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1 E 2 CORÍNTIOS
1. A cidade de Corinto
A Corinto à qual Paulo escreve mais ou menos em 50 d.C. é uma Corinto reconstruída por Júlio César em 44
a.C. depois que havia sido completamente saqueada e destruída em 146 a.C. Com Júlio César, Corinto se torna
capital romana da província da Acaia que era uma cidade importante e privilegiada por muitos motivos. Entre
estes motivos podemos destacar a sua posição privilegiada no istmo 1 que fazia com que Corinto tivesse portos
dos dois lados: um que se dirigia para o Oriente, abrindo caminho para a Ásia; outro que se dirigia para o Oriente,
abrindo caminho para o comércio com a Itália e outras regiões do Ocidente. Assim, a cidade é o lugar de
passagem desses navios e também dos seus tripulantes. Por sua posição privilegiada no Istmo, era também o
lugar onde se realizam os chamados “Jogos Ístmicos” em honra a Netuno (Poseidon), quase tão famosos quanto
as Olimpíadas e que atraíam um grande público à cidade.
Corinto era conhecida ainda pela sua depravação moral. Existia na cidade um templo dedicado a Afrodite, no
qual, segundo Estrabão existiam mil hieródulas (homens e mulheres que em certos santuários pagãos da
antiguidade se dedicavam à prostituição) que haviam sido dedicadas a deusa como escravas por homens e
mulheres ricos da cidade. Segundo Estrabão, estas mulheres eram um grande motivo de atração para a cidade,
porque os marinheiros que ali passavam deixavam muito do seu dinheiro. Segundo Rinaldo Fabris 2, nas
escavações que têm sido feitas em Corinto se encontram apenas os restos de um pequeno templo dedicado a
deusa que não poderia abrigar as mil hieródulas das quais fala Estrabão. Ele acredita que estes escritos tinham o
intuito de aumentar a má fama que a cidade já possuía nas redondezas. Fato é que já no século V a.C. Aristófanes,
um importante escritor grego, utiliza o termo korinthiázestai, ou seja, “viver à maneira coríntia”, como sinônimo
de “fornicar” e, também, Platão, na República, utiliza a expressão korinthia korê, ou seja, “uma jovem coríntia”,
como sinônimo de prostituta.
4
Cf. Maria de Lourdes Corrêa Lima (apontamentos de aula); cf. também: Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 142-147; cf.
também: Rinaldo Fabris. Pablo, El Apóstol de las gentes. Paulus, p. 385ss
5
Quiasmo: uma estrutura literária onde temos uma premissa “a” que é modificada por uma premissa “b” que gera uma nova
premissa denominada “ a’ ”, que é justamente “a” modificada por “b”.
2
haviam ressuscitado, logo não colocavam a sua esperança numa ressurreição futura, mas no fato presente de
que já estavam em comunhão definitiva com Cristo. Paulo combate o erro dos Coríntios afirmando o fato da
ressurreição de Cristo. Se em Adão todos morrem em virtude da sua solidariedade com ele, também no novo
Adão, Cristo, todos vivem, em virtude da graça que Ele nos transmite.
Como podemos ver acima, a 2 Coríntios se divide em três partes bem distintas. Na primeira parte temos o
contraste entre a alegria de Paulo pelo apaziguamento da sua relação com os Coríntios e a defesa que ele precisa
fazer de si mesmo diante dos adversários. Na segunda parte, que é basicamente exortativa, Paulo fala da doação
à Igreja de Jerusalém. Assim como Cristo se fez pobre para nos enriquecer nós devemos dar livremente o que é
necessário para os irmãos (8,9). Na terceira parte temos uma outra controvérsia com os adversários onde Paulo
faz a sua apologia, trazendo em seu favor as diversas dificuldades que ele enfrentou pelo Evangelho.
Ao que tudo indica o tema da polêmica com os falsos apóstolos ocupa um bom espaço dentro da 2 Coríntios.
Alguns autores, principalmente protestantes, quiseram achar que Paulo se referia aos doze apóstolos, como se
fossem eles os seus opositores. Essa suposição hoje não encontra mais aceitação, tendo em vista que em outros
escritos, Paulo demonstra claramente a sua amizade e comunhão com os outros apóstolos. Esses adversários
acusam Paulo de falta de energia (10,1.10); de incapacidade de falar (11,6); falta de caráter (1,17); covardia
(4,1.16); apetite de dominação (1,24; 4,5); abuso do seu cargo (2,17; 10,14). Paulo se defende destes ataques
especialmente nos capítulos 10-13, onde tece a sua apologia afirmando ser também ele hebreu (11,21); arroga
em seu favor as inúmeras desditas pela qual passou (11, 23-33).
GÁLATAS
1. Destinatários
Os assim chamados gálatas eram, no início, tribos célticas que deixaram a região da Gália e se estabeleceram
no centro da Ásia Menor. Nessa região essas tribos viveram durante algum tempo sob os seus próprios chefes até
que em 25 a.C. Augusto agregou a região da Galácia ao domínio romano criando assim a província romana da
Galácia que abrangia um imenso território: ao Norte, até quase o Mar Negro; e ao Sul, até quase o Mediterrâneo.
O centro desta província romana era Ancira. Quando se fala dos Gálatas tanto podemos estar falando do
território menor onde se instalaram as tribos vindas da Gália ou de todo o território da província romana.
Algumas passagens podem nos mostrar em que região Paulo pensava quando falava da Galácia. Em At 16,6 e
18,23 Paulo faz distinção entre as regiões da Frígia e da Galácia, o que nos mostra que ele está pensando na
Galácia do Norte, a região mais restrita, e não na província romana da Galácia, a região mais ampla. A cultura
greco-romana se estabeleceu na região da Galácia e por isso ali Paulo pode também pregar o evangelho. 7
2. Datação
Paulo esteve duas vezes na região da Galácia: na segunda viagem missionária (At 16,6) e na terceira viagem
missionária (At 18,23). Em 4, 13 Paulo fala que, em virtude de uma doença, visitou os Gálatas pela primeira vez.
6
Cf. Maria de Lourdes Corrêa Lima (apontamentos de aula); cf. também: Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 142-147; cf.
também: Rinaldo Fabris. Pablo, El Apóstol de las gentes. Paulus, p. 385ss
7
Cf. Karl Hermann Schelkle. op. cit. pp. 133
3
Logo, ele deve ter escrito a carta durante a terceira viagem missionária, de Éfeso ou de Corinto, onde ele esteve
por mais tempo sem viajar. Gl 1,6 parece nos dar uma data mais precisa quando Paulo fala que os Gálatas foram
evangelizados e logo estão dando ouvidos à outra coisa. Em virtude disso, os estudiosos acreditam que é mais
provável que Paulo tenha escrito de Éfeso e não de Cesaréia, três anos mais tarde. Aqueles que acham que Paulo
quando fala da Galácia está se referindo à Galácia maior preferem datar a carta depois da primeira viagem
missionária (escrita talvez em Filipos entre os anos 51-52). Aqueles, porém, que acreditam que Paulo está se
referindo à Galácia menor datam a carta como tendo sido escrita em Éfeso entre os anos 54-55.
3. Estrutura
Saudação e admoestação: 1-10
Primeira Parte (Seção Autobiográfica): 1, 11 – 2, 21
Segunda Parte (Seção Dogmática): 3, 1 – 4,31
Terceira Parte (Seção Exortativa): 5, 1 – 6,10
Epílogo: 6, 11-18
4. Características Teológicas
O grande problema que Paulo enfrenta na comunidade dos Gálatas é a controvérsia com os “judaizantes”.
Em Gl 1, 6-7 Paulo fala de alguns que estão “perturbando” os cristãos da Galácia. Esse verbo “perturbar” que
Paulo usa é muito importante para entendermos quem são os judaizantes. Paulo aqui utiliza o verbo
grego tarasso que significa “perturbar”, mas não somente “perturbar” no sentido de “causar algum incômodo”,
mas “perturbar” aqui tem uma conotação política e significa “subverter a ordem estabelecida”. Logo, os
judaizantes são pessoas que vêm de fora da comunidade para subverter aquilo o que Paulo já havia estabelecido.
Podemos ver em várias passagens que Paulo questiona a atitude dos judaizantes (cf. 1, 6-7; 3,1; 5,10).
Esses perturbadores que vêm de fora querem impor aos Gálatas, que vieram do paganismo (4, 8-10), a
adotar os costumes judaicos. Os judaizantes acreditavam que, mesmo aqueles que aderiram a Jesus deveriam
continuar praticando ao lado do cristianismo todos os costumes judaicos, como a circuncisão, as leis dietéticas
etc. Eles se apresentam como os verdadeiros anunciadores do evangelho e se opõem veementemente a Paulo
fazendo contra ele diversas acusações. Daí podemos entender porque Paulo fala que os gálatas passaram a um
“outro evangelho” em 1,6 e afirma que ele mesmo está submisso ao evangelho que anuncia (cf. 1,8).
O problema dos judaizantes é o problema da justificação. Vejamos um pouco o tema da justificação 8:
Antigo Testamento: na terminologia jurídica do AT, o juiz “justifica”, declara alguém inocente. Justificar é,
portanto, absolver alguém no tribunal. Esse alguém que é absolvido deve ser inocente, caso contrário seria
uma perversão da justiça. De maneira particular, o Servo de Javé parece representar um estilo próprio de
justificação, segundo o qual, diferentemente da lei comum, o pecador seria declarado inocente. É quase como
se fosse um lampejo do que se desenvolverá na teologia paulina da justificação. No judaísmo, e
especificamente em Qumran, antes da doutrina farisaica da justificação, já se acentuava o papel de Deus neste
processo e o termo ganhou, por vezes, o sentido de perdão e reconciliação.
Novo Testamento: Aqui o autor do verbete destaca três momentos: a pregação de Jesus, a teologia paulina e
Tiago. Vejamos em primeiro lugar a pregação de Jesus:
Pregação de Jesus: A pregação de Jesus parece destacar de maneira especial os pecadores. Estes, se forem
humildes, são mais aptos a receber a justificação do que os fariseus que já se consideram justificados.
8
Cf. G. BARBAGLIO, As cartas de Paulo. II. São Paulo, 1991, p. 292-296; J. GNILKA, Teologia del Nuevo Testamento. Madrid,
1998, p. 82-93; A. VAN SCHAIK, “Justificação”, in A. VAN DEN BORN (org.) Dicionário Enciclopédico da Bíblia. Petrópolis, 1977,
col. 861-866
4
Teologia paulina: O texto do Barbaglio 9, apresenta uma análise das expressões utilizadas por Paulo quando
fala da justificação. Antes de traçar a teologia paulina sobre a justificação, convém ressaltar alguns pontos da
terminologia. Em primeiro lugar, Barbaglio destaca a expressão “justiça de Deus”, que aparece apenas na carta
aos Romanos, querendo de maneira indireta afirmar a expressão “ser justos pelo dom de Deus”. Também os
termos “justificar”, “ser justificados” aparecem em Gl e Rm, indicando que os beneficiários da ação
justificadora são, em primeiro lugar, Abraão, e depois todos os homens, judeus e pagãos. Nega-se a lei
mosaica com as suas obras de observância. Há uma antítese: não à justificação pelas obras e sim à fé. Também
os termos justiça e justificação aparecem em Gl, Rm e ainda em Fl e 1 Cor. Referindo-se à Gn 15,6, Paulo
mostra que Deus credita como justiça a fé. A justificação é expressada como resultado da ação salvadora de
Cristo (cf. Fl 1,11; 1 Cor 1,30 etc.). O adjetivo justo, por fim, em apenas um texto (Rm 3,26) é atribuído a Deus
e poucas vezes é atribuído ao homem.
O ponto de partida de Paulo é a sua concepção de pecado, uma vez que a justiça exclui o pecado e a
justificação inclui o perdão dos pecados. Segundo o pensamento paulino, antes de Cristo, todos, judeus e pagãos,
estavam sob o jugo do pecado e incapazes de justificar-se. O tema da justificação em Paulo desenvolve-se
sobretudo nas suas polêmicas com os judaizantes. Até mesmo o seu vocabulário deve ter sido retirado desse uso
legalista comum aos judaizantes. Segundo o sistema farisaico da justificação, que superexaltava a observância da
lei em detrimento da misericórdia de Deus, depois da morte o justo receberia a sua recompensa, por ter ele
mesmo, por suas própria capacidades, observado toda a Lei. Era o sistema da balança: para onde a balança tender
Deus é obrigado a proferir a sentença. As escolas de Hilel e Shamai, chegavam até a discutir sobre o que
aconteceria caso obras boas e más se igualassem. A justificação era assim uma espécie de recompensa, um
sistema forense onde Deus reconhece apenas uma realidade já existente. Paulo opôs a esse sistema a justiça
cristã, segundo a qual, é Cristo quem justifica o homem pela fé. Enquanto o sistema farisaico queria pôr no
mesmo patamar a fé e a observância da Lei, Paulo demonstra a supremacia da fé. A própria fé é também um dom
de Deus, o que já havia sido destacado por Fílon e Qumran. Paulo chega a citar o exemplo de Abraão, como
aquele que teve a “fé” imputada como justiça. Paulo demonstra então, que a justificação é um dom de Deus e
não um produto do esforço humano.
Tiago: Aparentemente há uma oposição formal entre Tiago e Paulo, uma vez que aquele aplica às obras um
lugar de maior destaque. Essa concepção levou Lutero a rejeitar o escrito de Tiago. Já os Padres puderam
perceber o que hoje nos parece claro, a saber, que não há de fato oposição, o que há é uma outra forma de
entender fé, obras e justiça. As obras em Tiago não são as “obras da Lei”, mas obras de caridade
(hospitalidade, religiosidade etc.). O que Tiago chama de “fé morta” é a aceitação puramente intelectual da
verdade, sem que isso implique num envolvimento ou numa mudança da vida. A justiça para Tiago é a
conformação entre a vida e a doutrina. A Lei ele a entende no espírito do Sermão da Montanha, onde esta se
torna uma lei de liberdade. Segundo Chaine, Tiago talvez queira combater uma visão errônea da doutrina
paulina sobre a justificação, segundo a qual alguns diriam que é possível se salvar somente pela fé, sem
praticar as virtudes cristãs.
Paulo se opõe à esse sistema farisaico da balança mostrando que a justificação não é:
Jesus Cristo + Lei = Salvação
E, sim:
Jesus Cristo = Salvação (a Lei é consequência da adesão a Jesus Cristo).
A Lei, para Paulo, exerce uma dupla função:
Em primeiro lugar a Lei foi dada em virtude das transgressões do povo. A Lei, todavia, não ajuda o homem a
vencer o pecado. Ele deve então voltar a Abraão, à fé.
9
G. BARBAGLIO, As cartas de Paulo. II. São Paulo, 1991, p. 292-296
5
Em segundo lugar, a Lei guarda para a fé. Ela é pedagoga. Com o advento de Cristo a Lei já alcançou o seu
objetivo.
Quando praticamos a Lei não a praticamos achando que é ela quem nos salva. A salvação vem pela graça de
Cristo. O nosso seguimento da Lei é somente a expressão de quem aderiu à salvação.
FILIPENSES
1. Destinatários10
Esta cidade recebeu o nome do rei Filipe II da Macedônia, pai de Alexandre Magno, que a fundou e
construiu. Paulo esteve em Filipos durante a 2ª viagem missionária (At 16, 12-40), entre os anos 50 e 51. Filipos
não tinha uma sinagoga, o que indica que a população judaica na região era pequena. Quando chega na cidade
Paulo encontra Lídia, comerciante de púrpura, num pequeno lugar de oração que havia em Filipos. Paulo e Silas
teriam expulsado um espírito maligno de uma adivinha, que o levou diante do tribunal sendo, por isso, açoitado e
preso, mas somente por uma noite (teria sido o primeiro cativeiro paulino) e depois teria sido despedido da
cidade depois de ter conseguido desculpas das autoridades pelo fato de terem açoitado um cidadão romano.
Paulo esteve ainda mais duas vezes na comunidade: durante o outono de 57, na terceira viagem missionária;
depois na Páscoa de 58 (At 20,6). Parece ser uma comunidade com a qual Paulo mantinha íntimos laços fraternos.
Somente dela Paulo aceita ajuda material e não teme ser tido como interesseiro (Fl 4,15s; 2 Cor 11,9).
2. Estrutura
Introdução: 1, 1-2 (saudação); 1, 3-11 (ação de graças)
Notícias Pessoais: 1, 12-16
Exortações: 1,27 – 2,18
– fé e humildade:1,27 – 2,11 (2,6-11: hino)
– trabalhar pela salvação: 2,12-18
III. Notícias Pessoais: 2,19 – 3,1
IV. Advertências e exortações: 3,2 – 4,1
V. Exortações Finais: 4,2-9
VI. Agradecimentos: 4,10-20
VII.Saudações e bênção final: 4,21-23
COLOSSENSES
1. A comunidade de Colossos11
10
Cf. Karl Hermann Schelkle. Teologia do Novo Testamento. pp. 163-164
11
Cf. Ballarini. Introdução à Bíblia. Vol.V/2. pp. 62-63
6
Colossos ficava na região da Grande Frigia, situada numa área de caráter vulcânico. Eram frequentes as
emanações sulfurosas e outras manifestações da natureza que faziam com que os moradores pagãos dessa região
venerassem forças ocultas personificadas. A comunidade na foi fundada por Paulo, como ele deixa expresso em Cl
2,1. Em At 2,10 é citada a presença de habitantes da Frígia no dia de Pentecostes, o que pode explicar a existência
de um cristianismo pré-paulino nessa região. Durante o período em que Paulo esteve em Éfeso ele poderia
facilmente comunicar-se com Colossos e com outras Igrejas vizinhas, como Laodiceia, que é citada na carta. Ao
que parece, mesmo não tendo fundado a comunidade, Paulo age com autoridade sobre ela, da mesma forma que
age sobre as comunidades que havia fundado. Epafras, citado na carta, teria sido evangelizado por Paulo e se
tornado o apóstolo direto de Colossos, que após a morte de Paulo passou para o pastoreio de João, assim como
as outras Igrejas da Ásia Menor.
2. Autoria e datação
A carta é uma dêutero-paulina. O problema da autoria se dá em virtude do estilo, do conteúdo e do
vocabulário, que se diferencia das proto-paulinas. O estilo é diferente porque neste escrito Paulo muda de
assunto rápido, possui um temperamento forte. Com relação ao vocabulário, termos que são próprios de Paulo,
como ‘justificação’, ‘justiça’, ‘justo’, não aparecem. Com relação ao conteúdo, alguns temas aparecem abordados
de outra forma, como a cristologia que, nas proto-paulinas insiste em falar do Cristo crucificado, e aqui Paulo
trabalha mais a questão as pré-existência do Verbo. Com relação à eclesiologia, nas outras cartas Paulo fala mais
da comunidade local, aqui Paulo apresenta o termo ‘ekklesía’ numa dimensão universal (cf. Cl 1,8 e 1 Cor 12,12).
Alguns também vêem em 4,18, na expressão ‘meu próprio punho’ um apelativo de um outro autor para atribuir a
carta a Paulo. Alguns autores vão defender a autoria paulina dizendo que o estilo e o vocabulário não
representam um problema em si, uma vez que era o amanuense quem colocava a carta por escrito e poderia, em
virtude disso, utilizar-se de um vocabulário próprio. Inclusive a expressão ‘meu próprio punho’, para esses
autores, não seria um apelativo, mas Paulo que no final do escrito feito pelo secretário ou amanuense queria
escrever com sua própria letra a saudação final.
O problema da autoria vai influenciar diretamente na datação da carta. Aqueles que acreditam que a carta
aos Colossenses foi escrita por Paulo vão datá-la no período correspondente ao cativeiro em Éfeso ou Roma.
Aqueles que acreditam ser a carta não de Paulo, mas da escola paulina, vão datá-la entre os anos 80 ou 90.
3. Estrutura
Introdução e ação de graças: 1, 1-14
1ª Parte – a dignidade de Cristo: 1, 15-29
2ª Parte – as falsas doutrinas: 2, 1-23
3ª Parte – conseqüências morais: 3, 1 – 4, 6
Epílogo: 4, 7-18
4. Conteúdo e teologia
A comunidade de Colossos parece ter uma mistura de gnosticismo, cristianismo e judaísmo. Alguns versículos
podem bem nos mostrar essa ideia:
2,8: ‘ninguém vos escravize’; ‘especulações da filosofia’.
2,9: ‘plenitude’ da divindade: não uma centelha.
2,10: ‘nele fostes levados à plenitude: poderia se pensar em um outro acesso a Deus que não por meio de
Cristo.
2,11: ‘verdadeira circuncisão’: referência ao mundo judaico.
2,16: ‘comida e bebida’: asceses (gnósticas?); ‘sábados e luas novas’ (mundo judaico).
2,18: ‘culto dos anjos’: elemento gnóstico para ter acesso ao mundo espiritual.
7
2,19: ‘indagando sobre coisas que viu’ – o termo indagar aqui (embateuo) é próprio dos cultos mistéricos
(gnosticismo).
Existiam dois tipos de sistemas gnósticos: os estáticos, onde não se podia ascender de uma à outra casta; os
dinâmicos, onde se podia ascender de uma à outra casta através de asceses, jejuns e banhos rituais. Podemos
perceber esses elementos na carta.
Existem várias explicações sobre como teria surgido esse sincretismo em Colossos. Alguns acreditam que seja
influência da filosofia platônica. Outros afirmam que seriam doutrinas gnósticas que receberam uma roupagem
judaica. Outros, ainda, afirmam que seria uma doutrina que acabou assimilando elementos do gnosticismo e das
religiões de mistérios.
Vejamos como Paulo responde aos problemas da carta.
A primeira grande resposta de Paulo é chamado “hino cristológico das comunidades da Ásia Menor” de 1,15-
20. Paulo afirma que o Verbo encarnado foi o primeiro na intenção de Deus, embora não tenha sido o primeiro na
ordem da criação. Tudo foi criado em vista dele e tendo-o como modelo. Depois:
2,9: nele habita ‘corporalmente’ toda a plenitude da divindade (para determinar com qualquer oposição entre
corpo e espírito que pudesse haver por conta de uma filosofia platônica).
2,12: co-sepultados (sintaphéntes); co-ressuscitados (sinegérthete); co-vivificados (sinedzuopoiésen – 2,13).
2,28: buscar a verdadeira ‘sabedoria’; ser ‘perfeitos em Cristo’ e não nas práticas ascéticas.
Em resumo, Paulo quer demonstrar que é a partir de Cristo, e não a partir das práticas ascéticas judaicas ou
gnósticas, que se deve atingir Cristo.
FILÊMON12
1. Autenticidade
Trata-se de uma carta pessoal de Paulo, a um cristão que se converteu, muito provavelmente, através da sua
pregação (cf. 19). Alguns quiseram negar a autenticidade da carta, talvez por tratar sobre o tema da escravidão
sem execrá-la diretamente. Contudo, a maioria dos autores aceita o escrito como verdadeiramente Paulino,
esclarecendo que o não negar diretamente a escravidão se dá em virtude do contexto no qual Paulo está inserido.
EFÉSIOS
1. A Cidade de Éfeso
Situada na Ásia Menor, a cidade Éfeso recebeu esse nome devido a sua origem mitológica: teria sido fundada
por uma amazona homônima, juntamente com a amazona Coresso, que teria dado nome a um importante monte
da cidade. A cidade passou pelas mãos de diversas nações que a dominaram, como a Pérsia, a Macedônia etc. Por
fim, em 133 a.C., passou pacificamente para as mãos dos romanos, em virtude do testamento do rei Átalo II,
último dos reis de Pérgamo.
Em Éfeso ficava situado o importante templo de Ártemis, uma das sete maravilhas do mundo antigo. Ártemis
era cultuada em Éfeso como a grande mãe, sendo representada, algumas vezes, com seios numerosos. Em Roma,
Ártemis foi identificada com Diana, e seu culto diferenciava-se bastante. Era cultuada em Roma como a deusa da
caça, tendo bosques e animais sagrados especialmente a ela dedicados.
O povo de Éfeso vivia sobretudo do Comércio, especialmente nos meses de abril-maio quando, por ocasião
das Artemísias (as festas em honra de Ártemis), a cidade se tornava muito movimentada e eram fabricadas
pequenas miniaturas do Templo e amuletos que protegiam contra mau-olhado e coisas semelhantes.
9
virtude de ser Éfeso a capital da província romana da Ásia, o escrito acabou tradicionalmente atribuído a
esta comunidade.
3. Estrutura
Introdução: 1,1-2
Parte Dogmática (encerrada pela doxologia de 3,20): 1,3 – 3,21
Parte Exortativa (aplicação da doutrina à vida prática): 4,1 – 6,20
Epílogo: 6,21-24
1. Autenticidade
A questão da autenticidade surge, principalmente, depois do século XIX. Apenas algumas vozes distoantes
tinham se levantado no século II, como Marcião e Basílides. Marcião negava a autenticidade das cartas por conta
do seu caráter pessoal. Para alguns autores do século XIX, as cartas teriam surgido no século II, com o intuito de
combater o gnosticismo e afirmar o episcopado monárquico, no lugar de um governo colegial por parte dos
presbíteros. Outros defendiam um fundo paulino nas pastorais, mas estas estariam permeadas de idéias
posteriores. Uma grande maioria católica afirma a autenticidade das cartas pastorais. Contudo, acreditam ter
havido a intervenção de um redator ou secretário que, segundo algumas opiniões, poderia ter sido Lucas (2 Tm
4,11), o que explicaria as diferenças de vocabulário e estilo presente nas cartas.
Argumentos a favor da autenticidade:
Reconhecimento por parte da Tradição: partes das cartas são citadas por Santo Irineu, no século II, sendo
atribuídas a São Paulo;
O caráter das cartas: além de trazer o nome do apóstolo (1-2 Tm 1,1; Tt 1,1), trazem traços específicos de sua
personalidade (1 Tm 1,15 – consciência de ser o primeiro dos pecadores); a carta a Tito é dirigida a um
companheiro de Paulo do qual se tem apenas vagas notícias em Gálatas e 2 Coríntios, um falsário teria
endereçado a carta a um companheiro mais eminente.
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Argumentos contra a autenticidade:
A doutrina: alguns autores afirmam que há uma excessiva preocupação jurídica nas cartas (1 Tm 1, 10; Tt 1, 9),
o que não próprio do cristianismo de Paulo, que era marcado pela adesão a Jesus Cristo e de fundo
profundamente místico (essa afirmação não procede, porque em todo o epistolário paulino encontramos uma
parte doutrinal e uma parte exortativa);
Os erros combatidos: alguns autores afirmam que os erros combatidos por Paulo são uma gnose já
desenvolvida, como temos no século II – cf. 1 Tm 6, 20 (essa afirmação também não procede, porque
problemas de fundo gnóstico Paulo também combate em outras cartas, como o dualismo, por exemplo). Os
erros combatidos por Paulo são de fundo judaico (Tt 1, 10; 1 Tm 1, 17): esses movimentos judaicos propagam
genealogias e mitos intermináveis (1 Tm 1, 4; 4, 7; Tt 3, 9). Alguns autores defendem que não erros gnósticos
que Paulo estaria combatendo, mas desenvolvimentos lendários das narrativas do Pentateuco. A organização
eclesiástica: alguns autores defendem a ideia de que as cartas apresentam uma organização hierárquica
própria do século II, quando fala dos bispos, presbíteros e das viúvas. Isso é um engano, porque a carta,
embora utilize-se destes termos, não apresenta ainda uma diferença entre bispos e presbíteros. Se a carta
tivesse sido escrita no século II, jamais apareceria esse uso indiscriminado de bispo e presbítero, pois, neste
período, estas funções já estavam bem definidas.
Datação: Para os que aceitam a autenticidade as cartas teriam sido escritas entre os anos 63 e 67. A 1 Tm de
Filipos (1 Tm 1,3); Tt, talvez, logo depois; e a 2 Tm da prisão romana, antes da morte.
2. Teologia
1 Tm – exortação ao destinatário para que, como bispo, defenda os seus fiéis contra a heresia (1, 3-10);
exorta-o a nomear colaboradores (3, 1-13); seja modelo para os fiéis (4, 12-16).
2 Tm – exortação a confessar o Evangelho e a fé, mesmo nos tempos difíceis (1, 6-14); exortação a
desempenhar com fidelidade o ministério (2, 1-13).
Tt – exortação a garantir a ordem na comunidade por meio da nomeação de bispos e presbíteros (1, 5-9);
deve combater as heresias (1, 10-16).
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