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PRIMEIRO
O DOS CASTELOS – refere-se à posição que Portugal ocupa na Europa. Localiza Portugal
quanto ao espaço.
A Europa é comparada a uma figura feminina, que jaz,
fitando, virada para ocidente, com a cabeça apoiada na
A Europa jaz, posta nos cotovelos: mão. Está numa posição passiva, em contemplação,
De oriente a Ocidente jaz, fitando, lembrando. Os seus cabelos “românticos” referem-se aos
E toldam-lhe românticos cabelos povos do norte da Europa; a referência aos olhos gregos
Olhos gregos, lembrando. revela a grande importância que a cultura grega teve para a
Europa.
O cotovelo esquerdo é recuado;
O direito é em ângulo disposto. Continuando a descrição da Europa, refere-se que está
Aquele diz Itália onde é pousado; pousada no cotovelo esquerdo, mais recuado, que é
associado a Itália, onde teve origem a civilização romana. O
Este diz Inglaterra onde, afastado, cotovelo direito, que está disposto em ângulo, apoiando o
A mão sustenta, em que se apoia o rosto. rosto, é associado a Inglaterra, que mantém uma aliança
antiga com Portugal.
Fita, com olhar esfíngico e fatal,
O Ocidente, futuro do passado. O rosto da Europa é Portugal, que fita o ocidente, o mar,
O rosto que fita é Portugal. que teve grande importância no passado, mas contribuirá
para a construção do futuro. Fita com olhar misterioso,
porque o futuro está oculto, mas fatal, porque o destino está
já traçado.
(8-12-1928)
II- OS CASTELOS
PRIMEIRO
ULISSES Oxímoro - Embora seja “nada”, por ser irreal, o mito é “tudo”,
porque funda a identidade do povo que o criou, que nele
O mito é o nada que é tudo. acredita.
O mesmo sol que abre os céus
É um mito brilhante e mudo —
O corpo morto de Deus, O Sol, divinizado por muitos povos, é um mito, tal como Cristo
Vivo e desnudo. (“o corpo morto de Deus”), em que aqueles que inventaram a
religião cristã acreditam.
Este, que aqui aportou,
Foi por não ser existindo. Este (Ulisses) que, de acordo com o mito, aportou em Lisboa,
Sem existir nos bastou.
Por não ter vindo foi vindo apesar de não ter existido, foi existindo. Assim, bastou para ficar
E nos criou. a crença de que viajou até Portugal e fundou a cidade de Lisboa.
Assim a lenda se escorre Assim, a lenda (criada pelo homem) entra na realidade e
A entrar na realidade, fecunda-a, criando novas crenças e explicando acontecimentos,
E a fecundá-la decorre.
Em baixo, a vida, metade permanecendo.
De nada, morre.
A vida é metade do “nada”: a realidade vale menos do que o
(s/d) mito, porque morre, enquanto o mito permanece.
SEGUNDO
Teu ser é como aquela fria Assim, Viriato é o indício de que existirá o povo
Luz que precede a madrugada, português.
E é já o ir a haver o dia
Na antemanhã, confuso nada.
(22-1-1934)
TERCEIRO
(s/d)
QUARTO
D. TAREJA
Todas as nações são mistérios, porque o destino da história
As nações todas são mistérios. em construção é desconhecida dos seus protagonistas. Assim,
Cada uma é todo o mundo a sós. Dona Teresa, que amamentou e vigiou D. Afonso Henriques
Ó mãe de reis e avó de impérios. desconhecia que estava a criar o futuro rei de Portugal. Esse
Vela por nós! rei construiu um país que criou impérios.
O sujeito poético pede que D. Teresa, que no passado
Teu seio augusto amamentou vigiou o seu filho, ore agora por nós.
Com bruta e natural certeza Pede, também que reze por aquele que foi escolhido por
O que, imprevisto, Deus fadou.
Deus, apesar de ser imprevisível que viesse a ser rei.
Por ele reza!
Dê tua prece outro destino Ao referir que o seu filho envelheceu, refere-se
A quem fadou o instinto teu! metaforicamente ao envelhecimento ou à degradação de
O homem que foi o teu menino Portugal, pedindo que Dona Teresa ore, para ajudar a criar
Envelheceu. outro destino para a nação.
Mas todo vivo é eterno infante No lugar mítico onde D. Teresa permanece está também
Onde estás e não há o dia. vivo D. Afonso Henriques, reconhecido como o fundador de
No antigo seio, vigilante, uma nação. Assim, o sujeito poético mostra que existe
De novo o cria! esperança e pede a D. Teresa que, orando, ajude a restaurar
Portugal.
(24-9-1928)
QUINTO
D. AFONSO HENRIQUES No passado, D. Afonso Henriques, pai de uma nação, foi cavaleiro
e lutador. Hoje, cabe-nos a nós vigiar, para lutar contra “novos
Pai, foste cavaleiro.
Hoje a vigília é nossa. infiéis”. Para isso, o sujeito poético pede o exemplo e a força de D.
Dá-nos o exemplo inteiro Afonso Henriques.
E a tua inteira força!
Pede que D. Afonso Henriques dê a sua bênção, que será usada
Dá, contra a hora em que, errada,
como arma, e nos dê a sua espada (metaforicamente, o exemplo
Novos infiéis vençam,
A bênção como espada, da sua luta), que será usada como incentivo (bênção), na luta
A espada como bênção! contra os novos infiéis: a descrença, a apatia, o adormecimento
coletivo…
(s/d)
SEXTO
Rei poeta, D. Dinis, de noite, momento de reflexão,
D. DINIS escrevia as suas cantigas de amigo.
Ele foi, involuntariamente, “o plantador de naus a
Na noite escreve um seu Cantar de Amigo haver”, porque mandou plantar o pinhal de Leiria, cujas
O plantador de naus a haver, árvores haveriam de servir para construir as naus usadas
E ouve um silêncio múrmuro consigo: na expansão. Os pinhais semeados estavam já destinados
É o rumor dos pinhais que, como um trigo a “ondular” no mar, apesar de tal futuro ser ainda oculto
De Império, ondulam sem se poder ver. (“sem se poder ver”), para alimentarem o império, sendo
“um trigo do império”.
Arroio, esse cantar, jovem e puro, A ação de D. Dinis é comparada a um riacho (arroio),
Busca o oceano por achar; que busca o oceano, porque os pinheiros estão destinados
E a fala dos pinhais, marulho obscuro, a viajar no mar e o seu cantar está destinado a ser
É o som presente desse mar futuro, divulgado.
É a voz da terra ansiando pelo mar. Assim, o rumor dos pinhais já contém o futuro que lhes
está destinado, que é oculto, porque não é do
(9-2-1934)
conhecimento dos protagonistas da história.
SÉTIMO (I)
(12-2-1934)
Sétimo (II)
Ventre mítico do Império, porque foi mãe da ínclita geração, que
D. FILIPA DE LENCASTRE
esteve na origem da construção do Império.
Que enigma havia em teu seio Ao afirmar que o seio de D. Filipa de Lencastre apenas concebia
Que só génios concebia? génios, tendo sido os seus sonhos velados por um arcanjo, o sujeito
Que arcanjo teus sonhos veio poético compara-a a Nossa Senhora.
Velar, maternos, um dia?
Pede-lhe que encare Portugal, cuja História determinou, ao ter
Volve a nós teu rosto sério,
Princesa do Santo Gral, concebido os responsáveis pela expansão ultramarítima.
Humano ventre do Império, D. Filipa é considerada uma princesa mística, porque, para o poeta,
Madrinha de Portugal! terá sido escolhida por Deus para conceber os príncipes que
construíram o Império. É por esse motivo que o poeta lhe chama
(26-09-28)
“humano ventre do Império”. É também a Madrinha de Portugal,
porque conduziu o destino do país.
As Quinas – São referidas personalidades da História de Portugal que sofreram, para que o
nosso país iniciasse a expansão.
Firme em minha tristeza, tal vivi. D. Duarte afirma que cumpriu o seu dever, apesar de ter
Cumpri contra o Destino o meu dever. sofrido, agiu contra o Destino, que lhe deu D. Fernando
Inutilmente? Não, porque o cumpri. como irmão.
(21-07-1913)
Não me podia a Sorte dar guarida Não foi bafejado pela sorte, porque os escolhidos por
Por eu não ser dos seus. Deus sofrem no cumprimento da missão.
Assim vivi, assim morri, a vida,
Calmo sob mudos céus, Manteve-se fiel às suas ideias, mas conformou-se,
Fiel à palavra dada e à ideia tida.
porque acreditou estar a agir em nome de Deus.
Tudo mais é com Deus!
(15-02-1934)
D. João ficou ofuscado entre os seus
D. João, Infante de Portugal magníficos irmãos.
Não fui alguém. Minha alma estava estreita Isto porque é próprio do português querer
Entre tão grandes almas minhas pares, e poder todo o amplo mar ou a onda inútil
Inutilmente eleita, desfeita: tudo ou nada. D. João foi nada.
Virgemmente parada;
(28-03-1930)
Louco, sim, louco, porque quis grandeza Foi louco, porque procurou a grandeza que a sorte não
Qual a Sorte a não dá. pode dar (apenas quem sofre na concretização do seu
Não coube em mim minha certeza; projeto merece a glória). A certeza de que poderia
Por isso onde o areal está alcançar a glória não coube em si, pelo que teve de agir.
Ficou meu ser que houve, não o que há.
Como consequência, morreu no areal de Alcácer Quibir,
Minha loucura, outros que me a tomem onde ficou o seu ser que houve, material, mas não ficou o
Com o que nela ia. seu ser mitificado, que é eterno.
Sem a loucura que é o homem
Mais que a besta sadia, Considera a sua loucura positiva e aconselhável, já que
Cadáver adiado que procria?
sem a loucura o homem não passa de um animal, à
(20-02-1933) espera da morte.
IV. A Coroa
V. O TIMBRE – É o símbolo de uma família ou de uma nação. Nesta parte, serão abordados
os símbolos da expansão ultramarítima.
A cabeça do grifo: - O grifo é um animal mítico, que simboliza a união entre o terreno e o
divino.
O infante D. Henrique O infante D. Henrique é a cabeça do grifo,
porque foi ele quem sonhou o projeto divino.
Em seu trono entre o brilho das esferas, O infante é apresentado de noite e em solidão, a
Com seu manto de noite e solidão,
Tem aos pés o mar novo e as mortas eras — situação ideal para a elaboração de grandes
O único imperador que tem, deveras, projetos.
O globo mundo em sua mão.
Foi o único imperador que possuiu
verdadeiramente o mundo, pois dominou-o, ou
(26-09-1928) seja, conheceu-o. Assim, o tempo antigo, em
que o mar encerrava o desconhecido, morreu e
hoje o mar é aberto.
Uma asa do grifo:
D. João, O Segundo
D. João é uma asa do grifo, porque concretizou o
Braços cruzados, fita além do mar. projeto do infante.
Parece em promontório uma alta serra —
O limite da terra a dominar D. João II surge como uma alta serra em
O mar que possa haver além da terra. promontório, numa situação de superioridade. Fita o
limite da terra que pretende dominar e o mar que
Seu formidável vulto solitário acredita existir além da terra.
Enche de estar presente o mar e o céu
E parece temer o mundo vário D. João tem uma presença imponente. Surge só,
Que ele abra os braços e lhe rasgue o véu. enchendo o mar e o céu só com a sua presença. O mar
parece temer que ele aja e desvende todo o mistério.
(26-09-1928)
II. MAR PORTUGUÊS – consiste no percurso iniciático que Deus impôs ao povo português,
para que pudesse reunir as condições – o conhecimento – para, futuramente, vir a ser o líder
do Quinto Império. Assim, a conquista do império foi um caminho, não um fim em si mesmo. A
destruição do império (terreno) consistiu na destruição de algo material, mas as condições
espirituais foram reunidas, para que Portugal possa cumprir o projeto divino – a conquista de
um Império de Paz e de Amor.
I. O Infante
A obra nasceu, porque o homem sonhou; o homem
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce. sonhou, porque Deus quis.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse. Deus quis que a Terra fosse uma, completa, que o
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma, mar unisse e já não separasse, pelo que escolheu o
Infante.
E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente, Assim, as naus viajaram de ilha em continente,
Surgir, redonda, do azul profundo.
trazendo o conhecimento. Percebeu-se, assim, que a
terra é redonda. Vimo-la, portanto, surgir redonda, no
Quem te sagrou criou-te português.
Do mar e nós em ti nos deu sinal. azul profundo do Céu.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!
Deus quis que o Infante fosse português, e deu-nos
(s/d) sinal de que estávamos destinados a desvendar o mar
II. Horizonte
Ó mar anterior a nós, teus medos O mar anterior a nós era cheio de mistérios,
Tinham coral e praias e arvoredos.
mas, afinal, os medos eram infundados, porque,
Desvendadas a noite e a cerração,
desvendado o oculto, descobria-se um Sul celeste
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério e esplendoroso. As naus da iniciação permitiram o
’Splendia sobre as naus da iniciação. conhecimento.
(s/d)
III. Padrão
(13-09-1918)
IV. O mostrengo
O mostrengo que está no fim do mar
O mostrengo, como o Adamastor, começa por
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes, assumir a ousadia dos portugueses, que o
Voou três vezes a chiar, ofendem ao tentar descobrir os segredos do mar.
E disse, “Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo, O homem do leme, amedrontado, tem a coragem
Meus tectos negros do fim do mundo?” de enfrentar o mostrengo, respondendo-lhe
E o homem do leme disse, tremendo:
“El-Rei D. João Segundo!” sempre que viaja em nome de El-Rei D. João II.
(9-9-1918)
Tal como n’Os Lusíadas o episódio do Adamastor simboliza a superação dos medos, por
parte dos navegadores portugueses, também em Mensagem o poema “O Mostrengo” o vai
simbolizar.
N’Os Lusíadas, é Vasco da Gama que tem coragem de tomar a palavra, respondendo ao
Adamastor, em Mensagem é o homem do leme, que representa todo o povo português, que
teve a coragem de enfrentar os seus medos e desvendar o mistério, que o faz.
N’Os Lusíadas, o Adamastor desaparece após enfrentado por Vasco da Gama, pois a missão
foi cumprida e os medos foram vencidos; na Mensagem, o Mostrengo aparece novamente, no
penúltimo poema, pois o projeto dos portugueses ainda não está concretizado: novos medos
devem ser vencidos. O projeto material está cumprido; o projeto espiritual ainda está em
curso.
V. Epitáfio de Bartolomeu Dias No Cabo das Tormentas, jaz Bartolomeu Dias, o
Capitão do Fim, pois conseguiu dobrar o Cabo das
Jaz aqui, na pequena praia extrema, Tormentas, considerado o fim do mundo.
O Capitão do Fim. Dobrado o Assombro,
O mar é o mesmo: já ninguém o tema! Dobrado o Cabo, constatou-se que o mar é o
Atlas, mostra alto o mundo no seu ombro. mesmo. Do outro lado, não há abismo nem o fim do
mundo.
(s/d)
Por isso, Bartolomeu Dias é comparado a Atlas,
por ter conhecido, isto é, dominado o mundo.
Mas o que a eles não toca O que os navegadores estrangeiros não têm é a aura, o espírito de
É a Magia que evoca conquista, que nos lançou na descoberta do desconhecido, do Longe.
O Longe e faz dele história.
E por isso a sua glória Por isso, a sua glória foi-lhes “emprestada” pelos portugueses, que
É justa auréola dada lhes permitiram assumir-se como oficialmente descobridores de
Por uma luz emprestada.
territórios de cuja existência os portugueses já sabiam.
(2-4-1934)
No vale clareia uma fogueira. São descritas as sombras disformes de figuras que dançam à
Uma dança sacode a terra inteira. luz da fogueira e que sobem a encosta, perdendo-se na
E sombras disformes e descompostas
Em clarões negros do vale vão escuridão.
Subitamente pelas encostas,
Indo perder-se na escuridão.
De quem é a dança que a noite aterra? Os nativos são identificados com os Titãs, os filhos da Terra,
São os Titãs, os filhos da Terra,
que dançam a morte do marinheiro, Fernão de Magalhães,
Que dançam da morte do marinheiro
Que quis cingir o materno vulto — que quis possuir a Terra, desvendando o seu mistério. Os
Cingi-lo, dos homens, o primeiro —, nativos, figuras assustadoras e disformes, estão felizes, como
Na praia ao longe por fim sepulto. se tivessem vingado a terra, sua mãe, que o marinheiro quis
desvendar.
Dançam, nem sabem que a alma ousada
Do morto ainda comanda a armada,
Pulso sem corpo ao leme a guiar Dançam felizes, mas não sabem que a viagem prosseguirá,
As naus no resto do fim do espaço: porque, mesmo morto, Fernão de Magalhães continuou a
Que até ausente soube cercar guiar a armada, que completou a tarefa iniciada.
A terra inteira com seu abraço.
Em baixo, onde a terra é, o pastor gela, e a flauta Ladeiam-no os medos – Vasco da Gama
Cai-lhe, e em êxtase vê, à luz de mil trovões, superou os medos (ao passar o cabo das
O céu abrir o abismo à alma do Argonauta.
Tormentas e ao chegar à Índia) estes já não o
(10-01-1922) dominam.
X. Mar Português
1.ª parte - refere-se aos sacrifícios que as Descobertas
implicaram, para que o mar fosse português.
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
2.ª parte – reflexão sobre o sofrimento que os
Para que fosses nosso, ó mar!
Descobrimentos implicaram.
Valeu a pena? Tudo vale a pena O sujeito constata que os descobrimentos e o
Se a alma não é pequena. sacrifício valeram a pena, porque contribuíram para a
Quem quer passar além do Bojador evolução espiritual do povo português e para o
Tem que passar além da dor. conhecimento.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu. De facto, apenas com sacrifício se consegue atingir
a glória. A glória do povo português implicou a
descoberta do mar, o que implicou sofrimento, mas foi
(s/d) parte de um projeto divino.
Não voltou mais. A que ilha indescoberta D. Sebastião não regressou, mas o sujeito poético
Aportou? Voltará da sorte incerta acredita que terá aportado numa ilha
Que teve? desconhecida. D. Sebastião regressará? Deus não
Deus guarda o corpo e a forma do futuro,
Mas Sua luz projecta-o, sonho escuro revela o futuro, mas projeta-o, de modo oculto.
E breve.
(s/d)
XII. Prece
O sujeito poético dirige-se a Deus, constatando a
situação de decadência em que Portugal se
Senhor, a noite veio e a alma é vil. encontra atualmente, em que o heroísmo do
Tanta foi a tormenta e a vontade! país não se revela e o mar, que era Português,
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade. tornou-se universal.
Mas a chama, que a vida em nós criou, No entanto, o sujeito poético acredita que o
Se ainda há vida ainda não é finda. heroísmo do povo português não está findo, mas
O frio morto em cinzas a ocultou: apenas oculto na decadência do presente. Um
A mão do vento pode erguê-la ainda. impulso poderá reacendê-lo.
Dá o sopro, a aragem — ou desgraça ou ânsia — Por isso, o sujeito pede a Deus que dê esse
Com que a chama do esforço se remoça,
impulso – seja ele uma desgraça, que impulsione
E outra vez conquistaremos a Distância —
Do mar ou outra, mas que seja nossa! a ação, ou uma grande ansiedade – que leve o
povo português a recuperar o seu heroísmo.
(31-12-1921-01.01.1922)
Terceira Parte:
O Encoberto – Exprime a situação de decadência atual, em que o heroísmo do povo
português está ofuscado, encoberto. Com o regresso do Quinto Império, um império de paz e
de amor, o nosso heroísmo será recuperado.
Triste de quem é feliz! Os que se contentam com o que têm vivem como uma raiz,
Vive porque a vida dura. esperando a morte, como seres enterrados antes de o
Nada na alma lhe diz
Mais que a lição da raiz — serem.
Ter por vida a sepultura.
2.ª parte – reflexão sobre a importância do
Eras sobre eras se somem descontentamento e a apologia do sonho e do desejo de
No tempo que em eras vem. superação.
Ser descontente é ser homem.
Que as forças cegas se domem Independentemente da passagem do tempo, ser
Pela visão que a alma tem! descontente é condição para progredir. Para o efeito, a
força física deve estar ao serviço da espiritualidade.
E assim, passados os quatro
Tempos do ser que sonhou,
Assim, depois de passados os quatro impérios terrenos,
A terra será teatro
Do dia claro, que no atro aparecerá, na terra, o império espiritual que teve início
Da erma noite começou. num momento de decadência e nevoeiro.
Grécia, Roma, Cristandade, Por esse motivo, o sujeito poético incentiva à vivência do
Europa — os quatro se vão dia claro, do Quinto Império, em nome do qual D.
Para onde vai toda idade. Sebastião morreu.
Quem vem viver a verdade
Que morreu D. Sebastião? D. Sebastião lutou pelo sonho das Descobertas e foi por
esse sonho que morreu. Há de regressar, mitificado,
(21-02-1933) guiando o povo português em busca de um novo sonho. As
viagens ultramarinas fizeram parte do projeto divino, pois
permitiram o conhecimento e tornaram os portugueses
dignos de futuramente serem líderes do quinto império.
O Desejado
D. Sebastião jaz num espaço longínquo. No entanto, o
Onde quer que, entre sombras e dizeres, sujeito exprime a crença de um povo, afirmando que,
Jazas, remoto, sente-te sonhado, como mito em que o povo acredita, D. Sebastião poderá
E ergue-te do fundo de não-seres ressuscitar, para um novo destino. Como mito, D.
Para teu novo fado! Sebastião é nada, mas é tudo, porque o povo crê na sua
Vem, Galaaz com pátria, erguer de novo, ressurreição.
Mas já no auge da suprema prova,
A alma penitente do teu povo Como ser puro, D. Sebastião é comparável a Galaaz,
À Eucaristia Nova. cavaleiro apátrida da Távola redonda. O sujeito pede a D.
Sebastião, Galaaz com pátria, que venha encaminhar o
Mestre da Paz, ergue teu gládio ungido, povo português, liderando-o na conquista do Quinto
Excalibur do Fim, em jeito tal
Império, um novo reino espiritual.
Que sua Luz ao mundo dividido
Revele o Santo Graal!
Compara depois D. Sebastião ao Rei Artur, puro e digno
(18-01-1934) de possuir a espada Excalibur, pedindo-lhe que erga a sua
espada abençoada, mostrando o caminho para o fim do
mundo dividido e imperfeito, que acontecerá com o
momento de perfeição em que for conquistado o Quinto
Império.
(26-03-1934)
O Encoberto
Pretende-se, com este poema, associar a vinda do
Que símbolo fecundo Quinto Império ao símbolo dos Rosa-Cruz, homens
Vem na aurora ansiosa? intelectualmente superiores, que pretendiam atingir a
Na Cruz morta do Mundo perfeição, servindo Deus.
A Vida, que é a Rosa.
Pensa-se que Fernando Pessoa tenha pertencido aos
Que símbolo divino
Rosa-Cruz.
Traz o dia já visto?
Na Cruz, que é o Destino,
Destino – sofrimento, para a concretização do projeto
A Rosa, que é o Cristo.
divino.
Que símbolo final
Mostra o sol já desperto? Rosa - redonda, símbolo da perfeição.
Na Cruz morta e fatal
A Rosa do Encoberto.
(21-02-1933 -11-02-1934)
O céu ’strela o azul e tem grandeza. O sujeito poético afirma que o Padre António Vieira, homem
Este, que teve a fama e à glória tem, inteligente e visionário, conquistou a fama como imperador da
Imperador da língua portuguesa, língua portuguesa, cumprindo a vontade de Deus, ao conduzir
Foi-nos um céu também.
o povo português e ao profetizar o Quinto Império.
No imenso espaço seu de meditar,
Constelado de forma e de visão, António Vieira surge como isolado, num imenso espaço seu de
Surge, prenúncio claro do luar, meditar, com grandes ideologias. Prenunciou o regresso de D.
El-Rei D. Sebastião. Sebastião (o sujeito poético considera que, ao profetizar o
Quinto Império, profetizava necessariamente o regresso do
Mas não, não é luar: é luz do etéreo.
rei).
É um dia; e, no céu amplo de desejo,
A madrugada irreal do Quinto Império
Esse momento de claridade e certeza será iluminado, pois
Doira as margens do Tejo.
corresponde à conquista do Império de paz, de amor, de
(31-07-1929) verdade, que será liderado por Portugal.
Quando virás a ser o Cristo Apresenta D. Sebastião como um messias, que inaugurará uma
De a quem morreu o falso Deus,
nova ordem de paz e de amor, conduzindo o sujeito poético ao
E a despertar do mal que existo
A Nova Terra e os Novos Céus? fim da tristeza que lhe advém da vivência neste mundo
decadente, de crise, de mal.
Quando virás, ó Encoberto,
Sonho das eras português, Com a vinda de D. Sebastião, o sujeito poético pretende
Tornar-me mais que o sopro incerto
desempenhar um papel ativo no projeto de Deus, que já lhe
De um grande anseio que Deus fez?
despertou o sonho, a ansiedade. Por esse motivo, pensa-se que
Ah, quando quererás, voltando, Fernando Pessoa pretende ser associado a D. Sebastião
Fazer minha esperança amor? reencarnado, o messias, que liderará Portugal na conquista do
Da névoa e da saudade quando? Quinto Império.
Quando, meu Sonho e meu Senhor?
Noite
(8-7-1933)
É a Hora!