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PSICANALÍTICO
RESUMO
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Artigo científico organizado pelo Núcleo de Normatização e Planejamento de Pesquisa da Faculdade Pitágoras.
2019.
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Thaís Mendes Pires Silva - Aluno(a) do Curso de Especialização em Psicanálise. Graduado(a) no curso de
Psicologia. Atua profissionalmente como psicóloga. E-mail:thais.mps@hotmail.com.
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Roberta Augusta B. C. Paravidini - Professor(a) Orientador. Psicanalista, graduada em Psicologia pela
Universidade Federal de Uberlândia, mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de
Campinas.. E-mail: roberta.c.paravidini@gmail.com.
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1. Introdução
A forma de enxergar esse corpo e o próprio corpo torna-se assim frustrantes, pois, se o
corpo não representa o que se é, se o corpo não vive o prazer pleno e se o corpo não é o
padrão estabelecido pela cultura, isso pode causar sofrimento e adoecimento. Esses
sofrimentos são vivenciados no corpo de forma real através de modos de adoecimento físico e
psíquico, sendo elas: obesidade, bulimia, anorexia, depressão, fibromialgia, vigorexia,
toxicomania, dentre outras.
Partindo desse pressuposto, este artigo tem como objetivo investigar a relação do sujeito
como o estatuto corpo-sujeito obeso, partindo do referencial do que é corpo para psicanálise.
Todo o interesse em produzir um artigo com essa temática surgiu a partir de uma experiência
pessoal, bem como a partir da minha escuta clinica sobre as questões que envolvem o corpo e
suas intercorrências.
Trata-se, portanto, de uma pesquisa bibliográfica qualitativa, para a qual foi realizada
uma revisão da produção científica publicada em bases de dados (GOOGLE ACADÊMICO,
LILACS, SCIELO). Foram utilizadas as palavras chaves: Corpo na psicanálise; Obesidade;
Psicanálise; clínica contemporânea. Os achados foram discutidos à luz da psicanálise através
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das teorias clássicas, com foco no tema do estatuto corpo - sujeito obeso e seus
desdobramentos relacionados à obesidade e à cirurgia bariátrica.
O corpo na Psicanálise
A noção de corpo para Freud é distinta daquela apresentada por outros campos de saber
como a ciência e a filosofia, no qual mente e corpo são versus. Em Freud podemos encontrar
uma distinção entre corpo e organismo, sendo o corpo fonte e finalidade de satisfação. O
corpo passa a ser lugar para as manifestações dos desejos inconscientes ao mesmo tempo em
que a satisfação é fundamentalmente de ordem pulsional.
A partir de então é possível entender a pulsão como conceito limite entre o psíquico e o
somático. A pulsão representa os estímulos que advém do interior do corpo e se manifestam
na relação com o corpo. Os estímulos internos e externos só podem ser identificados a partir
da pulsão. Sendo assim, o que cada sujeito constrói sobre si e sobre o outro é único e
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singular.Dessa forma o corpo passa a ser o que sustenta o sujeito, o corpo sustenta o
fisiológico, o psiquismo o inconsciente. E por isso sofre todos os seus efeitos.
“A clínica da histeria revelou desde o início que não se trata de um suporte neutro. Pelo
contrário, ele é profundamente afetado pelo inconsciente que é suposto a suportar. Significa
que não só causa efeitos no inconsciente como é afetado pelas significações inconscientes.
Por isso é um corpo que além de funcionar conforme os princípios da fisiologia
anatômica... fala. Faz-se porta-voz das significações inconscientes. Acrescente-se a isso a
incidência da pulsão que o força a procurar uma satisfação muito específica uma satisfação
sem palavras e ficará fácil entender o desdobramento que o afeta. É um corpo cuja
fisiologia se faz histeriforme. Por quê? Porque sofre uma refração que o decompõe em
vários planos. Por um lado, a função fisiológica é alterada pela exigência pulsional, e
ambas, por sua vez, sofrem a inflexão que lhes impõe a função simbólica- vide o
inconsciente. (FREUD,S. 2004, p.146).
O conceito de narcisismo desenvolvido por Freud também nos oferece uma importante
contribuição para a compreensão da relação entre o corpo e as pulsões. Para Freud, o
narcisismo consiste em uma etapa fundamental da constituição subjetiva que indica um novo
modo de funcionamento pulsional.
Mesmo antes da publicação de seu artigo “Narcisismo: uma introdução”de 1914, Freud
já nos fornecia elementos para considerar que o corpo não é dado desde o início e, assim
como o eu, são constituídos em uma operação dialética. Em sua discussão a respeito do
presidente Schreber (1911), Freud nos fornece importantes contribuições para a compreensão
dessa operação. Ele afirma:
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“É uma suposição necessária a de que uma unidade comparável ao Eu não esteja presente
no indivíduo desde o início; o Eu precisa ser desenvolvido. Todavia, as pulsões auto-
eróticas estão presentes desde o início, e é necessário supor que algo tem de ser
acrescentado ao auto-erotismo, uma nova ação psíquica, para que se constitua o
narcisismo” (FREUD, 1914, p. 99).
“O Eu é, sobretudo corporal, não é apenas uma entidade superficial, mas ele mesmo a
projeção de uma superfície, ou seja, o Eu deriva em uúltima instância, das sensações
corporais, principalmente daquelas oriundas da superfície do corpo. Pode ser visto, assim,
como uma projeção mental da superfície do corpo” (FREUD, S. 1923, p.32).
Diante disso, pode-se perceber que o corpo é uma construção e precisar se inscrever no
aparelho psíquico. A partir disso forma-se a instância do Eu, no qual o sujeito se reconhece
como sendo um corpo. O corpo será a base para a formação dafunção do Eu, que é investida
de libido o tempo todo e, por não cessar nunca, há sempre algo que sobra. Esse algo „que
sobra‟ é o que podemos notar nas condições clínicas que pretendemos discutir no presente
artigo.
“Basta compreender o Estádio do Espelho como uma identificação, no sentido pleno que a
análise atribui a esse termo, ou seja, a transformação produzida no sujeito quando ele
assume uma imagem (...). A assunção jubilatória de sua imagem especular, por esse ser
ainda mergulhado na impotência motora e na dependência da amamentação que é o filhote
do homem no estágio de infans, parecer-nos-á, pois, manifestar, numa situação exemplar, a
matriz simbólica em que o eu [je] se precipita numa forma primordial, antes de se objetivar
na dialética da identificação com o outro e antes que a linguagem lhe restitua, no universal,
sua função de sujeito (...) o Estádio do Espelho é um drama cujo impulso interno precipita-
se da insuficiência para a antecipação - e que fabrica para o sujeito, apanhado no engodo da
identificação espacial, as fantasias que se sucedem desde uma imagem despedaçada do
corpo até uma forma de sua totalidade que chamaremos de ortopédica - e para a armadura
enfim assumida de uma identidade alienante, que marcará com sua estrutura rígida todo o
seu desenvolvimento mental. (LACAN, J. 1949 p. 100).
O sujeito existe antes mesmo de seu nascimento através do discurso do Outro e, após o
seu nascimento, precisa ocupar esse lugar. Dessa forma, o corpo é atravessado pela linguagem
e pelo simbólico que, assim, fabrica um corpo. Essa construção feita a partir do outro é apenas
uma capa que encobre aquilo que permanece sendo estranho para o sujeito, ou seja, o seu
interior, que é acessado apenas parcialmente pelas zonas erógenas gerando um gozo. O corpo
é, portanto, efeito de linguagem.
Nos anos 70, Lacan avança na elaboração da noção de corpo. Em seu seminário 22
“Real, Simbólico e Imaginário” afirma que “um corpo não tem outro aspecto senão o de ser
isto que resiste que consiste, antes de se dissolver” (SOUZA, A. 2000, p.37). Dessa forma, o
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que o corpo vive ultrapassa o imaginário e se torna real. Sendo assim, o corpo é tanto objeto
de dar a ordem como pôr em ordem, pois o sujeito se ouve, bem como ouve o outro.
Desse modo, podemos apreender o corpo por meio dos três registros, Real, Simbólico e
Imaginário, conforme sintetizado por Souza (2000).
O CORPO DO REAL
O corpo do real é o mais próximo da noção de somático, pois o real do corpo é a noção
do corpo para a biologia. O corpo do real que sustenta toda existência do sujeito, diz respeito
aos tecidos que constituem o organismo, como corpo real se oferece ao olhar. A partir da
linguagem, nasce a noção de fenômeno somático, no qual desconstrói a noção de sujeito
dividido entre corpo e mente para o corte divisório entre consciente e inconsciente. Dessa
forma não são todas as partes unificadas, mas sim partes do real que se resignificam e que são
um tipo de desconhecimento para o sujeito. O corpo do real é o corpo da linguagem.
(SOUZA, A. 2000)
O CORPO DO SIMBÓLICO
O CORPO DO IMAGINÁRIO
A relação do sujeito com o corpo começa diante do olhar do outro e da presença de seu
semelhante, na qual a imagem se constrói a partir de pequenos outros. Essa condição foi
denominada por Lacan como estádio do espelho. E através da apresentação da imagem do
espelho, do seu invólucro que se constitui a própria imagem, por meio desse simbolismo não
só de imagem, mas também de representações e linguagem que se fixa a imagem de si. A
partir desse reconhecimento, da junção de imagens, linguagens e símbolos, ou seja, do corpo
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Conforme o percurso teórico desse artigo, pode-se afirmar que o modocomo o sujeito
se estrutura no percurso da constituição de sua subjetividade é sempre multideterminada
emsua forma de estar no mundo e de estabelecer uma posição frente à falta do Outro. De
acordo com Lajónquière, o destino do sujeito desejante dependerá das possibilidades de ser
“arrancado da célula narcisismo/mãe fálica”ao mesmo tempo em que o corte não deve lhe
impossibilitar levar consigo a quantidade de energia necessária para investir nas coisas que o
rodeiam nos objetos(Lajonquière, 1992, apud Silva, 2006p. 42).Assim, podemos pensar a
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obesidade mórbida na atualidade como uma interseção entre a história do sujeito e as ofertas
da sociedade de consumo.
“[...] o discurso social atual sustenta a necessidade de uma saturação do vazio ou, mais
exatamente, a saturação do vazio como modalidade de supressão da falta e do desejo. A
obesidade é o fenômeno psicopatológico que, talvez mais que todos, ilustram os efeitos
devastadores dessa saturação: o corpo é reduzido a um mero receptáculo de
objetos”.(RECALCATI, 2002, p. 63).
O autor ressalta que, ante às transformações da nossa cultura, o grande Outro deixou
desmoronar seu poder de interdição, favorecendo para que a lei perversa de gozo fique ao
alcance das mãos. Desta forma, o discurso capitalista, ao oferecer uma infinidade de objetos
com a promessa de tamponar a falta, nada mais faz do que reforçá-la, operando nessa lógica
perversa descrita por Recalcati. Esta se sustenta no fato de não preencher a falta e sempre
produzir novas formas de faltas, ou seja, outros objetos compensatórios que geram um ciclo
de consumo, suscitando assim o esquecimento do simbólico e uma impulsiva ambição por
objetos. Todo esse discurso sustenta e reforça a ideia da obesidade como fruto dessa
sociedade contemporânea na qual o sujeito obeso se coloca no lugar de não ter que lidar com
a falta, pois sempre há algum objeto ao alcance como forma de compensação.
“Na época do discurso capitalista o que mais conta não é a ligação com o Outro – a espera
do signo da sua fala – mas, antes, a inveja do gozo do Outro, o sofrimento do ser excluído
do gozo, não do signo.” (RECALCATI, 2002, p. 63).
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Partindo desse ponto de vista, o fator mais agravante é o modo como o sujeito que sofre
com a obesidade se identifica com o vazio do estômago a partir do vazio da sua vida, gerando
assim uma “maquina de gozo”. Desse modo, o excesso de fome presente na obesidade não se
diferencia e não há um limite entre fome animal e fome humana:
“Quando esse limite se escreve, ele nunca é um dado da natureza, mas um efeito da ação do
simbólico, da ordenação simbólica que barra o corpo animal e o apego do homem à matéria
originária do alimento-mãe.” (RECALCATI, 2002, p. 52).
O autor faz uma comparação a respeito da fome entre obesidade e bulimia e, de acordo
com o mesmo, as experiências pulsionais são semelhantes, mas se distinguem em relação ao
Outro, sendo um da alienação e o outro da separação do Outro.
“Essa separação pode produzir uma fantasia de um corpo virtual, narcisista, idealizado, uma
espécie de um eu ideal totalmente desencarnado no qual o sujeito obeso se refugia.”
(RECALCATI, 2002, p. 57).
“o sujeito obeso demanda não o desejo do Outro, mas exibe-se, capturando o olhar do outro
e lhe causando angústia. Nesse sentido, se revela um traço perverso: o sujeito se torna
objeto que causa angústia no Outro.” (RECALCATI, 2002, p. 54).
A obesidade por si só não pode ser definida como neurose, perversão e psicose, pois não
pode ser definida como estrutura. A obesidade, no caso da neurose, pode ser usada como uma
indagação histérica a respeito do desejo do outro. Pode se estabelecer também como uma
defesa a certos adoecimentos, sendo um deles, uma defesa contra a depressão.
“O sujeito obeso evita a angústia relativa ao encontro com o desejo do Outro, construindo
um verdadeiro e próprio universo no qual todo o gozo fica concentrado no objeto
alimento.” (RECALCATI, 2002, p. 69).
Dessa forma, o corpo obeso passa a ser a própria recusa, pois a recusa ao indivíduo
obeso não foi possível. A obesidade significa então a não possibilidade de separação,
impossibilidade de recusa. Há uma impossibilidade de recusar o “objeto-alimento”, o dever de
dizer sempre „sim!‟, o que indica um caráter de passividade, no qual o sujeito obeso não
obtém um desmame “da oferta ilimitada e asfixiante do outro.” (RECALCATI, 2002).
2. Considerações finais
O estatuto do corpo - sujeito obeso pode ser pensado na atualidade como uma interseção
entre a história de vida do sujeito e a lógica da sociedade de consumo. A sociedade
contemporânea nos coloca frente a um novo estilo de vida, especialmente de uma
supervalorização da imagem, do corpo esbelto, do corpo reconstruído pelas plásticas, entre
outros, ofertando assim várias possiblidades a serem consumidas. Dessa forma, o sujeito está
sempre buscando o corpo da estética perfeita transformando assim a finalidade da sua
existência.
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A cirurgia bariátrica surge como uma forma quase obrigatória, um modo de submissão
em que o sujeito deve, por meio dessa intervenção, para o obeso, transformar o olhar sobre si
e o olhar dos outros para assim poder existir e ser amado. A expectativa é de que, mudando o
corpo, possa alterar a forma de se ver e se identificar. A cirurgia bariátrica opera no real do
corpo e também em seu estatuto imaginário, produzindo efeitos na relação do sujeito com o
mundo. Contudo, como ser de linguagem, é fundamental a articulação com o registro
simbólico para que o sujeito possa saber-fazer com esses efeitos.
Com isso, o sujeito obeso quando fracassa cirurgia bariátrica começa a buscar novas
respostas e formas para estar na lógica de consumo da sociedade contemporânea.
Apresento uma música a qual delineia a luta constante pela indústria da magreza, que
elucida a dor de viver um corpo que precisa ser moldado o tempo todo para se encaixar nos
padrões estabelecidos, isso sem pensar nas consequências e nas formas para obter esse corpo.
Beyoncè em sua música Pretty Hurts canta:
Ain’t got no doctor or pill that can take the pain away
The pain's inside and nobody frees you from your body
It's my soul, it's my soul that needs surgery
It's my soul that needs surgery
Plastic smiles and denia lcan only take you so far
Then you break when the fake faça deleaves you in the dark
You left with shattered mirror sand the shards of a beautiful past
REFERÊNCIAS
FREUD, S. (1914). Sobre o narcisismo: uma introdução. In: Edição standard brasileira das
obras psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, vol. XIV.
FREUD, S. (1915). As pulsões e suas vicissitudes. In: Edição standard brasileira das obras
psicológicas completas de Sigmund Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, vol. XIV.