OLHAR
PERIFÉRICO
Informação,
Linguagem,
Percepção
Ambiental
Lucrécia
D’Alessio
Ferrara
A
PERCEPÇÃO
PROGRAMADA
A
racionalidade
funcional
da
habitação
expressa
na
limpeza
estrutural
de
sua
concepção.
(Le
Corbusier
–
Casa
Savoie
em
Poissy)
O
desafio
perceptivo
colocado
como
objetivo
interpela
o
receptor
no
sentido
de
mudar
seus
hábitos,
para,
racionalmente,
descobrir
a
nova
formação
expressa
no
programa
e,
teoricamente,
definida
com
clareza.
Associação
por
contiguidade
entre
teoria
e
prática
em
linguagem
de
alta
definição;
agora,
a
descoberta
de
novos
hábitos
de
morar
e
de
viver
significa
a
adoção
de
um
juízo
perceptivo,
uma
escala
de
valores
não
elaborada
pela
memória
repertorial
do
receptor,
mas
prevista
na
sequência
programada.
Cria-‐se,
metodologicamente,
uma
outra
concepção
de
espaço
capaz
de
marcar
um
outro
tempo
que
corresponda
aos
avanços
históricos
da
Revolução
Industrial.
Este
espaço/tempo
não
existe,
mas
está
programado
como
uma
aspiração
de
domínio
ambiental,
uma
forma
de
ensinar
o
homem
a
ser
moderno:
um
signo
novo
no
espaço
de
um
tempo
marcado
pela
razão
e
a
função.
Este
sistema
formal
rigorosamente
sintático,
legisigno
remático
na
classificação
de
Charles
Pierce,
concentra
sua
organização
sígnica
na
montagem
informativa
que
alia
qualidade
(conteúdo)
da
informação
à
quantidade,
numa
proposta
concentrada
que
exige
a
descoberta
do
seu
princípio
estrutural
como
chave
perceptiva:
a
racionalidade
e
a
funcionalidade
das
novas
soluções
formais
são
as
novidades
perceptivas
propostas
pelo
ambiente
modernista
de
dimensões
inteligíveis.
A
PERCEPÇÃO
POSSÍVEL
Nesta
história
da
associação
perceptiva,
a
percepção
possível
é,
por
ora,
a
última
etapa
na
qual
estamos
inseridos.
O
princípio
de
sua
organização
sígnica
é
a
bricolagem
ou
o
eixo-‐fragmentos
de
linguagem,
envolvidos
em
múltiplas
e
indefiníveis
soluções
sintáticas
que
se
acotovelam
na
busca
de
um
significado,
em
si,
mudo
ou
inexistente,
porque
só
pode
decorrer
do
próprio
gesto
perceptivo.
A
O
pós-‐moderno
não
se
opõe
ao
passado,
nem
é
iconoclasta,
mas
é
antropofágico.
Absorve,
como
seu
conteúdo,
a
linearidade
mimética
do
renascimento,
o
detalhe
do
paramorfismo
barroco,
a
decoração
maneirista
e
as
próprias
soluções
funcionais
do
programa
modernista,
a
fim
de
devolver
tudo
transformado
em
uma
ação
perceptiva
que
exige
a
comunicação
entre
linguagens,
entre
os
receptores
e
entre
os
próprios
ambientes.
A
organização
modernista
sobre
a
cidade,
a
habitação
e
os
espaços;
o
pós-‐
moderno
sugere
uma
experiência
ambiental
em
que
vários
sistemas,
ideias,
propostas,
são
insistentemente
ensaiados
na
tentativa
de
gerar,
não
apenas
novos
espaços,
mas
sobretudo
novas
percepções
ou
outras
ações
sobre
o
espaço.
Este
espaço
é,
necessariamente,
aquele
de
um
outro
tempo:
uma
cidade
voltara
para
a
comunicação.
Para
falar
de
modo
termodinâmico,
o
pós-‐moderno
não
é
uma
recusa,
uma
ruptura
ou
uma
radical
mudança
de
direção,
mas
uma
recomposição,
uma
reordenação
do
passado,
inclusive
modernista,
por
força
da
absorção
das
novas
tecnologias
eletroeletrônicas
no
cotidiano
físico,
social
e
psíquico
desta
modernidade.
A
decoração,
os
estímulos
aberrantes,
a
cor,
a
luz,
a
mistura
de
materiais,
uma
aparente
improvisação,
a
tensão
tátil,
cinética,
o
predomínio
da
fachada
sobre
o
conjunto
do
edifício,
criam
uma
metáfora
às
avessas
da
racionalidade
e
do
funcionalismo
modernista.
Tudo
parece
estar
preparado
não
para
agasalhar
o
homem,
mas
para
mostrá-‐lo
numa
ação
dramática,
na
qual
ele
contracena
com
o
próprio
ambiente
decorado.
Já
não
se
tem
símbolos,
porque
o
pós-‐moderno
não
tem
crenças
e
aparentemente,
não
tem
ideologia
ou
conteúdo,
mas
têm-‐se
metáforas
de
símbolos
do
passado,
desnutridos
de
conteúdo
original
e,
por
isso,
gratuitos
e
supérfluos.
A
ordem
do
passado
sugere
a
desordem
do
presente,
uma
nova
estrutura
na
qual
o
móvel,
o
passageiro,
o
ineficaz,
o
público,
a
exposição,
substituem
os
valores
tradicionais
de
durabilidade,
eficiência,
privacidade,
aconchego
e
descrição.
Uma
nova
ordem
que
expõe
suas
complexidades
e
contradições,
como
declara
Robert
Venturi,
que,
ao
lado
de
Charles
Moore,
lidera
o
pós-‐moderno
norte-‐americano.
Desordem
e
caos
como
outra
fase
da
modernidade
que
se
exibe
perante
um
receptor
mais
exigente
e
mais
A
subversão
dos
modelos
estabelecidas:
a
fissure
nas
concepções
artísticas.
(Caravaggio,
São
Mateus,
1593
[obra
proscrita])
A
Casa
Battló
(Antoni
Gaudi,
1904-‐1906.
Barcelona)
A
Casa
Battló
(Antoni
Gaudi,
1904-‐1906.
Barcelona)
FERRARA,
Lucrécia
D’Alessio.
Olhar
periférico.
Informação,
Linguagem,
Percepção
Ambiental.
São
Paulo:
Editora
da
Universidade
de
São
Paulo,
1993.