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www.ceramicaindustrial.org.br
http://dx.doi.org/10.4322/cerind.2015.021
Resumo
Em sistemas energéticos, o balanço de entradas, saídas e perdas são fundamentais para dimensionar e propor
ações de eficiente energética, visando racionalizar o consumo energético, independentemente da fonte de
energia. Esta estimativa é importante tanto na fase de projeto das instalações, quanto na exploração ou operação.
Na fase de projeto indica as necessidades energéticas do processo e a contribuição da energia no custo do
produto e a capacidade de armazenamento do combustível. Na fase de operação, foco deste trabalho, permitiu
avaliar a utilização da energia na fabricação de telhas no segmento de cerâmica vermelha, em seu processo de
queima, mostrando os pontos fracos da etapa de queima do forno tipo túnel, os quais devem sofrer intervenção
para melhorar a eficiência energética. O forno túnel em estudo está localizado na Cerâmica Eficind, região de
Salto, SP, é contínuo com vagonetas, consumido gás natural e produzindo telhas de cerâmicas. Os resultados
obtidos com o balanço térmico possibilita a proposição de ações de eficiência energética que podem levar
a otimização da queima com vistas ao uso mais racional da energia, bem como permite comparações entre
fontes de energia substitutas e empresas produtoras.
Palavras-chave: cerâmica vermelha, balanço térmico de forno, eficiência energética.
1. Introdução
O panorama energético a nível mundial e uma maior 10 anos. A maioria dos projetos foi desenvolvida dentro
conscientização da opinião pública relativamente à questão das regras do Programa de Eficiência Energética – PEE,
energética, levou nas últimas décadas a novo olhar para sob regulação da ANEEL. O montante total investido
eficiência energética como fonte de suprimento nos mais neste conjunto de projetos foi de R$161 milhões, gerando
variados setores econômicos. uma economia de 626 GWh, o que apresenta um Custo
O contínuo aumento do preço dos combustíveis, e a da Energia Conservada (CEC) de R$ 79,00 por MWh
consequente elevação dos preços das matérias-primas, (para uma duração média das ações de eficiência de 10
levou a que o setor industrial também se visse forçado a anos e a uma taxa de remuneração do capital de 12%
melhorar o seu desempenho energético. O setor cerâmico ao ano). Considerando o valor de R$ 138,00 por MWh
seguindo esta tendência busca implementar ações que para o custo marginal de expansão do sistema de energia
levem a otimização de custos e simultaneamente garanta elétrica, valor estimado pela EPE, a eficiência energética
a qualidade final do produto. Nos últimos anos por conta é uma alternativa viável. Ou seja, a mesma quantidade de
de políticas públicas direcionadas a construção civil, energia pode ser disponibilizada, a preços mais baixos,
também o segmento de cerâmica vermelha vem buscando sem a necessidade de novas obras e com efeitos positivos
melhorar seu desempenho energético, notadamente no meio ambiente.
devido aos preços crescentes da energia e matéria prima, A Figura 1 apresenta o valor médio da economia
com reflexos relevantes para a mitigação de impactos energética obtida por setor de atividade. Dado o valor do
ambientais. Nesta direção tem-se observado inovações custo marginal de expansão da potência disponibilizada
que propiciam ações de eficiência energética, como é pela rede elétrica em 2010 que era de R$ 138 por MWh.
caso da ainda grande margem de melhorias no que diz Com este patamar o setor industrial cerâmico era um
respeito ao aproveitamento de calor residual da fabricação daqueles com maior potencial para programas de eficiência
de cerâmica vermelha. energética, ressaltando-se que o pay-back seria menor
A experiência recente brasileira em eficiência energética que 5 anos.
na indústria foi mostrada por Bajay et alii1. Para conhecer Os resultados de um balanço térmico fornece um
o que já foi feito no Brasil e identificar prioridades de meio de comparar o uso de energia de uma empresa ou
investimentos foram analisados 217 projetos de eficiência planta ao de outras instalações semelhantes, que produzam
energética industrial em 13 setores, realizados nos últimos produtos semelhantes. Essa abordagem pode ser utilizada
para comparar plantas, processos ou sistemas; também ao aperfeiçoamento da gestão ambiental4. Do ponto de
pode ser aplicada a uma classe de equipamentos, como vista da eficiência energética, deve ser ressaltado que o
aconteceu no âmbito do Diagnóstico Energético da planejamento de oferta de energia considera como uma
Cerâmica Eficind, localizada na Região de Salto, Estado de suas premissas básicas programas de conservação de
de São Paulo, produzindo telhas. energia. É sabido que uma parcela do crescimento do
A cadeia produtiva do segmento industrial de cerâmica mercado pode ser atendida mais rapidamente através
vermelha é relativamente simples, o que significa dizer de ações de eficiência energética do que com a oferta,
que os seus efeitos encadeadores para trás são reduzidos, mesmo que sejam com usinas térmicas. A inovação pode
existindo basicamente a exploração da jazida e o transporte propiciar a penetração de equipamentos mais eficientes,
da matéria prima. Entre os principais insumos utilizados levando a otimização dos processos produtivos em plantas
destacam-se o gás natural (GN) e a lenha. Neste segmento, industriais de cerâmica vermelha.
novos programas de conservação de energia envolvem
sobretudo a inovação tecnológica com seu viés de reduzir 2. Estudo de Caso: Cerâmica Eficind
o consumo de energia, mas também tecnologias mais (CEFI)
eficientes, a incorporação de melhores práticas e novos
arranjos gerenciais. Estes programas visam otimizar o Na CEFI a energia elétrica representa em média cerca
perfil e o mix do consumo de forma a diminuir tanto de 30% do custo de fabricação de telhas. De acordo com a
os gastos com energia, quanto os impactos ambientais Diretoria Industrial este custo de produção tem impactado
associados ao consumo dela e garantir a competitividade, o lucro, sobretudo a partir de janeiro de 2015, quando
cujo principal requisito é a qualidade dos produtos com entrou em vigor o Sistema de Bandeiras de consumo
sustentabilidade2. Neste contexto, a inovação voltada para de energia elétrica. No tocante aos combustíveis para
a sustentabilidade neste segmento industrial, deve ser geração térmica, a CEFI também vem tendo problemas
considerada como programas de conservação de energia devido ao elevado aumento dos custos com a utilização
nos processos produtivos, métodos de gestão ou negócios, de gás natural. Os resultados do balanço térmico do forno
novos ou significativamente melhorados, para a organização túnel a GN auxiliam na comparação da CEFI vis-a-vis
e que traz benefícios econômicos, sociais e ambientais, o uso de cavacos.
comparados com alternativas pertinentes3. Não se trata 2.1. Utilização de energia: onde, quando, porque
apenas de reduzir impactos negativos, mas de adicionar e quanto
benefícios líquidos ao segmento de cerâmica vermelha.
Em um cenário onde o segmento de cerâmica vermelha Inicialmente foi necessário entender onde, quando,
comprometa-se com o desenvolvimento sustentável, passa porque e quanto de energia estava sendo utilizada na CEFI.
necessariamente por mudar sua forma de atuação para, no Essas informações forneceram os pontos de referência
mínimo, reduzir os impactos sociais e ambientais adversos. e indicações para a otimização energética na produção
A mudança nas formas de produzir cerâmica vermelha de telhas. Onde está usando a energia? Os principais
pode ser impulsionada pela melhor compreensão da consumidores de energia elétrica na produção de telha são
magnitude e dos riscos dos impactos ambientais globais. os motores e acionamentos, e os sistemas de iluminação.
A regulamentação ambiental é necessária para promover Quanto aos combustíveis os principais consumidores
os incentivos ao investimento, à inovação tecnológica e são as etapas de secagem (secador) e cozimento (forno
O forno túnel da CEFI possuem três seções: camada de material isolante, embaixo, e refratário, em
preaquecimento, queima e resfriamento (Figura 3). cima, com este sustentando o material processado.
Ar fresco entra na seção de resfriamento realizando o
2.3.1. Evolução do forno túnel da CEFI
arrefecimento dos produtos cozidos e, aquecido, segue
para a câmara de combustão. O ar quente é utilizado para Com o auxílio de Sontag, engenheiro e ceramista por
combustão e ajuda a reduzir o consumo de combustível ou mais 40 anos, pode-se avaliar o consumo de energia térmica
aumentar a temperatura dos gases de combustão. Os gases do forno túnel em uso na CEPI. Este forno sob a orientação
de combustão que deixam a zona de queima são dirigidos do Eng. Sontag8 passou ao longo dos anos por modificações
à zona de preaquecimento ou secagem, aproveitando-se construtivas objetivando melhorar sua eficiência através
o calor residual. de otimização da queima e do aproveitamento de calor
A Figura 4 apresenta um desenho esquemático de como residual. A seguir é descrita algumas das modificações que
são as instalações de gás natural (tubulação, acessórios foram incorporadas até a configuração atual do forno túnel.
para a regulagem de pressão, queimadores e ventiladores) Para a configuração atual faz-se um balanço de energia
junto ao forno túnel da CEFI. No forno CEPI as peças “expedito”, demonstrando a influência do teor de umidade
são transportadas em vagonetas que atravessam o túnel. na entrada do forno e o consumo específico de energia
Durante a travessia, as peças variam de temperatura de térmica do mesmo. O forno túnel cheio de vagonetas
acordo com a curva de queima. À medida que novas deslocam-se em um único sentido. Nesta configuração,
vagonetas carregadas com peças secas e cruas vão sendo mais antiga era bastante difícil o controle da queima como
empurradas para dentro de uma das extremidades do os queimadores localizados em seu centro.
forno, na outra extremidade vão saindo peças cozidas Após algumas horas de queima as vagonetas saiam
sem, portanto, haver necessidade de interromper a queima do forno, a temperaturas extremamente altas para serem
para carga e descarga, trabalhando de forma contínua. descarregadas, pois estas absorvem uma carga térmica
As vagonetas são constituídas de material metálico em e carregariam com elas no sentido da porta de saída;
sua parte inferior, rodas e chassis, que sustentam uma notou-se então a necessidade da chaminé ou extração, a
O calor total para a queima é decomposto conforme mH2O = 0,02 kgH2O/kgmassa e mArgila =
0,98 kgArgila/kgmassa
a Equação (2).
O calor total por QT2% = 205,41 kcal/kg e QT4% =
QT = QH 2O + Qargila − QR (2)
221,32 kcal/kg
Q H2O é o calor consumido pela umidade presente na
O cálculo do consumo de gás natural no forno da CEFI
telha a ser queimada, calculada através da Equação 3. foi realizada a partir do total de massa cerâmica sinterizada
por dia, da ordem 101.250 kg/dia (40.500 pç × 2,5 kg/pç),
cH 2O × (100 – t A ) +
com um consumo de 140 m3/h de gás natural, com produção
Q=
H 2 O mH 2 O × (3)
latente vapor ( Forno )
Q + c × t − 100 em dois turnos de 8 horas (16 h/dia). Para um consumo
diário de gás natural de 2.240 m3/dia, aproximadamente
Substituindo na Equação (3) C H2O = 1, C vapor = 0,48, 21.056.000 kcal/dia (PCS gás natural = 9.400 kcal/m 3, a
tA = 25 °C, tForno = 850 °C, e Q latente = 550 kcal/kg, 20 °C e 1 atm). Utilizando gás natural tem-se um consumo
obtem-se a Equação (4). de energia térmica no forno CEFI de 208 Kcal/kg de produto.
Na hipótese de consumo de cavacos no forno da
Q=
H 2O mH 2O × 985 (4) CEFI utilizou-se a informação ACERVIR9 de que cada
metro cúbico de lenha comercial equivale a 390 kg e o
PCS de 3300 Kcal/kg (BEN, 2012). A partir do consumo
Tabela 1. Produção telhas, consumo de GN, umidade e médio de cavacos médio de 22 m3 durante os testes e
temperatura de telhas. da relação de 1.287.000 Kcal/m3 de cavaco, tem-se um
Produção diária (pçs) 40.500 consumo total de 28, 3 milhões de Kcal para queima de
TemPeratura entrada do forno (°C) 35 101.250 Kg de telhas. Utilizando cavacos obteve-se nos
Temperatura saída do forno (°C) 70 testes iniciais um consumo de energia térmica no forno
CEFI da ordem de 279 Kcal/kg de produto, 34% mais
Umidade entrada do forno (%) 2
comparativamente ao gás natural.
Umidade saída do forno (%) 0
Em termos energéticos, a opção cavacos poderá ser
Temperatura da exaustão do forno (°C) 90 viável. Necessita-se de mais testes e novos comissionamentos
Consumo de GN (m3/h) 140 do forno CEFI. Deve ser destacado a perda de qualidade
3. Considerações Finais
A Cerâmica Eficind tem buscado a atualização
tecnológica de seu processo produtivo. Esta atualização
ocorre com testes visando à alteração do principal
combustível utilizado no seu forno túnel. É uma
mudança que envolve toda a estrutura da empresa, tanto
administrativa quanto produtiva. A principal razão esta
atrelada a elevação dos custos de gás natural. Alternativa
em teste é a utilização de cavacos de madeira, e daí a
otimização energética do forno de túnel tem sido analisada
para ambos os combustíveis: gás natural e cavacos.
A Figura 9 mostra a esteira transportadora de cavacos
passando por cima do forno indo aos seus queimadores
laterais. No entanto, para um bom funcionamento do
conjunto, isto é, com eficiência e economia, deve-se
compreender que o forno trabalha continuamente e que
Figura 9. Esteira com cavacos no forno tunel.
a planta produtiva, incluindo um secador, deve prever
esta operação contínua, havendo a necessidade de
implantação de ferramentas de planejamento e controle
final das telhas. Dificuldades no controle de processo com da produção, concomitantemente.
a nova fonte de energia. Observa-se o agravante de que Este estudo de caso teve por objetivo auxiliar a empresa
argila queimada com trincas não pode ser reaproveitada na ampliação do entendimento do funcionamento de forno
no processo produtivo. Atualmente seu uso ocorre em túnel, que ocorre de forma empírica podendo-se levar a
melhorias de estradas vicinais rurais. resultados negativos com perdas no processo produtivo
Neste contexto, dois aspectos requerem atenção. e de capital investido na mudança de combustível e a
otimização do processo de queima.
O primeiro, relacionado com a necessidade da continuidade
dos testes com cavacos e uma nova validação do balanço
Referências
térmico. O segundo é imprescindível com as “saídas” de
novos testes realizar também uma avaliação econômica 1. BAJAY, S. V., et al. Oportunidades de eficiência energética
criteriosa, considerando perdas e a necessidade de para a indústria: relatórios setoriais - vários. Brasília:
investimentos em controle de processo, comparações de CNI, 2010.
preços de mercado e perspectivas de evolução de oferta 2. BERNI, M. D., BAJAY, S. V., GORLA, F. D. Oportunidades
da lenha e gás natural. Os preços praticados no mercado de eficiência energética para a indústria: relatório setorial
- setor cerâmico. Brasília: CNI, 2010. 75 p.
para a lenha comercial na região de Salto é da ordem de
R$ 116,00/m3, enquanto o gás natural no Estado de São 3. FARIAS, A. S. et al. Utilização de eco-inovação no processo
de manufatura de cerâmica vermelha. RAI – Revista de
Paulo possui um preço médio de US$ 17,80/MMBTU.
Administração e Inovação, v. 9, n. 3, p. 154-174, 2012.
De posse destes dados de campo iniciais será DOI: 10.5773/rai.v9i3.533.
realizado balanço de energia para as três fases da queima,
4. GRICOLETTI, G. C., SATTLER, M. A. Estratégias ambientais
considerando as respectivas temperaturas da curva de para indústrias de cerâmica vermelha do Rio Grande do
queima, chegando‑se ao balanço global de energia no Sul. Revista ANTEC Ambiente Construído, v. 3, n. 3, p.
fomo, considerando um volume de controle que envolva o 19-32, 2003.
mesmo. Com este balanço será possível saber efetivamente 5. TANGRAM. Energy efficiency in ceramics processing.
onde a energia fornecida, quase que totalmente, pela Hitchin: Tangram Technology Ltd, 2015. Disponível em:
combustão, está sendo consumida, ou seja, quanto desta <www.tangram.co.uk>. Acesso em: 21 abr. 2015.