TESTE DISCURSIVO
Nome: ______________________________________________________________________________
Impasse
“Gregory Arnfeld não estava propriamente moribundo, mas não lhe restava
muito tempo de vida. Tinha um câncer inoperável e havia recusado com firmeza
todas as sugestões para que tentasse um tratamento de radiação ou
quimioterapia.
Sorriu para a mulher, sem levantar a cabeça do travesseiro, e disse:
- Sou o caso perfeito, Tertia. Mike cuidará de mim. Tertia não sorriu. Parecia
terrivelmente preocupada.
- Existem tantas coisas que podem ser feitas, Gregory. Mike deve ser
considerado como o último recurso. Talvez não haja necessidade de usá-lo.
- Não, não, quando acabarem de me afogar com produtos químicos e de
me encharcar de radiação, estarei tão doente que não será um teste justo.
- Estamos no século XXII, Greg. Existem tantos tratamentos para o câncer.
- Verdade, mas Mike é um deles, e o melhor, na minha opinião. Estamos no
século XXII e sabemos do que os robôs são capazes. Eu, pelo menos, sei muito
bem. Sou a pessoa mais chegada a Mike. Você sabe disso.
- Sei, mas não deve usá-lo apenas por orgulho. Além disso, como pode ter
tanta confiança na miniaturização? É uma ciência ainda mais nova que a
robótica.
Arnfeld assentiu.
De acordo, Tertia, mas os rapazes da miniaturização me parecem
extremamente confiantes. Podem diminuir o tamanho do corpo ou fazê-lo voltar
ao normal de forma quase rotineira e os controles que tornam isso possível foram
implantados no corpo de Mike. Ele pode aumentar ou diminuir de tamanho à
vontade, sem afetar as coisas que o cercam.
- De forma quase rotineira - repetiu Tertia, com ironia.
- Isso é tudo o que podemos pedir, na verdade. Pense nisso, Tertia. Tenho
sorte de ser parte da experiência. Vou passar para a história como o principal
responsável pelo projeto de Mike, mas isso será secundário. Meu maior feito será
o de ter sido tratado com sucesso por um mini-robô, e por minha livre e
espontânea vontade.
- Sabe que é perigoso.
- Tudo na vida é perigoso. Os remédios e a radiação têm graves efeitos
colaterais. Podem retardar a progressão da doença, sem curá-la. Ficarei reduzido
a uma existência limitada, quase vegetativa. E se não fizer nada, certamente
morrerei em pouco tempo. Por outro lado, se Mike cumprir a sua missão, minha
saúde voltará ao normal, e se houver uma recaída, bastará recorrer novamente a
ele.
Estendeu a mão para segurar a da esposa.
- Tertia, sabíamos que o momento estava próximo, eu e você. Vamos tirar
proveito desta oportunidade, será uma experiência gloriosa.
Neste momento, Louis Secundo, do grupo de miniaturização, disse:
TEXTO II
“Aprendi como a morte destrói minuciosamente o que havia sido, até há
pouco, um rosto rosado e sadio. Observei como estruturas maravilhosas, que
tornam o homem uma criação insuperável, degradavam-se e transformavam-se
em carniça para seres minúsculos, indignos daquela complexidade.
Dediquei-me a observar como a vida se transformava em morte e a morte
em vida — até que, no meio daquelas trevas, uma luz subitamente se impôs aos
meus olhos. Uma luz tão esplendorosa e, ao mesmo tempo, tão simples que me
deixou tonto com a imensidão de suas possibilidades. Era assustador — porque,
entre tantos gênios que haviam se dedicado àquelas pesquisas, a mim somente
parecia destinada a descoberta de um segredo tão impressionante. [...]
Preparei-me para uma infinidade de derrotas. Seriam milhares de cirurgias a
executar. Muitas delas iriam resultar frustradas e, no final, talvez meu trabalho
saísse imperfeito. No entanto, quando pensava nos progressos diários feitos pela
ciência, eu me lembrava das palavras de herr Waldman: minha tentativa no
mínimo prepararia o terreno para que, no futuro, alguém fosse bem-sucedido. Foi
com esses sentimentos que me decidi pela criação de um ser humano.”
(SHELLEY, Mary. Frankenstein; Adaptação de Ruy Castro; São Paulo, Companhia das Letras, 1994.)