Victor Guimarães
Mestrando pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG - Brasil).
Email: zictorzictor@gmail.com
Durante dois anos, a equipe visitou a residência do casal em Belo Horizonte. Nas
conversas à mesa do café, emergiam as memórias da juventude em Portugal, da
constituição de uma vida familiar em Angola e da velhice no Brasil.
Os planos na sala de seu Acácio e dona Conceição são exemplos de um
dos movimentos que o filme faz para dar conta da memória. Sempre enquadrados
juntos, os dois contam suas histórias para a equipe, fora de campo. Muitas vezes
falando ao mesmo tempo, numa elaboração conjunta das lembranças, um acaba
por preencher as lacunas da memória do outro.
Como disse Bazin, o cinema não se contenta em conservar o objeto no
instante –tarefa da fotografia. Com o cinema, ―pela primeira vez, a imagem das
coisas é também a imagem da duração delas, como que uma múmia da mutação‖
(BAZIN, 2003: 126). Nos planos longos à mesa do café ou no sofá, assistindo às
imagens antigas, o que o documentário apanha é o próprio esforço de elaboração
de uma memória. Ainda que essa tentativa acabe por se frustrar – como no
momento em que seu Acácio ensaia uma história, mas logo se esquece do que iria
dizer –, o que a duração do plano inscreve é o tempo mesmo da fabricação dessa
memória – e também a saudade que irrompe no rosto dos dois, quando eles
assistem aos registros do jogo de canastra na casa de Luanda.
Essa elaboração, muitas vezes, é inscrita apenas na banda sonora do
filme, e sobreposta às imagens que seu Acácio produziu em Angola, tanto entre os
povos Tucokwe quanto no próprio cotidiano de sua família. Nesse outro
movimento, o documentário figura espaços e tempos longínquos, articulados às
lembranças verbalizadas pelo casal. Mesmo que seu Acácio considere as imagens
domésticas como de menor valor, o gesto autoral da diretora é o de incluir
também esses registros, que documentam a vida dos colonos portugueses na
África.
Em certo momento, o filme decide fazer o caminho inverso da biografia
do casal: do Brasil, a equipe parte para Angola, e depois seguirá para Portugal.
Enquanto as imagens articulam os antigos registros e as filmagens atuais em terra
africana, Acácio Videira revisita suas lembranças mais valiosas: aquelas do tempo
que passou junto dos Tucokwe, documentando a vida cotidiana e os rituais dos
- 225 -
Victor Guimarães
Referências bibliográficas
- 226 -