Você está na página 1de 14

INTEIRO TEOR DA DELIBERAÇÃO

19ª SESSÃO ORDINÁRIA DO TRIBUNAL PLENO REALIZADA EM 28/05/2014


PROCESSO TC Nº 1400791-5
INTERESSADO: JOSÉ DE MACEDO COELHO, PRESIDENTE DA CÂMARA
MUNICIPAL DE DORMENTES (CONSULTA)
RELATOR: CONSELHEIRO DIRCEU RODOLFO DE MELO JÚNIOR
PRESIDENTE: CONSELHEIRO VALDECIR PASCOAL

RELATÓRIO

Trata-se de consulta formulada pelo Presidente da


Câmara Municipal de Dormentes, Sr. José de Macedo Coelho, nos
seguintes termos:

a – Um município “X” pode modificar a carga horária do


professor, para que seja atendida temporariamente a
necessidade da rede pública de ensino?
b - Caso seja possível, considerando ser uma necessidade
temporária, pode ser efetivada essa alteração mediante
decreto ou uma simples ampliação da carga horária?
c – A escolha de professor a ser beneficiado com a jornada
modificada, deve ser precedida de alguma forma de seleção
simplificada?
d – A manutenção dessa jornada modificada e ampliada por
longo período configura burla à necessidade de realização de
concurso público?

Os autos foram submetidos à Coordenação de Controle


Externo deste Tribunal, que emitiu o Parecer PETCE nº.
25899/2013, contendo o seguinte opinativo:

PETCE Nº 25.899/2013
TIPO: CONSULTA
ORIGEM: CÂMARA MUNICIPAL DE DORMENTES
INTERESSADO: JOSÉ DE MACEDO COELHO
RELATOR: CONS. MARCOS LORETO

Ementa: DIREITO ADMINISTRATIVO. ALTERAÇÃO CARGA HORÁRIA


PROFESSOR. POSSIBILIDADE. CRITÉRIOS DE CONVENIÊNCIA E

1
OPORTUNIDADE MOTIVADOS. AUTONOMIA MUNICIPAL.
INEXISTÊNCIA DE DIREITO ADQUIRIDO A REGIME JURÍDICO.
GARANTIA DE IRREDUTIBILIDADE DE VENCIMENTOS. NECESSÁRIA
PREVISÃO EM LEGISLAÇÃO LOCAL.

1 - INTRODUÇÃO

O presente relatório analisa a consulta formulada pelo Presidente da Câmara Municipal


de Dormentes, Sr. José de Macedo Coelho, protocolada neste Tribunal em 08/04/2013, com
fundamento no art. 2º, XIV, da Lei Orgânica do TCE-PE (Lei Estadual nº 12.600/2004) e na
forma estabelecida no Regimento Interno do TCE-PE (Resolução TC nº 015/2010), cumprindo
despacho do Chefe do Núcleo de Atos de Pessoal.
O consulente formula quatro questões, nos seguintes termos:

“A – Um município “X” pode modificar a carga horária do professor, para que seja
atendida temporariamente a necessidade da rede pública de ensino?
B - Caso seja possível, considerando ser uma necessidade temporária, pode ser efetivada
essa alteração mediante decreto ou uma simples ampliação da carga horária?
C – A escolha de professor a ser beneficiado com a jornada modificada, deve ser
precedida de alguma forma de seleção simplificada?
D – A manutenção dessa jornada modificada e ampliada por longo período configura
burla a necessidade de realização de concurso público?”.

2 - PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE

Preliminarmente, cumpre analisar os pressupostos de admissibilidade que se encontram


esculpidos na Resolução TC n.º 15/2010(Regimento Interno do TCE-PE).
A parte é competente para formular a consulta, a teor do art.198, X da Resolução TCE
nº15/2010 e, da forma como apresentada, atende a todos os requisitos de admissibilidade
previstos no art.199 da mesma Resolução, por conter indicação precisa de seu objeto, ser
formulada articuladamente e em tese e por não carecer de parecer jurídico, haja vista município
ter população menor que 50.000 habitantes (conforme Censo 2010 do IBGE, disponível em
www.ibge.gov.br/cidadesat).

3 – ANÁLISE

As questões trazidas a lume pelo consulente têm como finalidade primeira


perscrutar sobre a competência e os limites do ente municipal para proceder a alteração de carga
horária de servidores ocupantes de cargo de professor.
No entanto, o conjunto de questões formuladas apresenta temas reflexos que
indagam: a) se escolha dos docentes para ministrar aulas, considerando a modificação da carga

2
horária exige a realização de processo simplificado de seleção; b) se a manutenção da jornada
modificada por “longo período” configura burla ao concurso público.
Prima facie não seria desprovida de sentido a interpretação de que o que o
consulente tem em mente é indagar sobre alteração que provoque aumento de carga de horária
de professores municipais, vez que indaga acerca de forma de provimento de cargos de
professor para cumprir a jornada modificada e se a manutenção dessa jornada por longo período
não configuraria burla a princípio do concurso público.
Esta análise cinge-se na abordagem dos limites de competência do município em
proceder à alteração de jornada de trabalho de professores, tomando por referência os
dispositivos constitucionais, da Lei federal 9394/96 e a necessidade de regramento por norma
local do regime de trabalho da carga horária de professores municipais, fazendo menção a
precedentes Jurisprudenciais quando cabível.

Da competência do município para legislar sobre organização do seu sistema de ensino

A Constituição Federal no capítulo destinado à Educação, Cultura e Desporto,


estabelece dentre os princípios que norteiam o dever estatal de disponibilizar educação aos
cidadãos a necessidade de valorização dos profissionais da educação escolar pública,
garantindo, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso
público de provas e títulos (inciso V do art.206).
Dispõe a Carta Magna que a Educação será promovida e incentivada com a
colaboração da sociedade (art.205,caput) e fixa as competências e atuação dos entes da
federação que organizarão em regime de colaboração os seus sistema de ensino, in verbis
Art. 211. A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios organizarão em regime
de colaboração seus sistemas de ensino.

§ 1º A União organizará o sistema federal de ensino e o dos Territórios, financiará as


instituições de ensino públicas federais e exercerá, em matéria educacional, função
redistributiva e supletiva, de forma a garantir equalização de oportunidades educacionais e
padrão mínimo de qualidade do ensino mediante assistência técnica e financeira aos
Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;

§ 2º Os Municípios atuarão prioritariamente no ensino fundamental e na educação infantil.

§ 3º Os Estados e o Distrito Federal atuarão prioritariamente no ensino fundamental e


médio.

§ 4º Na organização de seus sistemas de ensino, a União, os Estados, o Distrito Federal e


os Municípios definirão formas de colaboração, de modo a assegurar a universalização do
ensino obrigatório.

§ 5º A educação básica pública atenderá prioritariamente ao ensino regular.

3
À evidência que, a teor do §2º do art.211, cabe aos municípios atuarem prioritariamente
no ensino fundamental e na educação infantil. Referido dispositivo autoriza, pois, que os
municípios, para fins de cumprimento de seu desígnio constitucional e no exercício de sua
autonomia, editem legislação com vistas a organizar o sistema de ensino fundamental e infantil.
Poder-se-ia objetar que ao município não cabe legislar sobre educação, pois a
Constituição ao prescrever no art. 22, inciso XXIV, que compete privativamente à União
legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional; que compete à União, aos estados e ao
Distrito Federal legislar concorrentemente sobre educação, cultura, ensino e desporto (art. 24,
inciso IX); e que é competência comum da União, dos estados, do Distrito Federal e dos
municípios proporcionar os meios de acesso à cultura, à educação e à ciência (art. 23, inciso V),
não estendeu aos municípios a competência para legislar em matéria de educação.
Esta linha interpretativa conduziria à perspectiva de que não tendo autonomia para baixar
normas próprias sobre educação ou ensino, os municípios estariam constitucionalmente
impedidos de instituir sistemas próprios, isto é, municipais, de educação ou de ensino.
Não obstante, o texto constitucional deixa margem, no art. 211, para que se possa falar
em sistemas de ensino dos municípios quando estabelece que “a União, os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios organizarão, em regime de colaboração, os seus sistemas de ensino”.
No mesmo diapasão, cabe aos municípios manter escolas, em especial de Educação Infantil e de
Ensino Fundamental, conforme está prescrito expressamente no inciso VI do artigo 30 da
Constituição Federal de 1988: “compete aos Municípios: VI – manter, com a cooperação técnica
e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-escolar e de ensino
fundamental”.
Do exposto seria conclusiva e correta a tese de que a ausência de dispositivo
constitucional atribuindo aos municípios a competência para legislar sobre educação
impossibilitaria aos municípios a edição de normas de organização da educação fundamental e
infantil num sistema próprio de educação?
A resposta a esta indagação não pode ser positiva, posto que a constituição atribui aos
municípios o dever de organizar, em regime de colaboração com os demais entes e adstrito a sua
área de atuação prioritária por desígnio constitucional, seu sistema de ensino (caput art.211).
No âmbito da Educação, a competência legislativa suplementar do município em editar
regras de organização de seu sistema de ensino é inequívoca e norma federal de caráter geral, a
Lei Federal 9394/96 conhecida como “Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional”,
insculpe regra que traduz o espírito da constituição, como sói ocorrer no inciso II do art.11 do
diploma legal em comento, in verbis:

Art. 11. Os Municípios incumbir-se-ão de:

(...) omissis
III - baixar normas complementares para o seu sistema de ensino;

4
Aqui cabe uma inflexão num texto do educador DEMERVAL SAVIANI 1 que, a despeito
de não ser obra de cunho jurídico, contorna adequadamente os termos da questão sobre a
competência dos municípios na organização de seus sistemas de educação.

O texto da nova LDB, entretanto, procurou contornar a dificuldade apontada, ultrapassando a


ambigüidade do texto constitucional e estabelecendo com clareza a existência dos sistemas
municipais de ensino. Para tanto, além do artigo 211 (“A União, os Estados e os Municípios
organizarão em regime de colaboração os seus sistemas de ensino”), a LDB terá certamente
buscado respaldo nos incisos I e II do artigo 30 da Constituição Federal que afirmam,
respectivamente, a competência dos municípios para “legislar sobre assuntos de interesse local” e
“suplementar a legislação federal e a estadual no que couber”. Assim, o inciso III do artigo 11 da
LDB estipula que cabe aos municípios “baixar normas complementares para o seu sistema de
ensino”. Isto posto, ainda que do ponto de vista da hermenêutica constitucional se possa
argüir contra a constitucionalidade do disposto na LDB – já que, se os constituintes
quisessem, de fato, estender essa competência aos municípios o teriam feito expressamente
como o fizeram em relação aos estados e ao Distrito Federal –, já não pairam dúvidas, à luz
do texto da LDB, quanto à competência legal dos municípios para instituir os respectivos
sistemas de ensino. A questão que se põe, agora, diz respeito às condições para a sua efetivação. E
aqui a LDB revela uma certa cautela ao prescrever, no parágrafo único do artigo 11, que “os
municípios poderão optar, ainda, por se integrar ao sistema estadual de ensino ou compor com ele
um sistema único de educação básica”. Cumpre observar, então, que a definição clara da
competência dos municípios para instituir os próprios sistemas de ensino flui da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional (LDB) e não da Constituição Federal. Portanto, não parece procedente
a posição daqueles que entendem que a LDB, ao tornar opcional a organização dos sistemas
municipais de ensino, teria enfraquecido a norma constitucional já que esta não diz que os
municípios poderão organizar seus sistemas de ensino mas afirma que deverão fazê-lo (Romão
1997, pp. 21-22). Em verdade, a LDB, ainda que lhe dê caráter opcional, estabelece claramente a
competência dos municípios para organizar os próprios sistemas de ensino. Aliás, o próprio fato de
deixar a eles a opção indica o reconhecimento explícito de sua competência nessa matéria. Com
certeza a LDB introduziu a possibilidade de opção à luz de duas evidências, uma no plano formal e
outra no plano real.
Do ponto de vista formal, levou em conta a ambigüidade da Constituição, como já se mostrou. Do
ponto de vista real, considerou as dificuldades técnicas e financeiras que muitos municípios teriam
para organizar a curto ou mesmo a médio prazo os seus sistemas de ensino. É de notar que o
reconhecimento dessa limitação está expresso também no texto constitucional quando, ao
estabelecer no inciso VI do artigo 30 a competência inequívoca dos municípios de manter
programas de Educação Pré-escolar e de Ensino Fundamental, acrescenta que isso será feito com a
cooperação técnica e financeira da União e do estado. (grifos por ora)

Quando se está a falar de carga horária de professores municipais e seu regramento é


cediço compreender que a questão não se insere no debate sobre o cabimento ou não do
município legislar sobre educação.

1
SAVIANI, DEMERVAL – Sistema de ensino e plano de educação: o âmbito dos municípios in
Revista Educação e Sociedade, ano XX, No 69, dezembro/99, pp.119 a 136

5
É certo que a Constituição fixou de forma expressa os limites de competência legislativa
de cada um dos entes federativos nessa matéria, sem olvidar, no entanto, de atribuir ao
município a competência para organizar seus sistemas de ensino, incluindo a edição de normas
complementares para tal mister. Aspecto que veio ganhar concretude com a edição da Lei
Federal 9394/96.
Assim, a organização do sistema de ensino municipal incluindo as formas de provimento,
acesso, carreira, jornada de trabalho, direitos e deveres dos profissionais do magistério insere-se
na competência legislativa complementar dos municípios, desde que obedecidos os ditames
constitucionais e as regras gerais estabelecidas na Lei de Diretrizes de Bases da Educação (Lei
Federal 9394/96).
Conclusão que só reitera o princípio de autonomia dos entes federados, no exercício da
finalidade de fazer cumprir os desígnios que lhe são incumbidos pela Constituição Federal.
O próprio consulente reconhece essa competência quando faz menção aos arts.24, I e
art.25, caput, ambos da Lei Federal 9394/96, como normas gerais definidoras da carga horária
mínima do pessoal do magistério. E, corretamente, arremata que cabe à Lei local definir carga
horária dos servidores.
Por outro lado, assevera que quando da seleção de servidores por concurso público deve a
jornada de trabalho vir explicitada “com a finalidade de que os pretensos candidatos saibam se
podem ou não executar devidas funções”.
Superados, pois, os aspectos atinentes à competência do município em editar normas
reguladoras de seu sistema de ensino, resta adentrar na peculiaridade da consulta formulada.
Para tanto, é importante colacionar julgados sobre alteração de carga horária no magistério e os
limites legais, a fim de que se possa emitir sugestão de resposta às indagações do consulente.

Da fixação de carga horária de professores, possibilidade de alteração e os requisitos


legais para mudança.

Reconhecida a competência do município em legislar de forma complementar em matéria


de educação, mormente com vistas à organização seu sistema de ensino, parece indubitável que
a regulação do sistema de jornada de trabalho de professores se insere dentre os aspectos
organizacionais da educação municipal.
Impõe-se, no entanto, que essa carga horária na educação básica fundamental atenda às
regras gerais insculpidas na Lei Federal 9394/96, particularmente o que dispõe o inciso I do
art.24, de modo a que o ano letivo municipal atenda carga horária mínima anual.
A carga horária mínima da lei federal é regra geral imposta a todos os entes da federação,
dentro dos limites de sua atuação prioritária, para fazer cumprir a diretrizes básicas da educação
nacional. De modo que essa exigência tem relação, apenas indireta, com a carga horária do
corpo funcional necessário para executar as atividades docentes âmbito da administração
municipal.
O município deve cumprir na educação básica a carga horária mínima anual definida na
regra geral, entretanto, em respeito ao princípio da autonomia municipal, tem o dever de regular
por legislação local a carga horária dos titulares de cargo público no seu sistema de ensino,
incluindo os docentes.

6
Sendo a lei local o instrumento por excelência de definição da carga horária dos docentes,
é nela mesma que serão traçados os requisitos gerais para provimento, atributos, carreira,
direitos e deveres dos profissionais de educação municipal. A lei estruturadora do plano de
carreira e vencimentos dos docentes constitui-se na norma vinculadora do funcionamento do
sistema de ensino municipal.
Ressalte-se, mais uma vez, que a despeito de a norma local ser reguladora dos requisitos
de provimento dos cargos públicos do sistema de educação municipal, não há que se olvidar de
que a forma de ingresso em cargos públicos deve se dá unicamente por meio de concurso
público, incluindo a modalidade do processo simplificado se atendidos os ditames legais, a teor
dos incisos II e IX do art.37 da Constituição Federal.
É a lei local estruturadora do plano de cargos e carreira dos profissionais do magistério e
que regula a carga horária dos docentes e o regime de cumprimento dessa jornada. Esta regra
irradia para o sistema normativo municipal a forma de cumprimento do regime de jornada de
trabalho (atividades em sala de aula, atividades extra-classe) e impõe limites de jornada para
cada grupo ocupacional regulado.
Inescapável a conclusão de que qualquer alteração no regime de cumprimento da carga
horária de professores deve está alinhada com os dispositivos das leis reguladoras da jornada de
trabalho no sistema de educação municipal, além da necessidade de respeitar os princípios do
direito adquirido e da irredutibilidade de vencimentos.
Acresça-se que ato de alteração de carga horária de docentes, pelos reflexos
orçamentário-financeiro e implicações no sistema de educação dos municípios, quiçá na vida de
professores e alunos, deve ser fundado em relevantes razões de conveniência e oportunidade.
A jurisprudência é no sentido de que o município devidamente motivado pode alterar
regime de carga horária de seus docentes, desde que haja previsão legal do regime modificado
de carga horária e que seja garantido o direito adquirido dos ocupantes dos cargos de professor
em não ter reduzida a remuneração correspondente (princípio da irredutibilidade dos
vencimentos).
Por outro lado, a alteração de regime de carga horária, por si só, não agride o direito
adquirido dos professores municipais desde que preservados os direitos previstos em Lei, haja
vista que no âmbito administrativo não há direito adquirido de servidores a regime jurídico.
Veja-se nesse sentido, Decisão em Agravo de Instrumento, da Sétima Câmara Cível do
Tribunal de Justiça de Pernambuco, a qual contorna com precisão o entendimento sobre a
matéria.

7
8
Também no âmbito do Supremo Tribunal Federal há entendimento no sentido de admitir
a possibilidade de alteração do regime de carga horária, desde que obedecidos aos critérios
definidos em lei municipal e garantida a carga horária contratada, assim como motivação de ato
administrativo alterador da carga horária, como se verifica na Decisão adiante colacionada

DIREITO ADMINISTRATIVO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO.


SERVIDOR PÚBLICO. MAGISTÉRIO MUNICIPAL. ALTERAÇÃO DA JORNADA
DE TRABALHO. MANUTENÇÃO DA CARGA HORÁRIA CONTRATADA.
POSSIBILIDADE. ADEQUAÇÃO ÀS NECESSIDADES DAS ESCOLAS PÚBLICAS
EM RAZÃO DO ESCASSO NÚMERO DE PROFESSORES. DISCRICIONARIEDADE
DO ATO. CRITÉRIOS DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE MOTIVADOS.
FUNDAMENTO AUTÔNOMO INATACADO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA STF 283.
ALEGAÇÃO DE DESVALORIZAÇÃO DOS PROFISSIONAIS DA EDUCAÇÃO,

9
ARBÍTRIO NA GESTÃO DO ENSINO PÚBLICO E QUEDA NA QUALIFICAÇÃO
PROFISSIONAL. DISSONÂNCIA ENTRE AS RAZÕES RECURSAIS E O REAL
CONTEÚDO DA IMPUGNADA. SÚMULA STF 284. AGRAVO CONHECIDO E
NEGADO PROVIMENTO.

(ARE 729167 RS, Min. LUIZ FUX, 20/05/2013, DJe-098 DIVULG 23/05/2013
PUBLIC 24/05/2013)
Isto posto, verifica-se que os seguintes aspectos norteiam as respostas às indagações
formuladas pelo consulente: a)a regulação de jornada de trabalho dos professores municipais
encontra-se no âmbito da competência do município para organizar seu sistema de ensino; b) o
regime de carga horária de professores municipais pode ser alterado motivadamente pela
Administração, desde que preservado o direito adquirido dos titulares quanto a irredutibilidade
de seus vencimentos.
Em síntese, alteração que vise redução ou aumento de carga horária de professores
municipais deve se enquadrar ao que prevê a Lei local que rege a matéria, sendo precedida de
ato administrativo motivado em relevantes razões de conveniência e oportunidade.

Das respostas ao que se consulta

Conforme o que restou consignado acima, impõem-se as seguintes respostas às questões


A e B (A – Um município “X” pode modificar a carga horária do professor, para que seja
atendida temporariamente a necessidade da rede pública de ensino? B - Caso seja possível
considerando ser uma necessidade temporária, pode ser efetivada essa alteração mediante
decreto ou uma simples ampliação da carga horária?) formuladas pelo consulente:

A) É possível ao município, no exercício de sua competência própria, alterar a carga


horária de professor quando a carga horária alterada encontrar previsão nas regras legais
vigentes no município;

B) A alteração de carga horária, nos termos do previsto em lei municipal, pode ser
procedida por meio de ato administrativo motivado em relevantes razões de conveniência e
oportunidade.
Quanto às questões de número C e D (C – A escolha de professor a ser beneficiado com a
jornada modificada, deve ser precedida de alguma forma de seleção simplificada? D – A
manutenção dessa jornada modificada e ampliada por longo período configura burla a
necessidade de realização de concurso público?), devem ser respondidas de plano à luz dos
preceitos constitucionais, posto exigirem posicionamento quanto a forma de provimento de
cargos e empregos públicos e a exigência de realização prévia de concurso.
Em sendo assim, não vislumbramos maior obstáculo na tese indagada na questão 3 “A
escolha de professor a ser beneficiado com a jornada modificada, deve ser precedida de alguma
forma de seleção simplificada?” e na sua resposta que deve ser norteada sob os auspícios da
assunção ao princípio constitucional do concurso público como o meio idôneo de investidura
em cargo ou emprego público, incluindo o exercício do magistério (inciso II do art.37), hipótese

10
que só encontra ressalva no instituto da contratação temporária por excepcional interesse
público (inciso IX do art.37), também de sede constitucional.
Por outro lado, a Lei local define carreira, progressão e jornada de cada cargo de docente.
E, em sendo assim, a legislação local é vinculante no que respeita a jornada de trabalho de cada
cargo ocupado. Desse modo, qualquer modificação de carga horária de docentes municipais
deve obedecer aos atributos e jornada fixados em Lei, de modo a não provocar a redutibilidade
de vencimentos do servidor.
Desse modo, sugere-se que a resposta para a questão C seja nos seguintes termos:
C) A ocupação de cargo, emprego e/ou função públicos deve ser precedida do
competente concurso, seja na forma regular ou na forma simplificada, nos termos do que
dispõem os incisos II e IX do art.37 da Constituição Federal, e a fixação de carga horária de
servidores deve ser vinculada aos estritos termos do que dispõe a Lei local para cada vínculo
ocupado, sendo vedada qualquer modificação que infrinja o princípio constitucional de
irredutibilidade de vencimentos.

Quanto a questão D, na forma como redigida, seria necessário um tour de force


analítico que permitisse dar uma resposta para uma questão que, travestida de generalidade,
contém nos seus termos uma locução (“longo período”) que não permite uma resposta, em tese,
sobre a definição do que seria ampliação de jornada de por longo período.
Assim ocorre porque é a situação fática e concreta de cada município, num dado
período de tempo, que permitiria identificar se atos administrativos mantenedores de jornadas
de trabalho de professores ampliadas perduram por tempo além do tolerável, de modo a tipificar
a burla ao concurso público.
Difícil aquilatar, em tese, o preciso conceito de “manutenção de jornada
modificada e ampliada por longo período” como condicionante do ato de “burla ao concurso
público”. Travestida de indagação, a quarta questão constitui-se, na verdade, numa afirmação.
É o argumento falacioso que remete o receptor da questão a assumir postura de
permanente justificativa ou manutenção na defensiva. O ato antecedente (manter jornada
modificada ampliada por longo período) é causa inevitável do consequente (burla ao concurso
público). Uma típica indagação do emissor que contém em si a afirmação (manter jornada
modificada ampliada por longo período represente burla ao concurso público).
A resposta a tal indagação requereria a análise de cada caso concreto, de modo a
firmar entendimento preciso sobre se a manutenção da jornada modificada e ampliada estaria a
configurar fuga ao princípio do concurso público.
A despeito disso, há que se responder a questão no sentido de que em regra a
jornada de trabalho dos professores municipais obedece ao que estipula a legislação local. De
modo excepcional e por tempo determinado, por meio de ato administrativo motivado em
relevantes razões de conveniência e oportunidade, o município pode proceder a alteração da
jornada de trabalho de seus professores respeitado o princípio da irredutibilidade de
vencimentos.

Identificar a duração do lapso temporal, em questões dessa natureza, implicaria adentrar


em aspectos que envolvem discricionariedade da Administração Pública municipal na
organização de seu sistema de ensino, o que, se respondido em tese por este Tribunal,

11
representaria uma espécie de exercício arbitrário de suas próprias razões, vez que escapa à sua
competência adentrar no âmbito das escolhas administrativas tomadas pelos administradores no
exercício da gestão pública.

4 - CONCLUSÃO

De todo o exposto, opina esta NTE pelo conhecimento da presente consulta e por ser
respondida cada questão como segue:

A) É possível ao município alterar, de forma definitiva ou temporária, a carga horária


de seus professores desde que obedecidos os limites de jornada previstos na norma local. Tal
norma deve prever critérios e condições para implementar a alteração de jornada, respeitados os
princípios da isonomia e da impessoalidade;

B) A alteração temporária de carga horária deve ser procedida por meio de ato
normativo previsto na Lei ou na regulamentação que rege a matéria no âmbito local, sendo
sempre um ato administrativo motivado em relevantes razões de conveniência e oportunidade;
C) A ocupação de cargo, emprego e/ou função públicos deve ser precedida do
competente concurso, seja na forma regular ou na forma simplificada, nos termos do que
dispõem os incisos II e IX do art. 37 da Constituição Federal. A fixação definitiva ou temporária
de carga horária de professor, assim como eventual alteração, devem obedecer aos limites de
jornada e aos critérios e condições para sua alteração conforme estipulados em lei local, sendo
vedada qualquer modificação que infrinja o princípio constitucional de irredutibilidade de
vencimentos;

D) A jornada de trabalho dos professores municipais obedece ao que estipula a


legislação local. Em tese, de modo excepcional e por tempo determinado, por meio de ato
administrativo motivado em relevantes razões de conveniência e oportunidade, o município
pode proceder a alteração da jornada de trabalho de seus professores respeitado o princípio da
irredutibilidade de vencimentos.”

É a análise
Recife, 05 de agosto de 2013.

É o relatório.

VOTO DO RELATOR

Acolho o Parecer da Coordenação de Controle Externo


deste Tribunal, adotando os seus exatos termos para responder ao
consulente.

12
Por conseguinte,

CONSIDERANDO que a Consulta atende aos pressupostos de


admissibilidade;

CONSIDERANDO os termos do Parecer da CCE de fls. 08 a


23 dos autos;

CONSIDERANDO o disposto no artigo 2°, inciso XIV, da


Lei Estadual n° 12.600/04;

CONHEÇO a presente Consulta, vez que formulada por


autoridade competente e, no mérito, voto no sentido de que seja
emitida a seguinte resposta:

A)É possível ao município alterar, de forma definitiva


ou temporária, a carga horária de seus professores desde que
obedecidos os limites de jornada previstos na norma local. Tal
norma deve prever critérios e condições para implementar a
alteração de jornada, respeitados os princípios da isonomia e da
impessoalidade;

B)A alteração temporária de carga horária deve ser


procedida por meio de ato normativo previsto na Lei ou na
regulamentação que rege a matéria no âmbito local, sendo sempre
um ato administrativo motivado em relevantes razões de
conveniência e oportunidade;

C)A ocupação de cargo, emprego e/ou função públicos


deve ser precedida do competente concurso, seja na forma regular
ou na forma simplificada, nos termos do que dispõem os incisos II
e IX do art.37 da Constituição Federal. A fixação definitiva ou
temporária de carga horária de professor, assim como eventual
alteração, devem obedecer aos limites de jornada e aos critérios
e condições para sua alteração conforme estipulados em lei local,
sendo vedada qualquer modificação que infrinja o princípio
constitucional de irredutibilidade de vencimentos;

D)A jornada de trabalho dos professores municipais


obedece ao que estipula a legislação local. Em tese, de modo
excepcional e por tempo determinado, por meio de ato
administrativo motivado em relevantes razões de conveniência e
oportunidade, o município pode proceder a alteração da jornada de

13
trabalho de seus professores respeitado o princípio da
irredutibilidade de vencimentos.
__________________________________________________________________
OS CONSELHEIROS CARLOS PORTO, TERESA DUERE, MARCOS LORETO, JOÃO
CARNEIRO CAMPOS E RICARDO RIOS PEREIRA VOTARAM DE ACORDO COM O
RELATOR. PRESENTE O PROCURADOR GERAL, DR. CRISTIANO DA PAIXÃO
PIMENTEL.
PH/FT

14

Você também pode gostar