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Análise do comportamento e do desempenho

táctico de jogadores de
futebol sub-15: estudo comparativo entre dois
clubes portugueses
Análisis del comportamiento y del desempeño táctico de jugadores
de fútbol sub-15: estudio comparativo entre dos clubes portugueses
Analyze of tactical behavior performed by soccer player under-15:
comparative study between two portuguese clubs
*Centro Universitário de Belo Horizonte, UNI-BH, Prof. Ms. Israel Teoldo da Costa* ***
Belo Horizonte, MG, Brasil. Prof. Dr. Júlio Garganta*** ****
**Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG, Belo Prof. Dr. Pablo Juan Greco**
Horizonte, MG, Brasil.
***Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, Profa. Dra. Isabel Mesquita*** ****
FADEUP, Porto, Portugal. Prof. Daniel Castelão*** | Prof. Ezequiel
****Centro de Investigação, Formação, Inovação e Müller***
Intervenção em Desporto,
CIFID, FADEUP, Portugal Prof. Bernardo Silva***
israelteoldo@gmail.com
Resumo
O objectivo do presente estudo consiste em analisar o comportamento e o desempenho tático de
dois grupos de jogadores de Futebol da categoria Sub-15. A amostra consiste em 1363 acções tácticas
desempenhadas por jogadores Sub-15 de dois clubes portugueses. O instrumento utilizado para a recolha
e análise de dados foi o teste “GR3-3GR” que perminte avaliar as acções tácticas de acordo com dez
princípios tácticos fundamentais do jogo de Futebol. Foi realizada a análise descritiva e o teste do Qui-
quadrado (c2), com um nível de significância (p≤0,05). Os resultados não mostraram diferenças
significativas (p≤0,05) em nenhuma das variáveis analisadas. Conclui-se que diferentes concepções e
níveis de jogo não afectam drasticamente a aplicação dos princípios de jogo, nomeadamente no que se
reporta a frequência de ocorrência, localização e resultado da acção táctica.
Unitermos: Futebol. Desempenho táctico. Princípios de jogo

Abstract
The aim of this study is to analyze tactical behavior performed by two groups of novice soccer
players. The sample analyzed integrates 1363 tactical actions performed by under-15 players from two
Portuguese clubs. The test "GK3-3GK" was used to provide the evaluation of tactical actions according to
ten basic tactical principles of soccer game. For data analysis it was used a descriptive analysis and chi-
square (
c2) test (p≤0.05). The results showed no significant differences in any of the analyzed categories. We
concluded that the different game conceptions and different levels of play may not drastically affect the
application of the game principles, particularly when related with frequency of occurrence, place of action
and tactical outcome.
Keywords: Soccer. Tactical performance. Game principles

Agradecimento
Com o apoio do Programa AlBan, Programa de bolsas de alto nível da União Européia para América
Latina, bolsa nº E07D400279BR”. Esse trabalho foi apresentado na forma de pôster no II Congresso
Internacional de Deportes de Equipo realizado na Universidade da Coruña, A Coruña – Espanha – Maio
2009.

http://www.efdeportes.com/ Revista Digital - Buenos Aires - Año 14 - Nº 141 - Febrero de 2010

1. Introdução

No Futebol as capacidades tácticas e os processos cognitivos subjacentes à tomada de decisão


são considerados requisitos essenciais para a excelência do desempenho desportivo (Greco,
2006). Durante uma partida, a constante interacção das equipas, manifestadas nos processo de
cooperação com os colegas e oposição aos adversários, provoca mudanças no sentido, no fluxo e
no ritmo de jogo, exigindo dos jogadores uma elevada capacidade de adaptação e de tomada de
decisão táctica (Garganta, 1997).

Diante da importância das transformações operadas no jogo, tem aumentado o número de


estudos que visam avaliar a respectiva dimensão táctica e/ou organizacional (Barreira, 2006;
Cunha, Binotto, & Barros, 2001; Ferreira, Paoli, & Costa, 2008; Garganta, 1997; Gréhaigne,
Godbout, & Bouthier, 1997), o que denota a importância que lhe é reconhecida, nomeadamente
no que respeita à sua influência no rendimento das equipas e dos jogadores.
O presente estudo tem como principal objectivo contribuir para o acervo de conhecimentos a
propósito da dimensão táctica no Futebol, através da análise dos comportamentos tácticos de
jogadores Sub-15, com recurso ao teste “GR3-3GR”.

2. Material e métodos

2.1. Amostra

Foram avaliadas 1363 acções tácticas desempenhadas por jogadores Sub-15 de dois clubes
portugueses. Deste total de acções, 550 foram realizadas pelos jogadores integrantes das
equipas do clube A e 813 pelos jogadores pertencentes a equipas do clube B. Não foram
analisadas, nesse estudo: as acções relativas à reposição da bola pela linha lateral; os livres; as
situações em que não houve movimentação do jogador no campo de jogo.

2.2. Instrumento

O instrumento utilizado para a recolha e análise de dados foi o teste “GR3-3GR”, desenvolvido no
Centro de Estudos dos Jogos Desportivos da Faculdade de Desporto da Universidade do Porto
(Costa, Garganta, Greco, & Mesquita, 2009).

Através deste teste, pretende-se avaliar as acções tácticas, com e sem bola, desempenhadas
por cada um dos jogadores participantes de acordo com dez princípios tácticos fundamentais do
jogo de Futebol, tendo em conta a localização da acção no campo de jogo e o resultado final da
mesma.

O teste “GR3-3GR” é aplicado num campo reduzido de 36 metros de comprimento por 27


metros de largura, durante 4 minutos de jogo. Durante a sua aplicação é solicitado aos jogadores
avaliados que joguem de acordo com as regras oficiais do jogo, com excepção da regra de “fora-
de-jogo”. No presente estudo são apresentados os resultados das primeiras configurações
experimentadas durante a construção do teste “GR3-3GR”, cujas dimensões correspondiam a 27
metros de comprimento por 18 metros de largura. Essa configuração foi testada com base nas
dimensões mínimas estabelecidas pela International Football Association Board (FIFA, 2008) com
o objectivo de verificar se era possível observar a presença de todos os princípios tácticos
avaliados no teste “GR3-3GR”.

2.3. Procedimento

Dois clubes portugueses participaram nos testes. Após a formação das equipas e a entrega
dos coletes numerados para identificação, os atletas foram informados acerca do objectivo do
teste. Foram-lhes concedidos 30 segundos para “familiarização” com o teste, findos os quais se
deu início à avaliação propriamente dita.

2.4. Material

Para a gravação dos jogos foi utilizada uma câmara digital PANASONIC modelo NV – DS35EG.
O material de vídeo obtido foi introduzido, em formato digital, num computador portátil (marca
LG modelo E500 processador Intel T2370) via cabo (IEEE 1394), convertendo-os em ficheiros
“.avi”. Para o tratamento de imagem e análise do jogo, bem como para categorização da
respectiva informação, foi utilizado o software Utilius VS.

2.5. Análise estatística

Para o tratamento dos dados foi utilizado o software SPSS (Statistical Package for Social
Science) for Windows®, versão 17.0. Foi realizada a análise descritiva (frequência, percentual)
para as variáveis (princípio, localização e resultado). Recorreu-se ao teste do Qui-quadrado (X2),
com um nível de significância de 0,05 para verificar a associação entre as frequências de
realização dos princípios de jogo para os jogadores dos dois clubes observados.

2.5.1. Análise da fiabilidade

As observações do teste “GR3-3GR” foram realizadas por dois observadores treinados que
possuíam concordância inter-observadores superior a 0,80. Foi também verificada a fiabilidade
intra-observador, recorrendo-se ao índice Kappa de Cohen (SPSS 17.0 for Windows®). Para
efeitos de aferição da fiabilidade, foram reavaliadas 236 acções tácticas desempenhadas pelos
jogadores, o que representa 15,6% da amostra, ou seja, um valor superior ao de referência
(10%), apontado pela literatura (Tabachnick & Fidell, 1989).

As sessões para determinar a fiabilidade intra-observador foram realizadas com um intervalo


de 10 dias. Os resultados da fiabilidade intra-observadores exibiram valores de Kappa de 0,95
(erro padrão=0,024) e 0,97 (erro padrão=0,016) para o primeiro e o segundo avaliadores,
respectivamente, sendo portanto superiores aos valores de referência (0,75) apontados pela
literatura (Bakeman & Gottman, 1989; Fleiss, 1981).

3. Resultados e discussão

Na Tabela 1 pode observar-se a frequência com que cada princípio táctico, ofensivo
(destacados em itálico na tabela) ou defensivo, foi executado por cada uma das equipas. Ao
analisar as informações insertas na mesma Tabela, constata-se um número total de acções
tácticas de 1363, sendo 550 realizadas pelas equipas do clube A e 813 realizadas pelas equipas
do clube B. Tais resultados mostram que as equipas do Clube B realizam um jogo onde é mais
evidente a circulação de bola do que acontece com as equipas do Clube A.

Tabela 1. Acções Tácticas em Função dos Princípios

Pode-se verificar que as equipas do Clube A desempenharam 49,3% das acções associadas
aos princípios da fase ofensiva e 50,7% associadas aos princípios da fase defensiva, enquanto
que as equipas do Clube B apresentaram valores percentuais de 47,1% e 52,9% para as fases
ofensivas e defensivas, respectivamente.
Ao analisar a frequência de acções relativas à globalidade dos princípios de jogo, percebe-se
que as acções tácticas relacionadas com os princípios ofensivos de “cobertura ofensiva” e de
“espaço” evidenciam valores superiores, quando comparadas com as acções respeitantes à fase
defensiva, nomeadamente no que respeita aos princípios de “equilíbrio” e de “unidade
defensiva”.

Durante a fase defensiva nota-se, para as equipas dos dois clubes avaliados, uma menor
incidência das acções tácticas relacionadas com o princípio de “cobertura defensiva” em relação
aos demais princípios. As causas poderão ser atribuídas ao posicionamento e movimentação dos
jogadores da equipa que se encontra na fase ofensiva, impedindo a superioridade numérica
defensiva no centro de jogo e obrigando os defensores a, constantemente, buscarem um
reposicionamento em campo, o que também pode ser justificado pela frequência de acções
relativas ao princípio de “equilíbrio”. Para além disso, observa-se uma elevada frequência das
acções para o princípio de “unidade defensiva”, o que poderá dever-se a facto das dimensões do
campo utilizado no teste induzir o aumento da incidência de bolas que saem pela linha de fundo
e, consequentemente, os momentos de reposição de bola por parte do guarda-redes. Neste caso,
é plausível que a equipa adversária recue e se reposicione, com o intuito de conseguir tempo e
espaço para organizar o sistema defensivo colectivo.

A Tabela 2 mostra as frequências das acções tácticas desempenhadas pelos jogadores, de


acordo com a respectiva localização. As coordenadas são o meio campo defensivo e o meio
campo ofensivo, de modo a poder perceber-se a frequência de acções tácticas, ofensivas e
defensivas, realizadas em cada um dos espaços.

Tabela 2. Localização da Execução dos Princípios

Ao analisar a Tabela percebe-se que as equipas do Clube A realizaram 277 acções no meio
campo ofensivo, sendo 58,8% defensivas e 41,2% ofensivas. As mesmas equipas realizaram 273
acções tácticas no meio campo defensivo sendo 42,5% defensivas e 57,5% ofensivas. Por outro
lado, as equipas do Clube B executaram 370 acções no meio campo ofensivo, sendo 52,4%
dessas acções defensivas e 47,6% ofensivas. Estas equipas realizaram 443 acções no meio
campo defensivo, das quais 53,3% são defensivas e 46,7% ofensivas.

Observa-se que as equipas de ambos os clubes realizaram, em termos percentuais, uma maior
quantidade de acções tácticas relacionadas com os princípios ofensivos no meio campo
defensivo. As equipas do Clube A apresentam uma maior incidência na realização de acções
defensivas no meio campo ofensivo, enquanto que as das equipas do Clube B realizam mais
acções defensivas no meio campo defensivo. Tal parece traduzir uma tendência das equipas do
Clube A para realizarem uma marcação mais avançada no terreno de jogo, quando comparadas
com as equipas do Clube B.

A Tabela 3 mostra a frequência das acções em função dos resultados obtidos no teste “GR3-
3GR”.

Tabela 3. Resultados das Acções Tácticas

A partir da aplicação do teste foram gerados cinco resultados, tanto em acções ofensivas
quanto defensivas. De modo a facilitar a apresentação dos dados e a respectiva compreensão,
optou-se por agrupá-los em três categorias, sendo na fase ofensiva: remate à baliza,
manutenção da posse de bola (sequência da equipa atacante + sequência fragmentada da
equipa atacante) e perda da posse de bola (sequência fragmentada da equipa defensora +
sequência da equipa defensora); e na fase defensiva: recuperação da posse de bola (sequência
da equipa defensora + sequência fragmentada da equipa defensora), posse de bola do
adversário (sequência fragmentada da equipa atacante + sequência da equipa atacante) e
remate do adversário à baliza.
Na Tabela 3 observa que as equipas denotam semelhanças no que respeita a indicadores
observados tanto para a fase ofensiva quanto para a defensiva, sobressaindo os valores das
variáveis Manutenção da Posse de Bola e “Posse de Bola do Adversário”.

Observa-se ainda que apesar das equipas do Clube A possuírem menor frequência de posse de
bola no jogo, elas conseguem rematar mais vezes à baliza do que as equipas do Clube B,
indiciando uma “concepção de jogo” mais directa à baliza adverrsária.

Os resultados encontrados para as três variáveis (Princípios, Localização e Resultados)


analisadas através do teste Qui-quadrado (sig≤0,05), não evidenciaram diferenças significativas.

Na Tabela 4 pode observar-se os índices de performance por jogador, para cada clube
participante. Tais índices foram calculados para cada princípio, por cada fase de jogo (ofensiva e
defensiva) e por jogo.

Verifica-se que as equipas dos dois clubes possuem jogadores com heterogeneidade de
rendimento, tanto nos princípios da fase ofensiva quanto nos princípios da fase defensiva. Em
relação aos índices de performance da fase ofensiva e defensiva, também se percebe que as
equipas nesse escalão possuem maior competência para realizar os princípios tácticos ofensivos
do que os defensivos. Parece legítimo inferir que as equipas nesse escalão possuem mais
dificuldades em realizar as acções tácticas defensivas em comparação com as ofensivas, sendo,
portanto, necessário enfatizá-las nas sessões de treino.

Tabela 4. Índice de Performance dos Jogadores


4. Conclusões

Verificou-se que os Clubes avaliados (A e B) possuem jogadores com níveis claramente


discrepantes de rendimento táctico, tanto no que respeita aos princípios da fase ofensiva como
no que se reporta aos da fase defensiva. Foi também notório que as equipas do Clube A
evidenciaram um jogo mais directo à baliza adversária, quando comparadas com as do Clube B.

Todavia, os comportamentos tácticos realizados pelos jogadores das equipas de ambos os


Clubes observados (A e B) não apresentaram diferenças significativas no que diz respeito à
frequência de realização das acções tácticas em função dos princípios de jogo, da sua localização
e dos seus resultados. Tal parece traduzir que concepções de jogo diferenciadas podem não
afectar drasticamente a aplicação dos princípios de jogo, nomeadamente no que se reporta a
frequência de ocorrência, localização e resultado.

Futuros estudos deverão centrar-se no modo como estes indicadores interagem para induzir
ou inibir a eficácia competitiva nas partidas de Futebol.

Referências
 Bakeman, R., & Gottman, J. M. (1989). Observación de la interacción: Introducción al
análisis secuencial. Madrid: Ediciones Morata, S.A.
 Barreira, D. (2006). Transição defesa-ataque em futebol: Análise Seqüencial de padrões
de jogo relativos ao Campeonato Português 2004/05. Porto: Universidade do Porto.
Dissertação de Licenciatura (não publicada). Universidade do Porto: Faculdade de
Ciências do Desporto e de Educação Física.
 Costa, I., Garganta, J., Greco, P., & Mesquita, I. (2009). Avaliação do Desempenho
Tático no Futebol: Concepção e Desenvolvimento da Grelha de Observação do Teste
“GR3-3GR”. Revista Mineira de Educação Física, 17(2), in press.
 Cunha, S. A., Binotto, M. R., & Barros, R. M. L. (2001). Análise da variabilidade na
medição de posicionamento tático no futebol. Revista Paulista de Educação Física, 15 (2),
111-116.
 Ferreira, R. B., Paoli, P. B., & Costa, F. R. (2008). Proposta de 'scout' tático para o
futebol. EFDeportes.com, Revista Digital. Buenos Aires, año 12.
http://www.efdeportes.com/efd118/scout-tatico-para-o-futebol.htm
 FIFA. (2008). Laws of the Game 2008/2009. Zurich: Fédération Internationale de Football
Association.
 Fleiss, J. L. (1981). Statistical Methods for Rates and Proportions (2 ed.): Wiley-
Interscience.
 Garganta, J. (1997). Modelação táctica do jogo de futebol – estudo da organização da
fase ofensiva em equipas de alto rendimento. Porto: Universidade do Porto. Dissertação
de Doutoramento (não publicada). Universidade do Porto: Faculdade de Ciências do
Desporto e de Educação Física.
 Greco, P. (2006). Conhecimento técnico-tático: o modelo pendular do comportamento e
da ação tática nos esportes coletivos. Revista Brasileira de Psicologia do Esporte, 107-
129.
 Gréhaigne, J. F., Godbout, P., & Bouthier, D. (1997). Performance assessment in team
sports. Journal of Teaching in Physical Education, 16 (4), 500-516.
 Tabachnick, B., & Fidell, L. (1989). Using Multivariate Statistics. New York: Harper & Row
Publishers.

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