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Humanização, Saúde Pública

e Interdisciplinaridade em Pediatria

Brasília-DF.
Elaboração

Lourdes Aparecida Galego Valero

Produção

Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e Editoração


Sumário

Apresentação.................................................................................................................................. 4

Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa..................................................................... 5

Introdução.................................................................................................................................... 7

Unidade I
INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO........................................................................................ 9

Capítulo 1
Introdução à interdisciplinaridade................................................................................... 9

Capítulo 2
Fragmentação do conhecimento e suas implicações................................................. 21

Unidade iI
Compreendendo o processo de Humanização ......................................................................... 27

Capítulo 1
Humanismo e processo de humanização hospitalar..................................................... 27

Capítulo 2
Atendimento humanizado................................................................................................... 35

Unidade iII
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica......................................... 42

Capítulo 1
Construção de um processo interdisciplinar de humanização................................. 42

Capitulo 2
Humanização no ambiente de trabalho........................................................................... 50

Capítulo 3
A assistência pediátrica sob olhar da humanização e interdisciplinaridade............. 57

Referências................................................................................................................................... 85
Apresentação

Caro aluno

A proposta editorial deste Caderno de Estudos e Pesquisa reúne elementos que se


entendem necessários para o desenvolvimento do estudo com segurança e qualidade.
Caracteriza-se pela atualidade, dinâmica e pertinência de seu conteúdo, bem como pela
interatividade e modernidade de sua estrutura formal, adequadas à metodologia da
Educação a Distância – EaD.

Pretende-se, com este material, levá-lo à reflexão e à compreensão da pluralidade


dos conhecimentos a serem oferecidos, possibilitando-lhe ampliar conceitos
específicos da área e atuar de forma competente e conscienciosa, como convém
ao profissional que busca a formação continuada para vencer os desafios que a
evolução científico-tecnológica impõe ao mundo contemporâneo.

Elaborou-se a presente publicação com a intenção de torná-la subsídio valioso, de modo


a facilitar sua caminhada na trajetória a ser percorrida tanto na vida pessoal quanto na
profissional. Utilize-a como instrumento para seu sucesso na carreira.

Conselho Editorial

4
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa

Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em unidades, subdivididas em


capítulos, de forma didática, objetiva e coerente. Eles serão abordados por meio de textos
básicos, com questões para reflexão, entre outros recursos editoriais que visam tornar
sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, fontes de consulta para
aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.

A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.

Provocação

Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.

Para refletir

Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.

Sugestão de estudo complementar

Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo,


discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.

Atenção

Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a


síntese/conclusão do assunto abordado.

5
Saiba mais

Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões


sobre o assunto abordado.

Sintetizando

Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o


entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.

Para (não) finalizar

Texto integrador, ao final do módulo, que motiva o aluno a continuar a aprendizagem


ou estimula ponderações complementares sobre o módulo estudado.

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Introdução
Pensar em Interdisciplinaridade implica em analisar este conceito a partir da epistemologia
e da educação, ou seja, com ênfase na definição destes conceitos e suas implicações na
prática profissional, e também na estrutura dos currículos por meio da inserção da
interdisciplinaridade no processo de ensino-aprendizagem na área da saúde.

Ao longo do texto, iremos abordar, primeiramente, o panorama sócio-histórico da


interdisciplinaridade e sua inserção na formação em saúde e na prática profissional
em diferentes níveis de atenção. Em seguida, iremos analisar as principais barreiras ao
desenvolvimento de práticas interdisciplinares, bem como os pontos fortes e limitações
da interdisciplinaridade.

Mais adiante, vamos abordar o conceito de humanização no ambiente hospitalar e sua


relação com a interdisciplinaridade.

As demandas e necessidades sociais e laborais exigem uma reflexão crítica do papel da


interdisciplinaridade na atenção à saúde, a identificação de caminhos possíveis para
atuar em equipe e do desenvolvimento de práticas mais humanizadas com o intuito
de oportunizar a integralidade do cuidado e a qualidade e humanização do serviço
prestado aos indivíduos, famílias e comunidades.

Objetivos
»» Analisar criticamente o conceito de Interdisciplinaridade.

»» Descrever sobre as iniciativas de humanização nos serviços de saúde,


aprofundando conceitos, metodologias e aplicações práticas.

»» Discutir os temas humanização e sua aproximação com a Interprofissionalidade


na área da saúde, seja no âmbito da formação ou na atuação profissional.

»» Analisar os processos de humanização no ambiente hospitalar, com


ênfase na UTI pediátrica.

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INTERDISCIPLINARIDADE E Unidade I
O CONHECIMENTO

Capítulo 1
Introdução à interdisciplinaridade

Historicamente, a ciência moderna tem sido marcada pela fragmentação do conhecimento


decorrente do franco processo de especialização observado ao longo dos anos. Pensando
no contexto em que isso ocorreu, pode-se afirmar que, esse movimento da ciência foi
necessário e coerente com as demandas da época.

Em uma rápida contextualização histórica, podemos citar algumas correntes de


pensamento e elementos culturais que levaram ao estado da arte atual da ciência. A
Revolução Industrial, o Iluminismo e a Revolução Científica foram cruciais para o
desenvolvimento científico, como o observamos hoje. No entanto, alguns conceitos e
práticas levaram ao distanciamento entre as disciplinas, à constante especialização e,
consequentemente, à fragmentação do conhecimento.

O Positivismo foi uma corrente de pensamento do século XIX. Esse movimento


teve influência, principalmente na Europa, na organização racional social e partia
do pressuposto de que a ciência é o único modo de produção de conhecimento e,
consequentemente, de sua supremacia em comparação a outros meios de produção
de conhecimento. Sendo assim, muito do que conhecemos hoje é fruto das ciências
naturais, ressaltando que tudo que é real, verdadeiro e inquestionável é fundamentado
a partir da experiência e, assim, reivindicando a importância da ciência baseada
nesses princípios.

Essa breve contextualização é necessária, já que essa corrente acabou determinando a


estrutura e o planejamento do ensino, os quais, por sua vez, conduziram o conhecimento
a se tornar fragmentado e disciplinar. Cabe ressaltar que, o modelo cartesiano
e positivista teve reflexo direto na elaboração de currículos multidisciplinares,
restringindo a integração de diferentes campos do conhecimento. Esse processo
permitiu muitos avanços, no entanto, a ciência está em constante desenvolvimento
para equacionar desafios em variadas esferas. Além disso, considerando que a ciência

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UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

pode ser determinada pelo contexto em que está inserida e é sujeita à temporalidade,
essa estrutura de produção do conhecimento tem mostrado sinais de esgotamento e,
com isso, algumas questões foram levantadas. Apesar disso, muitos aspectos ainda
persistem, o que ainda influencia a maneira como estruturamos os processos de
ensino-aprendizagem e, consequentemente, reproduzimos na prática profissional.

Dessa forma, o século XIX foi marcado pela influência do modelo cartesiano, o que
levou ao nosso modelo de ciência fragmentada e com cultura de isolamento disciplinar,
e, mais adiante, resultou na dicotomização dos saberes. Claro que o problema não reside
na fragmentação para uma aplicação didática de conteúdo ou na especialização, mas
no fato que passaram da fragmentação para o isolamento quase total, o impactou na
integração dos saberes e, por sua vez, interferiu na prática profissional e na integralidade
do cuidado.

Figura 1. Correntes de pensamento e eventos que influenciaram a evolução da ciência.

Fonte: autor.

Até o momento estamos discutindo a evolução da ciência, a estrutura de ensino


baseada no modelo cartesiano e positivista e a fragmentação do conhecimento.

»» Mas qual a finalidade e a aplicação no cotidiano, no ambiente laboral


e nas práticas em um ambiente hospitalar?

»» Qual a importância de entender esse processo e que benefícios irão


trazer?

São questões importantes e vale a reflexão. A importância de conhecer e entender todo


o processo possibilita um olhar crítico sobre o assunto e o processo socio-histórico que
resultou nessa estrutura para que a assimilação de novos conceitos seja realizada de
maneira crítica. Lembrando que, todo esse processo tem reflexo direto na prática clínica,
visto que a universidade foi embasada por essas correntes de pensamento, utilizando-se
no processo de ensino-aprendizagem e os profissionais formados levam esses conceitos

10
INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

à prática. Vimos que a ciência tem uma característica temporal. Sendo assim, podemos
afirmar que nem todos os conceitos ou práticas serão verdades absolutas e o progresso
implica em novas abordagens para produção de conhecimento, bem como novas formas
de organizá-lo.

Passamos para um ponto crucial e o principal objeto de estudo do presente material.


Chegamos na relação entre o profissional e o paciente ou os profissionais e o paciente
se considerarmos a Unidade de Terapia Intensiva, local onde é necessária a atuação de
diversos profissionais em conjunto.

A complexidade das relações no contexto profissional e a busca pela resolução de


problemas são desafios para a elaboração de estratégias de intervenções que levem em
consideração valores básicos coerentes com a ética profissional, o respeito à dignidade
humana e uma abordagem de todos os aspectos do indivíduo. Dessa forma, passar a
ser sujeito e agente da mudança por meio da reflexão sobre a situação e contexto de
atuação do profissional de saúde.

Importante lembrar o conceito de ética profissional, que é o conjunto de


normas éticas que formam a consciência do profissional e representam o
que é próprio da sua área de atuação e a Lei do Exercício Profissional. O indivíduo
que tem ética profissional deve cumprir com todas as atividades de sua
profissão, seguindo os princípios determinados pelo seu órgão regulamentador
e legislação pertinente.

A noção de disciplina a o desenvolvimento de todo o processo é fundamental para o


entendimento do termo interdisciplinaridade.

Partindo da noção de organização disciplinar, instituída no século XIX, a formação das


universidades modernas desenvolveu-se com o impulso dado à pesquisa científica no
século XX acentuando as características descritas desse tipo de organização. Temos
um processo histórico de nascimento, institucionalização evolução e consequente
esgotamento.

A disciplina foi uma maneira de delimitar o conhecimento e assim organizar uma


seleção de conteúdos aliados a um conjunto de procedimentos metodológicos e
didáticos. Algumas críticas são frequentes a essa estrutura: a dificuldade de estabelecer
conexões entre os fatos e as barreiras ou fronteiras entre as disciplinas, que dificultam
a integração e ação de convergência entre os sujeitos. Além disso, quanto mais se
desenvolvem, se diversificam e se especializam ficam mais distantes da realidade e a
abordagem de assuntos mais abrangentes, dinâmicos e complexos torna-se inadequada
e insuficiente.

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UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

A disciplina é uma categoria organizacional no interior do conhecimento


científico, pois institui a divisão e a especialização do trabalho e responde
a diversidade de domínios que recobrem as ciências. A disciplina, por
um lado, define um domínio de competência sem o qual o conhecimento
se tornaria fluído e vago. (SCHERER, 2006, p.38).

Mas quais seriam as alternativas a essa organização fragmentada do saber?

Em meados da década de 1960, o conceito de interdisciplinaridade surgiu na Europa


a priori a partir da construção epistemológica. Posteriormente, a elaboração de um
método e a tentativa de elaboração de um processo baseado nesse princípio sem
esquecer das implicações decorrentes dessa abordagem e pôr fim a construção de
teoria da interdisciplinaridade. No Brasil a interdisciplinaridade chegou ao final dos
anos sessenta e no final dos anos setenta a principal preocupação era uma definição
terminológica.

As primeiras discussões sobre interdisciplinaridade foram lançadas na década de


1970 por Georges Gusdorf em parceria com pesquisadores de universidades europeias
e americanas de diferentes áreas do conhecimento. A proposta inicial desse grupo
foi apontar as principais tendências de pesquisa com intuito de sistematizar uma
metodologia, buscar aproximações, similaridades e interlocuções entre as disciplinas.

No Brasil, a primeira produção significativa sobre interdisciplinaridade foi de Hilton


Japiassu, o autor apresentou os principais questionamentos a respeito do tema e
seus conceitos refletindo sobre as estratégias disciplinares. Posteriormente, em 1976,
escreveu o livro “Interdisciplinaridade e a patologia do saber” apresentando uma síntese
das principais questões envolvendo a interdisciplinaridade e os pontos fundamentais
para uma metodologia interdisciplinar. Outro trabalho relevante foi desenvolvido por
Ivani Fazenda sobre os aspectos relativos à conceituação da metodologia relacionada à
interdisciplinaridade.

Até o momento não houve nenhuma menção sobre definição ou conceito de


interdisciplinaridade. Isso ocorre porque ainda não há um conceito único e estável,
existe uma grande variação no nome e significado atribuído á prática. Na maioria
das definições temos a característica relacionada à intensidade de trocas entre os
especialistas e o grau de interação real entre os sujeitos.

A falta de um consenso, de uma generalização conceitual de interdisciplinaridade não


exclui a necessidade da relação de sentidos e significados buscando uma percepção
comum. Se considerarmos que todo conhecimento mantém um diálogo permanente
com outros conhecimentos em forma de questionamentos, confirmações, ampliações,
complementação, fica mais claro entender o conceito de interdisciplinaridade.
12
INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

No entanto, não podemos confundir essa conciliação, o uso simultâneo e indiscriminado


de teorias e pontos de vista teóricos e éticos diversos sem considerar as diferenças e
incompatibilidades. É necessário reconhecer a multidimensionalidade e complexidade
dos fenômenos que exigem uma perspectiva pluralista e diferentes abordagens.

É importante esclarecer que, o conceito de pluralismo é colocado nesse contexto no


sentido de impedir que as múltiplas associações caiam na fragmentação corporativista
e conservem a multiplicidade, diversidade e pluralismo dos sujeitos. As diferenças
requerem estratégias e conhecimentos diversos para serem captadas e implementadas,
assim as diferenças não são resultantes, apenas, dos limites e fronteiras das disciplinas,
mas também entre teorias, campos epistemológicos e são dependentes da cultura e
comunicação dos especialistas.

Em síntese as práticas interdisciplinares podem ser definidas como a interação entre as


diversas fronteiras do conhecimento, um eixo integrador entre os sujeitos que permita
entender as múltiplas implicações dos fenômenos e dessa maneira observar o mesmo
objeto de estudo, situação ou o contexto de diferentes perspectivas. O grande desafio da
interdisciplinaridade é a interação das disciplinas e práticas baseadas em um diálogo
comum sem cair nas práticas multidisciplinares que apenas produzem conhecimentos
justapostos em torno de um mesmo problema ou tema.

Nesse ponto é importante a definição de alguns conceitos para determinar o que queremos
dizer quando falamos sobre interdisciplinaridade, que representações e configurações
apresentam em nossa mente e como seria possível sua prática e desenvolvimento.
Somente a integração de conteúdos e práticas de diversas disciplinas seria suficiente?
É uma prática coletiva? Seria o conjunto de disciplinas? A atuação conjunto de diferentes
sujeitos em busca de um objetivo comum?

Para esclarecer e responder algumas questões é importante definir as práticas estabelecidas


e conceitos relacionados a disciplinaridade, multidisciplinares, pluridisciplinares,
pluriauxiliares, interdisciplinares e campos transdisciplinares.

Enquanto a disciplinaridade está relacionada à exploração especializada de determinado


domínio homogêneo do conhecimento, a multidisciplinaridade pode ser relacionada
com a gama de disciplinas ligadas pelo diálogo entre os especialistas ou sujeitos,
mas em relação entre elas. A partir do conceito de multidisciplinaridade podemos
ver que somente o agrupamento de áreas ou disciplinas não caracteriza uma prática
interdisciplinar.

O agrupamento de diversos sujeitos não parece levar a uma busca de objetivo comum
ou a transpor os limites de cada especialidade. Uma das principais exigências da

13
UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

interdisciplinaridade é a que o especialista transcenda, ultrapasse sua própria especialidade,


tomando consciência de seus limites para contribuir e acolher contribuições de outras
especialidades.

Como definição geral, temos os principais conceitos:

Práticas multidisciplinares: pode ser entendida como uma gama de campos propostos
simultaneamente, um diálogo paralelo entre dois ou mais especialistas, mas sem que
as relações existentes entre eles apareçam. Geralmente é um sistema de um nível com
objetivos únicos e nenhuma cooperação. A figura abaixo é utilizada para caracterizar um
processo multidisciplinar, os retângulos representam uma disciplina ou especialidade,
fica claro que não há uma interligação entre elas. Outro exemplo comum é a atuação
de profissionais em um ambulatório ou hospital convencional, onde profissionais de
diferentes áreas geralmente trabalham de forma isolada sem cooperação ou troca
de informações entre si. As informações ficam restrita a uma troca relacionada à
organização administrativa.

Figura 2. Exemplo de organização multidisciplinar.

MÉDICO ENFERMEIRO FISIOTERAPEUTA

Fonte: autor.

Práticas pluridisciplinares: podem ser definidas como a justaposição de disciplinas,


especialistas, geralmente situados hierarquicamente no mesmo nível, com relação
fazendo aparecer às relações existentes entre eles. Sua organização apresenta um só
nível com objetivos múltiplos, cooperação entre os sujeitos, mas sem coordenação.
Como exemplo de práticas pluridisciplinares, reuniões clínicas onde casos de pacientes
são discutidos por diversos profissionais trocando informações sobre o caso. Reuniões
de grupos técnicos planejando avaliações ou procedimentos científicos são exemplos de
práticas pluridisciplinares.

Figura 3. Exemplo de organização pluridisciplinar.

ENFERMEIRO

MÉDICO

FISIOTERAPEUTA
Fonte: autor.

14
INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

Práticas interdisciplinares: são caracterizadas pela interação participativa conexas e


com objetivos comuns. Inclui a participação e pactuação de objetivos comuns a um
grupo de campos do saber conexos com intensa troca de entre os sujeitos. Dessa maneira
introduz a noção de finalidade maior que redefine as fronteiras disciplinares, os
limites internos dos campos originais lavando a mudanças estruturais gerando
enriquecimento mútuo e a interação dos sujeitos. É um sistema de dois níveis com
objetivos múltiplos coordenados e com uma tendência a horizontalização das relações
de poder entre os sujeitos.

É importante destacar que, as práticas interdisciplinares exigem a identificação de


uma problemática comum, intencionalidade e uma plataforma de trabalho conjunto
para que os princípios e conceitos fundamentais de cada campo sejam, em um esforço
comum, decodificados em linguagem mais acessível para os envolvidos identificando as
diferenças e convergências dos conceitos para uma ação contextualizada. Desta forma
a possibilidade de uma aprendizagem mútua é possível, que não se concretiza pela
simples adição ou mistura de sujeitos ou disciplinas, é necessária uma recombinação
dos elementos internos, organização e objetivo comum para a implementação de um
modelo interdisciplinar.

As práticas interdisciplinares autenticas permitem extrapolar as os campos, e quando


prolongadas podem tornar-se novas práticas e até mesmo disciplinas. Podemos observar
que a estrutura organizacional e o nível de comprometimento para a implementação de
práticas interdisciplinares levam a uma série de questionamentos e a necessidade de
novas bases dos princípios de formação tradicional e práticas profissionais, exigindo a
reelaboração das relações de poder e identidade entre os sujeitos envolvidos.

Figura 4. Exemplo de organização interdisciplinar.

ENFERMEIRO

NUTRICIONISTA MÉDICO

SERVIÇO SOCIAL FISIOTERAPEUTA

Fonte: autor.

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UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

Campos transdisciplinares: se caracterizam pela interação das disciplinas com uma


finalidade comum, apresentam uma coordenação dos campos de saberes individuais e
interdisciplinares sobre uma base geral compartilhada. Isso é possível com a interação
de médio e longo prazo que possibilitam uma estabilização e criação de um novo campo
ou prática com autonomia teórica e prática própria. É um sistema de níveis e objetivos
múltiplos, apresenta uma finalidade comum dos sistemas e uma forte tendência de
horizontalização das relações de poder entre os sujeitos. Se compararmos com as práticas
interdisciplinares campos transdisciplinares podem ser considerados uma radicalização
de nível capaz de flexibilizar as divisões e barreiras convencionais das especialidades.

Figura 5. Exemplo de organização transdisciplinar.

médico

fisioterapeuta enfermeiro

Fonte: autor.

Em síntese podemos resumir os principais pontos da estrutura organizacional dos


modelos dessa forma:

»» Multidisciplinares: diálogo paralelo entre dois ou mais especialistas um


nível, objetivos únicos, nenhuma cooperação.

»» Pluridisciplinares; especialistas, geralmente situados hierarquicamente


no mesmo nível. Um nível, objetivos múltiplos, cooperação entre os
sujeitos, sem coordenação.

»» Interdisciplinares: interação participativa conexas, objetivos comuns,


introduz a noção de finalidade maior que redefine as fronteiras
disciplinares. Sistema de dois níveis, objetivos múltiplos, coordenado,
tendência a horizontalização das relações de poder entre os sujeitos.

»» Transdisciplinares: interação das disciplinas com uma finalidade comum,


apresentam uma coordenação dos campos de saberes individuais e

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INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

interdisciplinares sobre uma base geral compartilhada. Sistema de níveis


e objetivos múltiplos, finalidade comum dos sistemas e uma tendência de
horizontalização das relações de poder entre os sujeitos.

Após analisar as formas de organização e se apropriar dos conceitos relacionados


as principais formas de organização podemos fazer algumas considerações e
questionamentos. O objetivo dessa discussão não será categorizar ou dividir em fases
e ciclos, a contextualização histórica é importante para entender como todo o processo
se desenvolveu, do qual infere-se desnecessária por criar a falsa ideia de progresso
colocando o passado ou os elementos que nos apropriamos como atrasados quando
comparados a atualidade ou previsões sobre um futuro desenvolvimento. Já foi
mencionado anteriormente a importância do processo histórico, a institucionalização,
o desenvolvimento e consequente esgotamento, voltamos a esse conceito para deixar
claro que a divisão, separação não é implica necessariamente em um isolamento.

A divisão pode ser e foi um ponto que possibilitou inúmeros avanços, no entanto, a
ruptura de uma visão holística, a crescente especialização e levaram ao isolamento e a
uma abordagem em unidades. Isso é contrário ao conceito que buscamos que pode ser
sintetizado como a totalidade como reconstituição do todo. Uma unidade de diversas
disciplinas e práticas com conexões, integrados e com objetivos comuns.

A definição dos conceitos e dos tipos de práticas disciplinares é importante para


evitar equívocos na compreensão do termo interdisciplinaridade e os preceitos para
implementação de práticas interdisciplinares. A apropriação desses conceitos permite
uma reflexão profunda sobre as práticas e estruturas onde se desenvolvem, e dessa
forma atuar de forma crítica.

Importante lembrar, ainda sobre a palavra disciplina, que em sua história está
justificada como um importante objeto para cada profissão, mas será que
o problema é que esse conhecimento, principalmente na área da saúde, está
representado por uma fragmentação de saberes? Ainda sobre a proposta e
solução, seria sim o trabalho em equipe multidisciplinar uma solução para a
solução desse problema?

Falar sobre interdisciplinaridade é um exercício de conhecimento que conduz a diversos


questionamentos e ações práticas com intencionalidade. Uma das características é a
intensidade de troca entre os sujeitos e integração real dos sujeitos, mas:

Em que nível isso ocorre?

Que relações são estabelecidas entre os sujeitos para que seja possível um projeto
interdisciplinar?

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UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

Se compararmos as outras organizações a interdisciplinaridade se diferencia por


apresentar um sistema de dois níveis com uma forte tendência a horizontalização entre
os sujeitos. Em sentido mais amplo isso significa que temos uma mudança nas relações
de poderes entre os sujeitos, as especialidades tendem a essa organização horizontal em
contraposição a uma organização e interação vertical de poder entre os sujeitos. Não se
trata de excluir a importância dos profissionais envolvidos, mas reconhecer que as relações
horizontais permitem uma troca de informações mais significativas sempre levando em
consideração um objetivo comum e a organização para chegar ao resultado final.

Esse tipo de organização é mais complexo do que, alguns conceitos levam a acreditar
que, a simples presença de diversos sujeitos em um mesmo ambiente. É importante
destacar esse ponto, pois, o termo interdisciplinaridade é extensamente utilizado e, na
maioria das vezes, não representa de forma adequada o termo. Se aproxima muito do
modelo multidisciplinar que é muito diferente em sua organização e, consequentemente,
com resultados distintos. Temos que levar em consideração as implicações de uma
abordagem interdisciplinar, pode nos proporcionar a possibilidade de rever o antigo
e torná-lo atual, um processo constante que não deve ser transitório para possibilitar
uma prática generalizada.

Até o momento não houve nenhuma definição clara e precisa sobre interdisciplinaridade,
foram apresentadas as principais características, alguns elementos essenciais para a
uma possível prática interdisciplinar e o contexto em que se desenvolveu. A disciplina
é uma característica comum das quatro palavras apresentadas: multi e pluri remetem
a ideia de juntar uma ao lado da outra, inter e trans são no sentido de articulação e
estabelecer uma relação recíproca e acrescentando a trans o conceito de ir além
ultrapassando os próprios limites. Essa síntese dos conceitos mostra que existe uma
tentativa de romper o caráter estagnado das disciplinas em diferentes níveis, talvez isso
ocorra pelo esgotamento ou pelo desenvolvimento alcançado até o momento.

Um novo contexto exige novas abordagens e níveis de organização surgem, em


um primeiro momento temos uma prática onde não existe muita interação, em um
segundo momento temos uma comunicação entre os sujeitos ou disciplinas e que
trocam informações, discutem e estabelecem entre si uma interação. Em um terceiro
nível ultrapassam as barreiras impostas que as afastam e fundem-se formando uma
nova perspectiva que transcende as anteriores, essa ideia de desenvolvimento e o
entendimento dos termos é crucial para entender a diferença entre a simples justaposição
e a fusão dos conceitos, o intermédio a esse processo seria uma transição ao processo
de fusão. Se lembrarmos dos conceitos estudados temos a interdisciplinaridade nesse
ponto, não existe uma fusão das disciplinas ou dos sujeitos, mas não se limita ao simples
convívio no mesmo espaço.

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INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

Existem muitas opiniões sobre o que constitui a prática interdisciplinar, um ponto


em comum nas diversas definições é que o termo interdisciplinaridade é considerado
quando existe uma interação mútua dos conceitos constituindo novo conhecimento
ou buscando resolução de um problema concreto de forma objetiva, organizada e com
intencionalidade. Os limites que antes eram barreiras são explorados com a unificação
de conceitos e novos métodos resultantes da intensa troca de informações permitindo
que as potencialidades sejam exploradas e ampliadas.

Esse diálogo entre os sujeitos as novas metodologias geradas permitem a construção de


um novo conhecimento, dessa forma a prática interdisciplinar pode ser uma resposta a
toda diversidade, complexidade e dinâmica atual. Em um sentido mais radical pode ser
entendida como a superação de uma visão fragmentada e dicotômica persistente para
superar a multiplicidade de saberes fragmentados provisórios e parciais.

Ao tratarmos da Interdisciplinaridade há uma relação de reciprocidade,


de interação que pode ajudar no diálogo entre diferentes conteúdos,
desde que haja uma intersubjetividade presente nos sujeitos, pois integrar
conhecimentos significa apreender, disseminar e os transformar. A
Interdisciplinaridade surgiu como uma nova pedagogia capaz de identificar
o vivido e o estudado, capaz de construir conhecimento a partir da relação
de múltiplas e variadas experiências (FAZENDA, 2006, p. 49).

A importância de uma abordagem interdisciplinar fica evidente se levarmos em


consideração a diversidade e complexidade da realidade na área de saúde, uma vez
que seu objeto de estudo tem base conceitual situado em campos distintos das ciências
biológicas, exatas e humanas se considerarmos o âmbito coletivo temos a interação
entre aspectos biológicos e sociais. Ainda nesse contexto, o processo saúde doença
envolve relações sociais, expressões emocionais, condições sociais, contexto histórico e
cultural dos indivíduos ou grupos.

Analisando esse ambiente dinâmico, os processos e a atuação dos profissionais temos


um grande desafio de implementar uma abordagem interdisciplinar, no entanto, a
existência de tantas possibilidades de atuação pode ser um estímulo para exploração
de estratégias que levem a práticas integradoras levando a um reordenamento interno.

Assim, podemos compreender melhor a importância da interdisciplinaridade enquanto


ferramenta na promoção de mudanças em condutas dos profissionais na área da saúde,
pois trata-se de um processo dinâmico e que envolve todo esforço e cooperação da
equipe em saúde onde o respeito mútuo, a diversidade e principalmente os diálogos
entre os profissionais responsáveis pelo cuidado em saúde podem ser classificados
como o caminho para o início desse processo.

19
UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

Com isso, deixamos como proposta de reflexão para a esse tema a importância
do trabalho em equipe na área da saúde e principalmente dentro de um ambiente
hospitalar, onde seus trabalhadores e representantes legais podem seguir e construir
um pensamento interdisciplinar, pois o objetivo é pensar, refletir e principalmente
trabalhar sobre os diferentes fatores que interferem no contexto social onde a equipe
de trabalho está inserida. Podemos com isso lembrar que uma ação transdisciplinar
tem como pressuposto a possibilidade da prática de um profissional se reconstruir e se
integrar na prática do outro, onde ambos são transformados interferindo assim em uma
realidade contextualizada. Assim cada profissional deve agir e pensar de forma ética e
isolada sobre suas atribuições dentro de um contexto em saúde, mas essencialmente
deve sempre pensar e refletir de forma coletiva, pois é esse pensamento profissional
coletivo que muitas vezes vai atribuir mais conhecimento e propriedade ao cuidado e
assistência à saúde de um indivíduo e comunidade.

Falamos até aqui sobre o tema Interdisciplinaridade, dados históricos, a


construção desse conceito, sua importância, formas de organização dos serviços
e principalmente a relação do conceito de Interdisciplinaridade com o Trabalho
em Saúde, ainda sobre vantagens e os desafios do trabalho interdisciplinar
em saúde. Falamos sobre a importância e conceito de disciplina dentro desse
conhecimento, bem como a existência de sua fragmentação. Realizamos ainda
alguns momentos de reflexão desse tema com a forma de organização de um
raciocínio e pensamento interdisciplinar.

20
Capítulo 2
Fragmentação do conhecimento e
suas implicações

A velocidade e o volume de informações produzidas e propagadas propiciadas pelo


avanço tecnológico, sobretudo das tecnologias da informação e comunicação, e pela
configuração da ciência, que se constituiu da divisão do seu conjunto de elementos
partindo do princípio que a análise de cada um dos elementos, finitos, que a
constitui permite reconstruir o todo. Esse modelo permitiu inegáveis avanços e não
pode deixar de ser reconhecido, mas essa visão reducionista se revela insuficiente
se levarmos em consideração a complexidade das relações entre os sujeitos em
diferentes contextos.

A organização do conhecimento da forma tradicional apresenta uma tendência ao


monodisciplinar, a fragmentação levando a uma compreensão de recortes específicos e
restritos do contexto que está inserido e onde concentra seus conhecimentos adotando
uma perspectiva metodológica que divide o objeto de estudo para estudar seus elementos
constituintes e, posteriormente, recompor o todo. A principal limitação desse tipo de
abordagem é que se estabelece uma ideia de finitude, desconsiderando a multiplicidade
e complexidade de fatores envolvidos no processo.

Isso significa que esse modelo analítico está em crise? Não, significa que, com todos os
avanços, o contexto histórico e social que nos encontramos e os novos desafios, hoje é
uma abordagem insuficiente se levarmos em consideração todos os fatores citados. É
necessário reconhecer os resultados e todo progresso que este modelo proporcionou,
no entanto, a tendência reducionista e mecanicista levou a uma hiperespecialização e
ao consequente isolamento quase completo das disciplinas. Como resultado temos uma
realidade parcelada, compartimentos, mecanicista e reducionista, uma prática que
rompe a complexidade em fragmentos disjuntos, fracionando os problemas e tornando
unidimensional um contexto multidimensional.

De uma maneira geral temos uma prática institucionalizada que permitiu grandes
avanços e conquistas, mas não é suficiente para lidar com a complexidade das relações
que criou. Um modelo, método ou prática que não responde às necessidades de uma
comunidade entra em crise e dá lugar ao surgimento de novas práticas. Para refletir
sobre os conceitos estudados até o momento temos o fragmento de um texto,
talvez um dos mais críticos, sobre as consequências da constante especialização e
suas implicações.

21
UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

A leitura do fragmento do texto de Ortega y Gasset para refletir:

Dantes os homens podiam facilmente dividir-se em ignorantes e


sábios, em mais ou menos sábios ou mais ou menos ignorantes.
Mas o especialista não pode ser subsumido por nenhuma destas
duas categorias. Não é um sábio porque ignora formalmente tudo
quanto não entra em sua especialidade; mas também não é um
ignorante porque é um “homem de ciência” e conhece muito bem
a pequeníssima parcela do universo em que trabalha. Teremos
que dizer que é um sábio-ignorante - coisa extremamente grave
– pois significa que é um senhor que se comportará em todas as
questões que ignora, não como um ignorante, mas com toda a
petulância de quem na sua especialidade, é um sábio. ” (ORTEGA y
GASSET, 1929: pp.173-174)

É um dos textos mais radicais e críticos sobre a ciência moderna, no entanto, notem a
data que foi escrito – para quem achava que estávamos discutindo um tema recente,
em construção e com pouco referencial teórico. Isso evidencia que os pensadores desse
período já se preocupavam com o rumo que a ciência estava tomando:

Que horizontes alcançariam com esses métodos?

O resultado nós sabemos. A análise do contexto atual e o maior embasamento teórico


permite entender a fragilidade desses saberes disciplinares distanciados uns dos outros
e propor alternativas aos saberes e fazeres desse modelo.

Até o momento temos uma discussão ampla sobre o modelo e as práticas interdisciplinares
e ao processo de formação, divisão e especialização das disciplinas.

»» Mas qual o impacto na área da saúde?

»» Qual a influência na prática profissional?

Todos os conceitos e contextualização são importantes para entender e estabelecer um


marco teórico. A influência na prática profissional e o impacto na área da saúde estão
intimamente relacionados a esse contexto, nossa formação foi baseada em todos os
conceitos e princípios estudados até o momento, logo, uma prática e exercício profissional
baseado na unicausalidade, tecnicista, biologista, individualista e curativista reflete
todo o processo de formação de profissionais da área de saúde. A atenção é direcionada
a sujeitos individuais e suas unidades morfológicas, essa abordagem exclui a síntese
entre o sujeito e o contexto, uma visão mais holística sobre o processo de saúde e doença.

O problema é que nessa síntese temos todos os conceitos, que são reproduzidos, e
impedem uma prática mais flexível que leve em consideração a diversidade, complexidade

22
INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

e contexto multidimensional do sujeito. Não esqueçam que podemos e devemos levantar


discussões no sentido de implementar novas abordagens nas práticas profissionais diárias,
a interdisciplinaridade é um processo em construção, ainda não há uma metodologia
específica, um conceito único, temos um contexto complexo que exige novas práticas
visando uma atenção integral ao sujeito o que nos leva a reflexão.

Devemos ainda lembrar que somos sujeitos ativos nesse processo, estamos inseridos no
contexto social e histórico atual e é essencial que uma abordagem que supere o esgotado
modelo vigente. Assim se faz necessário um esforço nesse sentido para obter práticas
mais participativas e integradoras, principalmente no sentido de levantar problemas,
analisá-los e propor soluções, onde dentro de um contexto em saúde uma importante
ferramenta é o levantamento de um diagnóstico situacional em saúde.

Vale destacar que, o conceito e compreensão de diagnóstico situacional na área


da saúde pode ser considerada como uma importante ferramenta que auxilia na
identificação dos problemas e das necessidades dentro de um contexto social,
podemos exemplificar as necessidades de promoção à saúde como educação,
saneamento, segurança, transporte, habitação e assim conhecer como está a
organização dos serviços de saúde.

Dentro desse sentido, para entender como esse processo se desenvolveu na área da
saúde é necessário um breve estudo sobre como o ensino da Medicina no Brasil.
Como a maioria dos cursos relacionados à área da saúde que foram influenciados e
seguiram diretrizes do ensino médico, apresentam disciplinas e algumas metodologias
em comum é essencial entender o processo de institucionalização que levaram a
formação de profissionais e sua atuação na sociedade.

O ensino das ciências médicas no Brasil será abordado a partir do final da década de 1970
quando houve uma reformulação universitária e o modelo de ensino médico no Brasil
passou a ser fundamentado nos princípios baseados na reforma flexneriana. A reforma
Flexner ocorreu em 1910, nos Estados Unidos e desencadeou um processo de profundas
transformações na educação médica e influenciou a estrutura de ensino baseado no
estudo Medical Education in the United Statesand Canada– A Reporttothe Carnegie
Foundation for the Advancementof Teaching, mais conhecido como Relatório Flexner.
Foi considerado como um grande reformista e transformador da educação médica, no
entanto, seus críticos consideram como o principal responsável pela consolidação de
um modelo de formação que nunca conseguiu atender ás necessidades da saúde e dos
indivíduos onde foi implantada. De fato, os conceitos estabelecidos em seu relatório
já estavam em curso e podemos fazer um paralelo com as principais correntes de
pensamento já estudadas.

23
UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

Para entender o motivo de um modelo que privilegia a formação científica de alto


nível, estimulando a especialização com um enfoque cientificista e com descaso ou sem
levar em consideração o humanismo é necessário recordar qual o conceito de saúde
estabelecida na época. Temos um contexto marcado pela predominância de doenças
infecciosas e altos índices de mortalidade, o conceito vigente de saúde era a ausência
de doença sem levar nenhum outro aspecto em consideração. Nesse conceito surge o
paradigma flexneriano que até hoje persiste e é fortemente atuante na prática.

Antes de apresentar os conjuntos de elementos que formam esse modelo é importante


entender o termo paradigma. Thomas Kuhn enfatiza e reconhece que o conhecimento
científico não é definitivo, mas apresenta uma estrutura e segue uma sucessão de
períodos. Podemos destacar pelo menos cinco períodos dessa estrutura:

1. Fase pré-paradigmática.

2. Fase paradigmática ou ciência normal.

3. Crise do paradigma.

4. Revoluções científicas.

5. Mudança de paradigma.

Vimos que existe uma estrutura e uma sucessão de períodos, mas qual a definição de
um paradigma?

Segundo Khun um paradigma é um conjunto de elementos culturais, conhecimentos,


códigos técnicos e teóricos compartilhados por membros de uma comunidade científica.
Esse paradigma responde às necessidades da comunidade científica e sua constituição
determina a existência de uma determinada ciência.

Os principais elementos presentes nesse paradigma se complementavam e


potencializavam levando a uma abordagem nas unidades morfológicas do sujeito,
individuais e sem relação com o coletivo. Sendo eles:

»» Mecanicismo: indivíduo considerado como uma máquina.

»» Unicausalidade: única causa para foco no processo patológico.

»» Tecnificação: especialização precoce.

»» Biologicismo: só leva em conta o processo de desenvolvimento da doença.

»» Individualismo: sem levar em consideração as particularidades do indivíduo.

»» Curativismo: foco no processo de cura da doença.

24
INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO │ UNIDADE I

Figura 6. Principais elementos do paradigma cartesiano/positivista.

Fonte: autor

Com a concepção prévia de conceito de saúde vigente baseado no curativismo, modelo


no qual a saúde é vista como ausência de doença, a busca por soluções possíveis e
aceitáveis, os passos para obtê-los foram estabelecidos baseados nos princípios
vigentes e temos uma abordagem caracterizada por uma concepção fragmentada e
reducionista. Ao assumir um paradigma se adquire um critério de escolha para os
problemas, perguntas e práticas. Seguindo uma analogia ao jogo de quebra-cabeça,
a pergunta de pesquisa, o problema, ou a prática partem do princípio de que todas
as peças estão necessárias encontram-se dentro da caixa, não é necessário buscar
nada além para encontrar uma solução. Com isso, a tendência é aumentar o grau de
aplicação dos conceitos vigentes.

Toda essa descrição pode dar uma falsa impressão de um processo de evolução
cumulativo de conhecimento. Contudo uma vez que o processo começa a entrar em crise,
o paradigma não responde as questões o modelo entra em crise e existe a necessidade
de um novo paradigma. A substituição de um paradigma por outro não ocorre de
forma simples e automática com a aceitação de uma nova abordagem, o processo não é
cumulativo e linear, o processo de evolução implica a perda ou substituição, completa
ou parcial, do conhecimento no período de crise. No entanto, quando o modelo entra
em crise a transição não ocorre de forma automática e natural, há uma competição entre
o antigo e o atual pela preferência da comunidade científica com diferentes concepções
do problema para fundamentar sua prática.

Essa transição não é simples porque implica em uma desconstrução de conceitos,


princípios e práticas que não respondem mais às necessidades e, simultaneamente,
uma reconstrução da área de estudo a partir de novos princípios e, consequentemente,
o abandono de velhas hipóteses alterando significativamente as práticas, métodos e
aplicação elementares do antigo paradigma.

25
UNIDADE I │ INTERDISCIPLINARIDADE E O CONHECIMENTO

Assim, o processo de evolução implica necessariamente em perda ou substituição, mas


algumas condições devem ser preenchidas pelo novo paradigma:

1. resolver problemas que o paradigma anterior não tenha conseguido resolver;

2. preservar uma parte substantiva do que foi construído anteriormente.

Assim o modelo flexneriano passou a ser associado a um ensino rígido que privilegiou
e estimulou a especialização profissional com um enfoque cientificista sem considerar
uma abordagem humanista.

Novos modelos vêm sendo elaborados com a ideia de formular um novo paradigma
que contrapõem o modelo reducionista, onde o modelo hospitalocêntrico surge com
a proposta de uma abordagem mais contextualizada aos novos desafios que surgiram.
Um modelo que busca a integralidade considerando as dimensões sociais, econômicas
e culturais. Assim a partir dos conceitos adquiridos até o momento podemos fazer uma
reflexão: Quais seriam as barreiras e fragilidades de uma estrutura interdisciplinar?
Qual impacto da estrutura de ensino implementada baseada na reforma flexneriana?

Foi possível compreender nesse capítulo o importante processo de construção do


conhecimento e ainda propomos algumas reflexões a creca do tema. Abordamos
a importância do conceito de saúde dentro do contexto da interdisciplinaridade,
onde foi possível perceber o a valorização dos modelos de atenção à saúde, sua
organização e desafios.

26
Compreendendo
o processo de Unidade iI
Humanização

Capítulo 1
Humanismo e processo de
humanização hospitalar

Até este capítulo, vimos que o modelo de atenção à saúde foi estruturado com base
no conceito de saúde, no qual a ausência de doença era considerada como sinônimo
de saúde. Isso conduziu a prática profissional a ser basear na unicausalidade e se
desenvolver de maneira tecnicista, individualista e curativista. A atenção foi direcionada
ao corpo biológico em detrimento da consideração da singularidade do sujeito e sua
inserção social. Este paradigma resultou em um processo de contínua fragmentação do
conhecimento e, consequentemente, com a especialização precoce, retroalimentação
esse processo.

O Homem sempre buscou uma forma de entender e de explicar a origem de suas


doenças, sabemos que dados históricos mostraram a importância e construção
de algumas importantes teorias, como a miasmática, substituída posteriormente
pela teoria de que a doença ocorria em decorrência das alterações do meio
ambiente e a maneira como o homem vivia. Os estudos de Louis Pasteur
trouxeram a Teoria da Unicausalidade, com a descoberta dos vírus e bactérias
portanto, do agente etiológico. Com o passar dos anos a após estudos surge
assim a teoria da multicausalidade como fator determinante e condicionante de
doenças e não apenas a presença exclusiva de um agente etiológico, e finalmente,
uma série de outros estudos e conhecimentos provindos principalmente da
epidemiologia social.

Vale enfatizar que a epidemiologia está, também, preocupada com a evolução e o desfecho
da história natural das doenças nos indivíduos e nos grupos populacionais, em que a
aplicação dos princípios e métodos epidemiológicos no manejo de problemas encontrados
na prática médica com pacientes, levou ao desenvolvimento da epidemiologia clínica.
Assim a epidemiologia se desenvolveu a partir do estudo dos surtos de doenças

27
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

transmissíveis e da interação entre agentes, vetores e reservatórios. A descrição das


circunstâncias associadas ao aparecimento de epidemias nas populações humanas,
como nas guerras, migração, fome e desastres naturais, tem aumentado a capacidade
de controlar a dispersão das doenças transmissíveis por meio da vigilância, prevenção,
quarentena e tratamento.

À medida que as questões foram ficando mais complexas e as estratégias de resolução


ineficazes e pouco resolutivas, surgiu um novo paradigma baseado no conceito ampliado
de saúde, que assume o sujeito em todas as suas dimensões: modelo biopsicossocial.
O paradigma integralista busca uma atuação mais contextualizada focado na saúde,
e não exclusivamente na doença, e considerando as dimensões sociais, econômicas, e
culturais dos sujeitos envolvidos para formatar uma estrutura mais harmônica.

Portanto, uma reflexão mais complexa e crítica do processo saúde e doença só poderá
ser alcançada com a formação de um profissional de saúde com:

Visão sistêmica e integral do indivíduo, família e comunidade, um


profissional capaz de atuar com criatividade e senso crítico, mediante
uma prática humanizada, competente e resolutiva que envolve ações
de promoção, de proteção específica, assistencial e de reabilitação. Um
profissional capacitado para organizar, desenvolver e avaliar ações que
respondam às reais necessidades da comunidade articulando os diversos
setores envolvidos na promoção da saúde (CADERNOS DE ATENÇÃO
BÁSICA, 2000, p.9).

No contexto hospitalar, temos alguns fatores que tornam o cenário mais complexo.
Um ambiente destinado ao atendimento de pacientes críticos, que necessitam de
cuidados especializados e de alta complexidade submetidos a mudanças súbitas no
quadro clínico, a alta complexidade tecnológica e um ambiente tenso caracterizam um
ambiente com uma dinâmica pouco favorável para reflexões. Temos um ambiente de
isolamento, profissionais que convivem diariamente com o pronto atendimento, morte
e a tensão de todos os fatores associados.

A prática desenvolvida no ambiente de unidade de terapia intensiva expõe os profissionais


envolvidos a uma série de dilemas éticos e morais relacionados a conduta e a estrutura
encontrada na maioria dos serviços de saúde. A tomada de decisões conflitantes,
podemos citar como exemplo a escolha de qual paciente será atendido, a escassez
de materiais e recursos e a relação entre os profissionais podem levar a e contribuir
para uma despersonalização do atendimento ao paciente. Não podemos esquecer de
acrescentar a esse contexto a presença e a relação de familiares ou acompanhantes com
o paciente, os membros da equipe e ao ambiente.

28
Compreendendo o processo de Humanização │ UNIDADE II

Até o momento parece improvável qualquer reflexão sobre um atendimento humanizado,


levando em consideração todos os aspectos e dimensões do indivíduo. Isso nos leva a
algumas questões:

Como criar um ambiente propício para que os aspectos biopsicossociais sejam


contemplados como preconiza o paradigma da integralidade?

Outra questão é como superar a/as barreiras do paradigma positivista ou flexneriano


em um local que exige grande especialização dos profissionais envolvidos devido a
complexidade das situações enfrentadas?

Existe uma forma de implementar prática humanizadas em um ambiente com as


características já descritas?

Que estratégias podem ser adotados para uma prática com múltiplos olhares visando um
exercício profissional harmonizado com as múltiplas dimensões da existência humana?

Parece um paradoxo, uma discussão contraditória. Como responder essas questões de


forma satisfatória e, além de responder ou ficar somente no aspecto teórico, aplicar,
incorporar nas práticas diárias de uma equipe de saúde?

A resposta a essas questões será abordada nos parágrafos seguintes. Lembrando que
se trata de um processo em constante construção e por esse motivo não teremos uma
única resposta ou uma estrutura comum de definições. Partimos com os conceitos
adquiridos até o momento e proponho uma reflexão, um posicionamento crítico a todos
os argumentos fechados em apenas uma definição.

Se voltarmos aos conceitos estudados anteriormente, podemos responder esses


questionamentos com certa facilidade, no entanto, é uma questão complexa e sua
implementação na prática profissional apresenta algumas peculiaridades. Quando um
paradigma não responde mais às necessidades, a prática começa a apresentar lacunas
e o modelo entra em crise, surge outro modelo que vai tentar responder e preencher as
lacunas. Como vimos isso não ocorre de uma maneira simples, no entanto, permite a
construção de novos conceitos, novas abordagens, novas disciplinas e consequentemente
práticas que vão seguir o modelo. Se levarmos em consideração que as fronteiras
do conhecimento e das áreas são imprecisas, que todas as dimensões do indivíduo
constituem um desafio ao exercício profissional. Emerge o conceito de humanização,
de um exercício profissional ancorado em princípios e práticas humanísticas e
humanizadoras e a necessidade de ações pautadas na interdisciplinaridade para
englobar todas as dimensões necessárias para uma prática integralista.

29
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

A aparente ambiguidade e oposição dos termos e das práticas relacionadas com


a superespecialização e, seu contraponto, práticas integrativas associadas a uma
estrutura interdisciplinar começa e ser dissipada. Na realidade, temos que levar em
consideração o fato da necessidade dessa especialização para lidar com esse tipo de
situação e ao mesmo tempo buscar formas de responder aos anseios e necessidades
de todos os sujeitos envolvidos. A saúde apresenta múltiplas facetas e a união desses
conceitos permite uma harmonização das dimensões do sujeito, lembrando que as
fronteiras estabelecidas são imprecisas e, ao invés de ser um impedimento pode ser
uma oportunidade para essa prática integrada.

Uma demanda da saúde emerge nesse contexto:

A humanização e a promoção da qualidade do atendimento à saúde para superar as


barreiras e desafios do ambiente hospitalar.

Devemos, nesse sentido fazer uma reflexão sobre a importância desse tema
Humanização, o que ele nos traz, uma vez que nos parece absolutamente
natural “ser humano”. Contudo o tema vem sendo cada vez mais discutido,
principalmente em virtude da necessidade hoje de resgatarmos valores éticos
perdidos ao longo dos anos.

Essa demanda surge de uma situação crítica e delicada, a hospitalização, é um evento


traumático com diversos fatores que expõe a vulnerabilidade, fragilidade do ser humano
e da condição que se encontra. Vulnerabilidade em todas as dimensões levando em
consideração o paciente, familiares, os profissionais envolvidos e a estrutura disponível.
Todo esse cenário ganha contornos especiais e torna a situação mais complexa quando
se trata de um acontecimento que acomete uma criança, isso implica uma grande
mudança na rotina de toda a família. A exposição a um ambiente estressante, onde não
há muitas orientações ou uma rede de apoio, é uma experiência difícil e uma das únicas
fontes de segurança é a presença dos pais.

No sentido de mudar esse panorama e tentar uma abordagem mais humanizada, o


Estatuto da criança e do Adolescente, em 1990, apresenta um artigo que preconiza que os
estabelecimentos de saúde deverão proporcionar condições de permanência adequada
para um dos pais ou responsável nos casos de internação de crianças ou adolescentes.
Se levarmos em consideração o tempo que toda essa discussão ocorre e as iniciativas
de implementar práticas mais humanizadas podemos considerar que levou um tempo
para um posicionamento oficial e o início de uma organização nos serviços de saúde que
atendam às necessidades dos indivíduos.

A partir disso, o cuidado em pediatria não significava apenas cuidar da criança com
ênfase na doença. O processo de cuidar, assistir, acolher deve abarcar outros fatores e

30
Compreendendo o processo de Humanização │ UNIDADE II

dimensões da criança. Neste processo é considerado o universo e a estrutura familiar,


considerando as configurações possíveis, do indivíduo, dessa forma a criança mantém
os sujeitos que representam uma referência fundamental em sua vida.

Esse momento representa um avanço para implementação de um cuidado mais


integral, no entanto nos defrontamos com disparidades de conceitos, experiências
e abordagens acerca do que vem a ser a experiência de hospitalização, o hospital e a
permanência na unidade de terapia intensiva e o conceito persistente e ainda vigente
que desconsidera a condição e a complexidade humana do paciente que, muitas vezes,
é tratado como uma máquina com algum tipo de problema em uma de suas partes e
deve receber passivamente tudo que lhe é imposto. A urgência de encontrar estratégias
que proporcionem soluções e uma melhor atenção ao indivíduo é necessário e tem sido
pauta em diversas iniciativas.

Ao nível local, temos o Programa Nacional de Humanização da Assistência Hospitalar


(PNHAH), lançado pelo Ministério da Saúde no ano de 2000. A temática ganha
legitimidade e muda de status quando uma ação desse nível é proposta com objetivo
fundamental de aprimorar e aprofundar as relações entre os profissionais, pacientes e
familiares e também entre hospital e comunidade. A abordagem visa promover a assistência
à saúde, levando em consideração todas as dimensões do indivíduo sob um prisma
multifatorial e multicausal e reafirmando que cada faceta possui significado e importância.

Para alcançar os objetivos propostos, o referido programa, prevê várias formas de ação
com avaliação periódica da satisfação dos usuários e dos profissionais e envolve três
aspectos fundamentais:

1. capacitação permanente dos profissionais de saúde, proporcionar


condições para sua participação na identificação de problemas e apontar
formas de melhorar as condições de trabalho;

2. criar condições para a participação ativa do usuário na avaliação da


qualidade dos serviços;

3. incluir a participação da comunidade organizada em parceria com agentes


públicos em ações de apoio e acompanhamento do serviço.

Essas medidas tem o objetivo de aprimorar as relações entre os profissionais e usuários


e entre o hospital e comunidade atuando no campo das interações sócio comunitárias
visando a melhoria do atendimento e qualidade dos serviços prestados.

Buscando um atendimento humanizado associado ao reconhecimento dos direitos


do paciente, de sua subjetividade e referências culturais. E implica a valorização do

31
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

diálogo entre profissionais para articulação de estratégias que melhorem as condições


de trabalho.

Essa iniciativa tenta responder, em partes, as demandas da saúde relacionadas a


democratização das relações que envolvem o atendimento, melhor diálogo e melhoria
das relações entre profissionais e pacientes, e reconhecimento dos profissionais de
saúde e pacientes como sujeitos ativos no processo terapêutico.

As mudanças não ocorrem de imediato e para a implementação de uma estrutura que


possibilite a aplicação e implementação de novos conceitos e práticas é necessário exploração
e investimento. No entanto, as possibilidades para uma prática pautada no reconhecimento
da singularidade e no diálogo com o paciente constitui um campo novo acompanhado de
todas as dúvidas e desafios que são características de processos um em construção.

Na avaliação do público, a forma do atendimento, a capacidade demonstrada


pelos profissionais de saúde compreender suas demandas e suas expectativas
são fatores que chegam a ser mais valorizados que a falta de médicos, a falta de
espaço nos hospitais, a falta de medicamentos… (MS, 2000).

Esse fragmento do documento oficial do programa Nacional de Humanização da


Assistência Hospitalar traz alguns elementos relacionados aos aspectos de relacionamento
com os profissionais de saúde. Podemos destacar um ponto central:

“Compreensão das demandas e expectativas…”


Uma das principais queixas identificadas e podemos relacionar com a organização
hospitalar. Se retomarmos os conceitos da unidade anterior, vimos que a organização e
constituição hospitalar foi historicamente marcada pela imposição de procedimentos e
decisões aos pacientes que sequer compreendem, esse distanciamento foi causado pela
objetividade positivista e sua neutralidade em face ao objeto de estudo. O indivíduo
não é o doente, mas o foco é a doença, o doente passa a ser visto como o corpo doente
sem levar em consideração as particularidades e a subjetividade do indivíduo. Assim
resgatar a humanidade no atendimento seria uma primeira etapa de aproximação para
atender os anseios dos indivíduos.

O quanto se conhece dos pacientes?

Podemos pressupor que os profissionais da saúde saberão ou poderão


corresponder as suas expectativas?

O que fazer quando o profissional julga saber o que é o melhor para o indivíduo
e tenta satisfazer essas expectativas?

32
Compreendendo o processo de Humanização │ UNIDADE II

Como e quais mecanismos podem dar voz ao paciente para facilitar a verbalização
de suas demandas?

Para responder essas questões podemos buscar o conceito ou o que é considerado como
tratamento humanizado que responda às demandas. Embora constitua o alicerce de
toda estrutura do programa e um amplo conjunto de iniciativas, o conceito humanização
na assistência ainda carece de uma definição clara e precisa.

Uma definição que se aproxima de humanização na assistência definida, levando


em consideração o que é descrito no documento, como a capacidade de oferecer
um atendimento de qualidade, articulando avanços tecnológicos com um bom
relacionamento entre os sujeitos envolvidos no processo de atenção á saúde. Levando
em consideração as características individuais e o contexto social que estão inseridos.

Se analisarmos essa definição podemos notar que se aproxima de uma diretriz de


trabalho que busca um modelo hospitalar centrado no diálogo e na possibilidade de
comunicação entre os sujeitos envolvidos. Buscando construir uma rede de significados
compartilhados diminuindo as barreiras comunicacionais dessa interação.

Lembrar que a interação entre os sujeitos é influenciada pelo contexto social e cultural,
organizando um conjunto de referências compartilhadas que podem contribuir para a
construção de um modelo de saúde que permita ações que respondam às expectativas
centradas na ética no diálogo e na negociação dos sentidos e rumos.

Essas ações podem levar a constituição de novos parâmetros para ação introduzindo
mudanças na cultura de assistência a saúde.

No entanto, devemos refletir sobre a forma que podemos atuar e transformar


uma cultura, somente com investimento na formação e capacitação dos
profissionais de saúde é suficiente para atingir os objetivos?

É muito importante refletir sobre o papel do Ensino Superior, da capacitação dos


profissionais de saúde, e qual o propósito dos cursos superiores nesse contexto.

Que tipo de relação se estabelece e quais os impactos na sociedade?

Para responder essa questão sugiro a leitura do texto: “Rethinking higher


education and its relationship with social inequalities: past knowledge, present
state and future potential” disponível em: <https://www.nature.com/articles/
s41599-017-0001-8>.

No artigo “Rethinking higher education and its relationship with social inequalities:
past knowledge, present state and future potential” temos algumas questões relevantes

33
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

e um ponto importante é a ênfase na necessidade dos institutos de formação superior


servirem a uma necessidade pública para atender ao desenvolvimento intelectual
individual e, principalmente, à progressão social.

Convém destacar que, esses conceitos estão presentes no processo de humanização


na assistência a saúde. Para que o processo seja possível a participação de sujeitos
críticos é essencial. Temos uma proposta de ensino que integra a emancipação, com o
objetivo de repensar estruturas sociais, organizar modelos que reflitam as necessidades
e ansiedades dos indivíduos. Após a leitura do texto podemos entender a importância
do processo de formação dos profissionais de saúde e que esse é um dos elementos para
responder as questões relacionadas com o atendimento humanitário.

34
Capítulo 2
Atendimento humanizado

Antes de abordarmos o tema Atendimento Humanizado, cabe lembrar alguns dados


históricos na construção dos Sistemas de Saúde Pública e Saúde Suplementar dentro
do Estado Brasileiro. Muitas são as dimensões com as quais estamos comprometidos:
prevenir, cuidar, proteger, tratar, recuperar, promover, enfim, produzir saúde.
Muitos são os desafios que aceitamos enfrentar quando estamos lidando com a defesa
da vida, com a garantia do direito à saúde. Desafios que muitas vezes passam não
somente pela esfera governamental de organização, mas também pelo próprio contexto
social onde o usuário do sistema de saúde está inserido e ainda a relação e vinculo que
esse usuário tem com sua unidade e equipe de saúde.

Assim, nesse contexto de desenvolvimento e construção do Sistema Único de


Saúde e de mudanças na organização da Saúde Suplementar, acompanhamos
avanços que nos alegram, novas questões que demandam outras respostas,
mas também problemas que persistem sem solução, impondo a urgência seja
de aperfeiçoamento do sistema, seja de mudança de rumo.

No Brasil ainda sabemos que existem:

»» profundas desigualdades socioeconômicas;

»» dificuldades no acesso aos serviços e aos bens de saúde;

»» desvalorização dos trabalhadores de saúde;

»» expressiva precarização das relações de trabalho;

»» baixo investimento num processo de educação permanente desses


trabalhadores;

»» pouca participação na gestão dos serviços;

»» fragilidade no vínculo entre trabalhadores da área da saúde e os usuários.

Com isso alguns aspectos chamam a atenção quanto a avaliação dos serviços de saúde,
em que ainda existe um despreparo dos profissionais para lidar com a dimensão
subjetiva que toda prática de saúde supõe, a presença de modelos de gestão centralizados
e verticais desapropriando o trabalhador de seu próprio processo de trabalho e falta de
maturidade emocional de gestores. Nesse sentido existe um cenário que indica, então,
a necessidade de mudanças no modelo de atenção que não se farão sem mudanças no

35
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

modelo de gestão na qual a Política Nacional de Humanização da Atenção e Gestão no


Sistema Único de Saúde veio para propor mudanças.

A Política Nacional de Humanização vem, desde de sua criação, trabalhando com


algumas diretrizes, para que seja possível sua implementação nos diferentes níveis de
atenção, sendo:

Ampliar o diálogo entre os profissionais, entre os profissionais e a


população, entre os profissionais e a administração, promovendo
a gestão participativa. Implantar, estimular e fortalecer Grupos de
Trabalho de Humanização com plano de trabalho definido. Estimular
práticas resolutivas, racionalizar e adequar o uso de medicamentos,
eliminando ações intervencionistas desnecessárias. Reforçar o conceito
de clínica ampliada: compromisso com o sujeito e seu coletivo, estímulo
a diferentes práticas terapêuticas e corresponsabilidade de gestores,
trabalhadores e usuários no processo de produção de saúde (BRASIL,
2004, pg.12).

O objetivo ainda é o de sempre se promover uma nova cultura de atendimento na


saúde que apoie a melhoria da qualidade e eficácia dos serviços prestados por meio do
aprimoramento das relações entre:

»» trabalhadores da saúde;

»» usuários e profissionais;

»» hospitais e comunidade.

Nesse sentido a Humanização para o Ministério da Saúde, significa o mesmo que


humanização da assistência, como o aumento do grau de corresponsabilidade na
produção de saúde e de sujeitos e mudança na cultura da atenção dos usuários e da gestão
dos processos de trabalho. Para isso, a Politica segue alguns princípios norteadores
como: valorização da dimensão subjetiva e social em todas as práticas, valorização da
atenção e gestão em saúde, valorização de compromissos e responsabilização, estímulo
aos processos comprometidos com a produção de saúde e com produção de sujeitos e
ainda o fortalecimento do trabalho em equipe multiprofissional.

Por subjetividade podemos compreender que é o momento onde do indivíduo


evidencia sua opinião ou ainda, podemos dizer que é a relação que esse
indivíduo tem com o mundo externo e seu “interior”, resultando em marcas
singulares na formação do indivíduo quanto a construção de crenças e valores
compartilhados.

36
Compreendendo o processo de Humanização │ UNIDADE II

Nesse sentido vale enfatizar que a Humanização é a valorização dos diferentes sujeitos
implicados no processo de produção de saúde: usuários, trabalhadores e gestores.
Os valores que norteiam esta política são a autonomia e o protagonismo dos sujeitos, a
corresponsabilidade entre eles, o estabelecimento de vínculos solidários e a participação
coletiva no processo de gestão.

O problema é como colocar em pratica o que se espera da Política Nacional de


Humanização, em que na área da saúde o trabalho é também está caracterizado como
uma missão, pois não são poucas as exigências: trata-se de trabalho reflexivo que articula
dimensões técnicas, éticas e políticas, em cenários de múltiplos e diversos atores com
profissionais de formações diversas e usuários de todas as origens culturas e além disso,
trabalha-se no campo temático mais denso da experiência humana: a vida, o corpo,
a morte.

Com isso, devemos considerar que a qualidade da atenção e a assistência humanizada


devem estar presentes desde o momento em que o usuário chega no serviço de Saúde
ou seja desde o primeiro contato com as portas de entrada dos sistemas de saúde,
seja ele público ou privado, onde devemos repensar sobre como deve ser o acesso
aos serviços, pois chamamos esse primeiro contato com os usuários dos serviços
de acolhimento.

Assim para um atendimento humanizado e acolhedor, devemos agregar profissionais


com conhecimento de saúde, com capacidade de compreender as dimensões humanas
do adoecimento da população e exercer de fato a escuta de suas necessidades. Pois acima
de tudo ser acolhedor é saber ouvir, escutar e dar a melhor resposta.

Nesse contexto, vale ressaltar que o acolhimento pode ser considerado uma importante
ação, pois traz a possibilidade de mudanças na relação do profissional e usuário com
sua rede social, utilizando ferramentas de cunho técnico, ético, humanitário e de
solidariedade. Vale lembrar que dessa forma é possível reconhecer o usuário como
sujeito e participante ativo no processo de produção da saúde, uma vez que o acolhimento
atende a todos que procuram os serviços, ouvindo seus pedidos e assumindo uma
postura capaz de acolher, escutar e dar a resposta mais adequada ao usuário.

Para um atendimento humanizado e acolhedor é necessário:

Figura 7.

DAR A MELHOR
ouvir escutar
RESPOSTA

Fonte: autor.

37
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

Ouvir refere-se ao sentido da audição, onde a pessoa ouve apenas, mas pode ou
não interpretar o processo de comunicação e escutar requer mais que ouvir, ou
seja, a pessoa deve prestar atenção ao o que se está sendo discutido, entender
do que se trata, perceber o que foi falado e assim opinar.

É importante criar espaços legítimos de fala e escuta, que devolvam


à palavra sua potência reveladora e transformadora. Na relação do
profissional com o paciente, a escuta não é só um ato generoso e de boa
vontade, mas um imprescindível recurso técnico para o diagnóstico e a
adesão terapêutica. Na relação entre profissionais, esses espaços são a
base para o exercício da gestão participativa e da transdisciplinaridade
(RIOS, 2009, pg12)

Surge nesse sentido a importância do acolhimento como tecnologia de ação, que é


a concentração de atividades com o objetivo de se ampliar a capacidade de escuta e
resolutividade, por meio do uso de tecnologias relacionais de informações, o que
chamamos de conhecimentos específicos, ou ainda de conhecimentos técnico/científicos,
o que de forma logica leva a uma competência profissional.

Atendimento Humanizado em ambiente


Hospitalar
A atenção Hospitalar é caracterizada por suas várias dimensões que se inter-relacionam,
construindo assim a assistência hospitalar, onde as mais relevantes são: dimensão
assistencial, dimensão gerencial, dimensão administrativo/financeira, dimensão ensino
e pesquisa e dimensão social. Assim vale destacar que o trabalho em um ambiente
hospitalar diante dessas variáveis torna-se desafiador e complexo.

Vamos nesse sentido discutir e refletir sobre a importante dimensão assistencial, que
envolve a forma de organização tecnológica do trabalho hospitalar. Devemos ainda nessa
dimensão considerar o modelo clínico aplicado, principalmente em virtude da dinâmica
e constantes mudanças na tecnologia hospitalar. Com isso o grande desafio colocar em
prática a integralidade do cuidado ao indivíduo, promovendo articulação do trabalho das
diversas equipes e ao mesmo tempo promovendo a humanização do cuidado, ou seja,
uma qualificação das relações entre equipes de saúde e usuários do sistema, com base em
valores como respeito às singularidades e defesa dos direitos dos usuários.

Considerando as variáveis, sustentabilidade financeira, responsabilidade social e a


responsabilização das três esferas de governo com os sistemas de saúde no Brasil, foram
necessárias mudanças, transformações e principalmente readequações do papel dos
hospitais dentro da Rede de Atenção à Saúde. Nesse sentido, vale lembrar que, hoje o
38
Compreendendo o processo de Humanização │ UNIDADE II

Sistema Único de Saúde e a Saúde Suplementar por meio dos Planos de Saúde trabalham
sob a regulamentação de políticas próprias na gestão desses equipamentos em Saúde.

Acesse o endereço eletrônico a seguir e leia matéria sobre o papel dos hospitais
na Rede de Atenção a saúde.

Disponível em: <http://www.conass.org.br/biblioteca/pdf/revistaconsensus_11.pdf>

Assim, uma preocupação real para a gestão hospitalar tem sido a forma de relação de seus
trabalhadores e seus usuários. Com isso o tema Humanização Hospitalar vem ganhando
força e se transformando em uma ação importante e presente no processo de trabalho
diário dentro das Instituições Hospitalares. Contudo sabemos que para o aprimoramento
do processo de trabalho, esse deve estar pautado no respeito e na valorização das
pessoas, tornando as ações de assistência hospitalar muito mais humanizada. Nesse
sentido ainda, importante lembrar que programas de humanização fazem parte dos
contratos de gestão entre as Instituições Públicas e organizações sociais, onde as ações
de humanização dentro do ambiente hospitalar estão estabelecidas como meta. Dessa
forma o gestor hospitalar deve conscientizar-se sobre a necessidade de organização dos
serviços fundamentada em programas e ações de Humanização Hospitalar.

Como humanizar a assistência hospitalar se quando entramos dentro de


algumas Instituições ainda nos deparemos muitas vezes com regras, orientações
e principalmente horários pré-estabelecidos para visitas aos pacientes?

Vale destacar que, para o bom funcionamento das Instituições Hospitalares é necessário
sim estabelecer algumas regras, contudo é sabido que se a gestão busca ações de
humanização para a organização do serviço, essas regras devem ser constantemente
avaliadas. O paciente que se encontra em regime de internação e também seus
familiares esperam sempre ter problema de saúde resolvido. O problema é que sem um
acolhimento adequado por parte dos profissionais que representam a Instituição, os
conflitos certamente ocorrerão. Contudo sabemos e como já dito anteriormente, que a
Instituição Hospitalar é muito complexa em regras e normas, criando assim, uma certa
dependência dos pacientes com os profissionais onde o paciente percebe, por vezes,
que perdeu a sua individualidade e privacidade. Assim a solução para esse problema é a
implantação de ações dentro da Política e programas de humanização, considerada uma
importante estratégia de gestão hospitalar e comprometida com a defesa da vida, onde
todos os sujeitos, gestores de saúde, trabalhadores e usuários devem estar envolvidos.

Importante destacar que ações com base em programas de humanização tem como
proposta a troca de saberes que inclui os trabalhadores da saúde, seus usuários e
principalmente os gestores. Com isso, dentro das Instituições Hospitalares se faz

39
UNIDADE II │ Compreendendo o processo de Humanização

necessário aprimorar a forma de comunicação dos sujeitos envolvidos, onde para


que as mudanças ocorram com foco na Humanização, o objetivo é a construção de
soluções compartilhadas.

Assim a Política Nacional de humanização quando instituída, colaborou muito para a


área hospitalar, pois veio para estimular a comunicação entre gestores, trabalhadores
e seus usuários na construção e aprimoramento de novos processos de trabalho,
tornando assim praticas mais humanizadas e acolhedoras. Portanto, humanizar a
assistência hospitalar requer estratégias e a utilização de mecanismos que permitam a
participação de gestores, trabalhadores e usuários. Portanto, os gestores responsáveis
por Instituições Hospitalares devem estar preparados para entender a importância da
inclusão de seus trabalhadores na gestão dos serviços sob sua responsabilidade.

Cabe a partir desse momento, enfatizar alguns dos princípios norteadores da Política
Nacional de Humanização (PNH) que, como dito anteriormente, quando utilizados
como estratégia de gestão, podem colaborar com a melhoria e construção de uma
assistência hospitalar humanizada, são eles:

»» transversalidade – busca transformar as relações de trabalho a partir da


ampliação do grau de contato e da comunicação entre as pessoas e grupos;

»» indissociabilidade entre atenção e gestão – trabalhadores e usuários


devem buscar conhecer como funciona a gestão dos serviços, assim como
participar ativamente do processo de tomada de decisão nas organizações
de saúde;

»» protagonismo, corresponsabilidade e autonomia dos sujeitos – qualquer


mudança na gestão é mais concreta se construída com a ampliação da
autonomia das pessoas envolvidas, que compartilham responsabilidades;

»» acolhimento – o acolhimento deve acontecer por meio de uma escuta


qualificada oferecida pelos trabalhadores às necessidades do usuário;

»» ambiência – criar espaços saudáveis, acolhedores e confortáveis, que


respeitem a privacidade, propiciem mudanças no processo de trabalho e
sejam lugares de encontro entre as pessoas.

A problematização dos modos de organização dos serviços de saúde,


dos hospitais em particular, sobretudo pelos efeitos negativos que
produzem nos sujeitos e nas práticas de cuidado, tem propiciado a
emergência de novas concepções sobre a gestão em saúde, que passa
a ser compreendida como um campo de experimentação de novos
processos de comunicação e de interação entre sujeitos, ampliando sua

40
Compreendendo o processo de Humanização │ UNIDADE II

lateralidade na direção da construção de um plano comum de ação.


Esse movimento tem favorecido a produção de uma série de inovações
em toda a rede SUS como a introdução de mudanças da arquitetura
dos serviços de saúde e a reorganização de seus processos de trabalho
(BRASIL, 2013, p. 37).

Foi possível compreender nesse capitulo a importância sobre o conceito de


humanismo e seu contexto histórico, bem como foi possível ainda compreender
sobre as principais teorias que acompanharam todo esse processo. Aprendemos
sobre o conceito de humanização e sua importância dentro do ambiente
hospitalar e como se deu ao longo dos anos esse processo de construção e relação
social. Foi apresentada a Política Nacional de Humanização (PNH) enquanto
forma legal de gestão na melhoria da assistência dentro na atenção à saúde e
como a gestão hospitalar pode se utilizar dessa política no aprimoramento dos
processos de trabalho. Identificamos que mecanismos e estratégias podem ser
utilizados pelos gestores hospitalares dentro de programas de humanização
hospitalar. A Política Nacional de Humanização pode ainda ser implantada não
somente em Instituições Públicas, mas também serve de incentivo e referência
para Instituições hospitalares dentro do sistema de saúde Suplementar.
Percebemos a importância da ambiência hospitalar, enquanto espaços de
acolhimento e bem-estar para os usuários.

41
Humanização
e Trabalho Unidade iII
Interdisciplinar na
Assistência Pediátrica

Capítulo 1
Construção de um processo
interdisciplinar de humanização

Neste capítulo, vamos unir os conceitos relacionados a interdisciplinaridade e práticas


humanitárias de atendimento à saúde. O objetivo é levantar algumas questões,
retomar conceitos e fazer uma reflexão crítica sobre o processo, suas possibilidades
de implementação e quais as limitações ou barreiras para levar esses conceitos para a
prática profissional.

Sabemos, para que um trabalho interdisciplinar seja possível devemos considerar


alguns aspectos importantes como: reconhecer as funções e responsabilidades
de cada profissional dentro da equipe, ter a habilidade de compartilhar
informações, saber compreender os procedimentos e condutas de cada área ali
envolvida, levantar problemas e compartilhar soluções, tudo isso utilizando-se
as estratégias e mecanismos da humanização.

É muito importante recordar os principais pontos abordados até o momento para


entender e buscar construir conceitos para atender as diversas perspectivas teóricas
que o tema exige e transformá-las em prática.

Para atender uma proposta com todos os elementos característicos e essenciais de


um projeto interdisciplinar é necessário buscar formas possíveis da integração dos
profissionais envolvidos. Lembrando que a interdisciplinaridade não se resume
a simples presença de diversos profissionais em um mesmo espaço, é necessário
criar uma estrutura em torno de um projeto ético sustentado pela base teórica
metodológica que contemple as novas perspectivas paradigmáticas e as transforme
em ações concretas.

42
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

No final do capítulo anterior temos um texto sobre o ensino superior, em geral os estudos
mostram a importância de iniciar a construção e a inserção dos temas relacionados a
interdisciplinaridade na formação profissional. Enfatizam que é essencial o incentivo
às práticas interdisciplinares nas universidades e instituições de ensino superior com
propostas de formação acadêmica híbrida, incorporando gradualmente os conceitos
básicos para uma profissionalização mais complexa que atenda as demandas e desafios
do contexto social atual.

Mais uma vez temos os termos demandas, contexto social e complexidade.


A frequência desses termos mostra uma perspectiva da complexidade que temos que
lidar, o reconhecimento dessa complexidade e do contexto social em que se desenvolve
permite resgatar e reconhecer as diversas dimensões dos indivíduos envolvidos
no processo.

Essa forma de organização nos leva a uma quebra parcial das identidades profissionais e
das especialidades propiciando formas mais complexas de organização e a possibilidade
de construção de dispositivos e formas de atendimento que não se limitem a concepção
tradicional de atenção à saúde foca no processo curativista em que o foco principal é
a doença e sua cura sem levar em consideração as múltiplas facetas e dimensões do
indivíduo e o contexto que está inserido.

Até o momento a discussão está centrada na formação dos profissionais de saúde, uma
possível alteração dos currículos como solução para o problema da fragmentação e
impessoalidade no processo de ensino. Supondo que essa mudança será incorporada
na prática profissional.

Mas é muito importante destacar que somente uma mudança na formação é


insuficiente, temos que levar em consideração a estrutura e a gestão hospitalar e,
um dos pontos mais importantes, o indivíduo que busca ou é atendido pelos serviços
de saúde.

Como mudar toda uma estrutura se não temos nem uma definição precisa sobre
interdisciplinaridade e humanização?

Como implementar um conceito teórico complexo nas práticas profissionais?

Uma reconstrução não é tarefa fácil, se lembrarmos do processo e das etapas que
ocorrem para a substituição de um paradigma vigente. Temos um processo que envolve
uma resistência inicial, o estabelecimento de novas metodologias e práticas exige
comprometimento, reflexão e um ambiente sustentável para a prática.

43
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Cabe enfatizar que o processo de ensino aprendizagem principalmente nas


Instituições de Nível Superior, devem pensar na organização de um currículo
escolar de forma a atender questões da atualidade, pois é necessário reconhecer
as mudanças sociais, estruturais e exigências pertinentes de cada profissão.
Lembramos que, para a organização de um currículo de Nível Superior é
necessário seguir a Lei de diretrizes e Bases Nacional (LDB).

Uma abordagem interdisciplinar pode ser considerada uma fonte de inovação e uma
forma plausível para responder problemas complexos. Apesar de décadas, vimos que
não é um tema recente, de discussão e teorização sobre interdisciplinaridade e suas
possibilidades inovadoras, os possíveis impactos na sociedade em longo prazo incluindo
os usuários finais no processo para garantir que suas necessidades sejam atendidas
ainda não temos uma estrutura que possibilite essa atuação. Talvez pela resistência
dos indivíduos, pela formação baseada nos princípios positivistas, na dificuldade de
estruturar uma metodologia que abarque todos os aspectos e nas relações entre os
profissionais envolvidos.

Em síntese temos diversos elementos que contribuem para uma prática melhor, mas
as barreiras são persistentes. Esse é um ponto importante, as barreiras não se limitam
somente há relação entre as disciplinas ou os profissionais envolvidos. Temos que levar
em consideração que ao estreitar as fronteiras novos conceitos surgem e é necessária
uma nova organização. Essa “nova organização” está muito distante ou já temos um
esboço de ações voltadas para uma prática interdisciplinar?

Qual curso hoje não tem algum elemento interdisciplinar?

Ficando somente no campo da formação, temos uma grade curricular que estimula o
debate. Neste curso estamos discutindo o tema e buscando novas formas de organização
e práticas. Mas analisem de forma crítica, de acordo aos conceitos estudados e
respondam se isso é suficiente e se realmente estamos em uma prática interdisciplinar
ou é uma prática mais semelhante a uma abordagem multidisciplinar? Para ilustrar
e relembrar um ponto importante observe as figuras a seguir e reflita: Na primeira
imagem temos um esquema da organização na qual se tem a impressão de um processo
que vai se desenvolvendo, uma continuidade. O pluri ou multidisciplinar implica em
uma coordenação, passas uma noção de conjunto, estabelece algum tipo de relação, mas
não existe uma combinação. Essa relação pode levar ao mesmo sentido, mas não temos
pontos de convergência. Podemos observar que a prática inter implica diretamente
em uma combinação. É uma estrutura que requer convergência uma combinação do
conjunto de forma ordenada.

44
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Figura 8. Esquema dos estágios de organização.

COORDENAÇÃO PLURIDISCIPLINARIDADE

COMBINAÇÃO INTERDISCIPLINARIDADE

FUSÃO TRANSDICIPLINARIDADE

Fonte: autor.

Na segunda imagem fica claro o conceito de ir na mesma direção relacionado a prática


multi ou pluri, paralelismo, e a convergência relacionada a prática interdisciplinar.
Infelizmente, na maioria dos casos, nós temos uma abordagem multidisciplinar que
se confunde com a abordagem interdisciplinar. Um dos motivos é que a associação
entre a atuação de diversos profissionais no mesmo sentido caracteriza uma prática
interdsiciplinar.

As ilustrações são interessantes para notar a diferença entre estar no mesmo sentido
e estar em convergência. A discussão vai ser limitada a multi/pluridisciplinaridade e
interdisciplinaridade em entrar em detalhes sobre transdisciplinaridade.

É importante lembrar que, um dos requisitos para a prática interdisciplinar é interação


participativa, conexa e com objetivos comuns. Inclui a participação e pactuação de
objetivos comuns a um grupo de campos do saber conexos com intensa troca de entre os
sujeitos. Dessa maneira introduz a noção de finalidade maior que redefine as fronteiras
disciplinares, os limites internos dos campos originais lavando a mudanças estruturais
gerando enriquecimento mútuo e a interação dos sujeitos.

Em outras palavras: uma reunião para discutir um caso clínico entre os profissionais
contribui para avaliar qual a melhor conduta. No entanto, se analisarmos com mais
detalhes temos uma estrutura hierárquica entre os sujeitos, existe um objetivo comum,
mas as trocas são relacionadas a uma estrutura burocrática. Não existe um estreitamento
nas relações, as relações de poder persistem e as fronteiras entre os profissionais são
bem delimitadas.

45
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Figura 9. Esquema representando as interações nos processos.

PARALELISMO Coordenação
Pluridisciplinaridade

PERSPECTIVISMO/
/CONVERGÊNCIA
Combinação
Interdisciplinaridade

HOLISMO/ Fusão
/UNIFICAÇÃO Transdiciplinaridade

Fonte: autor

Essa revisão dos conceitos foi necessária para rever pontos importantes e relembrar
que apesar de uma ampla teorização e a possibilidade de implementar os conceitos na
prática clínica ainda temos diversas barreiras.

»» A primeira delas é uma definição de conceito e a segunda, tema do


capítulo, é como fazer interdisciplinaridade?

»» Quais os requisitos para a construção de um processo interdisciplinar?

O problema é que ainda encontramos dificuldades em responder essas questões.


Estudos relacionados ao tema são esclarecedores nesse ponto, existem tentativas de
um conceito ou de estruturar um projeto, mas não há nenhum consenso, receita ou
metodologia específica para afirmar que seguindo todos os passos estará estruturando
um processo interdisciplinar. É um tema que levanta mais questões e reflexões do que
respostas por ser um processo em construção, temos alguns elementos que são essenciais
para fundamentar e implementar uma prática interdisciplinar. Temos convicções que
um novo modelo é necessário para responder aos desafios, as demandas sociais cada
vez mais complexas e as necessidades dos indivíduos envolvidos.

Contudo, sabemos a importância de refletir sobre esse tema interdisciplinaridade,


mas qual caminho seguir para essa construção e ainda, como sair da teoria e ir para a
prática de um processo interdisciplinar. Um passo importante é sem dúvida conhecer
o que essa teoria nos traz e exercer, métodos, objetivos, desafios e assim refletir sobre a
construção de um trabalho interdisciplinar.

46
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Para que uma ação interdisciplinar em saúde ocorra existe uma condição
importante, a socialização de conceitos e de conhecimentos de todas as
áreas envolvidas. Dessa forma é possível a construção de novas propostas de
tratamento e conduta clínica, para cada caso, tornando a assistência à saúde mais
humanizada e resolutiva, facilitando a comunicação da equipe multidisciplinar.
Contudo para que o trabalho interdisciplinar ocorra algumas condições são
necessárias para a inclusão da interdisciplinaridade, ou seja, os gestores precisam
investir no trabalho em equipe interdisciplinar, a equipe de profissionais precisa
aprimorar relações, com ela própria, com os pacientes e familiares.

A área da saúde, em alguns momentos, pode parecer um paradoxo. Precisamos


da especialização, isso permitiu um grande avanço no tratamento de doenças, no
desenvolvimento tecnológico, mas estamos em um momento que não é mais suficiente
uma abordagem centrada no curativismo.

Como vemos, o processo de humanização no atendimento hospitalar é outro fator.


Agora temos dois conceitos que não apresentam uma definição clara, mas são a
demanda de uma nova estrutura que busca um cuidado holístico do indivíduo. Requer
a implementação de um processo reflexivo acerca dos princípios éticos e práticas para
obter um tratamento digno, solidário e acolhedor. Que envolva todas as dimensões dos
indivíduos envolvidos, respeitando suas individualidades e levando em consideração
seu contexto social.

Geralmente, o termo humanização vem acompanhado de interdisciplinaridade.


Isso ocorre porque problematizar o tema, e todas as facetas, implica em uma
reflexão crítica sobre princípios e valores que norteiam a prática dos profissionais,
retomando conceitos anteriores, lembrem-se que o objetivo é capacitar profissionais
para torná-los sujeitos e agentes de transformação do processo. Por isso, o aspecto
interdisciplinar, a prática direcionada a um atendimento humanista são a resposta de
uma necessidade e problemática comum, isso pode ser interpretado e será alcançado
com mudanças estruturais que vão gerar reciprocidade, enriquecimento mútuo
levando a relações com uma tendência à horizontalidade e alterando as relações de
poder entre os sujeitos envolvidos.

Para chegar até esse ponto foi fundamental compreender a dimensão histórica que
todo o processo se desenvolveu, e que todo o processo se desenvolveu, mesmo com
resistências, por meio do diálogo reflexivo. É importante refletir que, o diálogo permite
a problematização, o desafio e uma possível alternativa para transformação de uma
realidade, não é um ato passivo, pelo contrário exige que entre em campos inexplorados
para compreender as necessidades do outro, entender o contexto histórico e social que

47
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

o processo se desenvolve, requer um conhecimento prévio da realidade profissional


e pessoal.

Essa postura será crucial para entender a dinâmica profissional que se desenvolve em
um processo de constante transformação. Um profissional que conhece o contexto social,
histórico e institucional tem a capacidade de construir, visualizar e encontrar estratégias
de ação para enfrentar os problemas e, consequentemente, práticas mais humanizadas.

Perceber a realidade profissional e organizacional em sua verdadeira forma, dinâmica,


instável, mutável, e não como um conceito pronto e estático torna a prática mais
integral, ou seja, o sujeito percebendo a totalidade e a dinâmica no processo pode atuar
baseado em uma visão sistêmica, integrada, porque entende que as partes permanecem
em constante interação. O compromisso com a humanização no âmbito hospitalar
requer um constante processo de ação e reflexão. O conformismo com situações vividas
diariamente pode levar ao distanciamento das práticas humanizadoras.

Sabemos que a frase “sempre fiz assim, não vou mudar” ainda faz parte do
pensamento de alguns profissionais dentro de Instituições Hospitalares,
dificultando no dia a dia do trabalho dos serviços o avanço de novas propostas
para melhoria, principalmente quando se pensa em implantar ações de
humanização. Podemos dizer que enfrentar esse tipo de desafio com a equipe
de trabalho é um dos obstáculos que os gestores enfrentam quando decidem
investir na Humanização do serviço de saúde e qual seria a melhor medida para
minimizar esse tipo de problema e provocar mudanças no serviço?

Podemos usar como exemplo uma ação que ocorreu em 2013, na ala de oncologia
pediátrica, hospital A.C Camargo, que foi decorada com super-heróis e as embalagens
utilizadas para a quimioterapia foram cobertas com cápsulas temáticas dos super-heróis
escolhidos pelas crianças. O objetivo, a ideia principal, é que ao receber uma superfórmula
se tornarão mais fortes para combater o “vilão”. Houve uma ressignificação da
experiência, uma maneira de abordar uma situação complexa de forma lúdica e
humanizada. Mudando a concepção de abordar o tema quimioterapia e transformando
o remédio em algo bom, isso pode trazer diversos benefícios para a criança, o estímulo
a sua imaginação, explorar o lado lúdico e sentir que faz parte de algo em um ambiente
hostil é uma grande diferença de uma abordagem tradicional.

Trouxe esse exemplo porque, muitas vezes, falar sobre interdisciplinaridade e


humanização parece uma utopia. Algo inalcançável, no entanto, existe diversas ações
orientadas por esses princípios que obtém bons resultados levando em consideração as
dimensões dos indivíduos, saindo da abordagem clássica focada no curativismo e em
um modelo hospitalocêntrico, e tornando-os sujeitos ativos no processo.

48
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Esse tema deixa mais questões do que conclusões. Não podemos esquecer que é um
processo em construção, apesar do tempo que remontam as discussões, somente agora
alguns espaços estão sendo ocupados. Podemos observar um aumento de programas
de pós-graduação abordando o tema interdisciplinaridade e se pensarmos no propósito
da universidade, dos institutos superiores de formação, relacionado à transformação
é provável que esse processo avance cada vez mais. Muitas questões irão surgir,
metodologias e formas para responder aos anseios e algumas serão substituídas, é
importante ter essa noção de continuidade e de mudanças constantes nas necessidades
das comunidades envolvidas para melhor atendê-las.

49
Capitulo 2
Humanização no ambiente de trabalho

Para iniciarmos nossa discussão sobre a humanização no ambiente de trabalho, cabe


enfatizar a importância do tema ambiente organizacional, ou seja, o que está fisicamente
instalado e instituído como, equipamentos, móveis, decoração e ainda seu quantitativo
de recursos humanos.

Devemos lembrar que, a arquitetura hospitalar tem como objetivo principal


adequar as instalações físicas para que pacientes e funcionários sintam‑se
em segurança, uma vez que hospital é um lugar para a promoção da saúde e
prevenção de riscos ocupacionais, essencialmente a infecção hospitalar. Assim a
arquitetura hospitalar busca, dentro de uma legislação específica, adequar os
ambientes de forma eficiente no sentido de promover fluxos adequados que
facilitem os processos de trabalho.

Cabe lembrar que, quando discutimos sobre humanização no ambiente de trabalho


devemos enfatizar o conceito de ambiência, que para a Política Nacional de Humanização
tem referência ao espaço físico, social e profissional, ainda o espaço de relações
interpessoais, onde o objetivo é promover uma ação acolhedora e resolutiva. Dentro da
PNH ainda podemos destacar as principais diretrizes da ambiência:

»» a Ambiência como espaço de encontros entre os sujeitos;

»» o espaço como ferramenta facilitadora do processo de trabalho;

»» o espaço que visa à confortabilidade.

Em relação à ambiência como facilitadora do processo de trabalho, podemos exemplificar


uma enfermaria de Pediatria, onde a organização das áreas como enfermarias, posto
de enfermagem, brinquedoteca, sala de reuniões, devem ser lembrados no momento
de implantação ou de reforma do serviço, uma vez que essa atitude pode facilitar ou
prejudicar a demanda de necessidades das crianças internadas e processos de trabalho
da equipe multidisciplinar.

Vejamos alguns relatos de experiências projetuais de Ambiência:

Quando uma das paredes de uma enfermaria pediátrica (Santa Casa de


Limeira/SP) foi pintada de amarelo ‘ouro’ e as demais harmonizadas
com cores quentes e frias, quebrando o ambiente monocromático e sem
expressão, percebeu-se que as crianças responderam positivamente

50
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

sendo estimuladas pelas cores – o local acabou por se constituir num


ponto de atração dentro da enfermaria (BRASIL,2017, p. 26)

O problema é que ainda encontramos em algumas Instituições Hospitalares ambientes


que estão em desacordo com exigências legais em relação e metragem, disposição
de salas e principalmente aquém da necessidade de acomodação para as equipes de
trabalho. Devemos ressaltar que, isso traz no dia a dia de trabalho stress para as equipes
e prejuízo aos processos de trabalho, impactando na assistência hospitalar.

Estamos falando de confortabilidade, pois não podemos discutir ambiência sem citar
e associar ao conceito de confortabilidade, que é buscar criar um ambiente favorável
não somente para a saúde do usuário, mas principalmente para o bem-estar dos
trabalhadores. Importante lembrar que, alguns trabalhadores da área hospitalar
passam muitas vezes até doze horas dentro de um mesmo setor desempenhando suas
funções, assim a confortabilidade deve existir para que o trabalhador desempenhe
adequadamente suas atribuições, não somente dentro de aspectos ergonômicos/legais,
mas também dentro de aspectos de humanização e conforto.

Cabe enfatizar que, a ergonomia é a ciência que estuda todos os aspectos


que envolvem a saúde do trabalhador e principalmente as condições laborais.
O objetivo é desenvolver mecanismos para que o trabalhador se sinta confortável,
seguro e produtivo no exercício de suas funções. A ergonomia trabalha muito
com medidas preventivas, diminuindo a ocorrência de acidentes e doenças
do trabalho. Vários estudos nessa área já comprovaram que procedimentos
ergonômicos, quando adequadamente aplicados, contribuem de forma
satisfatória para na diminuição do stress, cansaço e doenças ocupacionais do
trabalhador.

Outros aspectos, ainda dentro da ambiência e confortabilidade devem ser considerados


quando estamos discutindo um ambiente de trabalho humanizado, podemos citar alguns:

»» iluminação – deve ser adequada a atividade realizada no ambiente;

»» cheiro – cheiros agradáveis em um ambiente evita experiências traumáticas


tanto para pacientes com trabalhadores;

»» som – também deve ser adequado a atividade a que se propõe o serviço,


sabemos que o excesso de ruído no ambiente hospitalar é hoje um grande
desafio para os gestores;

»» cor – no geral temos a ideia de que cores claras devem sempre fazer parte
de um ambiente hospitalar, contudo devemos adequar as cores com o
tipo de atividade realizada;
51
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

»» privacidade – esse é um aspecto que deve ser sempre considerado


durante o atendimento ao paciente hospitalizado e também na saúde de
seus trabalhadores.

Outro tema de relevância quando discutimos ambiente de trabalho humanizado é o tipo


de gestão dos serviços de saúde e como dito anteriormente, para a Política Nacional de
Humanização e principalmente para programas de atenção a assistência hospitalar, o
que é preconizado é a gestão compartilhada.

O problema é que em muitas instituições hospitalares o que ainda existe são desenhos
organizados e representados por meio de organogramas que indicam diversas áreas e
cada uma com um responsável, com cargos de chefia ou coordenação. Assim, pensar em
uma gestão participativa é sem dúvida propor grandes mudanças não somente na forma
como está desenhada a linha de mando de uma Instituição hospitalar, mas também e
principalmente como deveriam seus processos de trabalho ocorrer.

Sabemos da necessidade dentro das Instituições Hospitalares de uma ordem e


organização dos serviços, onde a linha hierárquica pode por vezes estabelecer uma
relação de fragmentação na relação dos responsáveis por cada um dos serviços ali
desenhados. É comum a separação das áreas dentro de um ambiente hospitalar,
tanto física como de relação interpessoal. Assim quando estamos falando de ações
humanizadas dentro de uma Instituição Hospitalar, existem propostas de integração e
promoção de intercâmbio entre todos os setores do Hospital.

Estabelecer um organograma institucional e linhas hierárquicas dentro da Instituição


é importante, contudo os gestores precisam promover um alinhamento e conexão
entre todos os setores, até porque os usuários dos serviços hospitalares passam por
vários setores para atendimento e resolução do seu problema em saúde, cabendo aos
trabalhadores adequar às informações e aprimora os processos de trabalho fortalecendo
assim um ambiente humanizado, tranquilizador e seguro.

Devemos lembrar que organograma é uma representação gráfica, ou seja,


um desenho da estrutura hierárquica de uma Instituição, demonstrando
claramente todas as áreas envolvidas e quem são seus responsáveis, bem como
suas atribuições. No caso de hospitais públicos, a definição do organograma
é de responsabilidade das secretarias de saúde, municipal ou estadual e para
hospitais privados a responsabilidade de definição do organograma fica com o
conselho diretor.

52
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Figura 10. Organograma Institucional.

DIRETOR
PRESIDENTE

DIRETOR DIRETOR
ADMINISTRATIVO CLINICO

SETOR DE SERVIÇO DE SERVIÇO


FINANÇAS ALMOXARIFADO MEDICO

Fonte; autor.

A Política Nacional de Humanização traz uma proposta importante em relação à gestão


dos serviços de saúde, é preciso que se tenha um olhar centrado no trabalho coletivo,
garantindo uma tomada de decisão compartilhada frente aos problemas encontrados,
qualificando assim a assistência à saúde prestada e minimizando os conflitos do
cotidiano do trabalho em saúde.

Contudo sabemos que, esse tipo de gestão ainda é um grande desafio para muitos gestores
dentro das Instituições Hospitalares, pois são Instituições onde encontramos diversas
categorias profissionais e que desempenham suas funções de forma autônomas, isso em
virtude não somente da formação acadêmica, mas também da lei do exercício profissional
que rege cada profissão. Lembramos que, muitos Hospitais preocupados com a Política
de qualidade interna e o cumprimento de metas, divulgam incessantemente a missão
da Instituição, contudo sabemos que isso ainda não é o suficiente para aprimorar a
comunicação entre as equipes e aprimorar os processos de trabalho.

Nesse sentido, cabe ressaltar a importância do perfil do gestor hospitalar, em que sua
forma de liderança deve permitir condições para que os processos de trabalho estejam
articulados de maneira a garantir os resultados esperados, na qual cada trabalhador
reconheça sua importância e responsabilidade nesse processo a tomada de decisão
compartilhada. Assim, podemos citar uma técnica para aprimorar os processos
de trabalho e principalmente a forma de comunicação entre as equipes, os momentos de
reflexão e discussão dos profissionais envolvidos.

53
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Uma importante estratégia que possibilita a criação de espaços de discussão e


reflexão no ambiente de trabalho é a educação permanente em saúde. Não somente
por constituir um projeto político-pedagógico com vistas à transformação das
práticas de saúde e do trabalho em equipe, mas principalmente por abrir espaço
de aprendizagem no trabalho, onde o aprender e o ensinar se incorporam ao
cotidiano das organizações e ao trabalho. O objetivo da educação permanente
em saúde é refletir sobre a prática, realizando um diagnóstico e planejar as
ações de saúde de acordo com as necessidades do contexto, transformando as
práticas cotidianas, os processos de trabalho e as relações. Cabe lembrar que,
esses espaços de discussão são físicos, mas também espaços sociais.

Contudo sabemos que, o gestor em saúde deve repensar sobre seu verdadeiro papel dentro
das Instituições Hospitalares e buscar alternativas que auxiliem, colaborem e abram
caminho para a gestão compartilhada e assim humanizar os processos de trabalho.

Um facilitador de educação permanente em saúde é um sujeito com


habilidades para mediar os processos de gestão do trabalho e articular
diferentes componentes, como a participação social, a formação dos
trabalhadores e a organização do cuidado, sua atribuição principal é
o olhar crítico sobre as práticas de atenção, gestão, ensino e controle
social, deve estar aberto para o encontro entre diferentes saberes,
permitindo a troca e a construção coletiva de respostas aos problemas
de saúde. A roda de conversa é uma proposta de produção de coletivos,
permitindo a construção de novas práticas de gestão, em que as
decisões são horizontalizadas, os arranjos engendrados coletivamente
e as responsabilidades divididas e compartilhadas (NESPOLI;
RIBEIRO, 2011).

Acesse disponível em: <http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_


nacional_humanizacao_pnh_folheto.pdf>.

Fique sabendo mais sobre mecanismos da Humanização e sobre o conceito de


gestão participativa e formas de implantação.

Outro tema também importante para ser discutido em relação a um ambiente de


trabalho humanizado é sobre os direitos dos usuários das Instituições hospitalares.
Vale ressaltar a importância de se criar e principalmente de se manter um vínculo social
com o paciente e seus familiares durante o período de internação, sendo essa uma
condição facilitadora de adesão do paciente ao tratamento proposto, onde muitas vezes
alguns procedimentos realizados no pratica diária do hospital deve ser continuado no
domicilio do paciente.

54
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Portanto, a relação que se constrói entre equipe multidisciplinar, pacientes e familiares


tem um reflexo não somente no período de internação, mas também na recuperação e
continuidade do tratamento na assistência domiciliar. Assim os acompanhantes devem
ser vistos como colaboradores no tratamento de pacientes hospitalizados. Contudo
sabemos que é comum conflitos entre acompanhantes e equipe de saúde em virtude do
nível de preocupação e stress do familiar, onde a própria equipe relata que as vezes um
acompanhante requer mais atenção do que o próprio paciente.

Assim, uma ação importante é por meio da equipe multidisciplinar que presta
assistência direta ao paciente internado, realizando um levantamento de informações
das condições físicas e emocionais do familiar em permanecer ao lado do paciente
como acompanhante e participativo do tratamento. Devemos lembrar que, tanto para
hospitais públicos do Sistema Único de Saúde como para hospitais do Sistema de Saúde
Suplementar. Existem legislações e programas que norteiam e regulamentam os direitos
de usuários e acompanhantes. Podemos citar como exemplo a Política Nacional de
Humanização que em 2007 cria a cartilha de visita aberta e direito de acompanhantes
dentro do Sistema Único de Saúde e ainda, dentro da Saúde Suplementar os Hospitais
conveniados por meio de suas políticas internas de qualidade, cada vez mais
aprimoram e investem em programas de orientação quanto a horários de visitas e a
permanência de acompanhantes durante o período de internação do paciente, uma vez
que essa ação também valoriza os hospitais quanto a conquista de selos de qualidade e
acreditação hospitalar.

Citamos a seguir um relato registrado na Cartilha de Humanização do Ministério


da Saúde de 2013,

“Quando eu vou poder cortar a unha do meu bebê?”. Essa pergunta


foi feita por uma mãe em uma manhã na principal maternidade
de alto risco do Maranhão e não apenas feita, mas ouvida e
respondida por uma equipe multidisciplinar de saúde, pois uma
vez por semana, mães que tiveram seus filhos no hospital, têm a
oportunidade de participar de reuniões coletivas onde é possível
esclarecer dúvidas de todos os tipos sobre o cuidado e a saúde de
seus bebês.

A reflexão diária sobre algumas situações dentro do ambiente hospitalar é um


mecanismo que muitas vezes se faz necessário, pois pode favorecer não somente o
paciente internado, mas principalmente o vínculo que se cria com seus familiares,
criando um grau de confiança maior na equipe de saúde.

Assim podemos ainda enfatizar que, como dito anteriormente, o Programa de Humanização
da Assistência Hospitalar, trouxe como proposta uma importante iniciativa na tentativa de

55
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

acolher usuários e trabalhadores para a construção e fortalecimento dessa relação. Esse


programa apresentou como objetivo principal a humanização dos serviços e das pessoas
envolvidas, priorizando alguns aspectos como:

»» capacitação permanente dos profissionais de saúde;

»» criação de condições para a participação ativa do usuário na avaliação da


qualidade dos serviços;

»» participação da comunidade como parceira em ações de apoio e


acompanhamento dos serviços.

Com a crescente demanda de serviços nas unidades hospitalares, avanço da tecnologia


hospitalar, novos sistemas de informação e principalmente a ocorrência com que
surgem novos protocolos clínicos, fica cada vez mais difícil de compreender como
a equipe multidisciplinar irá conseguir adequar à assistência de forma harmônica e
humanizada. Contudo sabemos da importância da valorização de todos os profissionais
que compõe a equipe de trabalho em um ambiente hospitalar, não somente por parte
de gestores, mas também por parte de cada membro da própria equipe.

Foi possível observar nesse capítulo sobre a importância de se construir e


manter um ambiente humanizado, as ações e mecanismos que podem ser
colocadas em pratica no dia a dia de uma unidade hospitalar, onde os benefícios
podem ser percebidos não somente por pacientes e seus familiares, mas
principalmente pelos profissionais de saúde. Percebemos a importância de se
aprimorar e promover situações de reflexão do processo de trabalho com base
na Humanização.

56
Capítulo 3
A assistência pediátrica sob olhar da
humanização e interdisciplinaridade

A princípio nos parece difícil de compreender e associar os temas assistência pediátrica,


humanização e interdisciplinaridade, que relação existe entre seus conceitos e que
reflexão podemos fazer na associação desse conhecimento e sua utilização na prática
diária da assistência hospitalar. O objetivo aqui é aprofundar nosso conhecimento e
fazermos uma discussão sobre cada um desses três conceitos e assim realizarmos uma
reflexão sobre ações que podem colaborar e qualificar os processos de trabalhos nos
serviços de internação em Pediatria. Vamos discutir inicialmente sobre a assistência à
criança hospitalizada.

A hospitalização, seja ela eletiva ou dentro de uma condição de urgência/emergência,


sempre é vista com muita preocupação e ansiedade por parte de pacientes e familiares,
no caso de crianças existe uma situação ainda mais complexa, pois envolve toda
uma mudança de rotina na vida desses pequenos pacientes, onde o medo e o choro
podem ser frequentes no dia a dia do período de internação e assim, não somente
pelo aspecto legal, mas principalmente pelo aspecto de segurança e tranquilidade
da criança a presença dos pais ou cuidadores responsáveis devem fazer parte do
processo de internação e tratamento. Portanto, enxergamos esses acompanhantes
como integrantes do processo de hospitalização. De uma forma geral quem assume o
papel de acompanhante permanente da criança durante o período de internação é a
própria mãe.

A partir da permissão legal, com base no Estatuto da Criança e


do Adolescente, da presença de acompanhante junto à criança
hospitalizada, os profissionais de saúde das unidades de internação
pediátrica passaram por processo de readaptação, aprendendo a se
relacionar diretamente com esse novo sujeito, dividindo atividades
assistenciais e, também, gerando cuidado diante das necessidades de
acompanhantes (FIGUEIREDO et al, 2013, p.691).

Para muitas mulheres ter um filho hospitalização representa uma experiência difícil e
de muito sofrimento. Esse sofrimento pode estar relacionado não somente a condição
de saúde instável do filho hospitalizado, mas também ao fato de ter deixado outros
filhos que ficaram em casa ou até mesmo afastamento do emprego. São muitas histórias
e relatos que a equipe de saúde vivencia no dia de uma criança internada.

57
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Para a criança, principalmente aquelas em período escolar, uma internação hospitalar


tem um significado de mudanças traumáticas, isso se dá em virtude não somente
da dor pela própria doença e o medo de estar em outro ambiente, mas também pelo
afastamento do lar, da escola, dos amigos e dos brinquedos. Assim esse novo ambiente,
a unidade de internação, precisa ser o mais seguro, acolhedor possível e ainda o mais
próximo de sua rotina diária de vida.

Cabe nesse contexto citar o exemplo do serviço de enfermagem pediátrica


que em muitos hospitais seguem protocolos assistenciais para a segurança da
criança internada e a promoção de não conformidades, são eles:

»» higiene correta das mãos antes e após cada procedimento realizado;

»» implantação do check-list cirúrgico pediátrico;

»» cumprimento de todos os passos para o preparo e administração de


medicamentos;

»» utilização de bomba de infusão inteligentes, por enfermeiras pediátricas


para reduzir as não conformidades na administração de medicamentos
e prevenção de riscos.

Assim, criança e acompanhante se deparam, durante o período de internação,


com muitas normas, rotinas e orientações, pois normas, rotinas e protocolos são
instrumentos utilizados pelos trabalhadores da equipe de enfermagem e do serviço
médico com o objetivo de organizar processos de trabalho, uma vez que são esses os
profissionais que demandam uma maior carga horária de assistência ao lado da criança
e seu acompanhante.

Contudo, sabemos que surgem conflitos entre a equipe multidisciplinar e acompanhantes,


em virtude do número de informações e intervenções técnicas aplicadas a criança
hospitalizada. Podemos citar aqui crianças que permanecem em Unidades de Terapia
Intensiva e que necessitam receber um maior número de intervenção terapêutica para
recuperação e estabilização clínica. Para muitos pais essa relação pode representar uma
imposição de normas dentro do ambiente hospitalar revelando uma fragilidade por
parte da criança e acompanhante e de poder por parte das equipes de saúde. Em alguns
casos podemos até encontrar acompanhantes que se calam, não referindo queixas ou
duvidas por medo de represálias ou prejuízo ao tratamento de seu filho.

É muito importante promover uma relação de harmonia entre a equipe de saúde, criança
e seu acompanhante, pois normas e rotinas são necessárias, mas podem ser flexibilizadas
e muitas vezes repensadas. Para tal é necessário por parte da equipe medica, enfermagem

58
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

e outros profissionais a avaliação constante da relação social com os acompanhantes


de seus pequenos pacientes. Podemos assim chamar uma comunicação de qualidade
entre os profissionais de saúde e os acompanhantes de comunicação terapêutica ou
vínculo terapêutico, pois é capaz de gerar harmonia, confiança e tranquilidade para
as mães. Contudo algumas barreiras precisam ser identificadas e se necessário sofrer
intervenção com o objetivo de minimizar os conflitos e promover a comunicação
terapêutica, citamos a seguir algumas barreiras comuns que podem ocorrer durante o
processo de internação:

»» Baixa escolaridade das acompanhantes – nessa situação os profissionais


de saúde devem utilizar uma linguagem simples e de fácil compreensão.

»» Utilização de muitos termos Técnicos – deve ser evitada e transformada


em explicações preliminares na assistência à criança hospitalizada.

»» Rotatividade de profissionais de enfermagem e do serviço médico –


essa situação deve ser evitada por parte dos gestores e responsáveis por
confeccionar as escalas de trabalho, pois a alta rotatividade de profissionais
dificulta a construção do vínculo com a criança, acompanhante e equipe
de saúde e ainda pode gerar discordância entre os dados fornecidos por
diferentes profissionais.

Para superação desses osbstáculos é necessário a implantação não somente de ações


de humanização, mas também de um diálogo constante da equipe com a família e
uma gestão compartilhada para organização dos processos de trabalho dentro da
unidade pediátrica. Os profissionais de saúde dos serviços de pediatria devem também
receber com frequência treinamentos e orientações, pois a alta carga emocional não é
somente da criança e familiares, mas também da equipe multidisciplinar que vivencia
diariamente o sofrimento e angustias do binômio mãe e filho. Assim a equipe necessita
de atenção e tempo de reflexão sobre os problemas do dia a dia de trabalho. Podemos
citar alguns exemplos de hospitais que através dos núcleos de humanização implantam
os programas de “cuidando do cuidador”, que embasado pela educação permanente em
saúde, organiza espaços de reflexão para os trabalhadores.

Assim, família e acompanhante da criança hospitalizada devem ser respeitados e


valorizadas as relações que norteiam o ambiente hospitalar. A presença do acompanhante
durante a hospitalização é uma questão indiscutível, tanto para a criança quanto
para a equipe de saúde, contudo sabemos que dificuldades na relação equipe-família
sempre irão existir, porém é necessário a promoção de uma relação de harmonia para o
bem-estar da criança.

59
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Figura 11. Roda de relação.

Criança

Mãe

Médico

Fonte própria.

Cabe lembrar que esse processo de melhoria e direitos para a infância e juventude teve
início por meio da publicação em 1991 do Estatuto da Criança e adolescente – ECA.

Acesse o site da Sociedade Brasileira de Pediatria - www.sbp.org.br

Leia sobre a importância O Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, que é


considerado o marco legal sobre a consciência e o reconhecimento da criança
e do adolescente até dezoito anos como um sujeito de direitos, que tem
assegurado a prioridade absoluta como cidadão do país e a sua proteção como
dever da família, da sociedade e do Estado.

Seguindo esse raciocínio vamos associar a esse contexto a importância da humanização


como mecanismo facilitador da relação da equipe de saúde e acompanhantes ainda,
humanização como mecanismo de gestão para os serviços de atendimento infantil.
Lembramos que a Política Nacional de Humanização promove para os serviços de
pediatria condições para um cuidado seguro e humanizado. Porém vale destacar
que os serviços podem se valer não somente da Política, mas também de programas
e de experiências cientificamente comprovadas para garantia de uma assistência
humanizada.

Como dito anteriormente sobre as dificuldades encontradas pela criança, familiares e


equipe multidisciplinar durante o período de hospitalização, cabe a partir desse momento
ressaltar o quanto a humanização Hospitalar em pediatria pode significar o mesmo que
um cuidado prestado com respeito, dignidade e ternura às crianças hospitalizadas e
seus familiares, promovendo um ambiente harmonioso, transformando a relação entre
pacientes, familiares e profissionais menos formal, minimizando a dor e essencialmente
contribuindo para a sua cura, diminuindo o tempo de internação.

60
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Vamos dar início pelo processo de acolhimento em pediatria, lembrando que para os
pais que recebem a notícia da necessidade de internação de um filho, apresentam um
alto grau de ansiedade e preocupação. O primeiro contato da família e da criança com
a equipe do setor de internação deve ser o mais acolhedor possível, pois dessa forma
esse processo irá minimizar traumas e auxiliar no período de permanência no hospital.
Cabe enfatizar que, o momento da admissão na unidade de internação é considerado
um momento importante, contudo o mecanismo de acolhimento deve existir durante
todos os dias até o momento da alta hospitalar.

O acolhimento deve envolver a família e criança com o objetivo de esclarecer


dúvidas e aproximar a criança do processo terapêutico. Existem vários mecanismos
e instrumentos que podemos eleger como facilitadores do processo de acolhimento e
humanização durante o período de hospitalização. Cabe enfatizar ainda que, em termos
de espaço físico as unidades de internação em pediatria devem contar no mínimo com
brinquedotecas.

Brinquedoteca hospitalar – é um espaço físico dentro das unidades de internação


pediátrica, com amparo legal, seu objetivo principal é humanizar e promover
o lúdico. É considerado um momento de respeito ao brincar, pois o brinquedo
faz parte da vida da criança e não deve ser excluído durante o processo de
internação.

O direito de brincar deve ser preservado mesmo quando a criança está


no hospital. O recurso lúdico, nesse contexto, não representa apenas
um incentivo de diversão e entretenimento, mas uma alternativa
educacional, pois favorece o desenvolvimento social, emocional e
intelectual, e terapêutica, quando auxilia a diminuir o estresse, o
medo e a ansiedade. Outro aspecto importante do brincar é favorecer
a interação entre a criança e o adulto, observa-se que, de forma geral, a
pessoa com quem a criança brinca é a mesma a quem ela recorre quando
se sente assustada e necessita de ajuda, estabelecendo um vínculo de
confiança importante durante a hospitalização (KICHE; ALMEIDA,
2009, p. 126).

Dentro de uma Unidade Pediátrica as atividades lúdicas podem ser representadas por
meio dos jogos, brincadeiras, dança, música e até mesmo peças teatrais. Cabe enfatizar
que cada um deles deve promover sentimentos de alegria e prazer, pois é dessa forma
que a criança se sentirá acolhida durante o período de internação. O problema é que
mesmo com todas as vantagens do brinquedo terapêutico, sabemos que ainda existem
Instituições Hospitalares que encontram dificuldade para implantar ambientes com

61
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

brinquedoteca e a utilização do brinquedo terapêutico, vejamos alguns motivos que


impossibilitam esse processo:

»» falta de espaço físico adequado para organização da Brinquedoteca;

»» falta de capacitação e orientação profissional quanto a utilização e as


vantagens do brinquedo terapêutico;

»» déficit no dimensionamento da equipe multidisciplinar e tempo dispensado


na utilização do brinquedo como ferramenta para minimizar ansiedade e
sofrimento no período de internação.

Portanto, torna-se essencial a organização de um espaço para praticas do brincar


na estrutura física da Unidade e ainda a conscientização e capacitação da equipe
multidisciplinar quanto à importância do brinquedo terapêutico.

Estudos científicos já demonstraram as vantagens da utilização do brinquedo


terapêutico antes de procedimentos como punção venosa e curativos
pós-cirúrgicos. Enfermeiros capacitados e amparados por legislação própria
relatam experiências positivas quando, antes da realização desses procedimentos
usaram bonecas ou outros brinquedos para explicar o que seria feito, trazendo
para a criança mais tranquilidade e segurança.

Cabe ressaltar que, para a implantação da brinquedoteca como mecanismo de


humanização é importante um planejamento adequado com estudo prévio, reunião da
equipe multidisciplinar, cumprimento da legislação norteadora e até mesmo visitas em
Instituições hospitalares com mais experiência, pois trata-se de um processo que deve
seguir parâmetros éticos e legais para sua implantação e funcionamento.

Contudo vale lembrar que, o processo de humanização em uma Unidade pediátrica


deve ser compreendido não somente por meio da tecnologia, protocolos clínicos e a
utilização do brinquedo terapêutico, mas principalmente pela valorização da presença
materna, a boa comunicação com a equipe multidisciplinar e principalmente pelas
atitudes dispensadas durante o período de hospitalização da criança. Isso confere um
caráter humanizado no processo de assistência em pediatria. Importante destacar
ainda que, esses programas de humanização devem estar fortalecidos por atividades de
valorização do ser humano, como a criança hospitalizada, seu acompanhante e também
a equipe multidisciplinar.

Retornamos agora ao início desse nosso raciocínio sobre a importância na relação


da assistência pediátrica e humanização. Foi possível observar o quanto o cuidado às
crianças hospitalizadas sofre influência benéfica das ações de humanização durante o

62
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

período de internação. Porem, sabemos para que o processo de humanização ocorra


serão necessárias algumas transformações como, mudanças na visão dos gestores,
mudanças na própria estrutura física da Unidade de Internação Pediátrica, mudanças
nos processos de trabalho e conscientização da equipe multidisciplinar. Outro fator
relevante são as pesquisas de satisfação realizadas em serviços de atendimento infantil,
na qual o levantamento demonstra o quanto os acompanhantes valorizam ações de
humanização, pois para as mães a humanização é retratada em termos da qualidade do
relacionamento com a equipe de saúde, onde muitas vezes um pequeno cuidado, um
gesto de carinho retrata um ambiente acolhedor e humanizado.

Portanto, em virtude da importância do trabalho da equipe multidisciplinar na


assistência pediátrica é que podemos sem margem de duvidas associar o conceito da
interdisciplinaridade, como dito anteriormente. Ficou claro o quanto o papel da equipe
responsável pelos cuidados a esse pequeno paciente é relevante desde o momento
de chegada na unidade de internação, durante todo seu período de tratamento e
principalmente nas orientação e plano de alta. Não podemos esquecer que a assistência
pediátrica envolve desde recém-nascidos em unidades de tratamento intensivo até
crianças e adolescentes em idade escolar, portanto os serviços devem estar preparados
para adequar e implementar as ações conforme a demanda necessária.

Cabe lembrar que, existem nos serviços de assistência pediátrica as especialidades como
no cuidado do adulto, assim podemos exemplificar a importância de algumas como,
nefro pediatria, oncologia pediátrica, gastro pediatria. Todas essas subespecialidades
exigem dos serviços uma organização específica e própria, onde os gestores e equipes
de trabalho devem conhecer e respeitar não somente a assistência pediátrica mas tem
o que ela tem especificidade.

Sobre o tema Interdisciplinaridade cabe um momento de reflexão, considerando


os tópicos abaixo vamos direcionar nosso raciocínio para a assistência hospitalar
e principalmente nos serviços de Pediatria:

»» o trabalho interdisciplinar pode ser o caminho para o rompimento da


assistência hospitalar que ainda é considerada fragmentada;

»» o gestor Hospitalar precisa acreditar e investir mais na organização e


no trabalho interdisciplinar;

»» o profissional da saúde precisa durante o período de sua formação


discutir mais sobre a importância do trabalho interdisciplinar, isso
colabora muito na pratica hospitalar e na assistência pediátrica.

63
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Vale ressaltar, para que o trabalho interdisciplinar ocorra em um ambiente


hospitalar, existe uma variável importante que é a socialização de conceitos e de
conhecimentos das áreas envolvidas. Assim esse processo só será possível se existir
a proposta de construção de novos saberes. Esse é um facilitador para melhoria e
implantação de projetos terapêuticos inovadores e mais humanizados, uma vez que
facilita a comunicação da equipe e ainda é respeitado cada um de todos os casos dos
pacientes hospitalizados. Contudo, para que isso ocorra, alguns pressupostos são
necessários, como a institucionalização da interdisciplinaridade, ou seja, os gestores
precisam acreditar no trabalho em equipe interdisciplinar, cada membro da equipe
multidisciplinar precisa criar vínculos com ela própria, com os outros profissionais,
com pacientes e familiares.

Sabemos que ainda existe um o problema a ser resolvido, é que existem Instituições
Hospitalares onde o cuidado em saúde é realizado de forma fragmentada por meio
da assistência prestada por cada um dos profissionais da equipe isoladamente.
Podemos exemplificar aquela criança que durante todo seu período de internação
recebe tratamento e cuidados por parte dos serviços, médico, nutrição, enfermagem,
fisioterapia, psicologia e serviço social, porém toda essa assistência é realizada de forma
isolada, ou seja, por departamentos, seguindo uma linha vertical.

É necessário enfatizar que, ainda muitos hospitais nos dias de hoje, estão representados
em sua estrutura organizacional por organogramas com muitas linhas verticalizadas,
gerando vários departamentos e consequentemente isso possibilita a existência de uma
assistência mais fragmentada. Isso em virtude de modelos clássicos de gerenciamento
e administração de recursos humanos. Assim para a assistência pediátrica, se faz
necessária mudanças na gestão de recursos humanos.

A perspectiva de construção de organogramas mais horizontais, um


modelo de gestão mais participativo nestas instituições, implica em
reunir os profissionais naquilo que os mesmos têm em comum: o
objeto de trabalho, onde a atenção ao usuário, por meio da estratégia do
trabalho em equipe, é uma proposta capaz de reunir grupos profissionais
com interesses e lógicas de organização de trabalho diferenciadas, com
vistas à construção de uma proposta assistencial o mais consensual
possível (CAMELO, 2011)

Nesse sentido para que o trabalho em equipe aconteça dentro das Instituições
Hospitalares e principalmente na assistência pediátrica, isso só será possível quando
os profissionais que compõe a equipe multidisciplinar, construírem juntos estratégias
de interação e comunicação entre si, trocando conhecimentos e articulando ações para
a produção do cuidado aos pequenos pacientes, pois sabemos que mesmo com todas as
64
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

especificidades de um serviço de pediatria, ainda é possível uma interação dos membros


da equipe e a organização de estratégias para o trabalho interdisciplinar.

O problema é que ainda nos deparamos no dia a dia do cotidiano hospitalar com unidades
pediátricas que precisam amadurecer a ideia e propor discussões acerca do trabalho
interdisciplinar, pois muitos profissionais encontram dificuldades de compreendê-lo e
praticá-lo, em virtude da existência da forte cultura de uma assistência fracionada.

Podemos apontar como solução para esse problema, a reorganização de novos modelos
de assistência pediátrica hospitalar, onde os principais objetivos são: promoção de
novas formas de organização das equipes, aprimorando de seus processos de trabalho,
redefinir novas relações da equipe multidisciplinar. Assim, à medida que cada objetivo
é alcançado o resultado é o trabalho interdisciplinar na assistência pediátrica. Devemos
ainda ressaltar que, uma estratégia para gestores e os profissionais que representam a
equipe de trabalho dentro desse contexto é a organização de espaços para discussão e
reflexão sobre o dia a dia da unidade, isso significa dizer que, será necessário investir
na pratica de processos educativos como ferramenta de gestão e de organização dos
processos inovadores de dentro dos serviços de pediatria.

Nesse sentido as Instituições de Ensino para a formação de profissões da área da saúde,


estão inserindo na grade curricular a importância do tema Educação Permanente como
estratégia para qualificar e aprimorar processos de trabalho. Quando levamos esse tema
para a assistência pediátrica temos a certeza que pode ser utilizada como ferramenta de
gestão na organização desses processos uma vez que sua fundamentação está na reflexão
crítica sobre o trabalho interdisciplinar, construindo assim uma possibilidade real de
mudança na relação da equipe, mudança nos processos de trabalho e consequentemente
na assistência pediátrica.

A Educação Permanente em Saúde propõe que, através da análise


coletiva dos processos de trabalho, seus atores possam se responsabilizar
mutuamente pela produção de autonomia e de cuidados na perspectiva
da integralidade da assistência baseada na aprendizagem significativa,
propondo assim que essa análise seja desenvolvida na interlocução,
em rodas de conversas sobre os problemas vivenciados no cotidiano
da produção do cuidado, da gestão e formação dos trabalhadores
(FORTUNA et al, 2011).

Cabe enfatizar que todo processo educativo com base na Educação Permanente
em Saúde dentro de uma Unidade Pediátrica constitui a criação de possibilidade
de mudanças no espaço de trabalho, pois ultrapassa as barreiras do tecnicismo, da
assistência fragmentada, do isolamento dos vários profissionais que compõe a equipe

65
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

e ainda de capacitações pontuais, pois é respeitada e reconhecida a participação ativa


dos sujeitos no processo, bem como o desenvolvimento de sua capacidade crítica,
utilizando de conhecimentos instituídos para contribuir no mundo do trabalho, onde
espaços de discussão em grupo ou também no formato de Rodas de Conversa tem sido
uma estratégia para a aproximação dos profissionais envolvidos.

Para que essa proposta seja efetiva e inovadora na assistência pediátrica, esses espaços
devem ser institucionalizados, uma vez que todo processo educativo no formato
de roda de conversa tem um disparador importante que é a partir, muitas vezes, de
conhecimentos já construídos, isso se faz necessário para motivar um processo
de compreensão e de criação para compreender o mundo do trabalho nas unidades
pediátricas, onde podemos usar um problema real para dar início ao processo de
reflexão da equipe e assim, o surgimento de propostas e soluções. Quando a equipe
se dispõe a sentar e a discutir um problema da unidade de internação, o importante é
que isso ocorra sob a mediação de uma discussão com novas informações. Portanto, a
roda de conversa é uma forma de se trabalhar incentivando a participação e a reflexão
de todos, buscando construir condições para um diálogo entre os membros da equipe
multidisciplinar, por meio de uma postura de escuta e movimentação de palavras e
falas, promovendo sempre uma cultura de reflexão.

Figura 12. Roda de conversa.

Médico Enfermeiro

Nutricionista Fisioterapeuta

Fonte: autor.

Nesse sentido, vale ressaltar que, os profissionais responsáveis pela organização


dos serviços das Unidades de Pediatria, devem estar comprometidos com as ações
de processos educativos fortalecidos na Educação Permanente, pois isso possibilita
construir espaços coletivos para a reflexão e avaliação dos processos de trabalho,

66
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

transformando e promovendo o trabalho interdisciplinar. Com isso, deixamos aqui


essa importante proposta de organização e institucionalização de espaços de discussão
e reflexão para a equipe multidisciplinar que desempenha suas atividades em Unidades
Pediátricas, pois podemos considera-los como dispositivos que constroem mudanças
organizacionais e um novo estilo de gestão de pessoas.

Considerando ainda a importância do trabalho interdisciplinar na assistência pediátrica,


cabe além de se instituir processos educativos como ferramenta de organização dos
processos de trabalho e humanização da equipe, pensar também na gestão de qualidade
dessas Unidades de Atendimento. A gestão da qualidade em Instituições hospitalares
pode ser considerada a forma de se administrar toda sua estrutura com vistas na
satisfação não somente dos clientes que dela se utilizam, mas também de todos os
profissionais que a representam.

Trabalho em equipe e processos Educativos


em Saúde
Os conflitos do dia a dia do trabalho em saúde surgem e muitas vezes não são
discutidos entre os atores envolvidos. Por isso, a importância de se construir
e organizar espaços coletivos onde a equipe possa sentar conversar e refletir
sobre a identificação dos problemas. É importante que haja espaços coletivos
que propicie a reflexão participativa dos atores implicados no processo de
trabalho, característica importante que desencadeia um processo educativo.
Vale investigar de que forma uma proposta de espaços de discussão e reflexão
podem atuar como processo educativo permanente em saúde no trabalho em
uma Unidade Hospitalar.

Devemos ressaltar que, educação é um fenômeno social necessário a toda atividade


humana, pois o Homem é um ser consciente e, à medida que conhece, tende a se
comprometer com sua realidade, uma característica do ser humano e ainda uma
consciência crítica que reconhece a necessidade de mudanças. Educação em Saúde é um
processo de trocas de saberes e experiências entre usuários, profissionais e gestores de
saúde. Cada pessoa é valorizada como dono de um saber, um aprendiz e um educador.
Esta prática tem como objetivo a prevenção de doenças, a promoção da saúde e promove
a autonomia dos sujeitos envolvidos, tornando-os sujeitos ativos e transformadores de
sua própria vida ou até mesmo da sua sociedade. O setor de saúde trabalha propondo
programas de ação educativa quase sempre fundamentados em uma assistência
individual. Para cada programa há uma linha de Capacitações e treinamentos. Nesse tipo
de ação nem sempre são consideradas as concepções e ações dos sujeitos envolvidos
no trabalho em saúde, que geralmente são organizadas com base na transmissão de

67
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

conhecimentos para categorias profissionais específicas e não valorizando com isso o


sentido de equipe. Os trabalhadores da área da saúde, em especial da área hospitalar,
encontram-se expostos às mais variadas situações de riscos à saúde relacionados
ao trabalho que podem levar ao adoecimento e à redução da capacidade produtiva.
Neste contexto, surgem processos educativos que permeiam os processos de trabalho
em saúde. Podemos lembrar mais uma vez sobre a Educação Permanente em Saúde
que, segundo o Ministério da Saúde, tem como proposta que a capacitação do pessoal
de saúde seja estruturada a partir da problematização do processo de trabalho, onde
o objetivo é a transformação das práticas profissionais e a reorganização do trabalho,
tendo como referência as necessidades de saúde dos atores envolvidos, a gestão setorial
e o controle social em saúde.

Cabe enfatizar que, com todo dinamismo e constantes transformações na área da


saúde, o mercado de trabalho exige mudanças no perfil dos profissionais de saúde,
onde é necessário que esses profissionais estejam alinhados com os objetivos, metas
e resultados das instituições. Assim a atuação de diferentes atores que compõem a
equipe multiprofissional, representa um importante trabalho coletivo, resultando na
assistência profissional de cada um desses profissionais que compõe a equipe. Nesse
sentido, vale destacar que, o trabalho coletivo tem suas especificidades, importância e
deve estar adequada para resolver os problemas em saúde individual e coletiva.

Vale lembrar que, o produto final de trabalho em saúde está direcionado


para diferentes níveis de atenção à saúde, como a promoção, prevenção e
recuperação, pois em qualquer um desses níveis onde o trabalho ocorra, fica
claro a necessidade de envolvimento e atuação de diferentes agentes que
compõem a equipe multiprofissional, assim podemos dizer que surge o trabalho
em equipe e coletivo em saúde.

Quando o trabalhador da saúde se encontra com um usuário no processo


de trabalho, é estabelecido entre eles um espaço mediador que sempre
existirá nos seus encontros, onde esse trabalhador da saúde utiliza-se
de suas ferramentas (conhecimentos, equipamentos, tecnologias de
modo geral) na busca da realização de um produto/utilidade necessário
para a população sem, contudo, reduzi-lo a um mero objeto de sua ação
(MERHY, 2007)

Nesse sentido, devemos ressaltar que, a educação em saúde tem uma característica
relevante que são os espaços de produção e troca de saberes, pois existe uma importante
relação entre estes dois campos, onde os profissionais envolvidos se utilizam de um ciclo
permanente de ensinar e de aprender. Com isso, vale enfatizar que, os trabalhadores
da saúde precisam buscar constantes espaços de reflexão sobre a prática, a atualização
68
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

técnico-científica e o diálogo com seus usuários e outros trabalhadores. Quando


abordamos esse tema educação de trabalhadores da saúde, precisamos compreender
que existem diferentes denominações e que podemos exemplificar aqui, sendo: educação
continuada, educação em serviço e educação permanente.

Quando abordamos sobre o processo de educação continuada, devemos compreender


que se trata de um processo de mudanças, que interage com toda a equipe mediante
estratégias específicas de capacitação para a atualização e aprimoramento de ações
e principalmente a assistência em saúde. É considerado um processo educativo que
tem como objetivo estimular a integração e desenvolvimento desses profissionais.
Assim podemos citar como exemplos as palestras e cursos de aprimoramento que são
organizados e ministrados dentro do ambiente hospitalar para atualização e adequação
de novos modelos e protocolos assistenciais.

Devemos considerar que toda Instituição Hospitalar deve contar na sua estrutura
e gestão de Recursos Humanos com um profissional responsável pelo serviço de
Educação Continuada. Importante ressaltar que, na grande maioria dos Hospitais
o serviço de Educação Continuada é de responsabilidade dos profissionais
enfermeiros, pois são considerados os mais preparados e experientes nesse
tipo de abordagem e processo educativo. Ainda vale destacar que, dentro de
um ambiente hospitalar as equipes de enfermagem são os profissionais que
mais participam dos treinamentos, em virtude da carga horária dispensada e
proximidade na assistência direta ao paciente hospitalizado. Contudo, cabe
uma reflexão importante, pois todos os profissionais que participam direta
ou indiretamente da assistência hospitalar deveriam receber treinamentos e
capacitações de forma permanente e periódica.

Assim, para alguns estudiosos sobre esse tipo de processo educativo, a Educação
Continuada deve ser utilizada como um importante mecanismo de desenvolvimento
de recursos humanos e da instituição, preparando os profissionais para fazer melhor
aquilo que ele já faz e principalmente para desempenhar suas funções e atribuições na
realidade do momento. Podemos então dizer que, esse modelo de educação continuada
compreende a aplicação do conhecimento teórico especializado, contudo estudos
científicos já demonstraram que esse tipo de investimento na capacitação de recursos
humanos é necessário porem em algumas situações não tem se traduzido em mudanças
de melhoria dos processos de trabalho hospitalar.

Como dito anteriormente, a Educação Continuada é tradicionalmente e largamente


utilizada na área da enfermagem como continuação e extensão do modelo acadêmico,
pois está fundamentada em uma ciência e fonte do conhecimento técnico/científico

69
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

específico, dando ênfase em cursos e treinamentos, por exemplo, o principal objetivo


é de se adequar os profissionais de enfermagem ao trabalho de uma determinada
unidade, sendo para isso necessário a aplicação de informações e conhecimentos
institucionalizados e pré-estabelecidos, assim a educação continuada não se constitui
através de espaços de reflexão sobre as necessidades de cuidado dos usuários.

Em relação ao outro termo de tipo de processo educativo a educação em serviço, ela é


caracterizada por um cenário de aprendizagem, pois é um tipo de processo educativo
que surge das relações humanas do trabalho, no intuito de desenvolver capacidades
cognitivas, psicomotoras e relacionais dos profissionais. Assim sua importância
e relevância está no aperfeiçoamento constante diante da evolução científica e
tecnológica, aprimorando competências e promovendo a valorização profissional
e consequentemente institucional. Podemos citar como exemplos o que se aprende e
ensina dentro das equipes de trabalho no dia a dia da instituição, contudo é importante
lembrar que também não traz como proposta espaços de reflexão e discussão dos atores
envolvidos na assistência ao paciente hospitalizado.

Em relação ao processo educativo por meio da Educação Permanente em Saúde, é


importante ressaltar sobre a Política de Governo, no ano de 2003, no Governo Lula,
o Ministério da Saúde criou e instituiu a Política de Educação Permanente em Saúde
que apresentou como estratégia a educação permanente na reorganização do sistema
de ensino em saúde, funcionando como dispositivo de aproximação entre o cotidiano
do profissional do SUS e as necessidades da população. Devemos lembrar que, seu
principal mecanismo de ação é o envolvimento das áreas de ensino em saúde, formação
profissional e ainda o profissional inserido na realidade em saúde.

Assim cabe enfatizar que esse tipo de processo educativo pode ser utilizado e implantado
não somente nas instituições prestadoras de assistência à saúde, mas também em
Instituições de Ensino. Devemos enfatizar ainda que em Educação Permanente em
Saúde é considerada um importante mecanismo de gestão, pois cria condições de
reconhecimento de uma realidade em saúde, promovendo assim espaços de reflexão e
de intervenção.

Os processos de ensino-aprendizagem requerem muitas vezes revisão, para


alguns trabalhadores os modos tradicionais de ensino-aprendizagem podem
ser percebidos como adequados e suficientes, para alguns não, e podem ser
vistos como “ultrapassados”.

A Educação Permanente em Saúde enquanto Política Pública Nacional


surge com a Portaria no 198/2004/GM/MS, que institui a política
como estratégia do Sistema Único de Saúde (SUS) para a formação e

70
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

desenvolvimento de trabalhadores para o setor tendo como função:


identificar as necessidades de formação e desenvolvimento dos
trabalhadores de saúde, construir estratégias e processos que qualifiquem
a atenção e a gestão e fortaleçam o controle social no setor na perspectiva
de produzir impacto sobre a saúde individual e coletiva. (BRASIL, 2004)

Acesse o endereço eletrônico: Dicionário da educação profissional em saúde.


Veja como os autores Ricardo B. Ceccim e Alcindo A. Ferla, definem Educação
Permanente em Saúde.

Disponível em: <http://www.epsjv.fiocruz.br/dicionario/verbetes/edupersau.html>.

Precisamos lembrar que o principal objetivo da Política de Educação Permanente em


Saúde é a inovação e a possibilidade de mudança das práticas de saúde, promovendo
a análise crítica, e consequentemente o surgimento de técnicas mais adequadas,
metodologias mais dinâmicas, fluxo contínuo de conhecimento e ainda conscientizando
o profissional de saúde quanto à necessidade de mudanças e de intervenções para ações
mais compatíveis com a realidade de trabalho.

Nesse contexto é muito importante lembrar que o trabalho em saúde demonstra cada
vez mais a necessidade de um esforço coletivo no cotidiano das Instituições em Saúde,
onde os sujeitos envolvidos na assistência precisam ter a condição de compreensão
de novas propostas educativas, tendo como propósito a reorganização de serviços e
processos de trabalho, ampliação de espaços democráticos de discussão de decisão e a
implementação de gestão participativa.

Nesse sentido devemos enfrentar novos desafios, pois a proposta de um processo educativo
fundamentada na Política de Educação Permanente em Saúde, faz pensar em uma nova
pedagogia, pois relacionar essa concepção de educação com a assistência hospitalar,
nos remete a possibilidade de reconhecimento da demanda, crescimento profissional
e consequentemente melhorias dos processos de trabalho, existindo assim um grande
desafio para os profissionais envolvidos, na busca de uma construção coletiva do saber,
mudança de postura de suas práticas. Assim a educação permanente possa efetivamente
acontecer dentro das Instituições Hospitalares, os processos de trabalho não podem
acontecer a partir de organogramas com de funções hierárquicas pré-estabelecida e
determinadas, mas sim por meio do encontro dos profissionais no reconhecimento de
uma realidade existente com propostas de intervenção fundamentada no saber coletivo.

Assim, percebemos que as Instituições Hospitalares buscam a capacitação


e o desenvolvimento de seus funcionários, mas em geral existe um contraste
entre as necessidades que envolvem as capacitações e a realidade do dia a dia

71
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

de trabalho. Um programa de Educação voltado aos profissionais de saúde


em um ambiente hospitalar requer um planejamento dinâmico, participativo,
interdisciplinar, e com objetivos definidos, buscando atender diretamente as
necessidades da organização, dos profissionais e principalmente de uma realidade
existente. Falamos sobre a importância da Educação Continuada que promove
aprendizado aos colaboradores, porém seus conteúdos devem considerar a
realidade, o cotidiano do trabalho, as necessidades do profissional, do setor
de trabalho. Foi possível perceber que todo processo de ensino-aprendizagem
requer obrigatoriamente uma revisão, pois para alguns trabalhadores os modos
tradicionais de ensino-aprendizagem podem ser percebidos como adequados e
suficientes, para outros não, e podem ser vistos como “ultrapassados”. Além disso,
a Educação Continuada deve levar em consideração as dificuldades em situações
reais do trabalho. O objetivo da Política de Educação permanente em Saúde é
a mudança das práticas de saúde, visando análise crítica, e consequentemente
inovações técnicas adequadas, com metodologias dinâmicas, de fluxo contínuo
de conhecimento, que visa aprimorar o profissional e modificar intervenções
e ações.

Qualidade na organização Hospitalar


Importante finalizar esse capítulo enfatizando sobre a importância da organização
dos serviços dentro da Instituição Hospitalar e principalmente na busca constante da
qualidade da assistência prestada. Esse pode ser um fator relevante para alinhamento
do trabalho em equipe e facilitador para a promoção de processos educativos e
consequentemente na promoção de um trabalho interdisciplinar.

Nos serviços de saúde e principalmente em Unidades Hospitalares a qualidade deve


apoiar-se em pressupostos de segurança, satisfação de seus usuários e também de seus
colaboradores, pois o serviço é consumido enquanto é oferecido, diferente da produção
de bens. Esse conceito emergiu frente às constantes transformações ocorridas no cenário
da saúde e toda sua dinâmica e inclusão de novas tecnologias e meios de comunicação,
bem como com a globalização e a disputa de mercado entre organizações hospitalares.

Assim a gestão da qualidade dentro de uma Instituição Hospitalar envolve a atuação de


seus gestores na definição de políticas de qualidade da organização, no desenvolvimento,
na implantação e avaliação de programas de qualidades. Portanto as políticas de
qualidade abarcam decisões referentes à ao uso da qualidade como estratégia, das
prioridades na qualidade de decisões e do estabelecimento de procedimentos, normas
e métodos.

72
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Devemos lembrar que, há muito tempo as organizações hospitalares têm voltado


a atenção para programas de qualidade com o objetivo de melhorar os serviços
prestados e consequentemente a assistência. Assim algumas instituições têm o
conceito de qualidade claro, não só estão atendendo simplesmente a demanda
existente dos clientes, mas principalmente fazendo surgir o que chamamos de
“encantamento do cliente”, pois a qualidade nas Instituições Hospitalares está
ligada a efetividade da recuperação e a redução de ocorrências indesejáveis
durante o período de internação de seus pacientes. Isso é possível perceber
de forma clara nas Unidades de assistência pediátrica. Nesse sentido devemos
ainda considerar a importância de um indicador que “mede” a qualidade, ou seja,
o processo, que corresponde à prestação da assistência propriamente dita ou
ainda, as atividades desenvolvidas durante o atendimento, incluindo as relações
entre os clientes e profissionais, a identificação de problemas, o diagnóstico e
as medidas de tratamento das doenças e recuperação da saúde, durante todo
período de internação hospitalar.

Para que a qualidade da assistência hospitalar seja uma realidade dentro das Instituições,
é necessário, para a organização e gestão dos serviços, a observação de alguns princípios
importantes.
Figura 13. Princípios da Administração Hospitalar.

PLANEJAMENTO ORGANIZAÇÃO

GESTÃO
HOSPITALAR

DIREÇÃO CONTROLE

Fonte: autor.

O planejamento é a primeira etapa de um processo administrativo onde são definidos


objetivos, recursos e métodos de trabalho. No planejamento o gestor tomará
decisões mais assertivas na resolução de problemas, atingindo metas pré-definidas.
Importante lembrar que, o planejamento é constituído de seis etapas: definição de
objetivos a serem alcançados devem ser definidos e devem orientar os principais
planos, servindo de base a todos os setores, análise da situação da organização em
relação aos objetivos, onde deve-se avaliar a situação atual em relação aos objetivos
almejados, como a organização se encontra e o que deve realizar, desenvolvimento

73
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

de proposições em relação às condições futuras, determinar as situações esperadas


durante a execução do plano, ainda, análise das possíveis ações, relacionando e
avaliando as ações a serem adotadas, analisando as vantagens e desvantagens de
cada uma delas. Outra etapa do planejamento é selecionar o curso da ação mais
adequado para atingir os objetivos e excluir as demais, isso representa a tomada de
decisão e a última etapa é a implementação e execução do plano de avaliação dos
resultados para que os objetivos sejam alcançados.

Planejamento estratégico – a definição dos objetivos e das estratégias das organizações é


feita pela alta administração (ex.: presidentes, vice-presidentes). O alcance dos objetivos
é programado para longo prazo e a ênfase é dada ao ato de planejar e não de executar.

Importante lembrar que, existe dois tipos de planejamento relevantes para a


gestão hospitalar, o planejamento tático que envolve uma determinada unidade da
organização e é conduzido por executivos de nível (ex.: diretores). O alcance dos
objetivos se estende em médio prazo. São delineadas as ações que os departamentos irão
executar para que a organização tenha sucesso no que foi planejado, e o planejamento
operacional – tem foco no curto prazo. Este planejamento, também chamado como
plano de ação. É realizado pelo nível operacional (ex.: gestores de departamentos) e
retrata a aplicação prática dos planos estratégicos e táticos, detalhando “o que fazer”
e “como fazer”.

Obs.: o planejamento deve ser flexível; deve adaptar-se às situações. Se pudermos


prever situações, torna-se mais fácil realizar ajustes nas atividades e reorientá-las
em outras direções.

Outro princípio importante para a organização e gestão dos serviços, é a organização


que tem o objetivo de estabelecer os meios e os recursos necessários para viabilizar
o planejamento. Apresenta o modo como a organização tenta cumprir os planos. É a
função relacionada com a divisão e distribuição de tarefas em unidades organizacionais,
bem como de recursos necessários, às equipes ou departamentos. Existem dois aspectos
da organização:

»» organização formal: baseada na divisão racional do trabalho e na diferenciação


de seus órgãos, de acordo com critérios estabelecidos por aqueles que tem o
poder de decidir, representados por meio do organograma.

»» organização informal: é aquela que surge espontaneamente entre os


integrantes de todas as posições hierárquicas por meio das relações
interpessoais, que não estão definidas no documento formal da organização.

74
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Devemos lembrar alguns fatores que podem interferir de forma benéfica ou ser
prejudicial no trabalho da equipe dentro de um ambiente hospitalar, como a estrutura
organizacional que é o modo como às atividades da organização são divididas,
organizadas e coordenadas. Quando a estrutura é definida adequadamente, ela propicia
a organização das funções e responsabilidades, a identificação de tarefas necessárias,
as medidas de desempenho compatíveis com os objetivos pré-estabelecidos e ainda as
condições motivadoras.

Outro fator é a cultura organizacional que constitui as crenças, valores e hábitos da


instituição. Consiste nas relações e na forma como as pessoas se organizam, interagem e
agem dentro da empresa, diferenciando-a das demais. É a maneira tradicional de pensar
e executar as coisas, as normas que orientam o comportamento que são compartilhados
por todos os integrantes da organização. Pode ser apresentada em três níveis: artefatos,
valores compartilhados e pressuposições básicas, o que se segue:

Artefatos: constituem o primeiro nível. São componentes visíveis e perceptíveis que


demonstram a cultura, por exemplo, vestuário, padrões de comportamento, instalações,
processos, histórias, símbolos, eventos.

Valores compartilhados: constitui o segundo nível. São valores de importância para


as pessoas, filosofias, metas, estratégias adotadas para a tomada de decisão, regras, que
juntos, formam a identidade do grupo.

Pressuposições básicas: constituem o terceiro nível. São os sentimentos, as crenças


e percepções. As pressuposições guiam o comportamento dos integrantes.

Devemos lembrar que, mudanças de comportamento dos profissionais dentro de


uma Unidade de Trabalho têm sido uma constante nas Instituições de Saúde, onde
os supervisores de equipe muitas vezes demoram a perceber um colaborador com
problemas de saúde ou até mesmos casos de depressão e insatisfação no ambiente de
trabalho. Hoje podemos destacar um alto número de afastamento de profissionais de
saúde dentro de Instituições Hospitalares.

Vale enfatizar que as organizações públicas se diferenciam das organizações do segundo


e terceiro setores por terem perfis diferenciados de cultura:

Cultura de poder ou política – predomínio do critério político em suas decisões.

Cultura Burocrática – privilegia a hierarquia, o desempenho, o universalismo e a


meritocracia técnica.

Cultura Compreensiva – enfoca o tratamento compreensivo ao cidadão.

75
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

Cultura Híbrida – mescla os dois primeiros perfis, critérios técnicos (expertise) mais a
representatividade (de partidos políticos, grupos de interesse) e o critério da confiança
(lealdade pessoal e afinidades na nomeação).

Outro fator importante, a organização dos serviços hospitalares é o clima organizacional,


que é considerado a forma como os integrantes das organizações convivem entre si e
satisfazem as suas necessidades; a forma como percebem a cultura e a expressam em
atitudes. Depende da estrutura, da cultura e das condições econômicas da instituição,
além do estilo de liderança adotado e do investimento na equipe de trabalho. Influencia
a motivação, o desempenho e a satisfação no trabalho, provocando diversos níveis de
produtividade.

A pesquisa sobre clima organizacional e manutenção de um clima favorável é


fundamental para a obtenção de bons resultados de desempenho. Existem hoje
na atualidade muitos modelos de aplicabilidade e reconhecimento do clima
organizacional para Instituições Hospitalares.

Assim uma pesquisa de Clima Organizacional tem como objetivos:

»» avaliar a situação interna na organização;

»» obter informações a respeito de como a instituição é vista pelos seus


colaboradores, do grau de satisfação e das expectativas, bem como a
integração entre os setores;

»» identificar as fragilidades com o propósito estabelecer estratégias e soluções


para corrigi-las.

Devemos lembrar que, uma pesquisa organizacional deve levar em consideração vários
aspectos, entre eles, a liderança, a comunicação, o investimento em treinamento e
desenvolvimento, a satisfação dos colaboradores. A liderança baseia-se no poder
de influenciar pessoas e norteá-las, a comunicação, além de ser considerado um
instrumento facilitador para a motivação, favorece a obtenção de dados importantes.

Assim, como dito anteriormente a implementação de programas de treinamento e


capacitação aumenta a motivação do pessoal. Satisfação dos colaboradores e cooperação
com a instituição são obtidas por meio de estratégias de relacionamento.

Dando continuidade sobre os princípios da organização dos serviços hospitalares,


vamos falar sobre a Direção, que é a função da administração responsável pela
coordenação das ações dos membros da organização, pois está ligada diretamente ao
gerenciamento das relações interpessoais. Dentro desse princípio da Direção devemos
incluir a comunicação, a motivação e a liderança dos trabalhadores para adequar os
76
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

objetivos destes com os objetivos da organização, e ainda medidas para oferecer boas
condições de trabalho, ambiente de cooperação entre seus membros e gerenciamento
de possíveis conflitos.

Importante enfatizar nesse sentido que é por meio da comunicação que os fluxos de
informação percorrem todos os setores, colaboradores e usuários dos serviços. Existem
a princípio quatro níveis hierárquicos de comunicação nas organizações:

»» Comunicação intrapessoal – processo interno de codificação e


decodificação permanente de mensagens.

»» Comunicação interpessoal – refere-se à comunicação entre duas pessoas


e consiste na verbalização de pensamentos.

»» Comunicação de grupos pequenos – ocorre entre três ou mais pessoas


que, por meio da interação, alcançam metas comuns.

»» Comunicação de grupos múltiplos – é um desdobramento dos pequenos


grupos, que agem de modo interdependente.

Outro fator que influencia a eficácia do processo de comunicação, é denominado “fluxo


de comunicação”. Os fluxos de comunicação constituem níveis: Fluxo descendente:
as comunicações são formais e o fluxo é de cima para baixo – destinadas a fornecer
informações sobre normas e rotinas e orientar procedimentos (ex.: manuais, boletins).
Fluxo ascendente: as comunicações são menos formais, regulares e o fluxo é de baixo
para cima destinadas a fornecer sugestões ou reclamações individuais (ex.: relatórios,
caixa de sugestões).

Após a comunicação vamos falar sobre a importância da liderança que é o uso da


influência para dirigir e coordenar as atividades dos membros de um grupo em direção
aos objetivos propostos, onde essa influência pode ser vista como a capacidade de uma
pessoa modificar, intencionalmente, o comportamento de outra pessoa ou de um grupo,
porem nem sempre os administradores são líderes. A influência dos administradores é
consolidada pela autoridade formal, pelo próprio cargo ou posição que ocupa, pois, os
líderes ultrapassam a autoridade formal, motivando seus colaboradores a desempenhar
atividades além daquelas definidas formalmente.

Assim cabe lembrar que, a liderança pode ser centrada nas atividades ou centrada
nas pessoas.

»» Liderança centrada nas atividades preocupa-se com a execução das


tarefas e seus resultados. A abordagem é controladora e diretiva.

77
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

»» Liderança centrada nas pessoas preocupa-se com os aspectos humanos


dos seus colaboradores e suas relações interpessoais. A característica da
abordagem é participativa.

Outro fator importante é a motivação, que é a predisposição individual para exercer


esforços que busquem o alcance de metas organizacionais. Cabe ao administrador
ajustar esses esforços em direção às metas da organização. Existem várias teorias de
motivação. As teorias que enfocam as necessidades internas do indivíduo que motivam
o seu comportamento são denominadas teorias de conteúdo. Entre elas estão à teoria
de Maslow, de Adelfer, de Herzberg e de McClelland.

Como dito anteriormente, vale destacar a importância do princípio da Direção


dentro da organização dos serviços hospitalares, onde os fatores, liderança,
comunicação e motivação estão fundamentados. Assim cabe um momento de
reflexão sobre esses três temas, uma vez que adequadamente compreendidos e
praticados, podem promover um trabalho em equipe pautado na humanização.
Outro ponto importante de reflexão é o trabalho interdisciplinar no ambiente
hospitalar, que sabemos ainda encontra desafios, tanto no seu entendimento
conceitual como na sua operacionalidade. Desafios esses que estão pareados com
a falta de comunicação dos membros das equipes, profissionais de saúde com
déficit de motivação e ainda podemos encontrar supervisores de equipes que
encontram dificuldades de alcançar um patamar de liderança satisfatório. Assim
cabe enfatizar que esses três e importantes fatores, comunicação, motivação e
liderança precisam ser discutidos e avaliados constantemente no dia a dia de
trabalho nas unidades hospitalares. O objetivo sempre será aprimorar processos
de trabalho e o gerenciamento de possíveis conflitos, que inclui levantamento
de problemas e intervenções.

Figura 14. Relação entre os três fatores do princípio da Direção.

COMUNICAÇÃO LIDERANÇA MOTIVAÇÃO

Fonte: autor .

O último e também muito importante princípio dentro da administração e gestão dos


serviços hospitalares é o controle, que é responsável pela geração das informações
sobre a execução das atividades da organização, pois é necessário o monitoramento
e controle das atividades executadas em relação às planejadas e a correção de desvios
significativos.

78
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

Para garantir que os resultados do que foi planejado, organizado e dirigido sejam
alcançados conforme os objetivos pré-definidos, deve seguir quatro etapas:

»» estabelecer padrões de desempenho – estabelecer um modelo daquilo


que se pretende alcançar em parâmetros desejáveis;

»» mensurar o desempenho atual;

»» compará-lo com os padrões pré-definidos;

»» adotar ações corretivas – caso se façam necessárias.

Com isso, o Controle pode ser feito por três níveis: nível institucional, denominado
controle estratégico, com foco na organização como um todo, obtenção de resultados em
longo prazo. Nível intermediário, chamado controle tático, focaliza o desempenho das
unidades ou departamentos com resultados em médio prazo e ainda o Nível operacional,
chamado controle operacional, utiliza mecanismos de controle mais específicos para
abordar as atividades operacionais e obter resultados em curto prazo. Assim devemos
lembrar as principais ferramentas do Controle:

»» Sistemas de informação – sistemas informatizados que processam


os dados e fornecem, continuamente, informações, em tempo real,
relevantes aos gestores para auxiliar na tomada de decisão.

»» Controle financeiro – é o mais utilizado, mede a capacidade de geração


de lucros, disponibilidade para parar as despesas, a eficiência do uso dos
ativos, entre outros.

»» Auditoria – avalia a eficiência e eficácia das atividades da instituição.

Nos dias atuais para que uma Instituição Hospitalar alcance a qualidade não basta
exercer as atividades da melhor forma possível, é preciso buscar a excelência dos serviços
prestados, atendendo as necessidades de seus dos clientes e muitas vezes, superando suas
expectativas. Com isso, devemos ressaltar que os princípios da qualidade devem fazer
parte dos objetivos estratégicos da organização hospitalar e para isso se faz necessária a
participação de todos os membros na busca do aperfeiçoamento contínuo das operações
focalizando, acima de tudo, as necessidades dos clientes. Importante enfatizar que
existem várias técnicas que estão relacionadas à gestão de qualidade na área hospitalar
e que auxiliam os gestores na tomada de decisões para a resolução de problemas e
melhoria dos processos. Podemos citar os Círculos de Controle de Qualidade – CCQ,
que consistem em reuniões com grupos de vários profissionais que compõe as equipes e
que, voluntariamente se reúnem com regularidade para resolver problemas e melhorar
a qualidade dos serviços. Para Unidades de Pediatria podemos citar uma técnica

79
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

interessante, que é o Benchmarking e que consiste no conhecimento das melhores


práticas adotadas por empresas do mesmo segmento. Neste caso, a investigação é feita
para a busca de práticas administrativas que possam servir de modelo para dinamizar
os processos e aperfeiçoar o desempenho dos serviços e assistência prestada.

O Benchmarking não deve ser realizado apenas para demostrar bom desempenho,
mas também para identificar maneiras de modificar sua prática a fim de melhorar
expressivamente o seu desempenho.

Nesse sentido, importante discutir sobre o tema qualidade total que significa fazer com
que os princípios da qualidade façam parte dos objetivos estratégicos da organização
e para isso se faz necessária a participação de todos os membros na busca do
aperfeiçoamento contínuo das operações focalizando, acima de tudo, as necessidades
dos clientes. Existe um conjunto de princípios comuns e interdependentes: o foco no
cliente, a organização como processo contínuo e a melhoria contínua.

»» Foco no cliente – atender às necessidades do cliente constitui o princípio


básico.

»» Organização como processo contínuo – percepção de organização como


uma série de processos e atividades interligadas.

»» Melhoria contínua – parte da premissa que as necessidades dos clientes


sofrem constantes mudanças e em tempo de concorrência, a sobrevivência
a longo prazo depende da capacidade me atender as expectativas, inovar
e surpreender os clientes ou usuários dos serviços.

Outro tema relevante dentro da política de qualidade é a Acreditação Hospitalar, que


segundo o Ministério da Saúde, o processo de Acreditação é um método de consenso,
racionalização e ordenação das Organizações Prestadoras de Serviços Hospitalares e,
principalmente de educação permanente dos seus profissionais.

Acreditação Hospitalar consiste na avaliação sistematizada e ordenada dos recursos


organizacionais por um órgão reconhecido, de forma periódica e de caráter voluntário,
com o propósito de garantir a qualidade da assistência com base em padrões previamente
aceitos.

Existem duas importantes dimensões para o processo de acreditação hospitalar, sendo


o primeiro o processo educativo que leva as instituições e os profissionais de saúde a
adquirirem a cultura da qualidade e excelência e o segundo o processo de avaliação
e certificação dos serviços, que avalia e atesta o desempenho de acordo com padrões
predefinidos. Assim, o principal objetivo da Acreditação é incentivar o aperfeiçoamento

80
Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

permanente dos processos hospitalares com o objetivo de promover a qualidade na


prestação de serviços de saúde, por meio da padronização de processos com foco na
segurança do paciente. Devemos ressaltar que, as organizações de saúde que optam
pela Acreditação têm que se adequar aos preceitos estabelecidos pela Organização
Nacional da Acreditação – ONA. Importante lembrar que as Instituições Hospitalares
podem buscar até três níveis de Acreditação ONA.

Figura 15. Níveis de ACREDITAÇÃO ONA.

ONA 3

ONA 2

ONA 1

Fonte: autor.

Assim nesse sentido cabe ressaltar sobre a importância e valor do conhecimento.


O conhecimento é sem dúvida um dos mais importantes recursos de uma organização
em saúde, portanto a gestão do conhecimento deve englobar toda a forma de gerar,
armazenar, distribuir e utilizar o conhecimento.

Nesse sentido, para Assumpção (2010), a Gestão do Conhecimento é definida como um


processo educacional complexo de contínua redução do tempo entre a identificação de
problemas em qualquer ponto do nível de atenção à saúde, a geração de novos saberes
e sua transformação em novas competências nas práticas.

Devemos lembrar que nos últimos anos as organizações hospitalares, tanto públicas
como privadas, passaram a valorizar e inovar mais a gestão interna, onde no caso das
empresas privadas, as exigências eram e ainda são em virtude da própria sobrevivência
e conformidade com a competitividade no mercado. Quanto às empresas públicas o
motivo está justificativo através de compromissos com o cumprimento de políticas
e programas de saúde e ainda o cumprimento de metas estipuladas em contratos de
gestão. Portanto, falar de gestão do conhecimento nos remete a compreensão do tema
sob dois aspectos importantes, são eles:

»» necessidade de atualização da Tecnologia da informação que tem como


foco central uma rede de computadores com sistemas adequados para o
desempenho das atividades internas da empresa, sendo uma importante
ferramenta que gera muito conhecimento;

81
UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

»» cultura organizacional, comportamental e aspectos pedagógicos de uma


empresa, ou ainda ambiente organizacional.

Nesse sentido vale ressaltar que, empresas hospitalares sob boa liderança e com
tecnologias adequadas abrem caminho para a promoção do processo da gestão do
conhecimento, que o gestor em saúde precisa buscar sempre inovar e criar condições
adequadas para sua liderança. Portanto, esses dois termos inovação e criatividade estão
presentes dentro do processo de governança em uma Instituição Hospitalar.

Inovar significa mexer com padrões culturais, tirar as pessoas da zona de conforto,
enfrentar medos e inseguranças, promover mudanças, que muitas vezes estão
atrelados aos sentimentos e atitudes próprias dos seres humanos.

Contudo sabemos que um problema real quando se trabalha com gestão do conhecimento,
a preocupação é como enfrentar e ainda solucionar problemas, o que muitas vezes
pode ser feito com as próprias pessoas que compõe a empresa, mas é comum gestores
contratar ou buscar fora da instituição Hospitalar serviços de consultoria para solução
de problemas internos. Porem sabemos que, muitas vezes a solução dos problemas e o
conhecimento está mais próximo que se imagina. A proposta da gestão do conhecimento
é a de dar valor à informação e facilitar o fluxo dos processos de trabalho nas empresas,
e quando usada adequadamente, se torna um instrumento estratégico e operacional de
gestão, pois o objetivo é aproveitar recursos existentes na empresa.

Nesse sentido, podemos lembrar sobre a importância dos processos educativos em saúde
e especialmente a Educação Permanente que constitui uma possibilidade de mudanças
no espaço de trabalho, em razão de abrir espaços de diálogo com formas diferenciadas
de educar e aprender, pois a participação ativa dos sujeitos com o desenvolvimento de
sua capacidade crítica, gera conhecimentos instituídos para contribuir no mundo do
trabalho. O conhecimento adquirido e valorizado no ambiente de trabalho hospitalar
representa uma estratégia de gestão na reorganização de processos de trabalho, pois
funciona como um dispositivo de aproximação entre o cotidiano do profissional,
a organização e principalmente as necessidades do usuário, além disso, convoca
a participação de todos os profissionais envolvidos com o objetivo de aumentar a
qualidade dos serviços prestados.

Assim após toda essa reflexão realizada até esse momento sobre a assistência pediátrica
à luz da humanização e do trabalhado interdisciplinar. Devemos lembrar que, dentro
de um ambiente hospitalar a humanização deve ser mais do que um ato humanitário,
pois é necessário a implementação de um processo interdisciplinar reflexivo sobre os
aspectos éticos que norteiam a prática dos diferentes profissionais que compõe a equipe

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Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica │ UNIDADE III

de trabalho. Assim falar em humanização no ambiente hospitalar e principalmente em


Unidades Pediátricas significa abordar um tratamento digno e acolhedor aos pequenos
pacientes.

A organização de um trabalho interdisciplinar norteada por princípios da humanização,


ocorre principalmente por meio do processo dialógico e reflexivo. Devemos enfatizar a
importância do diálogo, que tem seu significado não somente no ouvir o outro e dar
respostas, mas sim em problematizar uma situação, buscar soluções e transformar
realidades. O diálogo não pode ser caracterizado como um ato passivo ou unilateral,
é fundamental compreender e valorizar a dimensão histórica de todo o contexto
estudado. O diálogo requer uma relação horizontal entre os sujeitos envolvidos sobre um
determinado tema que a abertura e desvelamento de uma realidade leva efetivamente
à um processo de reflexão.

Nesse sentido cabe ressaltar que, os profissionais que compõe a equipe de trabalho
em uma Instituição Hospitalar devem compreender sobre o processo de construção
de um trabalho interdisciplinar com base na humanização, pois isso significa dizer o
mesmo que prestar uma assistência com competência técnica cientifica e ainda com
ternura humana. Devem ainda compreender que a humanização estabelece espaços de
solidariedade, respeito, diálogo, preocupação com o próximo, promovendo relações mais
harmônicas entre os membros da equipe. Devemos sempre lembrar que os pacientes
dentro de uma Unidade Hospitalar são a razão de ser da existência do hospital, assim,
a conscientização é fundamental para humanizar as relações dos profissionais entre si
e por consequências estes com os pacientes.

Foi possível perceber nesse capítulo sobre a importância dos conceitos de


humanização hospitalar e trabalho interdisciplinar em saúde, o quanto podemos
relacionar esses conceitos com a assistência pediátrica. Abordamos ainda sobre
as principais estratégias e ações de humanização dentro de um ambiente
hospitalar, como o acolhimento e o trabalho reflexivo da equipe multidisciplinar
podem transformar os processos de trabalho. Percebemos que os processos
educativos são essenciais para o aprimoramento e fortalecimento da relação
da equipe de trabalho. Falamos ainda sobre o papel da gestão hospitalar na
organização dos serviços e na promoção do trabalho em equipe sob o olhar da
interdisciplinaridade e humanização. Compreendemos a importância da gestão
dos serviços hospitalares por meio de seus princípios como planejamento,
direção e controle, e ainda o quanto a política de qualidade hospitalar pode
promover um ambiente com propostas que indicam para o caminho do trabalho
interdisciplinar em saúde. Aprendemos sobre a gestão do conhecimento, que
está envolvida como uma mistura de Tecnologia da Informação e Administração,

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UNIDADE III │ Humanização e Trabalho Interdisciplinar na Assistência Pediátrica

um novo campo entre a estratégia, a cultura e os sistemas de informação da


organização, pois o conhecimento de cada membro da empresa, informações
de um setor ou atividade especifica, criatividade no trabalho e experiências
acumuladas pelas pessoas, compõe o fluxo e um processo de trabalho sustentado
pela gestão do conhecimento. Percebemos que o conhecimento hoje é o mais
importante dos recursos dentro de uma organização em saúde, por ser capaz de
tornar as ações, tanto no nível organizacional e ainda individual, mais eficientes
e eficazes. Vimos que os gestores devem buscar a construção de práticas mais
inovadoras e criativas, que fortaleçam os processos de trabalho em saúde e
assim a assistência prestada pelas Instituições.

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