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GRUPO 04

A DEFESA DA TRANSFUSÃO DE SANGUE AOS FIÉIS DA


RELIGIÃO TESTEMUNHA DE JEOVÁ EM CASOS EXTREMOS
OU EMERGENCIAIS

ARAÇATUBA
2021
Camilly Caroline Martins
Cibele Garcia Duarte Dobner
Diogo Zanellati Menani
Gabriel Fukao
Gabrielly Riguetti de Oliveira
Gustavo Baleeiro Aleixo
Heitor Augusto Julio Marconato
Joao Vitor Ferraz Brambila
Lígia Castilho de Alcântara
Luis Henrique Fessore de Carvalho
Nathan Filipe Quintiliano de Souza
Oscar Pedro Mariano Porto
Tamiris Sant’ Anna do Nascimento
Vitória Lorrainy alves dos Santos

A DEFESA DA TRANSFUSÃO DE SANGUE AOS FIÉIS DA


RELIGIÃO TESTEMUNHA DE JEOVÁ EM CASOS EXTREMOS
OU EMERGENCIAIS
Trabalho de dissertação constituído
por artigo, apresentado ao Centro
Universitário Toledo, como parte da
composição de nota da AV1

Orientadora: Prof. CAMILA PAULA


DE BARROS GOMES

ARAÇATUBA
2021
Está claro que os médicos, através de autorização judicial, realizaram a
transfusão de sangue contrariando a vontade da paciente Ana Clara. Contudo,
a decisão judicial está correta, baseada em inúmeros artigos presentes na
constituição federal.
O pensamento religioso acerca desse assunto baseia-se em uma
interpretação livre do texto bíblico, onde os próprios crêem que o sangue
representaria a “alma” do indivíduo e, ao introduzir o sangue no corpo humano,
independente das maneiras supostas, violariam as leis de Deus.
Portanto, a partir do momento em que um cidadão decide aderir à
religião comentada e acreditar em suas doutrinas, não há dúvidas que,
necessariamente, essas manifestações de crença terão que ser exercidas,
tanto dentro do templo religioso, quanto perante a sociedade. Sendo assim, é
vedado ao Estado restringir, discriminar, impedir, embaraçar ou praticar
quaisquer atos que demonstrem oposição àquilo que o cidadão escolheu,
pensamento que eleva e celebra a sua dignidade, não podendo, claro, ser
contrário à ordem pública e aos direitos de terceiros.
A luz do Artigo 5º da constituição federal
CF Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

VIII - ninguém será privado de direitos por motivo de crença religiosa


ou de convicção filosófica ou política, salvo se as invocar para eximir-
se de obrigação legal a todos imposta e recusar-se a cumprir
prestação alternativa, fixada em lei;

Desta maneira, a Ana Clara não poderia ser privada de seu direito à
vida, meramente por uma crença religiosa. Além disso, a decisão judicial
objetivou salvar a vida do seu filho(a), visto que ainda estava em seio materno,
mas desde da concepção seus direitos são assegurados. Art. 227 (CF). “É
dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao
adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde...”
Outrossim, entende-se por Saúde Pública o conjunto de ações e
serviços realizados pelo poder público. Com a promulgação do texto da
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o direito à saúde
passou a ser considerado direito social de todos e dever do Estado. Está
presente como direito fundamental, expresso no Art. 196
CF Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido
mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do
risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e
igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e
recuperação.

Além disso, a Resolução 1.201/80 do Conselho Federal de Medicina


estabelece que, “se houver iminente perigo de vida, o médico praticará a
transfusão de sangue, independentemente de consentimento do paciente ou de
seus responsáveis”. Como apresentado no caso da Ana Clara, que perdeu uma
quantidade significativa de sangue devido a complicações durante sua cesárea
e o único tratamento viável no momento era uma possível transfusão.

Resguardar o direito à vida é um pressuposto irrenunciável na garantia


das prerrogativas constitucionais, visto que a não efetivação de tal
impossibilitaria que os demais direitos sequer fossem idealizados. Neste caso,
claramente o direito à vida se sobrepõe ao direito à liberdade religiosa, que cai
por terra, sendo possível e legítimo todo e qualquer ato para se evitar a morte
da paciente.

Vale ressaltar que, após concluir a faculdade de medicina, o médico faz um


juramento, que, entre tantos deveres, expressa seu principal: o de salvar vidas.

JURO SOLENEMENTE QUE, AO EXERCER A ARTE DE CURAR,


MOSTRAR-ME-EI SEMPRE FIEL AOS PRECEITOS DA
HONESTIDADE, DA CARIDADE E DA CIÊNCIA. PENETRANDO NO
INTERIOR DOS LARES, MEUS OLHOS SERÃO CEGOS, MINHA
LÍNGUA CALARÁ OS SEGREDOS QUE ME FOREM REVELADOS,
O QUE TEREI COMO PRECEITO DE HONRA. NUNCA ME
SERVIREI DA MINHA PROFISSÃO PARA CORROMPER OS
COSTUMES OU FAVORECER O CRIME. SE EU CUMPRIR ESTE
JURAMENTO COM FIDELIDADE, GOZEM PARA SEMPRE A MINHA
VIDA E A MINHA ARTE DE BOA REPUTAÇÃO ENTRE OS
HOMENS; SE O INFRINGIR OU DELE AFASTAR-ME, SUCEDA-ME
O CONTRÁRIO. (Hipócrates - 460 a.C)

Além disso, o direito à saúde, é considerado um direito fundamental, e


está expresso no sexto artigo da constituição federal:
CF Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o
trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência
social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos
desamparados, na forma desta Constituição.

Estatisticamente, os professantes da religião Testemunhas de Jeová


correspondem a menos de 1% da população brasileira, apenas 800mil
pessoas. Sendo assim, cabe à doutrina da testemunha de Jeová a eficácia a
800mil pessoas, mas quando o médico jura assegurar a vida sem distinção, ele
faz um juramento a 213,3 milhões de pessoas, havendo assim um contrapeso
maior sobre responsabilidade de um médico de salvar vidas.
Sendo assim, a vida humana representa um bem indisponível, com
tutela integral da Constituição Federal que a erigiu como o bem maior do
homem, distinguindo-a com inúmeros direitos fundamentais. Assim, nesta linha
de pensamento, há ativa participação estatal na preservação da vida, conforme
se constata pela resolução 1021/80 do Conselho Federal de Medicina no
sentido de que, havendo iminente perigo de vida, o médico praticará a
transfusão de sangue, independentemente de consentimento do paciente ou de
seus responsáveis. Assim como, pelos dizeres do art. 146, § 3º, inciso I, do
Código Penal, é possível a intervenção médica ou cirúrgica sem o
consentimento do paciente ou de seu representante legal, se justificada por
iminente perigo de vida. Tais dispositivos deixam claro que a recusa impeditiva
do paciente não impede a transfusão de sangue.
Em 29 de janeiro de 2009, o juiz Luís Eduardo Yatsuda Arima, da 2ª
Vara da Fazenda Pública do DF., sentenciou que “Entre o direito à liberdade
religiosa e o direito à vida, deve prevalecer o direito à vida”, onde ele autorizou
médicos do Hospital de Base (HBDF) a realizar transfusões de sangue em uma
testemunha de Jeová, mesmo contra a vontade dela. O pedido à Justiça partiu
da filha de uma mulher internada em estado grave e inconsciente para uma
cirurgia na cabeça. Por meio de procuração reconhecida em cartório em 2006,
a paciente de 55 anos havia manifestado o desejo de não receber sangue de
outra pessoa. Os médicos disseram à filha da paciente que só levariam a
cirurgia adiante com autorização judicial. Laudos comprovavam que a senhora
corria risco de morrer sem a cirurgia neurológica, com transfusões.
A dubiedade da legislação brasileira deixa brechas para o conflito entre
médicos e testemunhas de Jeová. O Código de Ética Médica, de 1981, manda
que a vontade do paciente deve ser respeitada desde que não comprometa a
vida dele. No Código Civil, consta que o paciente tem total autonomia para
recusar procedimentos. Já o Código Penal estabelece que, em risco de morte,
o médico pode e deve adotar procedimento médico ou cirúrgico sem
consentimento do doente ou seu representante legal. Entre esses
procedimentos está a transfusão de sangue.
O Tribunal de Justiça de São Paulo também teve a oportunidade de
apreciar o interessante caso de uma jovem que deu entrada no hospital
inconsciente e necessitando de aparelhos para respirar, encontrando-se sob
iminente risco de morte, quando lhe foram aplicadas as transfusões de sangue.
Por questões religiosas, afirmou ela em juízo, na ação de reparação de danos
morais movida contra o hospital e o médico que a salvou, que preferia a morte
a receber a transfusão de sangue que poderia evitar a eliminação física. Outra
pessoa havia apresentado ao médico, no momento da internação, um
documento que vedava a terapia de transfusão, previamente assinado pela
referida jovem e que permanecia com o portador, para eventual emergência.
Entendeu o Tribunal, ao confirmar a sentença de improcedência da ação, que a
apelante, embora o direito ao culto que lhe é assegurado pela Constituição
Federal, não era dado dispor da própria vida, de preferir a morte a receber a
transfusão de sangue.
A decisão acima se assemelha ao suicídio medicamente assistido ou a
eutanásia, por mais que o paciente da religião comentada não possua
pensamentos suicidas ou estado terminal, em sua visão, ao introduzir o sangue
no seu corpo, ele se tornaria algo impuro, pior que a própria morte. Então, o
que os difere? Sendo que o próprio, consciente do risco eminente de vida,
recusa-se da transfusão sanguínea, o médico ao permitir a escolha do
paciente, querendo ou não, culmina sua morte, demonstra a semelhança das
práticas citadas.
Em nosso país, eutanásia e suicídio assistido são crimes. É enquadrado
como homicídio, já que há clara intenção de matar. No caso da eutanásia, o
homicídio pode ser doloso ou culposo, a depender da conduta do médico. Se
injetar uma substância letal, por exemplo, o homicídio é doloso. No caso do
suicídio assistido, qualquer pessoa que auxilie ou instigue o suicídio no Brasil
está cometendo um crime, a pessoa que o fizer pode ser condenada a até seis
anos de prisão pelo artigo 122 do Código Penal.
Por último, vale reforçar a teoria da tipicidade conglobante, uma teoria jurídica
criada por Zaffaroni, que basicamente diz que uma norma não pode ser
proibida pela outra de jeito algum e, como no caso são questões que ferem
duas normas, tanto a do art. 6 do Código de Ética Médica, no que diz respeito a
que o médico deve guardar absoluto respeito pela vida humana, atuando
sempre pelo benefício do paciente, quanto ao direito de liberdade religiosa.
Com isso podemos ver que o médico optou por fazer dentro da lei o
procedimento que está de acordo com sua conduta, sem falar o "aval" da juíza
que, por sua vez, liberou esse procedimento prezando pelo direito a vida da
mulher.
Suponhamos que há um mandado de busca e apreensão na casa de um
indivíduo, tanto o Código de Processo Civil quanto o de Processo Penal
obrigam os oficiais a exercerem o mandado e, se preciso, usar a força, porém o
art. 150 do Código Penal trata sobre invasão de domicílio, punindo quem
invade a casa de um indivíduo sem sua permissão, há aqui um conflito entre
normas que pertencem a leis que tem a mesma hierarquia, logo, não há
antinormatividade em um cenário em que leis se conflitam, consequentemente,
os fatos se tornam atípico, ou seja, não há crime.
Ressaltando o caso em conflito, que inclui a testemunha de Jeová e a juíza,
não há antinormatividade por parte da juíza nem do médico, pelo fato de
ambos estarem agindo dentro da normatividade da lei.
Conclui-se que, a juíza tomou a decisão correta em permitir que a equipe
médica realizasse a transfusão de sangue, uma vez que esse procedimento
médico visava salvar a vida da paciente.
Referências
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do
Brasil. Brasília, DF: Centro Gráfico, 1988.
CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA (CFM - Brasil). Código de ética médica.
Resolução nº 1.201/80. Brasília: Tablóide, 1990.
BRASIL. Código Penal. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de
1940. BRASIL. Código Penal.
BRASIL Código Civil. Decreto-Lei n° 3.071 de 1° de janeiro de 1916.
BRASIL. Código Civil.
TRANSFUSÃO DE SANGUE - TESTEMUNHA DE JEOVÁ. Disponível em:
<https://jus.com.br />. Acesso em: 08 de set. de 2021.
Testemunhas de Jeová e a transfusão de sangue - Migalhas. Disponível
em: <https://migalhas.com.br />. Acesso em: 08 de set. de 2021.
Filha de testemunha de Jeová vai à Justiça para autorizar transfusão de
sangue. Disponível em: <https://correiobraziliense.com.br />. Acesso em: 08 de
set. de 2021.

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