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Direito Constitucional-teórico prático-2 de novembro

A Constituição é pactícia, estabelece um compromisso, implica cedências


A circunstância de um diploma compromissório faz com que existam considerações na
interpretação da constituição que não se levantam noutros âmbitos do direito
Interpretação das normas constitucionais
Elemento literal- manda atender à letra do preceito; àquilo que está escrito
Quando nos depararmos com a letra do preceito, ainda não estamos perante a norma
A norma é o resultado da interpretação
Artigo 18 da CRP encontra-se um preceito, redigido por escrito, elemento literal, o resultado da
interpretação será a norma
A letra do preceito nem sempre revela aquilo que o legislador quer dizer
Artigo 18/2- a lei (elemento literal)
A lei não é suficiente para dizer se é em sentido formal ou material
Elemento sistemático- implica o reconhecimento de que existem interdependências semânticas
entre os preceitos normativos
Interdependência semântica- o significado dos preceitos constitucionais está relacionado com
outros preceitos; há várias conexões entre preceitos
A interdependência pode ser analisada em duas perspetivas:

 Total
Círculo hermenêutico de iluminação recíproca
CRP

A forma como se interpreta um preceito vai iluminar, influenciar a


forma como o outro preceito vai ser interpretado. Há um círculo de interpretação que serve de
iluminação à forma como os outros preceitos são interpretados.
Artigo 2- a forma como interpretamos este artigo vai influenciar a forma como interpretamos os
artigos 110 e 111 da CRP. A separação de poderes está inerente ao Estado do Direito
Na resolução de casos prático tem de se ter presente a letra da constituição e perceber o que o
legislador escreveu. Nem sempre a letra é suficiente, temos de ir mais além- isto pressupõe que
atendamos à sistematização, a uma ideia de como as normas da constituição estão relacionadas
umas com as outras. As partes e o todo estão relacionados.

 Parcial
Implica ter em atenção cada parte da constituição. A relação que na própria parte da
constituição é possível concretizar
Artigo 18/2 – 165/1/b
O 18/2 (lei da Assembleia da República ou Decreto-Lei autorizado pelo governo) depende
daquilo que o 165/1/b consagra, porque o primeiro limita-se a dizer que é a lei que concretiza a
restrição (não diz qual é)
Artigo 103/2 – 165/1/i (lei da Assembleia da República ou Decreto-Lei autorizado pelo
governo)
Elemento histórico- na interpretação dos preceitos à que atender às circunstancias de tempo e
lugar subjacentes à criação do texto constitucional
A constituição de 1976 é essencialmente socialista. A circunstância de saber que a constituição
de 1976 surgiu no contexto de uma revolução que tinha como objetivo pôr fim ao poder
ditatorial leva a que se encontrem soluções no texto da constituição de 76 marcadas pela
tentativa de desviar desse propósito ditatorial. Do ponto de vista ideológico a constituição de 76
é socialista.
Elemento teleológico- qual foi a finalidade do legislador constituinte ao estabelecer um
preceito num determinado sentido
Propósito subjacente às normas constitucionais:
- permitir que os cidadãos se possam relacionar entre si de forma organizada, com dignidade,
coma proteção e respeito dos direitos de uns e outros
- a constituição protege os bens jurídicos fundamentais:
o Liberdade
o Dignidade
o Saúde
o Educação
o Defesa nacional

Bem jurídico- valor reconhecido por uma comunidade e esse valor é a forma importante
absorvido pelo ordenamento jurídico. Quando é absorvido, esse valor torna-se num bem jurídico
Quando a proteção do direito é feita ao nível constitucional diz-se que esse bem é fundamental
A constituição do ponto de vista teleológico visa dar proteção a bens jurídicos fundamentais
- Da reunião de todos estes elementos, consegue extrair-se a norma
A par dos elementos, há princípios que ajudam a tomar a posição (quando há situações
extremas):
O direito constitucional é dado a um exercício difícil de concretizar na prática, mas é suposto
nos prepararmos de o conseguirmos fazer um dia. Uma qualidade que um jurista deve ter é
ponderação, ser ponderado. Este exercício é difícil quando em causa estão em causa bens
jurídicos fundamentais distintos
Princípio da unidade da Constituição
A Constituição como um único instrumento jurídico-normativo
Pode ser entendida como una e do ponto de vista circular
Não há uma hierarquia entre as normas constitucionais
Entre o artigo 24 e o 27 não existe uma relação hierárquica; nenhum é superior a outro; todas as
normas têm a mesma dignidade
“A Constituição tem de ser interpretada à luz da Constituição”
Princípio da concordância prática
Quando somos levados a aplicar dois ou mais preceitos constitucionais que levam a um
resultado contraditório, deve-se procurar fazer um exercício de conciliação entre ambos
Na situação de conflito, o propósito é garantir que ambos são concretizados e nenhum é
colocado de parte
Princípio da máxima efetividade
Se um preceito da constituição admite várias interpretações plausíveis, devemos atender aos
vários resultados possíveis e escolhemos o resultado que melhor seja capaz de proteger as
finalidades constitucionais; aquele que é capaz de elevar a concretização dessa finalidade
Princípio da conformidade funcional
Casos com que aplicam normas relativas à organização do poder político
Escolher o resultado que melhor permite garantir a proteção da separação e interdependência
dos poderes
Artigo 19/7- mesmo em caso de estado de emergência, a separação de poderes não pode ser
posta em causa. Se só a AR tem competência para legislar sobre determinada matéria, só ela o
pode fazer e não o governo
Continuação das perguntas da ficha de 26 de outubro

Diga, justificadamente, se concorda com a seguinte afirmação: “a CRP é reduzida a


um simples instrumento de governo”.
A Constituição é tida como um texto programático
-Estabelece em si as normas-tarefa/fim
-Identifica o sentido de atuação do Estado; linhas de ação
É programática porque estabelece as normas fim que definem as linhas de orientação dirigidas
ao Estado.
Não se pode dizer que é um simples instrumento do governo porque não está em causa só a
definição dos órgãos e das respetivas competências. Define fins e tarefas a serem concretizadas
Linhas de ação que definem o Estado- art 9 - 80

Qual será o fundamento para a atribuição de um caráter compromissório à CRP?


Carácter compromissório- prende-se com a vertente socialista subjacente ao texto de 76
Compromisso entre a força socialista e a força liberal
Força socialista- o Estado intervém; deve intervir
Força liberal- rejeita a intervenção do Estado e confia nos privados para atuar
Artigo 64/2/a
Intervenção do Estado que garante o serviço nacional de saúde
Artigo 61/1
Livre iniciativa de cada um se mover no mercado da forma como quiser sem intervenção do
Estado
Há um outro compromisso que se prende com a garantia de unidade do Estado e a
descentralização de autarquias locais e à autonomia das regiões autónomas

Caso Marbury vs Madison


Contributo que o constitucionalismo americano teve para a nossa própria experiência
constitucional em Portugal
Artigo 3/3
Dá consagração ao princípio da conformidade constitucional dos atos
Os atos devem obediência à Constituição. A constituição é a norma normarum (fonte de
produção normativa, serve de fundamento aos atos do Estado)
Apesar de a constituição ser fundada na ideia de ciclo, na qual os preceitos têm a mesma
dignidade, a relação que estabelece com outras normas é uma relação hierárquica. A lei da AR,
decreto lei do governo, regulamento municipal devem obediência à Constituição, caso contrário
estes atos normativos serão inconstitucionais
Nem sempre estes diplomas estão em conformidade com a Constituição.
Quem garante que a Constituição é respeitada? Quem é o guardião da Constituição?
O ordenamento jurídico não se conforma com a inconstitucionalidade dos atos
As normas constitucionais são normas imperfeitas. Não têm consequência associada em caso de
incumprimento. São normas cuja violação não acarreta qualquer sanção de natureza civil ou
penal
Composição das normas jurídicas:
o Previsão- situação da vida real que a norma consagra
o Estatuição- se essa situação acontecer, qual a consequência; efeito jurídico

Artigo 136/1- se o presidente não respeitar o prazo, não é sancionado. A consequência é


meramente política
Artigo 119/2- consequência associada ao diploma em si, é ineficaz
O que ter em conta no caso Marbury vs Madison:
- Relação hierárquica da Constituição com as outras normas
- A violação das normas não implica sanção de natureza civil ou penal
Contexto:
1803
Decisão do supremo tribunal dos EUA que veio ser mundialmente famosa pela forma como
reconheceu a competência aos juízes para serem guardiães da constituição
Reconheceu aos juízes o poder inalienável de recusar aplicar uma norma se a entenderem como
inconstitucional
John Adams fez uma nomeação de 42 juízes para o tribunal de Colômbia
A presidência está a definir quem vai exercer o poder jurídico
Ao contrário dos planos de John Adams, o Senado que iria concretizar a nomeação atrasou-se.
Só se efetivou na presidência de Thomas Jefferson, que decide invalidar a nomeação feira por
Adams
Marbury, um dos juízes nomeados, não se conforma com a decisão de invalidade de Jefferson e
decide reagir e apresenta uma intimação no supremo tribunal dos EUA contra Madison
(secretário de Estado encarregado de dar concretização à nomeação)
Esta decisão foi relevante porque o juiz do supremo tribunal dos Estados Unidos declarou-se
incompetente para decidir esta questão porque atendia que a norma que estabelecia a
distribuição de competências entre o supremo tribunal e os tribunais inferiores violava a
Constituição. A norma era inconstitucional
A este juiz está a servir de Guardião da constituição. Qualquer juiz que se depare com uma
norma que padece de inconstitucionalidade, não o deve aplicar ao caso
Saber se uma norma viola, não está reservada a um único tribunal, é um poder que está atribuído
a todos os tribunais
O modelo que resultou deste caso, quanto à garantia da Constituição, quanto à fiscalização da
constitucionalidade é um modelo difuso
-Qualquer tribunal aferirá da inconstitucionalidade de uma norma
-Este modelo conheceu muita resistência na Europa continental
-Em 1920 encontramos na Áustria o surgimento de um modelo diferente que reconhece a um
único órgão a competência para controlar a conformidade dos atos com a constituição – Modelo
concentrado
Em Portugal encontramos um modelo misto/complexo.
O controlo da constitucionalidade é difuso na base e concentrado no topo. A última palavra
sobre a conformidade dos atos é do tribunal constitucional
TC- 221 e 277ss CRP- encontramos que em matéria jurídico
constitucional, é o tribunal constitucional que intervém como última palavra, é concentrado no
topo
Tribunal Constitucional (concentrado)

Artigo 204- a garantia da Constituição na base são todos os


tribunais (difuso)

Um juiz diz “Não vou aplicar esta norma porque me parece que é inconstitucional”. Esta
decisão não vai agradar a todas as partes do processo. Elas vão recorrer até chegarem ao
Tribunal Constitucional que vai proferir a última palavra nesse âmbito

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