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Prof. Miguel Teixeira de Sousa (pg.173 seg.

1) Vicissitudes da Vigência da Lei


Com isto considera-se o impedimento à vigência, a suspensão de vigência e a cessação de vigência.
1.1) Impedimento à Vigência
Pressupõe os seguintes requisitos:

 Durante o período de Vacatio Legis (antes da lei entrar em vigor) é publicada uma outra lei sobre a
mesma matéria;
 A lei que é publicada em momento posterior (depois) entra em vigor antes ou ao mesmo tempo que a
lei publicada em momento anterior;
Uma vez que a segunda lei contém última posição do legislador sobre a matéria em questão, a primeira lei não
chega a entrar em vigor.
1.2) Suspensão da Vigência
A suspensão da vigência da lei pode ser um prazo mais ou menos longo. Recorre-se à suspensão quando se
considera inconveniente a lei permaneça em vigor, mas se entende que a lei continua a ser justificada e poderá
retomar a sua vigência no futuro. Há dois tipos de suspensão:
I) Suspensão Temporária – quando a vigência da lei é suspensa por determinado tempo, ao fim
do qual a lei volta a entrar em vigor;
II) Suspensão Indefinida – quando a vigência da lei é suspensa, mas não se define um prazo
concreto de suspensão, logo não há nenhuma data fixa para a lei voltar a vigorar;
1.3) Cessação da Vigência
Causas determinantes da cessação da vigência de uma lei:
I. Caducidade – cessação que decorre do termo do prazo de vigência da lei, ou do desaparecimento
dos pressupostos, de facto ou de direito, da sua aplicação.
 Vigência Temporária – a caducidade verifica-se quando a lei se destina a ter uma
vigência temporária; o que acontece quando a própria lei prevê um facto (pode ser
cronológico, ou não cronológico; quando é não cronológico, pode-se dizer que a vigência
da lei está sujeita a uma condição) que implica a cessação da sua vigência.
 Falta de Pressupostos – a caducidade verifica-se também quando desaparecem os
pressupostos (de facto ou de direito) da sua aplicação; e, quando a previsão da lei deixa
de poder ser preenchida.
II. Revogação – termo de vigência da lei por um ato (expresso ou tácito) do legislador.
 A revogação de uma lei é a cessação da sua vigência determinada por outra lei. Aqui
verifica-se a entrada em vigor de uma lei e a cessação da vigência de outra.
 Esta revogação é realizada por uma outra lei posterior. Pressupõe assim 2 leis: a
revogada e a revogatória. A revogada tem de estar em vigor no momento em que é
revogada; e a revogatória só opera a revogação no momento em que entrar em vigor.
 Modalidades de Revogação:
a) A revogação pode ser expressa (quando resulta de uma declaração do legislador)
ou tácita (quando resulta da incompatibilidade da lei revogada com uma nova lei);
b) Pode ser substitutiva (verifica-se quando a lei revogatória substitui o regime jurídico
da lei revogada) ou simples (ocorre quando a lei revogatória se limita a revogar a lei
anterior sem definir nenhum novo regime jurídico – actus contrarius);
c) A revogação tácita é necessariamente substitutiva, uma vez que é esta
incompatibilidade de um regime posterior com um regime anterior que provoca que a
revogação seja tácita?????;
d) A revogação expressa pode ser simples ou substitutiva;
e) Tendo em conta o seu objeto, a revogação pode ser individualizada (aquela que
atinge apenas uma lei ou algumas regras jurídicas de uma lei) ou global (aquela que
recai sobre um instituto jurídico ou um ramo de direito. Esta é tácita quando decorre
da circunstância de a lei nova regular toda a matéria da lei anterior; ou seja, recair
sobre todo um ramo de direito ou regime jurídico);
f) Tendo em conta o seu âmbito, ela pode ser total/ab-rogação (quando a lei anterior foi
revogada no seu todo) ou parcial/derrogação (quando apenas forem revogadas
algumas regras da lei anterior);
g) Tendo em conta a sua eficácia temporal, ela pode ser retroativa (aquela em que a lei
é revogada a partir do início de vigência da lei revogada) ou não retroativa (a lei é
revogada a partir da vigência da lei revogatória). Normalmente, a revogação não tem
eficácia retroativa. Dúvida: se não é retroativa, isto significa que os atos praticados
durante a vigência da lei revogada são regidos pela lei revogada? Ou só acontece no
direito penal?
 Revogação Tácita – resolve o conflito de leis através de regras que definem os seguintes
critérios:
i. Prevalência da fonte posterior à fonte anterior;
ii. Prevalência da fonte de hierarquia superior à fonte de hierarquia inferior;
iii. Prevalência da fonte especial sobre a fonte geral.
A revogação só pode operar entre uma lei anterior e uma lei posterior da mesma hierarquia ou de
hierarquia superior. Se esta regra não for respeitada a lei posterior é inválida. Em todas as situações que não
sigam a regra há uma incompatibilidade entre a lei revogada e a revogatória (no caso do critério de
posterioridade há uma incompatibilidade total; enquanto no critério de especialidade a incompatibilidade é
parcial). No caso de a lei especial ser posterior à geral, a geral não deixa de vigorar, apenas é restringido, ou
seja, deixa de ser aplicável aos casos abrangidos pela lei especial. [aqui também se pode falar de derrogação,
mas não nos podemos esquecer que aqui não se trata de uma vicissitude na vigência da lei geral, apenas uma
alteração no âmbito da sua aplicação]
Se não se verificar nenhum problema quanto à hierarquia, a lei posterior só pode revogar a anterior
quando ambas forem leis gerais ou especiais; ou quando a lei anterior for geral e a posterior for especial. Assim,
uma lei geral posterior não revoga uma especial anterior, exceto se a intenção inequívoca do legislador for
outra. (não nos poderemos esquecer dos outros elementos da interpretação, não podemos dar importância
apenas ao elemento histórico da intenção do legislador; há uma intenção inequívoca do legislador quando ele o
determine expressamente – seria inútil, porque decorreria de uma determinação expressa; no art.7: O legislador
fala de revogações expressas, e já uma referência linguística diferente; a resolução do problemas remetendo
para a intenção do legislador remete-nos para o juízo cujo resultado pode não ser claro; a palavra inequívoca
vem alocar o ónus da argumentação; se não for inequívoca, não revoga)
 Efeitos Sistémicos – efeitos que a revogação pode produzir no sistema jurídico:
a) A revogação limita-se a eliminar uma repetição no sistema jurídico, sem nada
alterar de substancial neste sistema.
b) Pode implicar o alargamento do âmbito de aplicação de uma outra lei (por
exemplo o caso de quando as leis especiais são revogadas a lei geral passa a
ter um âmbito de aplicação mais vasto);
c) Determina a caducidade de todas as leis que percam o seu âmbito de aplicação
após a cessação de vigência daquela lei.
d) A revogação de uma lei implica também a caducidade de todas as leis
dependentes.
 Revogação e Aplicabilidade – Embora a revogação de uma lei implique o fim de vigência
da lei, não significa que a lei revogada deixe de ser aplicável na resolução de casos
concretos. Esta possibilidade decorre da aplicação da lei no tempo, em concreto, da
sobrevigência da lei antiga (a revogação não implica a cessação de vigência da mesma
lei, mas apenas a restrição do seu âmbito de aplicação)
 Não Repristinação – a lei revogatória pode ser revogada por uma lei posterior – aqui, vale
a regra da não repristinação da lei revogada, segundo o qual a revogação da lei
revogatória não importa o renascimento da lei que teria sido revogada; para que o
contrário fosse possível, era necessário que a nova lei revogatória indicasse que a
anterior lei revogada voltasse a entrar em vigor.
Esta regra nem sempre é seguida: a declaração de inconstitucionalidade ou ilegalidade com força
obrigatória geral da lei revogatória determina a repristinação das regras que a lei declarada inconstitucional ou ilegal
tinha revogado, pelo que essa declaração implique a retoma de vigência da lei revogada.
 Revogação e Remissão – Pode acontecer que a lei para a qual uma outra lei realizou
uma remissão seja revogada por uma lei posterior. Importa assim verificar quais os
reflexos dessa revogação na remissão. Aqui temos que distinguir entre:
i. Revogação Simples: implica a interpretação ab-rogante da lei remissiva;
ii. Revogação Substitutiva: implica que todas as remissões realizadas para a lei
revogada passam a ser feitas pela lei revogatória
III. Declaração de Inconstitucionalidade ou ilegalidade com força obrigatória geral.
IV. Formação de um Costume contra legem (formação de um costume contrário à lei).
1.4) Problemas de Hierarquia
A lei revogatória tem de ter a mesma hierarquia ou hierarquia superior à lei revogada ou suspensa.

2) Direito Transitório (Aplicação da Lei no Tempo)


A revogação da lei antiga pela lei nova permite assegurar a consistência do sistema jurídico, pois evita que
vigorem duas leis sobre a mesma matéria; mas não resolve os problemas relativos à lei aplicável. Soluções
para estes problemas:
1. Entender que as situações jurídicas constituídas antes do início de vigência da lei nova continuam
a ser regidas pela lei antiga  assim, conclui-se que as fontes aplicáveis na decisão de casos
concretos não coincidem necessariamente com as fontes vigentes num sistema jurídico, pois
podem ser aplicadas fontes que já não vigoram nesse sistema.
2.1) Princípios Orientadores
Os problemas relativos à aplicação da lei no tempo decorrem da sucessão de leis para regular uma mesma
realidade. Para facilitar, distingue-se:
 A lei nova pode referir-se factos jurídicos (podem ser: a) instantâneos se se verificarem
instantaneamente; b) duradouros se os factos perdurarem no tempo), ou seja, a
acontecimentos que ocorreram num determinado momento e lugar.
 A lei nova pode também referir-se a efeitos jurídicos (podem ser: a) efeitos jurídicos
instantâneos, ou seja, as consequências momentâneas de factos jurídicos; b) situações
jurídicas, ou seja, consequências duradouras de factos jurídicos).
Na resolução dos problemas de aplicação da lei no tempo temos que escolher entre:
 Interesse na estabilidade – conducente à aplicação da lei antiga;
 Interesse na adaptação – que conduz à aplicação da lei nova.
Princípios para a resolução de conflitos de leis no tempo:
 Princípio da Não Retroatividade da lei nova – reflexo do interesse na estabilidade e uma
emanação do princípio da confiança – assegura que factos passados e efeitos já produzidos não
são abrangidos pela lei nova;
 Princípio da Aplicação Imediata da lei nova – reflexo do interesse na adaptação e constitui uma
exigência do Estado de Direito e do caráter abstrato e genérico das regras jurídicas. Daqui
decorrem 4 consequências:
i. A lei nova aplica-se a todos os factos futuros que ocorram na sua vigência;
ii. A lei nova aplica-se a todos os efeitos futuros que se produzam na sua vigência;
iii. A lei nova plica-se a todos os factos jurídicos que se tenham iniciado na vigência da lei
antiga e que ainda estejam em curso no início de vigência da lei nova;
iv. A lei nova aplica-se a todas as situações jurídicas que se tenham constituído na vigência
da lei antiga e que não se tenham extinguido antes da vigência da lei nova.
2.2) Direito Transitório
O direito transitório resolve os problemas suscitados pelos conflitos de leis no tempo. Este pode ser
material ou formal:
 Material – fixa um regime específico para determinados factos ou efeitos jurídicos, ou seja, institui um
regime que não coincide nem com o da lei antiga nem com o da nova.
 Formal – este escolhe de entre a lei nova e a lei antiga qual é a lei aplicável a um certo facto ou
determinado efeito jurídico. Este tipo de direito transitório comporta regimes específicos:
i. Regime Especial – estabelecido no art.º 297.ºCC, relativo à alteração de prazos;
ii. Regime Geral – estabelecido nos art.º 12.º e 13.º CC; este é também o regime legal
subsidiário.
O direito transitório formal é constituído por regras de conflitos, regras que determinam qual a lei
competente para regular um certo facto ou efeito jurídico. Estas regras de conflito comportam uma previsão
e uma estatuição:
 Previsão – contém 2 elementos: o objeto de conexão (define o campo de aplicação da regra de
conflitos, servindo-se de um conceito-quadro – ou seja, o facto, a situação jurídica ou o efeito jurídico
que se procura determinar se é regulado pela lei antiga ou pela nova) e o elemento de conexão
(elemento utilizado pela regra de conflitos para estabelecer a conexão com a lei antiga ou com a lei
nova – ou seja, a ocorrência do facto, a existência da situação jurídica ou a produção do efeito na
vigência da lei nova ou antiga).
 Estatuição – determinação da lei competente para regular o facto, a situação ou o efeito jurídico.
2.2.1) Soluções do Conflito
A resolução de um conflito de leis no tempo pode ser obtida através:
i. Aplicação Imediata da Lei Nova [art.º 12.º/1 (1ªparte); /2 (2ªparte)]:
A lei só dispõe para o futuro; ou seja, a lei nova regula os factos jurídicos que ocorram após a sua
vigência, mesmo os factos duradouros que se iniciaram na vigência da lei antiga e que se mantêm no
início de vigência da lei nova.
Efeitos jurídicos instantâneos – a aplicação imediata da lei implica que são abrangidos pela Lei
Nova os efeitos que se produzam (ou modifiquem ou extingam) depois do seu início de vigência. A
constituição de um efeito jurídico pode decorrer da conjugação de factos que ocorreram na vigência da
lei antiga e de factos que se verificaram na vigência da lei nova.
Situações Jurídicas – [art.º 12.º/2 (2ªparte)] para que se verifique a aplicação imediata da lei ás
situações jurídicas que se constituíram na vigência da lei antiga que transitam para o domínio da lei
nova, é necessário que a lei nova disponha diretamente sobre o conteúdo de certas situações
jurídicas, abstraindo dos factos que lhes deram origem (ou seja, do seu título constitutivo); neste caso,
o título não modela o conteúdo da situação jurídica.

ii. Sobrevigência da Lei Antiga [art.º 12.º/2 (1ªparte)]:


Ocorre sempre que lei nova se refira às condições de validade de um ato jurídico ou ao
conteúdo de situações jurídicas que não possam abstrair do seu título constitutivo.
Quando a lei nova dispuser sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer
factos, entende-se que só visa os factos novos.
Quando a lei nova disponha sobre o conteúdo de uma situação jurídica e não abstraia do
respetivo facto constitutivo, não pode verificar-se a aplicação imediata da lei nova, assim, o
conteúdo da situação jurídica continua a ser regulado pela lei antiga.
iii. Retroatividade da Lei Nova [art.º 12.º/1 (2ªparte) e art.º 13.º/1]:
A lei nova é retroativa quando ela se aplica a factos já ocorridos ou a efeitos já produzidos
antes da sua entrada em vigor.
A lei nova também é retroativa quando produz um efeito jurídico ou extingue um efeito jurídico
produzido com base num título modelador anterior à sua vigência.
Este princípio comporta 2 exceções:
a) A lei nova pode ter eficácia retroativa;
b) A lei interpretativa tem em regra caráter retroativo.
Há limites impostos à retroatividade da lei nova sempre que haja que salvaguardar interesses
que não devam ser atingidos por um regime jurídico retroativo. Limitações que constam na CRP:
a) As leis restritivas de direitos, liberdades e garantias não podem ter efeito retroativo;
b) A lei penal incriminatória não pode ser retroativa;
c) A lei que regula a competência dos tribunais criminais não pode ser retroativa;
d) A lei que cria impostos não pode ser retroativa.
Quando a lei nova tenha eficácia retroativa presume-se que ficam ressalvados os efeitos já
produzidos pelos factos que ela se destina a regular.
Lei Interpretativa – lei que realiza a interpretação autêntica de um ato normativo, o que
pressupõe o caráter interpretativo daquela lei. Esta lei integra-se na lei interpretada, ou seja, o
significado estabelecido pela lei interpretativa coincide com o único significado que a lei
interpretada sempre comportou. Por esta razão é que a lei interpretada é retroativa. A
retroatividade da lei interpretativa não é irrestrita, uma vez que ela não atinge todos os factos
passados e todos os efeitos já produzidos; segundo o art.º 13.º do CC, ela não atinge o
cumprimento de uma obrigação, nem a sentença que adquiriu a força de caso julgado por não ser
impugnável, nem a transação e os atos análogos. A lei pode ser qualificada como interpretativa
mas afinal ter um conteúdo inovador: aqui ela é falsamente interpretativa; ela continua a ter a
retroatividade atribuída pelo art.º 13.º uma vez que o legislador está dentro da margem de atuação
concedida pela lei.
A lei nova pode ser menos exigente quanto aos requisitos de validade formal ou substancial de
um ato jurídico do que a lei antiga. Essa circunstância não terá nenhum reflexo sobre os atos
jurídicos praticados durante a vigência da lei antiga; segundo o art.º 12.º/2(1ªparte) a aplicação
imediata da lei nova não torna válido o que era inválido na vigência da lei antiga.
Retroatividade in mitius e lei Confirmativa– se a lei nova dispuser
que se consideram válidos os atos jurídicos que, tendo sido praticados durante a vigência da lei
antiga, preenchem os requisitos de validade determinados pela lei nova. Requisitos:

 Se o ato jurídico não estiver a produzir quaisquer efeitos no momento


da entrada em vigor da lei nova, aplica-se o art.º 12.º/2 1ªparte, não
havendo assim retroatividade in mitius da lei nova.
 Se o ato jurídico, apesar de inválido, estiver a produzir efeitos no
momento de vigência da lei nova há que entender que esta lei produz
um efeito confirmativo do ato inválido e verifica-se uma retroatividade in
mitius da lei nova.
Graus de Retroatividade – a retroatividade pode ser mais ou menos ampla; ela pode abranger
mais ou menos factos passados ou efeitos já produzidos. Na ordem jurídica portuguesa são
admissíveis os seguintes graus de retroatividade:

 Retroatividade Ordinária – respeita todos os efeitos já produzidos antes da entrada em


vigor da lei nova;
 Retroatividade Agravada – respeita determinados efeitos produzidos antes da vigência da
lei nova, mas que atinge outros efeitos igualmente produzidos já antes desse momento;
 Retroatividade Quase-Extrema – só respeita o caso julgado obtido antes da lei nova –
retroatividade mais forte admissível no ordenamento jurídico português;
 Retroatividade Extrema – nem sequer respeita o caso julgado anterior à vigência da lei
nova (exceção – só admissível em caráter sancionatório se for mais favorável ao agente).
Limite à Retroatividade – Declaração de Inconstitucionalidade ou Ilegalidade de uma norma
com força obrigatória geral pelo TC: esta declaração produz efeitos desde a entrada em vigor da norma
declarada inconstitucional ou ilegal, mas, ficam ressalvados dos efeitos dessa declaração os casos
julgados; estes só não ficam ressalvados se se verificarem estas 2 condições:
1) se a norma declarada inconstitucional/ilegal que esteve na base da decisão transitada
em julgado respeitar a matéria penal, disciplinar ou de ilícito de mera ordenação social;
2) se essa norma tiver um conteúdo menos favorável ao autor do ato do que a norma
posterior que regule a mesma matéria.
--o caso julgado não pode ser atingido por uma lei nova de caráter retroativo. Se a declaração de
inconstitucionalidade/ilegalidade não pode afetar o caso julgado, então o legislador também não pode atribuir a uma
lei nova uma retroatividade que atinja esse mesmo caso julgado.
--Exceção: é possível produzir-se uma lei nova retroativa em matéria penal, disciplinar ou de ilícita mera ordenação
social; se essa lei nova for mais favorável do que a lei antiga.
iv. Retroconexão da Lei Nova [art.º 12.º/1 (1ªparte)]:
Decorre do preenchimento da previsão da lei nova com factos passados ou efeitos já
produzidos; não conduz a nenhuma alteração do passado, mas à definição do presente em função
de factos ou efeitos passados.
Ela pode ser total (quando o facto ou efeito que serve de previsão da lei nova já se verificou
totalmente no passado) ou parcial (quando a previsão da lei nova engloba quer factos que
ocorreram ou efeitos que se produziram na vigência da lei antiga, quer factos ou efeitos que se
verificaram na vigência da lei nova).
Limites da Retroconexão – semelhantes aos da retroatividade: a proibição da aplicação
retroativa da lei penal implica a impossibilidade de uma lei nova extrair, para o futuro, quaisquer
consequências penais de uma conduta que era lícita quando foi praticada; a proibição das leis
restritivas de direitos, liberdades e garantias determina a impossibilidade de uma lei nova retirar
quaisquer consequências do exercício lícito de um direito ou do gozo legitimo de uma liberdade ou
garantia; a necessidade da lei retroativa respeitar o caso julgado impede que uma lei nova o
ignore para o futuro.
A retroconexão conduz à aplicação imediata da lei nova. Ao pressupor sempre uma aplicação
imediata da lei podemos afirmar que ela está disposta no art.º 12.º/1 1ªparte.
É importante determinar se a situação jurídica tem um conteúdo que depende do seu facto constitutivo ou
se esse conteúdo é independente desse facto. Admitem-se então 2 hipóteses:
i. O título não modela a situação jurídica – uma vez que a situação jurídica tem sempre o mesmo
conteúdo independentemente do título que a ela esteja subjacente [art.º 12.º/2 (2ªparte)];
ii. O título modela a situação jurídica – o conteúdo da situação jurídica varia de acordo com respetivo
título constitutivo [art.º 12.º/2 (1ªparte)];
2.2.2) Critério Supletivo Especial
Art.º 297.º CC estabelece um regime especial para a sucessão de leis sobre prazos; o regime legal (só é
aplicável aos casos que estejam em curso no momento de entrada em vigor da lei nova) varia consoante a
lei nova estabeleça.
Diminuição do Prazo Se a lei nova estabelecer um prazo mais curto do que a lei antiga, a lei nova é
imediatamente aplicável aos prazos que já estiverem em curso, mas o prazo só se conta a partir da entrada
em vigor da lei nova; a não ser que, segundo a lei antiga, falte menos tempo para o prazo se completar =
Sobrevigência da Lei Antiga, justificada pela necessidade de evitar que um encurtamento do prazo se
viesse traduzir num aumento desse mesmo prazo.
Aumento do Prazo Se a lei nova fixar um prazo mais longo do que aquele que era definido pela lei
antiga, a lei nova é imediatamente aplicável aos prazos em curso, mas, contar-se-á neles todo o tempo
decorrido desde o seu momento inicial.
ExtensãoArt.º 297.º/3 determina que as regras relativas à sucessão de leis sobre prazos são igualmente
aplicáveis aos prazos fixados pelos tribunais ou por qualquer outra autoridade.
Restrição O disposto no art.º 297.º/1 e 2 não é aplicável a todos os prazos que sejam fixados por uma lei
nova. Devido a:
(1) não é aplicável quando os prazos tenham sido definidos pelas partes ou quando estas não
tenham estipulado quaisquer prazos e tenham aceite os prazos legais supletivos – aqui nada
justifica que se afaste a solução que vale para as estipulações negociais.
Relativamente aos prazos legais temos 2 situações:
(1) se a lei nova aumentar o prazo que consta da lei antiga, aplica-se o disposto no art.º 297.º/2,
que ao consagrar uma hipótese de retroconexão parcial coincide com a regra da aplicação
imediata da lei nova;
(2) se a lei nova encurtar o prazo que está determinado pela lei antiga, temos 2 hipóteses:
A. Se a aplicação imediata do prazo mais curto criar um desequilíbrio entre as partes, onde
uma delas é beneficiada em detrimento da outra, o nº1 do mesmo artigo acautela
suficientemente os interesses de todas as partes;
B. Se a aplicação imediata do prazo mais curto não originar nenhum desequilíbrio entre as
partes, porque qualquer delas pode beneficiar desse mesmo prazo, a solução é a
aplicação imediata da lei nova de acordo com a 1ª parte do nº1 do art.º 12.º, não sendo
necessário recorrer ao 297.º.
3) Direito Subjetivo e Objetivo
3.1) Perspetivas de Análise
O Direito pode ser considerado numa perspetiva (1) dinâmica (onde o direito é um conjunto de
consequências ou efeitos) ou (2) estática (onde o direito é um conjunto de regras).
(1) Visão Dinâmica:
 O Direito pode ser objeto de uma análise dinâmica, que se socorre dos conceitos de facto
jurídico, regra jurídica, e consequência ou efeito jurídico.
 O facto jurídico é todo o facto que é relevante para o Direito; todos os factos cuja verificação
desencadeiam consequências ou efeitos jurídicos. Uma vez que o facto jurídico é construído
pelo próprio direito diz-se que é um facto bruto que o direito transforma em facto institucional.
 Um ato jurídico é um facto humano e voluntário juridicamente relevante.
 Um facto jurídico stricto sensu é um facto não humano e não voluntário que seja juridicamente
relevante (ex.: nascimento, morte).
 A regra jurídica é o significado de uma fonte do direito. É a partir destas que se determina a
relevância jurídica dos factos, pois apenas são integráveis na previsão dessas regras os
factos qualificados como jurídicos. Esta qualificação é a operação que que possibilita a
transformação de um facto bruto num jurídico.
 A consequência ou efeito jurídico é o resultado da aplicação de uma regra jurídica a um facto
jurídico; podendo essa aplicação traduzir-se na constituição, modificação ou extinção desse
efeito.
 Todo o efeito constitutivo decorre de um título, ou seja, de um facto a que uma regra jurídica
atribui a função de constituir efeitos jurídicos.
(2) Visão Estática
 Considera-se o direito em si mesmo, independentemente das consequências ou dos efeitos
jurídicos que resultam da aplicação das regras jurídicas a certos factos jurídicos.
 Significa que as regras jurídicas são analisadas e estudadas como tal, sem haver a
preocupação de determinar as consequências e as situações que decorrem da sua
aplicação.
É preferível seguir uma perspetiva estática de análise ao direito. A preocupação deve assim incidir
sobre o direito considerado em si mesmo e não sobre as consequências.
3.1.1) Perspetiva Objetiva
Pode ser entendido em vários sentidos:
 expressão “Direito Objetivo” como equivalente a sistema ou ordenamento jurídico;
 expressão “Direito Objetivo” como sinónimo de lei ou de fonte do direito;
 expressão “Direito Objetivo” como equivalente a regra jurídica;
As regras jurídicas que se referem a uma mesma realidade sociojurídica constituem um instituto.
3.1.2) Direito Subjetivo
Alude-se à posição de um sujeito (o titular de direito) quanto a um determinado modo de atuar.
O Direito Subjetivo tem sido concebido de várias maneiras:
 Como um “poder de vontade”;
 Como um “interesse juridicamente protegido”;
 Como um “direito de exigir e de constituir”;
O Direito Subjetivo é então a situação subjetiva que resulta de uma permissão de ação ou de omissão
(quando as situações subjetivas se referem a um poder, a situação que decorre da permissão é uma
faculdade ou competência).
De acordo com a visão estática adotada, não são consideradas as consequências jurídicas
decorrentes da aplicação das regras jurídicas aos factos jurídicos.
4) Situações Subjetivas
A estatuição das regras relativas a uma conduta ou a um poder constitui uma situação subjetiva.
A categoria desta situação depende do objeto da regra (difere se tiver por objeto uma conduta ou um
poder) e do sentido do operador deôntico (caráter de obrigação, permissão ou proibição).
4.1) Concretização do Objeto
Se a regra jurídica tiver por objeto uma conduta, teremos as seguintes hipóteses:
 Se o operador deôntico for uma obrigação ou uma proibição – a situação jurídica é um dever;
 Se o operador deôntico for uma permissão – a situação jurídica é um direito;
Se a regra tiver por objeto um poder, teremos as seguintes hipóteses:
 Se o operador deôntico for uma proibição – a situação jurídica constituída é uma sujeição;
 Se o operador deôntico for uma permissão – a situação jurídica constituída é uma faculdade
(a modalidade mais frequente das faculdades que são atribuídas por uma permissão é
constituída pelos direitos potestativos, que são direitos a constituir, modificar ou extinguir uma
situação jurídica);
4.1.1) Situações Relativas e Absolutas
As situações subjetivas podem ser relativas ou absolutas:
 Há direitos que são correlativos de deveres (direitos relativos);
 Há direitos que implicam deveres (direitos absolutos);
4.2) Lógica da Ação
Uma ação introduz uma modificação no mundo e uma omissão não causa nenhuma modificação no
mundo.
A lógica da ação refere-se às opções de conduta (ação ou omissão) que num certo momento se abrem
a um agente.
Os agentes podem confrontar-se com conflitos normativos – com regras contraditórias sobre direitos
ou deveres (pode suceder que uma regra atribua um direito ou imponha um dever e que uma outra
regra negue esse direito ou contrarie esse dever).
Os agentes podem confrontar-se com conflitos de situações subjetivas – quando num caso concreto
há direitos ou deveres cujo gozo ou cumprimento impede o gozo ou o cumprimento de outros direitos
ou deveres.
Estes conflitos não pressupõem nenhuma incompatibilidade entre regras jurídicas, sendo que eles não
podem ser confundidos com as hipóteses onde se verifica uma inconsistência no sistema.
Os conflitos de situações subjetivas pressupõem apenas que, num caso concreto seja impossível
gozar todos os direitos ou cumprir todos os deveres que constam de regras válidas.
4.2.1) Incoerência Pragmática
Um sistema é consistente quando qualquer obrigação pode ser cumprida sem violar nenhuma outra e
quando qualquer permissão pode ser gozada sem violar nenhuma obrigação. Embora que mesmo que
o sistema seja consistente não é possível assegurar que todos os direitos possam ser
simultaneamente gozados e que todas as obrigações possam ser simultaneamente cumpridas.
O princípio de que a obrigação pressupõe a possibilidade pode ser respeitado pelo sistema, mas não o
ser na prática.
Isto significa que nunca é possível assegurar a consistência pragmática num sistema jurídico, ainda
que este seja consistente – estas situações são aquelas em que se verifica uma colisão de deveres ou
de direitos.
4.2.2) Espécies de Conflitos
A colisão interpessoal de direitos ocorre quando vários sujeitos são titulares de direitos incompatíveis
entre si.
 A colisão de direitos homogéneos verifica-se quando os direitos incompatíveis são todos da
mesma espécie – ocorre quando os direitos conflituantes pertencem a espécies distintas.
O conflito unipessoal de deveres ocorre quando, sobre um mesmo sujeito, recaem deveres
incompatíveis;
 No conflito de deveres heterogéneos, os deveres pertencem a diferentes espécies.
 A análise dos conflitos de deveres implica uma referência aos atos supra-rogatórios – esses
atos são aqueles cuja prática é louvada, mas cuja omissão não pode ser censurada.
4.2.3) Solução dos Conflitos
O Direito Positivo fornece alguns critérios para solucionar o conflito de direitos:
1. Hierarquização dos Direitos Conflituantes;
2. Prioridade do Direito ou do seu Exercício;
3. Preferência na Satisfação do Direito;
No caso de faltar um critério legal, a colisão de direitos e o conflito de deveres só podem ser
solucionados através de uma ponderação de interesses – através de uma hierarquização dos
interesses a que respeitam aqueles direitos e deveres. Como se efetua esta ponderação?
Fórmula de Ponderação: prevalece o direito cujo gozo ou cujo cumprimento “derrotar” a
contrarrazão fornecida por um direito ou dever incompatível. Os direitos e deveres são
equivalentes se a razão para o gozo ou cumprimento de um deles for igual à contrarrazão
fornecida por outro direito ou dever. Estas razões e contrarrazões são aferidas pela importância
dos interesses a que eles respeitam.
Se após a avaliação dos interesses conflituantes se concluir que um prevalece sobre o outro,
há que dar preferência ao direito ou dever superior. Esta prevalência pode originar 2 situações:
1. Apenas o direito prevalecente pode ser gozado – o gozo de um direito superior
impede o gozo de um inferior [art.º 335.º/2 CC];
2. O cumprimento do dever prevalecente não afasta o cumprimento do dever inferior
conflituante.
Se um direito ou dever respeitar a um interesse equivalente dos demais direitos ou deveres
conflituantes, então nenhum dos direitos ou deveres prevalece sobre os demais. 2 situações:
1. Apesar de conflituantes, todos os direitos podem ser gozados, embora somente
numa medida “sub-otimizada” – cada um dos direitos conflituantes deve ceder para
que todos eles possam ser gozados – solução do compromisso.
2. Situação específica dos deveres: verifica-se quando apesar de equivalentes, não é
possível cumprir todos os deveres conflituantes – aqui pode ser cumprido qualquer
dever.
4.2.4) Valor Prima Facie
A ponderação de interesses por detrás da resolução da colisão de direitos e do conflito de deveres
mostra que nenhuma situação subjetiva pode ser considerada absoluta – há sempre que contar que
um direito possa obstar ao gozo de outro direito e que um dever possa justificar o não cumprimento de
outro dever.
Assim, as situações subjetivas valem apenas prima facie, uma vez que nas hipóteses de colisão ou de
conflito elas podem ser desconsideradas por outras situações subjetivas prevalecentes.
As situações subjetivas atribuídas pelo sistema jurídico estão submetidas a uma condição pragmática
com um dos seguintes enunciados:
1. O titular só pode gozar o seu direito se, na situação concreta, não houver um direito de outrem
que deva prevalecer;
2. O titular só está obrigado a cumprir o seu dever perante alguém se, na situação concreta, não
houver um dever perante outrem que deva prevalecer.
As situações subjetivas que cedem perante outras situações subjetivas estão sujeitas a uma
pragmatic defeasibility.
Deveres prima facie (deveres que podem ser derrotados por outros deveres) – a prevalência de um
deles torna inexistentes os deveres conflituantes ou considerar que todos eles se mantêm existentes,
embora releve uma causa que justifique o não cumprimento de um deles.
Razões para agir de primeira ordem – fornecem razões para agir ou não; estas podem ser afastadas
por uma razão com maior força; cedem perante contrarrazões;
Razões para agir de segunda ordem – fornecem razões para agir ou não de acordo com outras razões
– estas razões de 2ªordem são as “razões excludentes”; estas prevalecem sobre quaisquer outras
razões, qualquer que seja a sua força relativa; não cedem perante nenhumas contrarrazões.
Isto mostra-nos que podem existir razões para agir que excluem qualquer outra razão
para não agir, e por isso estão imunes a qualquer contrarrazão.
GIRILL fornece 3 hipóteses para mostrar que não são apenas os conflitos de deveres que originam
deveres prima facie:
1. Cancellation – hipótese de cancelar;
2. Overriding – decorre de um conflito de valores;
3. Nulification – algo fica sem efeito; é nulo.

Prof. Menezes Cordeiro (pg.825-860)

1) Cessação de Vigência
1.1) A Caducidade da Lei
Existem 2 tipos de caducidade:
1. Sentido Amplo – traduz a cessação de um efeito jurídico, pela superveniência de um facto a que o
Direito confira eficácia extintiva ou pelo desaparecimento da base que lhe facultava a produção de
efeitos.
2. Sentido Estrito – exprime a cessação de efeitos pelo decurso do prazo a que eles estavam
sujeitos. As situações sujeitas a este tipo de caducidade estão estruturalmente delimitadas em
termos temporais.

Leis Transitórias: são consideradas leis transitórias aquelas que se destinam a vigorar apenas num
período limitado. Por exemplo: leis destinadas a enfrentar situações passageiras, leis que visem um
efeito pré-determinado, leis dirigidas a ocorrências destinadas a desaparecer. Em todos os casos é
necessário que se possa inferir a autolimitação da lei. O diploma transitório pode conter um prazo
explicito e certo quanto à sua vigência, mas pode também ter um termo incerto. Existem ainda as leis
condicionadas, cuja vigência dependa da ocorrência da condição.
1.1.1) Supressão da Matéria Regulada
A lei visa regular os factos que nela própria se prevejam; então, quando se verifica que tais factos não se
podem verificar, a lei cessa automaticamente a sua vigência.
Neste caso não se trata de uma lei transitória uma vez que o objetivo do legislador não é o de
uma aplicação necessária e temporalmente limitada. A lei procura vigorar para sempre, e só deixa
de o fazer de acordo com uma ocorrência exterior á vontade normativa.
A caducidade de uma lei não se confunde com a sua não-aplicação.
Existe ainda a eventualidade de a lei visar uma solução que se tornou impossível ou inútil, aquando desta
ocorrência, faz cessar a sua vigência numa caducidade em sentido amplo.
1.1.2) Desuso

Ocorre quando, justificadamente, uma lei deixa-se de aplicar. A justificação deve ser procurada no plano
do sistema, ela pode resultar:
a) De se atenuarem fortemente os fins que levaram à promulgação da lei;
b) De, no seu conjunto e mercê da evolução socioeconómica, a lei se revelar contraproducente ou
inútil;
c) De se terem apurado valores ou princípios que contraditem a via prosseguida ou que a tornem
menos eficaz.
Encontramos uma não aplicação consistente da lei e apoiada no sistema, sedimentada num período de
tempo significativo.
1.2) A Revogação da Lei
Diz-se revogação a cessação de vigência de uma lei (lei velha) por determinação de outra lei (lei nova).
Temos então:
i. Revogação – figura mais geral; abrange as diversas situações de cessação de vigência de uma
lei, pela ocorrência de uma nova lei.
ii. Ab-Rogação – traduz uma revogação expressa e completa de uma lei velha por uma nova.
iii. Derrogação – afastamento da lei velha pelo surgimento de um novo regime com ela incompatível.
O Art.º 7.º/2 do CC aponta 3 modalidades de revogação:
i. Revogação Expressa – ocorre sempre que uma lei nova suprima explicitamente a lei velha.
ii. Revogação Implícita – casos em que uma lei venha estabelecer um regime diverso do anterior.
iii. Revogação Global – sempre que uma lei substitua toda a matéria regulada na anterior.
1.2.1) Leis Especiais
Diz-se especial a norma que retire, de um regime comum, uma situação determinada em função de uma
certa característica e estabeleça, para ela, um regime não conforme com o aplicável às generalidades das
situações.
A situação de especialidade é sempre relativa – ela só é especial em relação a uma outra norma.
1.2.2) Remissões para Leis revogadas e não-repristinação
O que acontece quando uma lei remete para outra que tenha sido revogada?
i. Remissões Estáticas – a lei remissora apela ao concreto regime constante da lei para que remeta;
assim, se este for revogado, a lei remissora perde o seu sentido, sendo também revogada.
ii. Remissões Dinâmicas – se foi substituído subentende-se que a remissão se vai reportar à lei
nova.
Princípio da Não-Repristinação das Leis [art.º 7.º/4 CC] – a revogação da lei revogatória não importa o
renascimento da lei que este revogara. Esta mensagem normativa dirige-se apenas à supressão da lei
velha. A repristinação é possível apenas perante a lei nova.
2) Direito Transitório
Este fenómeno tem a ver com a sucessão de leis no tempo. Quando uma situação jurídica se prolongue no
tempo e tenha se deparado com uma lei velha e uma lei nova, qual se deve aplicar?
 Direito Transitório Material – quando surgem regras especiais para as situações em
causa dispensando-lhes um tratamento misto adequado à sua materialidade;
 Direito Transitório de Conflitos – quando ocorrem regras de conflito que determinam a
aplicação da lei nova ou da lei velha.
O Direito Transitório preocupa-se também com a entrada em vigor das leis e a sua cessação.
2.1) Princípios Clássicos
São 3 os princípios clássicos do Direito Transitório:
i. Princípio da Não-Retroatividade – “a lei dispõe apenas para o futuro”. Significa que (a) a lei nova
não se aplica às questões que já foram resolvidas de acordo com a lei velha; (b) a lei nova não
funciona perante os factos jurídicos operados perante a lei anterior; (c) a lei nova respeita os
direitos adquiridos.
A lei retroativa será aquela que fixa efeitos não em função de factos presentes ou futuros, mas
de acordo com algo que sucedeu no passado e que nada poderá alterar.
 Podemos então distinguir 3 tipos de retroatividade:
A. Retroatividade Forte – a lei nova atinge situações que já foram decididas pelo
tribunal ao abrigo da lei velha. Este tipo de retroatividade é inconstitucional de acordo
com o art.º 282.º/3 CRP.
B. Retroatividade Média – vai atingir efeitos decorridos ao abrigo da lei velha. Este tipo
de retroatividade é tendencialmente inconstitucional: a CRP não a proíbe, a não ser
em matéria penal e salvo se a lei nova for mais favorável ao arguido. Se não, a
retroatividade contraria o princípio básico da proteção de segurança (característica
de um Estado de Direito); ela poderia ser admitida se fosse compensada com uma
indemnização.
C. Retroatividade Fraca - quando a lei nova vá atingir determinados efeitos para o futuro
que já estavam a decorrer ao abrigo da lei velha. Este tipo de retroatividade é
admissível desde que não contradiga valores constitucionais, e no caso concreto não
origine posições abusivas por serem contrárias ao sistema.
ii. Princípio do Respeito pelos Direitos Adquiridos – “a lei nova deve respeitar os direitos
anteriormente constituídos”. Distinguem-se então:
A. Regras que se reportam aos requisitos para a aquisição de direitos – a lei nova rege
para o futuro, respeitando os direitos constituídos (mas estes não se confundem com
meras expectativas; estas são atingidas pela lei nova)
B. Regras que regem institutos, dos quais podem emergir relações jurídicas – são
sensíveis à lei nova.
 O sistema dependeria então da natureza das regras em jogo. Teremos de saber se elas
visam factos passados ou futuros (nesta hipótese não afetam os primeiros).
iii. Princípio da Aplicação Imediata da Lei – a regra do respeito pela lei leva a que a mesma se deva
aplicar imediatamente. A aplicação imediata da lei não envolve uma aplicação retroativa, mas
finda a lei velha; que uma vez revogada pela lei nova não pode mais reger as situações da vida
social.
 Segundo o Art.º12.º/2 (2ªparte), a lei nova dirige-se para situações preexistentes, ou seja,
relações duradouras. De outro modo, subsistiriam situações perpétuas reguladas por leis há
muito ab-rogadas. Este artigo conduz-nos a uma manifestação de retroatividade fraca: a lei
rege ignorando os factos passados que justificam a diferenciação que ela vai suprimir.
2.2) Leis Interpretativas
São leis que interpretam outras. Quando uma lei velha tem vários sentidos possíveis, a lei interpretativa
vem validar um desses sentidos.
Estas leis têm determinados requisitos:
I. Tem que recair sobre um ponto em que existam efetivas divergências e sendo estas reconhecidas
pela jurisprudência/doutrinas;
II. Tem que exprimir uma vontade legislativa de resolver a dúvida dentro de uma das soluções
plausíveis (se não, seria inovatória);
III. Tem que manifestar uma intenção normativa de o fazer;
IV. A retroatividade resultante tem que coincidir com os dados básicos do sistema.
O art.º 13.º/1 (2ªparte) proíbe a retroatividade forte; no que diz respeito à retroatividade média, tem que se
ponderar em cada caso a sua admissibilidade constitucional.
3) Situações Jurídicas
3.1) Situação Jurídica
Situação humana valorada pelo direito;
Produto de uma decisão apropriada, correspondendo ao ato e ao efeito de realizar o direito, resolvendo um
caso concreto;
Ela integra a localização das fontes, a interpretação e a aplicação.
Existem várias modalidades de situações jurídicas:
i. Situações Simples e Complexas (deriva muitas vezes de fatores científicos ou de problemas de
linguagem)
 Situações Simples – é composta por um elemento ou mais?? Se tirarmos algum dos seus
elementos a situação deixa de existir;
 Situações Complexas – constituída por vários elementos, ocorre quando podemos retirar
algum dos seus elementos, pois a situação continua a existir; os elementos retirados
poderiam ser situações jurídicas autónomas.
ii. Situações Unissubjetivas e Plurissubjetivas
 Situação Unissubjetiva – postula apenas um sujeito; uma única pessoa;
 Situação Plurissubjetiva – assenta em mais do que uma pessoa;
 Complexidade Subjetiva – trata-se de uma modalidade de situações plurissubjetivas que se
caracteriza pela presença, numa conjuntura simples, de vários sujeitos.
iii. Situações Absolutas e Relativas (a relação jurídica)
 Situação Absoluta – existe por si, sem dependência de uma outra situação de sinal contrário;
não postula nenhuma relação jurídica;
 Situação Relativa – há duas situações: uma em relação à outra e uma de teor inverso; aqui
temos a relação jurídica – relaciona 2 pessoas; a relação jurídica é apenas uma das várias
situações jurídicas possíveis.
A doutrina clássica apresentava outros critérios de distinção:
1. Um critério de Eficácia (onde seriam absolutas as situações que produzissem efeitos
perante todos; e relativas as que operassem apenas entre credor-devedor);
2. Um critério de Responsabilidade (seriam absolutas as situações que, a serem
violadas, possibilitariam o responsabilizar de qualquer coisa; e relativas as que
apenas permitissem pedir contas a uma única pessoa);

iv. Situações Patrimoniais e Não-Patrimoniais


 Situação Patrimonial – tem conteúdo económico, pode ser avaliado em dinheiro. Estas
situações não se confundem com as situações regidas pelo Direito patrimonial (onde se
verificam que situações sem conteúdo económico são objeto de regulação patrimonial).
 Situação Não-Patrimonial – não tem conteúdo económico, e não tem uma equivalência
monetária.
!!! – No entanto, este princípio não deve ser perturbado pela possibilidade de arbitrar, em danos causados em
situações não-patrimoniais, uma indemnização em dinheiro (a avaliação feita tem apenas um fim compensatório,
não exprimindo um conteúdo económico intrínseco).
Assim, este critério tende a perder nitidez: todas as situações (mesmo as situações pessoais)
tendem a poder ser avaliadas em dinheiro; e terão de o ser quando se trata de indemnizações; dando assim a
qualquer situação uma natureza económica.
Este problema resolve-se pela normativização do critério: é
patrimonial a situação cuja troca por dinheiro seja admitida pelo Direito; quando o direito o proíba, são não-
patrimoniais.
v. Situações Ativas e Passivas
 Situação Ativa – coloca determinados efeitos sob a vontade do próprio sujeito a quem ela
assista; deriva de permissões normativas ou de normas que confiram poder; esta situação é
sentida como uma vantagem.
 Situação Passiva – põe os efeitos na dependência de uma pessoa que não o sujeito; deriva
de normas proibitivas ou impositivas; esta situação é sentida como um peso.
 As situações ativas e passivas podem combinar-se entre si em medidas diversas; por
exemplo uma situação complexa, tende a abranger várias posições ativas e passivas.
vi. Situações Analíticas e Compreensivas
 Situações Analíticas – obtêm-se através da redução, aos fatores componentes elementares,
das realidades jurídicas. Apresentam-se como fórmulas lógicas. Estas situações apresentam-
se como excessivamente lógicas. (conceitos como podere dever)
 Situações Compreensivas – derivam da consideração autónoma, historicamente consagrada,
das mesmas realidades, abrangendo múltiplos elementos. Traduzem-se em esquemas
culturais. Muitas vezes estas situações representam simples acasos do passado.
3.2) Direito Subjetivo
O Direito Subjetivo corresponde a uma situação jurídica compreensiva: é dado pela história e cultura
do Direito e tem uma presença efetiva nos planos teórico e prático, englobando diversas realidades
menores.
3.2.1) SAVIGNY
O Direito Subjetivo seria um poder da vontade; tal poder deveria ser entendido como reconhecimento,
ao sujeito titular do direito, de um âmbito da liberdade independente de qualquer vontade estranha.
3.2.2) JHERING
Remete o Direito Subjetivo para o rol dos meros expedientes técnicos;
É o aproveitamento que forma a substância do direito;
Direito Subjetivo respeita à segurança jurídica do aproveitamento dos bens; direitos são interesses
juridicamente protegidos.
……………………………………………………….
3.2.3) Escola Jurídico-formal (pg.888)
Concluímos então que o Direito Subjetivo pode ser definido apenas como uma permissão normativa
específica – mas isto conduziria a que fizéssemos do direito subjetivo um conceito analítico e não
compreensivo.
O Direito Positivo vigente reporta o Direito Subjetivo aos bens.
3.2.4) Modalidades do Direito Subjetivo
Existem várias classificações de direito subjetivo:
i. Direitos Comuns e Potestativos
 Direito Comum – traduz-se numa permissão específica de aproveitamento de um bem; este
deriva da incidência de uma norma permissiva;
 Direito Potestativo – implica um poder de alterar, unilateralmente, através de uma
manifestação de vontade, a ordem jurídica; é fruto de uma norma que em si, nada diz quanto
à forma por que as pessoas devam atuar, apenas lhes facultando a possibilidade de alterar a
ordem jurídica. Na verdade, este direito é o produto de normas que lhe conferem poderes
(poderes atribuídos ao beneficiário através do intermear de normas permissivas). Estes
comportam múltiplas classificações:
a) Direitos potestativos autónomos (se surgirem de modo isolado) e integrados
(se se integrarem em direitos subjetivos mais amplos);
b) Com destinatário (se as alterações que eles promovam se deem na esfera
jurídica de outrem; neste caso é necessária uma declaração de vontade; o
destinatário encontra-se na situação de sujeição) ou sem destinatário (se as
alterações que eles promovam se deem na esfera jurídica do próprio titular;
basta um comportamento);
c) Exercício judicial (o titular tem de dirigir-se ao tribunal para desencadear os
efeitos que a lei coloca na sua disponibilidade) ou extrajudicial (pode fazê-lo
independentemente de ir a tribunal);
d) Constitutivos (dão lugar a uma nova situação jurídica), modificativos
(alteram uma situação preexistente), extintivos (extinguirem essa situação);
O Direito Potestativo aponta também para outras realidades presentes depois da sua atuação. Assim, podem ser
de crédito, reais, de família, sucessórios, intelectuais, etc. Têm assim um espectro largo de atuação e podem ser
transmissíveis.
ii. Modalidades quanto ao Objeto
 Tipo de bem de cujo aproveitamento nele se trate.
 Bens patrimoniais – tendo natureza económica são avaliáveis em dinheiro (podem ser:
corpóreos; incorpóreos – bens intelectuais; prestações; realidades jurídicas);
 Bens não-patrimoniais – não tenham natureza económica nem se exprimem em dinheiro
(podem ser pessoais – quando se reportem à própria pessoa ou a realidades com ela
conexas; familiares);
iii. Modalidades quanto ao Regime
 O objeto do direito subjetivo dita então o seu regime.
 O regime aplicável ao direito subjetivo foi-se desprendendo ao longo da história. Resulta
então que direitos pautados por se reportarem a objetos idênticos acabem por pertencer a
áreas caracterizadas por terem regimes diversos.
 Direitos de crédito, direitos reais, direitos de família, direitos das sucessões e direito das
pessoas.
3.3) Outras Situações Ativas
São situações que colocam determinados efeitos na pendência da vontade do próprio sujeito a quem
elas assistam.
Existem outras situações jurídicas ativas para além do direito subjetivo:
i. Poder
 Direito e poder confundem-se, mas são diferentes.
 Poder é a disponibilidade de meios para a obtenção de um fim.
 O Poder é uma situação analítica que se obtém por via logica e surge como fator componente
elementar das realidades jurídicas; ele configura-se ainda como uma situação simples: nada
mais se pode dele retirar.
 Os poderes comportam ainda várias classificações:
a) Poderes materiais ou jurídicos – consoante os meios disponíveis sejam de atuação
material ou jurídica; no caso dos poderes jurídicos há que ainda se lidar com poderes
constitutivos, modificativos ou extintivos (em função do tipo de eficácia jurídica que
desencadeiam);
b) Poderes de Gozo, de Crédito, de Garantia ou Potestativos – são de gozo se tiverem
por fim o aproveitamento de uma coisa corpórea, de crédito se tiverem por fim a
exigência de uma conduta, de garantia se tiverem por fim a atuação dos esquemas
de responsabilidade patrimonial e potestativos se tiverem por fim a produção de
efeitos de direito;
c) Poderes Autónomos ou Integrados – dependendo da sua independência ou da sua
integração em figuras mais vastas. Deve-se falar ainda em poderes instrumentais
quando se encontrem ao serviço direto de outras realidades.
ii. Faculdades
 É um conjunto de poderes ou de outras posições ativas, unificado numa designação comum;
 Contraposição entre poder e faculdade – os poderes correspondem a realidades analíticas e
as faculdades a realidades compreensivas.
iii. Expectativas
 Configuram uma categoria de posições ativas marcadas por uma imprecisão acentuada;
 Podemos ainda distinguir:
a) Expectativa de mero facto – traduz uma hipótese de evolução futura à qual uma pessoa
empreste maior ou menor verosimilhança, mas que o direito não reconheça.
b) Expectativa jurídica – tem que se encontrar um sentido útil próprio diferente do do direito
subjetivo. Situa-se então no domínio dos factos jurídicos complexos de produção
sucessiva. Falta saber se o direito tutela ou não a expectativa.
 A expectativa não deve ser confundida com determinados direitos que garantem vantagens
futuras ou eventuais – nestes direitos podemos distinguir:
a) Direitos de Adjudicação ou de aquisição automática – correspondentes a situações nas
quais o beneficiário por mero efeito da lei irá adquirir um novo direito;
b) Direitos de Apropriação – ocorrências que permitam ao beneficiário, através de uma
declaração de vontade, adquirir um novo direito;
c) Direito de Candidatura – o beneficiário ocupa uma posição que tutelada que lhe irá
facultar vantagens;
 A verdadeira expectativa jurídica retrata a posição do sujeito inserido na sequência que irá
conduzir a um verdadeiro direito, mas antes de este surgir. Essa sequência pode resultar:
a) Normas legais explicitas;
b) Negócios jurídicos (a aquisição condicionada);
c) Conceitos indeterminados (confiança da pessoa que acredite na manutenção de algo que
é dito ou feito em nome da boa-fé);
 O direito ou tutela a expectativa tal como ela surge ou é e poderemos falar de um direito
subjetivo (ainda que intercalar) ou o direito dispensa, à expectativa, uma tutela meramente
processual, tendo em vista o direito definitivo que irá surgir e ocorrerá uma expectativa
jurídica proprio sensu.
iv. Poderes Funcionais
 São obrigações especificas de aproveitamento de um bem;
 Têm natureza híbrida: há aproveitamento de um bem, no que surge como uma vantagem;
esse aproveitamento não é permitido, mas sim obrigatório – o titular deve agir.
 Não é correto atribuir-lhe a mesma estrutura do direito subjetivo uma vez que falta a
permissão;
 A posição é ativa por implicar sempre uma margem de escolha, a cargo do titular.
v. Exceções
 Situação jurídica pela qual a pessoa adstrita a um dever pode, licitamente, recusar a
efetivação da pretensão correspondente;
 As exceções materiais são suscetíveis de várias classificações:
a) Fortes ou fracas – consoante permitam ao seu beneficiário deter um direito alheio ou
apenas enfraquece-lo; as exceções fortes são perentórias quando detenham pretensão
por tempo indeterminado e dilatórias se apenas o fizerem por certo lapso de tempo;
o A exceção forte perentória apenas leva à extinção do direito
definitivamente paralisado, devendo, em consequência ser tratada
como modo de extinção;
o As exceções dilatórias e as fracas apenas expressam limitações no
conteúdo dos direitos que supostamente vêm bloquear.
 A exceção opera pela vontade do seu beneficiário, tem pelo menos essa autonomia.
 Alguns autores consideram as exceções materiais como direitos e outros como poderes;
Dentro dos que as consideram direitos há duas posições:
a) Os que a consideram como contra-direitos;
b) Os que vêm nelas direitos potestativos;
 As exceções correspondem a poderes em sentido técnico: trata-se de uma figuração analítica
que traduz, com efetividade, a disponibilidade de meios para obtenção de um fim; além do
mais elas integram a categoria dos poderes potestativos, uma vez que visam a produção de
efeitos jurídicos, que alteram a ordem existente.
 As exceções podem ainda surgir isoladas (tendem a ser referidas como direitos) ou
integradas em situações mais vastas (tendem a ser mencionadas como integrando o
conteúdo de certos direitos subjetivos).
A técnica da subjetivação jurídica assenta na atribuição, pela positiva, de um espaço de liberdade aos
sujeitos beneficiários. A partir daqui se infere a proteção de ele desfruta: o beneficiário pode aproveitar
certo bem, o não-beneficiário não o deve fazer.
Há ainda outra técnica para conferir vantagens às pessoas: consistem em fazer incidir, numa generalidade
de pessoas, normas de comportamento que acabem por acautelar certos interesses; assim haverá um
beneficiário ao qual, sendo atribuída qualquer permissão, se concede uma certa tutela, através dos deveres
assacados a terceiros – surge uma proteção reflexa.
3.4) Situações Passivas
Nestas situações o sujeito fica colocado no âmbito de aplicação de normas proibitivas ou impositivas;
i. Obrigação
 É a situação passiva de base, compreensiva e equivalente a direito subjetivo;
 Não seguindo o disposto no art.º 397.º a obrigação corresponde à posição do denominado
sujeito passivo;
 A obrigação permite descobrir no seu seio diversas realidades jurídicas;
 A obrigação não é um somatório: ela tem uma unidade intrínseca, permitindo não só
comunicar, mas também exprimir algo de mais amplo do que a soma das suas parcelas;
 As obrigações têm inúmeras classificações:
a) Obrigação de Dare – o adstrito deve entregar a coisa a outrem;
b) Obrigação de Facere – o adstrito deve desenvolver uma atividade em prol de outrem;
estas têm ainda 3 sub-classificações:
A) Obrigações de Facere (ou de facto positivo) – deve-se desenvolver uma atividade
em si;
B) Obrigações de Non-Facere (ou de facto negativo) – deve-se abster de certa atuação;
C) Obrigações de Pati (ou de suportação) – deve-se sofrer que alguém desenvolva, na
sua esfera, uma atividade que não poderia ter lugar.
 Características:
a) dever principal – necessidade jurídica de alguém realizar uma prestação;
b) deveres secundários – deveres complementares acordados por ambas as partes e que
completam o dever principal;
c) deveres acessórios – resultam do ordenamento jurídico e normalmente destinam-se a
afeiçoar aquela obrigação aos princípios gerais que vigoram no OJ.
ii. Dever
 O dever traduz a incidência de normas de conduta: impositivas ou proibitivas;
 A pessoa adstrita a um dever encontra-se na necessidade jurídica de praticar ou não certo
facto;
 Uma obrigação pode decompor-se em múltiplos deveres, e ainda noutras realidades.
 Os deveres aparecem também no conteúdo do próprio direito subjetivo, contribuindo para a
sua delimitação negativa – os deveres têm assim um relevo universal;
 Os deveres têm as mesmas classificações acima referidas às obrigações.
iii. Sujeições
 São as situações jurídicas passivas correspondentes aos direitos potestativos; está numa
sujeição a pessoa que possa ver a sua posição alterada por outrem, unilateralmente.
 A pessoa que se encontre numa sujeição nada pode fazer nem deve fazer, apenas lhe cabe
aguardar que o titular do direito potestativo atue ou não, essa posição. Resultam então dois
regimes:
1. Os deveres implicam condutas, e daí, todo um complexo de regras destinado à sua
regulação;
2. As sujeições, pelo contrário, nada implicam; assim as sujeições (tal como o direito
potestativo) são situações absolutas.
iv. Ónus
 Doutrina Comum – o ónus corresponde à situação na qual alguém deva adotar certa atitude,
caso pretenda obter certo efeito;
 O ónus não é um dever: não há que adotar uma conduta, porque o resultado por ele
propiciado é facultativo;
 Pode-se então dizer que o ónus assenta numa permissão: permissão essa que, a não ser
atuada num certo sentido, conduz a consequências desagradáveis para o destinatário da
mesma, ainda que não assimiláveis a sanções.
 A figura do ónus deve ser remetida para o domínio processual – aí traduz deveres no
processo com a índole de terem consequências substantivas; surge então o Ónus Material ou
Encargo;
 O Encargo corresponde estruturalmente a um dever. No entanto segue um regime particular –
é um dever de comportamento que, embora funcionando no interesse de outras pessoas, não
pode ser exigido, por estas, o seu cumprimento.
 O Encargo tem uma configuração tal que se apresenta como realidade analítica, sendo
embora um dever, ele tem uma especificidade de base que justifica a sua autonomização; é
uma situação absoluta (existe o dever, mas não há uma situação jurídica);
 Esta categoria é híbrida porque podemos dizer que o titular do encargo tem o poder de
denunciar os defeitos, mas se ele quiser exercer este poder, ele tem de o fazer dentro de um
certo caso;
v. Deveres Genéricos
 Situações jurídicas passivas que se traduzem em posições absolutas, ou seja, sem relação
jurídica.
 Estes deveres não dão lugar a comportamentos que possam ser exigidos por um sujeito a
outro.
 São necessidades jurídicas de praticar ou não um certo facto. Tipos:
a) Resultam da atribuição de situações jurídicas ativas aa outras pessoas;
b) Resultam de normas proibitivas ou improibitivas genéricas;
vi. Deveres Funcionais
 Necessidade jurídica de praticar ou não um certo comportamento que decorre do
desempenho de uma função ou de um estatuto.
 O dever funcional traduz algo de semelhante aos poderes funcionais, mas com um
acrescento: os comportamentos que ele postule podem, diretamente, ser exigidos por certas
pessoas, mantendo-se uma margem de ilimitação por parte do obrigado.
 Os deveres funcionais não têm uma especifica fonte, antes surgem com a simples ocorrência
do condicionalismo funcional de onde promanem.
4) Institutos Civis Gerais
O direito pode analisar-se em normas e princípios:
 A Norma é uma proposição que associa certos acontecimentos (previsão) a determinados efeitos
jurídicos (estatuição); verifica-se ainda que a norma tem um âmbito de aplicação muito restrito;
 O Princípio é também uma proposição; no entanto, limita-se a imprimir uma certa direção aos
modelos de decisão jurídica que, com ele tenham determinado contacto; o princípio,
contrariamente à norma apresenta-se muito mais abstrato;
Qualquer decisão jurídica concreta é sempre fruto de modelos de decisão que integram numerosas normas
e princípios em articulação mútua.
O instituto jurídico é um conjunto de normas e de princípios que permite a formação típica de modelos de
decisão; assim:
 O instituto não é um modelo de decisão;
 O instituto não equivale ao somatório de normas e princípios que o componham e que possam ser
apurados;
 O instituto não implica a definição ou a consciência de todos os seus componentes;
 O instituto não é uma instituição, não depende do destino ou do sentido que se queira atribuir a tal
realidade.
O critério que deve presidir à formação de qualquer instituto é um critério científico: só faz sentido
autonomizar uma certa articulação normativa quando ela apresente uma unidade interna induzida da
múltipla formação de modelos de decisão. Assim, o instituto comporta normas e princípios articuláveis, que
obedeçam aos mesmos vetores científicos e que desempenham um papel harmónico e funcional.
Institutos Civis: compostos de normas e princípios privados comuns são um instrumento da ciência jurídica
civil.
Na elaboração conceptualista – o instituo jurídico foi tratado como um conceito geral e abstrato; para a sua
elaboração retira-se, de uma realidade, um certo número de características tidas por comuns a uma serie
de outras realidades – representa assim um empobrecimento perante as realidades a retratar.
Hoje em dia o instituto jurídico – deve ser apreendido como um conceito geral-concreto; este conceito não
se apresenta através de uma definição abstrata, mas com recurso a uma série marcante de aspetos da
mesma realidade e a ela são reconduzidos.
A Justificação para o recurso a institutos advém do que foi dito acima e com as precisões seguintes:
 A situação jurídica constitui a peça fundamental do direito em sentido próprio; no entanto, a sua
riqueza impede uma comunicação viável – o direito não pode ser ministrado a nível de situação,
sob pena de incomunicabilidade.
 Os princípios jurídicos apresentam-se demasiado abstratos ou vagos para possibilitar todo um
regime que implicaria também um recurso a normas.
O instituto é apresentado como forma de solução aos problemas de construção científica e de explanação
didática.
A sequência deve ser firmada pelos institutos civis mais relevantes do atual direito positivo português.
Estes são:
i. A personalidade e a sua tutela;
ii. A autonomia privada;
iii. A boa-fé
iv. A imputação dos danos;
v. A propriedade e a transmissão;
4.1) A Personalidade e a sua Tutela
A pessoa humana não constitui um instituo jurídico, ela está presente em cada solução ou norma, mas não
integra modelos de decisão específicos, que de modo particular, a tenham em conta.
A personalidade humana vai relevar enquanto fator de polarização de soluções, ou seja, enquanto
elemento suscetível de infletir, induzir, ou provocar decisões jurídicas num sentido que poderia ser diverso.
Uma pessoa é um centro de imputação de normas jurídicas; assim, pode ou não haver coincidência entre a
pessoa para efeitos de Direito e a pessoa enquanto individuo da espécie homo sapiens.
A pessoa conduz assim ao aparecimento de verdadeiros institutos, ou seja, a conjuntos articulados de
normas de princípios que permitam a figuração de modelos e de decisão de tópicos.
Na base dos institutos ligados à pessoa, encontram-se as situações jurídicas de personalidade, a entender
como as que se prendam a bens de personalidade: quer impondo condutas que lhes digam respeito
(deveres de personalidade) quer permitindo o seu aproveitamento (direitos de personalidade);
Subinstitutos da Personalidade e da sua Tutela:
4.1.1) Direitos de Personalidade
São “direitos sobre a própria pessoa” – direitos que concedem ao seu sujeito um domínio sobre uma parte
da sua própria esfera de personalidade;
Moldes mais diretos de presença de meios para a defesa da pessoa Humana:
i. Direitos Fundamentais
 São posições jurídicas atribuídas pela Constituição;
 O seu critério é o da fonte da sua atribuição;
 Estes traduzem posições da pessoa contra o Estado, de forma a procurar controlá-lo e ao
poder político;
 A eficácia civil dos direitos fundamentais ganha dimensões substantivas renovadas, ao
propiciar soluções diferentes; este fenómeno pode se analisar em 2 planos:
a) O da sua penetração dogmática – pode-se dar de modo direto (neste caso, ela passa
desde os textos fundamentais às decisões civis) ou através da concretização de
conceitos indeterminados (contribui para precisar, em casos concretos, princípios
como os da boa-fé ou dos bons costumes)
b) O do seu alcance material – permite-lhe passar por 3 fases: (1) os direitos
fundamentais asseguram um espaço livre da intervenção estadual; (2)o espaço
assegurado livre contra o Estado não poderia ser invadido por terceiros; (3) eficácia
reflexa ou civil – pretensões contra terceiros por ações que contundam com os
direitos fundamentais;
 Esta eficácia civil dos direitos fundamentais foi utilizada para restringir áreas de liberdade e
justificar o incumprimento das obrigações;
 Os direitos fundamentais na sua efetivação traduzem um peso ou um sacrifício para outrem:
outros particulares também detentores de direitos fundamentais – o peso destes direitos deve
ser distribuído por toda a sociedade, através do Estado, não podendo concentrar-se numa
única pessoa (se não, iria contra o principio da igualdade) – a doutrina inclinou-se para admitir
que estes só interfeririam no campo civil através da concretização de conceitos
indeterminados;
 Os direitos fundamentais tendem a reforçar posições já consagradas pelo Direito de
Personalidade – ainda aí com limitações que lhes restituem o seu verdadeiro sentido
normativo e com adequação axiológica (recorda que estes não acautelam apenas certos
valores, antes o fazem por forma adequada ou perante violações que eles considerem
adequadas – apenas nesta dimensão eles podem surtir efeitos civis) e funcional (obriga a
atinar nas próprias violações em si – também estas podem situar-se no termo de funções
estranhas ao direito fundamental considerado, quer por conflitos de deveres em que este
ceda, quer por simples alheamento ou desconexão);
 Estes direitos têm um papel na argumentação (permitindo tornar mais consistentes soluções
apoiadas noutros níveis normativos), contribuem para a concretização de conceitos
indeterminados e admitem uma aplicação direta quando o seu sentido normativo dê lugar.
ii. Responsabilidade Patrimonial
 Permite responder à questão básica das consequências do incumprimento;
 O devedor que não cumpra as suas obrigações sujeita-se a que sejam apreendidos os seus
bens (os bens penhoráveis) – estes serão vendidos para satisfação dos credores [se tais
bens não existirem ou forem insuficientes, haverá rateio, ficando todos prejudicados por
igual];
iii. Danos Morais
 O dano corresponde à supressão de uma vantagem, atual ou previsível, atribuída pelo Direito;
 O dano moral traduz a supressão de vantagens não patrimoniais;
 O único modo que garanta proteção dos bens não patrimoniais é através da exigência de uma
indemnização;
iv. Família
 Conjunto de situações relativas a pessoas ligadas entre si por casamento, parentesco,
afinidade e adoção;
4.2) A Autonomia Privada
Dupla utilização da autonomia privada:
 Equivale ao espaço de liberdade reconhecido a cada um dentro da ordem jurídica (engloba tudo o
que as pessoas podem fazer, tanto num prisma material como num jurídico) – neste caso, esta
liberdade seria originária;
 Corresponde ao espaço de liberdade jurígena (ou seja, à área reservada na qual as pessoas
podem desenvolver as atividades jurídicas que entenderem) – neste caso, esta liberdade seria
concedida pelo direito;
A autonomia privada corresponde a um espaço de liberdade atribuído, pelo direito, às pessoas, podendo
definir-se como uma permissão genérica de produção de efeitos jurídicos;
Esta deixa à liberdade humana a prática de factos jurídicos;
O facto voluntário (facto cuja ocorrência depende da vontade das pessoas e cujos efeitos se produzem
porquanto queridos por essa vontade e na medida em que o sejam) pode enquadrar-se em 2 situações:
 A liberdade de Celebração – permite praticar ou não o ato, optando assim pela presença ou
ausência de determinados efeitos de direito; aqui fala-se em atos jurídicos em sentido estrito;
 A liberdade de Estipulação – permite optar pela prática do ato e selecionar o tipo de efeitos que se
irão produzir;
 Quando há liberdade de celebração e estipulação fala-se em Negócio Jurídico;
Em termos formas, corresponde à impossibilidade de o direito prever todos os efeitos concretos;
Em termos materiais, liga-se a certas liberdades económicas fundamentais;
4.3) A Boa-Fé
Traduz os valores fundamentais do sistema;
Boa-Fé Objetiva
 Remete para princípios, regras, ditames ou limites por ela comunicados ou para um modo de
atuação;
 Ela atua como uma regra de atuação imposta do exterior e que as pessoas devem observar;
 Há casos em que surge como um corretivo de normas suscetíveis de comportar uma
aplicação contrária ao sistema, e há casos em que surge como a única regra atendível;
 Ela concretiza-se em 5 institutos (nenhum deles deriva da boa-fé):
(1) Culpa In Contrahendo – antes da formação de contratos as partes já têm deveres a
respeitar (como os de proteção, lealdade, informação) – tais deveres visam prevenir que
na fase pré-contratual alguma das partes possa atingir a confiança da outra, provocando-
lhe danos;
(2) Integração dos Negócios – desenvolveu-se a partir de regras de interpretação negocial;
na eventualidade de se ter que enfrentar uma especial escassez de material
expressamente subscrito pelas partes, o intérprete-aplicador deve ter em conta a lógica
imanente ao negócio e as exigências substanciais do sistema de acordo com as
expectativas que as partes tenham depositado no processo;
(3) Abuso do Direito;
(4) Modificação dos Contratos por Alteração das Circunstâncias – permite, em certas
condições, modificar ou resolver contratos que, a favor de alterações registadas após a
sua conclusão, venham a assumir feições injustas para algumas das partes;
(5) Complexidade das Obrigações – promove um conjunto de deveres de proteção, lealdade
e de informação que asseguram a tutela da confiança das partes e o princípio de que, em
qualquer caso, prevalecem os interesses reais protegidos pelo credor;
 Em todos estes institutos afloram 2 princípios que atuam como fatores de mediação entre a
boa-fé e o instituto considerado: (1) princípio da confiança; (2) princípio da primazia da
materialidade subjacente; estes princípios são induzidos das concretizações da boa-fé.
Boa-Fé Subjetiva
 Aqui está em causa um estado do sujeito – esse estado é caracterizado como mero
desconhecimento ou ignorância de certos factos, como um seu desconhecimento sem culpa
ou uma ignorância desculpável ou pela consciência de determinados fatores;
 Pode ser usada em 2 sentidos:
o Sentido Psicológico – estaria de boa-fé quem simplesmente desconhecesse certo
facto ou estado de coisas;
o Sentido Ético – estaria de boa-fé quem se encontrasse num desconhecimento não
culposo (ou seja, é considerada de má-fé uma pessoa que, com culpa, desconheça
aquilo que deveria conhecer); esta conceção postula a presença de deveres de
cuidado e de indagação;
 Chegamos à conclusão que a Boa-Fé subjetiva é sempre ética – só pode invocar a boa-fé
quem, sem culpa, desconheça certa ocorrência.
4.3.1) A Tutela da Confiança
A proteção da confiança efetiva-se por 2 vias:
 Através de Disposições Legais Específicas – surgem quando o Direito retrate situações
típicas nas quais uma pessoa que, legitimamente, acredite em certo estado de coisas (ou o
desconheça) receba uma vantagem que de outro modo não lhe seria concedida;
 Através de Institutos Gerais – aparecem ligados aos valores fundamentais da ordem jurídica e
surgem associados a uma regra objetiva da boa-fé (a confiança é protegida quando se
verifique a aplicação de um dispositivo especifico a tanto dirigido; fora desses casos, releva
apenas quando os valores fundamentais do ordenamento, expressos como boa-fé ou outra
designação, assim o imponham)
Existem 4 pressupostos para a proteção jurídica dos institutos onde a tutela tenha lugar:
 Situação de confiança conforme com o sistema e traduzida na boa-fé subjetiva e ética, própria
da pessoa, sem violar os deveres de cuidado que ao caso caibam, ignore estar a lesar
posições alheias.
A situação de confiança pode ser expressa pela ideia de boa-fé subjetiva = a
posição da pessoa que não adira à aparência ou que o faça com desrespeito de deveres
de cuidado merece menos proteção;
 Justificação para essa confiança, expressa na presença de elementos objetivos capazes de
provocarem uma crença possível.
Requer que esta se tenha alicerçado em elementos razoáveis, suscetíveis de
provocar adesão a uma pessoa normal;
 Investimento de confiança consistente em ter havido um assentar efetivo de atividades
jurídicas sobre a crença consubstanciada.
Exige que a pessoa a proteger tenha desenvolvido toda uma atuação baseada na
própria confiança – uma confiança puramente interior que não desse lugar a
comportamentos não requer proteção;
 Imputação da situação de confiança criada à pessoa que vai ser atingida pela proteção dada
ao confiante.
Existência de um autor a quem se deva a entrega confiante do tutelado – ao
proteger-se a confiança de uma pessoa vai-se onerar outra; implicando que esta outra
seja a responsável pela situação criada;
Estes pressupostos articulam-se entre si nos termos de um sistema móvel – não há entre eles uma
hierarquia e não são indispensáveis (a falta de algum deles pode ser compensada pela intensidade
especial que assumam alguns);
Não nos podemos esquecer da responsabilidade pela confiança;
4.3.2) A Primazia da Materialidade Subjacente
A Boa-Fé exige que os exercícios jurídicos sejam avaliados em termos materiais, de acordo com as
efetivas consequências que acarretem;
Existem 3 vias de realização deste princípio:
 A conformidade material das condutas  exige que, no exercício de posições jurídicas, se
realizem, os valores pretendidos pelo ordenamento; será contrário à boa-fé condutas que
apenas na forma dê corpo ao que o Direito determine;
 A idoneidade valorativa  não admite que alguém utilize a própria situação jurídica que
tenha violado para, em função do seu ilícito, tirar partido contra outrem; será contrário à boa-
fé provocar um dano e exigir, a outrem, a sua reparação;
 O equilíbrio no exercício das posições  permanente necessidade de sindicar as diversas
condutas, mesmo permitidas; temos 2 tipos de posturas:
o O ato emulativo – atuação gratuitamente danosa para outrem;
o Atuação gravemente desequilibrada – conduta que, para conseguir uma vantagem
mínima para o próprio gere um dano máximo para outrem;
No fundo, este princípio conduz a uma melhor articulação do sistema com a periferia, permitindo uma
interpretação e uma aplicação melhoradas das mais diversas mensagens normativas.
4.4) A imputação de Danos
O dano ou prejuízo traduz-se na supressão ou diminuição de uma situação favorável que estava
protegida pelo ordenamento;
Existem vários tipos de danos:
 Danos Morais e Patrimoniais;
 Danos Lícitos e Ilícitos;
 Danos Naturais e Humanos;
 Danos Ressarcíveis e Compensáveis;
 Danos Emergentes e Lucros Cessantes;
A Regra básica de imputação de danos fala em risco para traduzir a aptidão que uma esfera tenha
para suportar os danos que, sobrevenham; esta suportação tem uma dupla justificação:
 Em termos Práticos – a suportação do dano na esfera em que ocorra corresponde à natureza
das coisas e faculta uma solução rápida e eficaz para a sua problemática;
 Em termos Valorativos – a suportação do dano pela esfera onde ocorra corresponde, à
solução mais justa; qualquer dano pressupõe a prévia atribuição de uma vantagem;
4.4.1) Imputação e Responsabilidade Civil
Em situações particulares, a regra básica de suportação de danos pelas esferas em que ocorram é
desviada por normas diversas que obrigam à sua imputação a outras esferas.
Surge a Responsabilidade Civil – como situação, pode ser definida como a ocorrência jurídica na qual
um dano registado numa esfera é imputado noutra; a imputação faz-se através da obrigação de
indemnizar.
A obrigação de indemnizar pode isolar-se pelas suas coordenadas, designadamente:
 Pela sua fonte: deriva de um dano e de uma imputação;
 Pelo seu conteúdo: prestação equivalente a um determinado dano;
 Pelo seu objetivo: supressão de um dano;
A situação mais simples na justificação de ocorrência de responsabilidade civil é a da prática de factos
ilícitos danosos – quando alguém, violando normas de direito, provoque danos em esfera alheia; o
dano deve ser suportado por quem o provoque e não em definitivo, pela esfera onde se tenha
registado;
A responsabilidade civil visa a supressão de um prejuízo, não tem escopos punitivos nem sequer
sancionatórios.
4.4.2) Títulos de Imputação
A responsabilidade civil só se concretiza na presença de particulares eventos que, em termos jurídicos,
justifiquem a imputação desses danos a uma esfera diferente – estes eventos são os títulos de
imputação;
Estes títulos de imputação ordenam-se em 3 categorias:
 Imputação por facto ilícito ou por incumprimento – tem lugar quando alguém ilicitamente e
com culpa, viole um direito alheio ou uma disposição destinada a proteger os seus interesses.
Aqui pode se chamar responsabilidade contratual ou obrigacional. Esta imputação postula 2
instâncias de controlo do sistema sobre a sua estatuição:
o A ilicitude o dano deve ser provocado em violação a normas jurídicas e sem que
ocorra uma causa de justificação;
o A culpa  a ação deve assentar numa tal relação de meios-fins que o agente
incorra num juízo de censura, seja por ter pretendido direta, necessária ou
eventualmente atingir as normas violadas, seja por não ter pretendido pautar-se
pelos deveres de cuidado que ao caso caibam
 Imputação pelo risco – tem lugar quando o direito faça correr por determinada esfera a
eventualidade de danos registados em esferas diferentes, independentemente de qualquer
facto ilícito, tal só se sucede em situações previstas na lei.
Esta imputação não postula qualquer ação destinada a provocar danos, logo, não
há que procurar o surgimento o dano numa confluência de meios-fins do agente, mas
apenas numa sequência socialmente adequada à sua suscitação.
Esta imputação deve ainda promover uma definitiva emancipação da imputação
de danos perante a responsabilidade aquiliana.
 Imputação por facto lícito ou pelo sacrifício – postula o cometimento voluntário de um dano,
mas de modo a que a sua prática não possa ser considerada ilícita. O direito considera injusto
uma suportação apenas do titular da vantagem frustrada, então, estabelece uma imputação
dos danos verificados ao autor do comportamento.
4.5) A Propriedade e a sua Transmissão
A propriedade pode traduzir:
 Sentido Amplo – o conjunto dos direitos patrimoniais privados;
 Sentido Estrito – o direito real – permissão normativa plena de e exclusiva de aproveitamento de
uma coisa corpórea.
A propriedade comporta traços comuns a todos os direitos que foram desenvolvidos a seu respeito;
A propriedade é explicada e constituída a partir da ocupação (que faculta a apropriação a quem se aposse
de bens sem dono) e do trabalho (permite a propriedade àquele que, pelo seu labor, produza novos bens)
O conteúdo da propriedade depende dos bens sobre que recaia;
As faculdades atribuídas ao proprietário são:
 Uso – correspondente à utilização da coisa, segundo as suas naturais qualidades;
 Fruição – integra a possibilidade de sobre ela desenvolver atividades produtivas;
 Disposição – mostra a natureza permissiva do conjunto e na possibilidade da sua transmissão;
Disponibilidade – tratando-se de direitos, eles apresentam sempre uma estrutura permissiva – o sujeito
pode renunciar à sua posição, remitir a dívida, abandonar a coisa; poderá também transformar o objeto do
seu direito ou destruí-lo;
Transmissão – equivale à possibilidade de usar os bens enquanto valores de troca, fazendo-os circular na
sociedade sendo onerosamente ou gratuitamente.
É possível a transmissão da propriedade por morte.
5) Representação
Há pessoas dotadas de um mínimo de posicionamento jurídico que estão impedidas de se
autodeterminarem pessoal e livremente (E.: menores de idade, dementes); há ainda casos em que o
cidadão pode ser impedido de agir ou pode não lhe ser conveniente aparecer em pessoa;
Encontramos para determinados exercícios jurídicos esquemas de representação legal, de tutela ou de
curatela, de representação voluntária ou de representação orgânica;
Ideia unitária subjacente (da representação) – exercício por parte duma pessoa em prol de outrem; esse
exercício vai repercutir-se na esfera jurídica do beneficiário; qualquer situação jurídica exercitável pode cair
na representação;
5.1) Teorias da Representação
Na representação, uma pessoa atua, manifestando uma vontade que, depois, se vai repercutir diretamente
e imediatamente na esfera jurídica de outrem;
Teoria da Vontade (Savigny) – o representante seria apenas o porta-voz do representado: este seria o
detentor da vontade relevante, fazendo todas as opções;
Em muitas situações o representado não teria qualquer vontade – a representação assume um papel
importante nas circunstâncias em que o representado não tenha informações claras sobre as
possibilidades contratuais e cabe ao representante eleger as melhores hipóteses;
Teoria da Representação – a vontade estaria presente, apenas, no próprio representante;
Porque é que os efeitos do negócio feitos pelo representante operam na esfera do representado?
 Teoria da Ficção – a vontade relevante surge no representante, mas tudo se passa como se
fosse o representado a agir;
 Teoria da Separação entre a Causa e os Efeitos – a causa processar-se-ia na esfera do
representante; os efeitos ocorrem na esfera do representado;
 Teoria da Mediação – a condução de um negócio através de representante pressupõe uma
colaboração entre ele e o principal (a atuação de ambos é necessária);
Temos também que recorrer ao contexto sistemático – apenas em sistema se poderá assentar em que os
efeitos de um negócio se irão repercutir numa esfera de quem, dele, possa nem ter a mínima das
consciências;
Situação triplamente voluntária (situação mais típica):
 A vontade do representado ao conceder os poderes de representação;
 A vontade do representante de celebrar o negócio;
 A vontade do representante de pretender fazê-lo não para si, mas para o dono, dizendo-o;
5.2) Representação Orgânica (ou das pessoas coletivas)
É um dos problemas postos à teoria da representação;
Duas teorias que explicam como se deve processar o exercício dos direitos das pessoas coletivas:
 Teoria da Representação (Savigny) – a pessoa coletiva seria incapaz de agir, ficando numa
posição similar à dos menores, então precisava de ser representada;
 Teoria Orgânica – defende que não há qualquer incapacidade de exercício – a pessoa
coletiva traduz uma realidade autónoma, tendo vias próprias de atuação; assim, ela iria agir
através de órgãos próprios;
A pessoa coletiva dispõe de órgãos, e a atuação destes órgãos é a atuação da pessoa coletiva. (devido à
dificuldade em designar este esquema, chama-se representação orgânica)
A pessoa coletiva pode constituir representantes voluntários: procuradores (aos quais se aplicará a
doutrina da representação);
Quando há uma lacuna nos esquemas coletivos, estas devem ser integradas de acordo com as regras da
representação;
5.3) Representação Legal
Os pais, enquanto representantes legais dos filhos, não os representam no sentido de se
autodeterminarem, de tal forma que os atos praticados se consubstanciem na esfera dos principais. Os
pais estão assim abrangidos por poderes funcionais, cabe-lhes agir em defesa dos filhos.
As regras são distintas da representação voluntária:
 A representação voluntária visa ampliar a vontade e o raio de ação do principal;
 A representação legal pretende a proteção patrimonial e pessoal dos jovens seres humanos
ou de certos deficientes;
5.4) Problema da Abstração
Diferença entre Procuração e Mandato:
 Procuração – fonte da própria representação;
 Mandato – na base dos deveres de agir em prol do mandante;
Daqui decorre a natureza abstrata da própria representação: independente do negócio que lhe tivesse dado
origem, ela sobreviveria por si; esta construção teria ainda a vantagem de proteger a confiança de terceiros
e a da própria sociedade, sempre que se lhes deparasse um procurador;
Sabemos que apenas na concreta solução de problemas surge o direito – uma relação de representação
só por si, de nada serviria;
Poderemos construir a relação na horizontal (representação e relação básica em paralelo) ou na vertical
(representação como primeira parte de um processo que só se completará com a relação básica) – em
qualquer das hipóteses a procuração/representação postula uma situação mais vasta que lhe dê um
sentido funcional.
Aqui, a abstração será imperfeita;
5.5) A Natureza
A representação equivale a um direito potestativo do representante que lhe permite, em certas
circunstâncias e invocando a contemplatio domini, produzir efeitos jurídicos na esfera do representado;
Para além do poder básico de provocar efeitos jurídicos na esfera do principal, o representante vai dispor
de múltiplas posições instrumentais, ficando adstrito a deveres;
Sendo um direito potestativo, a situação do representante enquanto tal é um direito funcional – o
representante não é livre dentro da permissão básica que lhe assiste, ele enquadra-se numa função,
devendo prosseguir o interesse e as instruções do principal:
 Quer seja por força do NJ subjacente;
 Quer seja por via dos preceitos legais aplicáveis;
 Quer seja por exigência do sistema, expressa na necessidade de acatar o princípio de boa-fé;
A representação decorre da presença, na esfera do representante, de um direito potestativo funcional de
agir em nome e por conta do principal, fazendo surgir na esfera deste, o produto dos negócios celebrados;
5.6) O Mandato
Para ter os seus efeitos, a procuração postula um negócio subjacente que a complete; o negócio
tipicamente subjacente à procuração é o contrato de mandato.
Art.º 1157.º - o mandato implica, para o mandatário, uma prestação de facto ou de facere:
 A prática de um ou mais atos jurídicos;
 Por conta de outra – significa que os atos a praticar pelo mandatário se destinam à esfera do
mandante;
Apenas caem para o mandato as atividades jurídicas, as restantes atividades caem na prestação de
serviço, à qual, na falta de leis especificas são aplicadas as disposições sobre o mandato;
O mandato presume-se gratuito ou oneroso consoante esteja fora ou dentro do exercício da profissão do
mandatário;
Se o mandato for oneroso, a retribuição é remetida para:
 O acordo das partes;
 As tarifas profissionais;
 Os usos;
 Os juízos de equidade;
Distinguem-se ainda:
 Mandato Geral – abrange uma generalidade não especificada de atos, compreendendo
apenas atos de administração ordinária;
 Mandato Especial – reporta-se a concretos atos nele referidos, abrangendo ainda os
necessários à sua execução;
Qualquer dos dois mandatos sempre abrangeria, além do dever de prestar, a execução de todas as tarefas
acessórias necessárias.
A pluralidade de mandatários dá lugar a tantos mandatos quantas as pessoas designadas; isto só não
ocorrerá quando o contrato ditar que eles devam agir conjuntamente – situação de Comandato.
5.6.1) Posição do Mandatário
Art.º 1161.º - obrigações do mandatário:
 Deveres de Atuação – constituem o núcleo do mandato; visa-se a prática dos atos previstos
no contrato; devem, ainda, ser considerados abrangidos todos os atos materiais instrumentais
necessários.
o a) – devem ser observadas as instruções do mandante – instruções relativas aos
negócios visados (de outro modo cairíamos numa situação de subordinação jurídica,
assumindo o mandato a natureza de um contrato de trabalho). Estas instruções
devem estar inseridas no próprio contrato ou implícitas nos seus termos. O CC não
fixa uma medida para o esforço do mandatário.
o Art.º 1162.º - atribui ao mandatário um ius variandi – permite-lhe não executar o
mandato ou afastar-se das instruções recebidas. O surgimento de circunstâncias
novas, que não se possam equacionar perante uma matéria contratual existente, ou
manifesta uma lacuna contratual (art.º 239.º), ou dá corpo a uma alteração das
circunstâncias (art.º 437.º/1);
 Deveres de Informação – o mandatário deve dar todas as informações relevantes ao
mandante (mesmo as que não lhe sejam pedidas);
 Deveres de Comunicação – cingem-se à:
o Execução do mandato;
o Sua eventual não execução;
o Razões da sua não execução;
o Art.º 1162.º - por via deste artigo é possível acrescentar as circunstâncias que surjam
e que possam interferir com a execução ou com as instruções recebidas (quando
possam ser comunicadas em tempo útil);
 Deveres de Prestação de Contas – esta prestação de contas postula negócios patrimoniais,
com movimentos recíprocos;
 Deveres de Entrega – abrange uma atividade material de entrega de dinheiro – do que
recebeu em execução do mandato ou no exercício deste; para além do dinheiro, haverá que
restituir documentos e objetos envolvidos.
o O mandatário deve transmitir para o mandante os direitos adquiridos em execução
do mandato – art.º 1181.º;
Art.º 1163.º - fixa os termos de aprovação tácita do mandato (havendo ou não execução deste): vale como
aprovação o silêncio do mandante por tempo superior àquele em que teria de pronunciar-se, segundo os
usos, ou na falta deles, de acordo com a natureza do assunto. 3 efeitos da aprovação:
o Constatação do bom cumprimento;
o Concordância com a execução ou não execução, nos termos preconizados e explicados pelo
mandatário;
o Renúncia a qualquer indemnização;
o Sancionamento das contas e o reconhecimento das importâncias devidas ao mandatário, segundo
a invocação deste;
O mandatário pode (durante a execução do mandato) fazer-se substituir por outro ou servir-se de auxiliares
(art.º 1165.º), nos termos em que o procurador o possa fazer (art.º 264.º/1 e 4):
o Pode fazer-se substituir apenas se o mandante o permitir ou se essa faculdade resultar do
mandato;
o Pode recorrer a auxiliares se o contrato não o excluir, ou se o tipo de mandato em causa não
implicar o contrário;
Art.º 1166.º - pluralidade de mandatários – quando tenham o dever de agir conjuntamente, responde cada
um pelos seus atos, salvo cláusula em contrário (responsabilidade solidária – 513.º). No mandato disjunto,
não deverá haver responsabilidade solidária;
5.6.2) Posição do Mandante
Art.º 1167.º - o mandante é no fundo obrigado a:
 Fornecer ao mandatário os meios necessários à execução do mandato;
 Efetuar pagamentos s vários títulos;
 a) – “meios necessários” – adiantamentos em dinheiro (quando pressupostos ou previstos no
contrato), ou a coisas móveis; documentos, autorizações, informações; ou o próprio
mandatário ficar incumbido de localizar os meios necessários; permite ainda ao mandatário
abster-se de executar o mandato enquanto o mandante se encontrar em mora quanto ao seu
cumprimento;
 pagamentos previstos a realizar pelo mandante:
o retribuição que ao caso caiba com eventual provisão por conta dela, segundo os
usos;
o embolso das despesas fundadamente consideradas indispensáveis pelo mandatário,
com juros legais desde que efetuadas;
o indemnização pelo prejuízo sofrido em consequência do mandato, mesmo na
ausência de culpa do mandante (assume o peso dos eventuais riscos);
art.º 1169.º - regra de solidariedade entre mandantes, perante o mandato conferido;
5.6.3) Cessação do Mandato
Há 2 formas de cessação do mandato:
 Revogação:
o Art.º 1170.º/1 – princípio da livre revogabilidade do mandato por qualquer das partes – exceção à
regra que só permite revogações por comum acordo.
Este princípio pode dar azo ao dever de indemnizar a outra parte prejuízo que ela sofrer
(art.º 1172.º) – havendo justa causa, não se justifica qualquer indemnização;
o Art.º 1170.º/2 – fixa uma exceção; no caso de o mandato produzir efeitos não só na esfera jurídica
do mandante, mas também na esfera do mandatário ou de terceiro;
o Art.º 1171.º - considera como revogação tácita a que resulta da designação, pelo mandante, de
outra pessoa para a prática dos mesmos atos – a sua eficácia opera depois de conhecida pelo
mandatário;
o Art.º 1173.º - Existindo uma pluralidade de mandantes, a revogação só opera se realizada por
todos; “interesse comum” – exprime direitos subjetivos nas esferas dos mandantes envolvidos;
 Caducidade:
o Art.º 1174.º - casos de caducidade: morte ou interdição do mandante ou do mandatário e
inabilitação do mandante, se o mandato tiver por objeto atos que não possam ser praticados sem
intervenção do curador.
Não é taxativo – o mandato caduca ainda, pelo menos, pelo decurso do prazo a que
esteja sujeito, pela obtenção do resultado que vise e pela ocorrência de condição
resolutiva;
o Art.º 1175.º - o mandato não caduca pela morte, interdição ou inabilitação do mandante quando
tenha sido conferido também no interesse do mandatário ou de terceiro;
Nos outros casos, só caduca quando conhecida pelo mandatário ou quando, da
caducidade, não possam resultar prejuízos para o mandante ou para os seus herdeiros;
No caso de morte – se o mandato não caduca, deverá entender-se que se transmitiu
aos seus sucessores (art.º 2024.º e 2025.º);
o Art.º 1176.º - a morte, interdição ou incapacidade natural do mandatário determinam, na esfera de
herdeiros ou conviventes, a obrigação de prevenir o mandante e de tomar as medidas adequadas
até que ele próprio esteja em condições de providenciar;
o Art.º 1177.º - havendo pluralidade de mandatários com obrigação de agir conjuntamente, o
mandato caduca em relação a todos, salvo convenção em contrário;
5.6.4) Mandato com Representação
Art.º 1178.º e 1179.º - normas deles resultantes:
 Sendo o mandatário também representante, é aplicável, em conjunto com as regras do
mandato, o disposto nos art.º 258.º e seguintes;
 O mandatário representante deve agir não só por conta do mandante, mas, também, em seu
nome (do mandante);
 A revogação e a renúncia da procuração implicam revogação do mandato;
Em geral no mandato com representação prevalece o regime da procuração sobre o do mandato;
5.6.5) Mandato sem Representação
Art.º 1180.º - O mandato sem representação é o exercido em nome do mandatário; o mandatário poderá ter
poderes de representação (se não os exercer declarando, na contratação, que age em nome do mandante,
os direitos adquiridos e as obrigações assumidas operam na esfera do próprio mandatário);
O mandatário fica obrigado a transferir para o mandante os direitos adquiridos em execução do mandato;
(relativamente aos créditos) o mandante pode substituir-se ao mandatário no exercício dos respetivos
direitos;
O mandante deve assumir as obrigações contraídas pelo mandatário (por alguma das formas legalmente
previstas).
 Se não o puder fazer, deve o mandante entregar ao mandatário os meios necessários para o
cumprimento ou reembolsá-lo do que ele tenha despendido;
O risco do incumprimento pelos terceiros não corre pelo mandatário, salvo se, aquando da contratação, ele
conhecesse ou devesse conhecer a insolvência deles;
Os bens adquiridos pelo mandatário e que devam ser transferidos para o mandante não respondem pelas
obrigações deste, desde que o mandato conste de documento anterior à data da penhora desses bens e
não tenha sido feita a inscrição da aquisição, quando sujeita a registo.
5.6.6) Caracterização do Mandato
Características gerais do mandato:
 Contrato consensual – a lei não o sujeita a nenhuma forma solene;
 Contrato Sinalagmático imperfeito (pelo menos quando gratuito) – as prestações a que o
mandante se encontre adstrito não equivalem às adstrições do mandatário;
 Contrato Supletivamente Gratuito – presumir-se-á oneroso quando exercido no âmbito da
profissão do mandatário;
O mandato apresenta-se como o contrato típico da prestação de serviço – a relação básica subjacente a
qualquer situação de representação está sempre próxima do mandato.
5.7) Requisitos, Modalidades e Figuras Semelhantes
5.7.1) Requisitos
O funcionamento da representação depende da presença de um negócio jurídico ou de um ato a ele
assimilável;
Implica uma atividade jurídica – o representante poderá praticar atos materiais em nome e por conta do
representado, de tal modo que os efeitos dessa atuação ocorram na esfera deste último;
É uma atividade humana – logo livre, requer autonomia e margens de decisão por parte do representante
(se tiver apenas que transmitir pela boca do representante a vontade do representado então não há
representação);
A representação não ocorre a propósito de uma declaração de vontade; o representante desenvolve os
necessários preliminares, conclui negócios preparatórios e declara e recebe declarações;
3 requisitos da representação:
 Uma atuação jurídica em nome de outrem – o representante, para o ser, deve agir
esclarecendo a contraparte e todos os demais interessados de que age nessa qualidade –
declarará que atua para que os efeitos da sua ação surjam na esfera jurídica do
representado; se ele não invocar expressamente essa qualidade, já não haverá
representação (Princípio da Notoriedade);
o Razões da atuação em nome de outrem:
A representação é um direito, mesmo que funcional – o representante poderá
ou não exercê-lo, consoante queira, uma vez que nada o impedirá de negociar
para si próprio;
O terceiro com quem se contrate tem todo o direito de conhecer a outra parte
– disso poderá depender a sua decisão;
 Por conta dessa mesma pessoa – ideia retirada do mandato e traduz-se na dimensão final da
ação representativa – visa a esfera jurídica do representado;
o Este requisito tende a perder a sua autonomia na representação – invocando o
representante que está a agir em nome do representado, fica implícito que o faz
por conta deste;
o Apenas no mandato é possível agir-se por conta de outrem pois existe uma
relação de mandato. Introduzir este requisito na representação implicará a
existência de uma relação subjacente, nos termos da qual atue o processo
representativo;
o A autonomia deste requisito comprova-se com recurso a uma conjunção muito
pensada pela doutrina alemã – não há representação quando alguém cura o
próprio negócio usando falsamente outro nome;
 Dispondo o representante de poderes para o fazer – poderes de representação;
o Na representação voluntária tais poderes provêm de um negócio dirigido: a
procuração ou um negócio misto que, tenha elementos da procuração;
o Se os poderes de representação tiverem origem legal, estamos fora da
autonomia privada;
5.7.2) Modalidades
Representação Legal – trata-se do conjunto de esquemas destinados a suprir a incapacidade dos menores;
ela compete aos pais ou ao tutor e deve ser atuada em certos moldes; trata-se de um instituto autónomo;
Representação Orgânica – as pessoas coletivas são representadas pela administração; não há aqui
“representação”, uma vez que os representantes integram órgãos da representada – há antes um esquema
de imputação de efeitos às pessoas coletivas;
Representação Voluntária – em sentido próprio ou direta – a que tenha na sua base a concessão, pelo
representado e ao representante de poderes de representação;
 A representação voluntária traduz a matriz tendencialmente aplicável às outras formas de
representação;
5.7.3) Figuras Semelhantes
A representação distingue-se de diversas figuras semelhantes que também implicam atuações por conta de
outrem:
 Da chamada Representação Mediata ou Imprópria – uma pessoa por via de um mandato age
em nome próprio, mas por conta de outrem, as pessoas que contratem com ela desconhecem
a existência de um mandato;
 Da Gestão de Negócios Representativa – o gestor atua em nome do dono, mas sem dispor
nem invocar poderes de representação; os negócios que pratique inscrevem-se na esfera do
principal;
 Do Contrato para Pessoa a Nomear – uma parte, aquando da celebração de um contrato,
reserva-se o direito de nomear um terceiro que adquira direitos e assuma as obrigações
provenientes desse contrato; os efeitos não se repercutem automaticamente na esfera do
nomeado, exige-se uma declaração de nomeação e um instrumento de ratificação ou de
procuração anterior ao contrato;
 Do Recurso a Núncio – o núncio limita-se a transmitir uma mensagem com uma declaração
negocial como conteúdo; este não tem margem de decisão, limita-se a comunicar o que tenha
recebido;
 Da Ratificação – o ato é praticado por conta do visado, mas sem poderes de representação –
permite a eficácia do ato em causa na esfera da pessoa por conta da qual foi praticado;
 Da Aprovação – o ato é praticado por conta duma pessoa que recusa a ratificação, todavia
valoriza a conduta do agente ilibando-o de responsabilidades;
 Do Consentimento – o agente é autorizado a agir em nome próprio na esfera alheia – a
procuração visa a pessoa, o consentimento visa o bem;
Nas diversas figuras acima apresentadas falta sempre algo que as distinga da representação – ou em
nome de outrem, ou o poder de representação, ou a própria autonomia (ex.: do núncio);
5.8) Regime da Representação
5.8.1) Princípios Gerais
Primazia da Representação Voluntária:
 Art.º 258.º - 261.º - nestes preceitos estão reunidas diversas representações – a legal, a
voluntária e até orgânica;
 Os princípios gerais da representação se reportam, à representação voluntária – a sua
transposição para as demais representações requer sempre analogia;
Efeitos da Representação
 Os negócios jurídicos celebrados pelo representante em nome do representado produz os
seus efeitos na esfera jurídica do representado (art.º 258.º) – a lei autonomiza a atuação
nomine alieno;
 A repercussão dos negócios na esfera do representado tem 2 características:
o É imediata – independentemente de quaisquer circunstâncias, ela opera no preciso
momento em que o negócio ocorra;
o É automática – não se exige qualquer outro evento para que ela ocorra;
 O poder de disposição mantém-se na esfera de origem, sob pena de ilegitimidade –
simplesmente ele vai ser atuado pelo representante;
Elementos Subjetivos
 Em qual das vontades se deve verificar os competentes requisitos (pelo representante ou pelo
representado)?
o Teoria do Dono do Negócio – apenas a vontade do representado teria relevância;
o Teoria da Representação – conta apenas a vontade do representante;
o Art.º 259.º - combinação de ambas as teorias; parte da teoria da representação,
sendo que se admite que a vontade do representado possa ter contribuído para o
resultado final, e, quando o representado tenha dado instruções ao representante
(instruções que tenham tido relevância no ato praticado) também nele terão que
operar os requisitos negociais;
 Art.º 263.º - este preceito surge ligado à ideia de que o representante é um mero porta-voz do
representado, deixando para 2º plano a autonomia que lhe é exigida; a harmonização
consegue-se em 2 planos:
o O menor não é um verdadeiro incapaz;
o A representação por incapazes só é viável quando a autonomia privada requerida
pela situação concreta o consinta;
 A má-fé do representado prejudica sempre, mesmo que o representante esteja de boa-fé;
mas também a má-fé do representante prejudica sempre; (má-fé = está de modo exprimir o
conhecimento, o desconhecimento culposo e a prática de quaisquer ilícitos);
Justificação dos Poderes do Representante
 Numa situação de representação o representante age em nome do representado – dá a
conhecer, aos interessados, o facto de representação;
 O destinatário da conduta tem o direito, nos termos do 260.º/1, de exigir que o representante,
dentro de prazo razoável, faça prova dos seus poderes – caso contrário a declaração não
produzirá efeitos;
o Dá credibilidade à representação e evita situações de incerteza quanto ao futuro do
negócio;
 Constando os poderes de representação de um documento, pode o terceiro exigir uma cópia
dele assinada pelo representante – reforça-se a confiança do terceiro e encontra-se um
esquema destinado a melhor responsabilizar o representante;
Negócio Consigo Mesmo
 Art.º 261.º - dispondo de poderes de representação, o representante poderia ser levado a
usá-los num contrato em que ele próprio fosse a outra parte. Neste caso surge um conflito de
interesses; para resolver isto, este artigo distingue 3 hipóteses:
o O negócio celebrado pelo representante consigo mesmo e em nome próprio – o
representante usa os seus poderes para contratar, mas fá-lo com ele próprio (Ex.:
comprando o que tinha poderes para vender);
o O negócio celebrado pelo representante consigo mesmo, mas em representação de
um terceiro – o representante usa os seus poderes para contratar, mas fá-lo com ele
próprio, em representação de outro terceiro de quem detinha bastantes poderes (Ex.:
compra o que tinha poderes para vender, fazendo-o com poderes de outro terceiro
que tinha para comprar);
o O negócio celebrado por pessoa a quem o representante tivesse subestabelecido os
seus poderes de representação, com o próprio representante;
Em qualquer destas hipóteses o representante pode sacrificar os interesses que lhe
foram confiados; assim, o legislador considera o negócio consigo mesmo anulável
independentemente de ser ou não prejudicial.
Dado o regime da anulabilidade, o representado decidirá se o negócio lhe convém ou
se pretende impugná-lo;
 Uma vez que estamos no domínio da autonomia privada, o representado poderá declarar
especificamente se concorda ou não com a celebração do negócio pelo representante e com
ele próprio – pode ainda suceder que fique excluída a possibilidade de conflito de interesses;
 Oposição de Interesses – quando um representante representa 2 pessoas com interesses
opostos; esta ideia traduz-se na incompatibilidade de procuração paralela das relações
subjacentes respetivas;
o A boa-fé que acompanha as relações em causa obrigará o procurador a dar conta ao
representado do conflito existente; o duplo procurador coloca-se no âmbito de
conflito de direitos (335.º) – após uma ponderação, sacrificará uma delas.
o Ele não pode aceitar procurações incompatíveis sob pena de responder pelos
prejuízos;
5.8.2) A Procuração e o Negócio-Base
A representação voluntária é dominada pela procuração (art.º 262.º) – a procuração traduz o ato pelo qual
se confiram, a alguém, poderes de representação e exprime o documento onde esse negócio tenha sido
exarado;
Procuração enquanto ato – é um negócio jurídico unilateral – implica liberdade de celebração e estipulação
e surge perfeita apenas com uma declaração de vontade – logo, não é necessária qualquer aceitação para
que ela produza os seus efeitos;
Quem não quiser ser procurador, tem de se renunciar à declaração de vontade extinguindo-a;
A renúncia pode ser tácita – resultando de elementos que com toda a probabilidade a revelem;
A procuração pode ter por objeto a prática de quaisquer atos, salvo disposição legal em contrário;
A procuração deve submeter-se aos preceitos gerais, com relevo para as regras de interpretação e para os
art.º 280.º e seguintes;
A procuração pode ser nula quando o seu objeto seja indeterminável;
Art.º 262.º/2 – a procuração deve revestir a forma exigida para o negócio que o procurador possa realizar.
Nos casos em que sejam exigidos a escritura pública, a procuração deverá assumir uma das três formas
referidas:
 Instrumento Público;
 Documento escrito e assinado pelo representado com reconhecimento presencial de letra e
assinatura;
 Documento Autenticado;
Regras especiais relativas a certos tipos de procuração estão presentes no DL n.º 267/92 de 28 de
novembro.
Poderes Gerais e Poderes Especiais
 Procuração que conceda poderes gerais – permite ao representante a prática de uma
atividade genérica, em nome e por conta do representado;
 Procuração que conceda poderes especiais – destina-se à prática de atos específicos;
Presente no regime do Mandato no art.º 1159.º;
o Esta distinção baseia-se em argumentos:
 Histórico – art.º 1323.º e1325.º do Código de Seabra; e o facto de toda esta
matéria se ter desenvolvido a partir do mandato;
 Sistemático – aponta a unidade que deve acompanhar o mandato com
representação (o mandatário irá receber todos os poderes necessários para
executar o mandato);
 Lógico – explica que não faz sentido ter uma lei mais exigente para um
mero serviço do que para os poderes de representação;
Negócio-Base
 A lei pressupõe que, sob a procuração, exista uma relação entre o representante e o
representado em cujos termos os poderes devam ser exercidos;
 A concretização dos poderes implicados por uma procuração pressupõe um negócio nos
termos do qual eles sejam exercidos – o negócio-base;
 O negócio-base será um contrato de mandato – neste momento a procuração e o mandato
ficam numa situação de união;
 A própria lei manda aplicar ao mandato as regras próprias da procuração;
 A extensão da procuração, as suas vicissitudes, a natureza geral ou especial dos poderes
que ela implique e o modo por que eles devam ser exercidos dependerão do contrato-base;
 Tratando-se de poderes gerais com relevo apenas para a administração ordinária – a
representação resultará da própria situação considerada;
 Os poderes especiais, para a prática de atos de alienação – exigirão um ato explícito do
representado;
Regras quanto ao Procurador e à substituição
 Art.º 263.º - regra específica de capacidade – esta regra permite que uma pessoa incapaz de
praticar pessoal e livremente um determinado ato de sua conta, o possa fazer validamente
como representante de outrem;
 Uma pessoa coletiva pode ser designada procuradora, ficando dotada de poderes de
representação – estes poderes serão exercidos pelos titulares dos órgãos competentes;
 Art.º 264.º/1 – admite a substituição do procurador em 3 hipóteses:
o Se o representado o permitir;
o Se a faculdade de substituição resultar do conteúdo da procuração;
o Se essa mesma faculdade resultar da relação jurídica que a determina;

As 2 primeiras hipóteses são naturais (derivam da natureza disponível que tem a
concessão de poderes de representação) a última emerge da osmose que sempre existe
entre a procuração e o negócio-base;
 A substituição pode ser feita com ou sem reserva:
o Com reserva – o procurador não é excluído – ele mantém os poderes que lhe foram
conferidos; regime supletivo;
o Sem reserva – verifica-se a exclusão do procurador;
 Em que medida é que o procurador primitivo é responsável pelos atos praticados pelo novo
procurador?
o Art.º 264.º/3 – culpa in eligendo ou in instruendo – o procurador só responde e tiver
agido com culpa na escolha do substituto ou nas instruções que lhe deu;
 Art.º 264.º/4 – admite que o procurador sirva de auxiliares na execução da procuração; esta
possibilidade poderá ser afastada por cláusula em contrato;
Cessação da Procuração
 Art.º 265.º/1 e 2 prevê 3 formas para a extinção da procuração:
o A renúncia do Procurador – a relação de representação está assente numa
confiança mútua; a renúncia súbita a uma procuração pode prejudicar o
representado – assim, o procurador poderá ter que indemnizar se causar danos e a
sua responsabilidade emergir da relação-base;
o A cessação do negócio-base – a lei admite que a procuração subsista se aquela for
a vontade do representado – nesta altura, os poderes mantêm-se, aguardando o
consubstanciar de outra situação de base que dê sentido ao seu exercício. As regras
aplicadas à caducidade do mandato aplicam-se também à procuração;
o A revogação pelo Representado – contraponto da livre renunciabilidade; nesta
ocasião, é necessário ter em conta o regime aplicável ao negócio-base para
eventuais indemnizações;
 Art.º 265.º/3 – uma procuração conferida no interesse do procurador ou de terceiro será
irrevogável; o exercício da representação e os moldes em que, pelo contrato-base ele se
possa efetivar, podem representar uma vantagem tutelada para o próprio representante ou
para terceiro – nesta altura, a revogação só pode ocorrer havendo justa causa (ou seja,
surgindo um fundamento, objetivo ou subjetivo, que torne inexigível a manutenção dos
poderes conferidos);
 A revogação e a renúncia podem ser expressas ou tácitas – o art.º 1171.º tem aplicação à
procuração (o representado que designe outro procurador para a prática dos mesmos atos
está, implicitamente, a revogar a procuração primeiro passada) – a revogação só produz
efeitos depois de ser conhecida pelo procurador;
 Sobrevindo a cessação da procuração, o representante deve restituir ao representado o
documento de onde constem os seus poderes – art.º 267.º - para evitar que terceiros possam
ser enganados quanto à manutenção de poderes de representação;
5.8.3) A Tutela de Terceiros
A representação voluntária serve os interesses próprios do representado – o representado pode multiplicar
as suas possibilidades de agir em termos juridicamente eficazes;
A solidez e a seriedade dos vínculos de representação não relevam apenas para o representado;
Através da representação o representante contrata com terceiros – estes têm tanto interesse quanto o do
próprio representado;
Embora implicado na procuração, o terceiro contratante não intervém nem na sua constituição, nem nas
suas modificações e extinções – o direito criou então uma tutela para os terceiros;
Proteção perante as Modificações e a Extinção da Procuração
 Para contemplar os interesses e a confiança dos terceiros, mas sem negligenciar a posição
do representado – art.º 266.º estabeleceu regras:
o Modificações ou Revogações da Procuração (atuações que dependem da iniciativa
do representante) – devem ser levadas ao conhecimento de terceiros por meios
idóneos – da inobservância desta regra resulta apenas a inoponibilidade da
modificação ou revogação;
o Casos de Extinção – não há um expresso dever de dar a conhecer aos terceiros,
mas não podem estar opostas ao terceiro que sem culpa as tenha ignorado;
A diferença reside no regime do ónus da prova – no n.º 1: o representado terá que
provar que os terceiros conheciam a revogação; no n.º 2: a invocação da boa-fé
caberá aos terceiros;
 Para explicar a produção de efeitos da procuração cuja extinção mantém eficácia por não ter
sido comunicada aos terceiros interessados surgiram 2 teorias:
o Teoria da Aparência Jurídica – entende que a procuração se extinguiu efetivamente,
todavia, mercê da aparência e para tutela de terceiros ela mantém alguma eficácia;
(art.º 266.º - dispensa aos terceiros nele referidos uma determinada proteção)
o Teoria do Negócio Jurídico – a procuração só se extingue quando a sua cessação
seja conhecida pelos terceiros a proteger;
Procuração Tolerada e Aparente
 A doutrina e jurisprudência alemã determinaram um princípio de tutela da confiança de
terceiros, útil no domínio comercial; na base desse princípio autonomizaram-se 2 institutos:
o A procuração tolerada – verifica-se que alguém admite, repetidamente que um
terceiro se atribua seu representante; quando isto ocorre, reconhecem-se ao
representante aparente autênticos poderes de representação – no entanto, não se
aceita que surja uma verdadeira procuração (apenas um esquema de tutela
imputada ao representado suscitada pela conduta do representante).
Mesmo assim, alguma doutrina defende a presença de uma verdadeira
procuração negocialmente consubstanciada;
o A procuração aparente – alguém atribui-se representante de outrem, sem
conhecimento do representado. Porém, o representado deveria ter prevenido a
situação ao vigilar os seus subordinados.
Teríamos assim como elemento objetivo – a aparência da representação;
Como elemento subjetivo – a negligência do representado – na presença de
ambos, os poderes de representação teriam lugar;
Teria de se exigir a boa-fé por parte do terceiro protegido – a tutela não opera
quando ele conhecesse ou devesse conhecer a falta da procuração;
Procuração Institucional
 No direito português, a confiança só é protegida através da boa-fé e do abuso do direito,
assim, não se admite a procuração tolerada nem a procuração aparente;
 No entanto, o terceiro que seja colocado numa situação de acreditar, justificadamente, na
existência de uma procuração poderá sempre ser protegido – sempre que, do conjunto da
situação, resulte que a invocação, pelo representado, da falta de procuração constitua abuso
do direito;
 Procuração institucional – destinada a proteger o tráfego jurídico e a proteger terceiros; surgir
enquadrada numa organização permanente com trabalhadores ou agentes e serviços
indiferenciados.
o Surge sempre que uma pessoa de boa-fé, contrate com uma organização em cujo
nome atue um agente em termos tais que, de acordo com os dados socioculturais
vigentes e visto a sua inserção orgânica, seja tranquila a existência de poderes de
representação;
 Representação aparente – requisitos:
o Uma atuação em nome alheio;
o Um terceiro de boa-fé (esta boa-fé resulta da aparência global da agência com
representação);
o Com uma confiança justificada;
o Para a qual tenha contribuído o principal;
Procuração Post Mortem
 Art.º 265.º - infere-se que a morte do representado não implica a caducidade da procuração;
em certos casos é evidente a não-caducidade;
 Em situações individualizadas, a procuração tende a caducar pela morte do representado, em
virtude da cessação da relação subjacente;
 O terceiro, perante uma procuração irrevogável e eficaz post mortem, fica latamente
protegido;
5.8.4) Representação sem poderes e Abuso de Representação
Inscrevem-se no domínio da tutela dos terceiros;
Ambos os institutos devem computar uma interpretação e uma aplicação integradas;
Representação sem Poderes
 Art.º 268.º - ato praticado em nome e por conta de outrem sem que, para tanto, existam os
necessários poderes de representação;
 O negócio deveria ser nulo uma vez que se coloca fora do âmbito da autonomia do seu autor;
 No entanto, o negócio pode ser favorável ao principal – todo o instituto da gestão
representativa do negócio assenta nessa eventualidade;
 Art.º 268.º/1 – a ratificação surge como um ato jurídico em sentido restrito pelo qual o
representado acolhe o negócio em causa na sua esfera jurídica;
 A aprovação implica apenas que o principal renuncie a eventuais indemnizações que lhe
poderiam caber por danos causados com a atuação sem poderes do representante e que
está disposto a compensar o representante pelas despesas e danos que ele tenha sofrido
com a sua atuação;
 O ato praticado sem poderes traduz numa violação contratual;
 Pode haver ratificação, mas não aprovação, de tal modo que se mantenha intacta a
responsabilidade contratual do mandatário;
 Não há qualquer contradição na hipótese de uma ratificação sem aprovação; o negócio
celebrado sem poderes pode vir a ser aproveitado – a ratificação coloca-se nesse plano, não
prejudicando o caráter jurídico e eticamente reprovável da conduta do agente;
 A ratificação está sujeita à forma requerida para a própria procuração e tem eficácia
retroativa, sem prejuízo dos direitos de terceiros;
 Se for negada, o negócio ficará sem efeitos, salvo se outra coisa se inferir do seu próprio teor;
 Não havendo ratificação o negócio mantém-se, todavia, é ineficaz em relação ao
representado;
 Uma vez que foi praticado em nome e por conta deste, enquanto se mantiver essa ineficácia,
ele poucos efeitos práticos irá surtir; o próprio terceiro fica vinculado a ele; a lei distingue 2
hipóteses para não adiar esta situação:
o A de o terceiro ter conhecimento da falta de poderes do representante, no momento
da conclusão – o terceiro pode fixar um prazo para que sobrevenha a ratificação:
Se o prazo for ultrapassado considera-se negada a ratificação, ficando o
negócio sem efeito; s
Se tal prazo não for fixado, o terceiro sujeita-se a que o representado adie,
indefinidamente a situação; sendo que o terceiro pode pedir ao tribunal que fixe um prazo
ao representado para que este ratifique o negócio sem que este caduque;
o A de ele não ter tal conhecimento – o terceiro pode, a todo o tempo, revogar ou
rejeitar o negócio em causa;
Abuso de Representação
 Art.º 269.º - determina a aplicação do regime da representação sem poderes;
 Abuso de Poder:
o Terminologia Italiana – situação na qual os poderes efetivamente existentes sejam
superados pelo ato praticado;
o CC português – doutrina – se use do poder de representação de modo a contrariar o
seu escopo ou as indicações do representado e a contraparte conheça ou devesse
conhecer o abuso, havendo também representação sem poder;
 Abuso de representação – exercício dos inerentes poderes em oposição com a relação
subjacente (com o que dela resulte, de modo direto ou por violação dos deveres de lealdade
que ela postula);
 O terceiro não pode ser confrontado com tal relação, que não tenha expressão direta nos
próprios poderes – salvo se a conhecesse ou devesse conhecer;

Prof. PPV
1) Abuso de Direito
(MC) Requisitos do Abuso de Direito:
o Existência de uma situação de confiança – traduzida em boa-fé subjetiva ética (desconhecimento
não culposo);
o Justificação da Confiança (crença plausível e legítima);
o Investimento da Confiança (realização de atos em função da confiança depositada na situação);
o Imputação da confiança à pessoa que vai ser atingida pela proteção;
(Oliveira Ascensão) distinção entre ilegitimidade e ilicitude:
o Ilicitude  pressupõe um elemento subjetivo (a culpa);
o Ilegitimidade em sentido técnico  exprime, no sujeito exercente, a falta de uma especifica
qualidade que o habilite a agir no âmbito de certo direito;
o O Abuso vai ser verificado pela análise objetiva da situação jurídica, independentemente de
qualquer reprovação que possa ser feita ao sujeito;
o MC  “ilegítimo” não foi utilizado no seu sentido técnico; pretendendo o legislador dizer “é ilícito”
ou “não é permitido”;
Art.º 334.º CC  desempenha um papel de controlo em relação ao direito subjetivo como o art.º 280.º
desempenha para o NJ;  Consagra os limites da autonomia privada no exercício do direito subjetivo,
sendo que estes limites são de 3 ordens:
i. Boa-Fé
Contrariedade à Boa-Fé:
 O exercício do direito subjetivo não exige sempre o contacto social, mas envolve-o natural e
frequentemente;
 Neste contacto social envolvido no exercício do direito subjetivo, o titular do direito deve agir
de boa-fé – art.º 762.º/2 que deve ser aplicado analogicamente ao exercício de qualquer
direito subjetivo;
 A concretização do dever de boa-fé tem a ver com os velhos mandamentos de:
A. Honeste Agere
 O Direito deve ser exercido honestamente;
 Insere-se aqui um tipo característico de má fé designado por exceptio doli;
 Insere-se ainda um tipo de exercício inadmissível denominado de tu quoque – proscrição da
invocação e aproveitamento de ilicitude própria = trata-se de situações em que o exercício é
inaceitavelmente contrário aos padrões de honestidade que devem reger as relações entre
pessoas de bem;
B. Alterum Non Laedere
 O direito deve ser exercido de modo não danoso – ou do modo menos danoso possível;
 Princípio do Mínimo Dano  exige que no exercício do direito, o titular deve evitar causar
danos a terceiros e que, se não for possível, exerça o direito de modo a causar os mínimos
danos possíveis;
 O exercício do direito não permite ao seu titular causar a terceiros danos desnecessários e
evitáveis;
C. Venire Contra Factum Proprium
 Corresponde à frustração de expectativas criadas – este tipo de má fé assenta na
inadmissibilidade de comportamentos contraditórios;
 O direito deve ser exercido sem frustrar expectativas criadas pelo seu titular;
 Se alguém tiver agido de modo a criar em outrem uma confiança legitima relativamente ao
exercício do direito, então não poderá frustrar essa confiança que tenha criado ou contribuído
para criar;
 Este tipo de má fé abrange ainda os comportamentos omissivos – como quando há uma
omissão do exercício do direito em circunstâncias tais que suscitem a expectativa de que ele
não virá a ser exercido;
 Os casos designados por supressio e surrectio constituem comportamentos contraditórios;
 “Inalegabilidade Formal” – é também um comportamento contraditório: aquele que dá lugar ou
permite que se mantenha um vício que conduz à invalidade formal do negócio age
contraditoriamente quando vem depois invocar a invalidade decorrente da deficiência formal
que provocou ou permitiu;
ii. Bons Costumes
 Distingue-se os bons costumes dos maus costumes – esta distinção é ética, entendendo-se
assim que o limite do exercício lícito do direito se encontra na moral – concretamente na não
contrariedade à moral;
 Nada pode valer como direito se for contrário à ética, à moral e aos bons costumes;
 Existe um estreito contacto entre os bons costumes e a boa fé – sendo que esta comunicação
é mais intensa no que concerne à boa fé objetiva do que respeita à boa fé subjetiva;
 A clausula dos bons costumes é muito mais ampla que a da boa fé;
 Os bons costumes implicam uma referência para critérios éticos supralegais, para as
coordenadas éticas regentes na sociedade e na Ordem Social, através desta referência o
direito procura encontrar critérios de decisão e de valor que o transcendem e o dominam –
trata-se de uma normatividade imanente que não se encontra muitas vezes nas palavras da
lei;
 Embora seja difícil, é preciso distinguir de entre os critérios de dever-ser imanentes nas
coisas, quais os aceitáveis e quais os que não o são;
iii. Fim Social ou Económico do direito
 O fim pessoal é inerente ao direito subjetivo e não pode deixar de existir;
 É frequente (embora não necessário) que o direito subjetivo, além do seu fim pessoal
subjetivo, tenha também uma função social e económica objetiva para a realização, da qual é
reconhecida pela Ordem Jurídica ao seu titular;
 Sempre que o anterior se suceda, o exercício do direito será abusivo quando seja contrário a
esse fim económico ou social que, com o fim pessoal preenche a sua função;
Tipos doutrinários tradicionais de abuso de Direito  não abrangem a totalidade dos casos de abuso do
direito, mas apenas os casos mais frequentes e emblemáticos de exercício abusivo de direitos subjetivos
(tipos representativos)  não devem causar estranheza ou dificuldade os casos atípicos de abuso que não
sejam qualificáveis como de algum desses tipos. Os tipos mais comuns são:
i. Exceptio Doli
 É o tipo mais antigo de reação contra a má fé;
 Quando o demandado se defendia com uma exceptio em que invocava um comportamento
fraudulento do titular do direito;
 Por vezes surge consagrada na lei – Lei Uniforme sobre Letras e Livranças
 Art.º 334.º CC – permite a sua dedução nos casos não especialmente previstos na lei;
 Ao titular de um direito subjetivo pode ser oposta a desonestidade com que o adquiriu ou
pretende exercer;
 Este tipo de abuso assenta na violação da boa fé, do dever de agir como uma pessoa séria e
honesta e na violação dos bons costumes;
 O seu caráter vago permite ao juiz a assunção de um papel e de uma atitude quase pretórios
na busca da justiça material;
ii. Venire Contra factum Proprium
 Este tipo de abuso centra-se na proscrição de comportamentos contraditórios e da frustração
de expectativas criadas e nas quais outrem haja legítima e razoavelmente confiado;
 A vida em sociedade exige que as pessoas possam confiar nas expectativas criadas e que
essas expectativas sejam atendidas pelo Direito;
 Encontra um fundamento duplo: negocial e ético;
 O exercício posterior do Direito em contradição com a prática passada reiterada e com
frustração das expectativas legítima e razoavelmente suscitadas na parte contra quem o
direito é exercido, constitui uma conduta eticamente reprovável  uma conduta contraditória
como esta é contrária aos bons costumes e à boa fé, constituindo assim abuso de direito;
iii. Inalegabilidades Formais
 Consiste na invocação da invalidade formal de um negócio pela parte que provocou
intencionalmente a ocorrência do vício de que decorre, ou que, embora não a tenha
provocado, participou na sua prática;
 Nestes casos, a invocação do vício formal constitui um comportamento contraditório que
frustra a expectativa da outra parte, contraria a boa fé e é desconforme os bons costumes;
iv. Supressio e Surrectio
 São subtipos do venire contra factum proprium;
 Traduzem o comportamento contraditório do titular do direito que o vem a exercer depois de
uma prolongada abstenção;
 Esta abstenção prolongada de exercício de um direito pode suscitar uma expectativa legítima
e razoável de que o seu titular o não irá exercer ou que o tenha renunciado;
 Esta expectativa é aceitável quando a sua criação seja aplicável ao titular do direito e resulte
de uma situação de confiança que seja justificada e razoável;
 Estes distinguem-se do venire contra factum proprium por o comportamento inicial do titular
do direito se traduzir numa abstenção e não numa ação;
v. Tu Quoque
 Consiste na invocação ou aproveitamento de um ato ilícito por parte de quem o cometeu;
 É um caso de violação do dever de honeste agere que é eticamente inaceitável para o Direito
e que pode ser contrariado pelo exceptio doli;
vi. Exercício em Desequilíbrio
 Trata-se de um caso de exercício danoso do direito;
 O formalismo positivista conduz as pessoas juridicamente menos preparadas a pensar que
podem exercer os seus direitos de qualquer modo, causando quaisquer danos a outrem pois
estes seriam lícitos uma vez que eram causados no exercício de um direito;
 O exercício do direito deve ser exercido de modo a causar o mínimo dano a outrem;
 São 4 as principais situações em que o exercício danoso é abusivo:
(1) Exercício Emulativo  o exercício do direito é abusivo quando o titular tem a intenção
exclusiva de prejudicar outrem;
(2) Exercício Danoso Inútil ou Injustificado  o exercício do direito é abusivo quando, para o
seu titular não trouxer nenhuma vantagem, mas traga sacrifícios injustos para outrem;
(3) Exigência de algo que deva ser imediatamente restituído  é abusivo a exigência de
uma coisa que deva ser imediatamente restituída ou o pagamento de uma quantia que
deve ser imediatamente paga – este é o fundamento da compensação;
(4) Desproporção no Exercício  o exercício do direito é abusivo quando a vantagem
resultante para o titular é mínima e desproporcionada com um sacrifício severo de
outrem;
Consequências Jurídicas do Abuso do Direito:
 O art.º 334.º CC não estatui quais as consequências do abuso;
 Há alguns casos dispersos na lei em que são estatuídas determinadas consequências em
certos casos específicos de abuso do direito;
 Decisões da Jurisprudência no que concerne o abuso do direito:
o O Tribunal decide que esse direito não deve e não pode ser exercido do modo e com
as consequências jurídicas que o titular pretende;
o Assim, a decisão não extingue o direito subjetivo na esfera do titular, mas delimita o
âmbito do seu exercício lícito, e decide que aquela concreta pretensão não encontra
fundamento naquele concreto direito subjetivo;
 O abuso de direito dá origem à responsabilidade civil – se se verificarem os pressupostos,
leva à condenação do seu autor a indemnizar os danos que tenha causado;
 Sempre que a lei não determine a consequência jurídica do abuso, cabe ao Tribunal fixá-la;
 O abuso de direito é de conhecimento oficioso – pode ser conhecido e decretado sem que
tenha sido invocado pelas partes e pode ainda ser reconhecido num tribunal de recurso sem
que o tribunal recorrido tenha apreciado a respetiva questão;

Prof. Sandra Lopes Luís


1) Autotutela
Os meios de autotutela consistem na realização do direito pelo próprio ofendido, ou seja, sem recurso a
uma entidade ou órgão imparcial  tem assim um caráter subsidiário, visando apenas compensar as
insuficiências das autoridades públicas;
Existem várias modalidades de autotutela:
i. Legítima Defesa;
ii. Estado de Necessidade
iii. Ação Direta;
iv. Direito de Retenção;
v. Direito de Resistência;
1.1) Legítima Defesa
Está prevista nos art.º 337.º e 338.º do CC e 32.º e 33.º do Código Penal;
Pressupostos:
i. Impossibilidade de Recurso aos Meios Normais de Defesa Pública
o Não deve ser atendido em termos absolutos, mas antes no sentido de o
recurso a estes meios causar sacrifícios ao defendente;
o A lei não recorre à ideia de tempestividade – uma vez que a exigência
de que a agressão seja atual pressupõe a exigência de uma reação
imediata;
ii. Existência de uma Agressão a alguém
o Tem que ser ilícita  contrária à lei e não pode ser provocada pelo
que se defende (esta provocação preordenada exclui o animus
defendi);
o Atual ou Iminente  atual – que já está a produzir efeitos; iminente –
que está em vias de produzir efeitos;
Exclui a licitude da legítima defesa preventiva – a
simples previsibilidade ou certeza da agressão não
autorizam o agente a desencadear desde logo a
legítima defesa;
o A lei não obriga o agente a adiar a defesa até à consumação da
agressão  logo que iniciada a agressão o agredido pode
desencadear a legítima defesa  no entanto é preciso usar a
razoabilidade (Ex.: arma de fogo à cabeça);
o Pode ser Patrimonial ou Pessoal pessoal – incide sobre o corpo da
pessoa; patrimonial – incide sobre o património de uma pessoa;
o Do próprio ou de terceiro  permite-se a legítima defesa de terceiros
(A está a defender B que está a ser agredido por C) - justifica-se com
valores de solidariedade;
o A agressão normalmente é uma atividade positiva  no entanto, pode
ser uma abstenção quando alguém viola um dever de agir com
intenção de lesar direitos alheios (Ex.: o bombeiro não abre a agulheta
da água porque quer que o fogo destrua o prédio);
iii. A atuação em legítima defesa
o Prática pelo agente de um ato de defesa – um ato destinado a afastar
uma agressão;
o Pode também ofender um Direito de Crédito  quando o não
cumprimento de uma obrigação é a via adequada para evitar o
sacrifício de outros interesses do devedor, em resultado da atuação
ilícita do credor;
o Deve evitar que se verifique ou perdure a lesão de um direito;
iv. Proporcionalidade
o É necessário que haja proporcionalidade e racionalidade entre a
agressão e a reação;
o Este princípio tem 3 vertentes:
(1) Adequação ou Idoneidade – o meio deve ser apto a alcançar o fim;
(2) Necessidade, proibição do excesso ou indispensabilidade – o meio usado,
de entre todos os disponíveis, deve ser o menos lesivo;
(3) Proporcionalidade em sentido restrito ou equilíbrio – deve haver um
equilíbrio entre as vantagens alcançadas e as desvantagens de certa
atuação;
o Parte final do 337.º/1  consagra a proporcionalidade em sentido
restrito entre a reação à agressão e a agressão, exigindo uma
ponderação de interesses do atacante e do defendente, em que pode
haver uma pequena desproporção  os interesses sacrificados do
atacante podem ser superiores (desde que não “manifestamente”) aos
interesses do defendente em legítima defesa, devido à situação de
atualidade do perigo que pode gerar maior perturbação e perplexidade;
o Art.º 337.º/2  vertente da necessidade ou proibição do excesso –
determina uma consideração dos interesses do atacante que serão
sacrificados e impõe o uso do meio menos lesivo por parte do
defendente;
Permite-se, no entanto, que o excesso de legítima
defesa – para que isto se suceda, é necessário referir que a
culpa (a não culpa, neste caso) deve ser aferida de acordo
com o critério do bonus pater familiae (art.º 487.º/2 CC) –
existe perturbação não culposa quando um pai reage à
agressão de um filho;
Existe medo não culposo quando alguém tem de
passar por um sítio escuro e perigoso;
Assim, o excesso de legítima defesa culposo é um ato
ilícito e gera dever de indemnizar, enquanto que não culposo é
um ato lícito e não gera dever de indemnizar (483.º/2 CC);
o Divergência Doutrinária  o art.º 32.º do CP não consagra o princípio
da proporcionalidade, ora, uma vez que o CP é posterior ao CC, isto
significa que o art.º 32.º revoga a parte final do nº1 do art.º 337.º?
 MC – sim, revoga;
 Figueiredo Dias (MBB) – recorrem à ideia do
abuso do direito e de unidade do sistema para
contrariar o problema da falta de
proporcionalidade no art.º 32.º - assim, o CP não
revoga o CC;
Art.º 338.º  havendo erro sobre os pressupostos o ato é sempre considerado ilícito, embora possa não
haver obrigação de indemnizar:
o Erro Desculpável – o homem médio incorreria nele, por isso, não deveria existir dever de
indemnizar nos termos do 483.º/2;
o Erro Indesculpável – o homem médio não incorreria nele, e por isso existe dever de indemnizar;
Quando a legítima defesa é ilícita, para além do agente incorrer em responsabilidade civil, é possível
legítima defesa dessa conduta;
MC  refere apenas a existência de 3 pressupostos (verdadeiramente 2 pois o CP revoga o CC logo não
há o da proporcionalidade): uma agressão atual e contrária à lei, contra a pessoa ou o seu património ou
contra terceiro; um ato de defesa necessário (que engloba a impossibilidade de recorrer a meios normais) e
a proporcionalidade;

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