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Eleições 2014:

O que está em jogo?


REVISTA CAMBOTA

Revista Cambota / Associação de Estudos, Orientação e

Assistência Rural – ASSESOAR. -- ano 39, n. 265 (2013) -

Francisco Beltrão: ASSESOAR, 2000.

Semestral

ISSN 1984-0845

Continuação do: Jornal Cambota, ano 1-26(1-247), 1973 – 1999.

A partir do ano 34, n. 260 de 2008, foi atribuído ISSN.

1. Agricultura Familiar – Periódicos. 2. Educação do Campo -

Periódicos. 3. Agroecologia – Periódicos. 4. Desenvolvimento

Local – Periódico. I. Associação de Estudos, Orientação e

Assistência Rural - Assesoar.

CDD – 050

Ficha Catalográfca: Sandra Regina Mendonça CRB: 9/1090

2
REVISTA CAMBOTA

Sumário
Especial
Plebiscito Popular pela Constituinte Exclusiva e Soberana do Sistema Político.... 4

Reportagem de capa
Eleições 2014: O que esta em jogo?........................................................ 8

Entrevista
Conhecimento e tecnologias apropriadas, alternativas para a permanência do
Jovem no campo.................................................................................... 11

Educação Popular e Pública


A Assesoar e o compromisso com a Formação Política.................................. 15

Agroecologia
10 ANOS DE TRANSGÊNICOS NO BRASIL: um domínio sustentado em fal-
sas promes-
sas....................................................................................... 18

FEIRAS SOLIDARIAS: espaços dinamizadores e de aprendizado em comerci-

Institucional
6° Congresso Nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra...........29

Com quase meio século, a ASSESOAR está olhando seus próximos


anos........32

3
Especial

Plebiscito Popular pela Constituinte


Exclusiva e Soberana do Sistema Político

Uma Constituinte Exclusiva e Soberana


1
para mudar o sistema político

Ao olharmos para a
composição do nosso
Congresso Nacional vemos
que é um congresso de
deputados e senadores que
fazem parte da minoria da
População Brasileira.

1-Texto extraído da “Cartilha Plebiscito Por Um Novo Sistema Político”, publicada pela Plenária Nacional dos
Movimentos Sociais, novembro de 2013.

4
Assim, o ditado popular
“Quem paga a banda,
escolhe a música” se
torna a melhor forma de
falar do poder econômico
nas eleições.

5
PLEBISCITO SOBRE A ALCA
No Brasil será de 1 a 7 de setembro de 2002

6
Especial

Para construir um plebiscito


popular sobre a Constituinte
Exclusiva precisamos:
- Organizar debates políticos sobre o
tema em todos os lugares possíveis
e dialogando com toda a população;
- Um processo de votação transpa-
rente, sério com credibilidade públi-
ca;
- Um sistema de votação que garan-
ta unidade nos métodos e na simbo-
logia em todo país;
- Um processo de votação ágil,
desburocratizado que motive as
pessoas a participar;
- Condições para que toda a popula-
ção possa votar, buscando atingir o
maior número possível de eleitores;
- O envolvimento do maior número
de pessoas engajadas de forma
voluntária.

7
Repor tagem de capa

A força física e intelectual da classe recursos para o sistema financeiro (paga-


trabalhadora é a única forma de produzir mento da dívida pública) e o mínimo para a
riqueza. No Capitalismo, essa riqueza é educação, a saúde, a moradia, o saneamen-
expropriada dos trabalhadores e concen- to, condição que não se modifica pelas
trada pelas empresas da burguesia (classe eleições.
dominante) permitindo exercer o controle
dos recursos naturais e o domínio político Para esconder essa situação dos traba-
sobre a sociedade. É por isso que todo o lhadores, os grandes blocos econômicos
exercício do poder tem em vista o controle (países e empresas) encantam o resto do
da riqueza produzida pelos trabalhadores. mundo com a ideia de que o capitalismo
pode ser democrático, mesmo sem discutir
Sendo o Estado a ferramenta que a distribuição justa da riqueza. Uma demo-
financia e socorre o negócio dos capitalis- cracia restrita ao voto e às eleições.
tas, a exemplo da construção dos estádios
e das hidrelétricas, a participação política De forma geral, a motivação para votar
da classe trabalhadora é permitida desde é trabalhada a partir da ampliação ou redu-
que não provoque mudanças estruturais. ção das políticas sociais/assistenciais e,
Como mostra o gráfico a seguir, a estraté- evidentemente, tendo peso a atividade
gia do Estado é transferir o máximo de econômica que garanta postos de trabalho.

8
Repor tagem de capa
Reportagem de Capa

Por causa da ideologia produzida pela alguém se recusa, é punido com multa,
classe dominante, é senso corrente pen- não pode fazer documentos, é impedido de
sar que as eleições partidárias sejam a participar de concursos públicos, etc.
principal ferramenta coletiva da democra-
cia e o voto a principal fonte individual do
poder. Ou seja, a maioria dos trabalhado- O que considerar nas eleições de
res pensa que, com o voto, nas eleições, é 2014?
possível realizar qualquer mudança do
ponto de vista das necessidades e dos O Brasil, como país capitalista, move-
interesses da sua classe. E que ser cidadão se segundo os interesses da burguesia,
exige participação política. E participação articulada internacionalmente. Esta dinâ-
política é votar em cada eleição. mica é visível no orçamento do governo
federal, demonstrado no gráfico anterior,
Garantida esta forma de pensar, é aprovado pelo congresso nacional, estan-
curioso constatar que diferentes forças, do presente, de diferentes formas, em
oficiais e do empresariado, mantêm cam- todas as instâncias deliberativas (Executi-
panhas permanentes de valorização e vo, Legislativo, Judiciário, Forças Armadas),
incentivo para o trabalhador votar. Se incluindo as disputas eleitorais.

9
Repor tagem de capa
Reportagem de Capa
gem...), isso faz com que os capitalistas
retirem seu dinheiro das atividades produ-
Os grandes blocos econômi- tivas, que geram emprego.

Por outro lado, o empresariado cuja


cos (países e empresas) acumulação principal se dá nas atividades
produtivas (indústria, comércio, minera-
encantam o mundo com a doras, energia, agronegócio...) estão
aliados, politicamente, em torno do PT e
ideia de que o capitalismo enfrenta, eleitoralmente, o sistema finan-
ceiro. No nível internacional, este bloco
pode ser democrático, mesmo tende a fortalecer suas relações econômi-
cas e políticas com os BRICS (Brasil, Índia,
Rússia, China e Africa do Sul) e MERCOSUL.
sem discutir a distribuição
Entende-se, de qualquer forma, que
justa da riqueza. um país capitalista, dirigido sob influencia
do empresariado do capital produtivo
tende a gerar mais empregos do que se
dirigido sob influencia do capital especula-
tivo. Ao mesmo tempo, a maior sensibili-
Considerando o período eleitoral uma dade dos dirigentes desse bloco em rela-
oportunidade de politização dos trabalha- ção à população empobrecida tende a
dores sobre os interesses de classe em garantir a continuidade de programasas-
jogo, como posicionar-se nas próximas sistenciais.
eleições?

Nesta eleição, o principal enfrenta-


mento se dará entre os setores articulados Um posicionamento possível...
em torno do PSDB e seus aliados e do PT e
seus aliados. Pelo analisado, além de dedicar-se a
explicitar os projetos de classe em jogo, é
Neste sentido, embora haja uma coerente esforçar-se para manter a ativi-
fusão entre o capital financeiro e o indus- dade econômica gerando o máximo de
trial, no caso brasileiro, tem-se, por um empregos e renda porque esta condição
lado, o PSDB que coordena politicamente favorece a possibilidade de fazer a luta da
uma aliança cujos interesses predominan- classe trabalhadora pela transformação
tes articulam-se ao sistema financeiro /espe- social.
culativo; prioriza a relação econômica e
política subordinada ao capital norte- Nesse sentido, a gestão do Brasil nas
americano e europeu. A condição atual da mãos da elite ligada ao capital financeiro
economia capitalista mundial é de crise, representa a pior situação para a popula-
cujo sintoma apareceu primeiro na falên- ção trabalhadora.
cia da especulação no sistema imobiliário
norte-americano, espalhando-se também
na Europa. O controle da economia mundi- Por Valéria Korb e Paulo de Souza
al pelo sistema financeiro prioriza a acu-
mulação capitalista através da especula-
ção (bolsa de valores, juros, agiota-

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Entrevista

Conhecimento e tecnologias apropria-


das: alternativas para a permanência
do Jovem no campo1

Jonai mora na comunidade de São e pela agroecologia; demonstra sua per-


Francisco do Bandeira, em Dois Vizinhos, sistência e determinação, dialogando com
com o pai José Ribeiro Antunes, a mãe sua família, sobre as possibilidades e quais
Marilene Girardi Antunes e o irmão Joel objetivos necessitam traçar para que
Girardi Antunes. Possui uma trajetória e tenham uma vida digna no campo.
opções de vida ligadas ao campo.
Sua opção pela agroecologia teve
A Jovem, com muitos sonhos e início enquanto cursava o ensino médio,
conquistas, revela sua paixão pelo campo quando teve a oportunidade - não concre-

1 - Projeto de vida da jovem agricultora e educadora do campo, Jonai Girardi Antunes.

11
Entrevista

tizada - de ir para a Venezuela, fazer um Universidade Tecnológica Federal do


curso de agroecologia. Logo depois foi Paraná – Campus Dois Vizinhos, cuja
convidada para ingressar no Curso abordagem está voltada ao campo, local
Técnico em Agroecologia, realizado pela onde quer permanecer. Seu sonho é,
Assesoar, em parceria com o Instituto depois da licenciatura, retornar à UPVF
Técnico Federal de Curitiba, com o apoio com toda a 'bagagem' dos dois cursos e
de organizações locais (Fetraf Sul, melhorar as condições da família no siste-
Cooperativas de Crédito - CRESOL, de ma agroecológico.
comercialização - COOPAFI e de produção Na perspectiva de avançar no conhe-
– CLAF). cimento e na produção agroecológica, a
Com relação à formação em agroe- família implantou uma agrofloresta no ano
cologia ela afirma que: “é uma área que de 2011. Esta proposta surgiu através de
pensei em me dedicar para fugir da depen- famílias do município e de organizações
dência do atual modelo de agricultura locais por intermédio da Assesoar. No
baseado no agronegócio”. curso técnico em agroecologia, partindo
da metodologia de elaboração dos pro-
Quando terminou o Curso Técnico
jetos de vida, Jonai elaborou seu proje-
em Agroecologia, iniciou o Curso de
to baseado na horticultura. Com a
Licenciatura em Educação do Campo, na

12
Entrevista
implantação da agrofloresta acabou Um dos limites atuais para avançar
adaptando-o. Assim, ela afirma que “é na produção é a falta de mão de obra, pois
uma agrofloresta de alimentos. Melhor, o pai e a mãe trabalham em outras ativida-
uma agrofloresta sustentável de ali- des para além da UPVF e ela e o irmão
mentos que inclui plantas frutíferas estudam. Com seu retorno à UPVF, Jonai
com uma diversidade grande de espéci- pretende, juntamente com a família,
es e plantas madeiráveis. Nós estamos ampliar a produção para que esse quadro
produzindo para termos uma qualidade se modifique.
de vida para a família e demais pessoas Questionada sobre a viabilidade da
que venham consumir esses alimen- agrofloresta manter a família na UPVF ela
tos”. responde: “é viável produzir em sistemas
A distância da UPVF até a cidade agroflorestais, pois em uma pequena área
dificulta a produção e comercialização é possível ter uma grande diversidade
de hortaliças. Planejam entregar para a tanto de verduras, frutas entre outros. Isso
merenda escolar na comunidade a qual sem contar as melhorias na qualidade do
viabilizaria a produção. Planejam, solo, alimentação da família. A agrofloresta
também, a entrega de frutas e hortali- é economicamente viável e ambientalmen-
ças menos perecíveis para o mercado te sustentável.”
institucional (escolas, creches...) duas Diferentemente, do que corriqueira-
vezes por semana. mente ouve-se dos jovens, Jonai tem como
A agrofloresta já dá bons sinais de sonho ficar no campo. “Gosto do campo!
sua potencialidade na produção de ali- Hoje em dia pode-se viver nele com uma
mentos, principalmente frutas (banana e boa qualidade de vida. Com uma vida
acerola) e hortaliças (mandioca e abóbora). digna. Tem-se autonomia na UPVF, gosto

13
Entrevista

desta área. Não me vejo fora daqui, sem- resta: após termos o sistema já equilibra-
pre estarei ligada a UPVF.” do você não necessita de grandes quanti-
dades de mão de obra, o trabalho é facilita-
Com a participação no Curso
do. Há muitas tecnologias que poderemos
Técnico em Agroecologia e no Curso de
adaptar as diversas situações, basta que
Licenciatura em Educação do Campo,
as pessoas se deem conta e tenham acesso
Jonai afirma sentir-se segura para dar
a elas.”
continuidade ao trabalho com maior
propriedade/conhecimento em sua UPVF. Ela afirma ainda que “a pratica da
Diz, também, que pretende continuar se agroecologia pode ser realizada em peque-
especializando nessa área. nas áreas ou grandes áreas, basta ter
senso de observação da natureza e perce-
Muitos pais desestimulam a perma-
ber o que ela está oferecendo em cada
nência dos filhos no campo. Afirmam que
situação. Faz-se necessário trabalhar com
este é um lugar penoso e que não garante
a natureza e não ir contra ela”.
vida digna aos jovens. Ao contrário disso,
“meu pai concorda e apóia. Porém, no E finaliza: “Vale a pena viver no
momento, não tem como viver somente campo, trabalhar no campo, ainda mais
da produção da agrofloresta então a quando a forma de produção estiver base-
estratégia é vender sua mão de obra até ada na agroecologia. Assim você terá
obter maior retorno para que a família autonomia, qualidade de vida, adquirindo
possa trabalhar somente na UPVF”. conhecimento. Não é por estar no campo
que o jovem não deva buscar conhecimen-
Ao falar de agroecologia, Jonai
to. Vale a pena sair, estudar e posterior-
deixa transparecer suas convicções: “Na
mente voltar para aplicar os conhecimen-
sociedade que estamos vivendo hoje,
tos. Assim, teremos a sucessão na
capitalista, excludente, a única saída é a
Agricultura Familiar dando continuidade a
agroecologia. Com suas tecnologias de
uma outra forma de produzir no campo”.
baixo custo, basta dedicar-se para poder
perceber quais são necessárias em cada
situação. Não precisa voltar a trabalhar
Por Janete Rosane Fabro
como antigamente, mas é necessário
adaptar-se e implementar os conheci-
mentos já gerados pela humanidade ao
longo dos tempos. Veja o caso da agroflo-

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Educação Popular e Pública

A Assesoar e o compromisso
com a Formação Política

Quem controla os meios de traba- A classe dos capitalistas sabe que


lhar, controla a riqueza do trabalho social seu sossego é maior quanto menor for a
e, por isso, tem condições de controlar capacidade organizativa e de luta da classe
como uma sociedade pensa. Para continu- trabalhadora, por isso, atua em todos os
ar explorando o trabalho, a Burguesia espaços e produz/ensina formas de inter-
molda a cabeça, especialmente da classe pretar e se posicionar no mundo. Dedica-se
trabalhadora. Esse é o papel da ideologia. a moldar como pensam as famílias, os
conteúdos e valores dos meios massivos de
A afirmação acima é estranha à comunicação, de religiões, de escolas, de
maioria dos trabalhadores brasileiros universidades e, inclusive, de organizações
porque explicam a exploração econômica, populares.
a miséria, a subordinação política, a exclu-
Aparecendo como democrática, a
são ou o 'sucesso' social, de outra forma.
burguesia oferece como doação, muitas das
Os trabalhadores, normalmente, acredi-
demandas das lutas da classe trabalhadora.
tam que a grande riqueza de alguns é fruto
É assim com o FGTS no lugar da estabilida-
de esforço individual, da maior competên-
de no emprego; com a democracia repre-
cia pessoal ou, mais recentemente, da sentativa no lugar da democracia direta;
maior capacidade empreendedora. com o plebiscito só para tratar de assuntos
secundários; com a assistência social ao

15
Educação Popular e Pública

invés de distribuição justa da riqueza; rumo ao Socialismo. A Formação Política


com o voto que aparenta ser o maior prepara os militantes que fazem a luta de
instrumento de poder popular e de cidada- classe acontecer ao elaborar respostas
nia, entre outros. para os desafios atuais, transformando as
conquistas específicas, do povo ou de
Um olhar mais atento da classe categorias profissionais, em vitórias da
trabalhadora mostrará que a democracia classe trabalhadora.
defendida pela elite é associada à defesa
da sua propriedade privada dos meios de Para que a Formação Política acon-
produzir (terra, fábricas, capital) e à teça, a organização/movimento terá que
liberdade de expressão dos seus empre- criar as condições (materiais e de mobili-
sários da comunicação, cuja defesa é zação) para que os dirigentes da classe
feita, se necessário, com o uso da violên- trabalhadora: (a) apropriem-se da teoria e
cia armada, legalizada ou mercenária, da ciência para teorizar o trabalho produti-
contra possíveis 'atentados' da classe vo de sua época; (b) elaborem uma estra-
trabalhadora 'contra a ordem e a liberdade tégia que permita às organizações popula-
social'. res e de classe posicionarem-se diante dos
desafios da realidade; (c) aprofundem e
'Afiar' a condição da classe traba- operem com o método do trabalho de
lhadora desmontar as explicações da elite base, formando e mobilizando muita
sobre o funcionamento do Capitalismo e gente; (d) apontem valores para a vivên-
contrapor-se de forma fundamentada e cia cotidiana que solidifiquem compromis-
organizada, com base na ciência e na sos comuns na estratégia de transforma-
história das lutas de classe, é o papel da ção, produzindo unidade de classe.
Formação Política.
Cooperativas, movimentos e sindi-
A Formação Política, permite o catos, especialmente da população do
contraponto à elite (contra-ideologia), campo do Sudoeste do Paraná, constata-
esclarece o povo e contribui para organi- ram que, na última década, diante da
zar a luta da classe para a transformação ausência de lutas contra os setores mais

1ª etapa de formação política 27 a 29 de agosto de 2013

16
Educação Popular e Pública

2ª etapa de formação política 29 a 31 de outubro de 2013

fortes do capital e do foco em negociações cuja tarefa inicial foi formular e acompa-
com governos, a formação política ficou nhar um programa de formação política,
em segundo plano ou foi paralisada. envolvendo 60 dirigentes, nas 04 etapas já
Quadro esse que fundamentou uma das realizadas, com mais duas previstas para
principais demandas atribuídas para a 2014. A continuidade, em 2015-18, amplia
Assesoar nos próximos anos: contribuir para duas turmas de dirigentes e inicia a
na retomada da Formação Política. formação política de nível intermediário e
para a juventude.
Debateu-se como a Assesoar se
organizaria e, em 2010, decidiu-se pela Trata-se, como assumido nos deba-
estruturação do Centro de Educação tes de 2013 e na Assembleia Geral
Popular, uma ferramenta estrutural e Ordinária de 2014, da Assesoar contribuir,
pedagogicamente organizada, funcionan- priorizando ações que permitam mobilizar
do em articulação política e operacional e articular-se com as lutas populares e
com as demandas regionais de formação classistas, no mínimo, no Paraná; conec-
da classe trabalhadora. O Centro de tar-se com o enfrentamento mais fecundo
Educação Popular da Assesoar cumprirá o contra o capital (atualmente as empresas
papel de fortalecer as condições políticas, transnacionais e o sistema financeiro);
metodológicas e materiais para a forma- organizar a resistência e acumular para um
ção política, tecnológica e organizativa da projeto popular de desenvolvimento para o
classe trabalhadora no Sudoeste do Brasil e, por fim, conectar-se à luta dos
Paraná. trabalhadores das cidades, especialmente
a juventude.
Em 2012, é constituído o Conselho
Político do Centro de Educação Popular, Por Valdir Duarte

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Agroecologia

10 ANOS DE TRANSGÊNICOS NO
BRASIL

Há uma década na agricultura e na aval da ANVISA (Agência Nacional de


mesa dos brasileiros, os transgênicos Vigilância Sanitária) e do IBAMA (Instituto
carregam muitas controvérsias sobre os Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos
riscos sociais, políticos, ambientais, Renováveis) para a liberação de transgêni-
econômicos e à saúde humana. cos.
Controvérsias e desconfianças que Outra alteração, atendendo nova-
aumentam com o passar do tempo, à mente às pressões da Monsanto, foi com
medita que resultados negativos de seu relação ao L M R (Limite Máximo de
cultivo e consumo surgem com maior Resíduo) permitido para a cultura da soja,
frequência, contrapondo-se ao prometido no qual o valor residual permitido para o
pelas empresas da biotecnologia. herbicida Glifosato passou 0,2 miligramas
Atendendo à pressão da empresa para 10 miligramas por quilo de soja. É
multinacional Monsanto, a liberação dos importante salientar o que esses números
transgênicos, no Brasil, aconteceu em significam, agora podemos ter 50 vezes
2003. Negociada entre o governo brasi- mais Glifosato na soja que chega em nos-
leiro e o Congresso Nacional, a lei sas mesas em forma de alimentos.
10.688/2003 foi sancionada autorizando Atualmente o Brasil é, ao lado dos
o plantio e a comercialização da soja Estados Unidos, líder mundial na produção
transgênica. A partir de então, os trans- de soja transgênica. Um estudo divulgado
gênicos se impuseram como uma realida- pelo Conselho de Informações sobre
de nacional. Biotecnologia, diz que, somadas todas as
A liberação de plantios transgênicos cultivares, na safra 2013/2014, uma área
em todo território nacional, aconteceu de 40,3 milhões de hectares teria sido
sem a devida avaliação dos impactos à ocupada com transgênicos no Brasil. Deste
saúde e ao meio ambiente e não levou em total, a soja transgênica teria ocupado
consideração a Lei de Biossegurança quase 27 milhões de hectares. Na figura 1,
existente desde 1995. Lei que acabou pode-se observar o avanço dos transgêni-
sendo modificada pouco tempo após a cos no território nacional, com estimativa
liberação, suprimindo a necessidade do de áreas ocupadas pelas culturas da soja,
milho e algodão.

18
Agroecologia

Com o crescimento do plantio de na produtividade depois da entrada dos


transgênicos, surge a primeira contradi- transgênicos. Esse crescimento de produ-
ção ao que foi prometido. A grande propa- tividade chega a ser inexpressivo quando
ganda a favor dos transgênicos era a comparado com os 31% de aumento de
utilização de menos agrotóxicos, mas a produtividade da soja convencional no
realidade é que, em 2008, o Brasil tornou- período de 1992 a 2003. No caso da soja,
se o maior consumidor de agrotóxicos do estudos comprovam que as transgênicas
mundo, principalmente em função do tem igual ou menor produtividade que as
Glifosato, utilizado na soja transgênica. convencionais. Em Cruz Alta (RS), nas
Segundo dados da CONAB (Companhia pesquisas realizadas pelo Fundacep, todas
Nacional de Abastecimento), o uso de as variedades de soja transgênica revela-
agrotóxicos cresceu 345% na agricultura ram uma produtividade 13% menor do que
brasileira nos últimos 12 anos. as convencionais recomendadas. Já o
Departamento de Agricultura dos Estados
Os impactos desta tecnologia, com-
Unidos aponta uma redução de produtivi-
provadamente associada a uma intensifi-
dade da soja transgênica entre 5 e 11% em
cação do uso de agrotóxicos, afetam a
relação às convencionais.
saúde humana e também o equilíbrio dos
ecossistemas através da contaminação Além do fracasso com relação a pro-
genética e da degradação do solo e da dutividade prometida, com o passar dos
água. anos surgiram insetos e plantas resisten-
tes aos agrotóxicos dos pacotes transgêni-
No mundo já existem diversas pes-
cos, fazendo com que número de aplica-
quisas denunciando os riscos dos transgê-
ções para o controle e/ou doses utilizadas
nicos à saúde humana. Destacam-se a má
aumentassem com o passar do tempo. Tais
formação de fetos, o aumento de tumores
falhas da tecnologia fizeram com que os
e as disfunções celulares. No Brasil, um
custos de produção fossem aumentando a
dos maiores cultivadores e consumidores
cada safra, juntamente com o impacto
de transgênicos, essas pesquisas ainda
causado ao meio ambiente.
são pouco realizadas.
Mesmo assim, essas falhas e impactos
As promessas de ganhos de produti-
que deveriam servir como um grande sinal
vidade, de benefícios para os agricultores,
de alerta, estão sendo utilizados como
de aumento na oferta de alimentos, de
justificativa para a liberação de transgêni-
segurança dos produtos, também, têm se
cos associados a agrotóxicos cada vez mais
mostrado infundadas. A cultura da soja,
perigosos, como é caso da possível libera-
por exemplo, teve apenas 4% de aumento
ção da soja e do milho resistentes ao herbi-

19
Agroecologia

ção sempre depende do cruzamento entre


No mundo já existem diversas plantas. O transporte do pólen é realizado
através do vento, dos insetos, dos pássa-
pesquisas denunciando os ros e até da água. No entanto, mesmo no
caso da soja, planta que se “auto fecunda”,
riscos dos transgênicos à um estudo da Embrapa concluiu que a taxa
de polinização cruzada é em torno de 6%,
saúde humana. Destacam-se oferecendo assim o risco de contaminação
por áreas próximas.
a má formação de fetos, o
Sendo assim, agricultores que não
aumento de tumores e as usam a tecnologia, podem ser obrigados a
pagar royalties pelo seu uso. Isso pode
disfunções celulares. acontecer porque antes dos grãos serem
armazenados nos silos, o agricultor, a
agricultora, deve declarar que tipo de
semente utilizou. Se declarar que não
cida 2,4-D, tecnologia apontada como a
utilizou sementes transgênicas deverá
“solução” para o caso de resistências ao
provar através de análise. O teste utilizado
Glifosato.
identifica se há presença de grãos transgê-
Frente a este modelo de agricultura, nicos, mas não é capaz de identificar a
agricultores e agricultoras comprometidos porcentagem destes grãos no lote. Se
com a produção de alimentos saudáveis, confirmada a contaminação, o agricultor
encontram-se cercados pelo crescente ou agricultora terá seu lote pago pelo valor
avanço do agronegócio e seus impactos atribuído a produção transgênica e pagará
como: erosão e contaminação genética, royalties sobre a totalidade dos grãos,
extermínio de polinizadores, contamina- mesmo não usando a tecnologia. O mon-
ção do solo, água, entre outros. Deste tante de recursos obtidos com os royalties
modo, o avanço do agronegócio, impulsio- são repassados diretamente aos cofres das
nado pelo uso da transgenia, tem violado o empresas que tem a patente da semente.
direito das famílias produzirem, processa- Somente na safra 2009/2010 o Brasil
rem e comercializarem alimentos saudá- pagou para a Monsanto cerca de 1 milhão
veis. Mesmo famílias que fazem uso de de reais em royalties.
agrotóxicos em seus cultivos, mas que
optam pelo cultivo de não transgênicos,
estão tendo dificuldades na produção, A liberação de plantios
tanto pela falta de sementes não transgê-
nicas no mercado como pela contamina-
transgênicos em todo terri-
ção genética de suas lavouras.
A contaminação genética pode acon- tório nacional, aconteceu
tecer através da polinização ou através
dos maquinários utilizados para plantio sem a devida avaliação dos
ou colheita. Através da polinização a
contaminação é mais imprevisível, princi- impactos à saúde e ao meio
palmente nas plantas que possuem a
chamada “polinização cruzada” como é o ambiente...
caso do milho. Nestas culturas, a reprodu-

20
Agroecologia

Mesmo com os impactos já existentes (Alemanha) e Dow (EUA). De acordo com


e com a carência de pesquisas de médio e os dados do Grupo ETC (Estudo, Trabalho &
longo prazos, a transgenia avança a Cultura), estas grandes empresas contro-
passos largos, fortalecendo o monopólio lam 59,8% do mercado mundial de semen-
das empresas que controlam a tecnologia tes e 76,1% do mercado de agroquímicos.
através de políticas públicas e parcerias
No Brasil, essas transnacionais com-
público-privado voltadas para o agronegó-
praram praticamente todas as pequenas e
cio. Neste jogo de interesses, as famílias
médias empresas de sementes, e domi-
agricultoras ficam reféns das transnacio-
nam toda a cadeia agroalimentar, da
nais e a soberania nacional sobre a agricul-
semente à comercialização. Assim, deter-
tura a cada dia mais distante.
minam e padronizam a dieta da população
Com exceção da utilização de algumas com poucos produtos e de acordo com seus
cultivares transgênicas da EMBRAPA interesses, direcionando os rumos estra-
(Empresa Brasileira de Pesquisa tégicos da produção agrícola brasileira.
Agropecuária), todos os cultivos liberados Com dinheiro, essas empresas, direcionam
até hoje no Brasil utilizam tecnologia a pesquisa e também a legislação com
transgênica e defensivos agrícolas produ- financiamento de campanhas eleitorais.
zidos pelas seis grandes empresas trans-
As evidências sobre os riscos dos
nacionais que também lideram o setor de
transgênicos estão cada vez mais numero-
transgenia em nível global: Monsanto
sas e contundentes, mesmo com os imen-
(Estados Unidos), Syngenta (Suíça),
sos esforçosdas empresas nas tentativas
Dupont (EUA), Basf (Alemanha), Bayer

21
Agroecologia

potenciais impactos sejam descartados em


de desqualificar as pesquisas realizadas estudos de médio e longo prazos. Em todos
por cientistas independentes. Um dos estes processos, é preciso garantir a parti-
principais entre estes riscos, é o desapare- cipação dos agricultores e agricultoras nas
cimento das variedades convencionais e decisões sobre a questão dos transgênicos.
sementes crioulas. Assim, é fundamental
que as famílias agricultoras continuem a O avanço tecnológico na agricultura é
reproduzir suas sementes, recuperando e fundamental para melhorar as condições
continuando a desenvolver suas técnicas de trabalho, no entanto, o que deve ser
de produção. Para o fortalecimento desta questionado é para que, qual o impacto e a
prática entre as famílias também é impor- quem realmente servem os novos instru-
tante a criação e o apoio à bancos comuni- mentos tecnológicos. A tecnologia deve
tários de sementes, à associações produ- estar disponível e sobre domínio das famíli-
toras e a existência de feiras e festas que as agricultoras e não servir como ferra-
possibilitem a troca de sementes entre as menta de domínio de grandes grupos
famílias. econômicos.
Cabe ao Estado garantir políticas
públicas estruturantes que incentivem a
produção, distribuição e utilização de
sementes crioulas. Cabe também ao
Estado, fiscalizar e responsabilizar as
empresas pelos impactos causados e não
liberar transgênicos sem que todos seus Por Felipe Grisa

Materiais de Apoio:
 Década de transgênicos tem resultados negativos. Disponível em: www.brasildefato.-
com.br/node/26842

 Legalizados há 10 anos, transgênicos vivem ‘apoteose’ no Brasil. Disponível em:


http://reporterbrasil.org.br/2013/11/legalizados-ha-10-anos-transgenicos-vivem-
apoteose-no-brasil/

 Transgênicos: 10 anos à solta. Disponível em: http://www.idec.org.br/em-


acao/revista/internet-meia-boca/materia/transgenicos-10-anos-a-solta

 Grupo de seis empresas controla mercado global de transgênicos. Disponível em:


http://reporterbrasil.org.br/2013/11/grupo-de-seis-empresas-controla-mercado-global-de-
transgenicos-2/

 Seminário internacional debate os 10 anos dos transgênicos no Brasil. Disponível em:


http://www.brasildefato.com.br/node/26389

 Soja transgênica no Brasil: Contaminação e royalties . Disponível em:


http://www.greenpeace.org/brasil/pt/Documentos/greenpeacebr_050531_transgenicos_
documento_contaminacao_royalties_port_v1/

 Sementes Transgênicas - Contaminação, Royalties e patentes. Disponível em:


http://terradedireitos.org.br/2009/05/10/cartilha-sementes-transgenicas-contaminacao-
royalties-e-patentes/

 Carta Política – Seminário 10 anos da Liberação dos Transgênicos no Brasil. Disponível


em: http://www.agroecologia.org.br/index.php/rumo-ao-iii-ena/570-transgenicos-no-
brasil-10-anos-de-promessas-nao-cumpridas

22
Agroecologia

FEIRAS SOLIDÁRIAS
espaços dinamizadores e de aprendizado em
Comercialização local

Feira ecológica de Francisco Beltrão

A história das feiras é tão antiga perspectiva, principalmente, a questão


quanto a história da humanidade, relatos econômica, percebem-se ainda muitas
apontam a sua ocorrência junto a festas e características que estavam presentes no
pela necessidade de troca da produção seu início. Com o avanço dos processos
excedente. Foi através delas que se inicia- ligados a grandes estruturas de mercado
ram as primeiras relações comerciais. Ao com pontos permanentes, as feiras foram
caracterizar esses espaços verifica-se que sendo desmotivadas. Apesar disso, elas
os mesmos são imbuídos de cultura e resistem e são espaços importantes de
significado. Vários processos de feiras construção de novas relações comerciais.
ainda são permeados por práticas coleti-
A maioria das feiras organizadas,
vas de trabalho, trocas de produtos e
atualmente, baseiam-se na estrutura de
saberes além de outras estratégias para
mercado individualizado e competitivo.
manter a cooperação entre as pessoas que
Essa forma de comercialização individuali-
participam.
zada não se distingue da lógica do mercado
Mesmo que na atualidade estes espa- capitalista e não serve de referência para
ços de comercialização tenham como se contrapor a ele. Também, não se apre-

23
Agroecologia

senta como referência na disponibilização A venda rendeu R$ 50,00. A partir deste


de alimentos à classe trabalhadora e exclui momento percebi que poderia levar mais
as famílias de agricultores descapitaliza- coisas que venderia.”
dos e sem condições de respostas rápidas Esta família já produzia alimentos
as exigências desse mercado altamente para o seu consumo, mas tinha exceden-
competitivo. tes. Ao iniciar o processo de implantação
Aos pequenos agricultores fragiliza- da feira solidária, em Ampere, eles foram
dos pela falta de acesso às tecnologias convidados, por um vizinho, para partici-
adaptadas à sua realidade; pela não exis- par. Inicialmente, as famílias se reuniam
tência de políticas públicas que incentivem para debater sobre o trabalho coletivo, o
a produção alternativa de alimentos e pelo
desconhecimento da estrutura de merca-
do; resta apenas a opção de adequarem-
se a lógica produtiva com base na agricul- A maioria das feiras organiza-
tura industrial, entregando sua produção
para terceiros ou então abandonar suas das, atualmente, baseiam-se
terras em busca de outras formas de
sobrevivência. na estrutura de mercado indi-
As feiras regidas por coletivos que vidualizado e competitivo.
possuem processos de formação e de
análise do contexto ao qual estão inseri- Essa forma de comercialização
das, são importantes instrumentos dina-
mizadores da comercialização local. Estas individualizada não se distin-
possuem vida própria, que, de certo modo,
independe da estrutura convencional dos gue da lógica do mercado
mercados, e sua dinâmica e forma organi-
zativa imprime diferentes estratégias de capitalista e não serve de refe-
produção e de diálogo com os trabalhado-
res urbanos, firmando novas relações para rência para se contrapor a ele.
além do mero ato de compra e venda.
Essas feiras são espaços de diálogos e
acordos produtivos e organizativos entre
preço justo dos produtos, a produção
as famílias. Partindo deste diferencial, a
agroecológica, as deferentes formas de
cooperação é estratégica na manutenção
comercialização, a organização da produ-
do processo, evitando assim que hajam
ção, entre outros temas.
perdas para as famílias, garantindo a
geração de renda de forma continuada ao Maria Roque, no início, participou com
longo do ano. certa desconfiança por não conhecer nin-
guém do coletivo que estava se formando.
Em relato, Dona Maria Roque (feiran- Esta desconfiança se somava a sua falta de
te do município de Ampere) afirma que: “ experiência com vendas, pois nunca havia
no dia de inauguração da feira levei poucos comercializado seus produtos. Como as
produtos (ovos, queijo, frango, verduras e demais famílias, ela participou do processo
mandioca). Tinha medo de não vender, de implantação da feira na perspectiva de
pois eu achava meus produtos feios em ampliação da renda. Hoje, a feira tornou-se
relação aos do supermercado. Vendi tudo! um espaço fundamental para Dona Maria e

24
ogia
Agroecologia

para os pequenos agricultores que ampli- escala para depois ser redistribuída por
am sua produção e renda, criando novas grandes redes que tendem a dominar o
expectativas de vida no campo. mercado em todas as fases do sistema
produtivo. Essa lógica contrapõe-se fron-
Esta forma diferenciada de fazer o
talmente com qualquer iniciativa de indus-
alimento chegar até a mesa dos trabalha-
trialização e comercialização descentrali-
dores é objeto de debate e formação na
zada como as feiras, as vendas diretas para
região sudoeste, desde os anos 1990.
os consumidores e mercados institucionais
Neste período, apesar do pensamento
locais. O impacto deste processo é a cen-
hegemônico do sistema capitalista que
tralização cada vez maior da produção que
levava os agricultores e agricultoras a
baseia-se em poucos cultivos, bem como
lógica de produzir e “entregar” sua produ-
na padronização da alimentação com
ção para que outros a transformem e
controle dos preços pelas grandes empre-
comercializem, muitos, insatisfeitos com
sas e pelo mercado financeiro.
essa situação, iniciaram a criação das
feiras solidárias. As feiras, por sua vez, tiram o agricul-
tor e a agricultora do anonimato. Os ali-
A reestruturação dos sistemas produ-
mentos produzidos possuem uma cara,
tivos com vistas à produção de alimentos
uma história que se confundem com a cara
para abastecimento local pressupõe a
e a história dos feirantes. Partindo deste
mudança na estratégia de atuação dos
reconhecimento amplia-se a oportunidade
governos municipais que, desta forma,
e capacidade das famílias dialogarem, o
passariam a fortalecer um projeto de maior
que contribui para a construção de outras
autonomia regional, levando em conside-
relações sociais juntamente ao abasteci-
ração as características da mesma, fortale-
mento local. A partir da feira, as famílias
cendo uma agricultura diversificada e
passam a integrar outros espaços de
voltada para a classe trabalhadora.
comercialização tais como: a venda direta
Porém, a estratégia do agronegócio casa a casa, restaurantes, programas de
não está pautada nesta premissa e sim, na governo entre outros.
industrialização da produção em larga

Feira ecológica de Francisco Beltrão

25
Agroecologia

O depoimento de Nicole Rodrigues Vicente, engenheira agrônoma, pesqui-


sadora em agroecologia e consumidora ecológica nos provoca sobre a importân-
cia de fortalecermos formas de comercialização local como as feiras.

“Cada vez que um consumidor adquire um produto na feira local, ele investe
seu dinheiro na família agricultora. A família, então, utiliza este dinheiro para dar
continuidade ao seu modo de vida, gerando assim condições para sua permanên-
cia no campo. A cada R$1,00 investido em um produto da feira local é R$1,00
investido nesta cadeia curta de produção, cujo rendimento vai direto para o bolso
do agricultor, resultando em maior incentivo e motivação para que esta família
continue vivendo no campo e do campo. Esta família permanecerá no campo com
qualidade de vida, podendo criar seus filhos com possibilidades de permanência
destes na UPVF, mantendo assim a agricultura familiar viva na região.
Na agricultura familiar, a produção de alimentos para o consumo, geralmen-
te, é uma prioridade. Dessa forma, manter a família no campo representa termos
UPVFs onde são cultivados diversos alimentos, incluídos o cultivo de árvores
frutíferas, áreas de floresta e manutenção de fontes de água limpa, pois esses
são elementos valorizados pelas próprias famílias que vivem no campo. A produ-
ção que vai para a feira é colhida e logo é levada à venda, portanto o consumidor
além de investir seus recursos na manutenção da agricultura familiar, ele acessa
produtos frescos, colhidos na época certa, adquirindo assim um melhor produto
para a saúde da sua própria família. A cada R$1,00 investido nos alimentos pro-
duzidos localmente é R$1,00 a menos investido nas grandes redes varejistas.
As grandes redes varejistas vão investir o recurso proveniente da venda dos
produtos em uma cadeia longa, cuja distribuição do rendimento ao longo da
cadeia é muito desigual, ou seja, alguém leva vantagem em cima do produtor.
Nesta longa cadeia, poucos agricultores familiares conseguem ter acesso devido
às exigências em escala e periodicidade. Para lucrar, o produtor, o distribuidor e o
comerciante, precisam que tudo seja em grande escala. Quanto maior o lote,
menor o preço que o comerciante paga, ou seja, menor o valor por unidade que o
produtor vai ganhar. Essas exigências requerem uma agricultura altamente
tecnificada, fundamentada na monocultura e no uso de insumos sintéticos que
contaminam o meio ambiente e nossas vidas, pois a produção de um mesmo
alimento em grande escala num país tropical requer altas doses de insumos
químicos. Seus produtos, geralmente, precisam de aditivos para prolongar sua
vida na prateleira. Além disso, eles são colhidos muito antes do ponto ideal de
maturação devido à necessidade de resistirem ao transporte em longos trechos.
O dinheiro investido nesta cadeia não circula apenas no local ele é segmen-
tado e diluído ao longo de todas essas fases e entre diversos atores. A cada
R$1,00 investido nos alimentos provenientes de outras regiões e comercializa-
dos nos mercados varejistas é R$1,00 a menos investido na agricultura familiar
da nossa região. Todos perdemos com isso.”

A seguir Nicole demonstra através dos fluxogramas quais estratégias pode-


mos fortalecer mediante o ato de consumir:

26
Agroecologia

27
Agroecologia

A feira é muito mais do que um sim- produtoras de alimentos como os traba-


ples local de comercialização, ela é espaço lhadores urbanos e também um espaço
de troca de conhecimentos e de alimentos, gerador de desenvolvimento.
mobilizatório, de amizades, de culturas, de
relações que envolvem tanto as famílias Por Janete Rosane Fabro
José Joacir Deriviane Antonioli

28
Institucional

6° Congresso Nacional do Movimento


dos Trabalhadores Rurais Sem Terra

Sob o lema 'Lutar, Construir Reforma Duas grandes mobilizações marcaram


Agrária Popular', entre os dias 10 a 14 de a comemoração dos 30 anos do MST: a
fevereiro de 2014, aconteceu o 6° ocupação do MEC por 750 'Sem Terrinhas',
Congresso Nacional do Movimento dos contra o fechamento das Escolas e por
Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, melhores condições na Educação do
em Brasília, reunindo 15 mil trabalhado- Campo e a Marcha pela Reforma Agrária
res/as de 23 estados brasileiros, além de Popular, com 15 mil Sem Terra, nas ruas de
250 convidados de 27 países, e mais de Brasília.
300 convidados nacionais de organiza-
“Após 30 anos de história, o MST
ções do campo popular.
continua nas ruas lutando por objetivos
“O congresso demarcou a consolida- simples, fáceis de entender: reforma
ção de um novo programa agrário do agrária, terra livre para viver e trabalhar.
Movimento que pretende nortear a orga- Condições para produzir o pão que falta na
nização da produção no campo brasileiro, mesa dos famintos. Exigem educação,
a chamada Reforma Agrária Popular”, saúde e cultura para os filhos. Oferecem a
afirma Iris Pacheco, da página do MST. quem os visita, sem preconceito, sob o
Os cinco dias foram de debate e precário teto das barracas onde se organi-
reflexão em torno do desafio organizativo zam, o fruto do trabalho dos assentamen-
do MST, o papel político dos assentamen- tos: alimentos saudáveis. E dizem o que
tos, a participação da mulher e dos jovens todos sabem mas viram o rosto: o agrone-
na luta, além do ato político em defesa da gócio envenena os campos do país” (Pedro
Reforma Agrária, através da marcha e de Tierra).
atividades culturais.

29
Institucional

Depois da luta e da pressão no dia da Ciranda Infantil Paulo Freire


marcha (12/02), a presidenta Dilma final-
A ciranda infantil Paulo Freire ou
mente decidiu ouvir as demandas do
Escola Itinerante Paulo Freire é o espaço
Movimento que apresentou seus proble-
constituído para as crianças do MST. É a
mas mais emergenciais, como o assenta-
forma que o movimento tem de reunir e
mento de 100 mil trabalhadores acampa-
promover atividades com as crianças –
dos à espera de terras para criar mais
Sem Terrinhas como são conhecidas – em
comunidades de trabalho e de vida.
congressos, cursos, marchas e reuniões.
Conseguiram o compromisso da Neste Congresso, a ciranda reuniu em
Presidenta de assentar, em 2014, 35 mil torno de mil sem-terrinhas, divididos por
trabalhadores, cifra significativa diante do faixas etárias, de 0 a 12 anos, com ativida-
que foi conseguido pelo MST nos últimos des de formação e diversão específicas
três anos do governo. para cada idade, sempre permeadas pelo
tema do congresso e os 30 anos do MST. A
ciranda contou com uma equipe de 200
educadores e educadoras que, desde
outubro de 2013, se preparavam para o
Congresso. A Ciranda fez sua abertura
oficial, no segundo dia, comemorando os
30 anos do MST e lançando o seu novo CD.

A mística do Congresso e do MST


A motivação para o debate de cada dia
eram iniciadas com a mística, cada manhã
organizada por uma região do país, come-
çando pela região sul e terminando com a
região centro-oeste, envolvendo em torno
de 1000 pessoas. Os movimentos sociais

30
Institucional

brasileiro”. Busca acumular


forças com outros setores da
sociedade brasileira para se
contrapor ao histórico auto-
ritarismo das oligarquias
rurais.
C o n f o r m e S a d e r, o
conceito de “popular”, do
MST, busca identificar a
ruptura com uma reforma
agrária clássica “que se dá
no marco da luta de resistên-
cia contra o avanço do mode-
lo de agricultura capitalista e
como forma de reinserir a
resgataram o sentido da mística e o trou-
Reforma Agrária na agenda de luta dos
xeram para a prática política. Como diz
trabalhadores”, e deixar de ser uma luta
Dom Marcelo Barros, “o MST não faz
menos institucional para fortalecer as
mística, ele é a mística”.
ocupações de latifúndios, de transnaciona-
Grandes nomes e militantes da cami- is, de perímetros irrigados e com a produ-
nhada do MST, como João Pedro Stedile, ção de alimentos para garantir a soberania
Ranulfo Peloso, Isabel Grein, orientaram alimentar do país.
os debates de cada dia, resgatando o
As consequências do capitalismo,
campo histórico do MST ao longo desses
tanto para os que vivem no campo quanto
30 anos e discutindo sobre os principais
na cidade, se agravam a cada dia. Por isso,
inimigos do campesinato: o agronegócio,
a identificação dos camponeses e campo-
as transnacionais e o latifúndio.
nesas de todo o mundo com a Reforma
O VI Congresso, atualiza a visão e as Agrária Popular, um projeto que distribua
propostas do MST, reconcebendo e ampli- terra, produza alimento saudável e que
ando o Programa Agrário para uma proporcione oportunidades para a juventu-
Reforma Agrária Popular. Mais do que uma de se manter no campo. A vida real tem
política distributivista de terras, propõe contradições e para resolvê-las é preciso
uma nova organização da propriedade organização, por isso, a luta de massa é
fundiária e a reorganização da produção central para o enfrentamento do capital.
no campo. Emir Sader, em texto publicado
A luta segue com a mobilização da
no site do MST no dia 17 de fevereiro de
classe trabalhadora para consolidar gran-
2014, sobre o VI Congresso, afirma que
des jornadas de lutas unificadas em torno
“O Programa de Reforma Agrária Popular
da Reforma Agrária Popular e de um proje-
não é um programa socialista”, mesmo
to popular para o Brasil.
que os objetivos estratégicos de sua luta
seguem tendo como horizonte o socialis-
mo. Hoje, o Movimento luta “por um novo
Por Lunéia Catiane de Souza e
projeto de país, que necessita ser constru-
ído com todas as forças populares, volta- Edival Korb
das para atender os interesses do povo
Fonte:
- Emir Sader: o MST nos seus 30 anos. http://www.mst.org.br/node/15733. Da Carta Maior.
- Congresso mostra a força e potencial da Reforma Agrária Popular. Disponível e: <http://www.mst.org.br/node/15753>.
Por Iris Pacheco, da Página do MST, Entrevista à Alexandre Conceição, da coordenação nacional do MST.

31
Institucional

Com quase meio século, a ASSESOAR


está olhando seus próximos anos

A origem da ASSESOAR está ligada a terra e a conquista de direitos aos trabalhado-


um contexto de lutas no sudoeste, quando res.
jovens agricultores buscavam, através da Assim, foram se constituindo propostas
organização, melhorar as condições da vida alternativas, em oposição ao modelo de
no campo. Foi nos anos 1950 e 1960, quando desenvolvimento capitalista que vinha sendo
o sudoeste do Paraná era dominado por implantado no campo brasileiro, acumuladas
companhias exploradoras de terras e dos historicamente pela proposta da Agro-
recursos naturais, como a madeira, que ecologia. Constituída e dirigida por agriculto-
jovens agricultores, organizados na JAC – res e agricultoras, a ASSESOAR, desempe-
Juventude Agrária Católica – com o apoio de nhou um papel fundamental na região. Nos
um grupo de Padres da Bélgica, em Fevereiro anos de 1980 e 1990, contribuiu para o surgi-
de 1966, fundaram a ASSESOAR. mento de organizações de agricultores na luta
Com o avanço do capitalismo, a pela terra, na luta em defesa dos atingidos por
ASSESOAR passa, de forma organizada, a barragens, no associativismo, no sindicalismo
ocupar espaços sociais e políticos na região, e no cooperativismo.
levantando bandeiras em favor da classe Ta m b é m , d e s t a c a - s e o p a p e l d a
trabalhadora do campo, como a luta pela ASSESOAR, em ações de formação e educa-

32
Institucional

ção popular, como as Escolas Comunitárias de análise do contexto sócio econômico, político
Agricultores (ECAS), o Curso Técnico em e ambiental atual e, a partir disso, definiu as
Agroecologia, a Formação Continuada de diretrizes e apontou o rumo a ser seguido na
Educadores, a Formação de Formadores, a elaboração do Plano 2015/2018. A equipe da
Formação de Dirigentes, a Pedagogia da ASSESOAR, com o apoio de Ligação e
Terra, entre outras. Organização - ELO (entidade de assessoria ao
O avanço do capitalismo, tem provoca- desenvolvimento de organizações) de
do grandes concentrações de terras e princi- Salvador/Bahia, elaborou uma proposta que
palmente da produção, provocando o êxodo está em estudo e negociação com as organi-
rural, redução de investimentos públicos na zações internacionais parceiras (Pão Para o
saúde, na educação, no transporte e princi- Mundo e CCFD).
palmente na segurança alimentar da popula- Ainda em construção, o Novo Plano
ção. Neste sentido, a classe trabalhadora aponta para os seguintes campos de ação: a
vem percebendo a necessidade de retomar a formação política, a educação do campo e a
luta e as mobilizações em prol da garantia agroecologia com ênfase no trabalho com a
destes direitos. juventude, na produção de sementes, no
Assim, com quase 50 anos de atuação fortalecimento das relações interinstituciona-
na região sudoeste do Paraná, a ASSESOAR is e na aproximação das lutas dos trabalhado-
está, desde o final de 2013, planejando seus res e trabalhadoras do campo e da cidade. O
próximos 4 anos – 2015 a 2018. Para isto, Centro de Educação Popular - CEP deverá
realizou, aproximadamente, 30 encontros cumprir papel estratégico nesse processo.
municipais com associadas/os e organiza-
ç õ e s p a r c e i ra s , u m s e m i n á r i o, u m a
Assembleia Geral e reuniões do conselho e Por André Duarte
equipe. Cerca de 300 pessoas contribuíram Andreia F. Vansetto Soares
nesse processo participativo que fez uma

Assenbleia Geral Ordinária da Assesoar 11 de fevereiro de 2014

33
Publicações da Assesoar

O livro “Formação política e educação popular: os formadores, o


planejamento e a organização de base”, é resultado do curso de formação de
formadores realizado pelo Centro de Educação Popular da Assesoar, em articulação
política com o Fórum Regional de Organizações e Movimentos Populares do Sudoeste do
Paraná, em 2010 e 2011. O escrito registra, organiza e partilha os estudos, debates e
encaminhamentos realizados com relação à Sociedade Capitalista e às Organizações
populares; à Democracia; ao Planejamento e seus instrumentos na luta popular e aos
avanços e desafios da construção do conhecimento na perspectiva da Educação Popular.

34
Publicações da Assesoar

A Coleção Tecnologias Ecológicas é um subsídio para o manejo e a implantação


de tecnologias ecológicas já testadas e consideradas eficazes, como forma de melhorar a
renda das famílias, diversificar a produção local de alimentos, contribuir para a redução
dos impactos ambientais e, ao mesmo tempo, influenciar na adoção de políticas públicas
voltadas para a solução desses problemas.
Estas publicações surgem por meio do Projeto Tecnologias Ecológicas, que é fruto de
uma parceria entre a ASSESOAR, as comunidades, as organizações da Agricultura
Familiar e Camponesa locais, as Administrações Municipais, as escolas, as universidades
públicas e a Fundação Interamericana – IAF.

35
assesoar@assesoar.org.br - http://www.assesoar.org.br

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