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FICHAMENTO: FAORO, Raymundo. Os Donos do Poder.

Formação do Patronato
Político Brasileiro.

1 – A Administração e o Cargo Público.

“O patrimônio do soberano se converte, gradativamente, no Estado, gerido por um


estamento, cada vez mais burocrático.” (p. 171)

“O funcionário é a sombra do rei, e o rei tudo pode: o Estado pré-liberal não admite a
fortaleza dos direitos individuais, armados contra o despotismo e o arbítrio.” (p. 172)

“A função publica congrega, reúne e domina a economia. Ela é o ‘instrumento regalista


da classe dominante’, formado um ‘ patriciado administrativo’.” (p. 174)

“A unidade do governo, traduzida e realizada numa camada social, será a rocha sobre a
qual se erguerá a unidade nacional, em luta contra a vocação regional e autonomista das
forças locais. No fundo do drama não estão apenas os funcionários leais ao rei pela
hierarquia, senão os funcionários que não sabem que atuam sob a vontade do rei, que o
doma, disciplina e lhes infunde o cunho de colaboradores submissos.” (p. 175)

“A via que atrai todas as classes e as mergulha no estamento é o cargo publico,


instrumento de amalgama e controle das conquistas por parte do soberano.” (p. 176)

2 – O Espectro Politico e Administrativo da Metrópole e da Colônia.

“Os interesses comerciais e fiscais inspiram a organização dos estabelecimentos


formados ao lado da atividade diretamente desenvolvida pelo Estado, sistema próximo
das modernas autarquias.” (p. 180)

“este efeito inesperado do colegialismo: ao limitar, em proveito de uma categoria social,


a autoridade real e ministerial, abre uma faixa de governo aos particulares a aos
distantes e abandonados oficiais da Coroa. Daí não se originou, todavia, um campo de
self-government local, ou do exercício de liberdades municipais. Cria-se um governo, ao
contrario, sem lei e sem obediência, à margem do controle, inculcando ao setor publico
a discrição, a violência, o desrespeito ao direito. Privatismo e arbítrio se confundem
numa conduta de burla à autoridade perdida esta na ineficiência.” (p. 182)

“O quadro administrativo da colônia se completa com a presença de quatro figuras, que


acentuam a reforçam a autoridade metropolitana: o juiz, o cobrador de tributos, o militar
e o padre.” (p. 187)

“Os magistrados, na grande maioria, são leigos, com cargos herdados ou obtidos no
enxoval de noiva.” (p. 188)

“O ouro, o diamante, o tabaco, o açúcar suscitam, por sua vez, outros organismos, todos
zelosos dos quintos, monopólios, terças partes, emolumentos, contratos, tributos, em
interferência direta, miúda, desconfiada sobre a economia. Daí irradia uma multidão de
funcionários, atraindo os reinóis ociosos: deputados das juntas, intendentes, tesoureiros,
oficiais, escrivães, meirinhos. O leite ordenhado da colônia chegava diluído e aguado
aos reais beiços, com provável déficit antes de explosão açucareira e aurifica.” (p. 188-
189)

“A administração, a justiça, o controle fazendário assentam, em ultima análise, sobre e


paz interna e a defesa, voltada esta contra o indígena e as agressões externas. A
instituição das forças armadas na colônia revela o modo de integrar o povoador nos
desígnios e nas atividades da coroa. [...] A organização militar precede à descoberta,
estrutura-se com a monarquia, no curso dos séculos e funde-se com a historia da
colônia. Ele terá um papel de defesa e um papel social, aglutinando populações e
elevando os seus elementos na escala de prestigio. A terra se consolida nas mãos do
português por via da força armada – é a conquista.” (p. 189)

“A nova estrutura militar, ao profissionalizar o soldado, libera o rei da ultima


dependência à nobreza, transformando o exercito em organização permanente, não mais
confundido com as mesnadas dos ricos homens.” (p. 191)

“A maior despesa publica da colônia, nessa época, flui dos ‘oficiais de guerra’.”(p. 191)

“O serviço militar, como profissão e atividade permanente, sem as patentes superiores,


não afidalgavam nem era meio de vida conveniente. O soldo e a farda sem galões de
nada valiam: refugio de maus elementos, mulatos e camponeses pobres, desvalidos e
trabalhadores urbanos. O olho guloso do comerciante fixa-se em outro ponto: na patente
superior, que eleva, dignifica e enobrece, reservada ao comerciante, ao mulato cobiçoso
de grandezas e ao áulico do governador.” (p. 196)

“A organização militar constitui a espinha dorsal da colônia, elemento de ordem e


disciplina, auxiliar na garantia de cobrança de tributos e dos privilégios reais.” (p.
196)

“As bulas reconhecem e aprovam os primeiros passos da conquista da monarquia


portuguesa, consagrada com a bula Inter Coetera (1456), a base do padroado, entregues
as terras novas à Ordem de Cristo. [...] tal maneira estava a administração eclesiástica
do Brasil na cúpula colonial.” (p. 197)

“A igreja exercia atribuições de ordem administrativa da maior relevância: os registros


de nascimento, o casamento com todas suas vicissitudes jurídicas, e a morte estavam a
seu cargo. A assistência social da colônia não encontrava outro remédio senão a igreja,
entregue ao seu cuidado e ensino”(p. 198)

“O rei dotava as corporações religiosas, para o custeio de suas obras, com terras e
escravos, além de dedicar-lhes rendas especiais. O pagamento aos padres sofria as
mesmas dificuldades, retardamentos e incertezas que atingiam os demais funcionários
civis e militares.” (p. 198)

“A organização politica portuguesa nunca assentou, como a espanhola, sobre a Igreja,


Igreja, contudo limitada pelo padroado. [...] O que no máximo conseguiram [a Igreja],
no Brasil foi, no máximo, sobretudo pelo esforço dos jesuítas, a conservação da moldura
religiosa da sociedade.” (p. 198-199)

“O colono queria o índio convertido em mão-de-obra, em escravo, escravos com


sentimentos humildes do bom cristão, modelado pelo missionário. A este designo
obedecia o franciscano, menos rígido e menos intransigente que o jesuíta, num sistema
de hibridismo cultural e ascendência do branco.” (p. 199)

“os colonos, entretanto, não queriam cristãos, mas escravos [...]. ” (p. 200)

3 – As classes: Transformações e Conflitos

“A ascensão social de desvia, no topo da pirâmide, num processo desorientador, com o


ingresso no estamento. A ambição do rico comerciante, do opulento proprietário não
será de possuir mais bens, senão o afidalgamento, com o engaste na camada do estado-
mor de domínio politico.” (p. 203)

“Na classe proprietária predomina a tendência à estabilidade social, enquanto a classe


lucrativa se beneficia das mudanças sociais. Pelo estilo de vida, a classe proprietária e
certos setores da classe média são as que mais se aproximam do estamento”. (p. 204)

“O viço das casas senhoriais, a mesa esbanjadora, o luxo farto conduz a muitos enganos.
Estas exterioridades custavam, na verdade, muito, assentadas sobre o escravo e o
investimento do engenho.” (p. 206)

“No começo do século XVII, a presença do comerciante ocupa o centro do palco, ferido
embora pelo desprezo do fidalgo, o que o leva a afidalgar-se para conquistar posição
social, atacado, ainda, pela concepção velhamente portuguesa e europeia de considera-
lo o parasita por excelência, o ocioso e improdutivo sanguessuga do trabalho alheio.” (p.
207)

“O comerciante – a burguesia comercial – libará o mel do açúcar, com os proventos da


exportação e reexportação, ficando o industrial e o lavrador com as sobras e o ônus.” (p.
211)

“A monocultura, apesar dos males que lhe aponto Gilberto Freyre, sobre tudo na dieta
das populações, foi o fator maior da integração das capitanias, com aquisição distante de
alimentos, trocados por produtos exportáveis, numa sociedade quase sem moeda,
integração servida também pelo trafico de escravos de costa a costa, ou da costa para o
interior.” (p. 211)

“A imagem do Brasil de Gandavo (1570) está morta: o português ocioso com meia
dúzia de escravos, um para pescar e um para caçar e os outros nas roças de
mantimentos. Em seu lugar, a devastação mercantil e o desejo de retornar ao reino, para
exibir as glorias da opulência.” (p. 212)

“O funcionalismo, já enorme em número, absorve essa leva de desprotegidos


[brancos portugueses e brasileiros pobres] com cargos civis e militares – ‘inúmeros
inspetores sem objeto a inspecionar, um sem-fim de coronéis sem regimentos para
comandar, juízes para dirigir cada ramo da administração, por menor que seja,
serviços que podem ser feito por duas ou três pessoas. Os vencimentos
aumentaram, o povo está oprimido e o Estado não acolhe beneficio algum.’ A
velha ordem administrativa portuguesa serve, na colônia, ao aproveitamento do
branco pobre, do mulato rico, poupando um problema social, com a plebeização do
branco alfabetizado, quase o letrado do tempo.” (p. 217)

“O negro, para se qualificar, não lhe bastaria a liberdade, senão a posse de outro
escravo.” (p. 217)

4 – A Apropriação de Rendas: O pacto Colonial, Monopólios, Privilégios e


Tributos.

“A economia, por uma ou outra forma, obedece à regência material do soberano e seu
estamento, em intensidade que ultrapassa os modos modernos de intervenção do Estado
ou as interferências limitadas da concepção liberal. Tudo parte das origens: o rei é
senhor das terras, das minas e do comercio, no círculo patrimonialista em que se
consolidou e se expandiu o reino. O pacto colonial não é mais do que a expressão global
do tipo de Estado dominante em Portugal. [...] A coroa delega a exploração do negocio
aos contratadores, que o gerem por conta do poder público. O preço será fixado pelo
senhor do comercio, bem como o quantitativo da utilização, cumprindo ao contratador
pagar o preço e redistribuir o produto na Europa, geralmente em conexão com os
mercadores internacionais” (p. 221)

As empresas de comércios, do Brasil colônia, ao contrario das inglesas e holandesas,


eram de “iniciativa oficial e pelo preponderante papel do Estado. Outra modalidade de
comando material, efetivo, intimo da economia constituíam as concessão [...] das quais
a de mineração era a mais importante, modalidade que se dilui [...].”

“Os três tipos de controle da economia – o monopólio, as companhias e as concessões


(típicas e atípicas) – se integram no domínio do comercio e da metrópole, o pacto
colonial, comercio reservado, xenofobicamente, aos portugueses [...]” (p. 221)

“O desenvolvimento da metrópole e das colônias não entra no plano de governo: o


cliente será o estamento, a alta nobreza e a administração, com aplicações só
admissíveis no fomento do comercio de trânsito.” (p. 223)

“A burguesia, fechado o caminho da revolução industrial, no país, se converte em


apêndice da nobreza, apêndice que sua rendimentos e se assenhoreia de privilégios” (p.
234)

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