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C A PÍTU LO

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COVID-19 e a
inclusão na
educação

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R E L ATÓ R I O D E M O N I TO R A M E N TO G LO B A L D A E D U C A Ç Ã O 2 0 2 0

C APÍTULO 8: COVID-19 E A INCLUSÃO NA EDUC AÇ ÃO


Os países da América Latina e do Caribe responderam à crise educacional do COVID-19.
„ A região tem o maior alcance potencial global da população estudantil no ensino a distância (91%), bem acima da média global (69%). O
alcance potencial foi maior por meio da televisão (86%) e do rádio (50%).

„ Dos 26 países, 7 tinham plataformas de aprendizagem, 22 forneciam conteúdo digital, 13 usavam conteúdo físico e redes sociais e 20
ofereciam educação por meio de rádio ou televisão.

„ O Centro de e-Learning CXC do Conselho Caribenho de Exames oferece recursos adaptados a diferentes estilos de aprendizagem dos
alunos, juntamente com tecnologia para a criação de salas de aula virtuais.

„ Os países têm usado ferramentas de comunicação, como plataformas de bate-papo, serviços de mensagens de texto e mídia social. El
Salvador e Honduras fizeram curadoria de conteúdo educacional no YouTube.

„ O México, onde a Telesecundaria já alcançava 21% da população da educação secundária, criou a plataforma Aprende en casa para oferecer
ensino à distância por meio da televisão. A República Bolivariana da Venezuela criou Cada familia una escuela, um programa de transmissão
de conteúdo educacional em duas emissoras públicas de televisão.

„ Em Belize, várias estações de rádio transmitem conteúdo educacional. A Guiana tem três tipos de programa de rádio, incluindo instrução
interativa em matemática para a 1ª a 3ª série.

„ O ministério da educação do Peru instruiu as autoridades governamentais locais a entregar livros didáticos a escolas, residências e outros
pontos de distribuição.

O alcance potencial dessas medidas não se traduz necessariamente em alcance real.


„ Entre os 25% dos domicílios rurais mais pobres da Nicarágua, um em cada dois não dispunha de eletricidade.

„ Na Guatemala, apenas 13% dos 20% dos domicílios mais pobres possuíam uma televisão em 2014/5.

„ Apenas 52% dos domicílios da região tinham internet e 45% tinham computador em 2017.

„ Pelo menos 20% dos alunos de 15 anos na Argentina, Brasil e México não tinham um lugar tranquilo para estudar em casa. Uma pesquisa
por telefone com jovens de 14 a 18 anos no Equador mostrou que aqueles no quartil mais pobre tinham maior probabilidade do que seus
pares mais ricos de passar mais tempo trabalhando ou realizando tarefas domésticas do que estudando..

Os governos têm feito esforços para direcionar as intervenções aos alunos desfavorecidos.
„ Alguns países priorizaram o acesso à Internet a preços módicos. No Uruguai, o governo fez parceria com uma empresa de
telecomunicações para fornecer a todos os alunos acesso ao conteúdo de aprendizagem sem cobrar pelo uso de dados.

„ Alguns países tentaram garantir acesso universal aos dispositivos. Nas Ilhas Cayman, uma parceria entre o governo e uma organização sem
fins lucrativos apoiou o fornecimento de notebooks a todos os alunos de escolas públicas.

„ No Chile, o reembolso por uma gama mais ampla de bens e serviços passou a ser permitido no âmbito de um programa público de
proteção social para ajudar os alunos com deficiência a continuar sua educação à distância.

„ No Suriname, um programa apoiou as comunidades indígenas proporcionando acesso a itens essenciais, água, serviços de saneamento e
higiene e apoio psicossocial e educacional.

„ Alguns países ajustaram o currículo. Para garantir uma avaliação do ensino e aprendizagem alinhada com as condições da pandemia,
o programa Aprendo en casa na Guatemala desenvolveu um portfólio de materiais por meio do qual o aprendizado pode ser avaliado
enquanto vigoram as medidas de distanciamento social.

„ Em São Paulo, Brasil, o programa Merenda em casa do Departamento de Educação ofereceu uma transferência de dinheiro para as famílias
mais pobres para garantir a alimentação dos alunos..

Os professores também precisam aprender a usar a tecnologia.


„ Cerca de 63% dos professores de educação secundária chilenos, 69% mexicanos e 71% colombianos relataram permitir que os alunos
usassem com frequência a tecnologia da informação e comunicação para projetos ou trabalhos de classe antes da pandemia.

„ Ainda assim, 88% dos professores no Brasil relataram que nunca haviam ensinado remotamente antes da pandemia.

Os alunos e pais também precisam de apoio adicional durante a pandemia.


„ Os alunos precisam receber feedback. Na Argentina, 81% dos alunos relataram receber tarefas de casa, 77% relataram ter contato com
professores e 69% relataram receber feedback dos professores.

„ Muitos pais precisam equilibrar o apoio em casa com outras responsabilidades. No Paraguai, os pais disseram que o maior impacto da
pandemia sobre eles foi na educação. Cerca de 32% acreditam que, do ponto de vista da educação, 2020 é um ano perdido.

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O enorme impacto da COVID-19 na educação será duradouro.................................111


Grandes esforços foram feitos para manter a continuidade
da aprendizagem............................................................................................................................. 112
Os esforços para promover a continuidade da aprendizagem podem
deixar os alunos em desvantagem para trás..................................................................... 113
Os países têm feito esforços para apoiar os alunos em risco...................................114
Os professores precisam de mais apoio para manter a continuidade
da aprendizagem.............................................................................................................................116
Alunos e pais precisam de apoio adicional durante a pandemia.............................. 117
Conclusão............................................................................................................................................118

No decorrer de algumas semanas no início de 2020, a entanto, eles também tiveram que lidar com o princípio
pandemia COVID-19 sobrecarregou muitos sistemas de ‘não causar danos’: a exigência de que nenhum plano
nacionais de saúde. Em seus esforços para conter a ou programa seja implementado se houver o risco de
disseminação da doença, governos em todo o mundo prejudicar ativamente alguém. E mesmo enquanto
impuseram confinamentos e reduziram a atividade os formuladores de políticas educacionais continuam
econômica, ameaçando bilhões de meios de subsistência. tentando encontrar oportunidades na crise, tornou-se
Uma medida importante para limitar o risco de infecção evidente que muitas das soluções que eles tentaram
foi o fechamento de escolas e universidades. No pico implementar correm o risco de deixar muitas crianças e
do período de fechamento em abril de 2020, 91% da jovens para trás. Junto com o resto do mundo, os países
população estudantil global foi afetada em 194 países. da América Latina e do Caribe buscaram ativamente
Vários países da América Latina e do Caribe, incluindo soluções para os desafios da equidade e da inclusão
Costa Rica, El Salvador, Paraguai, Peru e a República durante esse período difícil.
Bolivariana da Venezuela, decidiram manter as escolas
fechadas até o final de 2020. A Nicarágua foi o único O ENORME IMPACTO DA COVID-19 NA
país da região, e um dos poucos no mundo, a manter as
EDUCAÇÃO SERÁ DURADOURO
escolas abertas durante a pandemia (UNESCO, 2020).
A COVID-19 precipitou assim uma crise educacional, A crise financeira e de saúde terá três tipos de
alimentada pelas profundas e múltiplas desigualdades consequências imediatas e de longo prazo para a inclusão
discutidas neste relatório. Embora essas desigualdades na educação: consequências da perda de aprendizagem,
existam há muito tempo, os confinamentos e o da recessão atual e futura e da interrupção dos
fechamento de escolas as destacaram repentinamente serviços de apoio.
em escala global.
Os sistemas de educação responderam à pandemia
Durante a pandemia, milhões de pessoas tiveram que empregando soluções de ensino a distância, que são
tomar decisões difíceis: indivíduos tiveram que decidir se substitutos mais ou menos imperfeitos do ensino em sala
respeitavam ou desprezavam as restrições de quarentena, de aula. No Chile, apenas 9% dos professores acreditam
profissionais de saúde tiveram que escolher entre as que seus alunos conseguem estudar de forma autônoma.
necessidades conflitantes dos pacientes e as autoridades A principal estratégia pedagógica usada pelos professores
tiveram que decidir como alocar apoio econômico. A chilenos durante a pandemia, entretanto, consistia em
gestão da educação também apresenta dilemas morais. enviar trabalhos de casa que os alunos deveriam fazer por
Ao considerar a melhor forma de lidar com a interrupção conta própria. Apenas 49% dos professores sentiram que
da aprendizagem, os formuladores de políticas contaram tiveram sucesso em fazer seus alunos aprenderem desta
com opções que não existiam anteriormente, pois a forma (Mirada docente, 2020).
tecnologia tornou a educação a distância mais viável. No

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Uma pesquisa nos Estados Unidos examinando a “queda A educação infantil e os programas setoriais associados
do verão”, a perda de aprendizagem durante as longas a ela também foram gravemente afetados. Globalmente,
férias escolares entre as séries, revelou que os alunos o fechamento de creches e centros de educação
perderam quase 20% dos ganhos do ano letivo em leitura infantil resultou em pelo menos 40 milhões de crianças
e 27% em habilidades matemáticas entre a 2ª e a 3ª série, privadas de educação infantil (UNICEF, 2020). Na
enquanto as perdas correspondentes entre as séries 7 e República Dominicana, a implementação do programa
8 foram de 36% e 50% (Kuhfeld, 2018; Kuhfeld e Tarasawa, abrangente de desenvolvimento da primeira infância,
2020). Uma simulação com base nos dados da pesquisa Quisqueya empieza contigo (a Pátria cresce com você), foi
PISA para o Desenvolvimento, que incluiu Equador, interrompida, e 28% de todos os trabalhadores do setor
Guatemala, Honduras, Panamá e Paraguai, sugeriu formal tiveram seus contratos de trabalho suspensos,
que, a menos que fosse oferecida uma recuperação, apesar da introdução de várias medidas de apoio
o fechamento das escolas por três meses na 3ª série (Pumarol, 2020).
resultaria na perda de aprendizagem correspondente a
um ano inteiro até a 10ª série, devido às consequências Terceiro, o fechamento das escolas interrompeu os
para os alunos de terem ficado para trás tão cedo na mecanismos de apoio que beneficiam muitos alunos
escola (Kaffenberger, 2020). Essas lacunas podem ser desfavorecidos. As escolas desempenham muitas funções
maiores para alunos desfavorecidos que têm menos além da educação. Elas fornecem um porto seguro e
recursos em casa (Cooper et al., 1996), o que aumentaria uma arena social, bem como um ponto de distribuição de
as divisões socioeconômicas. bens e serviços vitais. As principais funções da escola que
ajudam a formar uma comunidade educacional, incluindo
O Fundo Monetário Internacional previu que o produto relações sociais, amizades, socialização e um sentimento
interno bruto (PIB) da América Latina e do Caribe sofrerá de pertencimento, são perdidas durante a educação
uma contração de 9,3% em 2020 (FMI, 2020). Nessa a distância. O isolamento social associado à crise da
recessão severa, os governos provavelmente responderão COVID-19 tem efeitos psicológicos negativos nas crianças
à perda de receita realocando fundos orçamentários da (Brooks et al, 2020). Há relatos de aumento da violência
educação para atender à demanda urgente em outros contra as mulheres sob o regime de confinamento, o que
setores. As famílias, especialmente aquelas próximas ou terá um impacto negativo nas crianças e adolescentes das
abaixo da linha da pobreza, também precisarão tomar famílias afetadas, podendo causar depressão, ansiedade e
decisões difíceis sobre a alocação de recursos, o que pode consequências no desenvolvimento de longo prazo (ONU
levá-las a retirar as crianças da escola. O Banco Mundial Mulheres, 2020).
estimou que 6,8 milhões de crianças e adolescentes em
idade escolar do ensino fundamental e médio estão em GRANDES ESFORÇOS FORAM FEITOS
risco de evasão escolar globalmente (Azevedo et al., 2020).
PARA MANTER A CONTINUIDADE DA
O desligamento da escola e a atração do mercado de
trabalho podem ser mais pronunciados no ensino médio: APRENDIZAGEM
A UNESCO estimou que 2,3% dos alunos do ensino médio Os países da América Latina e do Caribe têm sido
na América Latina e no Caribe podem não voltar à escola proativos em suas tentativas de garantir a continuidade
(UNESCO, 2020f). da aprendizagem e direcionar esforços para os alunos
com maior probabilidade de serem adversamente
A situação econômica terá muitas repercussões. Por um afetados pela pandemia. Embora a região tenha uma
lado, os pequenos ganhos obtidos na garantia do acesso vasta experiência na transmissão de aulas por rádio e
à educação para crianças refugiadas podem ser revertidos televisão, nunca teve que lidar com uma interrupção da
(ACNUR, 2020). Dois terços dos 3 milhões de migrantes aprendizagem tão generalizada (Cobo et al., 2020). No
e refugiados venezuelanos na Colômbia, Equador e Peru entanto, a região conseguiu o maior alcance global da
sofrerão um agravamento de sua insegurança alimentar população estudantil potencial em educação a distância
em 2020 devido à perda de renda e oportunidades de (91%), bem acima da média mundial (69%), com base
trabalho (PMA, 2020). Embora os ministérios da educação em um inquérito da UNESCO-UNICEF-Banco Mundial
da região tenham tentado facilitar o acesso à educação a sobre políticas de apoio ao ensino a distância por meio
distância para alunos desfavorecidos por meio de soluções digital, rádio e televisão, e com base na disponibilidade
de rádio e televisão, bem como de Internet, os alunos de bens domésticos que permitem a recepção de
venezuelanos enfrentam grandes barreiras para continuar instruções digitais ou por radiodifusão. De todas as
sua aprendizagem devido às suas condições de vida e à regiões, a América Latina e o Caribe teve o maior alcance
falta de acesso à tecnologia e materiais de aprendizagem potencial por meio da televisão (86%) e do rádio (50%)
(UNESCO, 2020d). (UNICEF, 2020a). Segundo o Banco Interamericano de
Desenvolvimento, dos 26 países da região, 7 tinham

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plataformas de aprendizagem, 22 forneciam conteúdo por meio da televisão nacional. Antes da pandemia, o
digital, 13 faziam uso de conteúdo físico e redes sociais sistema de educação a distância Telesecundaria já fornecia
e 20 ofereciam educação por meio de programas de conteúdo de aprendizagem durante o ano todo para
rádio ou televisão. A República Dominicana e a Jamaica escolas secundárias em áreas rurais por meio da televisão
forneceram aulas para todos os níveis por meio de todos por satélite. Em 2017/18, atingiu 1,4 milhão de alunos,
os quatro mecanismos (Álvarez Marinelli et al., 2020). ou 21% da população total da educação secundária.
Como resposta ao fechamento das escolas durante
A plataforma Aprendo en linea (Aprendo online) do Chile a pandemia, o governo do México criou a plataforma
oferece conteúdo em todos os níveis de ensino e fornece Aprende en casa para fornecer ensino a distância com
recursos digitais, incluindo software que permite o acesso base em currículos nacionais por meio de canais nacionais
de alunos com deficiência visual e auditiva (Ministério de televisão, rádio e digitais (Ripani e Zucchetti, 2020;
da Educação do Chile, 2020b). A Colômbia tem duas UNICEF, 2020b). A República Bolivariana da Venezuela
plataformas de ensino a distância: Colômbia aprende, criou o programa de televisão Cada familia una escuela,
desenvolvido antes da pandemia, e Aprender digital, transmitindo conteúdos educativos em duas estações
contenidos para todos (Aprendizagem digital, conteúdos públicas (VTE, 2020).
para todos), que o Ministério da Educação Nacional
estabeleceu para apoiar a educação a distância durante O uso do rádio na região ajudou a expandir o acesso
a pandemia. Eles disponibilizam atividades fáceis de à educação para os mais marginalizados. Em Belize,
usar, planos de aula e recursos multimídia em formatos várias estações de rádio têm transmitido conteúdos
de áudio, vídeo e texto abrangendo todo o currículo para permitir que as crianças continuem seus estudos
(Ministério da Educação Nacional da Colômbia, 2020a). O (Ministério da Educação de Belize, 2020). A Guiana
Conselho Caribenho de Exames facilitou a continuidade tem três tipos de programas de rádio, um dos quais se
da aprendizagem por meio da plataforma CXC e-Learning concentra em ensino interativo de matemática para as
Hub, que fornece recursos adaptados a uma variedade séries 1–3 (Ministério da Educação da Guiana, 2020a),
de estilos de aprendizagem dos alunos e oferece aos embora nos últimos anos pesquisas e uma comissão
professores tecnologia para criar salas de aula virtuais de inquérito tenham levantado dúvidas quanto à sua
para que possam interagir com os alunos em tempo real eficácia (Elliott e Lashley, 2017; Khatoon, 2017). No Peru,
(Cobo et al., 2020). mais de 335 estações de rádio transmitem o programa
Aprendo en casa para oferecer oportunidades de
Os países também usaram ferramentas de comunicação aprendizagem para estudantes em áreas rurais e remotas
amplamente disponíveis, incluindo plataformas de bate- ou de famílias carentes (UNESCO, 2020). A rede Radio
papo como WhatsApp, serviços de mensagens de texto Fe y Alegría é muito ativa na região, e desempenhou
e sites de mídia social, como mecanismos alternativos um papel fundamental para garantir a continuidade
para oferecer educação. Brasil, El Salvador e Honduras da aprendizagem, transmitindo conteúdo educacional
fizeram curadoria de conteúdo educacional no YouTube na República Bolivariana da Venezuela (Radio Fe y
por meio dos canais Futura, Aprendamos en casa e Alegría, 2020).
Portal Educativo, respectivamente. Em El Salvador, foi
estabelecido um centro de contato nacional, que pais Alguns países tentaram entregar materiais educacionais
e alunos podem acessar por e-mail e WhatsApp, para diretamente nas casas dos alunos. No Brasil, a Secretaria
facilitar a aprendizagem para pais e alunos (Cobo et al., da Educação do Estado de São Paulo desenvolveu
2020). A Guiana tem oferecido aprendizagem contínua kits contendo livros didáticos, materiais de leitura
por meio de plataformas de mídia social (Ministério da complementar e orientações para pais e cuidadores sobre
Educação da Guiana, 2020). saúde e educação. A polícia local ajudou a levar os kits
para as casas dos alunos (Dellagnelo e Reimers, 2020).
Serviços de radiodifusão têm sido usados para alcançar O Ministério da Educação do Peru instruiu as autoridades
áreas rurais e residências sem internet. O programa Profe locais a coordenar a entrega de livros didáticos em
en tu casa (Professor em sua casa) da Colômbia transmite escolas, residências ou outros pontos de distribuição
conteúdo educacional em duas estações de televisão (Ministério da Educação do Peru, 2020).
públicas, bem como na rede nacional de rádio. Em maio
de 2020, um programa adicional, Mi señal (Meu sinal), Os governos forneceram diretrizes para apoiar esses
foi exibido em três blocos: de manhã cedo para crianças esforços. A Costa Rica emitiu diretrizes sobre educação
menores de 9 anos, meio-dia para crianças de 8 a 12 anos a distância para quatro tipos de alunos, de acordo com a
e à tarde para crianças de 13 a 17 anos (Ministério da disponibilidade de dispositivos com acesso à Internet e
Educação Nacional da Colômbia, 2020a). O México tem conectividade adequada na casa do aluno (Ministério da
uma longa história de prestação de serviços educacionais Educação da Costa Rica, 2020). O Equador desenvolveu

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diretrizes para educadores para garantir a aprendizagem pobre eram mais propensos do que seus pares mais
ininterrupta e ajudar a desenvolver a capacidade dos ricos a passar mais tempo no trabalho ou nas tarefas
professores para a atuação remota (Ministério da domésticas do que na educação. Enquanto meninos e
Educação do Equador, 2020). El Salvador publicou meninas tinham igual probabilidade de continuar sua
diretrizes para professores, alunos e pais para ajudar a educação pela manhã, as meninas eram mais propensas
garantir a continuidade da aprendizagem e estabeleceu a ter responsabilidades de cuidar de crianças e realizar
um centro de contato para oferecer suporte (Ministério da tarefas domésticas à tarde, enquanto os meninos se
Educação de El Salvador, 2020a). envolviam em atividades de lazer (Asanov et al., 2020).

OS ESFORÇOS PARA PROMOVER A Os alunos com deficiência arcam com uma parte
desproporcional das consequências da pandemia da
CONTINUIDADE DA APRENDIZAGEM
COVID-19. Muitas plataformas de aprendizagem e muitos
PODEM DEIXAR OS ALUNOS EM conteúdos digitais não são acessíveis a alunos cegos
DESVANTAGEM PARA TRÁS ou surdos, mesmo aqueles com acesso a tecnologia
assistiva; por exemplo, alunos cegos têm dificuldade
Entretanto, o amplo alcance potencial dessas políticas com informações compartilhadas em imagens que seu
ambiciosas não se traduz necessariamente em alcance software não consegue ler, bem como com mudanças
real. Para começar, entre os 25% de domicílios rurais mais frequentes de plataformas online (IDA, 2020). Crianças
pobres, um em cada dois não tinha acesso à eletricidade com dificuldades leves de aprendizagem, como transtorno
na Nicarágua e um em cada três no Estado Plurinacional de déficit de atenção e hiperatividade, podem ter
da Bolívia e Honduras (Jimenez, 2016). Na Guatemala, problemas para trabalhar autonomamente em um
apenas 13% dos 20% de domicílios mais pobres possuíam computador. A perda da rotina diária que as escolas
uma televisão em 2014-15 (Programa DHS, 2020). Em oferecem adiciona uma dificuldade significativa para
2017, apenas 52% dos domicílios da região tinham acesso alunos que são sensíveis a mudanças, como aqueles
à internet e 45% a um computador (CEPAL, 2020). Entre com transtornos do espectro do autismo. O apoio
os alunos de 15 anos dos 25% de domicílios mais pobres,
menos de um em cada cinco tinha acesso à internet e a
um computador ou a pelo menos dois telefones celulares FIG U RA 8.1 :
(Figura 8.1). Os jovens de 15 anos mais pobres têm muito menos
probabilidade de ter acesso aos meios para acompanhar as
aulas online
Problemas de conectividade em áreas rurais significam
Porcentagem de alunos de 15 anos que pertencem aos 25%
que os povos indígenas e a educação intercultural foram
de domicílios mais pobres, com acesso a ferramentas de
afetados de forma desproporcional (UNESCO, 2020). aprendizagem online, 2018
No México, uma em cada cinco crianças indígenas de
3 a 17 anos não tinha eletricidade, televisão ou acesso 100
à Internet em casa em 2018 (Valencia López, 2020).
Mesmo onde há conexões de Internet disponíveis, muitas
vezes a capacidade não é suficiente para downloads de 80
Sem internet/computador ou
dados ou chamadas de vídeo. A educação infantil foi pelo menos dois telefones celulares
particularmente afetada. No Brasil, 18% dos professores
relataram não trabalhar com crianças e 51% disseram 60
que poucas crianças participavam das atividades (Nova
Escola, 2020).
%

40
Outros fatores que podem afetar as oportunidades de
aprendizagem dos alunos desfavorecidos incluem não
poder contar com o apoio dos pais e responsáveis, que 20
podem ter pouca ou nenhuma educação. Os alunos
Com internet/computador ou pelo
desfavorecidos também têm menos probabilidade menos dois telefones celulares
de ter um ambiente doméstico que possa apoiar a 0
aprendizagem. Pelo menos 1 em cada 5 estudantes de
Peru

México

Colômbia

Costa Rica

Brasil

Uruguai

Argentina

Chile

15 anos na Argentina, Brasil e México não tinha um lugar


tranquilo para estudar em casa (Reimers e Schleicher,
2020). Uma pesquisa por telefone com jovens de 14 a Fonte: Buchbinder (2020), com base em dados do PISA de 2018
18 anos no Equador mostrou que aqueles no quartil mais

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frequentemente fornecido nas escolas foi reduzido ou permite a alunos de escolas multisseriadas continuar
mesmo suspenso para reduzir o risco de infecção. aprendendo em casa. O projeto também forneceu
telefones celulares e tablets, bem como conteúdo
OS PAÍSES TÊM FEITO ESFORÇOS PARA educacional, para professores, alunos e pais (referência).

APOIAR OS ALUNOS EM RISCO


Chile atiende (Chile atende), um programa governamental
Apenas 9% dos países latino-americanos e caribenhos, multissetorial, adicionou vários bens e serviços à
bem abaixo da média global de 31%, relataram que não lista de despesas elegíveis para ajudar os alunos com
fizeram esforços durante a pandemia da COVID-19 para deficiência a continuar acessando o ensino superior a
direcionar intervenções a alunos desfavorecidos, como distância, incluindo tablets, software de reconhecimento
alunos com deficiência, alunos em áreas remotas, alunos de voz, cadeiras de rodas elétricas, estantes de leitura,
pobres e de comunidades indígenas (Figura 8.2). calculadoras falantes, scanners de bolso, assistentes
pessoais, transcrição de informações e intérpretes de
Alguns governos priorizaram o acesso à Internet a um linguagem de sinais (Chile Atiende, 2020). O Equador
preço baixo, muitas vezes por meio de parcerias com recomendou que os professores apoiassem a educação
reguladores e provedores de telecomunicações. Na de crianças com deficiência que estavam isoladas em casa
Argentina, por meio do regulador de telecomunicações (EACDH, 2020).
ENACOM, as empresas de telefonia suspenderam as
tarifas de navegação na plataforma Educ.ar do Ministério Em alguns casos, medidas de apoio foram direcionadas
da Educação, que oferece recursos digitais com curadoria aos povos indígenas. No sul do Suriname, o UNICEF
para professores, administradores, alunos e famílias; e a Equipe de Conservação da Amazônia apoiaram
eles também garantiram que o uso do site não afetaria as comunidades indígenas usando ferramentas de
as franquias de dados móveis (Cobo et al., 2020). Na comunicação personalizadas e garantindo o acesso a
Colômbia, para garantir o acesso das famílias mais pobres, itens essenciais, água, serviços de saneamento e higiene,
a conexão com a versão móvel do portal educacional e apoio psicossocial e educacional (UNICEF Guiana e
Colômbia Aprende é gratuita para usuários que pagaram Suriname, 2020a).
até US$ 20 em serviços móveis (Ministério de Tecnologias
da Informação e Comunicação da Colômbia, 2020). No Para tentar evitar que a interrupção aumentasse a lacuna
Paraguai, um acordo entre a Microsoft e o Ministério da de aprendizagem entre os alunos mais pobres e os mais
Educação e Ciência resultou em um pacote educacional ricos, alguns países ajustaram o currículo, orientando as
que apoia 60.000 professores e 1,2 milhão de alunos, escolas sobre quais conteúdos de aprendizagem priorizar.
a custo zero para os usuários (Cobo et al., 2020). No
Uruguai, uma parceria entre o Plan Ceibal, um programa
público que promove o uso de tecnologia da informação FIG U RA 8.2 :
Os países da América Latina e do Caribe tomaram
e comunicação (TIC) nas escolas, e a empresa de
algumas medidas para apoiar alunos em risco de exclusão
telecomunicações ANTEL proporcionou a todos os alunos
durante a pandemia
acesso ao conteúdo educacional do governo sem custo
Porcentagem de países que fizeram esforços para incluir grupos
pelo uso de dados (Plan Ceibal, 2020). de risco na educação a distância, América Latina e Caribe vs
todos os países, 2020
Alguns governos tentaram garantir o acesso universal
aos dispositivos. Nas Ilhas Cayman, uma parceria
Suporte a alunos
entre o ministério da educação e a organização sem com deficiências
fins lucrativos Alfabetização é para Todos apoiou Melhor acesso a infraestrutura em
o fornecimento de laptops a todos os alunos de áreas remotas ou urbanas

escolas públicas (Ministério da Educação, Juventude, Acesso subsidiado a dispositivos


Esportes, Agricultura e Terras das Ilhas Cayman, 2020).
Materiais de aprendizagem
A Organização dos Estados do Caribe Oriental, com o projetados para falantes
de línguas minoritárias Mundo
apoio da Parceria Global para a Educação (GPE), está
América Latina/Caribe
distribuindo dispositivos para pelo menos 12.000 alunos Nenhuma ação/Não sei

vulneráveis na escola primária em Dominica, Granada,


0 20 40 60 80 100
Santa Lúcia e São Vicente e Granadinas como parte %
de sua Resposta do Setor Educacional e Estratégia de Fonte: Análise da equipe do Relatório GEM com base no questionário
Recuperação para a COVID-19 (GPE, 2020b). No Panamá, UNESCO-UNICEF-Banco Mundial.

a Samsung disponibilizou ao Ministério da Educação


tecnologia para desenvolver uma plataforma online que

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Chile, Panamá e Peru identificaram os aspectos do Paraguai está desenvolvendo seminários virtuais para
currículo que são prioritários para alcançar os objetivos apoiar o bem-estar socioemocional dos professores
essenciais de aprendizagem durante um ano acadêmico durante a pandemia (Ministério da Educação e Ciência do
em que haverá menos aulas. O Ministério da Educação Paraguai, 2020).
da Guatemala, buscando garantir que a avaliação seja
coerente com a situação atual de ensino e aprendizagem, OS PROFESSORES PRECISAM DE MAIS
implementou o programa Aprendo en casa, que visa
APOIO PARA MANTER A CONTINUIDADE
desenvolver um portfólio de materiais que permitem
avaliar a aprendizagem durante o confinamento DA APRENDIZAGEM
(UNESCO, 2020e). A maioria dos professores e gestores escolares teve que
se adaptar rapidamente ao uso de novas ferramentas
Cerca de 14 milhões de pessoas na América Latina e no para dar aulas, distribuir conteúdo, corrigir a lição de
Caribe podem sofrer grave insegurança alimentar devido casa e se comunicar com os alunos, pais e responsáveis.
à COVID-19 (PMA, 2020a). Aproximadamente 85 milhões A adaptação à educação a distância em casa aumentou
de crianças da região recebem café da manhã, merenda significativamente a carga de trabalho dos professores.
ou almoço na escola (FAO e PMA, 2019). Os governos
têm tentado mitigar o impacto sobre as famílias mais O Ministério da Educação da Argentina assinou um
vulneráveis e garantir a continuidade dos programas de acordo com os sindicatos para regulamentar o trabalho
alimentação escolar. No estado de São Paulo, a Secretaria dos professores durante a pandemia, a fim de preservar
de Educação lançou um programa de apoio social a privacidade e o bem-estar dos professores (Ministério
denominado Merenda em casa, que oferece transferência da Educação da Argentina, 2020). No Brasil, 88% dos
de dinheiro às famílias mais pobres para garantir que professores relataram nunca ter ensinado remotamente
os alunos tenham comida suficiente. Em maio de 2020, antes da pandemia, e 65% disseram que o trabalho
732.000 alunos cujas famílias estavam registradas no pedagógico mudou e aumentou, com uma nova ênfase
cadastro nacional de programas sociais receberam a em atividades envolvendo interfaces digitais e interação
transferência de dinheiro (OCDE, 2020). Em vários países, remota (Instituto Península, 2020; Fundação Carlos
os governos adaptaram seus programas de alimentação Chagas et al, 2020). A mudança repentina da rotina e da
escolar por meio de transferências diretas de dinheiro ou modalidade de ensino aumentou a ansiedade, o cansaço,
estabelecendo entregas de alimentos para famílias cujos o tédio e a sobrecarga dos professores, ao mesmo tempo
filhos dependem dos programas (FAO e CEPAL, 2020). que aumentaram suas preocupações com sua saúde
e a de seus familiares devido à pandemia. No entanto,
As adolescentes grávidas também precisam de apoio 75% dos professores indicaram que as escolas não
para continuar sua educação por caminhos alternativos. priorizaram o apoio socioemocional, embora gostariam de
A Fundação Centro para as Mulheres da Jamaica, uma recebê-lo (Instituto Península, 2020). Trabalhar em casa é
agência pública que apoia meninas grávidas e mães jovens quase impossível para quem cuida de crianças ou outros
na continuação de sua educação, adaptou seus esforços membros da família, especialmente devido à divisão das
para a educação a distância, mas também ofereceu apoio tarefas domésticas por gênero e a segregação de gênero
psicológico, alimentação e produtos de higiene pessoal na profissão docente, que intensifica a carga de trabalho
(Kennedy, 2020). das professoras.

Outras respostas governamentais enfocaram o bem-estar Para ministrar efetivamente a educação a distância, os
físico, social e emocional de alunos, pais e professores. professores precisam de acesso à tecnologia apropriada,
Argentina, Peru e Suriname têm linhas diretas para mas apenas alguns países forneceram aos professores
crianças denunciarem violações dos direitos da criança dispositivos digitais, seja diretamente ou dando-lhes
e violência de gênero em casa; agentes de linha direta acesso a créditos para adquiri-los (Ministério da Educação
também podem ajudar a lidar com as consequências, de El Salvador, 2020; Molina, 2020). Os professores
fornecendo apoio psicossocial (Governo da Argentina, também precisam aprender a usar a tecnologia. A
2020; Convoca, 2020; UNICEF Guiana e Suriname, Pesquisa Internacional sobre Ensino e Aprendizagem
2020b). Cuba publicou uma cartilha com diretrizes sobre (TALIS) de 2018 constatou que cerca de 70% dos
apoio psicoemocional para crianças pequenas durante professores nos países participantes da América Latina
o confinamento (Ministério da Educação de Cuba et al., receberam treinamento formal no uso das TIC para o
2020). Panamá publicou uma ferramenta educacional para ensino (OCDE, 2020). Assim, 63% dos professores dos
a prevenção da violência sexual na infância (Secretaria anos finais do ensino fundamental chilenos, 69% dos
Nacional da Criança, do Adolescente e da Família do mexicanos e 71% dos colombianos relataram que
Panamá, 2020). O Ministério da Educação e Ciência do permitem que os alunos usem as TIC com frequência

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para projetos ou trabalhos de classe, acima da média de escolas públicas receberam algum tipo de lição de
da OCDE (53%) (OCDE, 2020). Ainda assim, 27% dos casa, 24% não receberam nenhum tipo de atividade para
professores brasileiros e 34% dos colombianos precisavam casa. Os pais e responsáveis relataram que a falta de
de treinamento (OCDE, 2020). No Haiti, como parte de comunicação das escolas foi um dos principais motivos
uma doação de US$ 7 milhões da parceria Global para pelos quais seus filhos não participaram de atividades
a Educação (GPE), está sendo oferecido treinamento a educacionais durante a pandemia (Itaú Social, 2020).
15.000 professores para apoiar a aprendizagem remota Os jovens brasileiros relataram que o principal desafio
(GPE, 2020a). para estudar em casa não era a falta de tempo ou de
acesso a dispositivos, mas sim o equilíbrio emocional, a
A relação entre professores, pais e alunos é fundamental dificuldade de organizar o estudo a distância e a falta de
na oferta de uma educação contextualizada e relevante um ambiente tranquilo em casa. Cerca de 60% disseram
de boa qualidade. De acordo com a TALIS 2018, escolas e que escolas e universidades deveriam priorizar atividades
pais tiveram relativamente pouca interação, embora os que abordem o estresse e a ansiedade, e 50% pediram
professores dos países latino-americanos participantes estratégias de gestão e organização do tempo (Conselho
tendessem a passar mais tempo se comunicando e Nacional de Juventude et al, 2020). No Chile, 63% dos
cooperando com os pais (1,8 horas no Chile, 2,7 horas na alunos relataram não ter contato com um professor
Colômbia, 1,9 horas no México) do que a média da OCDE para ajudá-los a esclarecer dúvidas sobre seu progresso
(1,4 horas por semana). No entanto, os professores da (Educación, 2020).
região relataram uma maior necessidade de capacitação
profissional para a cooperação entre professores e Os alunos precisam de acesso regular a recursos
pais (entre 17% e 22%) do que a média da OCDE (9%) educacionais e canais de comunicação bem projetados
(OCDE, 2020). com professores, pais e responsáveis. Eles precisam
ser protegidos dos riscos associados ao uso crescente
As escolas privadas têm uma vantagem sobre as escolas de fontes e plataformas online. Na Argentina, uma
públicas em termos da quantidade de tempo alocado organização da sociedade civil, Chicos.net, está tratando
para a educação a distância e da comunicação professor- de questões relacionadas a aliciamento, cyberbullying,
aluno (CEPAL e UNESCO, 2020). Os professores de escolas abuso sexual e risco digital para crianças e jovens durante
particulares tendem a ter acesso a dispositivos de alta a pandemia (Urbas e Pokorski, 2020).
qualidade para conduzir a educação a distância, manter
a interação e apoiar os alunos (Mancera et al, 2020). Os O envolvimento dos pais tem uma influência positiva no
professores de escolas públicas tendem a se comunicar desempenho acadêmico do aluno (Castro et al, 2015) e
menos com os alunos e oferecem menos oportunidades as práticas de educação domiciliar podem impulsionar
de interação e feedback síncrono do que os professores o desempenho acadêmico (UNESCO, 2016). No entanto,
de escolas particulares (Nova Escola, 2020). para muitos pais, cuidadores e famílias, a mudança para
a educação a distância os forçou a adotar diferentes
No entanto, as escolas particulares têm outros problemas: papéis simultaneamente e assumir tarefas para as
elas dependem de taxas, que muitas famílias não podem quais não estavam preparados e que frequentemente
pagar na situação atual. Algumas escolas privadas precisam equilibrar com muitas outras responsabilidades,
suspenderam os pagamentos a professores e outras especialmente a necessidade de manter ou garantir
faliram, obrigando os alunos a matricularem-se em um trabalho e renda em meio a uma recessão. Nesse
escolas públicas (Elacqua e Schady, 2020). No Equador, contexto, os alunos desfavorecidos são os mais afetados,
as matrículas em instituições públicas aumentaram em pois têm menos recursos em casa e seus pais costumam
120.000 alunos (6,5%) no início do ano letivo (Olsen e ter menos escolaridade e menos tempo para ajudar nas
Prado, 2020). lições de casa. Foram relatadas diferenças nos padrões de
participação dos pais em escolas públicas (36%) e privadas
ALUNOS E PAIS PRECISAM DE APOIO (58%) no Brasil (Nova Escola, 2020).

ADICIONAL DURANTE A PANDEMIA


No Paraguai, os pais relataram que o maior impacto da
Os alunos precisam de mais do que apenas instrução: eles pandemia sobre eles foi na educação, seguido de perto
também precisam ser capazes de se conectar com amigos pela economia. Cerca de 70% dos entrevistados disseram
e receber feedback sobre seu progresso acadêmico. Na que seus filhos tinham lição de casa ou atividades
Argentina, 81% dos alunos relataram receber trabalhos todos os dias. A responsabilidade de ajudar as crianças
de casa, 77% relataram ter contato com os professores e nos trabalhos escolares recaiu principalmente sobre as
69% relataram receber feedback dos professores (UNICEF mães (44%) ou sobre ambos os pais (33%). A maioria
Argentina, 2020). No Brasil, enquanto 74% dos alunos dos pais valoriza a educação a distância porque mantém

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R E L ATÓ R I O D E M O N I TO R A M E N TO G LO B A L D A E D U C A Ç Ã O 2 0 2 0

os filhos ativos (45%) e garante o direito à educação CONCLUSÃO


(34%). Alguns expressaram o desejo de que fosse menos A pandemia da COVID-19 representa um grande revés
trabalhoso para aqueles que tem que supervisionar as para os esforços na consecução do ODS 4, embora a
lições de casa (11%). Outros acreditam que, do ponto de magnitude do impacto ainda não esteja clara. A crise
vista educacional, este é um ano perdido (32%) (UNICEF mostrou que garantir a aprendizagem para todos durante
Paraguai e USAID, 2020). uma pandemia não é simplesmente uma questão técnica
de combater a exclusão digital. Embora a educação a
As organizações da sociedade civil são essenciais para distância tenha ocupado muitas manchetes na mídia,
dar voz às comunidades deixadas para trás na resposta uma minoria de países tem a infraestrutura básica para
educacional. Elas continuaram a realizar este importante se concentrar nos desafios pedagógicos das abordagens
trabalho, apesar do impacto da quarentena e do online de ensino e aprendizagem para todos os alunos.
confinamento (Human Rights Watch, 2020). Apelos estão A maioria das crianças e jovens está sofrendo uma perda
sendo feitos para garantir que as respostas educacionais de aprendizagem direta, mas, espera-se, temporária. No
à COVID-19 sejam equitativas, inclusivas, baseadas em entanto, permanecem as preocupações sobre os efeitos
direitos (GCE, 2020) e que enfatizem a solidariedade e indiretos mais duradouros da recessão, que lançará
o financiamento suficiente para a garantia do direito milhões de pessoas de volta à pobreza. Os governos
à educação (CLADE, 2020). No Brasil, uma campanha precisam examinar de perto os desafios da inclusão
nacional lançou dois guias sobre educação e proteção destacados neste relatório para reconstruir um sistema
de crianças e adolescentes na pandemia, direcionados à de educação melhor e acessível a todos os alunos.
comunidade escolar, famílias, partes interessadas locais
e outros tomadores de decisão (Campanha Nacional
pelo Direito à Educação, 2020). Movimentos feministas
e de mulheres na região têm chamado a atenção para
o aumento da violência de gênero (Munhoz, 2020). O
movimento Estamos Todos em Ação tem colaborado
com o Instituto Interamericano para Deficiência e
Desenvolvimento Inclusivo e o Fundo de População
das Nações Unidas para criar a #ThisIsCaringToo, uma
campanha que produziu textos, cartazes e vídeos
abordando de forma abrangente questões de cuidados
durante a pandemia, com ênfase em jovens com
deficiência (Ossana e Lanzillotto, 2020).

Algumas organizações estão oferecendo ajuda urgente


para aqueles que mais precisam. Por exemplo, a Plan
International forneceu kits de higiene e alimentos para
membros de grupos marginalizados, incluindo famílias
chefiadas por mulheres e meninas, no Brasil, República
Dominicana, Honduras e República Bolivariana da
Venezuela (Plan International, 2020).

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