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SEBENTA

2012/2013
ÍNDICE

1. Alteração da conformação de proteínas 1

2. Alterações estruturais da hemoglobina e do eritrócito 7

3. O metabolismo do ferro – implicações em patologia 13

4. Doenças associadas ao metabolismo dos aminoácidos 19

5. Patologias associadas a disfunções do ciclo da ureia 35

6. Intolerância à frutose e galactosémia 45

7. Défice da piruvato desidrogenase (PDH) 51

8. Estudo bioquímico de uma doença da cadeia respiratória mitocondrial 57

9. Doenças da oxidação dos ácidos gordos 63

10. Mecanismos de destoxificação hepática 69

11. Disfunção hepática 81

12. Stress oxidativo, disfunção mitocondrial e neurodegenerescência 87

13. Hiperuricémia 91
15. Regulação do metabolismo mediada por insulina, glucagina, adrenalina 97

16. Regulação do metabolismo mediada por estrogénios e glucocorticóides 103

17. Hormonas da tiroide 111

18. Alterações metabólicas no jejum 115

19. Alterações metabólicas na obesidade e na diabetes 121

20. Dislipidémias 125

21. Síndrome metabólica 131

22. Alteração da homeostase do cálcio e mecanismos de morte celular 135

23. O adipócito (V1) 145

23. O adipócito (V2) 155

24. A célula muscular – importância da fosfocreatina 161

25. Sistema nervoso e interacção nerónio-glia 169

26. A célula óssea 173

27. O cancro I 183

28. O cancro II 187


Alteração da conformação de proteínas
AULA TEÓRICA 1
JOSÉ MACHADO | YES YES YES

Objetivos:
 Analisar e interpretar as modificações estruturais de proteínas
 Os exemplos do prião e da β-amilóide

 Interpretar as consequências funcionais resultantes da modificação estrutural respectiva

Proteínas
o Como são definidas?
 Pelas características das cadeias laterais dos AA como por exemplo
polaridade e o conteúdo em enxofre. (influenciam a sua função)
 Tipos de ligações entre grupos das cadeias laterais. (influenciam a sua
estrutura)

o Que tipos de estrutura existem?


 Primária, principalmente dependente das ligações peptídicas
 Secundária (pontes de hidrogénio são importantes):
 α-hélice: possui rotação para a direita e cada passo (volta) da
hélice é definido por 4 AA
 Folha β-pregueada: as pontes de hidrogénio são formadas
entre os segmentos adjacentes da cadeia polipeptídica. Pode
ser paralela (a orientação aminoterminal e carboxiterminal é
igual) ou antiparalela (a orientação aminoterminal e
carboxiterminal é inversa)
 Terciária (é mantida por pontes dissulfeto e interações hidrofóbicas):
depende da organização no espaço da estrutura secundária.
 Quaternária: proteínas com mais do que uma subunidade

o A sequência de AA numa proteína é responsável pela sua estrutura e função.


o A conformação adquirida é responsável pela função.
o Para o normal funcionamento da proteína é essencial a estrutura e, principalmente, a
conformação portanto, uma alteração da conformação resulta numa alteração da
função da proteína.

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Chaperons
São proteínas responsáveis pelos mecanismos de manutenção da conformação,
nomeadamente as Hsp 70 e Hsp 60, que mantêm a proteína no estado unfolded, impedindo a
sua maturação antes do tempo.

Sequência sinalizadora
Indica o destino definitivo da proteína.

Proteínas misfolding (mal conformadas)


São marcadas com ubiquitina e degradadas no proteassoma. Quando existe uma
deficiência mitocondrial, o processo de degradação é afectado pois requer ATP. Quando o
sistema ubiquitina proteassoma é afetado, as proteínas misfolding não são degradadas,
acumulam-se e podem levar à disfunção e destruição da célula.

Fibrilas de amilóide
São depósitos patológicos que têm tendência a agregar-se formando agregados de
amilóide que se depositam no espaço extracelular causando doenças como Alzheimer, caso
ocorra no cérebro, ou disfunções pancreáticas, caso a acumulação se dê nas células
pancreáticas.

Doença de Alzheimer
É uma doença neurodegenerativa crónica do SNC, não curável, progressiva e fatal. É a
forma de demência mais comum no idoso.
A sua prevalência aumenta exponencialmente com a idade.
o Duas formas clínicas:
 Familiar: - Minoria dos casos
- Mutações genéticas
- Autossómica dominante
- Início precoce (<65 anos)
 Esporádica: - Maioria dos casos
- A idade é o principal factor de risco
- Início tardio (>65 anos)

Características Neuropatológicas da doença de Alzheimer:


 Acumulação extracelular de agregados β-amilóide – Placas senis
 Acumulação intracelular de tau hiperfosforilada (nos neurónios) que se
começa a agregar causando tranças neurofibrilares

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 Perdas neuronais e sinápticas selectivas (os neurotransmissores não
são captados, ou são em pouca quantidade, pelo neurónio pós-
sináptico e, desta forma, não ocorre a transmissão do impulso
nervoso)

Proteína percursora da Amilóide (APP)


É uma glicoproteína membranar que existe tanto nas células neuronais (relativamente
abundante) como nas células periféricas. É clivada pelas α-secretases e β-secretases. Quando é
clivada pela α-secretase, formam-se fragmentos solúveis, não amiloidogénicos, sem tendência
a agregarem-se. Quando é clivada pela β-secretase, formam-se fragmentos não solúveis,
amiloidogénicos, que têm tendência a agregar-se. Depois da clivagem pela β-secretase, os
fragmentos sofrem a ação da γ-secretase originando um peptídeo β-amilóide (quando se
juntam vários, formam-se os tais agregados de β-amilóide).

Mecanismos de lesão celular induzidos por β-amilóide

O peptídeo Aβ é capaz de produzir peróxido de hidrogénio (H2O2) por um mecanismo


que resulta da interação deste peptídeo com o Fe2+ e o Cu+. O peptídeo Aβ pode também
causar stress oxidativo mitocondrial e desregular a homeostase de Ca2+ (um aumento dos
níveis de Ca2+ é um indicador de morte celular) resultando no aumento do radical superóxido e
diminuição de ATP. O superóxido é convertido a H2O2 pela atividade da superóxido dismutase
(SOD) e também pode interagir com o óxido nítrico (NO), através de óxido nítrico sintase (NOS)

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para a produção de peroxinitrito (ONOO*). As espécies reativas de oxigénio danificam a
membrana que pode gerar produtos da peroxidação lipídica. Estes podem alterar a função de
transportadores de glicose e glutamato. Modificações oxidativas da tau podem promover a sua
agregação e induzir a formação de agregados. Interação de H2O2 com Fe2+ ou Cu+ gera o radical
hidroxilo (OH*), um potente radical que contribui para a disfunção do retículo endoplasmático.

Prião
É composto por proteínas que têm a capacidade de modificar outras proteínas
tornando-as cópias das proteínas do prião. Não possui ácidos nucleicos.
o Doenças do prião:
 Esporádica: -Doença de Creutzfeldt-Jakob (CJD) (de todas as doenças
do prião é a mais comum)
 Adquirida (infecciosa): -Kuru
-Nova variante da CJD
 Familiar: -fCJD
-Insónia Fatal Familiar (FFI)
-GSS

o Características clínicas das doenças do prião:


 Alterações motoras (ataxia, rigidez e tremor)
 Alterações cognitivas
 Demência
o Características neuropatológicas das doenças do prião:
 Placas de amilóide (devido à acumulação de proteínas do prião)
 Morte neuronal
 Gliose (proliferação ou hipertrofia de células gliais como os astrócitos
e as microglia). *Células gliais são células não neuronais que
proporcionam suporte e nutrição aos neurónios.
 Vacuolização dos corpos celulares e axónios

Proteína do prião (PrP)


 Glicoproteína
 Existe em todos os vertebrados
 Existe nas células nervosas

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 Existe nas células musculares
 Existe nas células sanguíneas e linfáticas
o PrPc
 Forma normal da proteína
 Sensível a protéases
 Predomínio de conformação α-hélice
 Estrutura primária semelhante às PrPsc
 Funções pouco claras
 Sabe-se que liga e transporta Cu+ (importante nos terminais nervosos)
 Sabe-se que é um antioxidante (importante para evitar o stress
oxidativo)
 Sabe-se que é um recetor
o PrPsc
 Forma defeituosa da proteína
 Resistente a protéases
 Predomínio de conformação folha-β
 Estrutura primária semelhante às PrPc

Porque é que a PrPc pode ganhar uma conformação defeituosa (PrPsc)?


 Hipótese de refolding: por uma razão desconhecida, uma PrPsc induz a
alteração da conformação de uma PrPc que ganha uma conformação
defeituosa.

 Hipótese de seeding: há um equilíbrio entre as 2 formas e, lentamente, as PrPc


vão ganhando uma conformação defeituosa.

 Hipótese da proteína x: uma proteína chaperon altera a conformação de PrPc


para uma conformação defeituosa.

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ALTERAÇÕES ESTRUTURAIS DA HEMOGLOBINA E DO ERITRÓCITO
AULA TEÓRICA 2
INÊS ALMEIDA | MARIANA FERREIRA

INTRODUÇÃO
 Existem dois mecanismos que fornecem às células um fluxo contínuo e adequado de
oxigénio: o aparelho circulatório e os transportadores de O2 (hemoglobina e mioglobina).
 A oxigenação de qualquer órgão ou tecido depende de três factores: fluxo sanguíneo
(diretamente determinado pelo fluxo cardíaco), capacidade de transporte de O2 pelo
sangue (dependente da hemoglobina, que se relaciona com a eritropoetina – proteína
produzida nos rins, fulcral na regulação da eritropoiese) e afinidade da hemoglobina pelo
O2 (um aumento da concentração de 2,3-BPG, de H+ ou de CO2, traduz-se numa diminuição
desta afinidade).
 Hemoglobina (Hb)
o É um tetrâmero constituído por 2 pares de cadeias polipeptídicas (α, β, ϒ, δ), ligadas
por meio de ligações não covalentes.
o As cadeias β designam-se por β-verdadeiras, enquanto que as cadeias ϒ e δ se designam
por cadeias β-like.
o Cada cadeia α contacta com as cadeias β, ϒ ou δ, mas não entre si.
o As cadeias α têm 141 resíduos de AA, sendo que são codificadas pelo cromossoma 16.
Por outro lado, as cadeias β, ϒ e δ têm 146 resíduos, sendo codificadas pelo cromossoma
11.
o No indivíduo normal, cada cadeia α é codificada por 4 genes e cada cadeia β é codificada
por 2 genes. Assim, a probabilidade de surgirem alterações nas cadeias α é menor,
estando as cadeias β mais susceptíveis a serem modificadas por mutações.
o Cada cadeia encontra-se covalentemente ligada a um grupo heme.
o Por sua vez, cada grupo heme pode ser dividido em 2 partes: uma parte orgânica
(protoporfirina IX) e outra inorgânica (átomo de ferro que pode estar no estado férrico
– Fe3+ – ou no estado ferroso – Fe2+, liga O2).
o A síntese de Hb compreende a síntese do heme (ocorre na mitocôndria e no citosol,
sendo que culmina com a junção da protoporfirina ao ferro endocitado) e a síntese das
globinas (ocorre nos ribossomas, através da adição de AA, formando-se várias cadeias
polipeptídicas).
o A síntese das cadeias de Hb humana varia ao longo do desenvolvimento do ser humano:
Hb Gower1, Hb Gower2 e Hb Portland surgem no embrião, enquanto que Hb Fetal
surge no feto e no adulto e Hb A2 e Hb A são específicas do adulto.

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o As mutações que provocam alterações estruturais na hemoglobina estão associadas a
diferentes patologias:
 Alterações qualitativas (mais frequentes; associadas a síndromes falciformes)
1. Anemia de células falciformes ou Drepanocitose (alteração do exterior)
2. Metahemoglobinémia (alteração do local ativo)
 Alterações quantitativas
3. Talassémias (deleção de uma ou mais cadeias)

ANEMIA DE CÉLULAS FALCIFORMES (DREPANOCITOSE)


 Há alteração do exterior.
 Ocorre uma mutação pontual na 6.ª posição da cadeia β, havendo a substituição do ácido
glutâmico (carregado negativamente) por uma valina (AA neutro, sem carga) – Hb
resultante: Hb S.
 A Hb resultante:
o Tem menos cargas negativas, pelo que pode ser identificada através de uma
electroforese.
o É menos solúvel (apresenta baixa solubilidade a altas concentrações iónicas) e as fibras
estão mais polimerizadas, pelo que irá precipitar em condições de hipóxia, obstruindo
os capilares (conduz a inflamação e dor), o que, por sua vez, irá contribuir para um
aumento destas mesmas condições.
o Em condições de hipóxia (desoxihemoglobina), há o afoiçamento dos GV (em vez de ser
um disco bicôncavo, tem forma de foice) – Anemia Hemolítica.
o O afoiçamento dos GV vai conduzir à sua hemólise e, posteriormente, à acumulação de
bilirrubina (degradação do heme) – Icterícia.
DIAGNÓSTICO LABORATORIAL
 Esfregaço de sangue periférico:
o Se a forma de foice dos GV for pouco visível, isto é, se a maioria dos GV apresentar
forma de disco bicôncavo e apenas alguns forma de foice, em laboratório pode simular-
se uma situação de hipóxia, tornando assim visível a forma de foice dos GV.
 Eletroforese em gel:
o A HbS tem mobilidade eletroforética anormal.
o A HbS tem menos cargas negativas que a HbA, porque o ácido glutâmico é substituído
por valina, na 6.ª posição.
 Focagem isoeléctrica:
o A HbS tem menos cargas negativas que a HbA.

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o pI HbS > pI HbA
 RFLP:
o As enzimas endonucleases reconhecem e clivam o DNA em sítios específicos,
determinados por uma curta sequência de nucleótidos. Assim sendo, o DNA clivado por
uma determinada endonuclease vai sempre originar os mesmos fragmentos.
o Os fragmentos resultantes são separados através de eletroforese em gel e transferidos
para uma membrana através do processo Southern blot. Se aparecerem 2 fragmentos, o
indivíduo é normal, se aparecer apenas 1 fragmento, o indivíduo possui anemia de
células falciformes.
TERAPÊUTICA
 ↑ Produção de HbF, recorrendo a hidroxiureia: se existe uma alteração nas cadeias β,
devemos ↑ as cadeias β-like, neste caso as cadeias ϒ.
 Inibição da polimerização da HbS, recorrendo a cianeto de Na⁺ - reage irreversivelmente
com o resíduo amino-terminal de valina na hemoglobina, aumentando a sua afinidade com o
O2 e evita o afoiçamento e posterior polimerização.
 Inibição dos canais de K⁺, recorrendo a clotrimazol – evita-se grande perda de K+ e,
consequentemente, o afoiçamento irreversível.
 Terapia génica (ainda não é utilizada).
METAHEMOGLOBINÉMIAS (HbM)
 Há alteração do local ativo (alteração do interior).
 Devido a uma alteração génica, a histidina F8 é substituída pela tirosina F8. Esta alteração
leva a que o ferro do heme passe do estado ferroso, Fe2⁺, ao estado férrico, Fe3⁺.
 A metahemoglobinémia hereditária pode surgir devido:
o HbM (Boston, Milvaukee, Saskatoon…).
o Deficiência na enzima citocromo b5 redutase: normalmente, a HbM formada pode ser
reduzida pela cit. b5 redutase, passando então o ferro ao estado ferroso, Fe2+, capaz de
ligar O2. No entanto, se existir uma deficiência nesta enzima, o ferro não é reduzido e o
resultado é uma Hb com dificuldade em ligar O2.
 Tratamento: azul metileno ou ácido ascórbico (para reduzir o ferro).

TALASSÉMIAS
 GV menos corados e mais pequenos → Anemia hipocrómica e microcítica
 β-Talassémia: deficiência nas cadeias β (deve-se ↑ HbF e ↑ HbA2, ou seja, ↑ as cadeias β-
like).
 α-Talassémia: deficiência nas cadeias α (↑ tetrâmeros β4 e ϒ4).

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o As cadeias α são codificadas por 4 genes. Se ocorrer deleção dos 4 genes, a talassémia é
incompatível com a vida (forma fatal).
 Hb Lepore: fusão das cadeias δ e β (presentes cadeias α).
 Podem existir:
o Formas minor: deleção de 1 cadeia.
o Formas major: deleção de várias cadeias.
 Existe uma fácies característica, em que os ossos malares e frontal estão mais salientes.
 Diagnóstico: Esfregaço de sangue periférico, …

PROTEÍNAS DA MEMBRANA DO GV
 Proteínas intrínsecas: glicoforina e proteína banda 3.
 Proteínas do citoesqueleto: espectrina, anquirina, actina e proteína banda 4.1.

ANOMALIAS DA MEMBRANA DO GV
ESFEROCITOSE HEREDITÁRIA
 GV esféricos.
 Hereditariedade: autossómica dominante; expressão variável, raramente recessiva.
 Anemia hemolítica hereditária mais comum na Europa do Norte.
 Clínica: anemia, icterícia e esplenomegália.

↓ Conteúdo nas GV deixa de ter o


Alteração da
proteínas estruturais suporte do
bicamada lipídica
do GV citosqueleto

GV não passam na
microcirculação Alteração da forma
Células esféricas
esplénica e são das células
eliminados

ANEMIA

 Patogenia: defeito das proteínas estruturais:


Alteração da
 Anquirina (50%)
membrana do GV
 Espectrina (30%)
 Proteína banda 3 (20%)

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ELIPTOCITOSE HEREDITÁRIA
 GV elípticos.
 Patogenia: defeito na espectrina.
 Clínica: anemia, icterícia e esplenomegália.

DIAGNÓSTICO – TESTES
 Teste da fragilidade osmótica:
o Na esferocitose as células são
excessivamente permeáveis ao influxo
de sódio logo, observa-se o desvio da curva da hemólise para a direita (GV mais
susceptíveis a hemólise).
 Autohemólise aumentada, corrigida na presença de glicose.
 Teste de Coombs (antiglobina directa) negativo.
 Análise com 51Cr para estudar a severidade do atingimento do baço.
 Esfregaço de sangue periférico – microesferócitos.
TRATAMENTO
 Remoção do baço.
 Ácido fólico (forma activa da vit. B9) – promove a produção de GVs normais. O seu défice
leva a anemias megaloblásticas.

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O METABOLISMO DO FERRO – IMPLICAÇÕES EM PATOLOGIA
AULA TEÓRICA 3
AS BITCHES DIREITO | AQUINO

Objectivos:
-Descrever os processos de captação, transporte e armazenamento do ferro no organismo humano
-Analisar as repercussões patológicas relacionadas com alterações no metabolismo do ferro (défice ou excesso).

O ferro no organismo
O ferro é um metal de transição, que possui electrões desemparelhados na última
camada. Possui, por isso, a capacidade de ceder ou captar electrões, alternando entre estados
oxidados ou reduzidos. Participa em reacções de oxidação-redução.
Para o organismo humano, o ferro é um oligoelemento: é essencial, mas requerido em
pequenas concentrações, inferiores a 100mg/dia. A absorção média diária é de 1 a 2 mg, e faz-
se pela ingestão de carne vermelha, ovos, fígado, ou por cozinhados feitos em panelas de ferro.
É componente do grupo heme e co-factor de várias enzimas que não têm heme.
É essencial para várias reacções do organismo, entre as quais:
 Transporte de Oxigénio e armazenamento – pela hemoglobina e mioglobina,
respectivamente, ambas com grupo heme:
 Gerar energia - é responsável pela ligações Fe-S (ferro-enxofre) que são necessárias ao
funcionamento dos complexos da cadeia respiratória; o citocromo C, com grupo
hémico, actua também como transportador de electrões nesta cadeia;
 Destoxificação – os citocromos (ex. Citocromos P450) têm grupo heme;
 Síntese de DNA – componente da ribonucleótido redutase; helicases possuem ferro na
sua constituição;
 Síntese de NO;
 Síntese de hormonas – triptofano oxigenase;
 Proliferação celular – cinases dependentes de ciclinas;
 Actividade anti-oxidante – SOD (superóxido dismutase), catalase, peroxidase;
 Inflamação – oxigenase ciclase, adenilato ciclase;
 O ferro é necessário para o crescimento dos agentes patogénicos, e por isso na
infecção. Infecção pode causar anemia.

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Metabolismo do Ferro
A quantidade de ferro absorvida compensa, em situação normal, as perdas. A perda de
ferro, 1 a 2 mg/dia, faz-se por descamação dos epitélios (pele, cabelo e unhas), por
descamação da mucosa gastrointestinal ou dos tractos urogenitais, pelas fezes, urina e suor
(em pouca quantidade); na mulher, é eliminado na menstruação.

Do ferro presente no organismo, está


presente maioritariamente entre a hemoglobina e
a ferritina, mas distribui-se:
 Em circulação na hemoglobina no sangue;
 Em circulação ligado à transferrina, no
plasma;
 No músculo, armazenado na mioglobina;
 Na medula óssea, para eritropoiese, na
hemoglobina;
 No fígado e parênquima de outros órgãos,
armazenado como ferritina;
 Nos macrófagos, para reciclagem
aquando da degenerescência dos
glóbulos vermelhos.

Ciclo do ferro – Absorção, reciclagem e eliminação:


A absorção do ferro faz-se no enterócito, no intestino. O ferro da dieta está no estado
férrico, Fe3+, e tem de ser reduzido ao estado ferroso, Fe2+, para ser absorvido. Essa redução é
feita pela FERRIREDUTASE (=Dcytb). A entrada para o enterócito é feita através da DMT-1
(proteína transportadora de catiões divalentes 1) –>DMT-1=Nramp2=SLC11A2, canais iónicos
que transportam catiões divalentes para dentro da célula.

O heme entra no enterócito através da HCP-1. Note-se que a absorção do ferro é mais
eficaz quando é absorvido do heme dos alimentos, como no caso da digestão de carnes
vermelhas, do que quando é absorvido na forma inorgânica – porque o heme é absorvido
como um todo, sem necessidade de redução. É a heme oxigenase (HO-1) que destrói o heme,
libertanto o ferro no estado férrico. Isto explica porque têm os vegetarianos mais défices em
ferro, mesmo quando se suplementam com ele. Além disso, as fibras vegetais, os fitatos, farelo

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e antiácidos diminuem a absorção do ferro (ligam-se a este). A vitamina C pode aumentar a
absorção do ferro porque permite a sua redução (Fe3+ -> Fe2+).
Em caso de excesso, o ferro pode ser agrupado e ligar-se à apoferritina,
transformando-se em FERRITINA para armazenamento nas células.
Por acção da FERROPORTINA, na membrana apical do enterócito, o ferro é
transportado para o exterior da célula; e para poder circular, tem de ser oxidado a ferro
férrico (Fe3+), por acção da FERROXIDASE (=ceruloplasmina, hefastina).
O Fe3+ liga-se então à apotransferrina, convertendo-a em TRANSFERRINA, que
transporta 2 iões de ferro férrico; o ferro pode assim circular pelo plasma até aos locais onde
será usado.
Ferro é transportado ligado à transferrina e pode ser:
 Armazenado como ferritina ou
hemosiderina, principalmente no fígado;
a frataxina é a responsável pelo
transporte do ferro para a mitocôndria;
 Ser incorporado no heme;
 Ser usado como co-factor - mas tendo
em conta que o ferro livre contribui para
o stress oxidativo, é importante o seu
armazenamento na célula e a existência
de quelantes de ferro.

O ferro entra na célula transportado pela


transferrina, numa endocitose mediada por
receptores; o endossoma agrupa o ferro sob a forma de ferritina, que fica armazenada para
evitar reacções e formação de radicais livres.
Outra fonte de ferro é a reciclagem a partir da destruição de glóbulos vermelhos;
pelo sistema reticuloendotelial, nos macrófagos, o glóbulo vermelho é destruído, o heme
degradado a bilirrubina e o ferro é libertado, de maneira semelhante à sua libertação para a
corrente sanguínea.

Alteração do metabolismo do ferro


Uma das causas para a alteração do metabolismo do ferro são os níveis anormais de
hepcidina, hormona produzida no fígado. A hepcidina liga-se à Ferroportina, constituindo um
complexo que é endocitado para degradação. Assim, o ferro não sai da célula.

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Quando os níveis de hepcidina estão dentro dos valores normais, também o ferro se
mantém dentro de valores normais.
Quando há um aumento da expressão de hepcidina ocorre uma diminuição da
concentração de ferro sérico, conduzindo a quadros de anemia.
Contrariamente, quando ocorre uma diminuição da expressão de hepcidina ocorre
um aumento da concentração de ferro sérico, que tende a depositar-se causando falência dos
órgãos. Isto acontece, por exemplo, em doentes com hemocromatose.
A regulação da hepcidina, como se pode ver na imagem abaixo, permite explicar
quadros de anemia em doenças inflamatórias.

Toxicidade do Ferro
O ferro livre pode reagir com peróxido
de hidrogénio, levando à formação de
espécies radicais muito lesivas – radicais
hidroxilo (segundo as reacções de Fenton e
Haber-Weiss).

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Para minimizar os efeitos destes
radicais livres, o organismo possui defesas
antioxidantes, nomeadamente através da
acção da superóxido dismutase, catalase,
ferritina ou GSH peroxidase.
Quando ocorre um diminuição
destas defesas antioxidantes ocorre,
consequentemente, um aumento dos ROS
(reactive oxygen species).
Este desequilíbrio pode conduzir à lesão de macromoléculas como lípidos, proteínas e
ácidos nucleicos.

Anemia por défice de Ferro


O défice de ferro é uma das causas mais frequentes de anemia.
Quando ocorre destruição dos glóbulos vermelhos que já não são funcionais, o ferro regressa à
medula óssea para ser reutilizado na formação de novos células.
Principais causas: adultos  hemorragias ; bebés e crianças  dieta pobre em ferro
Assim, o défice de ferro pode indicar perda de sangue pelo aparelho gastrointestinal.
No que respeita à alimentação, a carne é a melhor fonte de ferro. Fibras vegetais,
farelo e antiácidos diminuem a absorção de ferro, uma vez que se ligam a este. Já a Vit. C pode
aumentar a sua absorção e a sua redução de Fe 3+ a Fe 2+.

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Hemocromatose
Patologia associada à acumulação excessiva de ferro no organismo e
consequentemente em órgãos e tecidos, principalmente no fígado.
Deve-se a um progressivo aumento da absorção de ferro a nível intestinal.
O metabolismo do ferro pode ser resumido através do esquema que se segue:

Entrada no enterócito
Ferri-redutase pela DMT-1
Ferro no estado Ferro no estado Armazenado no
férrico ferroso enterócito
(Fe3+) (Fe2+) (ferritina)

Exportado para a
Passa a Fe3+ para corrente
se ligar à sanguínea pela
transferrina Ferroportina
Ferri-oxidase
-
Hepcidina

A forma mais comum da doença deve-se a uma mutação no gene HFE


(hemocromatose tipo I – doença autossómica recessiva); sendo a mutação mais comum a
C282Y, com a substituição de uma cisteína por uma tirosina na posição 282.
Este gene codifica uma proteína que interage com o recetor da transferrina (TfR).
Ocorre ainda uma diminuição da expressão da hepcidina e, consequentemente,
aumenta a concentração de ferro sérico em circulação, levando à sua acumulação e a lesões
nos tecidos. Os órgãos mais afectados são o fígado, pâncreas, coração, hipófise, gónadas e
tiroide. A pele pode apresentar uma cor bronzeada e o doente pode apresentar sintomas
como artrite, perda de memória, e em casos mais avançados da doença, pode conduzir a
impotência, diabetes, patologia cardíaca, cirrose hepática e cancro do fígado. [ver SO3 -
Hemocromatose]

Notas adicionais:
Indivíduos politransfundidos -> Aumenta ferro de origem exógena -> necessitam de receber
quelantes de ferro (ex. Desferroxiamina).
Quelantes de ferro – ligam o ferro e permitem que seja eliminado na urina, mais facilmente.

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DOENÇAS ASSOCIADAS AO METABOLISMO DOS AMINOÁCIDOS
AULA TEÓRICA 4
THE DEDUCTIONIST | PEDRO CRUZ

Metabolismo dos aminoácidos:


Os aminoácidos são obtidos a partir da dieta, da degradação de proteínas ou de outras biomoléculas através
de enzimas proteolíticas (calpaínas, catepsinas), Sistema Ubiquitina-Proteassoma ou Autofagia. O seu
catabolismo consiste na remoção do grupo amina e metabolização do esqueleto carbonado, cujos produtos
finais os classificam em Cetogénicos (Lys e Leu), Glicogénicos e Cetogénicos (Phe, Tyr, Trp, Thr e Ile) e
Glicogénicos (todos os restantes).
Doenças do metabolismo de aminoácidos:
Doenças genéticas raras, autossómicas recessivas devidas à perda total ou parcial de atividade enzimática.
Não têm cura, na ausência de tratamento são acompanhadas de atrasos mentais graves e são pediátricas
(começam a manifestar-se na infância). Poder-se-á recorrer a Terapia Génica.

Fenilcetunúria
- Defeito na conversão de fenilalanina em tirosina -

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 Tipo I – défice de fenilalanina hidroxilase:
Clássica ou Grave – atividade da enzima < 1%
Atípica ou Leve – 1% < atividade da enzima < 3%
 Tipo II – défice de dihidrobiopterina redutase
 Tipo III – défice de 6-piruvol-tetrahidrobiopterina sintetase, envolvida na síntese da
Tetrahidrobiopterina (afeta também outras vias metabólicas)
 Tipo IV – défice na síntese de Dihidrobiopterina
 Tipo V – défice de Dihidrobiopterina sintetase
Se a atividade da fenilalanina hidroxilase estiver reduzida mas > 3% trata-se de Hiperfenilalaninémia Benigna,
que não apresenta as manifestações clínicas da Fenilcetunúria.
Em situações normais, a Fenilalanina é metabolisada principalmente em Tirosina e esta em proteínas,
melanina, catecolaminas, fumarato ou Acetoacetil-Co A. Porém, na Fenilcetunúria, devido ao bloqueio da via
ao nível da fenilalanina hidroxilase, a Fenilalanina vai ser metabolisada por outra via, cujos produtos finais
são eliminados na urina:
1. Desaminação de Fenilalanina em Fenilpiruvato
Catalisada por uma transaminase, requer Piridoxal Fosfato (PLP, Vit. B6) e transforma um
Piruvato em Alanina ou um α-Cetoglutarato em Glutamato
2. Redução de Fenilpiruvato em Fenilactato
Catalisada por uma desidrogenase
2. Descarboxilação, Hidratação e Oxidação de Fenilpiruvato em Fenilacetato (par conjugado ácido-
base do Ácido Fenilacético)
Catalisada pela fenilpiruvato descarboxilase e três desidrogenases, libertando CO2 e 1 NADH
O Fenilacetato poderá ser conjugado com Glutamina em Fenilacetilglutamina.

Níveis elevados de Fenilalanina inibem a Tirosinase, diminuindo a produção de melanina e aumentando a


tendência para uma pele clara, cabelo louro e olhos azuis.

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Causas:
 défice na Fenilalanina hidroxilase – Fenilcetunúria clássica (cromossoma 12)
 défice de 5,6,7,8-Tetrahidrobiopterina ou de Dihidrobiopterina redutase (cromossoma 12)

Sintomas:
Assintomática no recém-nascido uma vez que a Fenilalanina e a Tirosina, recebidas da mãe, ainda têm
concentrações normais. À medida que o indivíduo começa a comer, a digerir proteínas e a metabolizar
aminoácidos por ele próprio a doença manifesta-se:
 défice de Tirosina
 acumulação de Fenilalanina
 acumulação de Fenilpiruvato (neurotóxico, difunde-se até ao SNC), Fenilactato e Fenilacetato
(confere um odor a “mofo” ou a “rato” à urina, pele e cabelo)
 atrasos no desenvolvimento psicomotor, tremores, microcefalia
 tonalidade da pele e do cabelo mais clara, eczema (inflamação da pele)
 esperança média de vida diminuída

Diagnóstico:
Deve ser realizado o mais cedo possível, preferencialmente até um mês depois do nascimento(mas não nos
primeiros dias) para que o tratamento seja mais eficaz.
 Teste de Guthrie (Teste do pézinho) 48h depois do nascimento – retira-se uma gota de sangue do
calcanhar para um papel de filtro que é depois analisada para rastreio de várias doenças. No caso da
Fenilcetunúria, coloca-se o papel de filtro sobre uma colónia de bactérias com inibidor do
desenvolvimento (níveis elevados de Fenilalanina irão superar este inibidor e a colónia vai-se
desenvolver proporcionalmente à concentração de Fenilalanina)
 HPLC ou Cromatografia de aminoácidos para medir os seus níveis
 Testes à urina, como Teste do FeCl3 – na presença de fenilpiruvato, a urina torna-se verde azeitona
(ineficazes pois as alterações desta surgem quando a doença se começa a manifestar)
 Pré-natal – análise genética dos genes envolvidos na Fenilcetunúria e da história familiar
Caso se detetem níveis elevados de Fenilalanina é necessário realizar outros exames (análise da cinética
enzimática e do DNA) para determinar a sua causa e o tipo de tratamento.

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Tratamento:
Sequelas neurológicas irreversíveis são quase inevitáveis, visto que a Fenilalanina inibe o transporte de
aminoácidos para o cérebro (essenciais para a síntese de proteínas), aumenta a degradação da Mielina e
provoca alterações na síntese de neurotransmissores (dos quais é precursora). O tratamento procura assim
diminuir a gravidade dos défices mentais.
 para défices de Fenilalanina hidroxilase, dieta pobre em Fenilalanina e proteínas (evitar produtos de
origem animal, leite materno, milho, trigo, feijão, pão, massas, bolachas e Aspartame) e rica em
Tirosina, pão, massas e bolachas hipoproteicas, suplementada nalguns casos com óleo de peixe, ferro
ou carnitina e ajustada com o crescimento do doente – não se deve excluir a Fenilalanina totalmente
da alimentação por ser precursora de catecolaminas (neurotransmissores) e melanina
 para défices em 5,6,7,8-Tetrahidrobiopterina, adiministração desse composto, 5-hidroxitriptofano,
Dopa, carbidopa ou inibidores da Dopa descarboxilase (envolvidos na síntese de neurotransmissores
monoaminérgicos)
 monitorizar regularmente e manter os níveis sanguíneos de Fenilalanina entre 3 e 12 mg/L durante
os primeiros 5 a 10 anos para evitar danos neurológicos graves durante o desenvolvimento (os efeitos
adversos da hiperfenilalaninémia parecem desaparecer a partir dessa idade)
 Transplante de Fígado (onde se localiza a Fenilalanina hidroxilase).
O controlo dos níveis de Fenilalanina em mulheres grávidas com Fenilcetunúria permite evitar danos
neurológicos severos e irreversíveis na criança se esta tiver a doença.

Alcaptonúria (Black Urine Disease)


- Defeito na degradação da tirosina -

 Doença genética rara do metabolismo da tirosina (defeitos na sua degradação)


 Doença autossómica recessiva por mutação no gene HGD no cromossoma 3
 Enzima com atividade deficiente: Homogentisato 1,2-dioxigenase – em pessoas
saudáveis catalisa a conversão de Homogentisato em Maleilacetoacetato
 Produto que se acumula: Homogentisato (ácido homogentísico) – subproduto tóxico
da degradação da tirosina – e Tirosina (tirosinémia)

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ACUMULA-SE
Esquema da Degradação do aminoácido Tirosina

1. Hidroxilação da Fenilalanina em Tirosina


Catalisada pela fenilalanina hidroxilase, com oxidação de 5,6,7,8-Tetrahidrobiopterina em
7,8-Dihidrobiopterina. Esta é reduzida pela dihidrobiopterina redutase, que usa NADH,
regenerando a 5,6,7,8-Tetrahidrobiopterina
2. Transaminação da Tirosina em p-Hidroxifenilpiruvato
Catalisada pela tirosina transaminase, que transfere um grupo amina para o α-Cetoglutarato e o
converte em Glutamato
3. Descarboxilação oxidativa e hidroxilação do p-Hidroxifenilpiruvato em Homogentisato
Catalisadas pela p-hidroxifenilpiruvato dioxigenase, que reage com O2 e produz CO2
4. Abertura do anel aromático do Homogentisato em Maleilacetoacetato
Catalisada pela homogentisato 1,2-dioxigenase, que reage com O2 e liberta H+
5. Isomerização do Maleilacetoacetato em Fumarilacetoacetato
Catalisada pela maleilacetoacetato isomerase
6. Hidrólise do Fumarilacetoacetato em Fumarato e Acetoacetato
Catalisada pela fumarilacetoacetase
7. Condensação com Coenzima A de Acetoacetato em Acetoacetato-Co A
Catalisada pela 3-cetoacil-Co A transferase, que transforma Succinil-Co A em Succinato

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Sinais e Sintomas:
1. A urina torna-se escura após várias horas de exposição ao ar devido à acumulação de ácido
homogentísico, que se oxida;
2. O cerume ou cera de ouvido pode também apresentar-se escurecido ou uma cor vermelha depois
de estar exposto ao ar, dependendo da dieta, igualmente devido à acumulação de ácido
homogentísico;
3. A acumulação de homogentisato danifica as articulações pela sua toxicidade e leva a artrite tardia
devido a danos nas cartilagens. As mais afetadas são as da coluna vertebral, a da anca e do ombro.
4. Pigmentação ocular (numa idade tardia);
5. A pele pode ficar igualmente escurecida em áreas expostas ao sol e o suor pode apresentar-se
acastanhado;
6. Em mais de 25% dos casos aparecem pedras no rim e pedras na próstata (nos homens);
7. A doença cardíaca valvular pode também estar presente, principalmente regurgitação das válvulas
mitral e aórtica e calcificação;
8. As doenças cardíacas coronárias podem piorar na presença de Alcaptonúria.

Diagnóstico:
- Cromatografia em camada fina (TLC)
- Exames ao plasma e à urina para detetar a presença de Ácido homogentísico
Tratamento:
- Não há cura para a Alcaptonúria. Podem apenas controlar-se os sintomas
- Dieta pobre em fenilalanina e tirosina é aconselhada
- Vitamina C (ácido ascórbico) tem demonstrado melhorias no tratamento da artrite e da
pigmentação da pele e ocular
- O herbicida nitisinona inibe a enzima hidoxifenilpiruvato-dioxigenase e deste modo reduz a
produção de ácido homogentísico. O problema é que faz com que se acumule tirosina em última
instância e, por isso, têm sido realizados mais estudos

Albinismo (Acromia, acromasia, acromatose)


- Defeito na síntese de melanina a partir de tirosina -
 Doença genética que afeta a síntese de melanina a partir do aminoácido tirosina
 Em humanos apresenta-se predominantemente como dois tipos:

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1. Albinismo ocular -----> afeta apenas os olhos; os indivíduos apresentam os olhos de um tom
azul muito claro
2. Albinismo oculocutâneo -------> afeta os olhos, a pele e o cabelo
 Pode ser autossómica recessiva (mais comum), autossómica dominante ou ligada ao X
(apenas o albinismo ocular)
 Caracteriza-se por hipopigmentação – ausência completa ou parcial de pigmento na pele,
cabelos e olhos
 Enzima com atividade deficiente: tirosinase – enzima que contém cobre (Cu2+) e que converte
a tirosina em dihidroxifenilalanina (Dopa) e esta em dopaquinona através de uma oxidação (com
recurso a oxigénio)
 O Albinismo pode também ser devido ao excesso de fenilalanina e diminuição dos níveis da
tirosina característicos da fenilcetonúria. O excesso de fenilalanina (que não é convertida em
tirosina por hidroxilação) inibe a tirosinase e, assim, diminui a síntese de melanina

1. Hidroxilação de Tirosina em Dopa (3,4-Dihidroxifenilalanina)


Catalisada pela tirosinase (contém Cu2+) nos melanócitos ou pela tirosina hidroxilase, que usa 5,6,7,8-
Tetrahidrobiopterina
2. Hidroxilação de Dopa em Dopaquinona
Catalisada pela tirosinase nos melanócitos

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3. Várias reações até originar Melanina polimérica preta (ciclização da Dopaquinona) ou vermelha
(condensação com Cisteína)
A Tirosina é ainda precursora de várias catecolaminas como Dopa, Dopamina, Norepinefrina e Epinefrina e
de várias hormonas da tiróide.

Sinais e Sintomas:
1. Defeitos na visão como fotofobia (sensibilidade à luz), nistagmo (movimentos oculares
involuntários), astigmatismo, estrabismo, hipoplasia do nervo ótico (nervo ótico pouco

desenvolvido) – o bom desenvolvimento do sistema ocular é bastante dependente

da presença de melanina!
2. Falta de pigmento na pele (pele rosada), cabelo (cabelo branco) e/ou nos olhos, conforme o
tipo de albinismo
3. Essa falta de pigmento torna os doentes mais suscetíveis de desenvolverem hiperplasias na
pele (cancro da pele) e queimaduras solares visto que a melanina protege a pele da radiação
ultravioleta
Diagnóstico
Realizado através de um teste genético
Tratamento
Não tem cura contudo é possível tratar os sintomas.
- Cirurgia nos músculos oculares para reduzir o estrabismo, o nistagmo e o astigmatismo
- Uso de lentes e óculos para correção

Maple Syrup Urine Disease (Leucinose, Cetoaciduria de Cadeia


Ramificada)
- Defeito na descarboxilação oxidativa de α-cetoácidos ramificados -
 Doença genética e autossómica recessiva que afeta a degradação ou descarboxilação
oxidativa dos α-cetoácidos provenientes da transaminação dos aminoácidos de cadeia
ramificada: leucina, isoleucina e valina

 É um tipo de acidose orgânica


 Enzima com atividade deficiente: Complexo da desidrogenase dos α-cetoácidos ramificados

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 Produto que se acumula: Esta enzima, quando ausente, leva a um aumento dos aminoácidos
de cadeia ramificada (leucina, isoleucina e valina) e dos seus α-cetoácidos tóxicos (α-
cetoisocaproico, α-ceto-β-metilvalerato e α-cetoisovalerato, respetivamente)
O complexo enzimático está localizado na mitocôndria e é formado por quatro subunidades E1α,
E1β, E2, e E3, sendo a E3 igual à do complexo da Piruvato Desidrogenase. Mutações em genes que
codifiquem qualquer uma destas subunidades podem levar ao aparecimento da doença!
 os cofatores necessários ao bom funcionamento da desidrogenase dos α-cetoácidos de
cadeia ramificada são os mesmos que têm participação no complexo da Piruvato
Desidrogenase:

 O TPP (tiamina pirofosfato) – forma ativa da vitamina B1 – é um cofator importante nas


desidrogenases (neste encontra-se ligado à subunidade E1α) pelo que a sua falta pode igualmente
prejudicar a atividade do complexo enzimático da desidrogenase dos α-cetoácidos ramificados

O que são aminoácidos de cadeia ramificada?


(Uma revisão mesmo muito breve)
Promovem a síntese protéica, evitam o catabolismo e servem de substrato para a Neoglucogénese.
Metabolisados no músculo, tecido adiposo, rim e cérebro, não no fígado (muito afetado por esta
doença por não possuir transaminases para cadeias ramificadas). Atuam como importante fonte
energética para o músculo esquelético durante períodos de stress metabólico.

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Transaminação

Descarboxilação
Oxidativa (perda
de CO2)

1. Transaminação do aminoácido aromático em α-cetoácido


Catalisada por uma transaminase e converte α-Cetoglutarato em Glutamato
2. Descarboxilação oxidativa do α-cetoácido num Acil-Co A
Catalisada pela α-cetoácidos desidrogenase, complexo enzimático semelhante à piruvato
desidrogenase e α-cetoglutarato desidrogenase
3. Desidrogenação com formação de FADH2 e uma ligação dupla no Acil-Co A
4. Reações semelhantes à β-oxidação até produzir Propionil-Co A (Valina), HMG-Co A (Leucina) ou
Propionil-Co A e Acetil-Co A (Isoleucina)

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Sinais e Sintomas:
1. A acumulação de α-cetoisocaproico e a produção de um composto chamado sotolone é
responsável pelo cheiro a caramelo característico da urina dos doentes (“A fralda cheira a
caramelo”; “A fralda cheira a panquecas”). O cheiro pode também estar presente no cerume do
ouvido
2. Gap aniónico aumentado (gasto de bicarbonato HCO3-) e taquipneia (respiração rápida com
vasta eliminação de CO2) como forma de compensar a acidose metabólica
3. Vómitos, desidratação, letargia, hipotonia, cetose (presença de corpos cetónicos no plasma)
e cetonúria (presença de corpos cetónicos na urina), hipoglicémia, etc.
4. Ocorre a intoxicação aguda do Sistema Nervoso Central (encéfalo e medula espinhal) que se
manifesta como atraso mental, mau desenvolvimento cerebral, coma e se a doença não for
tratada pode levar à morte da criança
5. Toxicidade hematopoiética origina leucotrombocitopenia e anemia

Diagnóstico
- Cromatograma HPLC (High Performance Liquid Chromatography) para detetar o excesso de
Leucina, Isoleucina e Valina – Separam-se os aminoácidos a nível plasmático!

Verifica-se principalmente um pico de LEUCINA (daí o nome alternativo de Leucinose para a


doença)

Tratamento
A doença é FATAL se não se administrar uma dieta pobre em aminoácidos de cadeia ramificada.
Alguns doentes melhoram com a administração de tiamina (TPP).
Porquê administrar tiamina pirofosfato?
Porque este é um dos cofatores necessários às desidrogenases.

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Homocistinúria
- Defeito na degradação da metionina -
 Doença genética, autossómica recessiva
 O que pode correr mal?
1. Deficiência da cistationina β-sintetase (forma mais frequente)
2. Deficiência de metileno-tetrahidrofolato redutase (2.ª forma mais frequente) - pode
estar associada a anemia megaloblástica
3. Deficiência da metionina sintetase

Défices vitamínicos:
1. Vitamina B6 (piridoxina) – Forma ativa: piridoxal fosfato - cofator da cistationina β-
sintetase
2. Vitamina B9 (ácido fólico) – Forma ativa: ácido tetrahidrofólico (THF ou
tetrahidrofolato) – cofator da metionina sintetase
3. Vitamina B12 (cobalamina) – cofator da metionina sintetase
Metionina:

armadilha de folatos

metileno-tetrahidrofolato NAD(P)+
redutase Serina
NAD(P)H
Vit. B6 Cistationina β-sintetase
beta sintetase
N5, N10-Metilenotetrahidrofolato Cistationina

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Síntese da homocisteína
1. A metionina (aminoácido essencial e apolar) é convertida em S-adenosilmetionina (SAM)
– Esta reação é catalisada pela metionina Adenosil-transferase (MAT) e necessita de ATP –
2. Perda de grupos metil por parte da SAM formando-se S-adenosilhomocisteína
– Esta reação é catalisada por várias metil-transferases –
3. A S-adenosilhomocisteína é hidrolisada, perde o grupo adenosina e forma-se a homocisteína.

Destinos da homocisteína

HOMOCISTEÍNA

1. Pode ser usada para 2. Pode ser usada para regenerar 3. Em caso de défice enzimático e
formar cistationina e a metionina e o tetrahidrofolato acumulação da homocisteína,
cisteína. (TFH - forma ativa da vitamina B9) esta segue uma via alternativa e
forma-se homocistina (2
- Reação catalisada pela - Esta reação é catalisada pela
homocisteínas ligadas S-S) que é
metionina sintetase que tem
cistationina β-sintetase que excretada na urina.
como cofator a vitamina B12 e
tem como cofator o piridoxal
aqui a homocisteína recebe
fosfato -
grupos metil do 5-Metil-THF que,
Nota: A cistationina origina após perder o grupo metil se
regenera em THF. Por sua vez a
cisteína, NH4+ e α-
homocisteína ao receber os
cetobutirato que por sua vez
grupos metil regenera-se em
vai dar origem ao Propionil-
metionina -
CoA e este ao Succinil-CoA,
que é um intermediário do
ciclo de Krebs.

Nota: A MTHFR (metileno tetrahidrofolato redutase – origina 5-Metil-Tetrahridrofolato) é


inibida alostericamente pela SAM; assim, altos níveis de metionina previnem a formação de
5-metil-tetrahidrofolato e, indiretamente, inibem a síntese de metionina a partir da
homocisteína porque deixa de haver 5-Metil-THF para doar grupos metil à homocisteína.
Por sua vez a SAM vai estimular alostericamente a cistationina β sintetase!

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Sinais e Sintomas:
– O excesso de homocisteína leva à inibição do cross-linking de colagénio ao nível da lisina oxidase.
Esta enzima favorece a ligação do colagénio e da elastina (a lisina-oxidase influencia então a solidez
dos ossos, dos tendões e a elasticidade das paredes das artérias).
- O excesso de homocisteína faz aumentar os níveis de homocisteína tiolactona, verifica-se a tiolação
(adição de grupos SH) dos grupos amina das LDL que se vão agregar e ser endocitadas pelos
macrófagos, criando assim placas de ateromas que vão causar a oxidação lipídica e a agregação das
plaquetas. As paredes das artérias sofrem, desta forma, de fibrose e calcificação das placas
ateroscleróticas, o que leva à doença vascular.
1. Musculoesqueléticos
- Estatura elevada, membros longos e delgados, pes cavus (pés com grande curvatura no
bordo interno)
- Constelação de sintomas semelhantes ao Síndrome de Marfan
- Osteoporose infantil
- Aumento do tónus muscular
2. Anomalias oculares
- Ectopia lentis (deslocamento do cristalino), miopia, glaucoma, atrofia do nervo ótico
3. Doenças Vasculares
- Tromboses intravasculares e formação de ateromas extensivos na infância
4. Do Sistema Nervoso Central
- Atraso mental
- Convulsões e distúrbios psicóticos

Diagnóstico
 Deteção da presença excessiva de homocisteína no plasma e homocistina na urina
 Teste de resposta à Piridoxina.

Tratamento
Dieta pobre em metionina e proteínas, administração de vit. B6, vit. B9, vit. B12 e incluir cisteína na
dieta (responsável pela capacidade redutora do Glutatião e formação de ligações S-S).

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Acidémia Metilmalónica
- Defeito na conversão de metilmalonil-CoA em Succinil-CoA -
Afeta a degradação de aminoácidos não polares e de lípidos com número ímpar de carbonos.

Ciclo de Krebs

Vit. B7 Vit. B12


Neoglucogénese
Propionil-Co A Metilmalonil-Co A Metilmalonil-Co A
Causas: carboxilase epimerase mutase
Défice da Metilmalonil-Co A mutase, de Vit. B12, de Cobalamina redutase ou adenosiltransferase
(regeneram a Cobalamina ou convertem-na numa forma ativa como a Adenosilcobalamina)

Sintomas:
 assintomática no recém-nascido
 aversão às proteínas
 vómitos, desidratação
 hepatomegália, insuficiência renal, pancreatite
 hipoglicémia, hiperglicinémia (degradada em Propionil-Co A)
 aumento do ácido metilmalónico (metilmalonato reduzido) e toda a sintomatologia associada
às acidémias:
 diminuição do pH sanguíneo
 hiperamoniémia
 aumento da frequência respiratória
 encefaleias
 inércia (letargia) e hipotonia
 alterações ou atrasos neuronais,
 atrasos no desenvolvimento
 anemia megaloblástica ou até coma

Diagnóstico:
 Teste de Guthrie (medição dos níveis de ácido metilmalónico)
 gasometria, medição dos níveis de aminoácidos ou de ácido metilmalónico
 análise genética

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Tratamento:
 dieta hipoproteica pobre em Valina, Isoleucina, Metionina e Treonina (degradados em
Propionil-Co A), rica em glicose e ácidos gordos com número par de carbonos (para promover
um estado anabólico e inibir o catabolismo) e com suplementos de Vit. B12 e de carnitina
(conjuga-se com e destoxifica Propionil-Co A e Metilmalonil-Co A)
 aumento da frequência respiratória, administração gradual de HCO3- (para acidémias graves)
 transplante de fígado
 hidratação
 hemodiálise (remoção de metabolitos tóxicos)
 antibióticos (bactérias intestinais produzem propionato)

34
PATOLOGIAS ASSOCIADAS A DISFUNÇÕES DO CICLO DA UREIA
AULA TEÓRICA 5
CLÁUDIA COSTA | EL-DANI

OBJECTIVOS: Analisar alterações bioquímicas nas doenças hereditárias do ciclo da ureia, nomeadamente:
1.1. Hiperamoniémia tipo 1
1.2. Hiperamoniémia tipo 2
1.3. Citrulémia
1.4. Acidúria Argininosuccínica
1.5. Hiperargininémia

Para começar, as patologias derivadas de disfunções do ciclo da ureia são patologias


hereditárias, normalmente pediátricas, e podem culminar na morte dos indivíduos, se não forem
identificadas atempadamente. A Hiperamoniémia tipo 2 (défice da enzima Ornitina
Transcarbamoilase - OTC) é a patologia mais frequente.

Mas afinal porque ocorrem estas patologias?

Transaminação que envolve o glutamato


É o principal modo de remoção de grupos α-NH2 provenientes do catabolismo de
aminoácidos, segundo a reação seguinte.
α-cetoglutarato + L-aminoácido L-glutamato + α- cetoácido
Esta reação é catalisada pela enzima aminotransferase/transaminase (transfere grupos
amina) que têm como cofator vitamina B6 (Piridoxal Fosfato - PLP). Destas reações surgem logo
duas possíveis origens das patologias:
1. Défice de aminotransferase/transaminase (Não há metabolismo);
2. Défice de vitamina B6.
É importante referir que a Lisina, Arginina e Treonina não sofrem transaminação e que no caso
da alanina e do aspartato, que também transferem grupos amina, para além do glutamato, as
reações que se processam são ligeiramente diferentes:

α-cetoglutarato + L-alanina L-glutamato + Piruvato (ocorre no fígado)

Catalisada pela enzima alanina transaminase/transaminase glutâmico-pirúvica (TGP)


Cofator: PLP 35
α-cetoglutarato + L-aspartato L-glutamato + Oxaloacetato

Catalisada pela enzima aspartato transaminase/transaminase glutâmico-oxaloacética (TGO)


Cofator: PLP

Destas reações surgem logo outras duas possíveis origens de patologias.


1. Défice de TGO e/ou TGP (Não há metabolismo);
2. Défice de vitamina B6 (novamente).

Desaminação oxidativa do glutamato


É usada para a libertação de NH2 no fígado, segundo a reação seguinte:

Glutamato + H2O α-cetoglutarato + NH4+ (amónia)

Catalisada pela enzima glutamato desidrogenase. Na reação que se efetua no sentido


direto, existe a conversão de NAD(P)+ em NAD(P)H + H+, ou seja, depende de NAD(P)+. Já no
sentido inverso, depende de NAD(P)H.

A amónia produzida pode ser, agora, utilizada para 3 fins, nomeadamente:


 Biossíntese;
 Excreção direta pelo rim;
 Vai para o fígado, para ser usada no ciclo da ureia (a maior parte segue esta via).

Tal como já foi referido, a glutamato desidrogenase catalisa esta reação. Esta enzima é
altamente regulada, daí que uma mínima alteração na sua regulação pode afetar, embora que
indiretamente, o ciclo da ureia.

Regulação da Glutamato desidrogenase


Catabolismo (sentido direto) Anabolismo (sentido inverso)
ATIVA INATIVA ATIVA INATIVA

↑ADP ↓ADP ↑ATP ↓ATP


↑GDP ↓GDP ↑GTP ↓GTP
↑NAD+ ↓NAD+ ↑NADPH ↓NADPH

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Concluindo, o fígado é o órgão que centraliza o metabolismo dos aminoácidos, tendo o
glutamato um papel central nos processos de transaminação, com eliminação de NH4+
formando-se ureia. O transporte da amónia para o fígado faz-se predominantemente pela
glutamina (glutamato + amónia) e pela alanina (no músculo).

Falta-nos rever o último passo para a remoção final da amónia do nosso organismo, processo
esse que ocorre conjuntamente na mitocôndria e no citosol dos hepatócitos. Assim, e como já
foi referido, este processo ocorre no fígado. Estamos, pois, a falar do CICLO DA UREIA.
Ciclo da ureia

37
Explicação do ciclo: O Ciclo da Ureia tem início na mitocôndria (matriz), onde a amónia reage
com HCO3-, com a intervenção da enzima Carbamoil fosfato Sintetase I (CPS-I), formando-se
Carbamoil fosfato (CP), que é o iniciador do ciclo. Esta enzima tem como cofator o N-Acetil
glutamato e precisa de energia. De seguida, dá-se a condensação do CP com a Ornitina (enzima:
Ornitina transcarbomoilase), formando Citrulina, que sai da mitocôndria para o citosol. Aí, reage
com o Aspartado (enzima: Arginino succinato sintetase), que provem do Ciclo de Krebs,
formando Argininosuccinato, reação que também precisa de energia. Este, por sua vez, vai se
transformar em Arginina (enzima: Arginino succinase ou arginino sucinato liase) que vai reagir
com água formando a ureia e regenerando a ornitina, que vai regressar à mitocôndria voltar a
reagir com o CP e assim sucessivamente.
Deste processo destaca-se o N-Acetil glutamato (NAG) que corresponde ao cofator da
primeira enzima do ciclo. Ora, o NAG é um regulador alostérico da CPS-I que resulta da
combinação do grupo acetil, proveniente de Acetil-CoA, com o glutamato, pela NAG-sintetase.
Desde já, percebe-se que um défice neste cofator ou mesmo na sua formação, podem originar
patologias.

Carbamoil Fosfato Sintetase II (CPS-II)


Esta enzima catalisa um passo num processo que não pertence ao Ciclo da Ureia, que é
a síntese de novo de pirimidinas. Este processo será estudado mais à frente. O quadro seguinte
diz respeito à comparação entre as duas enzimas (CPS-I e CPS-II), onde se pode concluir que a
principal diferença entre elas duas é o facto de a CPS-I não ter um inibidor e a CPS-II, sim.

Comparação entre CPS-I e CPS-II


CPS-I CPS-II
Via de atuação Ciclo da ureia Biossíntese de pirimidinas
Fonte de azoto NH4+ Glutamina
Localização Mitocôndria Citosol
Cofator (Ativador) N-Acetil glutamato PRPP
Inibidor - UTP

Antes de passarmos às patologias propriamente ditas, é importante referir que


determinados produtos provenientes do Ciclo da Ureia, servem como precursores da
Neoglicogénese, nomeadamente o Fumarato, que se transforma em Oxaloacetato, pela
intervenção das formas citosólicas das enzimas a seguir mencionadas.

38
___________________Doenças do Ciclo da Ureia_________________
São um grupo de doenças que resultam de uma deficiência enzimática específica que afecta este
ciclo. A gravidade destas é variável, podendo ser detectada em várias etapas do
desenvolvimento, desde o recém-nascido ao adulto.
O que provocam? Levam ao aumento da amónia sanguínea (hiperamoniémia), que pode ser
mais grave ou mais ligeira. Consequentemente, ocorre uma alteração da função e lesão cerebral.
Como se manifestam? Manifestam-se através de alterações no estado de consciência, vómitos,
agressividade, discurso por vezes incoerente, desequilíbrio na marcha, hepatomegália e
convulsões.
O diagnóstico é baseado na detecção da deficiência na enzima hepática, na clínica e história
familiar, uma vez que são doenças genéticas.

Deficiências enzimáticas hereditárias do Ciclo da Ureia


Na tabela e esquema seguintes, estão presentes as 5 principais doenças diretamente
ligadas à deficiência de enzimas do Ciclo da Ureia.

Patologia Enzima afectada Excesso de


Hiperamoniémia tipo I Carbamoil-fostato sintetase I Amónia (NH4+)
Hiperamoniémia tipo II Ornitina transcarbamoilase Carbamoil-fosfato
Citrulinémia Argininosuccinato sintetase Citrulina
Acidúria arginino-succínica Argininosuccinase Arginino Succinato
Hiperargininémia Arginase Arginina

39
Patologia Descrição da doença Tratamento
Disfunção familiar rara, autossómica recessiva.

Hiperamoniémia tipo I _______________


Sintomas: letargia, coma, convulsões, vómitos, hiperventilação,
hepatomegália.
Associada ao cromossoma X (homozigóticos masculinos e
heterozigóticos femininos). Caracteriza-se pela aversão à ingestão
de alimentos com alto conteúdo proteico, pois há uma elevada
concentração de glutamina no plasma, no LCR e urina (ocorre um
Hiperamoniémia tipo II _______________
aumento da sua síntese, devido aos elevados níveis de amónia).

Sintomas: sinais neurológicos (irritabilidade, agressividade, letargia,


coma e morte)
Doença genética rara, autossómica recessiva. Caracteriza-se pela
existência de níveis elevados de citrulina no plasma e no LCR (líquido
A ingestão de arginina aumenta a
Citrulinémia cefalo-raquidiano).
excreção de citrulina.

Sintomas: convulsões, vómitos, hepatomegália


Doença genética rara, autossómica recessiva. Caracteriza-se pela
A ingestão de arginina aumenta a
existência de níveis elevados de arginino-succinato no plasma, urina
Acidúria arginino- excreção de azoto (que é uma via
e LCR.
succínica de excreção do arginino-
succinato).
Sintomas: letargia, vómitos, hiperventilação, hepatomegália
A ingestão de alimentos pobres
Doença autossómica recessiva. Caracteriza-se pelo aumento dos
Hiperargininémia em proteínas reduz os níveis
níveis de arginina no plasma e LCR.
plasmáticos de amónia.

40
Relação da enzima Carbamoil-Fosfato Sintetase II com a síntese de Pirimidinas

No esquema do lado esquerdo, é possível observar a


relação entre a enzima CPS II e a formação de orotato/ácido
orótico. Quando há um défice nesta enzima, não há síntese de
carbamoil-fosfato e consequentemente não há formação de
orotato. Assim a síntese de pirimidinas fica comprometida.
O esquema do lado direito relaciona-se com a formação de
UMP. Na patologia Acidúria Orótica (excesso de orotato na urina),
o ácido orótico é excretado na urina, pois as enzimas que o
convertem em uridina monofosfato (orotato
fosforribosiltransferase e orotidina 5’-fosfato descarboxilase)
estão defeituosas. Deste modo, as pirimidinas não podem ser
sintetizadas e consequentemente não ocorre um normal
crescimento. O tratamento consiste na administração oral de
uridina; esta é convertida em UMP, que evita o bloqueio
metabólico e permite que o organismo obtenha pirimidinas.

Investigação da Hiperamoniémina – Qual a causa?


De modo a avaliar o que está na base da elevada concentração de amónia no plasma, recorre-
se a este diagrama:

Legenda

ASA – ácido arginino-succínico; THAN – hiperamoniémia transeunte do recém-nascido; LPI – “lysinuric protein intolerance”;
HHH – síndrome de hiperamoniémia-hiperornitinémia-homocitrulinuria; OTC – ornitina transcarbamoilase; CPS – carbamoil-
fosfato sintetase; NAGS – N-acetilglutamato sintetase
NOTA: O ácido orótico na urina tende a estar elevado na LPI e HHH, mas a concentração de citrulina é normal.
41
Outros métodos de investigação…
- Níveis de ácido orótico baixos ou normais: biópsia hepática (para avaliar a actividade
enzimática)
- Níveis de ácido orótico elevados: biópsia hepática (para avaliar alterações moleculares)
- Ensaio enzimático em fibroblastos
- Ensaio enzimático a nível sanguíneo, quando os níveis de arginina são elevados (devido ao
défice da enzima arginase)

Alterações do metabolismo dos aa - Patologias


Detecção no cromatograma HPLC (cromatografia de alta pressão)

(cromatograma normal) cromatograma indicador de citrulinémia


(níveis elevados de citrulina)

A amónia é neurotóxica. Porquê?


Por deficiência do ciclo da ureia ou na eliminação renal da amónia, ocorre um aumento
dos níveis de amónia circulante que conduzem a lesão cerebral. Como? Para além da alteração
de pH que provoca, a amónia atravessa a BHE (barreira hematoencefálica) por ser lipossolúvel;
no cérebro, ao reagir com o glutamato (via desidrogenase do glutamato) leva ao aumento dos
níveis de glutamina que se expressa em edema cerebral. Consequentemente, ocorre diminuição
de alfa-cetoglutarato e de oxaloacetato (pois este reage com a amónia, formando aspartato).
Assim, dá-se uma diminuição/ interrupção do TCA (não ocorre posteriormente a fosforilação
oxidativa, e acontece um decréscimo na produção de ATP, contribuindo para a lesão cerebral e
morte neuronal). A amónia livre é também tóxica pois provoca a alteração dos
neurotransmissores no cérebro.

42
Hiperamoniémia em consequência da disfunção hepática
Uma das causas da hiperamoniémia relaciona-se com problemas no fígado, que podem ser
agudos (provocados por toxinas ou inflamações) ou crónicos (causados por inflamações, álcool,
congestão venosa ou por doenças hereditárias associadas), nos quais se destaca a cirrose. Isto
leva à disfunção do fígado, cujas consequências são: hipoalbuminémia, hipertensão portal,
colestasia, …

Caso Clínico – Diagnóstico tardio de um caso de défice no ciclo da ureia

- Indivíduo do sexo feminino


- 65 Anos
- Diagnóstico: hérnia abdominal
- Alvo de cirurgia: 2 dias após: declínio progressivo do estado mental
- Níveis de NH4+ sérica na admissão: 140 µM (N=50). Aumentou para 218 µM no dia seguinte.
- Níveis de Glutamina elevados
- Alcalose respiratória persistente
- Hiato Aniónico constante
- Apresenta baixa atividade cerebral
- Valores normais de citrulina e arginina
- Alopurinol (gota) pode ter influenciado pirimidinas e ácido orótico

Progressão do estado clínico


- Hiperamoniémia e encefalopatia severa progressiva → tratamento com lactulose (filtração por
hemodiálise, dieta com baixo teor em proteínas e administração intravenosa de arginina).
- Amónia decresceu para 54µM, mas a doente continuava inconsciente.
- Retirou-se o tratamento. Amónia aumentou para 490µM.
- Doente faleceu.
- Redução marcada da CPSI e da actividade da OTC.

43
Pergunta do final da aula
5 crianças com diferentes valores de ácido orótico, citrulina, arginina e NH4+ a nível sanguíneo.
Qual a enzima em falta?

Ácido Citrulina Arginina NH4+ Enzima em défice


Orótico
I Baixo Baixo Baixo Elevado CPS I

Elevado Arginina Succinato


II - Baixo Elevado
(Muito) Sintetase

III - - Elevado Moderado Arginase

Ornitina
IV Elevado Baixo Baixo Elevado
Transcarbamoilase

Arginina sucinato
V - Elevado Baixo Elevado
liase

Sobre as disfunções no ciclo da ureia:


- Manifestação clínica ocorre normalmente durante o período neonatal.
- Os níveis encontram-se normais no nascimento, mas após 24h os indivíduos apresentam
letargia, hipotonia e aumento dos níveis de glutamina, que provocam toxicidade cerebral.
- Crianças com défice nas primeiras 4 enzimas apresentam-se normais, mas desenvolvem de
forma progressiva a doença.
- Deficiência em arginase é menos severa.
- Hiperamoniémia e edema cerebral são devidos a acumulação de glutamina.

Tratamento
 Dieta pobre em proteínas.
 Suplemento de arginina (menos eficaz se ainda houver formação de arginina-sucinato), se o
défice enzimático for posterior, para regeneração da ornitina e continuação do ciclo;
excreção de nitrogénio ocorre na via arginina sucinato.
 Utilização de compostos que conjugam aa e permitem a sua excreção:
o Benzoato  Benzoil-CoA  Reage com glicina  ácido hipúrico/hipurato 
eliminado na urina.
o Fenil butirato  Fenil acetato  reage com Glutamina  Fenil Acetil-Glutamina 
pode ser eliminada.

44
INTOLERÂNCIA À FRUTOSE E GALACTOSÉMIA
AULA TEÓRICA 6
Os nomes estão maiores devido a complexos de inferioridade.

CHEFE PIRES | SALAZAR _________

Metabolismo da Frutose

A frutose é um monossacarídeo que pode ser obtido quer através da sacarose (glucose +
frutose), quer pela desidrogenase do sorbitol ou até mesmo ingerida como açúcar livre na dieta
(mel).
A metabolização da frutose ocorre principalmente no fígado, na mucosa do intestino
delgado e no córtex renal.
O primeiro passo na metabolização da frutose, tal como acontece na glicólise é a
fosforilação da mesma. Tanto pode ser fosforilada pela hexocinase em frutose 6-P, intervindo
diretamente na via glicolítica, ou pela frutocinase (maior Vmáx), sendo convertida em frutose
1-P (com consumo de ATP).
O segundo passo é clivar, através de uma aldolase (essencialmente a do tipo B*), a frutose
1-P formada em gliceraldeído e dihidroxiacetona-P. Estes dois produtos integram a glicólise
quando convertidos a gliceraldeído 3-P (através da triose cinase e da isomerase,
respetivamente).

*Existem vários
tipos de aldolases,
tipo A (músculo), tipo
B (fígado), tipo C
(cérebro) e existe
também uma
aldolase fetal.

45
Intolerância Hereditária à Frutose, IHF

A intolerância à frutose é uma doença autossómica recessiva e ocorre porque existe um


défice na enzima aldolase B, responsável pela clivagem da frutose 1-P em gliceraldeído e
dihidroxiacetona-P.
Este défice leva a uma intoxicação metabólica pela acumulação de frutose 1-P tendo como
consequências:
 Inibição da fosforilase do glicogénio, diminuindo a glicogenólise e a capacidade de
regenerar glicose a partir do glicogénio;
 Inibição da condensação da dihidroxiacetona-P com gliceraldeído 3-P, fundamental para
a neoglicogénese ocorrer;
 Inibição da conversão de glucose 6-P a frutose 6-P, inibindo assim o fluxo da via
glicolítica diminuindo a concentração de ATP; esta diminuição é também justificada pela
diferença entre a taxa de fosforilação da frutose a frutose 1-P pela frutocinase (elevado Vmáx)
no fígado e a formação de ATP na mitocôndria – a maioria dos Pi são utilizados para fosforilar a
frutose em vez de formar ATP;
 Pode ocorrer também uma inibição da frutocinase pelo produto (frutose 1-P);
 Estimulação do metabolismo das purinas (de maneira a compensar a diminuição da
concentração de ATP).

A intolerância hereditária à frutose é caracterizada por:


 Hipoglicémia severa: pois ocorre uma diminuição da glicogenólise e da neoglicogénese;
 Alterações gastrointestinais e sintomatologia geral: irritabilidade, hipersudorese,
tremor, anorexia, vómitos, distensão abdominal, má progressão ponderal, hemorragia digestiva,
palidez, apatia, letargia, coma, choque;
 Disfunção hepática: hepatomegália, esplenomegália, icterícia, ascite (presença de
líquido na cavidade peritoneal), insuficiência hepática (hiperbilirrubinémia, hipoalbuminémia,
coagulopatia e aumento dos a.a. metionina e tirosina), cirrose, hepatite;
 Disfunção renal: oligúria e anúria (diminuição ou ausência da produção de urina),
tubulopatia proximal e raquitismo.
 Acidose metabólica;
 Hipofosfatémia;
 Hiperlactacidémia;

46
 Hiperuricémia: consequência da estimulação do metabolismo das purinas.
Os sintomas são mais evidentes nos lactentes (desde os 28 dias até aos 2 anos). Nos adultos
é menos frequente, pois estes são mais “tolerantes” à IHF, apresentando, por norma, vómitos e
mal-estar.
O diagnóstico é feito com base nos exames bioquímicos ao plasma e à urina, pela pesquisa
de açúcares redutores na urina, testes de tolerância à frutose, estudos moleculares e estudo das
aldolases quer por biopsia hepática quer no intestino delgado.
A terapia assenta na suspensão de frutose e quaisquer outros glúcidos convergentes, como
a sacarose ou o sorbitol e através de intervenções medicamentosas. Se detetada precocemente,
o prognóstico é bom e espera-se um crescimento e desenvolvimento normais.

Frutosúria Essencial

A frutosúria essencial é uma anomalia autossómica recessiva, benigna e assintomática,


ocorre por défice na enzima frutocinase e manifesta-se, após a ingestão de frutose por níveis
excecionalmente elevados de frutose no sangue e na urina.

Metabolismo da Galactose

A Galactose, ao entrar no organismo, é


primariamente fosforilada pela Galactocinase, com
consumo de ATP, transformando-se em Galactose-
1-P.
Depois, graças à acção da Galactose-1-P-
uridiltransferase (que, tal como o noma indica, faz a
transferência de grupos uridil), dá-se uma reacção
entre a Galactose-1-P e a UDP-Glucose, que resulta
na formação de Glucose-1-P e UDP-Galactose. Nesta
reacção, importa também referir o papel da UDP-
Galactose-4-epimerase, que possibilita a passagem
da UDP-Galactose a UDP-Glucose (ou o contrário – é
uma enzima reversível). Assim, esta enzima regenera a UDP-glucose para que esta possa entrar
outra vez no metabolismo de novas moléculas de Galactose. Há ainda outra enzima,
denominada Pirofosforilase, que catalisa a passagem de Galactose-1-P a UDP-Galactose (pode
sofrer depois a acção da Epimerase).

47
De seguida, a Glucose-1-P é transformada em Glucose-6-P, pela Fosfoglucomutase. Assim,
a Glucose-6-P formada vai entrar na glicólise ou na neoglicogénese.
Existe ainda uma associação entre o Metabolismo da Galactose e a síntese de glicogénio,
pois a UDP-Glucose, intermediário na formação do glicogénio, “participa” também no
metabolismo da Galactose.

Galactosémia

A Galactosémia é uma doença hereditária autossómica recessiva . Existem 3 tipos de


Galactosémias, todos caracterizados por defeitos enzimáticos diferentes.
A Galactosémia clássica, e mais comum, caracteriza-se pelo defeito na enzima galactose-1-
P-uridiltransferase. Esta falta desta enzima resulta num acumular de Galactose-1-P, que não se
transforma em Glucose-1-P. Esta acumulação tem diversas consequências (são semelhantes em
todos os tipos de Galactosémias) no organismo:
 Cataratas – a acumulação de Galactose -1-P irá fazer
com que o excesso de Galactose seja utilizado noutras vias.
No olho, a Galactose vai ser reduzida em Galacticol. Esta
substância provoca um aumento da pressão osmótica,
fazendo assim com que entre água no cristalino e levando
assim à ocorrência de cataratas.
 Hepatomegalia - causada por acumulação galactitol
nas células hepáticas, levando a um aumento da pressão osmótica e à entrada de água nessas
células.
 Hipoglicémia – a Galactose-1-P leva à inibição da Fosfoglucomutase, que, para além de
participar no metabolismo da Galatose, é também importante na degradação de glicogénio e na
neoglicogénese. Assim, se não existir actividade da fosfoglucomutase, não há libertação nem
controlo dos níveis de glicose plasmática, levando assim à hipoglicémia.
 Icterícia – a formação de ácido glucorónico está dependente da existência de glucose-1-
P disponível. Assim, se esta não é formada, devido à interrupção do metabolismo da galactose,
este ácido não se forma. Como sabemos, esta molécula tem um papel fundamental na
conjugação da bilirrubina. Consequentemente, a acumulação da bilirrubina não conjugada em
circulação vai levar a uma situação de icterícia.
 Lesões cerebrais – são também consequência do excesso de bilirrubina que pode-se
acumular na BHE (barreira hematoencefálica).

48
 Falhas Renais – devido à acumulação de Galactose ou dos seus metabolitos nos rins.
 Letargia – como a produção de Glucose-1-P proveniente da Galactose diminui, não há
tanta produção de ATP através da via glicolítica, o que leva a situações de cansaço.
 Catabolismo de Purinas – é realizado para tentar compensar a falta de ATP.
 Hiperuricémia – é resultante do aumento dos níveis de fosfato, provenientes da
degradação das purinas.
 Vómito e Diarreia – a ingestão de produtos ricos em Galactose (ou até Lactose, que se
“desdobra” em Galactose e Glicose) leva a Vómitos ou Diarreias, uma vez que o organismo é
incapaz de metabolizar a Galactose ingerida.
 (Falhas Ováricas – causas ainda são desconhecidas)
Outro dos tipos de Galactosémia, a não clássica, consiste no defeito na Galactocinase, que
fosforila a Galactose em Galactose-1-P. Assim, neste tipo de doença, em vez da acumulação de
Galactose-1-P há uma acumulação de Galactose no organismo.
Por fim, o último tipo de Galactosémia resulta na falta da enzima UDP-Galactose-4-
epimerase. Nesta situação, não há interconversão entre UDP-Galactose e UDP-Glucose, o que
resulta, tal como na Galactosémia clássica numa acumuação de Galactose-1-P no ser afectado.
Uma das características das Galactosémias (do 1º e 3º tipos mencionados) é que os adultos
são menos afectados por estas doenças do que as crianças. Este facto está directamente
relacionado com a enzima Pirofosforilase, que se encontra mais expressa nos adultos do que
nas crianças. Assim, em indivíduos mais velhos, a acumulação de Galactose-1-P é menor, uma
vez que esta pode ser metabolizada em UDP-Galactose através da Pirofosforilase (assim a
sintomatologia é mais atenuada nos adultos).

O tratamento para estas doenças consiste em diminuir ao máximo a ingestão de alimentos


que contenham Galactose ou até Lactose, de modo a que os sintomas sejam em menor número
e menos graves.

49
50
DÉFICE DA PIRUVATO DESIDROGENASE (PDH)
AULA TEÓRICA 7
Mafalda Moreira |Marta Campos

Piruvato
 O piruvato ou ácido pirúvico (C3H4O3) é um composto orgânico que corresponde ao
produto final da glicólise.
 De uma forma geral, em condições
anaeróbicas o piruvato pode sofrer uma
descarboxilação pela ação da enzima
piruvato descarboxilase, formando etanol
ou pode ser reduzido pela enzima lactato
desidrogenase, formando-se lactato. Em
condições aeróbias, o piruvato sofre uma
descarboxilação oxidativa pela enzima
piruvato desidrogenase (PDH), formando-
se acetil-CoA, que vai ser utilizada no ciclo
de Krebs.

 Existem várias vias metabólicas do piruvato, algumas das quais já referias. Salienta-se
ainda a formação de oxaloacetato, pela piruvato carboxilase que carboxila o piruvato.
Além disso o piruvato também pode ser transaminado pela transimanase glutâmico-
pirúvica, permitindo a formação de alanina. É de extrema importância perceber estas
diversas vias metabólicas, uma vez que, os produtos formados a partir do piruvato
podem servir como biomarcadores de uma determinada patologia, dado que, quando
há acumulação piruvato (nomeadamente quando há défice de PDH), este pode seguir
outras vias.
Nota: A conversão de piruvato em oxaloacetato é ativada pela acetil-CoA pelo que, quando há défice da PDH e
consequente acumulação de piruvato, a conversão deste em oxaloacetato é pouco provável.

51
Piruvato Desidrogenase (PDH)
 Corresponde a um complexo enzimático (E1, E2, E3) que catalisa os passos entre a
formação do piruvato, no citoplasma (pela glicólise) e a formação da acetil-CoA
(essencial no ciclo de Krebs) dentro da matriz mitocondrial.

Enzima Cofator Reação Catalizada


E1 - Piruvato TPP Descarboxilação oxidativa do
desidrogenase piruvato
E2 - Di-hidro-lipoil Lipoamida Transferência de acetil à CoA
transacetilase CoA-SH
E3 - Di-hidro-lipoil FAD Regeneração da forma oxidada da
desidrogenase NAD+ lipoamida

 Este complexo tem vários cofatores:


o Tiamina pirofosfato (TPP)/Vitamina B1 (tiamina);
o Coenzima A – cujo cofator é a vitamina B5 (ácido pantoténico);
o Lipoamida;
o NAD+ - Cujo cofator é a vitamina B3 (niacina);
o FAD – Cujo cofator é a vitamina B2 (riboflavina).
AMP +
GTP -
 Resumo da reação da PDH: Fosforilação -

+ + + - -

52
Regulação da atividade da PDH
 Inibição pelo produto: Acetil-CoA e NADH
o A CoA-SH e NAD+ revertem a inibição;
o O aumento da quantidade de piruvato ativa a PDH.
 Regulação por nucleótidos:
o GTP: Inativa;
o AMP: Ativa.
 Regulação por fosforilação reversível:
o Inativação por fosforilação num resíduo de serina.

Nota: A atividade de PDH decresce quando a célula possui carga energética elevada.

 A Acetil-CoA é um metabolito convergente, não sendo formada apenas pela ação da


enzima piruvato desidrogenase. Esta pode ser formada pela β-oxidação de ácidos
gordos, através do metabolismo dos aminoácidos bem como dos polissacarídeos.
Apesar de ter várias origens a Acetil-CoA é essencial para se dar inicio ao ciclo de Krebs.

Défice da PDH – Caso Clínico:


 1º Filho de pais saudáveis, não consanguíneos (Consanguinidade – Aumenta
probabilidade de existência de doenças hereditárias recessivas);
 Sem história de doenças hereditárias (Se houvesse história positiva com sintomas
compatíveis, teria de se excluir essa patologia);
 1º Internamento na 3ª semana de vida – pneumonia;
 Seguem-se 4 internamentos - crises de hipotonia (baixa tonicidade 
muscular) e
desequilíbrio; “falta de ar”;
 Aos 3 meses: atraso de desenvolvimento (após análise das curvas de desenvolvimento);
 Aos 9 meses: febre e convulsões - fenobarbital;
 Aos 2 anos: acidose láctica (Perante o aumento do piruvato, a recção alternativa foi
formar lactato pela lactato desidrogenase). Exame bioquímico: hiperlactacidémia no
plasma;
 Apresenta-se na consulta de desenvolvimento:

o ↓ Peso e estatura;
o ↓ Perímetro cefálico;
o Subfebril, prostrado (debilitado, enfraquecido), hipotónico (bioquimicamente,
devido à falta de ATP, há comprometimento da atividade muscular, dado ser
um dos tecidos que requer mais ATP);

53
o Polipneia (frequência respiratória 60 c/min - anormal);
o Taquicardia (frequência cardíaca 150 c/min – acima do normal);
o Pálido;
o Atraso de desenvolvimento moderado.

Nota: As doenças hereditárias do metabolismo são, normalmente, caracterizadas por atraso no desenvolvimento e
no crescimento, recusa alimentar e vómitos.

 Radiografia do tórax;
 Gasimetria – acidose metabólica, com compensação respiratória
o pH: 7,33 (N: 7,35-7,45);
o pCO2: 16 mmHg (N: 35-45 mmHg);
o pO2: 110 mmHg (N: 88-108 mmHg);

o HCO3-: 8,3 mM (N: 24-27 mM);


PRINCIPAIS ÁCIDOS A CONTRIBUIR PARA A ACIDOSE
 Lactacidémia: 7 mmol/L (N <2,1); A razão entre o lactato e o piruvato estava normal –

 Piruvato sérico: 3,9 mmol/L (N <0,2); essencial para distinguir défice de PDH do défice da
fosforilação oxidativa.
 Lactato/Piruvato: 1,8 (N <20);

 Na+: 140 mEq/L (N: 136-145 mEq/L);

 K+: 4 mEq/L (N: 3,5-5 mEq/L);

 Cl-: 100 mEq/L (N: 100-110 mEq/L);


 Hiato iónico ([Na+] + [K+]) – ([Cl-] + [HCO3-]): 32 ( ↑ ) (N: 14) – Por perda do bicarbonato;
 Cromatografia de aminoácidos plasmáticos: ↑ alanina (é destino alternativo do
piruvato)
Diagnóstico Diferencial:
 Acidose láctica congénita com alterações neurológicas (hipotonia, ataxia), atraso de
desenvolvimento;
 Sem hepatomegália (↑ volume fígado), sem cetose, sem hipoglicémia, L/P N – É da
salientar que algumas alterações do metabolismo dos glúcidos causam hepatomegália
e acidose láctica.
Deficiência em Piruvato Desidrogenase:
Avaliação da atividade PDH:
 Linfócitos: 70 mmol/min/mg proteína – 10% do N (controlo, 690mmol/min/mg
proteína);
 Fibroblastos: 105 mmol/min/mg proteína – 15% do N (controlo, 650mmol/min/mg
proteína);

54
 Western Blotting (estudos moleculares): ↓ fração E2.

Nota: Para o diagnóstico definitivo avalia-se se a atividade da enzima está reduzida. Basta recolha de células do
sangue (linfócitos) ou dos fibroblastos (estes permitem propagar muitas células sem ter que fazer muitas recolhas).
Além disso também se faz a análise genética (analisar o gene da PDH para ver se tem alguma mutação),
correspondendo a um passo muito importante para o aconselhamento genético.

Tratamento:
 Corrigir acidose: HCO3Na i.v. - fase aguda e CitratoNa oral – manutenção;
 Restrição de glucose (Para reduzir a acumulação de piruvato – mas não retirar
totalmente (GV) devido à sua importância na via das pentoses);
 Dieta cetogénica (pobre em glúcidos, teor elevado em lípidos – AcetilcoA mas, vai levar
à produção de corpo cetónicos).

Questões
 Porquê a dieta cetogénica?
o Os lípidos vão ser a fonte de acetil-CoA, que era o que estava em falta (há
bloqueio pelo piruvato, faz-se o bypass para chegar à produção de ATP).
 Défice em vitamina B1 afeta a atividade da PDH?
o Sim. Pois a vitamina B1 é um cofator da PDH. É de salientar que o álcool impede
a absorção de vitamina B1 a nível intestinal.
 Défice em vitamina B5 afeta a atividade da PDH?
o Sim. Pois a vitamina B5 (ácido pantoténico) é um cofator da coenzima A,
importante para a atividade da PDH.
 A ingestão de uma substância tóxica que aumente a concentração de NADH interfere
com actividade da PDH. Porquê?
o Sim, dado que o metabolismo cerebral é afetado, havendo inibição da atividade
da enzima pelos produtos. Ou seja, substâncias tóxicas como o álcool
aumentam a quantidade de NADH que inibe a atividade da PDH.
 Prevê-se que haja alguma alteração da actividade da PDH durante o exercício físico.
Porquê?
o Com elevada quantidade de oxigénio, há estimulação da atividade da PDH uma
vez que ajuda a drenar a acetil-CoA para o ciclo de Krebs. Assim, é bom fazer
exercício físico como forma de tratamento desta patologia, mas
moderadamente. Nesta situação não há aumento do lactato, se houver uma
boa oxigenação.

55
 Explicar o papel do dicloroacetato na terapêutica da deficiência em PDH:
o O dicloroacetato vai ser responsável por inibir a cinase da PDH e, desse modo,
mantém-se a forma desfosforilada da PDH, que corresponde à sua forma mais
ativa. Desta forma, a PDH vai funcionando. É de salientar que nem todas as
mutações levam à alteração na proteína. Só existe alteração na enzima quando
o RNAm é afetado.

56
ESTUDO BIOQUÍMICO DE UMA DOENÇA DA CADEIA RESPIRATÓRIA MITOCONDRIAL
AULA TEÓRICA 8
RITA ANDRADE | PEDRO RIBEIRO

Citopatias Mitocondriais
Doenças da CRM  Afectam processo OXPHOS

As doenças da Cadeia Respiratória Mitocondrial (DCRM) representam um dos erros


mais frequentes do metabolismo, manifestando-se de forma heterogénea (inicialmente
consideradas encefalomiopatias, este grupo de doenças pode explicar também miopatias de
etiologia desconhecida e associações de
sintomas inexplicadas), em qualquer idade,
envolvendo alterações funcionais das
mitocôndrias, que levam à disfunção do
sistema da OXPHOS, afectando qualquer
tecido ou órgão (órgãos aparentemente não
relacionados, quer pela função, quer pela
origem embrionária), através de um largo
espectro de sinais e sintomas (neurológicos
e/ou não neurológicos), de acordo com
qualquer tipo de hereditariedade (Figura 1).
Esta variabilidade deve-se, sobretudo, ao elevado número de genes que codificam as proteínas
da CRM (cerca de 100), dos quais a maioria está localizada no nDNA e 13 no mtDNA.
Nas DCRM a relação genótipo/ fenótipo é de um modo geral fraca, sobretudo nas devidas a
mutações do mtDNA. A expressão fenotípica das mutações do mtDNA/ nDNA depende de
muitos outros factores para além da mutação causal, como a função e necessidade energética
de cada célula/ tecido, a existência de isoenzimas específicas de orgão ou fase de
desenvolvimento e o efeito cumulativo de toxinas ou outros factores ambientais.

57
Mitocôndria: dupla regulação genética.
 Genoma nuclear
 Genoma mitocondrial
O mtDNA humano codifica
13 peptídeos da CRM (7
subunidades do complexo I, o
citocromo b, que faz parte do
complexo III, 3 peptídeos do
complexo IV e 2 subunidades
do complexo V), para além de
22 tRNAs e 2 rRNAs,
necessários à síntese proteica mitocondrial. Possui o seu próprio código genético, diferente do
genoma nuclear, sendo regulado por um sistema semi-autónomo, em que a replicação e a
transcrição dependem de factores de origem nuclear (Figura 2).
O mtDNA tem também outras características particulares, que têm constituído um desafio
à genética clássica: 1) A hereditariedade do mtDNA ocorre por via materna. De facto, apesar de
algumas mitocôndrias do espermatozóide penetrarem no óvulo durante o processo de
fecundação, elas são depois selectivamente destruídas, por razões ainda desconhecidas. 2)
A sequência do mtDNA é codificante quase na sua totalidade, com os genes que codificam
os tRNAs e rRNAs distribuídos ao longo de todo o genoma, intercalados nas sequências
que codificam os peptídeos da CRM, verificando-se a ausência de intrões, o que pode ser
uma vantagem, tendo em conta o “empacotamento económico” deste genoma. Por outro lado,
pode constituir uma desvantagem, quando se tem em conta a 3) elevada taxa de mutações,
relativamente ao nDNA (10-20 vezes superior), uma vez que possui maioritariamente
sequências codificantes, a probabilidade de uma alteração ser mais lesiva é muito superior. O
facto do mtDNA se encontrar bastante próximo da MIM, onde está localizada a CRM, que é a
principal fonte celular e radicais livres, assim como várias enzimas envolvidas no metabolismo
de drogas associadas à membrana mitocondrial, podem contribuir para uma taxa de mutações
mais elevada, contribuindo também para esse facto a 4) ausência de histonas protectoras. Por
outro lado, os 5) mecanismos de reparação do mtDNA existentes são também pouco eficientes.

58
Uma das características mais
importantes do mtDNA é
designada por 6) heteroplasmia
que é a ocorrência, em simultâneo,
de moléculas de mtDNA mutante e
normal na mesma mitocôndria.
Deste modo, quando há divisão
celular ocorre 7) segregação
mitótica (a replicação de mtDNA e
a divisão mitocondrial são
processos estocásticos,
independentes do ciclo celular e da replicação do genoma nuclear) e dá-se uma distribuição
aleatória das cópias mutadas de mtDNA nas mitocôndrias, nas células e nos tecidos, formando-
se 8) “mosaicos” de células com diversas percentagens de cópias mutadas em relação ao
número de moléculas de mtDNA normais, podendo encontrar-se desde células com todas
as cópias normais (homoplasmia normal) a células com todas as moléculas mutadas
(homoplasmia mutante), passando por vários graus de heteroplasmia. O facto da distribuição
nas células e nos tecidos ocorrer, aparentemente, ao acaso, torna imprevisível o grau de
transmissão duma alteração para a geração seguinte. Em consequência destes factos, a
percentagem de mtDNA mutado pode mudar de tecido para tecido e mesmo ao longo da vida.
É de notar que a expressão das alterações do mtDNA depende do tipo de mutação e da função
codificada pela sequência mutada, do grau de heteroplasmia e da necessidade energética de
cada tecido (cérebro e músculo mais afectados). Assim, existe um 9) limiar crítico a partir do
qual surge um fenótipo associado às alterações do mtDNA. Este efeito não é bem conhecido
ainda, sabendo-se que é variável consoante o tecido e de indivíduo para indivíduo (Figura 3).
As alterações patogénicas do mtDNA incluem mutações pontuais, rearranjos (deleções/
inserções) e redução drástica do número de cópias (depleção).

59
Que factores são necessários para estarmos perante uma CRM funcional e ocorrer a
OXPHOS?
É importante que não haja erros nos genomas de modo a não comprometer a síntese e
funcionamento dos complexos proteicos.
Uma vez que a grande maioria das proteínas mitocondriais é codificada por genes nucleares e
sintetizadas no citosol, a sua importação para o interior da mitocôndria e o seu
encaminhamento correcto para a
matriz, para o espaço
intermembranar ou para as
membranas interna ou externa,
torna-se essencial para o
funcionamento da CRM. Depois de
bem localizadas, as subunidades
agrupam-se de forma a dar origem
aos cinco complexos enzimáticos.
A OXPHOS ocorre na mitocôndria, Figura 4 – A cadeia respiratória mitocondrial (CRM) e o processo de
fosforilação oxidativa (OXPHOS)
envolvendo a redução de O2 a H2O
pelos electrões cedidos por NADH e FADH2 provenientes do metabolismo intermediário.

Doenças envolvendo o processo da OXPHOS


 Multissistémicas
 Heterogéneas (clínica, bioquímica, genética)

O ATP desempenha um papel central na troca de energia em sistemas biológicos. É rico em energia,
porque a unidade de trifosfato contém 2 ligações fosfo-anídricas. A energia (energia livre) é
libertada quando o ATP é hidrolisado, formando ADP. A energia contida no ATP e ligada ao fosfato
é libertada, p.e. durante a contracção muscular. Uma vez que o ATP representa uma reserva de
energia de ligações fosfato, que fornece energia a todos os sistemas biológicos, é compreensível
que defeitos genéticos dos componentes da CRM se manifestem, em primeiro lugar, como doenças
que afectam a força muscular e outros sinais degenerativos, principalmente ao nível do SNC, por
serem sistemas que requerem grandes quantidades de energia para funcionarem adequadamente.

AS DCRM surgem devido a alterações no mtDNA e/ ou no nDNA, que causam alterações estruturais
e bioquímicas, que podem traduzir-se na modificação da interacção entre os dois genomas, em

60
défice na importação e/ ou montagem das subunidades proteicas da CRM, em défice na
formação ou função dos transportadores de substratos ou na disfunção dos complexos enzimáticos
da CRM. Em geral, os defeitos genéticos da CRM levam a uma disfunção energética
mitocondrial, que pode ter como consequências o decréscimo das reservas de ATP celular e
o aumento da produção de radicais livres de oxigénio. Por sua vez, nesta situação, a disfunção
energética pode ser mais acentuada e pode também levar ao aumento da ocorrência de
mutações no mtDNA, resultando em disfunção tecidular e culminando na morte celular. Para
além do sistema da OXPHOS, são também de considerar as implicações que podem surgir
noutras vias metabólicas , nomeadamente, na alteração do estado redox mitocondrial e
citosólico, podendo observar-se um aumento na concentração dos corpos cetónicos (beta-OH-
butirato e acetoacetato), de lactato e piruvato (principalmente do primeiro), do aminoácido
alanina, ocorrendo também a cetonémia paradoxal, pois há aumento dos corpos cetónicos,
principalmente no período pós-prandeal. O ciclo de Krebs é também, em geral, afectado, assim
como a beta-oxidação dos ácidos gordos, podendo ocorrer o aumento da concentração dos
ácidos orgânicos.

Métodos de Diagnóstico: Quando é considerada a hipótese clínica de diagnóstico de uma


DCRM, inicia-se um estudo do foro metabólico, que inclui a avaliação (no plasma ou no liquído
cefalorraquidiano) do estado redox (através da medição dos níveis de lactato, L, piruvato, P, e
corpos cetónicos, acetoacetato, AcAc, e beta-hidroxi-butirato, b-OH-B, e avaliação das razões L/P e
b-OH-B/AcAc), em jejum e pós-prandial, e a funcionalidade (incluindo os estudos polarográficos) e
actividade enzimática dos complexos da CRM, seguido de estudos moleculares para avaliar
alterações do mtDNA/nDNA.

Tratamento: O tratamento de uma DCRM é sintomático na maioria dos casos, sendo no entanto
extremamente importante para a melhoria da qualidade de vida dos doentes. Implica uma
vigilância clínica regular, de modo a detectar e tratar precocemente possíveis complicações, como
diabetes, surdez, cataratas e envolvimento cardíaco, entre outros. A fisioterapia e as terapias
ocupacional, respiratória e da fala podem ser úteis em muitos casos. Muitas DCRM cursam com
convulsões, que de um modo geral respondem aos Anticonvulsivantes.
Na DCRM a dieta deve ser equilibrada e normocalórica. O excesso de calorias aumenta a
acumulação de substratos a montante dos défices enzimáticos, com agravamento da
hiperlactacidémia e da produção de ROS, entre outras consequências.

61
62
DOENÇAS DA OXIDAÇÃO DOS ÁCIDOS GORDOS
AULA TEÓRICA 9
LUÍS BERNARDES | MESTRE HENRIQUES

O metabolismo de ácidos gordos

Os ácidos gordos são a reserva energética mais importante em humanos, devido ao elevado
rendimento energético da sua metabolização e ao seu baixo peso relativamente ao glicogénio.

Em jejum, são utilizados como fonte predominante de Acetil-CoA em quase todos as células.
As grandes exceções são os neurónios, que requerem um aporte constante de glícidos para a
sua sobrevivência.

Em situações de glicémia normal, são uma fonte de energia muito importante para o coração,
fígado e músculo esquelético em repouso. Consequentemente, défices enzimáticos na
catabolização de lípidos vão afetar sobretudo estes três órgãos.

A metabolização de ácidos gordos para produção de energia pode ser dividida em 5 ou 6 fases:

 Transformação de triglicerídeos em ácidos gordos livres no adipócito


 Transporte de A.G. no sangue, ligados à albumina
 Ativação (ligação com CoA) no citosol da célula-alvo
 Transporte e metabolização de ácidos gordos de cadeia muito longa (VLCFA – mais de
22C) no peroxissoma, que liberta no citosol ácidos gordos de cadeia média
 Transporte para a mitocôndria, com a ajuda de 3 enzimas: Carnitina Aciltransferase I
(no EIM) e II (na matriz) e uma Translocase

 Ciclos de β-oxidação na mitocôndria, com formação de Acetil-CoA, englobando 4


reações principais: Uma desidrogenação para criar uma ligação dupla, uma hidratação
para formar um grupo OH, outra desidrogenação e uma clivagem tioclástica (tiólise)

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Vários ciclos destas reações vão dividir os ácidos gordos em várias moléculas de Acetil-CoA. Se
o número de carbonos for ímpar, é necessário uma via metabólica que carboxile o composto
de 3 carbonos residual (Propionil CoA) a um intermediário do ciclo de Krebs (Succinil CoA)

O Acetil-CoA pode depois ser catabolizado para produção de ATP através do ciclo de Krebs, ou,
mais predominantemente nos hepatócitos, transformado em corpos cetónicos (para
transporte no sangue) ou em aminoácidos cetogénicos. Note-se que quando falamos em usar
lípidos como fonte de energia, incluímos nestes os corpos cetónicos, importantíssimas fontes
de energia no miocárdio.

Note-se que, em ácidos gordos pares, não há nenhuma via que permita a formação de hidratos
de carbono a partir de lípidos.

Doenças do metabolismo de ácidos gordos

As patologias do metabolismo de ácidos gordos são relativamente raras, tendo uma


prevalência inferior a 1:2000 em Portugal. São doenças autossómicas recessivas, provocadas
por mutações de DNA nuclear, que condicionam um défice numa das enzimas da β-oxidação
ou do transporte para a mitocôndria.

Apesar de apresentarem características diferentes entre si, estas doenças têm denominadores
comuns ao nível bioquímico e sintomático, devidos à interrupção do metabolismo de ácidos
gordos.

Em situações de glicémia normal, verifica-se nestes doentes:

 Acumulação de ácidos gordos no sangue (hiperlipidémia) e nos adipócitos. No sangue,


devido à saturação da albumina, há conversão para ácidos gordos mais pequenos e
mais solúveis, como A.G. bicarboxilados;
 Acidose metabólica;

64
 Diminuição dos níveis de corpos cetónicos;
 Cardiomiopatia hipertrófica; Os órgãos mais afetados na forma crónica da doença,
 Miopatia; pois são os que usam normalmente ácidos gordos
como fonte energética
 Função hepática prejudicada.

Nos períodos de jejum ou de infeção (maiores necessidades energéticas), a doença tem


manifestações agudas e potencialmente letais, verificando-se:

 Défice energético generalizado;


 Hipoglicémia hipocetótica;
 Hiperuricémia, causada pelo aumento do catabolismo de purinas;
 Hiperamoniémia, devida a um aumento do catabolismo dos a.a. e a danos no fígado
que interrompem o ciclo da ureia;
 Aumento das transaminases plasmáticas, devido à lesão tecidular;

A doença mais comum da oxidação dos AG em Portugal é um défice da MCAD (Desidrogenase


dos acil-CoA de cadeia média). No entanto a LCHAD (Desidrogenase dos 3-hidroxiacil-CoA de
cadeia longa) também é muito comum.

As doenças relacionadas com a oxidação dos AG devem ser excluídas no contexto das
síndromes de morte súbita do lactente e de Reye, isto é, deve ser realizado diagnóstico
diferencial para excluir estas patologias.

Síndrome de Reye (afeta crianças e adolescentes) – esta síndrome é fatal em cerca de 30% dos
casos, podendo levar a sequelas graves a nível cerebral e hepático em caso de sobrevivência.
As suas causas são desconhecidas. No entanto, considera-se que infeções virais e aspirina
podem potenciá-la. Os sinais particularmente característicos desta síndrome são:

 Encefalopatia metabólica aguda SÍNDROME – Conjunto de anormalidades que


ocorrem normalmente em conjunto e
 Acidúria orgânica podem apontar para uma origem em
comum.

65
As doenças decorrentes de erros hereditários do metabolismo dos ácidos gordos podem
mesmo apresentar sintomatologia bastante semelhante à da síndrome de Reye, designando-se
este conjunto de sinais como síndrome de Reye-like. Esta síndrome apontará então para
problemas na β-oxidação.

 Hipoglicémia no jejum
 Hipocetonémia
 Hiperamoniémia (devido a um aumento do catabolismo dos a.a. e a danos no fígado
que interrompem o ciclo da ureia).
 Acidúria orgânica

As doenças da β-oxidação dos AG podem ter manifestação aguda que pode evoluir para
crónica, dependendo do défice e do jejum a que o doente é submetido. Adicionalmente,
apresentam-se pela primeira vez sobretudo no primeiro ano de vida e têm como
manifestações clínicas:

 Hepatomegália – aumento do volume hepático


 Hipotonia – tónus muscular diminuído
 Miopatia com deposição de lípidos – enfraquecimento dos músculos
 Rabdomiólise aguda (lise de células do músculo esquelético)
 Cardiomiopatia hipertrófica ou dilatada
 Arritmia Apenas em casos crónicos
 Fraqueza muscular generalizada

No entanto, dependendo da doença poderemos ter outros sintomas. Dentro destes podemos
destacar:

MCAD – morte súbita, letargia, apneia, disfunção hepática, coma, …

LCHAD – morte súbita, letargia, cardiomiopatia, disfunção hepática com colestase e cirrose,
vómitos, neuropatia, retinopatia, convulsões, coma,…

Achados laboratoriais:

 Hipoglicémia hipocetótica (que pode ser assintomática se o doente tiver cuidado com
a alimentação) – especialmente no jejum e processos infeciosos pois gasta-se ATP para
desencadear processo imunitário.
 Acidose metabólica

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 Hiperuricémia
 Transaminases - provenientes da lise celular nos órgãos afetados. No caso da
síndrome de Reye não se encontram elevadas.

Biomarcadores

Quando não ocorre a degradação completa dos AG, a acumulação de intermediários leva à
formação de conjugados que podem posteriormente ser detetados no plasma (acilcarnitina) e
na urina (acilglicina). Desta forma, para se obterem valores fidedignos as colheitas não devem
ser feitas depois da administração de glicose ou após recuperação de crise metabólica. Devem
então ser feitas provas de sobrecarga nas quais são administradas substâncias como MCT,
Carnitina ou outos ácidos gordos que levam a alterações significativas nos níveis dos
biomarcadores.

Diagnóstico

 Doseamento de carnitina
 Estudo de perfil da acilcarnitina, estudo da acidúria orgânica e da acilglicina
 Estudos genéticos e enzimáticos para confirmar diagnóstico ou, em alternativa,
diagnóstico pré-natal

Em alternativa, deve-se realizar o teste do pezinho no recém-nascido como forma de rastreio.

Tratamento

 Prevenir jejum prolongado


 Favorecer aporte de hidratos de carbono como fonte de energia
 Dar riboflavina, carnitina, MCT (triglicerídeos de cadeia média), … dependendo do
défice enzimático.

Uma vez que não necessitam da carnitina


Nos casos de defeitos para entrar na mitocôndria ao contrário
primários de captação de dos de cadeia longa.
carnitina. Também pode ser
dada em situações de crise
nos défices de MCAD.

Grande parte dos défices permitem ao doente levar uma vida normal. Especial atenção e
cuidado devem ser dados aos períodos de jejum e à alimentação.

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68
MECANISMOS DE DESTOXIFICAÇÃO HEPÁTICA
AULA TEÓRICA 10
MARIA JOÃO BRITO | CAROLINA BARBOSA | MARGARIDA CARMO

O fígado é o órgão central de destoxificação – para além de dar aos órgãos o que eles precisam, ele recebe
o que estes deitam fora. Nesta aula serão abordados os mecanismos mais importantes de destoxificação
hepática, destacando o sistema microssomal, que não sendo o único mecanismo é o mais preponderante.
Existem várias substâncias que se acumulam no organismo e que necessitam de ser eliminadas devido
aos seus efeitos tóxicos, nomeadamente:
 Substâncias Endógenas, exs:
o Amónia – eliminada através do ciclo da ureia
o Bilirrubina – eliminada através da urina, após sofrer conjugação com o ácido glicorónico
no fígado para se tornar hidrossolúvel. Caso isto não aconteça, pode dar origem a icterícia
e efeitos neurotóxicos pela sua acumulação na forma não-conjugada (indirecta)
(lipossolúvel).
o Hormonas Esteróides – são lipossolúveis e entram na célula ligando-se aos seus
receptores formando complexos que actuam como factores de transcrição, alterando
portanto a expressão genética. No entanto, a sua acção tem de ser de curta duração, ou
seja, necessitam de ser eliminadas.
 Substâncias Exógenas
o Álcool:
 Efeitos - má absorção da vitamina B1 e consequências na via das pentoses
(trancetolases e PDH), excesso de NADH resultante da sua metabolização,
excesso de Acetoacetato ( Acetil CoA -> Síntese de AG)
o Xenobióticos: Os xenobióticos são compostos químicos estranhos a um organismo ou
sistema biológico. Podem ser encontrados num organismo mas não são naturalmente
produzidos nem se esperaria que estivessem presentes, não sendo integrados nas suas
vias metabólicas e que por essa razão têm de ser eliminados.
Exs:
 Componentes alimentares (corantes, conservantes)
 Toxinas ambientais (dioxinas, pesticidas, fumos)
 Fármacos/Drogas de abuso
o A heroína, por exemplo, é metabolizada no fígado originando
metabolitos ainda mais activos.
o PROFÁRMACOS – fármacos cujos metabolitos são a forma activa, ou
seja, necessitam de ser metabolizados para exercerem os seus efeitos
no organismo.

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Factores que Influenciam o Funcionamento dos Mecanismos de
Destoxificação
É importante notar que a metabolização destas toxinas está dependente de vários factores como:
Variabilidade individual – os sistemas de destoxificação estão dependentes de enzimas, enzimas
essas que são codificadas por genes. Um dado indivíduo pode ser portador de polimorfismos
neste genes, o que afectará a actividade das enzimas.
o Imaginemos que temos 3 indivíduos: um metabolizador ultrarrápido, um normal, e um
ultralento. Administramos aos 3 o mesmo fármaco, numa dose standart aprovada num
ensaio clínico.
 Ultrarrápido: metaboliza-o tão rápido que não chega a ter efeito. Se o metabolito
tiver toxicidade, sentirá os efeitos secundários deste.
 Normal: terá os efeitos esperados, sem efeitos secundários.
 Ultralento: tem dificuldades em metaboliza-lo, sendo a dose standart excessiva,
o que resulta em níveis elevados da concentração do fármaco durante mais
tempo. Isto pode resultar em mau estar caso o medicamento tenha efeitos
secundários.
NOTA: No caso dos prófarmacos, a situação inverte-se no que toca aos metabolizadores
ultrarrápidos e ultralentos, uma vez que a forma activa é resultante da sua
metabolização.
Factores ambientais – a exposição a diversas toxinas induz uma expressão mais acentuada dos
citocromos específicos para essas toxinas. Como tal, pessoas que nunca foram expostas a esses
xenobióticos não terão uma metabolização tão rápida destes. Por outro lado, ao prescrevermos
um medicamento a alguém que reside numa zona altamente poluída, temos os sistemas de
destoxificação sobrecarregados com outros xenobióticos e estes podem competir com o fármaco
pela metabolização, diminuindo a sua eficácia.
Estilo de vida – Dieta, exercicio... Uma pessoa que faça mais exercício tem uma maior taxa de
mitocôndrias e por isso vai metabolizar mais rapidamente certas substâncias. Uma que coma
menos comida processada terá menos sobrecarga de xenobióticos a competirem pela
destoxificação.
Género – Homens e mulheres têm diferente número de sistemas de destoxificação. Podem
também transportar diferentes variantes genéticas (associadas ao sexo)
Idade – Nos jovens, estes sistemas estarão mais activos. No entanto, numa criança poderão estar
imaturos.

70
É importante notar que estes factores estão não só associados com diferentes taxas de metabolização de
fármacos e outras toxinas como também tem sido provado que se relacionam com diferentes
susceptibilidades a várias doenças como cancro, Parkinson, fadiga crónica e alterações no sistema
imunitário. Por exemplo, se expostos a uma substancia pró-carcinogénica, os metabolizadores lentos
terão mais probabilidade de desenvolver cancro devido à sua acumulação no organismo.
Este conhecimento é fundamental pois uma disfunção hepática vai então comprometer estes
mecanismos de destoxificação. (maior risco de cancro)

Destoxificação Hepática
O propósito principal destes mecanismos é transformar estas substâncias para que se tornem mais
hidrossolúveis e assim poderem ser eliminadas através da bílis (que segue pelo intestino, saindo pelas
fezes) e da urina. Estes sistemas não são exclusivos do fígado, de facto, existem em quase todas as células,
porém existem em maior quantidade no fígado, motivo pelo qual o consideramos um órgão especializado
na destoxificação.
Ocorre em duas fases:
 Fase I – Funcionalização: Aumento da polaridade e adição de um grupo funcional que permita a
posterior conjugação. É mediada por citocromos P450.
 Fase II – Conjugação: adição de outra substância a um grupo funcional.
Embora o mais comum seja passarem primeiro na Fase I e depois na Fase II, existem substâncias que já
têm o tal grupo funcional e por isso não necessitam de passar pela fase I (ex. bilirrubina). Outras passam
pela fase II e depois podem passar na fase I e sofrer metabolizações sucessivas.

71
Citocromos P450
 Proteínas hémicas – possuem um grupo heme.
 Em grande quantidade no fígado, especialmente no Retículo Endoplasmático, mas também na
mitocôndria.
 Existem dezenas de citocromos P450 com características ligeiramente diferentes e específicos
para determinados grupos de substâncias.
 Famílias CYP1, CYP2 e CYP3 são as que estão mais envolvidas na metabolização de fármacos.
 São codificadas por genes polimórficos, ou seja, podem ter variações que influenciam a sua
capacidade catalítica.
 Catalizam sobretudo reacções de oxidação e hidroxilação, para as quais necessitam de NADPH
(proveniente da via das pentoses) como cofactor e oxigénio.

 Uma vez que apenas um dos átomos de oxigénio é incorporado, podemos considerar os CYP450
mono-oxigenases.
 A maior parte indutíveis, ou seja, estão mais activos e a sua produção é aumentada nos indivíduos
que consomem esses determinados xenobióticos. Excepção: CYP2D6 é constitutiva (não
indutível)

72
Fase I

O oxigénio Este peróxido é


molecular liga-se protonado,
Esta alteração ao grupo heme. libertando-se
favorece a uma molécula
•Por vezes esta Outro electrão é
O substrato liga- transferência de de água.
ligação pode-se transferido para
se ao centro um electrão do quebrar, o citocromo. O átomo de
activo do NADPH via originando um Forma-se oxigénio
citocromo, citocromo P450 radical superóxido transitóriamente sobrante é
alterando a sua reductase, (O2•-) e
interrompendo o um ião peróxido incorporado na
conformação reduzindo o Fe
cíclo catalítico (O22-) molécula, na
ao seu estado
forma de um
ferroso (Fe2+)
grupo hidroxilo
MAIS POLAR

Requer:
1. Vitaminas do complexo B, 4. Antioxidantes,
2. Ácido fólico (folato), 5. Carotenóides,
3. Glutationa, 6. Vitaminas C e E.

 Esta fase inclui reacções de oxidação, redução, hidratação, hidrólise, hidroxilação e outros. (Por
exemplo, as reacções de hidroxilação aumentam a solubilidade mas permitem também a
conjugação na fase II, pois adicionam à molécula um grupo funcional que poderá reagir);
 Há produção de moléculas reactivas;
 Deste modo, o défice ou ausência de alguns destes produtos poderá comprometer a
destoxificação eficiente.
INDUÇÃO: por indutores mono-funcionais – afectam apenas uma enzima ou fase de
destoxificação- (etanol, acetona, componentes do fumo do cigarro, glucocorticóides, anti-
convulsionantes…); Isto leva ao desacoplamento das duas fases, o que pode causar danos no
DNA,RNA e proteínas devido à não metabolização das espécies reactivas geradas pela fase I na
fase II e sua consequente acumulação;

73
Sistema de transporte de electrões
Apesar de o citocromo P450 necessitar de 2 electrões para
concretizar a redução do ferro, a ligação do oxigénio e a
sua clivagem, surge um problema: a transferência de
electrões do NADPH é directa – os dois electrões são
libertados simultaneamente. No entanto, o CYP450, com
o seu único grupo heme, só consegue receber um electrão
de cada vez. Este problema é resolvido pela citocromo
P450 redutase que é uma flavoproteína: contém FAD e
FMN. Assim, ela consegue aceitar simultaneamente 2 e- (através do FAD) mas libertar apenas um (através
do FMN).

Fase II
Consiste essencialmente em conjugar o fármaco com substâncias endógenas, a fim de facilitar a
sua excreção. Deste modo, as principais vias de conjugação são:
 Glucoronidação por UDP-glucoronato -> Glucoronoconjugação;
 Sulfonação (conjugação com sulfato);
 Acetilação;
 Metilação;
 Conjugação com a glutationa;
 Conjugação com aminoácidos;
Requer:
1) Glutamina 4) Cisteína
2) Glicina 5) Antioxidantes
3) Taurina 6) Vitaminas

Glucoronoconjugação
Via usada na destoxificação não só da bilirrubina, mas também de estrogénios, progesterona,
triiodotironina (hormona da tiroide), meprobamato, morfina…
INDUÇÃO: por indutores muti-funcionais – estimulam várias enzimas da fase II -> balanço
saudável entre fase I e II - susceptibilidade a cancros. Presentes em várias frutas e vegetais.
INIBIÇÃO em ambas as fases: por competição
FASE II: depleção dos cofactores de algumas enzimas (por ex., através da dieta)

74
Destoxificação hepática de Fármacos
A mesma substância pode ser metabolizada em várias CYP’s e o mesmo CYP pode metabolizar
vários tipos de xenobióticos, o que poderá explicar as interacções medicamentosas. Logo, há
medicamentos que não podem ser tomados enquanto se faz a administração de outros.
Metabolização do Paracetamol (acetaminofeno)
O paracetamol é um fármaco que actua por inibição da cascata do ácido araquidónico,
impedindo a síntese das prostaglandinas. Esta é uma via de metabolização por conjugação por
glucoronidação ou sulfonação, sendo excretado pelos rins. Porém, também pode sofrer a acção
do CP450 e conjugação com a glutationa. Neste ultimo processo, há a formação de um
composto intermediário, o NABQI (N-acetyl benzoquinoneimina), que é tóxico. Por esta razão
é que há a conjugação com a glutationa, de modo a tornar-se não tóxico e ser excretado pelos
rins.

Em casos de overdose? As vias


de glucoronidação e sulfonação Produzido pela acção de duas
rins.
ficam saturadas. Assim, o isoenzimas: CYP2E1 e CYP1A2
paracetamol vai ser metabolizado
NABQI
pela via do citocromo P450
produzindo NABQI. A quantidade de
Em doses normais, é neutralizado
glutatião é esgotada pela
rapidamente, combinando-se
conjugação com NABQI, que pode irreversivelmente com o grupo
reagir livremente com as sulfidrilo do glutatião
membranas celulares, causando
peroxidação da membrana lipídica
mediada por radicais livres.

Em excesso, é hepatotóxico!

NB: nestes casos é usada N-


acetilcisteína como antídoto, uma
vez que promove a destoxificação
da NABQI pela via da glutationa e
expulsa os radicais livres.

75
Metabolização e destoxificação do Álcool - 5 Vias

H2O2 2H2O
NADPH + H2o + O2 NADP+ + H2O2 + 2H+
Fe

Oxidação não enzimática Sistema Microssomal de


Oxidação do Acetaldeído (MAOS)
H2O2 2H2
O

Catalase H2O + O2 H2O

Aldeído oxidase

NAD+ NADH NAD+ NADH

Etanol Acetaldeído
c Acetato
Álcool Desidrogenase Aldeído desidrogenase
desidrogenase

Acetato-CoA ligase
NADPH + O2 + H+ NADP+ + 2H2O

Gem-diol Proteínas,
Lípidos,
CYP2E1 Nucleótidos

Sistema Microssomal de Aductos de


Oxidação do Etanol (MEOS) Reacção não acetaldeído
enzimática
Acetil-CoA
AG

Ésteres
AG
Etílicos
Sintetase de ésteres
etílicos e AG Colesterol

Nota: - A metabolização é feita preferencialmente pela álcool desidrogenase e pelo CYP2E1, sendo a
actividade deste bastante menor do que a da desidrogenase quando em concentrações mais baixas
devido a ter um Km mais elevado que a desidrogenase.

76
- aducto é um complexo que se forma quando um composto químico se une a uma molécula biológica,
como o DNA ou as proteínas.. No caso dos das proteínas não têm efeitos biológicos e quantificam a
exposição a xenobióticos., No caso dos de DNA, quando não há reparação, ocorre uma mutação.
- Para encorajar doentes de alcoolismo a deixarem de beber é-lhes administrado dissulfiram juntamente
com o álcool. O dissulfiram inibe irreversivelmente a enzima aldeído desidrogenase (ALDH). Esta
acumulação provoca sintomas desagradáveis como rubor, náuseas, vómitos, palpitações, hipotensão,
taquicardia e convulsões levando o paciente a rejeitar o álcool por associação a estes efeitos.

Resumindo

Do metabolismo do álcool resulta:


 ↑Acetaldeído – pro-oncogénico muito forte (responsável pelas dores de cabeça)
 ↑Radicais livres (H202)→ ↑stress oxidativo
 ↑NADH que causa:
1. Conversão do Piruvato em Lactato
A via de síntese do lactato é activada pelo excesso de NADH visto que o consome.
Consequências:
 Acidose Láctica
 Hipoglicémia devida à inexistencia de piruvato para a Neoglicogénese

77
2. Síntese de Lípidos
O NADH pode ser usado como agente redutor tanto na síntese de glicerol como na de ácidos
gordos.

3. Cadeia Respiratória
O NADH pode ser usado directamente na oxidação fosforilativa, o que inibirá a normal oxidação
dos AG e o TCA. Assim há uma acumulação de:
Ácidos Gordos: acumulam-se no fígado, que se livra deles despejando-os na corrente sanguínea
-> Hiperlipidémia -> Aumento do risco cardiovascular
Acetil CoA: A acumulação deste contribui tanto para a síntese de gorduras como para a síntese
de corpos cetónicos, que ficam em excesso no sangue.
A metabolização do álcool, em ingestão exacerbada, pode ser realizada pelos CYP indutíveis
(CYP2E1), que aumentam a sua expressão na presença do álcool. Por isso, há uma competição da
metabolização do álcool com outros xenobióticos, podendo haver interacção medicamentosa (exemplo
da interacção do paracetamol e do etanol). (Ver também a parte álcool e medicação dos slides)

Risco de
Se a forma activa
toxicidade por
for o fármaco
sobredosagem
Competição ↓Metabolismo do
Consumidor agudo
álcool/fármaco fármaco
Se a forma activa Menor efeito -
for o metabolito maior dosagem

Se a forma
↑ Actividade Menor efeito -
Ausência de ↑Metabolização activa for o
dos CYP's por maior dosagem
álcool do fármaco fármaco
indução
Se a forma Risco de
activa for o toxicidade por
Consumidor metabolito sobredosagem
crónico Se a forma Risco de
activa for o toxicidade por
fármaco sobredosagem

Presença de Competição ↓Metabolização Se a forma


Menor efeito -
álcool álcool/fármaco do fármaco activa for o
maior dosagem
metabolito

78
FARMACOGENÓMICA
Tendo em conta o que se tem vindo a abordar, aquando da prescrição de um fármaco, deve-se
ter em conta o seguinte:

Substância activa Fármaco Pro-fármaco


Metabolizador
Dose maior para que o Dose menor para que o
Metabolizador rápido fármaco tenha o seu efeito metabolito não tenha o efeito
mais duradouro. de hiperestimulação
Dose menor para que o Dose maior para que o
Metabolizador lento próprio fármaco não se torne metabolito tenha o seu efeito.
(anti-ritmicos, antidepressivos, tóxico – o próprio
antispicóticos…) metabolismo já tem um efeito
mais duradouro.

79
80
DISFUNÇÃO HEPÁTICA
AULA TEÓRICA 11
MARIA JOSÉ TEMIDO | SOFIA PICÃO
Objectivos:

 Analisar o fígado como orgão central do metabolismo e regulador da composição química do organismo;
 Avaliar as causas e consequências da disfunção hepática ao nível bioquímico.

O fígado é não só constituído por hepatócitos mas


também por células de Kupffer (células com capacidade
Fígado fagocitária que têm como principal função a proteção
dos hepatócitos) e por vias de distribuição como os
Centro de distribuição canalículos biliares e por ramos das veias porta e
metabólica do organismo; hepáticas e da artéria hepática.

Regula a composição química do É um orgão altruísta:


organismo (nomeadamente a  Concentra em si tudo o que é tóxico – Destoxificação;
regulação da glicémia),  Liberta substâncias úteis para outros órgãos (ex:
contribuindo, assim, para a glucose (principal fonte de energia utilizada pelos
Homeostase; tecidos), corpos cetónicos (fonte de energia alternativa
para músculo, cérebro e rim), albumina...).

Uma disfunção do fígado compromete o funcionamento de


muitos outros orgãos.

No fígado ocorrem uma série de vias metabólicas comuns e não comuns a outros
orgãos/tecidos. As vias que ocorrem quase exclusivamente no hepatócito são:

 Neoglicogénese e Glicogenólise- Metabolismo da Glucose-6-P;


 Síntese de VLDL e Degradação de LDL - Transporte lipídico em lipoproteínas;
 Ciclo da Ureia – Destoxificação da Amónia;
 Catabolismo do Heme – Conjugação e excreção de bilirrubina;
 Síntese do Glutatião Reduzido – Mecanimos antioxidantes;
 Metabolismo dos Ácidos Gordos – β- Oxidação de Ácidos Gordos, Síntese e degradação
de Colesterol e Síntese e Conjugação de sais biliares.

Assim sendo os hepatócitos são células de extrema importância no equilíbrio metabólico


do organismo.

Causas e Consequências da falência hepática a nível bioquímico


Causas de falência hepática:

 Aguda – drogas, toxinas (nutrientes orgânicos,...), inflamações (hepatite, colangite,...);

81
 Crónica - toxinas (nutrientes orgânicos,...), inflamações (hepatite, colangite,...), álcool,
congestão venosa (ex: no coração), doenças hereditárias;

Consequências de falência hepática: Excesso de NADH – o que


irá inibir:
Degradação de LDL FALÊNCIA HEPÁTICA  PDH;
Síntese de HDL  Glicólise;
 Via das Pentoses;
Hipo-albuminémia  Absorção de Vit.
Hipertensão Portal B1 e B12
Ascite (acumulação de fluídos na
cavidade peritoneal) Colestase (refluxo do
Enteropatia exudativa fluído biliar) Acumulação de NH4+
(doença que provoca perda
Hiperaldosterismo (excesso de de proteínas a nível
Absorção de lípidos
aldosterona no sangue) intestinal) AA Aromáticos
varizes
Deficiência em Vit. K
Hipocalémia (baixos níveis de K+
no sangue)
Factores de neurotransmissores
coagulação
Produção renal Hemorragias
de NH4+ Gastrointestinais

ENCEFALOPATIA
Degradação de AA entéricos

Hiperventilação
Hiperamoinémia

ALCALOSE
α-cetoglutarato
GABA
glutamato

Doente alterna entre excitação e


letargia

Exemplos de doenças de disfunção hepática crónica

 Hepatite B e C
 Hepatite auto-imune - inflamação de causa desconhecida em que os anticorpos
atacam as células do fígado como se fossem organismos patogénicos
 Doença de Wilson - acumulação anormal de cobre no fígado

82
 Doença de Gaucher – doença lisossomal (défice na enzima que devia degradar o
glucocerebrosídeo)
 Hemocromatose – acumulação anormal de ferro no fígado
 Síndrome de Budd-Chiari – trombose das veias hepáticas e supra-hepáticas
 Carcinoma Hepático
 Colangite esclerosante primária – inflamação das vias biliares
 Disfunção Hepática alcoólica
 Hipertensão portal
 Síndrome de Zellweger – diminuição da quantidade de peroxissomas nas células do
fígado, rim e cérebro
 COLESTASE - bloqueio, obstrução do fluxo biliar, presença de secreção biliar nas
células hepáticas e acumulação de substâncias que normalmente são excretadas para
a bílis/duodeno tais como a bilirrubina e o colesterol, nos tecidos extra-hepáticos.

Causas:

 Obstrução do canal biliar;


 Lesão dos hepatócitos;
 Doença hepática crónica;
 Tumor hepático
 Infeção Viral

Índices importantes:

Bilirrubina Gama-Glutamil transpeptidase (GT) Fosfatase Alcalina (FA)

Ocorre aumento da sua síntese nas células junto dos


Enzima dos microssomas, canalículos biliares, aumentando a sua atividade
marcador sensível de lesão dos quando ocorre colestase. Também surgem níveis
hepatócitos, níveis elevados no elevados em situações de cirrose e tumores, entre
plasma significam colestase outros; os níveis sanguíneos têm origem
influenciada pela ingestão de principalmente no osso e fígado. Se a gama-GT
álcool e alguns fármacos. também estiver elevada, sugere o fígado como fonte
de FA.

83
 CIRROSE: Processo difuso de fibrose e formação de nódulos, frequentemente com
necrose hepatocelular. O consumo crónico de álcool é a causa mais frequente desta
patologia em Portugal.

Alteração da estrutura e função do hepatócito

As células começam a acumular uma fibra de forma anormal – A cirrose ainda é reversível

Necrose celular

Estas fibras começam a ocupar o espaço dos hepatócitos destruídos

Função dos hepatócitos totalmente comprometida – A cirrose é já irreversível

Inflamação

 ICTERÍCIA: Causada por deficiências na eliminação da bilirrubina. Doentes


caracterizados pela sua pigmentação amarela.

Causas
1. Hemólise: anemia hemolítica adquirida, esferocitose congénita
2. Hepatocelular: toxinas, infeções
3. Colestase: cirrose, tumor, pedras na vesícula

Tipos de Icterícia:

a) Pré –Hepática: elevada produção de bilirrubina não conjugada que resulta em


graves lesões no SNC pois esta é lipossolúvel nesta forma
b) Intra-Hepática: défice na captação e conjugação da bilirrubina nos hepatócitos, tal
como na secreção da bilirrubina no canal biliar logo há aumento quer da forma
conjugada, quer da não conjugada
c) Pós-Hepática: colestase o que resulta num aumento da bilirrubina conjugada,
reconhecido através da urina castanha e das fezes descoloradas

DIAGNÓSTICO DA DISFUNÇÃO HEPÁTICA:

1. Cintigrafia (técnicas imagiológicas)


2. Biópsia Hepática: é uma técnica invasiva por isso nunca se realiza este exame sem
evidência de biomarcadores/exames imagiológicas que indiquem alta probabilidade de
diagnóstico de disfunção hepática
3. BIomarcadores (os mais importantes estão sumarizados na tabela que se segue)

84
Parâmetros Bioquímicas Breve explicação
Hipercolesterolemia Se o recetor de LDL não estiver funcional,
este não vai ser degradado e a concentração
aumenta no plasma
Hipertrigliceridémia Aumento da sua síntese
Hiperlacticidémia Células em estado redox, aumenta o NADH
que é utilizado para reduzir o piruvato a
lactato
Hipoglicémia Esta é uma doença de armazenamento,
inibição da neoglicogénese
Hiperuricémia Aumento da degradação de purinas
provenientes das bebidas alcoólicas e das
células que entram em necrose
Hiperamoniémia Défice do ciclo da ureia
Hiperbilirrubinémia Aumento da bilirrubina não conjugada
Hipermetoniémia Aumento da síntese de metionina
-GlutamilTranspeptidase Níveis elevados indicam colestase,
influenciada pelo consumo de álcool
GGT-Gama-glutamiltransferase Envolvida na transferência de AA através da
metionina e no metabolismo do glutatião
Transaminases Indicam morte celular, no entanto, não
garantem que seja no fígado, é necessário
analisar os restantes parâmetros
Factores de coagulação Diminuição da síntese de proteínas
necessárias à coagulação
Ureia Défice no ciclo da ureia
FA- Fosfatase Alcalina Hidrolase responsável por hidrolisar
nucleótidos e proteínas, aumenta em casos
de colestase, cirrose e tumores (morte
celular)
A1AT- α-1-antitripsina Glicoproteína produzida essencialmente
pelos hepatócitos que inibe a protease de
serina que hidrolisa as fibras de elastina no
pulmão, protege, assim, os tecidos de serem
danificados pela elastase, presente nos
neutrófilos, monócitos e eosinófilo que
entra em ação em caso de inflamação.
Mutações nesta glicoproteína, sobretudo no
fígado (icterícia e doenças hepáticas)e o
pulmão, alteram a sua estrutura, verifica-se
a perda da capacidade inibitória e agregam-
se em forma de corpúsculo de inclusão nos
hepatócitos e por isso decrecem os seus
níveis séricos.

85
86
STRESS OXIDATIVO, DISFUNÇÃO MITOCONDRIAL E NEURODEGENERESCÊNCIA
AULA TEÓRICA 12
DUARTE FLOR | PROF. CR7 (APOIO MORAL DE JOANA DIREITO E CAROLINA AQUINO)

Radicais Livres são espécies químicas que possuem electrões de valência desemparelhados,
isto é, existem orbitais ocupadas por apenas 1 electrão de valência, e que têm tendência a
“roubar” um electrão a outras moléculas, daí se dizer que são muito reactivas. Depois essa
molécula a quem o radical livre “roubou” o electrão, fica ela própria um radical, pois perdeu um
dos seus electrões de valência. Este fenómeno progressivo chama-se cascata oxidativa. No
nosso organismo isto constitui um grande perigo, pois ao roubar um electrão a certas
biomoléculas podem danificar estruturas importantes, como biomembranas e DNA.
Felizmente, possuímos outras espécies químicas que os neutralizam: os antioxidantes. Estes vão
fornecer o electrão ao radical e possuem mecanismos para voltar ao seu estado reduzido sem
se tornarem espécies oxidantes como acontece na cascata oxidativa.
Diz-se que existe stresse oxidativo quando a nível celular os antioxidantes não são suficientes
para neutralizar os oxidantes. Esta situação ocorre se houver excesso de radicais ou défice de
antioxidantes, obviamente.
É importante ressalvar que os radicais livres não são maus. São sinalizadores em diversos
sistemas celulares (basta ver o caso do NO), tudo depende da quantidade existente. Se a
concentração for pequena, funcionam como sinalizadores por exemplo. Activam mecanismos
de sinalização como o p53 (em baixas concentrações). Se estiverem numa concentração
moderada podem promover o crescimento, proliferação e migração celular. Níveis altos é que
são nocivos para a célula.  Hipótese REDOX do Stress Oxidativo.
Das espécies reativas de oxigénio – ROS - destacam-se o HO˙ (hidroxilo), o mais nocivo e que
reage rápida e localmente, o H2O2 (caracterizado por conseguir atravessar membranas e formar
HO˙ facilmente; NÃO É RADICAL) e o O2-˙. Estes dois últimos originam-se normalmente em
diversos processos biológicos (abordados a seguir), mas são neutralizados por antioxidantes. Em
caso de stress oxidativo dão origem ao hidroxilo pelas reacções de Fenton (nesta é utilizado um
metal de transição que pode ser, por exemplo, ferro ou cobre) e de Haber-Weiss.
As espécies reativas de azoto (nitrogénio) – RNS – originam-se a partir da reacção de formação
de NO˙ pela NOS (óxido nítrico sintetase), em que arginina vai originar citrulina (Ver BQI). O NO˙
vai reagir com o anião superóxido e dar peroxinitrito – ONOO- (analogamente ao hidroxilo este
radical também é muito lesivo). Este pode dar o radical hidroxilo e outros como o NO2+.

87
As fontes biológicas, isto é, de origem natural, de radicais livres são:
 Mitocôndria – durante o processo de fosforilação oxidativa, muitas vezes originado o
anião superóxido.
 Durante a oxidação de ácido araquidónico (ver BQ I) origina-se também o superóxido.
 NOS – já explicado.
 Xantina Oxidase (BQI – catalisa a reacção de hipoxantina a xantina e de xantina a ác.
Úrico) – também origina anião superóxido.
 NADPH oxidase – forma superóxido a partir de NADPH e oxigénio.
 Monoamina Oxidase (MAO) - Ver degradação de catecolaminas em BQI – origina H2O2.
 Glucose Oxidase – nunca ouvi falar dela na vida, foi só referida.
 Cyt P450 – superfamília que catalisa várias reacções que envolvem oxigénio.
 AGEs – produtos da oxidação da glucose. Como na diabetes a glicose sanguínea está
aumentada, são produzidos mais radicais e por isso pensa-se que existe uma relação
entre o aparecimento de Parkinson e Alzheimer com a Diabetes.

As biomoléculas afectadas pelos radicais livres são principalmente:


Lípidos - ocorre peroxidação lipídica. Ácidos Gordos polinsaturados reagem com o radical
hidroxilo, formando radical alquilo, que depois de uma modificação conformacional forma o
radical peroxilo pela adição do O2. O resultado destas reacções vão ser novos radicais lipídicos
que continuarão a provocar estragos na membrana, como alteração da estrutura e aumento da
permeabilidade, que leva à entrada descontrolada de Na+ (e este aumento da pressão osmótica
leva à entrada de água na célula) e Ca2+, que em altas concentrações indica morte celular.
Proteínas – oxidação de carbonos e dos grupos tiol (terminações –SH). Os principais produtos
da oxidação de proteínas são aldeídos, que geralmente perdem a sua função depois da
formação de pontes S-S, que leva a alteração de estrutura. São por fim fragmentadas e digeridas.
A quantidade de aldeídos na célula pode ajudar a identificar alguma disfunção mediada por
radicais livres.
DNA – A oxidação de DNA normalmente é reparada, por exemplo pela enzima PARS, com
bastante gasto de energia (se o stress oxidativo for acentuado haverá mais lesões no DNA, mais
gasto de energia e baixos níveis energéticos levam à morte celular). Caso a reparação seja mal
feita leva à ocorrência de mutações, que podem ser patológicas e inclusive podem levar ao
cancro, se forem afectados genes de regulação do ciclo celular.

88
Defesas Antioxidantes não enzimáticas (todos possuem um estado oxidado e um
reduzido):
 Vitamina C – Vit. C (Fe2+) passa a Vit.C (Fe3+)
 Vitamina E (através do tocOH que passa a tocO˙; toc=tocoferol), importante a nível da
membrana, pois é lipofílica.
 Glutatião – GSH passa a GSSG
 Ácido úrico (ácido úrico + O2 + H2O → 5-hidroxisourato + H2O2 → alantoína + CO2)
 Tiorredoxina – proteína que reduz outras proteínas, mantendo os seus grupos tiol na
forma reduzida. É regenerada a forma reduzida através do ácido lipóico, com gasto de
NAD(P)H, pela Tiorredoxina redutase.

Defesas Antioxidantes enzimáticas
 Cu/Zn SOD – citosólica; Fe, Mn SOD –mitocondrial e existe outra forma extracelular;
(SOD=superóxido dismutase) – As SOD transformam o anião superóxido em peróxido de
hidrogénio ou oxigénio.
 Catalase – transformam peróxido de hidrogénio em água.
 Glutatião peroxidase – passa GSH a GSSG, reduzindo o radical.
 Glutatião Reutase – passa GSSG a GSH, com uso de NADPH

Um desequilíbrio REDOX muito acentuado leva à morte celular, pois são desencadeados
mecanismos de apoptose, nomeadamente pela saída dos citocromos das mitocôndrias, pelo
influxo de cálcio, pelo ativar do p53, activação de genes apoptóticos (FAS) e danos na membrana
lisossomal, que levam à saída de protéases lisossomais; e necrose, principalmente pela quebra
de energia na célula e pelo influxo de cálcio.
A mitocôndria, para além de ser um local onde se originam muitos radicais, é um alvo fácil para
estes, pois é um organelo que tem todas as biomoléculas que podem ser oxidadas. O seu DNA
é mais susceptível à oxidação por não ter histonas e por não ter mecanismos de reparação, o
que faz do alvo fácil, também um alvo frágil  . Ao longo dos anos vão-se acumulando mutações
no DNAmit, acumulando bases oxidadas e progressivamente havendo uma disfunção
mitocondrial, devido à oxidação das suas várias biomoléculas, o que leva a que em certos tecidos
mais vulneráveis como o cérebro (usa bastante O2, os neurónios serem células pós-mitóticas,
abundância de Ferro, grandes variações da concentração de cálcio durante o impulso nervoso,
o facto das mitocôndrias serem “velhas” e como foi explicado, por isso mais frágeis, e baixa

89
quando quantidade de antioxidantes) ocorra neurodegenerescência, que está associada a
doenças como o Parkinson e o Alzheimer. Teoria Mitocondrial do Envelhecimento

O Parkinson é abordado nos slides (na aula nem 1 minuto foi falada), por isso passo a explicar
uma teoria que associa o Parkinson aos radicais. Como sabemos uma das fontes biológicas de
radicais livres é a MAO (produz peróxido de hidrogénio), que está nos neurónios
dopaminérgicos, pois degrada dopamina. O aumento ao longo dos anos de radicais nestes
neurónios provoca a sua degenerescência e assim a doença de Parkinson.

90
HIPERURICÉMIA
AULA TEÓRICA 13
GUILHERME OLIVEIRA | PAULA CERQUEIRA

Metabolismo de nucleótidos – As Purinas


- Via de novo: Inicia com a formação de 5-fosforribosil pirofosfato (PRPP) a
partir de ribose 5-fosfato e ATP catalisada pela enzima fosforribosil
pirofosfatase (PRPPS). A conversão do PRPP mais a glutamina em 5-
fosforribosilamina é catalisada pela enzima 5-fosforribosil-1-pirofosfato
(PRPP)-amidotransferase (PRPP-AT) que é a reação limitante da síntese das
purinas estando sujeita a feedback negativo pelos nucleotídios purínicos.
Após várias fases intermediárias que necessitam energia na forma de ATP, a
inosina monofosfato (IMP) pode ser convertida à guanosina monofosfato
(GMP) e adenosina monofosfato (AMP). Os nucleotídios purínicos GMP,
IMP e AMP são desdobrados durante a renovação celular nas respectivas
bases purínicas: guanina, hipoxantina e adenina. Estas são convertidas em
xantina e posteriormente em ácido úrico em reação catalisada pela xantina
oxidase.
- Via de recuperação: As bases purínicas livres (guanina e adenina)
formadas pela degradação hidrolítica dos ácidos nucléicos, e a hipoxantina
derivada da adenina, podem ser reconvertidas em nucleotídios purínicos
pela via de recuperação envolvendo a enzima hipoxantina-guanina
fosforribosil transferase (HGPRT) e adenina fosforribosil transferase (APRT).
O outro substrato em ambos os casos é a PRPP. A via de recuperação não
requer ATP.

Hiperuricémia - Introdução
 Aumento da concentração plasmática de ácido úrico devido a uma variada gama de
causas (acima de 6-7 g/dl; os valores variam com a idade e com o género).
 Frequência:
 10-20% homens
 2-31% mulheres
 2-18% da população adulta: desta percentagem a fracção
correspondente à gota é de 0,1-0,3%.
 Sendo que é uma condição resultante de um défice numa via de reciclagem, é menos
frequente antes dos 30 anos, com a incidência a aumentar com a idade, sendo uma doença
inflamatória das articulações mais frequentes nos homens com idades superiores a 40 anos.
 O sexo masculino é o mais afectado (19:1), mas as mulheres pós-menopausa tendem a
ser mais susceptíveis.

91
 Pode ser assintomática, sendo apenas detectada por análises aos níveis plasmáticos
de ácido úrico.

Hiperuricémia – Causas
O ácido úrico é o produto final da degradação das purinas, nucleótidos obtidos através de
três vias: síntese de novo, metabolismo de moléculas endógenas (moléculas que possuam A e
G como bases) e pelo consumo de alimentos com alto teor de ácidos nucleicos (consumidas
pela dieta, sobretudo através do consumo de carnes jovens). Em indivíduos mais jovens, as
purinas são reutilizadas pela HGPRT ou APRT (hipoxantina-guanina ou adenina
fosforibosiltransferase). Porém, à medida que se envelhece, o catabolismo torna-se a via
preferencial, conduzindo à degradação dos nucleótidos purínicos em ácido úrico.
Normalmente, o organismo saudável elimina cerca de 700 mg de ácido úrico por dia,
recorrendo a duas vias diferentes:
- Excreção renal (2/3 → 0,3 – 2,0 g), com um alto grau de reabsorção: de todo o ácido
úrico filtrado, apenas 6-12% é eliminado a cada turnover. Regista-se uma competição com o
lactato.
- Uricólise intestinal: acção de bactérias que o degradam em compostos menos agressivos
para o organismo (exemplo: CO2, NH3, etc…).
Assim o aumento dos níveis de ácido úrico pode ter duas origens distintas:

Aumento na produção (↑ Ácido úrico no plasma→ ↑ Excreção Renal)


 Hiperuricémia primária: causada por um défice na produção de HGPRT, essencial na
reciclagem de guanina e hipoxantina, pois gera um catabolismo exagerado de nucleotídeos
que não podem ser mais reutilizados. Além de hiperuricémia pode causar síndrome de Lesch-
Nyhan (ligado ao cromossoma X, com uma incidência inferior a 1:100000).
 Hiperuricémia secundária (potenciada pelo envelhecimento):
 Excesso de purinas na dieta (consumo de vísceras animais, cerveja, marisco, etc);
 Turnover excessivo de ácidos nucleicos (muito frequente quando há
proliferação celular anormal, como no cancro, ou quando se tem um aumento da fagocitose
de células numa alergia);
 Catabolismo excessivo de ATP, também frequente no caso de neoplasias.

Os níveis anormais de ácido úrico são facilmente detectados no plasma e também na


urina, considerando que a excreção renal é a via de eliminação mais importante. Se os níveis

92
plasmáticos forem elevados mas a urina não mostrar nenhuma alteração significativa, o
problema reside na excreção.

Diminuição da excreção (↑ Ácido úrico no plasma → ↓ Excreção Renal)


 Hiperuricémia primária: considera-se idiopática, ou seja, sem causa conhecida.
 Hiperuricémia secundária:
 Insuficiência renal (nefropatia, cálculos, etc)
 Níveis elevados de lactato ou corpos cetónicos. O lactato compete com o ácido
úrico pois ambos recorrem ao mesmo transportador e poderá surgir uma hiperlactacidémia
como consequência.
 Reabsorção tubular aumentada, devido a uma mutação no transportador
URAT-1.
Com um problema na excreção, os níveis plasmáticos de ácido úrico estarão altos,
embora o mesmo não se verifique na urina.

Nota: a hiperuricémia secundária pode ainda ter como causas hemopatias mieloproliferativas,
anemia hemolítica, psoríase, sarcoidose, disfunção renal, intoxicação alcoólica, cetoacidose diabética,
acidose láctica, doença por depósito de glicogênio tipo I, hipo e hiperparatireoidismo, hipotireoidismo,
sedentarismo, jejum prolongado ou ainda utilização de drogas como salicilatos em baixas doses, diuréticos
tiazíclicos, penicilina e corticosteróides.

Hiperuricémia – Consequências
Em meio aquoso, o ácido úrico é muito influenciado pelo pH e em parte pela
temperatura, pelo que predomina na sua forma não dissociada quando o pH é inferior (menor
solubilidade) e a sua forma ionizada quando o pH é superior ao seu pK, 5,75 (maior
solubilidade). O ião combina-se normalmente com o catião sódio, formando urato de sódio e
se a concentração plasmática de urato se encontrar acima dos 7,0 mg/dL, esta excede a
solubilidade do urato monossódico e ocorre precipitação do sal, podendo conduzir a uma
litíase renal.
Por outro lado, a alta concentração da forma não dissociada (valores plasmáticos
superiores a 7,0 mg/dl) aliada a baixas temperaturas leva à precipitação de cristais, registando-
se uma agravação dos ataques à noite nas articulações do pé, nomeadamente na 1ª
metatárso-falângica.

93
Gota ou Artrite Gotosa
 Doença consequente de uma hiperuricémia severa (5% dos doentes com
hiperuricémia);
 Resulta da deposição de cristais de ácido úrico em locais vulneráveis, como
articulações;
 90% dos indivíduos com gota também sofrem de disfunção renal, contudo esta não é
severa. Por vezes esta não resulta da hiperuricemia mas sim de outras doenças como diabetes,
hipertensão arterial…
 A longo prazo, pode comprometer tanto articulações como os rins.
O ácido úrico precipita facilmente na sinovial das articulações das extremidades do corpo
pois o pH e a temperatura são mais baixos (a gravidade também auxilia a deposição, daí ser
comum a deposição no dedo do pé).
O sistema imunitário responde, onde o processo de quimiotaxia dos neutrófilos é
activado por libertação de citocinas (fagocitose por monócitos) e libertação de leucotrieno B4,
prostaglandinas e radicais livres (estes factores estimulam também a lesão tecidular ao serem
libertados no processo de fagocitose pelos neutrófilos). Assim, há uma fagocitose dos cristais
pelos neutrófilos, que ao sofrerem lise por efeitos lesivos decorrentes dos cristais, libertam
mediadores de lesão tecidular e inflamação, nomeadamente, enzimas lisosómicas. Este
processo repete-se e provoca dores em locais como as articulações dos dedos.
O tratamento resume-se ao seguinte:
 Dieta: diminuição da ingestão de alimentos ricos em purinas, com reforço da
hidratação oral, havendo preferência pela ingestão de águas bicarbonatadas ou bicarbonato
de sódio em solução (favorecem a solubilização do ácido úrico, facilitando a sua eliminação).
 Repouso
 Fármacos: tanto para aumentar a excreção como para inibir (alopurinol: inibidor
selectivo das etapas terminais da biossíntese de ácido úrico) a formação.
 Anti-inflamatórios não-esteróides e analgésicos para diminuir a dor;
 Colchicina: e diminui a motilidade leucocitária, a fagocitose e a produção de ácido
láctico, diminuindo, deste modo o depósito de cristais de urato e a resposta inflamatória
resultante.
 Cirurgia para extracção de tofos gotosos muito exuberantes.

Hiperuricémia derivada do alcoolismo (hiperuricémia secundária)


A ingestão excessiva de etanol origina altas concentrações de acetaldeído e NADH,
levando esta última a um aumento da actividade da LDH e, consequentemente, a uma maior

94
concentração plasmática de lactato (compete com o ácido úrico na excreção renal). Há uma
saturação dos receptores URAT-1 no rim, com uma eliminação de aniões orgânicos,
conduzindo a um aumento da concentração de ácido úrico.
Notas:
- O excesso de frutose pode causar hiperuricémia?
A transformação da frutose a frutose-1-fosfato implica a activação da enzima
frutoquinase pelo ATP. Um excesso de frutose implica uma depleção acelerada de ATP, o que
conduz a um aumento do AMP. Este estimula a AMP deaminase, que de forma
irreversível promove a desaminação da adenosina para inosina, que depois é convertida a
hipoxantina por uma PNP (purine nucleoside phosphorylase), convertendo-a a hipoxantina. A
xantina oxidase tem assim a sua acção, ao reduzir o O2 a H2O2 e oxidar a hipoxantina a xantina
e, posteriormente, a xantina a ácido úrico.
- Fármacos anticancerígenos podem causar hiperuricémia. Porquê?
Os fármacos anticancerígenos promovem a morte celular, ao se revelarem anti-
mitóticos. Com tal lise celular ocorrerá libertação dos cristais de ácido úrico para o meio
envolvente, levando a um aumento da sua concentração plasmática e a um consequente
desenvolver de hiperuricémia.
- Um défice da Glucose-6-fosfatase pode causar hiperuricémia?
Sim, pois sem a actividade normal desta enzima, teremos acumulação de Glucose-6-
fosfato. Para diminuir os mesmos haverá activação da via das pentoses, e sendo que um dos
produtos desta via é a Ribose-5-fosfato, um componente básico do PRPP, o substrato inicial na
síntese de nucleótidos, teremos um aumento da concentração destas biomoléculas. Para
contrabalançar este efeito, a via de degradação gerará níveis igualmente altos de ácido úrico,
contribuindo para uma hiperuricémia.

95
96
REGULAÇÃO DO METABOLISMO MEDIADA POR INSULINA, GLUCAGINA, ADRENALINA
AULA TEÓRICA 15
“O MATOS” COM OS MEGA-APONTAMENTOS DE VÁRIAS FOCAS XD

Hormonas pancreáticas
 As hormonas pancreáticas (insulina, glucagina e
somatostatina) são hormonas produzidas nas
“ilhotas de Langerhans”, sendo depois lançadas
na corrente sanguínea através da função
endócrina do pâncreas. As diferentes hormonas
são produzidas em diferentes tipos de célula
dentro da mesma ilhota. Assim, glucagina
insulina, e somatostatina são produzidas
respectivamente nas células alfa, beta e delta.

 Quando há alteração dos níveis plasmáticos de glucose, há também necessariamente


libertação de sinais que indicam que terão de se libertar determinadas hormonas.

 Deste modo, quando há um aumento dos


níveis plasmáticos de glucose (por
exemplo após uma refeição) há libertação
de insulina pelas células β-pancreáticas. A
insulina irá estimular uma maior entrada
de glucose para as células, síntese
proteica e de colesterol, glicogénese e
lipogénese. Insulina actua em vários
tecidos (músculo e adipócitos) mas não
actua nas células nervosas.
Assim, os níveis de glucose no sangue
retomam o valor normal.
 Quando há uma diminuição dos níveis
plasmáticos de glucose (por exemplo
passado algum tempo após a última refeição) há libertação de glucagina pelas células
α-pancreáticas. A glucagina irá estimular a glicogenólise, a neoglicogénese, a lipólise e
o catabolismo de proteínas como fonte de aminoácidos glicogénicos. A glucagina actua

97
preferencialmente no fígado, fazendo com que este liberte a glicose resultante do
conjunto de processos supra mencionados. Assim, os níveis de glicose no sangue sobem
até retomarem o valor normal.
(Nota: As situações de hipoglicémia são corrigidas mais rapidamente que as de hiperglicémia)

Formação da insulina
 A insulina é libertada pelas células β-pancreáticas na sua forma activa. Para tal, teve de
passar por um processo de maturação, uma vez que é produzida na forma de
pré-proinsulina (pela tradução do mRNA) e é transformada em proinsulina (remoção
do peptídeo sinal) e por fim em insulina madura através da acção de proteases (que
removem o peptídeo C). Estes
processos de maturação ocorrem no
aparelho de golgi, ficando a insulina
contida em vesículas de onde se liberta
para actuar nos receptores celulares
para que esteja rapidamente
disponível.
(Para além disso, pode-se libertar
peptídeo C e também alguma
proinsulina, que não irão ter actividade
nos receptores)

Controlo dos níveis séricos de glucose


 Em situações de níveis reduzidos de glucose plasmática há estimulação da medula
adrenal de modo a que haja produção de epinefrina / adrenalina que vai:
o Inibir as células β-pancreáticas para que não haja libertação de insulina;
o Estimular as células α-pancreáticas para que libertem glucagina.
o Estimular a glicólise (no musculo), a neoglicogénese (no fígado) e a degradação
de glicogénio em ambos.
 Ao mesmo tempo, é produzido a partir da adrenalina um estímulo para o hipotálamo,
que vai libertar ACTH, que levará à formação de cortisol.
EPINEFRINA ACTH CORTISOL REPOSIÇÃO DOS NÍVEIS DE GLICOSE

98
(o cortisol cria grandes reservas de aminoácidos, e, na fase final de recuperação da hipoglicemia, é responsável
pela diminuição do consumo de glicose e aumento da sua produção)

 Em situações de elevados níveis de glicose, as células β-pancreáticas são directamente


estimuladas por essa glicose a produzirem insulina (havendo inibição da libertação de
glucagina e baixas concentrações de epinefrina). Os elevados níveis de insulina vão
estimular a captação de glicose quer no músculo quer no tecido adiposo (através dos
GLUT- 4 dependentes de insulina). Para além disso, no músculo e no fígado, a insulina
irá estimular a síntese de glicogénio, bem como de lípidos (no tecido adiposo).
 Por outro lado, as células β-pancreáticas recebem diversos estímulos, inclusivamente da
glucagina (caso existam muitos aminoácidos) de forma a ser produzida insulina que
facilite a entrada dos mesmos para as células. Pelo contrário, a insulina irá inibir as
células α-pancreáticas.

99
No tecido adiposo e no fígado a insulina vai estimular a entrada de glicose, o aumento de
glicerol-3-P e a consequente síntese de triglicerídeos e AG, de forma a armazenar a energia em
excesso, consumindo dessa forma Ac-coA. No tecido adiposo, será também estimulada a
actividade da lipoproteína lipase, para que os TG aí possam ser armazenados. Para além disso,
a insulina estimula a biossíntese da hexocinase-IV (semelhante à glucocinase) a nível hepático e
a hexocinase-II, formação de creatina fosfato e piruvato cinase a nível muscular.
A insulina não tem efeitos directos no cérebro, uma vez que os transportadores GLUT-3
associados aos neurónios são independentes de insulina, ao contrário dos GLUT-4 encontrados
nos músculos.
A glucagina, por sua vez, fará aumentar a neoglicogénese e a degradação de glicogénio através
da activação de uma fosforilase que activa a glicogenólise. Ambos os processos acontecem
apenas no fígado, já que o músculo não tem receptores para a glucagina, pois nesse caso seria
privado de glucose necessária à sobrevivência. Os principais efeitos metabólicos no músculo são
mediados pela epinefrina, que estimula a entrada de glicose e a glicólise. O cérebro também não
sofre influência da glucagina, uma vez que é necessário um aporte constante de glicose para a
sobrevivência do mesmo.

Nota: Em situação de jejum pode até haver um aumento do ATP porque a degradação de
AG e de corpos cetónicos dão mais energia que a degradação de glucose.

100
Amplificação dos sinais
A insulina tem vários efeitos simultâneos numa célula apesar de ocorrerem em zonas muito
distintas. Isso só é possível porque há activação da sinalização intra-celular mediada por
receptores catalíticos. O estímulo liga-se ao receptor, os receptores dimerizam e auto-
fosforilam-se. Quando isto acontece faz com que outras proteínas sejam replicadas para o
receptor e sejam activadas vias de amplificação nas quais várias proteínas são activadas por
cascatas de fosforilação. Assim, uma proteína depois de activada pode activar muitas outras.
A glucagina, por sua vez, liga-se a receptores associados a proteínas G. Estes, quando ligam
GTP activam a adenilato ciclase que promove a conversão de ATP em AMPc. Este 2º
mensageiro irá activar a proteína cinase A (PKA) que irá fosforilar outros efectores na célula,
nomeadamente a glicogénio sintetase (inibindo-a). Desta forma, permite a degradação de
glicogénio sem que haja a sua formação simultânea.
Os processos de amplificação são importantes para a actuação quer da insulina quer da
glucagina.
Por outro lado, os processos reversíveis de fosforilação são um importante mecanismo de
regulação. Por exemplo, quando o receptor de insulina é activado em células com
transportadores de glucose dependentes de insulina (tipo GLUT-4), é activado o receptor
tirosina cinase que provoca a activação de várias moléculas por fosforilação.

Receptores α e β adrenérgicos
A epinefrina tem vários tipos de receptores que são diferentes no músculo e no fígado. A nível
muscular, existem receptores β-adrenérgicos, que quando estimulados provocam a degradação
de glicogénio através da formação de AMPc e actividade da PKA. A nível hepático funcionam os
receptores α-adrenérgicos, que em vez da PKA utilizam fosfolipase C, sendo activada a via do
IP3, com consequente libertação de cálcio do RE, o que também se revela importante para a
glicogenólise hepática.

101
102
REGULAÇÃO DO METABOLISMO MEDIADA POR ESTROGÉNIOS E GLUCOCORTICÓIDES
AULA TEÓRICA 16
DANIELA S. OLIVEIRA E JOANA PIRES

Dentro do grupo das hormonas esteróides podemos encontrar as hormonas sexuais e


os corticoesteróides. Este últimos englobam ainda os mineralocorticóides e os glucocorticóides.
São substâncias lipofílicas, pelo que são pouco solúveis em água assim precisam de se
ligar a um transportador (proteína) para circular no plasma, por exemplo, a albumina.
Atravessam a barreira membranar e possuem receptores intracelulares, que actuam no
núcleo da célula.
Influenciam a transcrição de genes, por ligação a promotores ou repressores.
Os efeitos surgem lentamente. Alguns efeitos são de tão longa duração que se dizem
irreversíveis.
A ausência prolongada não é, geralmente, fatal, mas origina alterações significativas do
fenótipo.
Perante um sinal do ambiente que estimule o SNC, este estimula o hipotálamo a produzir
hormonas hipotalâmicas que vão, por sua vez, estimular a pituitária anterior (da hipófise). Por
sua vez, esta vai estimular, entre outros, o córtex adrenal (com produção de corticoesteróides:
glucocorticóides, ex: cortisol; e mineralocorticóides, ex: aldosterona), e os ovários/testículos
(produção de progesterona, estradiol e testosterona, ou seja, esteróides sexuais) a partir do
colesterol.

Zona glomerulosa Mineralocorticóides – Aldosterona


Córtex supra-renal Zona fasciculada Glucocorticóides – cortisol
Zona reticular Aldosterona
Ovários Progesterona e Estradiol
Testículos Testosterona

103
Não nos podemos esquecer que a principal
característica da maioria dos sistemas
endócrinos é a retroalimentação negativa. Isso
significa que a resposta induzida pela ação de
um hormônio retroalimenta a inibição do nível de
sua produção.

Mecanismo de Acção das Hormonas Esteróides

As hormonas esteróides têm uma acção genómica (que influencia directamente a


expressão génica) e uma acção não genómica (que influencia indirectamente).

No citoplasma, as heat-shock protein (HSP) encontram-se ligadas aos receptores dos


glucocorticóides (NR/GR). Com a entrada de uma hormona esteróide na célula, a sua ligação
ao seu receptor faz com que ocorra a dissociação das HSP e formação de um complexo
hormona-receptor.
Ocorre a formação de dímeros que entram no núcleo. Aqui, por ligação a sequências
reguladoras do DNA (elementos de resposta hormonal, HRE), estimulam ou inibem a
transcrição de determinados genes o que levará à modificação da função celular.

104
Cortisol
É um corticosteróide (hormona esteróide derivada do colesterol) produzido pela glândula
supra-renal

Biossíntese do cortisol
A partir do colesterol (27C), é sintetizada pregnenolona que é precursora de
glucocorticóides, mineralocorticóides e de androgénios.
Para a síntese de cortisol, a pregnenolona primeiro, sob acção do citocromo P450,
transforma-se em progesterona e, depois então, é transformada em cortisol, por acção de
outros citocromos P450. O cortisol é uma hormona lipofílica, mas mais solúvel que a
pregnenolona, favorecendo a sua circulação até aos tecidos alvo.

O sistema nervoso central é sensível à dor, medo, infecção, hemorragia e à hipoglicémia.


Esses sinais vão estimular o hipotálamo a libertar a hormona responsável pela libertação de
corticotropina (corticotropin-releasing hormone – CRH). Esta hormona é um dos principais
reguladores da libertação da hormona adrenocorticotrópica (ACTH). Assim, quando o
hipotálamo é estimulado a libertar a CRH, esta vai actuar na glândula pituitária anterior para
sintetizar e libertar ACTH.
A ACTH estimula a síntese e a libertação de hormonas glucocorticóides, pois interage com
os receptores transmembranares do córtex adrenal, provocando o aumento da produção de
cAMP, para estimular a actividade da colesterol esterase.
Depois da libertação dos glucocorticóides, maioritariamente o cortisol, este vai actuar nos
tecidos alvo, principalmente, no músculo, fígado e adipócito. Sendo que os efeitos do cortisol
são:
 normalização da glicémia (por aumento da produção) estimulando a
neoglicogénese e glicogenólise
 estimula a lipólise nos adipócitos (catabolismo dos hidratos de carbono), tendo uma
acção antagónica à insulina e análoga da glucagina
 estimula o catabolismo proteico (proteólise) no músculo esquelético e outros tecidos
o que leva ao aumento da mobilização de aminoácidos (ex. alanina)
 vasoconstrição, através das catecolaminas
 resposta/fisiologia do stress
 adaptação cardiomuscular
 aumenta a pressão arterial
 resposta anti-inflamatória
 supressão do sistema imunitário (imunosupressão)

105
 no osso, inibe os osteoblastos e estimula os osteoclastos
Atraso no
 diminui a concentração plasmática de cálcio: pela diminuição da absorção pelos
crescimento
intestinos e pela inibição da produção de calcitriol nos rins

Acção dos corticoesteróides nas células estruturais e inflamatórias.

Resposta anti-inflamatória
 O cortisol tem efeitos no sistema imune e anti-inflamatório, pois impede a formação de
ácido araquidónico (por inibição da fosfolipase A2) ao nível dos macrófagos. Sendo o
ácido araquidónico o precursor de tromboxanos, prostaglandinas, prostociclinas e
leucotrienos, o processo inflamatório vai estar comprometido.
 Assim, a cortisona, um glucocorticóide sintético, é utilizado como anti-inflamatório e anti-
alérgico, nas alterações dermatológicas.

Normalização da glicémia
O cortisol tem a sua maior influência no controlo homeostático da glucose, sendo o seu
efeito semelhante ao efeito da glucagina, mas com uma acção mais lenta.
O cortisol actua no núcleo das células, aumentando a expressão genética das enzimas
gluconeogénicas. Assim, ele vai estimular a degradação de proteínas e de lípidos e a
neoglucogénese, para aumentar a produção de glucose. Tem portanto o efeito oposto da
insulina, mas promove a reabsorção de sódio e a perda de potássio, função específica dos
mineralocorticóides.

106
Tendo em conta os efeitos do cortisol e da ACTH, os seus níveis estão aumentados de
manhã, durante os períodos de jejum, que é necessário haver degradação proteica e lipídica.
No entanto, à noite os seus níveis já são mais baixos, sendo cerca de 10 vezes maior às 8
horas do que às 24 horas.

Resposta ao stress
Em situações de stress e de emergência, a síntese de cortisol é estimulada pela
estimulação da glândula pituitária anterior que liberta ACTH, que por sua vez estimula a
produção do cortisol pelo córtex das glândulas supra-renais. Por outro lado, o sistema nervoso
autónomo estimula a medula adrenal a produzir adrenalina. Estas duas hormonas combinadas
vão fazer uma rápida conversão de fuels em glucose pronta a ser utilizada. É este mecanismo
que permite a fuga descontrolada e incansável.

Consequências do aumento ou diminuição dos niveis de cortisol

Hipercortisolismo (ex: doença de Hipocortisolismo (ex: por insuficiência


Cushing – tumor da pituitária associada adrenal)
à hipersecreção de ACTH)
Hiperglicémia -> diabetes mellitus Hipotensão arterial
Proteólise muscular -> perda de massa Hipoglicémia
muscular Hiponatrémia (a concentração de sódio
Diminuição síntese óssea -> no plasma sanguíneo é menor do que o
osteoporose normal (135 mmol/L))
Hipertensão arterial devido à Diarreia crónica
vasoconstrição Fadiga

Caso Clínico - Défice na produção de cortisol - Hiposecreção de Cortisol – Doença


de Addison
As causas da doença de Addison passam por uma insuficiência primária ou secundária
das glândulas supra-renais. A insuficiência primária (1:100.000) está 70% dos casos envolvida
com a destruição auto-imune progressiva do córtex adrenal e a insuficiência secundária está
mais associada à secreção insuficiente de ACTH pela hipófise anterior.
Os principais efeitos são hipoglicémia, devido à diminuição de glucocorticóides, e perda
catastrófica de sódio e água, devido à ausência de mineralocorticóides, que se podem traduzir
por hipotensão. Assim, os principais tratamentos incidem na administração de hidrocortisona e
na hidratação, com suplementos mineralógicos

107
Hormonas Sexuais

Também conhecidas como hormonas esteróides, são hormonas lipídicas produzidas nas
gónadas a partir do colesterol. Deste grupo fazem parte o estrogénio, a progesterona e a
testosterona.
Os estrogénios são sintetizados a partir da pregnenolona que forma progesterona e esta,
por sua vez, forma testosterona e só depois, então, estrogénio (estradiol).

GnRH (gonadotropin-releasing hormone) libertada


no hipotálamo é responsável pela estimulação da
hipófise e consequente libertação de FSH (follicle-
stimulating hormone) e LH (luteinizing hormone).
O LH vai estimular os ovários na produção de
estradiol, progesterona e na ovulação.
O FSH, na mulher, estimula a ovulação
(juntamente com LH) e a secreção de estrogénios
(que estimula o desenvolvimento do endométrio). No
homem, é responsável pela indução da
espermatogénese.
O estrogénio, além de ser uma hormona sexual feminina, tem grande influência na massa
óssea. A sua presença estimula os osteoblastos a formar osso, já a deficiência de estrogénio

108
nas mulheres resulta num aumento da actividade dos osteoclastos – isto é, ocorre, reabsorção
do osso e consequente osteoporose.
A deficiência de testosterona nos homens resulta em reduzida massa óssea.

Caso Clínico - Síndrome poliquístico do ovário


Causas:
 Mutação num gene
Redução no
 Produção excessiva de insulina estrogénio, excesso
 Desequilíbrio das hormonas no hipotálamo, na hipófise, ou nos ovários de testosterona

Consequências:
 Diabetes do tipo 2, por resistência à insulina
 Níveis elevados de “mau colesterol” (LDL), ou baixos níveis do “bom colesterol” (HDL)
 Tensão arterial elevada
 Níveis aumentados de glucose no sangue
 Celulite (especialmente à volta da cintura e no abdómen)
 Níveis aumentados de gorduras do sangue (triglicerídeos)
 Níveis elevados da proteína reactiva C (indicador de inflamação)
 Níveis elevados de coagulação no sangue
 Cancro do endométrio (se não for tratada faz com que o revestimento interno do útero
não seja descamado e substituído regularmente)
 Infertilidade

109
As mulheres com este síndrome e que têm elevada libertação de GnRH têm
consequentemente níveis mais elevados de LH e níveis mais baixos de FSH, na maioria dos
indivíduos.
Altos níveis de LH (e insulina) parecem causar aumento da produção de andrógenios
pelas células da teca folicular, o que provoca hirsutismo (crescimento excessivo de pêlos
terminais na mulher, em áreas anatômicas características de distribuição masculina). Os
andrógenios também parecem inibir os efeitos de feedback negativo dos estrogênios e
progesterona o que leva a uma desregulação hormonal.
Já os os níveis mais baixos de FSH levam à anovulação.
A obesidade e a resistência à insulina, parecem amplificar os efeitos da patologia.

110
HORMONAS DA TIROIDE
AULA TEÓRICA 17
CAROLINA DIAS | JOANA DOMINGUES | CAROLINA MATIAS

HORMONAS TIROIDEIAS

As hormonas tiroideias (iodotironinas) são as únicas moléculas orgânicas com iodo no organismo animal. A
sua principal ação é aumentar a taxa de metabolismo basal, através da regulação da síntese de ATP
mitocondrial e também promovem o desenvolvimento embrionário.

O HIPOTÁLAMO tem uma grande importância na libertação/regulação das hormonas tiroideias, através da
libertação de TRH (thyrotrofin-releasing hormone) que estimula a HIPÓFISE ANTERIOR (Glândula pituitária).
Esta por sua vez liberta TIROTROPINA (TSH - thyroid stimulating hormone) que estimula as células foliculares
da TIROIDE a produzir as hormonas tiroideias: T3 (triiodotironina - forma ativa) e T4 (tiroxina, forma inativa,
mas produzida em maiores quantidades). Estas hormonas regulam o Complexo Hipotálamo-Hipófise por
feedback negativo. (A tiroide também pode ser estimulada por imunoglobulinas.)

TRH TSH
Hipotálamo Hipófise Anterior Tiroide
(-) (-) T3 e T4

As hormonas tiroideias são lipofílicas pelo que têm baixa solubilidade, deste modo têm que ser associadas a
proteínas/transportadores para poderem circular no plasma:

 Albumina
 TGB (thyroxin binding protein) – glicoproteína sintetizada no fígado
 Transtirretina – sintetizada no fígado (mutação no seu gene pode causar a Doença do Pezinho)

SÍNTESE

Peroxidase Tiroideia Peroxidase Tiroideia


Tiroglobulina Diiodotirosina Tiroxina (T4)
+ 4 Moléculas de iodo (TPO)
Glicoproteína com resíduos de tirosina Proteína com 2 iodos

1º: TSH estimula as células foliculares a captarem iodo (I-), que será oxidado e é necessário à síntese de
tiroglobulina. Síntese de percursor da tiroglobulina, empacotamento em vesiculas e passagem destas para a
zona coloidal/lúmen (da glândula).

NOTA: o iodo é captado por transporte ativo, através do transportador Na+/I-.

2º: Iodinação (oxidação) – junção do iodo à proteína percursora.

3º: Armazenamento durante algum tempo no lúmen.

4º: Estimulação pela TSH – recaptação, fusão com o lisossoma e digestão.

5º: Secreção de T3 e T4.

111
Em suma: TSH é responsável pela síntese e libertação de T4. Esta hormona (que é produzida em maior
quantidade que a T3) não tem ação biológica quando captada pelas células alvo, podendo ser convertida por
elas em T3 (forma ativa), através da remoção de um iodo! DIODINASES
As DIODINASES são enzimas peroxidases responsáveis pela ativação ou desativação das hormonas tiroideias,
principalmente pela conversão
de T4 em T3. São três: D1, D2 e
D3.

A molécula de T4 é formada
por dois anéis fenólicos aos
quais estão ligados 4 átomos
de iodo.

D2: consegue remover iodo do


anel externo tranformando T4
em T3 (principal) ou rT3 em T2. D2 D3
Atua ao nível do musculo
esquelético, coração, gordura,
tiróide e SNC. É a principal
ativadora.

D3: remove iodo do anel


interno, transformando T4 em
rT3 ou T3 em T2. Atua ao nível D3 D2
da placenta e feto. É a principal
inativadora.

D1: consegue remover iodo de


ambos os anéis transformando
T4 em T3 ou rT3 e estes em T2.
Atua ao nível do figado e rim.

NOTA: T4 – hormona mais comum, sem atividade; T3 – forma ativa; rT3 – forma inativa,
bloqueia recetores de T3, bloqueando a sua ação (sintomas semelhantes ao hipotiroidismo);
T2 – praticamente inativa.

AÇÃO

A ação destas hormonas pode dividir-se em atividade genómica e não genómica.

Atividade genómica: é a principal ação. Ocorre inteiramente no núcleo. A T3 entra no núcleo da célula alvo
(liga-se a recetores intracelulares) → liga-se a partes especificas do DNA e promove a transcrição.

Atividade não genómica: ocorre na mitocôndria e no citosol.

Ao nível da mitocôndria:

 T2 regula alostericamente o complexo IV da CRM (Citocromo c oxidase);

112
 T3 liga-se a proteinas desacopladoras e aumenta processos de termogénese → ↑CRM e ↑consumo
de O2;
 T3 induz NRF-1 (nuclear respiratory factor-1) → ↑atividade dos complexos da CRM, ↑passagem de
H+ e ↑atividade do gliceraldeido desidrogenase, NADH desidrogenase e succinato desidrogenase;
 T3 regula a expressão/transcrição do DNA mitocondrial (p28/p43).

Ao nível do citosol:

 T3 ativa PI3K → PIP3 e PIP2 “chamam” à membrana a PDK-1 (cinase) que ativa a PKB. A PKB é
responsável por:
 Ativação da S6K (cinase) → ↑translação e sintese proteica, que resulta num crescimento e
maturação celular;
 Ativação da PKC;
 Inibição de p21 (células saem da fase G1);
 T4 ativa cinase MAPK que promove angiogenese → crescimento celular.

Em suma:
Hormona da Tiroide

Recetor intracelular (no núcleo das células alvo)

Transcrição de genes especificos

↑ Sintese proteica Crescimento e maturação celular

↑ Respiração celular ↑ Ingestão de alimentos

↑ Consumo de O2 e ↑ Metabolismo

Estimulação cardiaca, de ventilação e termogénese

PATOLOGIAS ASSOCIADAS ÀS HORMONAS DA TIROIDE

Bócio

Deve-se a um défice de iodo → hipotiroidismo → ↓produção de T3 e T4 → deixa de haver feedback negativo


→ Hipotálamo e Hipófise produzem mais TRH e TSH → Aumento de tamanho da glândula tiroideia (não se
formam T3 e T4).

113
Hipotiroidismo e Hipertiroidismo

HIPOTIROIDISMO HIPERTIROIDISMO
Alterações no Sistema Nervoso:
Tremor, fraqueza muscular
- Adulto: ↓ reflexos, discurso lento, depressão,
CÉREBRO ↑ Excitabilidade neuromuscular (hiperreflexia)
↓ excitabilidade neuromuscular (hiporreflexia)
Insónia, irritabilidade
- Crianças: decréscimo da capacidade mental
↓ Funçãorenal (retenção) RIM ↑ Reabsorção renal
↓ Sintese proteica ↑ Proteólise: perda de peso e massa muscular
↓ Glicogenolise, gluconeogénese (hipoglicémia) ↑ Glicogenolise, gluconeogénese (hiperglicémia)
FÍGADO
↓ Destoxificação hepática ↑ Destoxificação hepática
↓ Lipólise (ganho de peso) ↑ Lipólise
Obstipação, reflexo esofágico (↓ mobilidade
INTESTINO Diarreia (↑ contração intestinal)
intestinal)
Taquicardia: ↑ frequência cardiaca (estimula os
Braquicardia: ↓ frequência cardiaca CORAÇÃO
recetores β-adrenérgicos no músculo cardiaco)
↓ Secreção de ácidos biliares: ↑ colesterol ↑ Secreção de ácidos biliares: ↓ colesterol
↓ Catabolismo de VLDL: ↑ VLDL ↑ Catabolismo de VLDL: ↓ VLDL
↓ Eritropoiese ↑ Eritropoiese
↓ Consumo de O2 ↑ Consumo de O2
↓ Termogénese (˃ sensação de frio) ↑ Termogénese (sudorese elevada)
↑ TSH: ↓T3 e T4 ↓ TSH: ↑T3 e T4 (↑ feedback negativo do
Diminuição do apetite hipotálamo e hipófise anterior)
↑ Risco de aterosclerose
↑ Volume da glândula tiroideia
Atraso de desenvolvimento e pequena estatura Crescimento elevado: ↑ metabolismo ósseo

DIMINUIÇÃO DO METABOLISMO AUMENTO DO METABOLISMO


ENERGÉTICO ENERGÉTICO

NOTA: A tiroide possui células intersticiais (células c) que produzem calcitonina, uma hormona
que leva à diminuição da concentração de cálcio no sangue → estimula a formação óssea.

114
ALTERAÇÕES METABÓLICAS NO JEJUM
AULA TEÓRICA 18
GUILHERME CAMÕES | FERNANDO DIAS (WOLVERINE)

As hormonas principais que regulam a concentração da glucose no sangue são:

 Insulina – responde à glucose e permite que esta entre nas células para fornecer
a estas uma fonte de energia
 Glucagina – quando não há glucose suficiente para activar as vias metabólicas

No entanto existem outras como a epinefrina, o cortisol e as catecolaminas que tem


acção semelhante à glucagina já que aumentam a glicémia.

Acções Metabólicas da Insulina e Glucagina (e outras)


Absorção de ácidos Insulina Estimula a síntese de triglicerídeos
gordos e libertação de (TG) através de ácidos gordos livres
gordura (AGL); Inibe a libertação de AGL dos
TG.
Glucagina Estimula a libertação de AGL dos TG.
Epinefrina
Hormona do
crescimento
Glicogénio (fígado) Insulina Aumenta a síntese

Glucagina Aumenta a degradação


Epinefrina (Glicogenólise)
Neoglicogénese (fígado) Insulina Inibe
Glucagina Estimula

Absorção de glucose Insulina Estimula a absorção, o seu


(músculo esquelético) armazenamento sob a forma de
glicogénio e a sua utilização no
metabolismo energético.
Glucagina Não há receptores, sem efeito
Glicogénio (músculo Insulina Estimula a síntese
esquelético) Glucagina Não há receptores, sem efeito.

Aminoácidos Insulina Estimula a absorção


Glucagina Não há receptores, sem efeito.
Cortisol Estimula a degradação
Cérebro (hipotálamo) Insulina Reduz a fome através da regulação
hipotalâmica
Glucagina Sem efeito

115
A glicose hepática é a mais importante na manutenção da glicémia, pois
encontra-se armazenada no fígado sob a forma de glicogénio para esse fim. Assim
sendo, a concentração do glucose no sangue mantém-se praticamente constante ao
longo do tempo enquanto que a concentração de glicogénio no fígado vai variando.

Glicogénio hepático

Glicémia

Metabolismo pós prandial

A seguir a uma refeição, a libertação de insulina é estimulada e a libertação de


glucagina é inibida levando a mudanças no metabolismo no fígado, tecido adiposo e
músculo.

116
No fígado é estimulada:
 Síntese de glicogénio
 Glicólise
 Síntese de ácidos gordos
 Síntese de VLDL a partir de triacilglicerol
 Absorção de aminoácidos e síntese proteica

No músculo é estimulada:
 Síntese de glicogénio
 Absorção de aminoácidos e síntese proteica

No tecido adiposo é estimulada:


 Síntese de ácidos gordos

Também ocorrem outras reacções no plasma como a degradação dos quilomicrons


absorvidos no intestino e do VLDL (transportador de lípidos sintetizados de novo para
os tecidos periféricos) através da enzima lipoproteína lípase (que é induzida pela
insulina) hidrolisando-os originando ácidos gordos livres que vão para o tecido adiposo
(armazenados sob a forma de triacilglicerol) e glicerol para formar ácidos gordos no
fígado.

Metabolismo no jejum
O organismo tende a reagir de formas diferentes perante o número de horas
de jejum a que está sujeito.
Ao fim de 8h de jejum: há um aumento bastante acentuado da quantidade de
corpos cetónicos no organismo.
Até 12h de jejum: o músculo liberta alanina como precursor de piruvato por
transaminação e, portanto, irá permitir a obtenção de glicose por neoglicogénese.

117
Após 12h de jejum: os níveis de glicose tendem a estabilizar:
- Há consumo de glicogénio (pelo que este encontrar-se-á muito diminuído) para
formação de glicose;
- Há beta-oxidação de ácidos gordos que se torna bastante importante como
fonte de energia nestas condições;
- Há estimulação da neoglicogénese (para fins óbvios);
- A glicose passa a ser usada apenas em tecidos prioritários e cuja principal fonte
de energia é a própria glicose (tecidos como o cérebro, portanto).

2-24 dias de jejum: para além de todas as reacções acima mencionadas,


começa a haver o uso de proteínas como fonte energética, para a manutenção dos níveis
de ATP. Assim:
- Dá-se a metabolização de aminoácidos glucogénicos, de forma a obter-se
glicose após posterior neoglicogénese;
- Dá-se a metabolização de outros aminoácidos, a fim de se sintetizar ATP.
Há ainda um novo aumento de corpos cetónicos para obtenção de ATP para o
músculo esquelético, cardíaco e rins.

118
Mais de 24 dias (fase avançada):
- Há uma diminuição da velocidade de degradação proteica (caso esta
degradação continuasse, iria conduzir à destruição dos tecidos, uma vez que as células
são mantidas por estruturas proteicas);
- Dá-se um aumento do catabolismo de triglicerídeos para formação de corpos
cetónicos no fígado, para que estes possam ser usados no cérebro;
- Surgem deficiências vitamínicas (C,B);
- Há diminuição da temperatura corporal, do batimento cardíaco, da pressão
arterial e do metabolismo basal.

Fase final:
- diminuição acentuada das reservas lipídicas;
- o catabolismo de proteínas passa de 30-55 g/dia para centenas g/dia;
- atrofia muscular, redução da actividade cerebral;
- MORTE!

119
Refeeding
Deve ser feito de forma bastante regulada, pois, caso contrário, leva à disfunção
dos órgãos.
Após “refeeding”, há um aumento de insulina como resposta ao aumento de
glicose (aumenta, portanto, o “ratio” insulina/glucose). Isto leva a:
- Estimulação de vias de síntese;
- Transporte de aminoácidos para os tecidos;
- Entrada de iões nas células (iões potássio, magnésio, fósforo), diminuindo,
assim, no sangue. Por consequência, há entrada de água nas células, conduzindo a
tumescência e, portanto, edemas.

É importante salientar que, durante o jejum prolongado, dá-se a indução de


diferentes processos de autofagia:

- Macroautofagia, no qual se forma um autofagossoma que, após se fundir com


um lisossoma, degrada proteínas e grandes organelos. É um processo importante no
jejum.
- Microautofagia, no qual os lisossomas captam proteínas para serem
degradadas.
- Autofagia mediada por chaperons, no qual as proteínas marcadas por
chaperons são degradadas em lisossomas.

A autofagia é regulada pela AMPcinase e inibida por insulina. Assim, um aumento


de AMP estimula a AMPcinase e, portanto, o processo autofágico. Os peroxissomas são
exemplos de organelos que são degradados por autofagia, tal como as mitocôndrias.

120
ALTERAÇÕES METABÓLICAS NA OBESIDADE E NA DIABETES
AULA TEÓRICA 19
ARNALDO FIGUEIREDO | FÁBIO GOMES

Obesidade
Obesidade é o estado patológico caracterizado pela acumulação excessiva de gordura
no organismo e pelo aumento de peso. Um dos métodos mais importantes para o seu
diagnóstico é o cálculo do IMC (Índice de Massa Corporal), que é um biomarcador da
distribuição da gordura no tecido adiposo. Este pode ser calculado pela equação:

IMC = Peso (Kg) / Altura2 (m)

A partir de um IMC ≥ 30 Kg/m2 consideramos que a pessoa sofre de obesidade.

Classificação IMC = Kg / m2 Risco

Baixo peso < 18,5

Peso normal 18,5 – 24,9

Excesso de peso Pré-obeso 25 – 29,9 Aumentado

Classe I 30 – 34,9 Moderado

Obesidade Classe II 35 – 39,9 Grave


Classe III ≥ 40 Muito grave

A obesidade potencia o aparecimento de várias patologias como a diabetes tipo II,


hipertensão arterial, doenças cardiovasculares, problemas respiratórios e ortopédicos,
entre outros.

Diabetes Mellitus

A diabetes é uma patologia caracterizada por hiperglicémia associada a uma diminuição


da concentração sanguínea ou resistência à insulina, que é um agente importante na
regulação do teor sanguíneo de glicose. Esta pode ser:

- Tipo I - Insulino-dependente: ocorre em casos de diminuição da produção de


insulina e está associada a factores genéticos (destruição auto-imune das células ilhéus
pancreáticos, onde é produzida a insulina) e/ou ambientais (infecções virais, toxinas).
- Tipo II - Não insulino-dependente: (mais comum): ocorre em casos de
resistência à insulina ou de falhas na sua secreção (insulina está presente mas não é
eficaz na interacção com o transportador – GLUT4) e está associada a obesidade severa.

121
Tipo I Tipo II

Faixa etária afectada <20 >40

Síntese de insulina Reduzida ou ausente Normal


Concentrações
Muito baixas ou ausentes Normal ou alta
plasmáticas de insulina
Associada a mutações nos Associada a mutações nos
Susceptibilidade genética
genes da HLA receptores (p.e.)
Obesidade Incomum Muito comum
Possível após stress
Cetoacidose Presente
severo

- Mutações nos genes de HLA (Human Leukocyte Antigen System) estão


associados a susceptibilidade genética à Diabetes tipo I, pois são os genes responsáveis
pela marcação antigénica das células dos ilhéus pancreáticos, podendo levar à sua
destruição auto-imune.

- Mutações nos genes da GLUT4 (único transportador de glucose nas células


musculares esqueléticas e cardíacas que é regulado pela insulina) podem resultar numa
interacção incorrecta entre os receptores e a insulina, tonando este sistema ineficaz e
causando diabetes tipo 2.

Insulina
A insulina é uma hormona produzida nas células β dos ilhéus pancreáticos (ou de
Langerhans). É responsável pela regulação do aporte celular de glicose no tecido
muscular e adiposo, pela inibição da lipase, pela desfosforilação da glicogénio sintetase
(por activação da fosfatase-1), activando-a, estimula a síntese de ácidos gordos e a sua
entrada nos adipócitos, entre outras funções. Interage com receptores celulares,
promovendo a mobilização, para a membrana, dos transportadores GLUT-4 (cuja função
é o transporte da glicose para o meio intracelular).

Alterações metabólicas na Diabetes tipo 1


A diabetes tipo 1 é então causada por uma ausência ou redução da produção de
insulina. Assim, um défice de insulina vai levar a:

 Oxidação dos lípidos para produzir energia por não existir o efeito
inibidor da insulina sobre a lipase, resultando em cetoacidoses;
 Degradação de glicogénio e transporte da glicose produzida para o meio
extra-celular, o que, aliado a uma redução do aporte de glicose para a
célula, leva a um aumento do teor sanguíneo de glicose (hiperglicémia).

122
 Devido a esta hiperglicémia, as pessoas podem incorrer em glicosúria
(presença de glícidos na urina) o que pode levar a desidratação.
 Esta falta de glicose na célula leva a uma maior degradação de proteínas
para compensação energética, o que leva a uma diminuição da massa
muscular e de peso e a fadiga crónica.

Alterações metabólicas na Diabetes tipo 2


A diabetes tipo 2 é causada por resistência à insulina (seja por falhas nos
receptores ou na própria insulina). Deste modo, os níveis de insulina são normais,
podendo até ser elevados, sendo as alterações metabólicas típicas:

 Uma maior propensão para obesidade, já que existe constantemente insulina


em valores altos em circulação, o que provoca uma inibição da enzima lipase e
um aumento da síntese de ácidos gordos, o que leva a um aumento da massa
adiposa dos indivíduos, sem haver degradação da mesma.
 O aumento da produção de lípidos leva também a um aumento do teor de
ácidos gordos no plasma, e, por consequência, a um aumento das VLDL, para
transportar os mesmo.
 Em casos de stress (jejum ou exercício físico intenso) a produção de ácidos
gordos aumenta, de modo a compensar os gastos energéticos, o que resulta
num aumento dos ácidos gordos livres, podendo levar a casos de cetoacidoses.

Obesidade

Factores que influenciam o desenvolvimento de Obesidade:

 Genéticos – é sobretudo uma doença poligénica (90% dos casos) mas existem
também formas monogénicas que são hereditárias e autossómicas
dominantes

 Ambientais – factores do meio envolvente, taxa metabólica, prática ou não


de exercício físico, alimentação…

É uma doença de causa multifactorial uma vez que apenas factores genéticos
(existência de genes de susceptibilidade para a obesidade) não são suficientes ou
necessários para o aumento de gordura. Estes factores têm então de estar combinados
com factores ambientais para que uma pessoa se torne obesa.

123
Leptina

Os factores genéticos da obesidade prendem-se sobretudo com mutações no gene


que codifica o receptor da hormona leptina, o gene ob. Esta hormona produzida nos
adipócitos do tecido adiposo tem como função reduzir o apetite actuando da seguinte
forma:

 inibindo a síntese do neuropéptido Y (NPY, um estimulador do apetite) ao


nível do núcleo arqueado (agregação de neurónios no hipotálamo
constituído por diferentes grupos importantes de neurónios, como
neurónios responsáveis por controlar a fome).

 estimulando a síntese da hormona α-MSH (inibidora do apetite).

Assim, pessoas que sofrem de obesidade possuem elevados valores de leptina


circulante (o nível de leptina circulante é directamente proporcional à quantidade de
gordura no corpo), contudo devido a mutações que ocorrem no gene que codifica o seu
receptor tornam-se resistentes aos efeitos desta hormona.
Esta hormona é também responsável por estimular os mecanismos de oxidação dos
ácidos gordos. Havendo esta resistência, não haverá a oxidação de ácidos gordos o que
levará a obesidade.

Mutações no gene receptor da leptina vão então causar acumulação de lípidos e


hiperfagia (característica da obesidade).

Obesidade e Resistência à Insulina

Na Obesidade, a acumulação de gordura vai levar a uma diminuição dos receptores


de glicose que para actuarem necessitam de insulina. Assim, esta diminuição vai levar a
um aumento da insulina circulante numa tentativa de compensar a resistência
adquirida, entrando num sistema de feedback positivo (quanto maior o teor de insulina
circulante, maior a resistência), o que poderá levar a diabetes tipo II.

Para além disso, a insulina, tal como a leptina, está também associada à sensação de
saciedade quando actua no hipotálamo. Assim, se houver resistência aos seus efeitos,
irá ocorrer um aumento do apetite.

A adiponectina é uma hormona que também é produzida no tecido adiposo e que


está envolvida na supressão de processos metabólicos que podem causar diabetes tipo
II, obesidade e ateroesclerose. A concentração desta hormona, ao contrário da leptina,
é inversamente proporcional à percentagem de gordura corporal nos adultos. Assim, em
casos de obesidade, devido à grande quantidade de gordura acumulada, a adiponectina
está presente em baixa quantidade, diminuindo a inibição de processos metabólicos que
levam à resistência à insulina (diabetes tipo II).

124
DISLIPIDÉMIAS
AULA TEÓRICA 20
ANA CARREIRA | CARLOS CODEÇO

Lipoproteínas:
São macroestruturas compostas por lípidos e proteínas que permitem o transporte dos lípidos
(não hidrossolúveis) no sangue. Já os ácidos gordos circulam ligados à albumina.

Diferem consoante a sua densidade, mobilidade electroforética e lípidos maioritários.

Assim temos:

 Quilomicrons – sintetizados no intestino, transportam TG exógenos (provenientes da


digestão), sofrem a acção de lipoproteína lipases (LPL) e os quilomicron remanescentes
são captados pelo fígado;
 VLDL – sintetizados no fígado, transportam TG endógenos;
 LDL – sintetizada a partir das VLDL (VLDL-IDL-LDL), transporta colesterol esterificado do
fígado para os tecidos (mau colesterol);
 HDL – sintetizada no fígado, transporta o colesterol de tecidos extra-hepáticos para o
fígado, onde pode ser convertido, por exemplo, em sais biliares (bom colesterol).

Definição:

Dislipidémias – desregulação dos níveis plasmáticos de lípidos (por falta ou excesso), relacionada
com o seu transporte (alterações do metabolismo da lipoproteínas, que também se encontram
em níveis anormais). Geralmente são assintomáticas e são detectadas em análises de rotina ao
sangue. É importante compreender que não só o excesso de colesterol ou TG (os lípidos mais
importantes), mas também a falta pode levar a patologia, dado que o colesterol é necessário
para as membranas celulares e para a síntese de hormonas esteróides, sais biliares e vitamina
D.

Classificação:

Fenotípica - classificação de Fredrickson (WHO) – é baseada no aspecto físico do plasma deixado


em repouso, que é diferente consoante o seu conteúdo em lípidos. É confusa e pouco prática.

Mas não nos podemos basear apenas no aspecto! É necessário também fazer o doseamento
plasmático dos TG e colesterol, podendo relacioná-lo com o aspecto. Podemos ainda fazer uma
electroforese para ver o tipo de lipoproteínas e correlacionar isso com o conteúdo em colesterol
e TG.

Assim chegamos à classificação laboratorial: Hipercolesterolémia isolada (mais frequente)-


aumento do colesterol total (CT) e/ou LDL-C.; hipertrigliceridémia isolada - aumento dos TG;
hiperlipidémia mista - aumento do CT e TG; diminuição isolada do HDL-C ou associada a
aumento dos TG ou LDL-C e outras como a hipocolesterolémia por exemplo por um défice nas
enzimas da síntese do colesterol (mas esta é pouco compatível com a vida).

125
Causas:

1. Dieta – graças a um consumo excessivo, o que por sua vez pode dever-se a uma
desregulação neuroquímica do hipotálamo (por excesso de grelina ou falta de leptina);
2. Apoproteínas – mutações relacionadas com o transporte (p.e. na Apo-B100, que é
reconhecida pelo receptor de LDL e assim deixaria de o ser, não entrando o colesterol
para a célula e aumentando a sua concentração no plasma);
3. Receptores das lipoproteínas: mutações nos genes que codificam os receptores de LDL,
p.e. (hipercolesterolémia);
4. Enzimas associadas a lipoproteínas – transferases, lípases.. Uma mutação na
lipoproteína lípase (LPL) leva a uma incapacidade de digerir as gorduras, que acumulam.

Classificação etiológica
É importante determinar se a causa é primária ou secundária porque queremos tratar a causa e
não só os sintomas.

Causas primárias (origem genética relacionada com a desregulação de alguns dos


componentes das lipoproteínas)

A. Síndrome da quilomicronémia

 Causa e alterações bioquímicas


o TG muito aumentados, devido à não degradação dos quilomicrons, potenciada
por défices na actividade da LPL e na cedência de apo-C-II e apo-E pelas HDL.
 Sintomas
o Xantomas, perda de memória e dores abdominais.
 Risco
o Necrose pancreática.
 Terapêutica
o Redução da ingestão de lípidos.

B. Hipercolesterolémia Familiar (HF) – mais frequente

 Causa
o Gene que codifica os receptores hepáticos de LDL, gene LDLR, cr19p13.3,
maioritariamente autossómica dominante;
o Gene ApoB;
o Gene PSCK9.
 Alterações Bioquímicas
o Acumulação de LDL e, consequentemente, de colesterol no plasma.
 Sintomas
o Xantomas e xantelismas.

126
 Terapêutica
o É diferente consoante se trate de homozigóticos ou heterozigóticos (simples ou
combinados), já que se verificam fenótipos mais “bravos” com duas cópias
mutadas do gene (dosagem génica).
 Heterozigóticos: administrar colestiramina, que diminui a reabsorção
de ácidos biliares o que leva o organismo a aumentar a síntese de sais
biliares (consumindo colesterol). A diminuição de sais biliares leva
também a um aumento compensatório do numero de receptores
hepáticos de LDL, o que vai também aumentar a reabsorção de
colesterol. Podemos também administrar estatinas, que inibem a HMG-
CoA reductase, enzima chave na síntese do colesterol.
 Homozigóticos: é necessário definir a capacidade residual dos LDL-R,
sendo que para valores >2%, administra-se colestiraminas, estatinas e
ácido nicotínico (inibe síntese hepática de TG). No entanto, é preciso ter
cuidado, pois a diminuição de síntese TG leva a um aumento de AG
livres (FFA), o que vai estimular a neoglicogénese, aumentando os níveis
de glucose plasmática e consequentemente a resistência à insulina,
potenciando a diabetes. É também importante reduzir a ingestão de
colesterol.
 Risco
o Aterosclerose (foam cells)

C. Dislipidémia familiar combinada (DFC) (disbetalipoproteinémia)

 Causa:
o Défice de apo-E, autossómica recessiva;
o Secundária a obesidade, diabetes, alcoolismo, hipertiroidismo.
 Alterações bioquímicas:
o Acumulação de quilomicrons remanescentes (precursor de VLDL), VLDL, IDL
(têm apo-E) e LDL (os receptores de LDL no fígado reconhecem sobretudo a apo-
E).
 Terapêutica:
o Dieta pobre em colesterol;
o Controlo dos níveis de colesterol.
 Risco:
o Aterosclerose.

D. Hipertrigliceridémia familiar

 Causa
o Mutação no gene da ApoB (autossómica dominante – mais grave quando os 2
genes estão mutados), que leva a um aumento de síntese da Apo-B100 (o que
leva a um aumento de VLDL) e da Apo-B48 (o que leva a um aumento dos
Quilomicron), que vai levar à incapacidade de utilizar TG (como fonte de
energia).

127
 Alterações
o Aumento de TG plasmáticos;
o Colesterol normal.
 Risco
o Doença coronária precoce

E. Abetalipoproteinémia

 Causa
o Défice na síntese de apo-B
 Alterações
o Não sintetiza apo-B100 nem apo-B48 logo não se formam VLDL nem
quilomicron;
o Incapacidade de absorção lipídica intestinal, o que leva a um défice de vitaminas
lipossolúveis.
 Sintomas
o Eritrócitos espiculados irregulares (acantócitos);
o Perturbações neurológicas.
 Risco
o Angina de peito;
o Enfarte do miocárdio;
o Acidente vascular cerebral;
o Insuficiência vascular periférica.

F. Doença Tangier (analfalipoproteinémia)

 Causa
o Défice na síntese de apo-A-I (HDL e quilomicron)
 Alterações
o Aumento de TG devido aos quilomicron sem apo-A-I
o Diminuição de HDL-C, o que vai obrigar à captação do colesterol por
macrófagos.
 Risco
o Aterosclerose (foam cells)
o Neuropatia – défice neurológico

G. Hipercolesterolémia poligénica

H. Hipocolesterolémia – défice de 7-dehidrocolesterol reductase.

128
Causas Secundárias

Doença Alteração dominante


Diabetes mellitus

Alcoolismo
Aumento de TG
Insuficiência renal crónica
Fármacos (doses altas de diuréticos, beta-
bloqueadores, corticoesteroides,
anabolizantes)
Hipotiroidismo
Aumento de colesterol
Síndrome nefrótica

Aterosclerose – uma das maiores consequências das dislipidémias.


 Quando há excesso de gordura (LDL), esta tem tendência a oxidar em contacto com o
O2. Assim, fica alterada e é fagocitada pelos macrófagos para ser eliminada. Quando a
gordura se encontra em excesso, os macrófagos não conseguem eliminar a sua
totalidade, e formam-se células esponjosas (foam cells). São depois libertadas citocinas
que desencadeiam a cascata da reacção inflamatória, levando à formação da cápsula do
ateroma. Por fim, o calibre dos vasos diminuirá, podendo levar à obstrução completa do
vaso, causando isquémia/hipoxia.

Terapia farmacológica nas dislipidémias


1. Resinas sequestradoras de ácidos biliares
 Bloqueiam a reabsorção intestinal de ácidos biliares e promovem a remoção das
LDL da circulação através da estimulação da síntese hepática de receptores para
LDL (o colesterol é utilizado para a síntese de ácidos biliares, havendo menos
colesterol a circular no sangue).
2. Inibidores da HMG-CoA redutase (estatinas)
 Inibem a síntese de colesterol, resultando numa diminuião da formação das LDL
e aumento da síntese do receptor para as LDL;
 A HMG-CoA redutase origina mevalonato, que é um precursor não só de
colesterol, mas também da coenzima Q10 (é um dos transportadores de
electrões na OXPHOS). É, portanto, necessário ter cuidado com a administração
de estatinas, pois podem desencadear uma citopatia.

129
3. Fibráceos
 Activam a lipoproteína lípase (LPL), promovendo a lipólise de TG sérico, podem
aumentar HDL e reduzem a produção hepática de VLDL (logo diminui TG, col-
Total e LDL).
4. Ácido nicotínico
 Inibem a produção hepática de VLDL (diminui TG), inibem a lipólise nos
adipócitos e podem aumentar a HDL;
 É necessário ter cuidado pois também causam hiperglicémia e resistência à
insulina.

Nota:
A CETP (cholesterol ester transfer protein) é uma glicoproteína plasmática que transfere ésteres
de colesterol das HDL para as lipoproteínas que contêm apo-B. Ao inibirmos a CEPT (p.e. através
de Torcetrapib), podemos aumentar os níveis de HDL (devido ao aumento de apo-A-I) e diminuir
o LDL-C devido à diminuição dos níveis de apo-B. No entanto, não altera significativamente os
níveis de colesterol e de TG séricos.

Bom estudo!

130
SÍNDROME METABÓLICA
AULA TEÓRICA 21
TÂNIA CARVALHO

Síndrome Metabólica
1 - Definição
Conjunto de alterações metabólicas que incluem resistência à insulina,
hipertriglieridémia, decréscimo de colesterol-HDL (este sintoma nem sempre está
presente no início da patologia), obesidade com hipertensão.
Os doentes apresentam risco aumentado para doenças crónicas como
hipertensão, doença coronária e diabetes.

Segundo a American Heart Association pode ser definida se identificada a presença de


três ou mais dos seguintes items:

2 - Principais Características
 Obesidade abdominal (excesso de tecido adiposo em redor da zona abdominal);
 Dislipidémia aterogénica (capaz de induzir aterosclerose): aumento TG,
diminuição HDL e aumento LDL plasmático que contribuem para a formação de
ateroma nos vasos periféricos;
 Tensão arterial elevada;
 Resistência à insulina ou intolerância à glucose;
 Estado pro-trombocítico (e.g. níveis sanguíneos elevados de fibrinogénio ou de
inibidor da ativação do plasminogénio-1);
 Estado pró-inflamatório (e.g. níveis elevados de proteína C reativa no sangue).

3 - Causas possíveis:
1. Stress: uma disfunção no eixo HPA induz um aumento dos níveis plasmáticos de
cortisol; este promove um aumento de glicose e de insulina que promove
adiposidade visceral, resistência à insulina e dislipidémia.

131
2. Estilo de vida sedentário, excesso de peso e obesidade que geram aumento do
tecido adiposo, razão LDL/HDL (hipercolesterolémia) e tendência para aumento
da trigliceridémia e glicémia.
3. Envelhecimento: o síndrome metabólico afeta metade da população acima dos
65 anos de idade devido à diminuição da adaptabilidade da célula-beta ao
excesso de ácidos gordos livres, acompanhado de deficiente sinalização mediada
pelo sistema nervoso simpático.
4. Doenças reumáticas: a comorbidade pode estar ass.ociada às doenças
reumáticas. A psoríase (com rico cardiovascular) e a artrite psoriática
(inflamatória) têm sido relacionadas com a Síndrome Metabólica.

4 - Etiologia
Associado ao desenvolvimento de gordura visceral, os adipócitos promovem um
aumento dos níveis plasmáticos de TNFα e modificam os níveis de libertação de
adiponectina (diminuição) e resistina (aumento).
TNFα causa a produção de citocinas pró-inflamatórias e ativa a sinalização celular
através da interação com o recetor para o TNFα, podendo conduzir à resistência à
insulina.

6- Riscos
- Diabetes
- Problemas cardíacos

5 – Tratamento
 Dieta saudável
 Exercício físico
 Diuréticos e inibidores ACE podem ser usados para tratar hipertensão.
 Medicamentos para o colesterol podem ser usados para baixar os níveis de LDL
e triglicerídeos e aumentar os níveis de HDL (ex: Estatinas)
 Usar medicamentos para diminuir a resistência à insulina ainda é controverso
(e.g. metaformina ou
 thiazolidineadiones)

132
CASO CLÍNICO

Senhor, 69 anos, engenheiro químico (reformado). Tinha alteração das provas


hepáticas (transaminases elevadas).
Antecedentes: enfarte agudo do miocárdio, tumor na próstata, bócio multinodular.
Factores de risco: dislipidémia mista, hipertensão arterial, ex-fumador, hiperglicemia em
jejum.
Medicação: antihipertensor, antidiabético oral (para aumentar a eficácia da entrada de
glucose nas células), antidislipidémico, antiagregante plaquetar, inibidor da bomba de
protões, hormonas tiroideias.

 Pressão arterial 80/150 mmHg


 Abdómen globoso, indolor à apalpação, sem massas organomegálicas ou edemas
periféricos
 ↑Transaminases (ALT e AST), ↑ Fosfatase alcalina, ↑ Gama GT, ↑ Bilirrubina
Total, ↑ Glicémia em jejum, ↑ LDL, ↑Triglicerídeos
 Fígado gordo

O que valorizar nos antecedentes? Bócio (desregulação endócrina), enfarte do


miocárdio, ex-fumador, etc.
Apresenta Síndrome metabólica? Sim, tem resistência à insulina (hiperglicemia
em jejum), obesidade, hipertrigliceridémia, hipertensão arterial.
É importante mudar o estilo de vida? Sim, diminuir o peso.
O tipo de tratamento farmacológico é adequado? Sim, porque está a tratar
todos os sintomas, mas é necessária uma alteração dos hábitos alimentares.

133
134
ALTERAÇÃO DA HOMEOSTASE DO CÁLCIO E MECANISMOS DE MORTE CELULAR
Aula Teórica 22
CAROLINA BAPTISTA | CAROLINA SIMÕES | CAROLINA PRATAS

Objetivos:
1. Rever os papéis fisiológicos do Cálcio
2. Descrever os mecanismos de controlo da homeostase do cálcio a nível
plasmático (calcémia) intracelular
3. Avaliar a importância da desregulação intracelular de cálcio na génese dos
processos de morte celular: apoptose, necrose e autofagia.

Funções fisiológicas diretamente dependentes do cálcio:


O corpo humano contém entre 1 e 1,5Kg de Ca2+, sendo que a maior parte
(aproximadamente 98%) está localizada na componente mineral dos ossos. Para além
do seu papel como constituinte ósseo, o cálcio funciona também como uma substância
sinalizadora, regulando a atividade de enzimas, canais iónicos e componentes do
citoesqueleto. O mecanismo utilizado para esta regulação está relacionado com a
calmodulina.
A calmodulina é uma proteína relativamente pequena a que o cálcio se liga. Este
complexo ativa uma cinase dependente de calmodulina que, ao fosforilar vai
ativar diversas proteínas, nomeadamente enzimas fundamentais para o
metabolismo, como é o caso de algumas desidrogenases.

O cálcio é portanto necessário para a formação dos ossos e de cristais de


hidroxiapatite, para a contração muscular e para a libertação de hormonas e
neurotransmissores. Durante a gravidez e o período de amamentação aumenta a
necessidade de cálcio do organismo.

Homeostase do Cálcio:
O metabolismo do cálcio é equilibrado em adultos saudáveis. Uma vez que
excretamos cálcio, quer a nível renal quer a nível intestinal, tem que haver sempre um
aporte adicional do mesmo, sendo que o consumo diário deste componente é
aproximadamente 20mmol. De facto, produtos que ingerimos quotidianamente como
lacticínios, nomeadamente o queijo, são particularmente ricos em cálcio. São captados
cerca de 3mmol de Ca2+ por dia pelo osso, sendo que o mesmo liberta 1mmol/dia.
Quanto à excreção de cálcio são expulsos por dia cerca de 2mmol de Ca2+ pela urina e
cerca de 18mmol pelas fezes.

O calcitriol e a hormona da paratiroide por um lado, e a calcitonina por outro,


asseguram um nível de cálcio no plasma sanguíneo e no meio extracelular mais ou
menos constante. A proteína da hormona paratiroideia (PTH; 84AA) e o esteroide
calcitriol promovem processos diretos e indiretos que aumentam os níveis de cálcio no

135
sangue. O calcitriol aumenta a reabsorção de cálcio nos intestinos e nos rins por indução
de transportadores. A hormona paratiroideia assegura que estes processos ocorram ao
estimular a biossíntese de calcitriol nos rins e a libertação de cálcio do osso. A
antagonista da PTH, a calcitonina (32AA), contraria estes processos.

Desregulação da Homeostase do Cálcio:

 Numa situação de alcalose (aumento do pH), existe um aumento da captação de


cálcio pelas proteínas, o que desencadeia uma situação de hipocalcémia.
 A hipocalcémia provoca o aumento da concentração da hormona da paratiroide
(PTH) para que sejam repostos os níveis de cálcio plasmático normais. Isto acontece
porque, tal como já foi dito, a PTH tem efeitos na reabsorção de cálcio tanto a nível
ósseo como a nível renal, o que permite a passagem do cálcio para o plasma.
 Na membrana das células nervosas, existe um trocador Ca2+/Na+. Em situações
de hipocalcémia, o transporte deste para fora das células aumenta. Consequentemente,
aumenta o transporte de sódio para o interior dos neurónios. O sódio, a nível das células
nervosas, desencadeia um potencial de ação que vai provocar a libertação de um
neurotransmissor, a acetilcolina. O impulso nervoso vai então ser transmitido às células
efetoras, os miócitos, que possuem na sua membrana recetores para a acetilcolina. A
ligação da acetilcolina a esses recetores vai provocar a abertura de canais iónicos,
ocorrendo a entrada de Na+ para o citoplasma que vai, por sua vez, desencadear um
potencial de ação na célula muscular. Todo este processo leva à contracção muscular,
pelo que um dos sintomas de uma situação de hipocalcémia é a ocorrência de espasmos
musculares.
 Quando há aumento da [Ca2+], em situações de hipercalcémia, diminui a
concentração da hormona PTH, aumentando os níveis de calcitonina, libertada pela
tiróide. Esta vai contrariar a libertação de cálcio, provocando a sua absorção pelas
células a nível renal e ósseo.

Entrada e Saída de Cálcio das Células

O cálcio entra nas células, através da membrana plasmática, por dois processos
diferentes: por canais sensíveis à voltagem que respondem à despolarização e por
recetores ionotrópicos, como é o exemplo do receptor do glutamato. Já dentro da
célula, podemos encontrar cálcio armazenado no retículo endoplasmático liso e nas
mitocôndrias.
Em condições normais, a mitocôndria capta cálcio por uniporte. A entrada do
cálcio deve-se ao potencial eletronegativo da mitocôndria, que se gera através da saída
de protões. Assim, quanto maior for a eletronegatividade da mitocôndria, maior é a
entrada de cálcio para dentro desta.
A expulsão do cálcio da mitocôndria dá-se através de trocadores Na+/Ca2+
(transportadores reversíveis que realizam antiporte) em situações normais. No caso de

136
uma situação patológica, esta expulsão ocorre através da abertura de poros, o que leva
a ocorrência da morte celular.
O armazenamento de cálcio no REL permite manter uma baixa concentração de
cálcio citoplasmático. Esta função é particularmente exercida no retículo
sarcoplasmático, que é uma forma especializada do REL presente nas células
musculares.
Para que o cálcio possa ser utilizado pela célula como substância sinalizadora, é
necessário que saia do retículo endoplasmático. Esta saída pode ser feita através de
recetores de rianodina (RYRs) que funcionam como canais de cálcio intracelulares, ou
então provocada por recetores acoplados a proteínas G, que ativam a fosfolipase C. Esta
enzima é responsável pela formação de dois segundos mensageiros a partir de
fosfolípidos da membrana, o IP3 (inositol 3-fosfato) e o DAG (diacilglicerol). O IP3 migra
para o RE, onde vai provocar a abertura de canais de Ca2+, permitindo a passagem deste
ião para o citoplasma. O DAG, por outro lado, permanece na membrana celular, onde
ativa proteínas cinases C, que vão por sua vez fosforilar outras proteínas na presença de
Ca2+, permitindo assim a transmissão do sinal.
A concentração de cálcio no meio intracelular é sempre inferior ao meio
extracelular e deve ser muito bem regulada, uma vez que altas concentrações de Ca 2+
têm efeitos citotóxicos sobre as células. Isto porque o Ca2+ ativa inúmeras enzimas e,
portanto, quando em excesso, pode levar à sobreativação das mesmas, como por
exemplo das calpaínas, uma família de enzimas que ativa caspases que provocam a
ruptura dos lisossomas. Esta sobreativação de enzimas pode ainda conduzir a uma
produção elevada de radicais livres e degradação celular. A concentração de Ca2+
citoplasmático tem de ser então mantida através de trocadores Na+/Ca2+, que
transportam o Na+ e o Ca2+ para dentro e para fora da célula, respetivamente, e de
bombas dependentes de ATP, as cálcio ATPases, responsáveis pela exocitose de Ca2+ por
transporte ativo.

Morte Celular:
A morte celular pode ser causada pelo aumento da [Ca2+].

137
A célula está muitas vezes exposta a condições que podem levar à lesão celular.
Essa lesão pode ser reversível até certo ponto, depois do qual a célula morre. A morte
celular pode seguir a via da necrose ou da apoptose, sendo a primeira sempre
patológica, enquanto que a segunda pode ocorrer também durante processos
fisiológicos normais do organismo.

As causas mais comuns de lesões celulares são: ausência de oxigénio (hipóxia);


agentes físicos (traumas, temperatura, radiação, choque); agentes químicos e drogas;
agentes infeciosos; reações imunológicas; distúrbios genéticos e desequilíbrios
nutricionais.

O estímulo nocivo desencadeia vários processos intracelulares, como danos na


membrana, que afectam a mitocôndria (levando à diminuição da produção de ATP e à
consequente morte celular), os lisossomas (causando digestão enzimática dos seus
componentes celulares) e a membrana plasmática em si, culminando na perda do
conteúdo celular. Há também aumento do cálcio intracelular uma vez que, devido à
deficiência energética da célula, deixa de ocorrer o seu transporte para o meio
extracelular.

O cálcio activa muitas enzimas que levam não só à degradação celular (como as
endonucleases e as proteases) como também ao aumento da produção de espécies
reativas de oxigénio (radicais livres, como o O2, H2O2, OH), conduzindo à proteólise e
dano do DNA.

Devido à diminuição da quantidade de ATP disponível, dá-se a perda das funções


celulares dependentes de energia. A atividade do trocador Na+/K+ ATPase na membrana
plasmática diminui, acumulando-se sódio no meio intracelular e ocorrendo perda de
potássio para o meio extracelular. O metabolismo energético alterado contribuirá ainda
para o aumento da glicólise anaeróbica e diminuição das reservas de glicogénio,
aumentando a concentração de ácido láctico e de fosfato inorgânico no organismo. Esse
aumento de produção ácida causa diminuição do pH, prejudicando a atividade de muitas
enzimas celulares. Por fim, do dano às membranas das mitocôndrias e dos lisossomas
resulta a diminuição da síntese proteica.

-Apoptose;
Morte
-Necrose;
Celular
-Autofagia.

138
Apoptose:

A apoptose ou morte celular programada é um modo de “autodestruição celular”


que requer energia e síntese proteica, desempenhando um papel importante no sistema
imunitário (ao permitir a eliminação de células tumorais, infetadas por vírus ou com DNA
irreparavelmente danificado) e também durante o desenvolvimento embrionário. A
apoptose é caracterizada por:

- Redução do Volume Celular;

- Manutenção da integridade dos organelos;

- Manutenção dos níveis de ATP;

- Manutenção da homeostase iónica (parcialmente);

- Invaginação da superfície membranar;

- Condensação e fragmentação da cromatina;

- Não afetar células vizinhas.

A apoptose é controlada no meio intracelular através da ativação de enzimas que


degradam o DNA nuclear e as proteínas citoplasmáticas. A membrana celular
permanece intacta (o que difere bastante das situações de necrose), ocorrendo apenas
uma alteração estrutural para que a célula seja reconhecida como um alvo fagocitário.
Macrófagos e outras células fagocíticas reconhecem então e removem as células
apoptóticas por fagocitose, sem ocorrência de fenómenos inflamatórios.

A apoptose pode ser desencadeada por uma série de sinais diferentes que
utilizam várias vias de transmissão. No centro do processo de apoptose encontra-se um

139
grupo de proteases aspartato contendo cisteína, conhecidas como caspases. Estas
ativam-se umas às outras, criando uma cascata enzimática semelhante à cascata da
coagulação sanguínea. As últimas a serem ativadas serão então as caspases efetoras,
que decompõem componentes celulares ou ativam DNases específicas que fragmentam
o DNA nuclear.

A apoptose pode ocorrer por duas vias, Intrínseca ou Extrínseca.

Os estímulos apoptóticos da via intrínseca, como a danificação irreparável do DNA ou


do retículo endoplasmático, levam à ativação da proteína p53 (produto de um gene
supressor tumoral), o que provoca a ativação das proteínas pró-apoptóticas BAK e BAX
e a permeabilização da MEM (membrana externa mitocondrial). Isto leva a que sejam
libertadas para o citoplasma inúmeras proteínas do espaço intermembranar que vão
induzir a ativação de caspases e a apoptose, como a proteína SMAC (ou Diablo), que
inibe o XIAP, um inibidor da caspase-9. O citocromo c é também libertado da
mitocôndria, ligando-se à proteína APAF1, induzindo a oligomerização da mesma e
formando assim um complexo dependente de ATP designado por apoptossoma, que se
liga à caspase-9, ativando-a. Esta, por sua vez, cliva e ativa caspases efetoras, como a
caspase-3 e a caspase-7, conduzindo à apoptose.

A via Extrínseca está dependente da ativação da caspase-8, uma caspase


iniciadora, ativada por meio de uma interação recetor-ligando, quer do sistema Fas,
quer do sistema TNF, que atuam por meio de mecanismos muito semelhantes. O
sistema Fas é utilizado pelos linfócitos T que, quando ativos, estabelecem a ligação dos

140
seus ligandos Fas ao recetor Fas da célula-alvo, que se encontra associado a uma
proteína mediadora, a FADD, responsável pela ativação da caspase-8. O sistema TNF
baseia-se na ligação do fator TNF-α (tumor necrosis factor-α) ao recetor TNF na
membrana da célula-alvo, que se encontra associado à proteína mediadora TRADD,
responsável pela ativação da caspase-8. A Caspase-8, uma vez ativa, pode ativar direta
ou indiretamente as caspases efetoras (3 e 7). A via indireta tem início com a clivagem
da proteína Bid, o que tem como produto a proteína tBID, necessária para a ativação
das proteínas BAK e BAX, resultando no processo descrito anteriormente.

Existem também fatores


inibitórios que se opõem aos sinais
que ativam a apoptose. Estes
incluem bcl-2, uma proteína
codificada por um proto-oncogene,
cujo antagonista é a proteína BAK,
entre outras proteínas
relacionadas. Os genomas de vários
vírus incluem genes para este tipo
de proteína. Assim, ao serem
expressos pelas células do
hospedeiro, previnem que a célula
hospedeira seja eliminada
prematuramente por apoptose, o
que é benéfico para o vírus, uma vez que permite a sua sobrevivência e reprodução.

A apoptose e a necrose por vezes coexistem e compartilham mecanismos e


características

141
Necrose:

 - Intumescência celular;
 - Intumescência e lesão dos organelos;
 - Depleção de ATP celular;
 - Perda de homeostase iónica;
 - Ruptura membranar;
 - Lise nuclear;
 - Inibição da síntese proteica;
 - Processo irreversível (não é preciso reverte-lo, ao contrário da apoptose);
 - Promove morte de células vizinhas.

Pode-se definir necrose como as alterações morfológicas que acontecem após a morte
celular de um tecido vivo, devido à acção progressiva de enzimas nas células que
sofreram uma lesão letal. A necrose é o correspondente macroscópico e histológico da
morte celular causada por uma lesão exógena irreversível. Assim que a célula morre, ela
ainda não é necrótica, pois esse é um processo progressivo de degeneração. As células
necróticas não conseguem manter a integridade da membrana plasmática,
extravasando o seu conteúdo e podendo causar inflamação no tecido adjacente.

Autofagia:

A autofagia é um processo catabólico que envolve a degradação dos próprios


componentes de uma célula através do mecanismo lisossómico. É um processo
altamente regulado que desempenha um papel essencial no crescimento,
desenvolvimento e homeostase celular, ajudando a manter um equilíbrio entre a
síntese, degradação e posterior reciclagem dos organelos celulares.

Existem diversos processos autofágicos. No entanto, todos têm em comum a


degradação dos componentes celulares atrevés do lisossoma. Ao longo da aula foi
descrito um dos processos autofágicos, a Macroautofagia (importante na remoção
celular de organelos lesados e agregados proteicos)

Formação de Autofagossoma + Lisossoma

Autofagolisossoma

MORTE CELULAR

A mitocôndria é um dos organelos que, quando danificado, é digerido por autofagia.

142
O cálcio pode ser importante, como sinalizador celular, para a activação do processo
autofágico.

Conclusões:
 A homeostasia intracelular do cálcio deve ser mantida de modo a evitar a
indução da morte celular.
 A indução da morte celular por apoptose ou necrose depende da variação da
concentração iónica (ex. cálcio) e dos níveis intracelulares de ATP.
 A necrose implica a perda de integridade membranar e a diminuição dos níveis
de ATP; a morte celular por apoptose pode conduzir à necrose.
 A autofagia permite a eliminação de organelos lesados, proteínas com
conformação alterada e agregados proteicos; se este processo falhar ocorre
morte celular.
 A manutenção da homeostasia iónica e metabólica permite manter a
sobrevivência celular.

143
144
O ADIPÓCITO (V1)
AULA TEÓRICA 23
CATARINA SILVA (COM APONTAMENTOS DE DANIELA HENRIQUES E DA BÁRBARA MARQUES)

1. Avaliar a importância do adipócito como célula de


armazenamento e com funções endócrinas

Tecido adiposo:

Os adipócitos são a unidade estrutural do tecido adiposo. Existe dois tipos de tecido
adiposo: tecido adiposo branco e castanho. Cada um é constituído por diferentes tipos de
células. Enquanto que o tecido adiposo branco contém as “adipokines”: resistina, adiponectina,
leptina e apelina, o tecido adiposo castanho contém células responsáveis pela produção de
calor.
O tecido adiposo está presente:
 debaixo da pele;
 cavidade abdominal;
 músculo esquelético;
 vasos sanguíneos ;
 glândulas mamárias.

Adipócito:
Os adipócitos são células gordas do tecido conjuntivo que se diferenciaram e se
especializaram (adipogénese) na síntese e no armazenamento de lípidos (TG e Colesterol).

Função do adipócito:
 manter o equilíbrio energético adequado do organismo (homeostasia);
 através do armazenamento de lípidos, estão a armazenar compostos que podem
ser recrutados e utilizados como Acetil-CoA, para obtenção de energia. Os
triglicerídeos constituem metade da energia oxidativa do fígado, rim, músculo
cardíaco e músculo esquelético em repouso.
 armazenar energia, sob a forma de lípidos;
 mobilizar fontes de energia em resposta ao estímulo hormonal;

 secretar moléculas sinalizadoras como hormonas:
 leptina:
 atua no hipotálamo
 inibe o apetite

145
 inibe a via NPY (neuropeptídeo Y: potente estimulante do apetite
secretado por células no intestino e hipotálamo)
 estimula a via MSH (melanocyte stimulating hormone: supressor
do apetite)
 adiponectina:
 actua no pâncreas
 regula os níveis de glucose e a degradação de ácidos gordos
 resistina (relacionada com obesidade e diabetes tio II)

Constituição do adipócito ao microscópio:

(t) : o adipócito apresenta-se repleto por


triglicerídeos;

(n): o núcleo encontra-se deslocado para a


periferia da célula, quase encostado à membrana
celular;

(c ): o citoplasma surge como uma banda fina


que rodeia o depósito de gordura.

O adipócito é uma célula importante em diversas doenças metabólicas incluindo


diabetes, obesidade e lipodistrofia1 (familiar e esporádica)

2. Explicar a funcionalidade bioquímica do adipócito


Célula Inerte funciona como um depósito/armazenamento
a. Pós-prandial (refeição)
Síntese de ácidos gordos e armazenamento soba forma de Triglicerídeos (Aula
22 de BQ I)
i. As células β-pancreáticas libertam insulina
ii. A insulina é transportada na corrente sanguínea até aos receptores
hepáticos
iii. No fígado promove a degradação de glicose em Acetil- CoA. (outras
fontes de Acetil Co-A para a produção de ácidos gordos são: os aa,
oxidação de piruvato pela PDH e corpos cetónicos)
iv. Acetil-Coa é carboxilada a Malonil-Coa que através de várias reações
origina Palmitato (ácido gordo).
v. Os ácidos gordos sintetizados no fígado são incorporados em
lipoproteínas (VLDL) que os transportam até ao tecido adiposo,

1
Lipodistrofia: anormal distribuição de gordura corporal. Os doentes tendem a desenvolver
resistência à insulina, diabetes e altos níveis de triglicerídeos.

146
vi. Aqui, os adipócitos irão adicionar os AG ao glicerol-3-P para formar
triglicerídeos.
vii. Os adipócitos não possuem glicerol cinase, não conseguem transformar
gicerol em glicerol-3-P. Têm de recorrer à degradação de glicose em
Glicose-3-P. Desta forma os adipócitos necessitam de ter glicose para
ser oxidada de forma a obter glicerol -3-P.
b. Jejum
i. Células α pancreáticas libertam glucagina.
ii. Glucagina vai atuar nos adipócitos, ativando a lipoproteína lípase (LPL).
iii. LPL irá degradar os triglicerídeos em Glicerol e ácidos gordos.
iv. O glicerol não pode ser reaproveitado pelos adipócitos, que não têm
glicerol cinase, sendo então libertados no sangue e transportados até
ao fígado. Neste, por ação da glicerol cinase, é convertido a glicerol 3-
fosfato e transformado em dihidroxiacetona fosfato (intermediário da
glicose ou da gliconeogénese).
v. Os ácidos gordos são transportados pelo sangue, ligados à albumina,
para diferentes tecidos/ órgãos. Aqui sofrem β-oxidação, sendo
convertidos a acetil-CoA, que pode incorporar o TCA e produzir energia.
vi. Os ácidos gordos não são utilizados para obtenção de energia na célula
nervosa (a concentração destes é muito variável, o que poderia
comprometer a funcionalidade de cérebro), nos eritrócitos (por não
possuem mitocôndria, não podem produzir energia através de acetil-
CoA-TCA) e na medula supra renal.

Célula Secretora
 TNF-α – aumenta a resistência à insulina
 Leptina – diminui o apetite, por inibição do NPY (existente nos neurónios
orexigénicos-estimuladores do apetite), activam o POMC (pro-
opiomelancortina, presente no neurónios anorexigénicos- diminuidores do
apetite)
 Resistina – aumenta a resistência à insulina
 Adiponectina – diminui a resistência à insulina
 PAI-1 – aumenta a resistência à insulina
 IL-6 (interleucina-6) – aumenta a resistência à insulina
 ApoE – interveniente na ligação dos quilomicrons, VLDL e HDL

Órgãos onde intervém o adipócito:

 No cérebro
 Pâncreas
 Fígado
 Músculo

As vias de sinalização permitem que o organismo se adapte a uma grande variedade


de estímulos metabólicos, tais como: fome, stress, infeção, inflamação e períodos
curtos de excesso de energia.

147
3. Interpretar o papel do adipócito na resistência à insulina,
diabetes obesidade e síndrome metabólica.

Efeito metabólico e clínico da atividade do adipócito:


Os ácidos gordos circulantes em conjunto com a regulação autócrina do tecido adiposo,
atuam nos PPAR γ (peroisome proliferator activated receptor γ), promovendo a adipogénese
(diferenciação e especialização dos adipócitos).
Os agonistas2 do PPAR γ como as glitazonas, estimulam o adipócito a produzir
adipocotocinas que provocam resistência à insulina, dislipidémias, hipertensão e diminição da
resposta imunológica.

Alterações patológicas no adipócito

•fatores genéticos (ex.: disfunção nos recetores para a insulina ou mutações no gene
codificante da leptina)
•fatores ambientais;
•estilo de vida sedentário,;
•aumento de ingestão de alimentos

•aumento da massa do tecido ádiposo


•aumento plasmático das hormonas que conferem resistência à insulina
provocam: • diminuição da produção de adiponectina.

•"Eixo adipócito- vascular"


•recrutamento de macrófagos para os locais que vão prodzir factores pró
inflamatórios como as citocinas
o aumento do •desencadeia-se um processo inflamatório no tecido adiposo
tecido adiposo : •agravamento da resistência à insulina

Principais doenças associadas:


 Obesidade (provoca alterações com características
inflamatórias no adipócito);
 Diabetes tipo II;

2
Agonista: substância química que interage com o receptor membranar ativando-o e desencadeando
uma resposta que pode ser de aumento oou diminuição da actividade das células às quais os receptores
estão associados.

148
 Síndrome Metabólico;
 Envelhecimento.

Acumulação de tecido adiposo no idoso


A leptina, produzida no tecido adiposo, atua no hipotálamo promovendo a libertação de
norepinefrina que irá atuar junto dos recetores β-adrenérgicos do tecido adiposo (castanho),
ativando a expansão genética dos UCP’S. Estes genes codificam proteínas transmembranares
presentes na mitocôndria que promovem a libertação de calor através da β oxidação.
No idoso, ocorre uma dessensibilização dos recetores β adrenérgicos com consequente
desregulação da termogénese. Este fator associado à diminuição do gasto energético
(sedentarismo) promove a acumulação de gordura e consequente obesidade, no idoso.

Síndrome Metabólica (Aula teórica 21):


Conjunto de alterações metabólicas que incluem:
 Resistência à insulina;
 Hipertrigliceridémia;
 Decréscimo de colesterol – HDL
 Obesidade

O doente que sofre de Síndrome metabólico sofre um risco aumentado de doenças


crónicas como:

 Hipertensão
 Doença coronária
 Diabetes

Obesidade e diabetes tipo II:

A obesidade encontra-se
associada ao aumento de probabilidade
de desenvolver diabetes tipo 2.
Em indivíduos obesos, o tecido
adipose liberta quantidades elevadas de
ácidos gordos não esterificados, glicerol,
hormonas, e citocinas pré-inflamatórias
que provocam a resistência à insulina.
Quando esta é acompanhada por uma
disfunção das células β pancreáticas
ocorre uma desregulação no controlo dos níveis de glucose. Anormalidades nas células β

149
pancreáticas são por isso potenciadoras do desenvolvimento de diabetes tipo II uma vez que
não há produção de insulina para promover a captação de glucose.
Desta forma, num indivíduo normal que tenha obesidade/ resistência à insulina, o
organismo irá aumentar o funcionamento das células β pancreáticas de forma a normalizar a
concentração de glucose. O indivíduo normal irá apresentar hiperinsulinémia compensatória.
Quando ocorre uma disfunção nas β células ou fatores de crescimento, ocorrerá uma
intolerância à glicose com aparecimento de diabetes tipo II.
Anorexia:

•Fatores genéticos
•fatores psicossociais
•fatores socioculturais
•levam a uma perceção errada da imagem corporal .

•alteração nos hábitos alimentares


•indução de vómito
•abuso de laxantes, impedindo a absorção intestinal
•actividade física intensa

•Cachexia:
•grande persa de peso
•atrofia muscular
•fadiga
•perda de apetire
•Nesta situação o retorno apenas por ingestão correcta de
nutrientes já é difícil .
•Regulação anormal do sistema nervoso autónomo e das
hormonas:
•aumento do cortisol
•diminuição da gonadotroppina,
•hipotermia
•bradicardia
•queda de cabelo

150
Lipodistrofia
 Distúrbio na forma como o organismo produz, usa e armazena a gordura.
 Há dois tipos diferentes de lipodistrofia:
o Lipoatrofia – perda de gordura em zonas particulares do corpo (ex. braços,
pernas, face
Ex.: rosto profundo, pernas finas, veias a mostra, nádegas flácidas, barrigas
protuberantes; mas excesso de gordura por exemplo nas costas.
o Hiperadiposidade – associada à acumulação de gordura em determinadas
zonas do corpo
Ex. barriga, mamas, e parte de trás do pescoço

Lipodistrofia congénita generalizada


 Doença genética rara
 Afeta a enzima 1-acilglicerol-3-fosfato O-aciltransferase 2 – a proteína esta localizada na
membrana do RE e converte ácido lisofosfatídico em ácido fosfatídico, o segundo passo
na biossíntese de fosfolípidos de novo.
 Caracterizada por:
o Redução do tecido adiposo desde o nascimento
o Resistência a insulina severa
o Hipertrigliceridémia
o Esteatose hepática
o Diabetes precoce
 Prevalência: <1:12 milhões de indivíduos.

Lipodistrofia associada à Sida


 Efeito secundário dos fármacos anti-HIV (anti-retrovirais)
 Os primeiros estudos indicaram – lipodistrofia em consequência do uso dos inibidores
de proteases
 Estudos mais recentes demonstraram – lipodistrofia em consequência da medicação
simultânea com inibidores da transcriptase reversa e inibidores de proteases.

151
Esquemas de revisões:
Síntese de AG

152
Síntese de TG

153
154
O ADIPÓCITO (V2)
AULA TEÓRICA 23
TÂNIA CARVALHO

Tecido Adiposo
O tecido adiposo está presente maioritariamente debaixo da pele, na cavidade
abdominal, no músculo esquelético, vasos sanguíneos e nas glândulas mamárias.
Constituído pelos adipócitos, que são células gordas do tecido conjuntivo que se
diferenciaram e se especializaram (adipogénese) na síntese e no armazenamento de
lípidos (TG e Colesterol).
São importantes para a manutenção da homeostasia metabólica, por
manutenção do equilíbrio energético (reservas de gordura), pois ao armazenarem
lípidos, estão a armazenar compostos que podem ser recrutados e utilizados como
Acetil-CoA. Os triglicerídeos constituem metade da energia oxidativa do fígado, rim,
músculo cardíaco e músculo esquelético em repouso. É capaz de mobilizar fontes de
energia em resposta a estímulos hormonais e tem ainda uma função secretora de
hormonas (p.e. leptina, adiponectina e resistina).
Ao microscópio, o adipócito surge cheio de
triglicerídeos (t). O núcleo (n) está deslocado para a
periferia da célula quase encostado à membrana
celular. O citoplasma (c) surge como uma banda fina
que rodeia o depósito de gordura.
É célula chave no aparecimento de diversas doenças,
como diabetes, obesidade e lipodistrofia, síndrome
metabólica, entre outros.

Funcionalidade bioquímica do adipócito

Célula Inerte – funciona como um depósito/armazenamento:


- Pós-prandial
• Há libertação de insulina pelas células β-pancreáticas. A insulina inibe a lipase
e estimula a síntese de AG, por excesso de acetil-CoA proveniente da glicólise. Os AG são
integrados nas VLDL que os transportam até ao tecido adiposo, onde vão ser
armazenados sob a forma de triglicerídeos, por junção ao glicerol-3-P.
- Jejum
• Há libertação de glucagina pelas células α-pancreáticas. Esta vai levar ao
recrutamento de triglicerídeos para o fígado, depois de serem submetidos à acção da
LPL, que os cataboliza em glicerol e ácidos gordos. O glicerol é convertido a DHAP para
integrar a glicólise ou a neoglicogénese, produzindo energia ou glucose e síntese
hepática de TG. Quanto aos AG, estes são transportados aos diversos órgãos ligados à
albumina, onde sofrem β-oxidação, sendo convertidos a acetil-CoA, que pode ir para o
ciclo TCA e produzir energia.

155
Nota: A célula nervosa, o eritrócito e a medula supra-renal não utilizam os ácidos gordos
livres como potencial fonte energética.

Célula Secretora
• TNF-α – aumenta a resistência à insulina (os mecanismos ainda não estão bem
definidos mas pensa-se estar envolvido nos processos de resistência à insulina)
• Leptina – diminui o apetite, por inibição do NPY (neuropeptídeo que estimula
o apetite) e estimulando a síntese da hormona α-MSH (melanocyte stimulating hormone
- inibidora do apetite). É antagonista da grelina, produzida no estômago, que induz o
apetite.
• Resistina – aumenta a resistência à insulina.
• Adiponectina – diminui a resistência à insulina (inibe os processos que levam à
resistência da insulina, a sua concentração é inversamente proporcional à quantidade de
gordura).
- Estimula
 Neoglicogénese e entrada da glucose nas células;
 Β-oxidação dos ácidos gordos, clearance dos triglicerídeos
(capacidade de os retirar da corrente sanguínea);
 Sensibilidade à insulina;
 Perda de peso;
 Protecção contra a disfunção endotelial;
 Etc.

156
• PAI-1 – aumenta a resistência à
insulina
• Citosinas, adipsina, visfatina, entre
outros.

→ O adipócito produz substâncias mas


também sofre a regulação feita por estas.

A regulação homeostática do balanço energético nos mamíferos depende do


comportamento e fisiologia individual e da capacidade de captação, armazenamento e
utilização de energia.

Alterações patológicas no adipócito

Muitos factores genéticos (ex.: disfunção nos receptores para a insulina ou


mutações no gene ob codificante para a leptina) combinados (ou não) com factores
ambientais, como um estilo de vida sedentário, com aumento de ingestão de alimentos
podem levar ao aumento da massa do tecido adiposo. Como há um maior número de
adipócitos, há uma maior produção de substâncias que criam resistência á insulina e
diminui a produção de adiponectina. A expansão do tecido adiposo que ocorre durante
o ganho de peso também leva a uma disfunção endotelial.
Por outro lado, o aumento do tecido adiposo vai recrutar macrófagos para os
locais, que vão produzir factores pró-inflamatórios, como as citocinas, desencadeando
um processo inflamatório no tecido adiposo. É também responsável pelo agravamento
da resistência à insulina.

157
Dessensibilização dos receptores β-adrenérgicos

A leptina, produzida no tecido adiposo, atua no hipotálamo promovendo a


libertação de norepinefrina que irá actuar junto dos receptores β-adrenérgicos do tecido
adiposo (castanho), activando a expansão genética dos UCP’S (proteína
desacopladora). No processo de síntese de ATP ocorrem os seguintes passos: o fluxo de
electrões pelos complexos transmembranares resulta no bombeamento de protões para
fora da matriz mitocondrial. (geração de um potencial de membrana). Em seguida esses
protões retornam para a matriz mitocondrial passando por proteínas ATP-sintetases que
utilizam a energia para síntese do ATP a partir do ADP e Pi. A UCP, que está localizada na
membrana interna, quando estimulada, serve como um canal alternativo para que os
protões voltarem para matriz. Nessa processo a energia não é aproveitada para a
fosforiação do ADP, gerando apenas calor, desregulando o processo da termogénese.
Com o avançar da idade, a actividade física diminui, embora a alimentação
permaneça igual gerando uma diminuição dos gastos energéticos e uma consequente
acumulação de tecido adiposo. Este processo leva a uma progressiva dessensibilização
dos receptores β-adrenérgicos, o que leva a uma desregulação da termogénese.
Consequentemente, ocorre uma acumulação de gordura, levando à obesidade do idoso.

Adipogénese

A activação do factor de transcrição PPARγ é essencial na adipogénese. Certos ácidos


gordos ligam-se ao PPARγ podendo, assim, controlar a adipogénese. Além disso, alguns
ácidos gordos actuam como moléculas sinalizadoras em adipócitos, regulando sua
diferenciação ou morte. Desta forma, a composição lipídica da dieta e

158
os agonistas de PPARγ podem regular o balanço entre adipogénese e morte de
adipócitos e, portanto, a obesidade. Por isso, quando o nº de ácidos gordos aumenta, o
nº de adipócitos também aumenta.

Anorexia
Factores genéticos, mas essencialmente, por factores neuroquímicos e
socioculturais, vão causar uma imagem corporal distorcida, que tem como consequência
alterações patológicas na ingestão de alimentos.
Para além das alterações da dieta, vão ainda induzir o vómito, tomar muitos
laxantes, que impeçam a absorção a nível intestinal, e realizar um exercício físico intenso
que culminam todos juntos numa excessiva perda de peso. Isso vai levar a uma
malnutrição extrema, sendo que o seu retorno já seja muito difícil por apenas ingestão
correcta de nutrientes (cachexia).
Esta situação vai ter como consequência uma anormal regulação do sistema nervoso
autónomo e da libertação de hormonas. Desencadeando aumento da produção de
cortisol, diminuição da gonadotropina, hipotermia, bradicardia e queda de cabelo.
(Consultar Seminário 13)

Lipodistrofia
Distúrbio na forma como o organismo produz, usa e armazena a gordura. Há dois
tipos diferentes de lipodistrofia:

 Lipoatrofia – perda de gordura em zonas particulares do corpo (ex. bracos,


pernas, face – Ex.: rosto profundo, pernas finas, veias a mostra, nadegas flacidas,
barrigas protuberantes)

 Hiperadiposidade – associada à acumulação de gordura em determinadas zonas


do corpo (ex. barriga, mamas, e parte de trás do pescoço)

Lipodistrofia congénita generalizada

Doença genética rara, autossómica recessiva. Afecta a enzima 1-acilglicerol-3-


fosfato O-aciltransferase 2 – a proteína está localizada na membrana do RE e converte
ácido lisofosfatídico em ácido fosfatídico, o segundo passo na biossíntese de fosfolípidos
de novo.

159
Caracterizada por:
 Redução do tecido adiposo desde o nascimento (As células adiposas são escassas
e apresentam volume reduzido devido à sua incapacidade de armazenamento de
lípidos);
 Resistência a insulina severa (devido a defeitos nos mecanismos pós-receptores
de acção da insulina presentes nos adipócitos, hepatócitos e células
musculares);
 Hipertrigliceridémia (devido à resistência à insulina);
 Esteatose hepática (“fígado gordo” devido à presença de vacúolos de gordura nos
adipócitos);
 Diabetes precoce (carência de sinalização do adipócito para as células B);
→ Prevalência: <1:12 milhões de indivíduos.

Lipodistrofia associada à Sida

Efeito secundário dos fármacos anti-HIV (anti-retrovirais). Os primeiros estudos


indicaram – lipodistrofia em consequência do uso dos inibidores de protéases. Estudos
mais recentes demonstraram – lipodistrofia em consequência da medicação simultânea
com inibidores da transcriptase reversa e inibidores de proteases.
As terapêuticas anteriormente referidas induzem dislipidémias que são
caracterizadas pelo aumento das lipoproteínas LDL e VLDL. A caracterização detalhada
revelou um aumento da apolipoproteína B, CIII e E.

160
A CÉLULA MUSCULAR – IMPORTÂNCIA DA FOSFOCREATINA
Aula Teórica 24
PEREIRA | CAPELAS

O tecido muscular começa a formar-se a partir da quarta semana de gestação, onde os mioblastos se
fundem e geram fibras musculares esqueléticas. A partir da embriogénese, provêm o tecido muscular estriado
esquelético e cardíaco, e o tecido muscular liso. O tecido muscular corresponde a 30% da massa total do corpo,
e possibilita a conversão de energia química em energia cinética e mecânica, denominando-se este processo de
transdução bioquímica.
Os três tipos de tecido muscular têm características diferentes:
 Tecido muscular estriado cardíaco – é uninucleado e encontra-se apenas no coração, controlado
involuntariamente pelo sistema nervoso autónomo.
 Tecido muscular liso – é involuntário e uninucleado. É o tipo de músculo mais difusamente distribuído
pelo organismo, sendo que se encontra nas paredes dos órgãos ocos, e vasos sanguíneos, etc.
 Tecido muscular estriado esquelético – é multinucleado e depende grandemente do controlo
voluntário ou consciente pelo sistema nervoso.
O tecido muscular esquelético é composto por fibras
musculares esqueléticas, em que cada uma é uma célula
muscular com vários núcleos à periferia, encontrando-
se envolvida pelo sarcolema. Internamente na célula
encontram-se as miofibrilhas, e entre elas encontram-se
o sarcoplasma (liquido que banha as células), as
mitocôndrias e grânulos de glicogénio. As miofibrilhas
organizam-se em unidades contracteis, os sarcómeros, que estão entre linhas z, e envolvidos pelo sarcolema.
O sarcómero consiste em unidades repetitivas de filamentos de miosina e actina-F e contêm também troponina.

Proteínas da fibra muscular


Na fibra muscular existem os miofilamentos finos e grossos. Os finos são a tropomiosina, a actina e a
troponina.
Actina que é uma proteína globular que forma o núcleo dos miofilamentos finos. Cada molécula de
actina contem um local de ligação para a miosina.
Troponina é uma proteína com três subunidades, I, C e T, que permite a ligação da miosina à actina na
presença de cálcio. Sendo que é a subunidade C que se liga ao cálcio. Faz parte dos filamentos finos.
Miosina é uma proteína oligomérica que forma filamentos, designados miofilamentos grossos. É
composta por duas cadeias pesadas – meromiosina pesada – e por duas cadeias leves – meromiosina leve
(associadas às duas cabeças da miosina que têm actividade de ATPase).

161
Sarcómero
O sarcómero é a unidade funcional da contracção muscular. O sarcómero é constituído por filamentos finos
(actina troponina e tropomiosina) e grossos (miosina). Nele podem identificam-se várias bandas:
 Banda A – contém actina e miosina
 Banda I – contém apenas actina
Linha Z – é o que separa dois sarcómeros

Quando há contracção muscular o sarcómero vai “encolher” reduzindo o seu tamanho em cerca de 1%.
O que acontece é que a cabeça da miosina liga-se à actina que está nos filamentos finos e quando a cabeça da
miosina se move, arrasta os filamentos finos e faz “encolher o sarcómero.

O processo de contracção muscular será explicado mais a frente.

162
A maquinaria necessária á contração muscular é:
 O sarcómero – unidade contráctil
 O retículo sarcoplásmico e o sistema tubular transverso são o aporte de cálcio ao músculo através
de 3 proteínas importantes:
 O canal de cálcio sensível à voltagem – abre quando há um aumento do
potencial de acção
 Bomba de cálcio - SERCA
 Canal de cálcio da riemidina
 O sistema membrana-citoesqueleto pela ligação contrátil à membrana plasmática, que permite ao
músculo contrair como um todo. Isto é conseguido através de através de 3 proteínas importantes:
 Distrofina – que se encontra associada a glicoproteínas
 Espectrina
 Integrina – que faz a ligação á matriz celular

Gânglios da base

córtex motor

libertação de Acetilcolina a nível da junção neuromuscular, que permite a entrada de sódio


despolarizando a membrana através de canais ionotrópricos. Activa também os canais metabotrópicos

iniciação da contração muscular através da libertação de cálcio do retículo sarcoplásmico após o potencial de
acção

o cálcio liga-se à troponina

alteração conformacional do complexo de tropomiosina-troponina

exposição dos locais de ligação à miosina

A unidade motora é o neurónio motor e a respectiva fibra muscular.

Na ausência de cálcio, o complexo de tropomiosina-troponina bloqueia a ligação da miosina à actina. Sendo


assim o cálcio ligado à troponina leva ao movimento do complexo com exposição dos locais de ligação, sendo
que a actina se liga à miosina por pontes cruzadas. Para a formação destas pontes também é necessária a presença
de ATP, para que ocorra a sua hidrólise e a pontes se possam efectuar. É também necessário ATP para que haja

163
o relaxamento muscular (para quebrar as pontes).Esta é a razão do rigor mortis porque deixa de existir ATP e
contracção mantém-se.

Fontes de Energia para a Contracção Muscular


Para que se dê a contracção muscular é preciso energia (sob a forma de ATP). O músculo pode utilizar
várias fontes de energia, e a escolha de qual fonte usar vai depender do tipo de exercício e das reservas
energéticas do organismo.
Creatina-P  a transformação de creatina-P em creatina liberta um Pi que pode ser utilizado para fosforilar
uma molécula de ADP e assim originar rapidamente ATP. Esta é uma estratégia extremamente rápida de
formação de ATP, contudo as reservas de creatina-P no músculo esgotam-se rapidamente. Por este motivo, este
tipo de estratégia é mais utilizada em exercício explosivo de curta duração (ex: sprints ou halterofilismo).
Nota: A creatina é sintetizada no fígado a partir de arginina, ornitina e glicina.

𝐶𝑟𝑒𝑎𝑡𝑖𝑛𝑎 − 𝑃 + 𝐴𝐷𝑃 → 𝐶𝑟𝑒𝑎𝑡𝑖𝑛𝑎 + 𝐴𝑇𝑃


Catalisada pela Creatina Cinase (CK)

Glicogénio muscular em condições de actividade moderada, a degradação do glicogénio consegue suprir


as necessidades energéticas por cerca de 5 a 10 minutos.
A activação da degradação do glicogénio no músculo pode ser activada pela epinefrina, que actua em
receptores associados à proteína G, fazendo aumentar o AMPc e activando PKA. A PKA, por sua vez, vai
fosforilar a glicogénio sintetase que fica inactiva, e vai também activar a fosforilase cinase que vai activar por
fosforilação a glicogénio fosforilase que fica assim activa  degrada o glicogénio. Como o músculo não possui
glucose 6 fosfatase, a glucose 6P formada entra directamente na via glicolítica.

164
.
Quando existe muita Glicose 6P e muito ATP presente estes produtos vão inibir a glicogénio fosforilase
que deixa assim de degradar o glicogénio.
É de referir, também, que a própria calmodulina e o próprio AMP são capazes por si só de activar a
fosforilase cinase que vai depois activar a glicogénio fosforilase (são moléculas activadoras da glicogenólise
bem como da glicólise). O próprio iao Ca2+ tem a capacidade de activar glicogenólise, a glicólise e a fosforilação
oxidativa.
Glicose (sanguínea) e ácidos gordos – após os 10 minutos de exercício moderado começam a ser utilizados
fontes de energia sanguíneas como glicose e ácidos gordos, sendo que dos 30 minutos em diante a utilização de
ácidos gordos é predominante.
Para além do tipo de exercício, o estado das reservas energéticas do organismo também influencia na
escolha da fonte de energia a utilizar.

165
Para o músculo-esquelético, quando há glicose abundante no sangue a via preferencial é a via glicolítica
recorrendo ao glicogénio e a glicose sanguínea. Num estado em que há baixos níveis de glicose sanguínea, vão
ser usado preferencialmente os ácidos gordos sendo que num estado de fome (jejum prolongado) podem ser
usados os corpos cetónicos. Neste ultimo estado, pode haver ainda proteólise e libertação de aminoácidos que
servirão para formar glicose pela neoglicogénese (recordar ciclo da alanina).
No músculo cardíaco, a situação e ligeiramente diferente porque este musculo como precisa de estar
continuamente em actividade não utiliza glicose no estado basal mas sim ácidos gordos, pelo que, só em casos
de fome é que este tipo de músculo pode utilizar corpos cetónicos como alternativa. Aqui nunca poderá ocorrer
proteólise porque isso implicaria diminuição da massa muscular que neste caso levaria a morte.

Ácido láctico – quando o exercício se torna muito intenso e há diminuição do


aporte de O2, a via anaeróbia predomina e forma-se ácido láctico. Este ácido é
depois enviado para o fígado onde pode ser usado na neoglicogénese para formar
glicose que pode ser enviado novamente para o músculo. A esta interacção
musculo-fígado chama-se ciclo de Cori.
Tipos de fibras musculares
Dentro das fibras musculares esqueléticas existem fibras rápidas e fibras lentas
que têm características diferentes entre si.
Fibras rápidas Fibras Lentas
Fibras longas para grande força de contracção Fibras lentas:
- Retículo sarcoplásmico extensolibertação rápida de - Fibras pequenas
Ca2+ - Extenso sistema vascular  cedência extra de O2
- Grandes quantidades de enzimas - Grande número de mitocôndrias  metabolismo
glicolíticascedência rápida de energia oxidativo
- Sistema vascular não muito extenso e poucas - Grande quantidade de mioglobina (côr vermelha)
mitocôndrias (pq. metabolismo oxidativo é secundário) reserva de oxigénio no músculo

Nota: esta divisão e respectivas características não são as mais correctas, mas como foi dado assim na aula decidimos
manter. Se alguém quiser saber mais pode consultar human physiology: the mechanism of body function, 8th edition.
166
Alterações patológicas do Músculo
Necrose muscular
Nestes caos há um aumento dos níveis plasmáticos de creatina e CK (porque há ruptura das células e estes
produtos extravasam para o plasma.

Miopatias
 Miogénicas – a lesão está nas fibras musculares
 Neurogénicas – a lesão está no neurónio motor
Doenças da Junção Neuromuscular
Doenças que levam a uma paralisia progressiva e que quando atingem os músculos do sistema respiratório são
fatais.
 Esclerose Lateral amiotrófica (ELA ou em inglês ALS)
 Atrofia Muscular Bulbar Espinal (Spinal Bulbar muscle atrophy – SBMA) – doença de Kennedy
 Autoimune
 Tóxicas
Miotonias
Há alteração do fluxo iónico que afecta o ciclo de despolarização e repolarização. Levam a paralisias.

Distrofia Muscular
Há uma alteração na proteína distrofina que leva a uma degeneração das fibras musculares. É uma doença
progressiva que se torna fatal quando atinge os músculos respiratórios ou cardíaco.
A distrofia mais frequente é a de Duchenne que é uma doença recessiva ligada ao X. Leva a uma hipertrofia
muscular dos tricípite sural e conduz a lordoses (aumento da curvatura da coluna lombar).

Perguntas:
A) A energia para a contracção muscular pode ser obtida rapidamente a partir da Creatina-P. – V
B) Por acção de um potencial de acção o reticulo sarcoplasmático liberta Na+. Falso, liberta Ca2+
C) A adrenalina é o neurotransmissor da junção muscular. Falso, é a acetilcolina. Embora também possa haver
activação pela epinefrina (em situação de stress) a acetilcolina é o principal.
D) A miosina tem função de ATPase. V
E) A ligação de Ca2+ à miosina permite a exposição dos locais de ligação da actina à troponina. Falso, a
ligação do Ca2+ à troponina é que permite a exposição dos locais de ligação da actina à miosina.

167
168
SISTEMA NERVOSO E INTERACÇÃO NERÓNIO-GLIA
AULA TEÓRICA 25
CAT-PAULII

O sistema nervoso é constituído por neurónios (100 biliões, aproximadamente o número de


estrelas da nossa galáxia) e por células da glia. Estas podem ser:

 astrócitos ( de suporte metabólico)


 oligodendrócitos ( SNC, podendo estar associados a vários axónios)
 células de Schawn (SNP, estando associadas a apenas um neurónio)
 microglia
 células ependimárias

Como é que os neurónios “transferem” a informação?

Quando o neurónio é estimulado, permite a


abertura dos canais de Na+ sensíveis à voltagem, pelo que
o interior da célula fica positiva, dá-se então o potencial
de ação (e a célula encontra-se despolarizada).

Após o pico máximo, é necessário voltar ao


estado basal de modo a poder ocorrer novo estímulo, aí a
célula abre os canais de potássio e fica repolarizada,
voltando ao seu estado electroquímico de repouso.

Durante o potencial de repouso é ativada a bomba Na+K+ em que há saída de 3Na+ e


entrada de 2K+, de modo a manter o potencial elétrico negativo. Esta bomba ATPásica é
responsável pelo consumo de 25/50 % de ATP em repouso.

169
Graças às células de Schawn, que contêm mielina
(isolador da passagem à corrente elétrica), a
despolarização do axónio acontece apenas nos Nódulos
de Ranvier. Diz-se portanto, que a passagem do impulso
nervoso é de forma saltatória. Este facto vai aumentar em
larga escala a rapidez de transmissão do impulso nervoso,
permitindo uma reação rápida ao estímulo.

O impulso nervoso é também unidirecional, pois o


neurónio pré-sináptico contém vesiculas com neurotransmissores que, quando é atingido,
liberta essas vesículas, por fusão com a membrana, e os neurotransmissores são libertados para
a fenda sináptica.
Assim, apenas o neurónio pós-sináptico é estimulado e os neurotransmissores que estão na
fenda sináptica são rapidamente recaptados (reciclados) ou degradados por enzimas, para que
não ocorra uma hiperestimulação.

O cérebro tem duas funções essenciais:

Função elétrica: Esta permite o fluxo elétrico em cada neurónio, permitindo a propagação do
impulso nervoso e a transmissão da informação em cada neurónio.

Função química: Permite a comunicação entre os neurónios, por libertação de substâncias


químicas (neurotransmissores) para a fenda sináptica.

Algumas toxinas, venenos ou até mesmo medicamentos têm como alvo os canais de Na+
sensíveis à voltagem. Assim, como não há entrada de Na+ para dentro da célula, o impulso
nervoso não é passado uma vez que não ocorre a despolarização da célula.

Há diversos tipos de neurotransmissores.

 O neurotransmissor que é libertado na junção neuromuscular é a acetilcolina (primeiro


neurotransmissor descoberto), que é degradada por acetilcolinesterases.
 O glutamato por sua vez, é um neurotransmissor excitatório, já o GABA é inibitório.
Temos ainda outros neurotransmissores como a dopamina e a serotonina.

170
Interação neurónio-glia

Nas células da glia acontece que: o glutamato é convertido em glutamina pela glutamina
sintetase, o que permite incorporar amónia livre, daí esta conversão ajudar na proteção contra
a toxicidade da amónia.

Glutamina
Glutamato Glutamina
sintetase

Para que haja formação de neurónio


GABAérgicos inibitórios, é preciso:

 A entrada de glutamato para o


neurónio, proveniente dos astrócitos.

O glutamato já dentro do neurónio é convertido


a GABA pela glutamato descarboxilase (GAD).

Astrócitos Neurónios
Fonte de energia Glucose Glucose
Glicogénio Lactato
Alanina (estes últimos 2 provém do
piruvato em excesso dos astrócitos)
Metabolismo Anaeróbio Aeróbio
Vias de obtenção de energia Glicólise Glicólise, mas sobre tudo ciclo de
Krebs e fosforalição oxidativa
Reservas de Glicogénio Muita da glucose é armazenada sob a Toda a glucose é consumida e nã há
forma de glicogénio formação de glicogénio
Isoforma dos GLUT’s GLUT1 GLUT3
Enzimas específicas citosólicas Glutamina sintetase Colina acetiltransferase
Enzima málica Glutamato descarboxilase
LDH5 – transforma preferencialmente Neuronal enolase
piruvato a lactato LDH1– transforma preferencialmente
lactato em piruvato. Esse piruvato é
depois conduzido para o ciclo TCA
Enzimas específicas mitocondriais Piruvato carboxilase Glutaminase activada por fosfato
Neuroesteróide sintetase (muita)
Glutaminase activada por fosfato Enzima málica mitocondrial
(pouco) Creatina cinase de ubiquitina
mitocondrial

A Barreira Hematoencefálica (BHE) consiste numa junção apertada de células endoteliais


que estão intimamente aderentes à membrana basal, o que permite que haja uma grande
seletividade das moléculas que passam para o cérebro.

171
Como esta barreira é lipofílica, formada por membranas biológicas, permite a passagem de
moléculas também lipofílicas, enquanto as moléculas hidrofílicas apenas atravessam por
mecanismos de alta seletividade

Metabolismo da Glicose e Interação neurónio-glia

 Jejum: apesar da hipoglicémia, ocorre transporte de glucose pela BHE, pois o cérebro
não é sensível à glucagina
 Se ↓↓ [glucose]plasma o cérebro pode utilizar reservas glicogénio, contidas nos
astrócitos
 Se persiste ↓↓ [glucose]plasma o cérebro utiliza corpos cetónicos (β-Ho-butirato e
acetoacetato)
 Utilização de corpos cetónicos pelo cérebro ocorre em:
o Jejum prolongado
o Dieta rica em gorduras ou corpos cetónicos (cetogénica – método de
tratamento de doenças como epilepsia ou défices de GLUT’s)
o Diabetes mellitus

Métodos de diagnóstico de doenças cerebrais:

Baseados em neuroanatomia, neurometabolómica e imagiologia funcional


 Ressonância magnética
 PET (positrons emisson transmisson) – permite ver o metabolismo da glucose

172
A CÉLULA ÓSSEA
AULA TEÓRICA 26
AS BITCHES – CRAZY | DUMB | SCIENCE
Objectivos:
1. Analisar as características da célula óssea e o metabolismo do cálcio
e do fósforo.
2. Descrever os mecanismos de regulação do metabolismo do cálcio e
do fósforo na célula óssea.
3. Interpretar alterações do metabolismo do cálcio e do fósforo e
implicações clínicas.
O tecido ósseo
O nosso organismo é constituído por 4 tipos de tecidos primários: muscular,
nervoso, epitelial e conectivo (que inclui conectivo, cartilagem, sangue e osso).
O tecido ósseo pode ser considerado como tecido conectivo de suporte
altamente especializado. Este é constituído por:
 Matriz orgânica/não mineral – formada maioritariamente por colagénio
tipo I (90-95%), mas contendo também outros componentes como a osteocalcina,
a osteopontina e a trombospondina, por exemplo.
 Sais minerais inorgânicos – agregados de cálcio e fosfato, depositados na
matriz, que quando mineralizados formam cristais de hidroxiapatite
(Ca10[PO4]6[OH]2).
 Osteoclastos – células provenientes de células estaminais
hematopoiéticas, responsáveis pela reabsorção óssea (dissolução dos cristais de
hidroxiapatite) e, consequentemente, pela reposição dos níveis sanguíneos de
cálcio e fosfato.
 Osteoblastos – células derivadas de células estaminais mesenquimatosas,
responsáveis pela formação do tecido ósseo (células de suporte). As suas funções
passam pela deposição de uma matriz orgânica (de colagénio tipo I
principalmente), seguida de um processo de mineralização do cálcio e fosfato para
formação de cristais de hidroxiapatite.

173
Composição do Osso

- Os componentes inorgânicos maioritários do osso são o cálcio e o fosfato – a


sua presença é necessária para a formação e precipitação da hidroxiapatite.
- A presença de inibidores (ex. pirofosfato) impede a precipitação da
hidroxiapatite noutros tecidos além do osso.
Formação do Osso a partir dos progenitores da Medula Óssea

Células estaminais
mesenquimatosas

RUNX2 - Condrócitos
OSTERIX - Adipócitos

Pré-Osteoblastos - Miócitos

RUNX2
DLX5
MSX1

RANKL
OSTEOBLASTOS

RANK
Células estaminais
Pré-Osteoclastos OSTEOCLASTOS
hematopoiéticas

As células mesenquimatosas são células pluripotentes (capazes de originar


variados tipos de tecido). Assim, o tipo de tecido em que uma célula
mesenquimatosa se vai diferenciar depende de diversos factores de transcrição
– dentro dos factores que determinam a diferenciação das células do tecido ósseo,
são de salientar o RUNX2 e o OSTERIX.
As células resultantes dessa diferenciação são os pré-osteoblastos, que
irão posteriormente diferenciar-se em osteoblastos, células especializadas na

174
formação do osso. Por outro lado, a diferenciação das células hematopoiéticas
origina pré-osteoclastos e, de seguida, osteoclastos maduros, que são as células
responsáveis pela reabsorção óssea.
É de salientar que os pré-osteoblastos produzem também um composto
denominado RANKL que, ao interagir com os pré-osteoclastos (através dos seus
receptores membranares RANK), irá estimular a diferenciação destes em
osteoclastos.
Assim, é de notar uma íntima interacção entre os processos de formação de
osteoblastos e osteoclastos – é através da actividade relativa destes dois tipos de
células que resulta a formação do tecido ósseo e a manutenção dos níveis de cálcio
no organismo.
Durante o crescimento: formação > reabsorção Daí que seja essencial
maior actividade dos osteoblastos ingerir maiores
quantidades de cálcio
Idade mais avançada: formação < reabsorção em idades mais jovens
maior actividade dos osteoclastos (para uma eficaz
formação óssea)
Ciclo de Remodelação do Osso

Remoção das “células velhas” pelos


osteoclastos: estes libertam iões H+ (para
dissolução dos cristais de hidroxiapatite) e
colagenases (clivam as ligações de
colagénio tipo I presente na matriz). Ocorre
assim o processo de reabsorção óssea.

Recrutamento
Fase de repouso Ciclo de dos
osteoblastos
Remodelação

Os osteoblastos depositam uma


Dá-se a mineralização de cálcio
nova matriz óssea - os osteócitos
e fósforo - deposição de cristais
"preenchem" o local onde os
de hidroxiapatite na matriz
osteoclastos actuaram

175
Existe, assim, uma manutenção do balanço entre a formação e a destruição do
osso. Nos indivíduos jovens, este ciclo tem uma duração aproximada de 120 dias,
sendo que as fases de reabsorção e neoformação são equiparáveis. Com o decorrer
da idade, os ciclos vão-se tornando mais longos, e o tempo destinado à reabsorção
do osso torna-se superior ao tempo destinado à sua formação – por esta razão,
com o avançar da idade, a densidade do tecido ósseo tende a diminuir e a sua
fragilidade tende a aumentar. Este facto pode levar a uma maior susceptibilidade
para algumas doenças como, por exemplo, a osteoporose.

Regulação do metabolismo do cálcio e do fósforo


A regulação da calcémia faz-se principalmente ao nível do osso, do rim e do
intestino. No osso pela deposição de cálcio ou sua reabsorção para a corrente
sanguínea; no rim, pelo aumento da excreção ou pela retenção do cálcio; no
intestino, por intermédio do aumento da função dos transportadores que
absorvem o cálcio para o meio intracelular. Alguns períodos do desenvolvimento
(ex. crescimento, gravidez, amamentação) requerem maior aporte de cálcio.
No meio intracelular, a concentração de Ca2+ está muito bem regulada; a
libertação de Ca2+ do retículo endoplasmático (RE) e mitocôndria é feita em caso
de sinalização. A activação da Fosfolipase C membranar por intermédio de
receptor acoplado a proteína G leva à clivagem do PiP2 em DAG (diacilglicerol) e
IP3 (Inositol-3-Fosfato). O IP3 vai até ao RE e activa os canais de Ca2+ a ele sensíveis,
promovendo a sua saída. Outros canais no RE são os canais de rianodina (RyR).
(Outros sistemas de entrada e saída do cálcio são referidos na aula 22 – Cálcio e
Morte Celular). O Ca2+ livre liga-se então à Calmodulina, uma proteína que liga até
4 iões Ca2+, ficando activa. O complexo liga-se então a outras enzimas, activando-
as e as suas cascatas de fosforilação. A calmodulina é o principal quelante
intracelular de Ca2+, impedindo-o de sair da célula.

176
Regulação hormonal do metabolismo do cálcio e do fósforo na célula óssea
 Quando os níveis de Ca2+ sérico aumentam: a tiróide é estimulada a
produzir calcitonina, nas suas
células C. É inibida a produção de
PTH (hormona da paratiróide). A
calcitonina inibe a actividade dos
osteoclastos e por outro lado os
estrogénios, hormona de
crescimento, TGF-β, IGF-1 e
Tiroxina aumentam a actividade
osteoblástica, sintetizando matriz
óssea e depositando cálcio no osso,
reduzindo a calcémia. É também
aumentada a excreção renal de
cálcio; diminuída a absorção
intestinal.
 Quando os níveis de Ca2+ sérico diminuem: as glândulas paratiroideias
secretam PTH (hormona da Paratiróide), que aumenta a produção de calcitriol
(vit. D3) no rim (aumentando a absorção intestinal de Ca2+); a PTH aumenta a
reabsorção renal de cálcio e a excreção de fosfato; estimula a actividade
osteoclástica, destruindo cristais de hidroxiapatite para libertar o cálcio para o
sangue, aumentando a calcémia.

Osteoblastos Osteoclastos
Estimulantes Estrogénios e PTH, que por sua vez
Androgénios, GH, TGF-β, estimula a produção de
IGF-1, Tiroxina vitamina D3
Inibidores Corticosteróides Estrogénio, Calcitonina,
TGF-β
*NOTA 1: A diminuição da excreção renal de cálcio é acompanhada por aumento
da excreção de fosfato, impedindo assim a precipitação como cristais de
hidroxiapatite, mantendo o cálcio em circulação no sangue.

177
*2: O aumento da calcémia devido à PTH é feito sobretudo à custa da reabsorção
óssea. A PTH sinaliza as células com receptores acoplados a proteínas G, activando
a adenilatociclase, que produz AMPc.
*3: A PTH está armazenada nas glândulas paratiroideias; a sua secreção é
condicionada pela concentração de Cálcio e de Magnésio no plasma, mas não pela
concentração de fosfato.

A vitamina D

Hormona Origem Efeito


Promove o aumento da expressão da
calbindina, entre outras
transportadoras de Ca2+, aumentando a
Calcitriol Rim
absorção intestinal de Ca2+ e fosfato (é a
única hormona que promove absorção
contra gradiente no intestino).
Hormona do
Estimula a actividade dos
Crescimento Hipófise
osteoblastos e a síntese de matriz.
(GH)
Tiróide
Tiroxina (células Actua em conjunto com a GH
foliculares)
Estrogénios/
Gónadas Acção igual à da GH
Androgénios
PTH Estimula a actividade dos
Paratiroideias
(paratormona) osteoclastos, aumenta a calcémia.
Tiróide Inibe os osteoclastos, reduz a
Calcitonina
(células C) calcémia
O 7-dehidrocolesterol é um derivado do colesterol que é convertido a
colecalciferol (vitamina D3 inactiva) na pele, por uma desidroxilação resultante
de fotólise por radiação UV. Esta reacção é exacerbada com o aumento da
exposição à luz e diminui com o aumento da pigmentação da pele. O colecalciferol
migra então para o fígado. No Retículo endoplasmático das células hepáticas é
hidroxilado, passando a 25-hidroxicolcalciferol. Migra então para o rim, onde é
novamente hidroxilado, formando vitamina D3 activa (1,25-dihidrocolecalciferol),
CALCITRIOL.

178
A síntese de calcitriol é regulada por retroacção. A hipocalcémia estimula a
produção de PTH, que estimula a síntese de calcitriol porque estimula a 1α-
hidroxilase renal. A hipofosfatémia também tem esta acção, mas não tão acentuada
como a hipocalcémia.

Alterações do metabolismo de cálcio e fósforo e implicações clínicas

Marcadores bioquímicos específicos do metabolismo ósseo:


Formação Reabsorção
 Fosfatase alcalina  Fosfatase ácida resistente ao
específica do osso tartarato (A fosfatase ácida destrói os
 Osteocalcina cristais de hidroxiapatite)
 Propeptídeo C terminal  OHprolina
do colagénio (derivado de  Marcadores de Destruição das
colagénio) Ligações cruzadas livres do colagénio
 Piridinolina
 Desoxipiridinolina
 Cálcio urinário
 Telopeptídeos N-colagénio
(derivado de colagénio)

Alterações do metabolismo de cálcio

Implicações clínicas
↑ PTH  Implicações a nível cardíaco –

↑ retenção arritmias devido ao encurtamento do


excesso de
renal de potencial de acção*;
vit D3
Ca2+
 Nefropatia (aumento da retenção
renal);
hipercalcémia
 Doenças de ordem psiquiátrica;
 Magnesúria;
 Obstipação, indigestão, náuseas,...
*O encurtamento do PA deve-se à abertura precoce dos canais K+, sensíveis a
Ca2+, o que leva à repolarização da célula.

179
Causas Factores de Risco Tratamento
 Doença;  Sexo feminino;  Exercício regular;
 Deficiências na  Raça caucasiana ou  Suplementos de
dieta; asiática; vitaminas e
 Deficiência  Hábitos tabágicos e minerais
hormonal; alcoólicos;
 Idade avançada.  Exercício físico
excessivo;
 Inatividade excessiva;
 Dieta pobre em cálcio;
 Anorexia;
 Consumo excessivo de
cafeína.

Implicações clínicas

↓ retenção  Implicações a nível cardíaco


↓ PTH renal de
Ca2+ (prolongar do potencial de
acção);
↓ absorção
carência de
intestinal  Parestesias;
vit D3
de Ca2+
 Tetania hipocalcémica
(contração espásmica dos
hipocalcémia
músculos da mão)
 Deficiencia de Vit D 
raquitismo
Com o aumento da idade, a massa óssea vai diminuindo e, consequentemente, o
risco de fractura aumenta.
A perda progressiva da densidade e espessura do osso e o aumento da
vulnerabilidade a fracturas pode indicar um quadro clínico de osteoporose.
Alguns fármacos como anti-epilépticos (DPH – Fenitoína; CBZ – Carbamazepina;
PB - fenobarbital) e corticosteróides estimulam o CYP 24.
Este vai transformar 25-hidroxivitamina-D3 na sua forma inactiva, provocando
uma diminuição da atividade da vit D3 e, consequentemente, ↓ Ca2+ e ↑ PTH,
interferindo com a formação do osso.

180
Alterações do metabolismo do Fosfato (fósforo)
Excesso de Fosfato – causado por excesso de degradação do osso; por aumento
de vitamina D3, também implicada na absorção do fósforo; por retenção renal.
Défice de Fosfato – causado por défice alimentar, défice de vitamina D3,
excreção renal.

Implicações clínicas
↑ reabsorção
tubular e
intestinal de  Urolitíase (formação de
fosfato
perda de
↑ retenção cálculos renais);
fosfato por
renal de
parte das
fosfato  Nefropatia (aumento da
células
retenção renal);
 Artrite.
hiperfosfatémia

A hiperfosfatémia está geralmente associada


a hipocalcémia, uma vez que há precipitação
de CaHPO4

Implicações clínicas

↓ retenção
 Osteomalacia,
↑ PTH renal de
Ca2+
enfraquecimento e
desmineralização dos
↓ absorção
carência ossos do adulto devido a
intestinal
de vit D3
de Ca2+
deficiência de vitamina D;

hipofosfatémia  ↓ ATP  Fraqueza


muscular (inclusive do
músculo cardíaco);
 Hemólise;
 Convulsões, coma;
 ↓ 2,3-BPG  ↑ da
afinidade da hemoglobina
por O2

181
182
O Cancro I
Aula Teórica 27
Joana Pinto | Susana Oliveira

O que é o cancro?
O cancro é uma patologia caracterizada por uma acumulação anormal de células. Em indivíduos
saudáveis, as células crescem, morrem e são substituídas num conjunto de processos muito controlado. Erros
no material genético consequentes de factores ambientais ou internos por vezes resultam em células que não
morrem e que se continuam a replicar, originando um agregado (massa) de células e, consequentemente, um
tumor. Este acumular de células pode ser devido a:
- Desregulação da proliferação Aumento descontrolado da divisão celular;
- Desregulação da diferenciação  Um bloqueio na diferenciação (de células estaminais, por
exemplo) leva ao aparecimento de células indiferenciadas e que têm maior capacidade proliferativa;
- Desregulação da morte de células por apoptose  Resistência à apoptose.

Os cancros causados por um aumento descontrolado do número de células são muito agressivos e,
apesar da propagação rápida, respondem melhor à terapêutica convencional do que as que têm por base a
resistência à apoptose. Estes últimos apesar de terem um crescimento e progressão mais lenta, como são
resistentes à morte programada, respondem pior à terapêutica.
O cancro é uma neoplasia cada vez mais frequente, essencialmente devido aos hábitos de vida da
população: para além de uma dieta pouco saudável, também a exposição a agentes carcinogénicos (poluição,
tabaco, etc.) é cada vez maior. Neoplasias como o cancro do cólon que antes tinham uma incidência mais
tardia, começam a surgir em idades mais jovens. Actualmente, depois das doenças cardiovasculares, o cancro
representa a primeira causa de morte. No homem a forma de cancro mais comum é o cancro da próstata e na
mulher o cancro da mama; no entanto, há mais mortes consequentes do cancro do pulmão.

Uma célula tumoral apresenta:


- Autonomia: as células tumorais são capazes de produzir factores de crescimento e, de uma forma
autócrina, estimulam o seu próprio crescimento.
- Anaplasia: perda da diferenciação. A célula deixa de ter funções especializadas e ganha capacidade
de divisão celular. Quanto mais indiferenciado for um tumor, mais proliferativo ele é e, portanto, mais
agressivo.
- Invasão e migração: Estas células produzem enzimas que degradam a matriz intracelular – protéases.
Aa maior parte destas enzimas são taloproteinases que vão degradar a matriz extracelular, levando à perda da
aderência célula-célula. Isto permite um crescimento independente e não controlado, acabando por levar à
destruição da arquitectura normal do tecido. Vão posteriormente invadir o tecido vizinho com a finalidade de

183
atingir um vaso sanguíneo e poder migrar para órgãos à distância. Há órgãos preferenciais como a medula
óssea (principalmente), fígado, pulmão, etc.

Para proliferarem, as células tumorais precisam de nutrientes


Há então estimulação da angiogénese, porque se o suprimento sanguíneo fosse igual, à medida que o
tumor ia crescendo, não haveria a capacidade de nutrir o tumor todo e haveria certas células que entrariam em
apoptose e depois em necrose. É por isso que em tumores de grandes dimensões, a parte central do tumor
apresenta áreas em necrose. A necrose surge porque não há nutrientes e porque não há oxigénio – hipóxia.
Um outra característica essencial da célula tumoral é que esta é capaz de sobreviver em condições
adversas e rentabilizar os recursos. Na situação de hipóxia descrita anteriormente (que ocorre quando há
poucos vasos sanguíneos), ela estimula a produção de um factor de transcrição HIF (Hypoxia-inducible
factor), que vai regular a expressão de genes, entre eles o gene codificante do VEGF (Vascular endothelial
growth factor) que irá estimular a angiogénese. Este processo é crucial para o desenvolvimento de um tumor,
pois para além de permitir o crescimento, permite que se metastize.
É a metastização que faz com que o cancro seja tão letal: certas células penetram no sistema circulatório
através de diapedese, por exemplo, (e ajudadas pela angiogénese), migrando e estabelecendo colónias noutras
partes do corpo. Se as células permanecessem num espaço restrito, o tratamento seria mais eficaz.

Limite de HayFlick
- Uma célula normalmente encontra-se em G0, mas por acção de factores de crescimento, pode entra
no ciclo celular e iniciar divisão. Normalmente, há uma barreira à proliferação das células (barreira de
imortalização), chamada Limite de HayFlick. Este limite existe porque os telómeros, sequências nucleotídicas
terminais dos cromossomas, vão sendo sucessivamente reduzidas em cada divisão. Ao chegar ao limiar de
encurtamento é desencadeada a apoptose.
Além disto, a presença de genes supressores tumorais no nosso genoma também contribui para este
limite. Isto porque quando há uma alteração no DNA numa célula, não há interesse que essa célula prolifere,
existindo mecanismos impeditivos desta proliferação. Alguns destes genes supressores tumorais produzem
proteínas importantes no controlo do ciclo celular ao activar mecanismo de apoptose.

-Numa célula tumoral não existe este limite: há uma capacidade ilimitada da proliferação. Isto acontece
porque a célula neoplásica tem telomerases, enzimas responsáveis pela “reposição” de telómeros depois de
cada divisão, evitando assim, a sua diminuição. Desta forma, nunca é atingido o limiar de encurtamento que
desencadeia a apoptose. É de notar que estas enzimas são quase inexistentes numa célula normal. Também
numa célula neoplásica há perda de controlo do ciclo celular por diminuição da expressão do pRb e p53 (genes
supressores tumorais – por hipermetilação local destes genes). Este último é considerado o guardião do

184
genoma por bloquear o ciclo celular quando o DNA está lesado (função pró-apoptótica e codifica enzimas de
regeneração do DNA). Em mais de 50% dos casos de cancro há inactivação do p53.

Nota: - Numa célula normal: hipermetilação global e hipometilação localizada.


- Numa célula cancerígena: hipometilação global (crescimento descontrolado das células) e
hipermetilação localizada (corresponde ao silenciamento de genes específicos, como os genes supressores
de tumores e os anti-apoptóticos; e ao aumento da expressão dos protooncogenes que estimulam a
proliferação celular).

As células cancerígenas têm, então, seis características major:


- Autonomia na produção de factores de crescimento de forma autócrina;
- Estimulação da angiogénese;
- Resistência a factores “anti-crescimento”;
- Resistência à apoptose;
- Capacidade proliferativa ilimitada;
- Invasão tecidular e metastização;

De notar que o aparecimento das neoplasias não depende exclusivamente da célula tumoral, mas
também do microambiente. Neste existem vários tipos de células (células endoteliais, fibroblastos, etc.) que
produzem factores de crescimento, capazes de estimular a célula neoplásica a proliferar. Além disso é crucial
garantir um correcto funcionamento do sistema imunitário  se este estiver funcional é capaz de reconhecer
células estranhas ao organismo e destruí-las. No entanto, o problema do cancro reside no facto de a célula
tumoral ser capaz de se tornar invisível ao sistema imunitário ou resistente a ele (quando o SI deixa de ter
capacidade de actuar sobre as células).

Mas afinal, o que leva às alterações que resultam no aparecimento do cancro?


O cancro é uma doença muito heterogénea e multifactorial, cujas causas incluem vários mecanismos e
factores. Dentro das principais alterações destacam-se dois grupos:

Alterações genéticas  Há alterações na sequência de bases, principalmente por mutações (deleções,


translocações, duplicações) em genes directamente relacionados com o cancro, sejam estes genes supressores
tumorais ou genes que induzem a proliferação (proto-oncogenes): Teoria Oncogénica do Cancro. Estas
mutações podem ocorrer em células germinativas ou em células somáticas. O primeiro caso é o menos

185
frequente e o responsável pelas formas hereditárias de cancro; as mutações nas células somáticas, por sua vez,
são as mais frequentes e correspondem às formas esporádicas da doença.

Alterações epigenéticas  Não há alteração da sequência de bases, mas sim no estado da expressão
génica, por aumento ou diminuição da expressão de certos genes. Um dos principais processos é a
(des)metilação do DNA, no qual estão envolvidas as enzimas DNA-metiltransferase e as DNA-desmetilases.
Estas (des)metilações ocorrem nos dinucleótidos Citosina-Guanina que se encontram dispersos ao longo de
todo o genoma, mas muito concentrados em zonas onde se localizam o genes supressores tumorais. No caso
da modificação das histonas há vários mecanismos bioquímicos envolvidos como a (des)metilação,
(des)acetilação e a (des)fosforilação. Relativamente aos genes tumorais, a hipermetilação e a desacetilação
levam à falência dos genes; por outro lado, a hipometilação do DNA e a acetilação das histonas acompanham
uma desrepressão destes. É por isso que uma hipermetilação localizada nas regiões promotoras de genes
supressores tumorais leva ao silenciamento de genes  Inibição da expressão génica.

Nota: O cancro é uma doença que tem mais incidência em idades avançadas, pois ao longo do tempo há uma
maior acumulação de erros que levam às tais alterações genéticas ou epigenéticas. Em média, são necessários
7/8 genes modificados para que ocorra cancro.

186
O CANCRO II
AULA TEÓRICA 28
FILIPE LOPES | JOÃO LORIGO

Na aula anterior vimos que o cancro resulta de alterações genéticas e epigenéticas que
vão levar a que de facto haja alterações na proliferação, diferenciação e morte das células. Há
assim neoplasias que resultam de alterações nos mecanismos de proliferação. Estas originam
tumores que evoluem rapidamente e são geralmente mais agressivos para o organismo. Outros
resultam sobretudo de alterações que levam a uma resistência à apoptose, tendo assim uma
evolução mais lenta mas uma menor resposta à terapêutica convencional.

O cancro é uma doença da desregulação da proliferação, diferenciação e/ou morte


celular. Qualquer um dos fatores isolados ou combinados leva ao aumento exagerado do
número de células.

Principais características da célula tumoral:

 Autonomia;
 Anaplasia;
 Perda da ligação à matriz: outra característica fundamental das células neoplásicas é
a sua capacidade de se desprender das células vizinhas e da matriz extracelular (perda
de adesão célula-célula e célula-matriz) que leva a que ela se consiga libertar do tecido
onde reside e posteriormente, através da produção de protéases, (nomeadamente pro-
proteinases que degradam matriz) sair do tecido originário. Esta célula tumoral pode
depois proliferar e metastizar para órgãos à distância, ajudado pelo seu poder de
angiogénese.
 Angiogénese: A célula tumoral, em situações de hipóxia, produz e secreta fatores de
crescimento (HIF, Factor Induzido por Hipóxia, que estimula o VEGF, Factor de
Crescimento do Endotélio Vascular) dos vasos sanguíneos, fatores esses que vão
promover a extensão dos vasos até à zona do tumor, aumentando em larga escala a
quantidade de sangue a circular nas imediações do tumor e com ele a quantidade de
nutrientes e oxigénio disponíveis para o tecido neoplásico.
 Aumento da instabilidade genética.
 Imortalização celular: Frequentemente, a célula tumoral ultrapassa o Limite de
Hayflick. Isto deve-se não só à acção das telomerases como também à hipermetilação
dos genes supressores tumorais e à perda do controlo do ciclo celular (por diminuição
de pRb e p53). Assim, passa a ter menor necessidade de fatores de crescimento, uma
vez que a célula tumoral produz os seus próprios fatores de crescimento.

187
Na célula tumoral, o ciclo celular é muito afectado. Isto porque as vias de sinalização celular
que promovem o avanço ou estagnação do ciclo estão também elas corrompidas.

Por um lado, há vias que promovem o progresso no ciclo celular e a entrada em mitose,
comandadas maioritariamente por ciclinas e cinases dependentes de ciclinas. Por outro, há vias
que controlam a progressão do ciclo, nas quais são muito importantes as proteínas codificadas
por genes supressores de tumores.

A célula tumoral é uma célula resistente a apoptose, porque tem desequilíbrios nas proteínas
envolvidas na regulação deste processo. Como exemplo, temos a família das BCL-2, proteínas
anti-apoptóticas que se encontram elevadas em muitos dos tumores estudados. Dentro das pró-
apoptóticas, podemos destacar proteínas como a BAX, BAC, BID, entre outras. O desequilíbrio
entre anti e pro determina a resistência ou sensibilidade à apoptose, tornando-se então claro
que no caso das neoplasias, a “balança” pende para o lado das anti-apoptóticas, que conferem
uma grande resistência à apoptose e portanto um período de vida da célula muito maior. Esta
maior ou menor sensibilidade à morte celular pode também determinar a resistência à
terapêutica. Uma célula tumoral com muitas proteínas anti-apoptóticas vai ser muito pouco
sensível às terapêuticas que tentam induzir apoptose em células tumorais.

Existem outras proteínas com funções pro e anti apoptose, nomeadamente proteínas da
família do TNF, que quando activados determinam a activação de vias de morte. Estas têm como
protagonistas as caspases, enzimas que participam na clivagem do DNA e levam a morte.

As alterações genéticas são aquelas em que ocorrem mutações (alteração da sequência de


bases), enquanto que as epigenéticas prendem-se com alterações na regulação da expressão
dos genes. Essa alteração da expressão esta relacionada com alterações do DNA (que pode estar
hiper ou hipo metilado), e por outro lado com modificação nas histonas, nomeadamente na sua
acetil ou desacetilação. Estes mecanismos regulam a expressão dos genes. Hipermetilação do
DNA e desacetilação das histonas levam assim ao silenciamento dos genes. No caso de os genes
em causa serem supressores de tumores, a célula pode perder o equilíbrio no seu metabolismo
e proliferação, e pode dar-se o aparecimento de neoplasias.

Sob o ponto de vista cinético, temos 4 tipos de células:

 Proliferantes: células que proliferam naturalmente. Como as células basais da mucosa


intestinal, vaginais, vesicais e hematopoiéticas.

188
 Não proliferantes: Como as células nervosas, do músculo estriado e do glomérulo
renal.
 Com atividade proliferativa mínima: Como as do músculo liso e tecido conjuntivo, do
endotélio capilar e ainda do parênquima hepático.
 Que proliferam em resposta a um estímulo fisiológico: Como células do periósteo
após fractura e do fígado após hepatotomia.

Nos tecidos adultos e renováveis, existem células capazes de repor tecido, e que têm para
isso características de auto-renovação e manutenção de estados não-diferenciados. Chamam-
se por isso células estaminais, e são, pelas suas características, susceptíveis a mutações e muito
resistentes às terapêuticas. Estas células com capacidade de renovação e replicação e capazes
de acumular mutações, conseguem originar tumores. A estas últimas, damos o nome de células
estaminais cancerígenas. São estas, na maioria dos casos, as responsáveis pela dificuldade na
cura completa dos doentes oncológicos mesmo depois dos tratamentos eliminarem o tumor. Se
existirem nesses tecidos células estaminais cancerígenas resistentes a terapêutica, com
capacidade de renovação mas com mutações, estas podem originar tecido tumoral de novo.
Assim, procura-se hoje investigar e identificar vias de sinalização destas células que permitam
novas terapêuticas incidentes nestas células.

O tecido hematopoiético, por exemplo, possui células estaminais capazes de produzir


diversas células muito diferentes entre si, mas que provêm de células multipotentes
semelhantes. O que determina assim a proliferação e diferenciação de uma célula multipotente
numa célula diferenciada, com organização e funções específicas são, no fundo, os fatores
extracelulares. Estes fatores são, na sua maioria, proteínas que têm de interagir com receptores
de membrana das células para que a informação que pretendem transmitir chegue ao interior
da célula, uma vez que não são lipossolúveis e portanto não conseguem passar pela membrana
celular. Como exemplo, temos os fatores de crescimento (GF – Growth Factor):

Os dois indutores de
 Factor de crescimento epidérmico (EGF)
crescimento de maior
 Factor de crescimento derivado das plaquetas (PDGF) importância.

 Factor de crescimento Transformante (TGF)


 Factor de crescimento neuronal (NGF)
 Factor insulina-like (IGF-I)
 Factor de crescimento das colónias de granulócitos e monócitos (GM-CSF)

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Os GF são peptídeos que se ligam a receptores que estão à superfície das células, transmitindo
portanto indirectamente a informação ao núcleo, através de sinais produzidos e activados por
essa ligação, que são depois lançados no interior da célula.

Existem alguns fatores capazes de atravessar a membrana e interagir directamente com as


estruturas intracelulares, como as hormonas esteróides (estrogénios, progesterona e
androgénios, aldosterona e cortisol) e tiroideias que são lipossolúveis e portanto não necessitam
de receptores. Entram directamente para a célula e interagem com receptores dentro da célula.

Temos vários tipos de receptores de membranas, tendo cada um:

Domínio extracelular – Onde se ligam os fatores. Podendo ser de vários tipos:

 Receptores ligados a proteínas G (cuja interacção leva a produção de 2º mensageiros)


 Receptores com atividade enzimática (sobretudo ligada a vias de proliferação celular)
 Receptores com atividade proteolítica (ligada a vias de diferenciação)

Domínio Transmembranar

Domínio Intracelular

Assim, existem várias vias de sinalização celular como:

VIAS DE PROLIFERAÇÃO (RECEPTORES COM ACTIVIDADE ENZIMÁTICA):

- Via das MAP Cinases: Regula o crescimento Celular (alterações em qualquer uma das
proteínas desta cascata podem levar a cancro).

Dimerização e
Recrutamento de
Ligação do GF ao atividade de Activação da Ras
CRB2 e GNRF que
Receptor tirosina cinase do (por fosforilação)
se acoplam a Ras
recetor

Transcrição de
Activação em
genes que induzem Foforilação da Migração da ERK
cascata da Raf-
o crescimento Elk-1 - Activação para o núcleo
>MEK->ERK
celular

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- Via da PI3 Cinase e da Akt: Regula os mecanismos de sobrevivência celular

Ativação de
fatores de
Atividade de
transcrição,
Ligação do serina- Fosforilação
inativação da Bad Proliferação
GF ao treonina da Akt
(por fosforilação) Celular
receptor cinase - PIP2 (ativação)
e fosforilação da
-> PIP3
GSK-3 (levando a
síntese proteica)

Nestas vias de sinalização, activadas pela ligação dos ligandos ao receptor com atividade
proteolítica, que cliva substratos dentro das células, os complexos proteicos são clivados e de
seguida parte destes migra para núcleo e activa factores de transcrição. Estas vias de sinalização,
sobretudo envolvidas na diferenciação, são importantes no desenvolvimento embrionário, e
determinam que células estaminais originem tecidos e órgãos, mas também são importantes no
desenvolvimento de tumores porque na vida adulta também podem estimular a proliferação
descontrolada das células estaminais, nomeadamente cancerígenas.

VIAS DE DIFERENCIAÇÃO (RECEPTORES COM ACTIVIDADE PROTEOLÍTICA):

- Via Hedgehog

- Via Wnt

- Via Notch

Em certos tecidos renováveis, apesar das células estarem maioritariamente na fase G0 e G1,
elas podem voltar ao ciclo por acção de cinases e cinases dependentes de ciclinas. Contudo, se
estes fatores estiverem em desequilibro, a proliferação poderá ser desequilibrada e contínua.
Assim, para que isso não aconteça, temos outras moléculas que impedem o ciclo, normalmente
codificadas por genes supressores de tumores. A de maior destaque é a p53. Esta proteína tem
como funções:

 Bloquear o ciclo na passagem de G1 para a fase S


 Regula a pRb (mantendo-a inactiva por desfosforilação)
 Induz a reparação do ADN
 Estimula a Bak (pró-apoptótica).

O gene p53 encontra-se mutado em mais de 50% dos tumores, e pode ser ele próprio um
mecanismo gerador de neoplasias, uma vez que as células perdem as funções de protecção.

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Ligandos de Morte:

- TNF, FasL, TRAIL.

Receptores de Morte: (aos quais os ligandos se ligam)

- TNF-R1, Faz, TRAIL-R1-R2-R3-R4

*TRAIL-R1 e R2: estão presentas nas células tumorais e sendo possíveis alvos terapêuticos.

*TRAIL-R3 e R4: Estão presentes nas células normais.

Diferenças entre Apoptose e Necrose:

APOPTOSE NECROSE

-Contração celular -Edema celular

-Vesiculação da membrana -Rotura da membrana


.Condensação e fragmentação da
cromatina -Núcleo pouco se altera

-Corpos apoptóticos -Alteração de organelos


intracelulares
-Sem alteração dos organelos
-Grave lesão celular

Em situações em que é preciso activar as vias de sobrevivência, como a via da PI3 Cinase
e da AKT, existe um importante factor de transcrição de proteínas anti-apoptóticas responsável
por essa activação, o NF-kB. Este factor de transcrição tem importância no aparecimento de
neoplasias porque ao contrário dos outros que se localizam no núcleo, este está no citoplasma,
e é um factor que se encontra normalmente inactivo por complexação com o seu inibidor, o IKB.
Assim, o NF-kB tem de estar complexado, uma vez que se estiver persistentemente activo, irá
causar a proliferação descontrolada. O problema é que quando alguns factores de crescimento
se ligam a receptores, activam cinases, que levam a foforilações sucessivas. Um dos alvos das

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cinases pode ser o IKB, cuja fosforilação funciona como um aviso para a célula, informando que
o IKB está pronto para ser degradado via ubiquitina-proteossoma. Sem o seu inibidor, o NF-kB
fica activo, migra para o núcleo e activa a transcrição dos genes descritos acima. O conhecimento
desta via de sinalização permitiu fabricar medicamentos para inibir o proteossoma, com o
objectivo de manter o IKB intacto e o NF-kB inactivo, portanto terapia para alguns cancros.

O cancro é causado por genes (oncogenes), que podem ser de origem viral (e incorporados
no genoma humano) ou resultantes de mutações nos proto oncogenes. Os de origem viral
verificam-se nos casos de HPV, que origina cancro do colo do útero, helicobacter pylori, capaz
de originar linfomas gástricos, entre outros. Os outros tipos de cancro resultam da exposição a
outros agentes carcinogénicos, tais como:

 Químicos – Berílio, arsénio, benzol…


 Físicos – Radiação
 Agentes vivos – Parasitas e vírus

Há vários agentes carcinogénicos responsáveis por alterar genes, alguns deles


potencialmente cancerígenos. Estes genes estão no adulto, normalmente, silenciados, ou são
expressos em quantidades muito reduzidas. Contudo, eles tiveram importantes funções durante
o desenvolvimento embrionário e infantil. Assim, claro se torna que a sua desregulação leva ao
cancro, uma vez que são genes influentes na acentuada proliferação celular. O gene C-fox, por
exemplo, é muito importante no desenvolvimento do osso na vida embrionária, mas depois
desta etapa tem de ficar reprimido. A sua “desrepressão” na adolescência pode levar ao
desenvolvimento de um osteossarcoma.

Assim, o cancro é causado na maior parte das vezes pela exposição a agentes
carcinogénicos, mas é necessário haver susceptibilidade intrínseca para que esta doença se
verifique.

Por último, muitos destes agentes carcinogénicos não são carcinogénicos per se. A sua
metabolização no organismo é que gera agentes carcinogénicos. Nitritos, nitratos, ou pesticidas,
metabolizados no intestino por bactérias, podem gerar nitrosaminas, fortemente
carcinogénicas. O mesmo se passa com aminas aromáticas, metabolizadas no fígado e rim e que
podem originar cancro da bexiga.

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As etapas do cancro:

1. Iniciação: Alteração do ADN por agentes.


2. Promoção: Proliferação celular descontrolada
3. Papiloma: Benigno
4. Carcinoma: Maligno
4.1 Metastização – Causa:
 Perda da Fibronectina. Consequências:
o Perda da adesão celular
o Alteração da organização celular
o Alteração na migração celular
o Alteração do citoesqueleto
 Secreção de fatores activados do plasminogénico – transforma o
plasminogénico em plasmina que é uma protéase activa que degrada a
matriz extracelular
 Degradação celular
 Migração à distância pelos vasos sanguíneos abundantes no meio
envolvente (activação do VEGF)

Em primeiro lugar, ocorre a lesão de uma célula, devido a uma ou várias das causas que
anteriormente explicámos. Depois, esta célula pode morrer ou sobreviver. Quando tudo corre
bem, a reparação do DNA ou a apoptose são os destinos possíveis desta célula. No entanto, por
vezes a célula sobrevive, e leva a uma neoplasia, primeiramente localizada, e após algum tempo,
generalizada através de metástases.

Bibliografia recomendada:

T. Devlin - 6ª Edição – cap. 13 e 25

Lehninger – 5ª Edição - cap. 25.2 e 28.3

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