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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

FACULDADE DE EDUCAÇÃO
DISCENTE: MÔNICA NUNES
PROFESSOR: Drº MARCELO MAC CORD
DISCIPLINA TÓPICOS ESPECIAIS EM HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO

FICHAMENTO 2

MIRANDA, Ana Paula de; MAIA, Bóris. “Ensinar religião ou falar de religião?
Controvérsias em escolas públicas do Rio de Janeiro”. Revista Teias, v. 14, n.
35, 2014, p. 80-97. Disponível em https://www.e-
publicacoes.uerj.br/index.php/revistateias/article/view/24385/17363. Acesso em
06/05/2021.

Neste artigo os autores retratam a pesquisa sobre as diversas formas de


administração institucional dos conflitos que foram observados em 10 escolas
públicas do Estado do Rio de Janeiro em relação aos diversos conflitos que
emergem em decorrência das diferentes expressões que norteiam as questões
étnicas, religiosas, sexuais, sociais e econômicos, entre outras. Como norte, foram
preconizados os casos entre alunos e professores que se referem explicitamente
aos atos de intolerância religiosa. Dito isto, a pesquisa se deu a partir das
observações e análises dos conteúdos e materiais didáticos utilizados em sala de
aula e nas demais atividades desenvolvidas.
A lei 3459/2000 define a introdução do ensino religioso e confessional,
trazendo também a questão da vertente religiosa do professor. Eles consideraram
que o processo de ensino-aprendizagem na escola é heterogêneo, visto que
avaliaram as diferentes percepções e situações conflitivas que os levam ao
enfrentamento. Tal situação, evidencia a ideia de conversão que pode provocar
críticas a partir das diferentes construções identitárias que definem valores morais e
sociais. A escola, é o cenário diversificado, é o espaço das ações e mobilizações
daqueles que se organizam para dar visibilidade e reconhecimento dos atos e suas
demandas que trazem à tona diversas controvérsias e suas justificativas que visam

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a legitimação dos argumentos para reconhecer ou não tais questões como problema
público.
Desde 1934 passou a vigorar em nossa Constituição a disposição do ensino
religioso como disciplina, porém sua introdução foi questionada pelos diversos
setores da sociedade, em especial os intelectuais e representantes das outras
matrizes religiosas. A LDB de 1996 prevê o ensino religioso e a 1ª redação do Artigo
33 define que este deveria ser ministrado sem qualquer custo para o Estado, além
de estabelecer a orientação para sua realização em “caráter confessional”, conforme
a orientação religiosa dos alunos e/ou seus responsáveis. Além disso, orienta que a
disciplina seja organizada pelas entidades religiosas e ministrada por professores ou
representantes da religião que seriam preparados por suas denominações de
origem.
Entretanto, em 1997 o artigo foi alterado por outra lei, formulada pelo
deputado Padre Roque (PT-PR), que atribuiu a responsabilidade do pagamento dos
salários dos professores ao Estado e os “sistemas de ensino” tratariam da definição
dos conteúdos e das tratativas da definição dos conteúdos e das questões em
relação à manutenção dos professores. Para tal disposição, consultaram diferentes
instituições religiosas e com isso se deu a transferência de poder para as
organizações religiosas de modo que as mesmas poderiam decidir acerca dos
conteúdos a serem ministrados.
A questão da “confessionalidade” que figura no artigo, foi destacada como um
dos pontos de discussão do acordo ratificado e aprovado pelo governo do
Presidente Luiz Inácio Lula da Silva: a proposta de concordata com a Santa Sé
(acordo Brasil-Vaticano). Porém, mesmo sem sucesso, a Comissão de Educação e
Cultura sugeriu a supressão deste artigo, visto que o mesmo provocaria a
discriminação entre os diferentes contextos religiosos de acordo com a profissão de
fé dos alunos. Em 2000, com a lei 3459, a questão voltou a ser discutida no Estado
do Rio de Janeiro porque a lei tornou o ensino religioso confessional obrigatório em
todas as escolas públicas da rede estadual. A promulgação desta lei por um
governador, Antonny Garotinho, de matriz evangélica ficou associada à ele e sua
esposa, justamente pela orientação religiosa dos mesmos.
Destarte, a escola deveria manter professores para cada matriz religiosa,
conforme a orientação dos diversos alunos. Todavia, na realidade, isto tornou-se

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algo inviável de realizar. Quanto à contratação dos professores para ocupar a
cadeira do ensino religioso, foi realizado, mesmo com resistência, o concurso para
admissão dos profissionais, mas dentre os aprovados prevaleceram aqueles de
orientação católica em detrimento dos demais e, consequentemente, uma maior
difusão dos ensinamentos desta matriz.
Os alunos são orientados durante as aulas conforme seus valores morais,
mas por conta da prevalência dos professores católicos todo conteúdo da disciplina
gira em torno da moralidade cristã. Diante disso, os autores destacam a falta de
interesse dos alunos, apesar de permanecerem em sala de aula, além deles
expressarem publicamente suas profissões de fé.
Por outro lado, eles destacam que nas aulas de outras disciplinas como
Biologia, Filosofia, Geografia, Língua Portuguesa e Artes também ocorreram
conflitos, haja vista que os conteúdos foram relacionados com as aulas do ensino
religiosos. Entre tais conteúdos figuram as questões sobre a evolução humana,
teoria do Big-bang, cosmologia e cosmogonia, entre outros. Além disso, foram
observados casos de intolerância por conta do uso de apetrechos religiosos que
culminaram em agressões e problemas relacionados à escolha de material didático,
que foi considerado inadequado diante da reclamação de alunos e responsáveis.
Vários conflitos seguiram sendo observados e os autores constataram que a
maior parte deles não aconteciam durante as aulas de religião, porque os alunos
desenvolveram estratégias para desviar os assuntos abordados. Todavia, também
perceberam que os professores não conseguiam lidar com as situações que se
apresentavam e acabavam, portanto, deixando de ensinar seus conteúdos a fim de
evitar conflitos. Dessa forma, identificaram a ausência de controle por parte dos
órgãos responsáveis pelas instituições. Logo, os problemas existem e envolvem as
subjetividades dos alunos, dos responsáveis, inclusive a organização escolar, com
seus gestores, orientadores e corpo docente.
Desta forma, os conflitos resultantes das ações de intolerância religiosa são
visíveis e o espaço escolar segue marcado por disputas de poder entre o conteúdo
escolar e as experiências individuais, tais como as profissões de fé. Tal relação,
denota a ausência de compromisso com o que seria definido como local de
sociabilidade entre os que o espaço, seja para adquirir ou transmitir conhecimentos.
O ideal seria organizar e transformar o espaço para construção e ampliação das

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relações sócio educacionais, ou seja, fazer da escola o lugar de aceitação e respeito
em relação às diferentes escolhas religiosas, políticas, etc.
Ago/21

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