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ISBN:978-85-237-1472-7
2019
CONGRESSO NACIONAL DE EDUCAÇÃO RELIGIÃO E ARTES
ARTIGOS COMPLETOS
Resumo
Segundo Bauman (2001) vivemos na modernidade líquida. Termos como pós-
modernidade, hipermodernidade, modernidade tardia, hibridismo e transculturação
definem paradigmas contemporâneos. Desde 1960 as Artes Visuais dialogam com outras
linguagens expressivas utilizando a “bricolagem” e a “apropriação”, que possibilitam a
heterogenia dos saberes apresentados no campo expandido (performances, site specifics,
instalações, videoinstalações, intervenções urbanas, etc.). Neste GT questionamos: como
se estabelecem as relações entre as artes, a educação e as religiões no mundo
contemporâneo? Como o estudo das imagens pode aproximar as artes da educação?
Pretendemos estimular o debate sobre as reflexões em torno das Artes e dos saberes
humanos transdisciplinares.
Palavras Chave: Arte. Filosofia. Educação. Imagens.
Abstract
According to Bauman (2001) we live in liquid modernity. Terms such as postmodernity,
hypermodernity, late modernity, hybridism, and transculturation define contemporary
paradigms. Since 1960 the Visual Arts have been in dialogue with other expressive
languages using "bricolage" and "appropriation", which allow the heterogeneity of the
knowledge presented in the expanded field (performances, site specifics, installations,
video installations, urban interventions, etc.). In this GT we asked: how are the relations
1
Professor/Pesquisador do Departamento de Artes Visuais e do Programa Associado de Pós-Graduação em
Artes Visuais da UFPB; Pós-Doutor em Estética e História da Arte (PGEHA/MAC/USP); Doutor em
Arquitetura e Urbanismo (PPGAU UFRN e UMinho/Portugal); Mestre em História (PPGH UFPB);
Especialista em Sociologia e Educação Especial (UFPB) e Licenciado em Artes Plásticas (UFPB). Email:
robsonxavierufpb@gmail.com.
2
Professor da Rede Privada de Ensino de João Pessoa. Pesquisador do Grupo de Pesquisa em Arte, Museus
e Inclusão (GPAMI UFPB); Mestre em Filosofia (PPGF PUC) e Linguística (PPGL UFPE); Graduado em
Ciências Atuariais (UFPB); Filosofia (PUC SP) e Linguística (UFPE). Email:
professormarcio28@gmail.com.
between the arts, education and religions established in the contemporary world? How
can the study of images bring the arts closer to education? We intend to stimulate the
debate on the reflections on the arts and transdisciplinary human knowledge.
Key words: Art. Philosophy. Education. Images.
Introdução
O pesquisador Dr. Milton dos Santos (Pós Doutorando pelo PPGAV UFPB)
apresentou o artigo “Buruburu: a simbólica dos orixás nos processos criativos do
performer Ayrson Heráclito e do artista plástico paraibano Elioenai Gomes”, discutindo
comparativamente a videoinstalação “Buruburu” de Ayrson Heráclito com a pintura
“Omuru: caminho do renascimento” de Elioenai Gomes.
São esses padrões, códigos e regras a que podíamos nos conformar que
podíamos selecionar como pontos estáveis de orientação e pelos quais
podíamos nos deixar depois guiar, que estão cada vez mais em falta. Isso não
quer dizer que nossos contemporâneos sejam livres para construir seu modo de
vida a partir do zero e segundo sua vontade, ou que não sejam mais
dependentes da sociedade para obter as plantas e os materiais de construção.
Mas quer dizer que estamos passando de uma era de 'grupos de referência'
predeterminados a outra de 'comparação universal', em que o destino dos
trabalhos de autoconstrução individual (…) não está dado de antemão, e tende
a sofrer numerosas e profundas mudanças antes que esses trabalhos alcancem
seu único fim genuíno: o fim da vida do indivíduo (BAUMAN, 2001, p.15).
Figura 01 – Esquema Monstro de Modernidade Líquida – canal super sociologia. Disponível em:
https://colunastortas.com.br/modernidade-liquida-o-que-e/.
Milton dos Santos no artigo “Buruburu: a simbólica dos orixás nos processos
criativos do performer Ayrson Heráclito e do artista plástico paraibano Elioenai Gomes”,
analisou comparativamente a videoinstalação Buruburu e a pintura Omulu, chegou as
seguintes considerações:
a) As mulheres dos anos 1940 tinha uma vida ativa, trabalhavam em usinas,
cuidavam da casa, da família, andavam a pé ou de bicicleta;
b) Adaptaram não apenas sua rotina, mas também sua apresentação social.
c) O aspecto social das mulheres múltiplas do século XXI é identificável nas
capas das edições do ano 2018 da Marie Claire France e Brasil. Mas o
estereotipo corporal representado continua sendo o da mulher do século
XX;
d) A partir da comparação entre os dois períodos, 1939-1945 e 2018,
observamos semelhanças de práticas de moda demonstradas nas revistas.
Considerações Finais
Referências
RESUMO
1. INTRODUÇÃO
[...] como o conjunto de direitos que são próprios apenas aos cidadãos
imaturos; estes direitos, diferentemente daqueles fundamentais reconhecidos
a todos os cidadãos, concretizam-se em pretensões nem tanto em relação a
um comportamento negativo (abster-se da violação daqueles direitos) quanto
a um comportamento positivo por parte da autoridade pública e dos outros
cidadãos, de regra adultos encarregados de assegurar esta proteção especial.
Por força da proteção integral, crianças e adolescentes têm o direito de que os
adultos façam coisas em favor deles (CURY, 2005).
3
PRIORIDADE ABSOLUTA. Prioridade Absoluta, direitos das crianças em primeiro lugar. Disponível
em: http://v1.prioridadeabsoluta.org.br/prioridade-absoluta-direitos-das-criancas/. Acesso em: 23/12/2014.
acompanharam essa evolução, havendo ainda negligência, abusividade e ameaça à
direitos tutelados.
4. O TRABALHO INFANTIL
Trabalho infantil é aquele exercido por pessoas abaixo da idade mínima legal
permitida.No Brasil, a Constituição Federal em seu artigo 7º, inciso XXXIII e a Lei
8.069/90, em seu artigo 60, proíbemexpressamente o trabalho noturno, perigoso ou
insalubre a menores de dezoito anos e qualquer trabalho a menores de dezesseis anos,
salvo na condição de aprendiz, a partir de quatorze anos.
No mesmo sentido, a CLT dedica todo o Capítulo IV do Título III à Proteção do
trabalho infantil, dispondo sobre diversos itens relacionados à proteção do trabalho
infantil: a idade mínima, descanso, intervalos e duração da jornada de trabalho, proibição
do trabalho perigoso, insalubre, penoso, noturno ou trabalhos realizados em locais
prejudiciais à sua formação, ao seu desenvolvimento físico, psíquico, moral e social e em
horários e locais que não permitam a frequência à escola.
O país ratifica, ainda, através do Decreto nº 4.134/2002, a Convenção 138 e a
Recomendação 146 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) sobre Idade Mínima
de Admissão ao Emprego e foi o primeiro a elaborar, através do Decreto nº 6.481/2008,
a Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP), que inclui, entre outros, o
trabalho infantil doméstico.
O trabalho diminui o tempo disponível da criança para seu lazer, sua vida em
família e educação; diminui, também, a oportunidade de estabelecer relações
de convivência com seus pares e outras pessoas da comunidade em geral. Além
disso, os menores experimentam um papel conflitante na família, no local de
trabalho e na comunidade, pois, como trabalhadores, são forçados a agir como
adultos, no entanto, não podem escapar de sua natural condição infantil. Esses
fatores são fonte de estresse emocional que afetam o desenvolvimento mental
e físico em um estágio crítico da vida. Crianças e adolescentes vivem um
processo dinâmico e complexo de diferenciação e maturação. Precisam de
tempo, espaço e condições favoráveis para realizar sua transição nas várias
etapas em direção à vida adulta. Essas transformações os tornam mais
vulneráveis às situações de risco do ambiente de trabalho e, portanto, mais
susceptíveis a adquirir doenças ocupacionais (MARTINS, 2013).
CONCLUSÃO
O trabalho infantil, definido como aquele exercido por pessoas abaixo da idade
mínima legal permitida, gera consequências nocivas aos valores éticos e à sociedade, pois
diminui o tempo disponível da criança para seu adequado desenvolvimento (educação,
família, lazer); provoca o estresse ao gerar uma situação de conflito onde a condição
natural de crianças e adolescentes é ignorada em prol de atitudes adultas; aumenta o risco
de doenças ocupacionais, e prejudica de forma geral a formação crianças e adolescentes.
Há um amplo reconhecimento jurídico da necessidade de proteger crianças e
adolescentes em relação ao trabalho. Ocorre que a vasta e específica proibição legislativa
e ética do trabalho infantil pelo Estado e a priorização absoluta nos procedimentos de
fiscalização não foram suficientes para a erradicação do trabalho infantil, cujas
estatísticas apontam números elevados. A situação é ainda mais grave relação ao trabalho
infantil doméstico, pois a exploração oculta não tem ainda uma metodologia adequada
para aferição.
Esse cenário evidencia que o problema está na falta visibilidade social, ou seja, na
falta de reconhecimento da exploração de mão de obra infantil no meio doméstico como
um problema social e não percepção do trabalho infantil enquanto tal.
É essencial, portanto, como forma de conferir efetividade aos direitos e garantias
já positivados, promover a visibilidade, mão somente através de métodos jurídicos
especializados, fragmentados e monodisciplinares, mas também por meio de outros
saberes, como a arte.
REFERÊNCIAS
FOSTER, Hal (org.). Vision and visuality. Seattle: Bay Press, 1988.
KNAUSS, Paulo. O desafio de fazer história com imagens: arte e cultura visual.
ArtCultura, Uberlândia, v. 8, n. 12, p. 97-115, jan.-jun. 2006.
RESUMO
Este trabalho analisa como autores vanguardistas endossaram a guerra civil russa por
meio das suas obras, que se dirigiam principalmente a classe operária, para captar apoio
para a revolução. Assim sendo, têm por objetivos demonstrar a influência da arte nesse
contexto, bem como apresentar alguns dos estilos da vanguarda. No tocante à vertente
metodológica, usou-se da abordagem qualitativa. No método de abordagem, da forma
sistémica. Já em relação ao procedimento, adotou-se o método tipológico. Conclui que na
Revolução Russa a arte também esteve no cenário e os artistas, especialmente os
construtivistas, a exploraram com o fim de angariar forças para os movimentos
socialistas.
1 INTRODUÇÃO
A insatisfação com o regime czarista de Nicolau II, a fome que afetava o país, a
concentração de terras nas mãos da burguesia e da Igreja Ortodoxa, bem como a
participação da Rússia na Primeira Guerra Mundial, foram alguns dos motivos
responsáveis pela eclosão da Revolução Russa de 1917. Gerando, portanto, “uma
extraordinária atmosfera de inquietude e renovação nos campos social, político e cultural,
cujos desdobramentos se fizeram sentir durante todo o século XX” (CAVALIERE, 2017,
p. 19).
Contudo, não se tratou apenas de uma insurreição política, mas também artística,
que durou vinte anos, de 1910 a 1930 (MIGUEL, 2006, p. 28). Essa conjuntura de guerra
civil fora “endossada pelos artistas. Imbuídos dos ideais de vanguarda, eles próprios
queriam uma revolução na arte que pudesse transformar a vida” (ANDRADE, 2007, p.1).
Desta forma, a arte começou a anunciar e desenvolve-se conforme os anseios
sociais, passando esse movimento a ser denominado por alguns estudiosos como
vanguarda russa, entretanto, há críticas a respeito dessa nomenclatura.
Marcelo Albuquerque (2017) afirma que “as vanguardas russas têm como
características principais dois pontos: o uso de elementos geométricos puros
(consequentemente a redução dos matizes de cores) e a mentalidade revolucionária”.
Diante desse contexto social e político, se destacaram movimentos vanguardistas
importantes, como o cubo-futurismo, o suprematismo e construtivismo.
O cubo-futurismo traz como característica a preocupação com a realidade e
concretude daquilo que buscavam expressar, seja através da palavra ou de imagens,
rompendo com simbolismos, onde “o que está em pauta é uma orientação estética voltada
para a concreção, o que significa uma referência direta ao objeto, ao invés de alusões
indiretas” (CAVALIERE, 2017, p. 27). Um dos grandes nomes cubofuturistas é o de
Vladimir Maiakóvski, conhecido como o “poeta da Revolução”.
Maiakóvski era apoiador dos bolcheviques e desenvolveu diversos trabalhos no
período da revolução russa. Seja através de propagandas afetas ao movimento
revolucionário, seja através das suas obras, ele denunciava as mazelas sociais e clamava
por liberdade. Em seus poemas, remetia-se a população, para instigá-la à revolução,
movimentando as classes operárias, que viviam a realidade da opressão czarista.
O suprematismo, por sua vez, “representado pelo pintor Kazimir Malevitch, foi
um dos mais importantes movimentos artísticos da história da Rússia e deixou notáveis
contribuições para a arte moderna” (FERRARI; et al, 2013). Sua expressão era de arte
abstrata, sem compromisso com a existência de objetos, havendo uma liberdade na sua
exteriorização, que pode ser vista, por exemplo, no Quadro Vermelho: Realismo
Pictórico de uma Camponesa em Duas Dimensões, que data de 1915, sendo de autoria
malevitchiana.
Figura 1 - Quadro Vermelho: Realismo Pictórico de uma Camponesa em Duas Dimensões
Essa obra dá alusão para um início de uma nova fase, “que rompia com toda a
rigidez das imposições do passado e prenunciava a sua libertação; era a irregularidade da
forma banhada pelo sangue da revolução; revolução na arte e na política que alentavam
aquela população” (GRECO, 2007). Outra pintura famosa deste autor é a Cavalaria
Vermelha, onde o vermelho representa a cor da revolução, associada ao movimento
socialista. Desta maneira, a atuação de Malevitch durante a guerra civil russa foi de
acolhê-la, levando-o consigo todos aqueles que o admiravam.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Para a elaboração desse estudo, utilizou-se como fundamentação teórica artigos
científicos, dissertações de mestrado e teses de doutorado, que analisaram a influência
histórica das vanguardas no contexto da Revolução Russa, embasando o objetivo
principal deste trabalho, qual seja, demonstrar como o as manifestações vanguardistas
geraram adesão à guerra civil russa.
3 METODOLOGIA
4 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Este trabalho analisa como autores vanguardistas endossaram a guerra civil russa
por meio das suas obras, que se dirigiam principalmente a classe operária, para captar
apoio para a revolução, o que demonstra a influência da arte nesse contexto. Dessa forma,
foi sendo observado que na Revolução Russa a arte também esteve no cenário e os
artistas, especialmente os construtivistas, a exploraram com o fim de angariar forças para
os movimentos socialistas.
5 CONCLUSÃO
Por conseguinte, percebe-se que ao longo de toda Revolução Russa a arte também
representou esse cenário político e social de mudanças, articulando-se entre si, retratando
a insatisfação social e voltando-se para as classes menos favorecidas, que não tinha acesso
a elas, passando a retratar a suas vidas cotidianas, de opressão e anseios, contribuindo
primordialmente para a instauração e manutenção do movimento socialista.
Desses movimentos artísticos percebe-se que a vanguarda que mais se destacou
com o objetivo de angariar forças para a revolução socialista, foi os construtivistas, pois
se aliaram aos ideais revolucionários e teve ampla participação popular, porque descrevia
a vida cotidiana das camadas menos favorecidas, que antes não tinham acesso à arte.
REFERÊNCIAS
ANDRADE, Pedro Duarte de. Política e arte na Rússia da Revolução. O Globo - Prosa
& Verso. Rio de Janeiro, p. 3 - 3, 20 out. 2007.
GRECO, Patrícia Danza. Kazimir Malievitch: novos conceitos, outras revoluções. 2007.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal Fluminense, Departamento de História,
2007. 219 f.
MIGUEL, Jair Diniz. Arte, ensino, utopia e revolução os ateliês artísticos Vkhutemas/
Vkhutein (Rússia/URSS, 1920-1930). 2006. Tese (Doutorado em História) –
Universidade de São Paulo, São Paulo.
RESUMO
O I CNERA congregou estudiosos de diversas áreas do saber como a Antropologia, a
História, as Ciências Sociais, a Filologia e a Psicologia. Nesse sentido, fazendo um liame
entre as áreas do conhecimento supramencionadas e nosso objeto de pesquisa no pós-
doutorado, apresentamos um estudo sobre as rezadeiras brasileiras e suas ancestrais ibéricas,
cujas raízes se mesclam com as das bruxas do Medievo perseguidas pela Inquisição e pela
Caça às Bruxas. Objetivamos mostrar a relação entre nossas rezadeiras e as rezadeiras
ibéricas, cujo ofício ultrapassou os limites do Além-Mar, instalou-se em terras brasileiras e
continuou tanto aqui como lá. Para tanto, ancoramos nossas considerações nesse
levantamento bibliográfico em teóricos basilares para a temática como Hoffmann-
Horochovski (2015), Mainka (2002), Morais (2007), Nogueira (2012), Santos (2007, 2009),
Silva (2009), Stancik (2009), Theotonio (2011) e Zordan (2005), dentre outros. Concluímos
que nossas rezadeiras têm uma longínqua ligação com suas ancestrais ibéricas, que para aqui
rumaram quando ainda éramos uma incipiente colônia portuguesa e que consigo trouxeram
um conhecimento vetusto que remete ao Medievo e às mulheres que proviam a cura naqueles
tempos sombrios.
A tradição da busca da cura por meio da intercessão feminina é uma prática que
se perde na noite dos tempos. O ser humano sempre buscou a solução para os seus
problemas físicos, mentais e espirituais a partir da utilização da fitoterapia, das orações e
das práticas ritualísticas de mulheres que detinham e detêm o conhecimento oculto da
manipulação energética. Seguindo o curso natural do tempo, este conhecimento empírico
inerente às mulheres da Antiguidade foi-se aprofundando na Idade Média. De acordo com
Barstow (1991), naquele momento histórico, as chamadas “bruxas” pela Igreja eram as
parteiras e benzedeiras pertencentes a uma sociedade que as necessitava. Considerava-se
natural o fato de se recorrer às conhecedoras dos mistérios fitoterápicos para livrar-se de
problemas físicos, emocionais, mentais e espirituais, como supra citamos; para afugentar
o azar e atrair a prosperidade; para abençoar a semeadura objetivando uma farta colheita,
assim como para revolver a energia nos casos de amor dos consulentes.
Contudo, essas mesmas mulheres tornaram-se uma ameaça social ao formarem
confrarias e colocarem em risco o incipiente saber médico masculino, sexista e patriarcal,
que estava sendo gestado em paralelo com a ascensão do cristianismo, que naquele
momento legitimava-se como a religião oficial do mundo civilizado. Dessa forma, os
saberes pagãos faziam com que a bruxa expressasse, conforme Zordan (2005, p. 339-
340), “o poder das Grandes Deusas, a divinização da Natureza e a terra-corpo como
sagrados”. Acreditava-se que o poder de curar poderia levar também ao de matar. Para
Barstow (1991), esse poder inexplicável e sobrenatural somente poderia haver sido
concedido a tais mulheres pelo próprio Satanás, com quem elas supostamente haveriam
feito um pacto de sangue e/ou copulado anteriormente.
O que não encontrasse eco nos ditames cristãos deveria ser expurgado. Se as
mulheres eram vistas com desconfiança pelo cristianismo, as mulheres fálicas,
inteligentes, carismáticas e resistentes ao discurso hegemônico dessa religião, que
depreciassem a instituição matrimonial focada na monogamia e valorizassem o sexo e o
prazer estéreis, tornaram-se uma ameaça que deveria ser eliminada. Paradiso (2011)
resume que essas mulheres foram, então, declaradas inimigas dotadas de malícia, lascívia
e corrupção, posteriormente perseguidas com o apoio do clero e da nobreza e, finalmente,
emudecidas à custa de sangue. A desculpa encontrada para silenciar-lhes o discurso e a
postura empoderadas foi a de taxá-las de endemoniadas. E calhou bem: a partir de então,
o silêncio passou a ser o destino das mulheres, cabendo o discurso aos homens, que o
construíram com base em um arcabouço autoritário e focado no masculino.
Osório (2004) defende que a típica imagem da bruxa que habita a imaginação do
ocidental comum está intrinsecamente vinculada ao repúdio. Caracterizamos-lhe, o mais
das vezes, como uma mulher velha, feia e pobre; enrugada e com uma grande verruga
pendendo da ponta do nariz aquilino; o cabelo maltratado, longo e grisalho; a voz rouca;
totalmente vestida de negro e curvada sobre seu imenso caldeiro, onde um menino cristão
está sendo cozido a fogo lento para servir de base para o preparo de poções mágicas. Ao
seu redor, além do caldeiro, símbolo ancestral que representa o grande útero da Deusa
Mãe, onde vida e morte estão conectadas pela reencarnação, repousam também outros
objetos igualmente mágicos como a varinha e a vassoura, além da companhia inevitável
de corvos e de gatos pretos. Na maioria dos contos de fadas, cristianizados e
ressignificados pelo filtro moral puritano da Era Vitoriana, as bruxas são as vilãs por
excelência e devem morrer no fim da história para que o bem possa, por fim, triunfar.
Mas, afinal, quem eram/são as bruxas? E por que têm que necessariamente desaparecer
no final da trama para que esse suposto bem possa prevalecer?
À luz de Paradiso (2011) e Zordan (2005), a imagem da bruxa foi sendo construída
a partir de discursos que apresentavam as mulheres metaforicamente como seres
autônomos e sexualmente emancipados, em oposição direta ao sistema de controle
patriarcal hegemônico; a personificação da rebeldia, da autossuficiência, dos instintos
mais primitivos e de uma sexualidade selvagem. Em vista dessas características, fez-se
necessário moldá-las ao discurso falocêntrico: emudecê-las e ceifá-las. Ellis (1995)
afirma que essa mudança começou de forma gradual e aparentemente bem-intencionada.
Aos poucos, a medicina tradicional dos antepassados passou a ser considerada bruxaria
pelos que professavam a fé em Cristo, subestimando, sobrepujando e rebatizando antigos
saberes. As pessoas que faziam uso dos vetustos conhecimentos pré-cristãos, como filtros
e poções, passaram a ser implacavelmente perseguidas. Com o cristianismo cada vez mais
preponderante, intolerante e imponente, tornava-se inviável que a mulheres continuassem
a agir como sempre haviam agido; não se aceitava mais que seguissem remediando a vida.
Bastava com gestá-la. As bruxas, antes respeitadas por sua cultura milenar e hereditária,
com a Caça às Bruxas e a Inquisição, passaram a simbolizar a ligação feminina com o
oculto e com o diabólico (BECHTEL, 2001).
A violência misógina legitimada que se produziu contra elas chegou às raias do
delírio e da insanidade por duas marcadas e dolorosas vezes na História: na Inquisição e
na Caça às Bruxas. Determinadas localidades assistiram a um verdadeiro extermínio de
pessoas acusadas de bruxaria (diga-se de passagem, que entre 75% e 90% dos casos,
tratava-se de mulheres). E por que mulheres e não homens? Provavelmente porque as
mulheres sempre estiveram mais próximas das crianças, dos velhos e dos doentes – dos
mais débeis, portanto; sempre trabalharam mais devotadamente na elaboração do
alimento; sempre foram profundas conhecedoras das dores, dos partos, das doenças e da
morte em si e, consequentemente, passaram a ser vistas com maior desconfiança devido
a tal proximidade, como defendem Menon (2008) e Mainka (2002). Casanova e Larumbe
(2005) esclarecem que a grande maioria dessas “malfeitoras” eram habitualmente
diagnosticadas como mentalmente desequilibradas.
A economia foi, segundo Barstow (1991), um dos maiores detonantes das
perseguições. Normalmente, as acusadas ou eram mulheres paupérrimas e que dependiam
de seus vizinhos para sobreviver ou eram abastadas e atraíam a ganância de seus algozes.
Ademais, ainda conforme Barstow (1991, p. 184): “Todas las mujeres solas eran
consideradas especialmente vulnerables al diablo. Las parejas de madre e hija eran muy
sospechosas, y muchas fueron quemadas o colgadas juntas”. Corroborando esta assertiva,
Casanova e Larumbe (2005) explicam que o crescente número de mulheres que viviam
sozinhas naquele momento da História se devia à dissolução de conventos em áreas
protestantes e/ou à viuvez imperante em razão das guerras contínuas. Sozinhas e
vulneráveis, sem a proteção de uma figura masculina, aquelas mulheres desamparadas,
mentalmente afetadas e materialmente pobres ou demasiadamente ricas tornaram-se
presas fáceis para os inquisidores.
Apesar da perseguição empedernida que sofreram, as bruxas, reduzidas em
número, resistiram, ressignificaram sua missão, redimensionaram sua atuação e seguem
entre nós sob a configuração das curandeiras nos mais diversos sítios do planeta,
conforme Stancik (2009). A bruxa não morreu. E por que deveria? Sobre essa
continuidade tratamos a seguir.
[...] está diretamente relacionada com a cura da “dor de barriga”. A “água fria”
poderia ser de um rio cuja “correntia” levaria a dor que estaria fazendo sofrer
aquela pessoa. Em outras palavras, da mesma forma que o curso de água do rio
se processa, também a “dor de barriga” a água levaria. O simbolismo da água
poderia se fazer presente em rios, fontes, lagoas, principalmente na água do
mar. Muitas rezadeiras, ao benzer as pessoas de “arduvento”, de “mau-
olhado”, “erisipela” dentre outros males e após pronunciarem as palavras
sagradas, concluem o ritual pedindo ao “todo poderoso” que jogue o mal que
o doente “estava sentindo nas águas do mar sagrado.”. Com esse tipo de
procedimento delega-se ao mar que leve definitivamente o mal, a doença, o
azar, a inveja, o olho gordo, “vento bravo”, dentre outros males para nunca
mais retornar ao corpo ou ao espírito da pessoa. Aliás, para muitos curandeiros
não importa se a água é do mar ou de um rio. Para eles, tais lugares, além de
serem misteriosos, são sagrados. São nas águas que alguns rituais religiosos ou
curativos eram praticados. Batizados (iniciação), lavagem de correntes
(contas), limpeza de corpo poderiam ser efetuados nas águas. (SANTOS, 2005,
p. 188).
Para que entendamos o valor dessas mulheres em nosso meio, o que significaram
e significam para a saúde pública no pretérito e no presente, faz-se necessário
retrocedermos um pouco no tempo e explanarmos sobre suas origens, atreladas às suas
antecessoras portuguesas e galegas, cujo legado segue sendo fomentado por atuais
rezadeiras tanto na Península Ibérica quanto no Brasil.
A seguir, apresentamos um panorama da benzeção no Norte de Portugal e na
Galiza e sua chegada ao nosso país por meio dos colonizadores e imigrantes.
Para compor este ritual de cura, as rezadeiras podem utilizar vários elementos
acessórios, dentre eles: ramos verdes, gestos em cruz feitos com a mão direita,
agulha, linha e pano, além do conjunto de rezas. Estas podem ser executadas
na presença do cliente, ou à distância. Em seu ofício, de amplo
reconhecimento, essas mulheres “rezam” os males de pessoas, animais ou
objetos, bastando apenas que alguém diga os seus nomes e onde moram.
(SANTOS, 2009, p. 12-13).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS
BECHTEL, Guy. Las cuatro mujeres de Dios: la puta, la bruja, la santa y la tonta.
Barcelona: Ediciones B, S.A, 2001.
CÂMARA, Yls Rabelo; SANZ-MINGO, Carlos; CÂMARA, Yzy Maria Rabelo. Das
bruxas medievais às benzedeiras atuais: a oralidade como manutenção da memória na arte
de curar - uma pesquisa exploratória. Boitatá, v. 11, n. 22, p. 221-236, 2016.
ELLIS, Peter Berresford. Celtic Women. Women in Celtic Society and Literature.
London: Constable and CompanyLtd., 1995.
FERNÁNDEZ-GARCÍA, Maria Isabel. Os científicos lucenses do século XVIII.
Lvcensia, p. 85-102, 2015.
HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais
LTDA, 1990.
ROSÁRIO, Maria do; SÁ, Lenilde Duarte de; KLÜPPEL, Berta Lúcia Pinheiro. Reza e
Tecnologia Leve no Diálogo entre os Saberes Científicos e Populares. Cadernos de
Pesquisa em Ciência da Religião, n. 23, p. 96-112, 2014.
SANTOS, Denilson Lessa dos. Nas Encruzilhadas da Cura: crenças, saberes e diferentes
práticas curativas. Dissertação. Mestrado, UFBA, Santo Antônio de Jesus, 230f. 2005.
SANTOS, Francimário Vitor dos. O ofício das rezadeiras como patrimônio cultural:
religiosidade e saberes de cura em Cruzeta, na região do Seridó Potiguar. Revista CPC,
São Paulo, n. 8, p. 6-35, 2009.
SANTOS, Thiago Lima dos. Pajelança: religião e sociedade no século XIX e XX. 29ª
Reunião Brasileira de Antropologia, Natal, p. 1-19, 2014.
ZORDAN, Paola Basso Menna Barreto. Bruxas: figuras de poder. Revista Estudos
Feministas, v.13, n. 2, p. 331-341, 2005.
A CRIAÇÃO DO MUNDO: O MITO NAS METAMORFOSES DE
OVÍDIO
RESUMO
INTRODUÇÃO
A história humana sempre foi e permanece sendo um mundo de pura reflexão
acerca do meio. A necessidade de explicar aquilo que aos olhos e entendimento humano
se torna ininteligível é inerente ao homem e a sua capacidade de criação. Esse desejo tão
arraigado no ser humano gerou a noção de mito.
Segundo alguns estudos científicos a ciência já tem apontado que o homem nasce
com a necessidade de crer em alguém ou em alguma coisa. Isso parece fazer sentido visto
que o homem sempre buscou nomear e crer em tudo o que era incrível ao seu
entendimento. A comunidade científica está tentando ratificar o que a fé e a criatividade
humana, há muito tempo, havia consumado. Os homens observavam as forças da natureza
e sua incrível capacidade de geração e passaram a nomear tais forças como sendo
divindades capazes de realizar maravilhas e de governar entre aqueles. A partir de então
tais figuras sacralizadas passaram a ser estabelecidas entre as sociedades de geração em
geração, cantadas por suas grandes realizações, tanto boas quanto más.
Assim também se deu com os homens mais influentes. Louvados, seus nomes
foram erigidos no decorrer das posteridades, tornando-se bravos heróis, dotados de
poderes provenientes das divindades há muito tempo reverenciadas através de ritos e
cânticos.
Podemos dizer que tais reverências, executadas pelas gerações, tornaram estas
divindades e heróis em mitos, pois o mito nasce da necessidade do homem de explicar
tudo ao seu redor.
Este trabalho tem por objetivo tentar explicar o que é o mito e qual é a sua
influencia dentro das sociedades antigas. Embora a noção de mito seja muito abrangente,
tentaremos pontuá-lo e, mostra-lo através da literatura. Escolhemos a obra de Ovídio, As
Metamorfoses, para explicar o mito da criação do mundo, revelando como o mito é visto
na cultura romana, através do autor, Ovídio.
O mito da criação do mundo sempre foi observado através de várias perspectivas
por diferentes culturas. Tendo em vista isso, para corroborar com o objetivo do nosso
trabalho que é comparar este mito cosmogônico, visto na cultura romana, com as demais
culturas, pontuaremos o mesmo na perspectiva de outras culturas de forma breve e direta.
A análise acerca do mito da criação do mundo na obra de Ovídio, As
Metamorfoses, será feita através do texto original latino e de uma tradução operacional
na língua portuguesa. 4
A noção de mito e o ser humano sempre caminharam lado a lado. Esse, desejoso
de encontrar explicações para o mundo em que vive, passou a nomear e a reverenciar tudo
aquilo que era misterioso à sua compreensão. O Sol e seus raios, a Lua iluminando a
escuridão da noite, as estrelas, as plantas nascendo sem a intervenção do homem, os raios
e seus danos, o fogo, os sentimentos humanos, tudo era fantástico à compreensão humana.
Desta forma, o homem os personificou e os reverenciou, mitificando estas forças maiores,
admiráveis e incontroláveis.
4
A tradução operacional é de nossa inteira responsabilidade.
O estudioso, Junito Brandão, em sua obra, Mitologia grega, Vol. I, conceitua o
mito como sendo “o relato de um acontecimento ocorrido no tempo primordial, mediante
a intervenção de entes sobrenaturais” (1986, p. 35). Ao analisarmos tal conceituação,
podemos nos certificar de que o mito, nada mais é do que uma narrativa ilógica e
irracional, construída sobre a presença de entes sobrenaturais, com a finalidade de
explicar fatos verídicos, ocorridos nas origens. Essa construção foi gerada através da
criatividade e vivência coletiva, do inconsciente de um povo. Junito Brandão ainda
afirma:
De outro lado, o mito é sempre uma representação coletiva, transmitida
através de várias gerações e que relata uma explicação do mundo. Mito
é, por conseguinte, a parole, a palavra "revelada", o dito. E, desse modo,
se o mito pode se exprimir ao nível da linguagem, "ele é, antes de tudo,
uma palavra que circunscreve e fixa um acontecimento".18 Maurice
Leenhardt precisa ainda mais o conceito: "O mito é sentido e vivido
antes de ser inteligido e formulado. Mito é a palavra, a imagem, o gesto,
que circunscreve o acontecimento no coração do homem, emotivo
como uma criança, antes de fixar-se como narrativa". (BRANDÃO,
1986, P.36)
O início de tudo sempre foi um grande fascínio para o homem. Explicar as origens
é algo inerente à curiosidade humana. O homem passa, então, a memorar e a sacralizar os
primórdios, inserindo-os na sua cultura, celebrando-os em sua religiosidade.
Cada cultura possui sua particularidade, sua visão em relação à origem do mundo.
A partir desta visão mítica, repousada em uma verdade, como já havíamos pontuado
acima, nasce o mito. O mito acerca da origem do mundo denomina-se cosmogônico.
Os mitos romanos se deram, tanto por meio da própria tradição latina, quanto pela
assimilação da cultura romana com as mais diversas culturas dos povos subjugados por
ela no decorrer das conquistas territoriais. Todavia, a cultura grega se estabeleceu de
forma vigorosa na religiosidade do povo romano. Como consequência desse
estabelecimento, podemos ver a presença constante dos deuses romanos, cujas
semelhanças são, inegavelmente, iguais ou parecidas as dos deuses gregos. O mito
cosmogônico, por exemplo, se assemelha muito ao àquele levantado pela cultura grega.
7 Os dados que tratam acerca das culturas chinesa, mesopotâmica e hindu foram extraídos do
artigo, Mitos - suas origens e sua importância para o homem contemporâneo.
O mito passou a ter espaço na literatura romana e o presenciamos, de forma mais
ativa, no período áureo ou clássico de Roma (século I a.C ao início do século I d. C.)
através das literatura e arte.
Neste período de ouro de Roma muitos poetas romanos passaram a revelar os
mitos em seus poemas e, dentre estes poetas destacaremos Ovídio e sua obra,
Metamorfoses (ano 8 d. C.)
As Metamorfoses de Ovídio traz inúmeros mitos e, dentre eles, podemos pontuar
o mito da criação do mundo, questão do nosso trabalho.
Em ambos os mitos cosmogônicos, grego e romano, há a presença de uma força
primordial denominada, Caos, força incomensurável geradora de outras forças que deram
início a tudo e, Ovídio, em sua obra, Metamorfoses, exibe tais acontecimentos.
3.1. Caos: a desordem
No início do Livro I das Metarmorfoses, Ovídio evoca os deuses para que esses
tragam ao seu espírito a realidade obscurecida da origem do mundo.
In nova fert animus mutatas dicere formas
corpora; di, coeptis (nam vos mutastis et illas)
adspirate meis primaque ab origine mundi
ad mea perpetuum deducite tempora carmen! (vs. 1 ao 4).
O espírito (me) leva dizer formas mudadas em novos
corpos.
Deuses, soprai as primeiras coisas para meus planos (se de
fato vós mudastes também aquelas (coisas)) e guiai (vós)
(para mim) o canto perpetuo da origem do mundo para os
meus tempos. (Tradução operacional).
No verso 5, começa a narrativa da cosmogonia. Ovídio pontua que, antes que
existisse qualquer outra forma de vida, havia uma força chamada Caos.
Ante mare et terras et quod tegit omnia caelum 5
unus erat toto naturae vultus in orbe,
quem dixere chaos: rudis indigestaque moles
nec quicquam nisi pondus iners congestaque eodem
non bene iunctarum discordia semina rerum. (vs. 5 ao 9).
Antes do mar, das terras e do céu, que cobre todas as coisas,
o aspecto da natureza era um só em todo o mundo, que
chamavam Caos: massa rude e confusa, nenhuma coisa
(existia) senão o peso inerte e sementes ajuntadas de coisas
não bem unidas pela discórdia. (Tradução operacional)
Todavia, Ovídio, logo após os versos acima, destaca o “deus” ( v. 32), agora
sozinho, trabalhando em favor da ordem cósmica. Esta força se opõe a vontade de Caos.
Denominado, “quisquis fuit ille deorum”, (quem quer que fosse dos deuses) e, como já
mencionado, “ fabricator mundi”, ( criador do mundo), o “deus” tece a criação nos versos
32 ao 75. Aglomera a terra, formando, assim, o globo terrestre. Estendeu os mares,
formou, por meio dos ventos, os rios, os pântanos e todos os olhos d’água. Fez surgir as
montanhas e os vales, florestou a paisagem e dividiu o clima. Nomeou os ventos e lhes
deu liberdade para evolarem sobre a terra sem impedimento. Os astros celestes passaram
a ferver e iluminar a terra e o céu, saindo da escuridão eterna, ocupando, juntamente com
os deuses, as regiões infindas do céu. Os animais obtiveram suas moradas nos mares e na
terra. Tudo floresce e têm suas forças impulsionadas para a vida através deste “frabricator
mundi”.
Podemos presenciar algo bastante relevante quanto à influência de Caos, do
“deus” e da “melior Natura”(esta sendo instrumento facilitador para a ação do “deus”).
Ovídio mostra que a desordem e a inércia que rodeava o reinado de Caos, foi algo que
existiu, contudo, não poderia retornar e isso é pontuado através dos verbos de ação que
se encontram sempre no passado. (praebebat, reparabat, pendebat, porrexerat, erat,
manebat, obstabat, pugnabant – estendia, restabelecia, pendurava, estendia, era,
permanecia, incomodava, lutavam). Já, quando a ordem passa a ser estabelecida pelo
“deus”, com ajuda da “ melior natura”, Ovídio levanta ações no perfectum (ações
acabadas), revelando ao leitor e estudioso da obra que a ordem veio e se estabeleceu,
reinante, sem a possibilidade de um retorno à desordem. O “deus” cria e tudo o que fora
criado por ele é eterno e perfeito. Os verbos de ação tanto do “deus” quanto do movimento
dos elementos criados por ele, com ajuda da “melior natura” são: diremit, absidit, secrevit,
evoluit, exemit, ligavit, emicuit, fecit, traxit, possedit, coercuit, fuit, secuit, coegit,
glomerauit, iussit, addidit, cinxit, distinxit, locauit, dedit, permisit, recessit, invasit
imposuit, dissaepserat, coeperunt, cesserunt, cepit. (dividiu, separou, distinguiu,
desdobrou, tirou, ligou, explodiu, fez, puxou, ocupou, conteu, foi, recordou, juntou,
aglomerou, ordenou, acrescentou, cingiu, distinguiu, estabeleceu, deu, permitiu, retirou
avançou, colocou, dividira, começaram, cederam, recebeu).
4. CONCLUSÃO
Embora cada cultura possua sua própria identidade religiosa, existem pontos que
se assemelham entre elas, e, um desses, é, sem dúvida, a figuração da cosmogonia. Uma
força primordial, geradora de duas outras forças, uma ativa, (masculina) e outra passiva
(feminina), essenciais ao desenvolvimento da vida humana, dá início ao que muitas
culturas entendem por criação do mundo e, a cultura romana, não ficou fora deste mesmo
pensamento religioso.
De acordo com As Metamorfoses de Ovídio, grande obra do século I d. C., que
detalha a transformação ou, podemos assim dizer, a evolução de diversos mitos, a religião
romana acreditava neste percurso de forças que, unidas, geraram a harmonia do cosmos.
Tinha como força primeva, Caos, que, por sua própria natureza, é a discórdia entre os
elementos e a manifestação da desordem. Como força geradora do equilíbrio do cosmos,
se contrapondo ao Caos, existia o “deus” (força masculina) e sua adjutora, a “melior
natura” (força feminina) que, unidas, estabeleciam o equilíbrio da criação e o nascimento
de toda natureza existente.
Desta forma, concluímos que Ovídio trás, em sua obra, As Metarmofoses, pontos
inerentes à essência da criação vistos em diversas culturas do mundo ao levantar forças
sacras geradoras do cosmos em sua obra, através do mito cosmogônico. Percebemos tal
fato, logo após um estudo apurado do texto original da obra ovidiana, ao fazermos um
levantamento dos verbos que estabelecem as ações dos principais personagens da
cosmogonia, ou melhor, daqueles que geraram o início de todas as coisas, o Caos, o
“deus” e a “melior natura”. Durante nosso estudo observamos que muitos dos verbos,
pontuados por Ovídio, possuíam ações criadoras. Estas, quando direcionadas a Caos,
encontravam-se no passado do infectum, mostrando, assim, ações que, de fato, ocorreram,
mas que não poderiam tornar a serem exercidas. Logo após, presenciamos as ações
pontuadas pelo “deus” e a “melior natura”, que evidenciam o perfectum (ação acabada),
revelando que as ações desses últimos são perfeitas, em relação àquelas outras, e
imutáveis.
REFERÊNCIAS
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____________________________________Mitologia grega, Vol I. Diagramação Daniel
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Simões Loureiro. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1993.
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Universidade de Coimbra. Ed. 2°/ 2008
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Jaa Torrano – 7. ed. – Iluminuras, 2007.
SOUSA, Eudoro de, 1911 – História e mito. Cadernos da UnB. Asa Norte Brasília- DF:
Editora Universidade de Brasília, 1981.
A CULTURA INDÍGENA E SUA MANUTENÇÃO: A INFLUÊNCIA
DA GLOBALIZAÇÃO NAS TRANSFORMAÇÕES
SOCIOCULTURAIS DOS FULNI-Ô, DA CIDADE DE ÁGUAS
BELAS – PE
O principal objetivo deste trabalho é analisar o modo como elementos culturais dos povos indígenas da
etnia Fulni-ô, residentes na cidade de Águas Belas, Pernambuco, são produzidos como objetos de
consumo para turistas e visitantes, seguindo a lógica do mundo globalizado. Para o alcance do objetivo
proposto, foi realizada pesquisa bibliográfica, com enfoque na história da etnia, além de uma visita in
loco, para realização de entrevistas semiestruturadas. Os resultados preliminares permitiram observar
que os índios Fulni-ô são um ótimo exemplo para refletir a produção de elementos culturais e identitários
em objetos de consumo, articulando categorias como local e global, para divulgar elementos da sua
cultura, ao mesmo tempo em que promovem desenvolvimento socioeconômico da etnia.
Introdução
Nesse sentido, é importante considerar as questões simbólicas que compõem seus traços culturais,
por serem parte de fatos que afirmam sua identidade quanto indígenas, esses elementos ajudam na
relação de portabilidade de uma identidade específica.
De acordo com Barth (1998) ainda, a forma de organização social de um grupo étnico depende
das fronteiras que se estabelecem com a manutenção provinda dos índios e não índios.
Seguindo essa linha de pensamento, se percebe que em meio às mudanças decorrentes do mundo
capitalista e globalizado, é impossível um grupo étnico manter sua cultura e costumes de forma original,
pois o processo cultural vive em evolução e modernização. A cultura está sempre se dinamizando e se
transformando.
Sendo assim, os grupos étnicos devem aparecer como organização social que se adapta as
mudanças, assim como afirma Cunha:
É desta forma que a Economia da Cultura entra como agente, dando suporte conceitual para as
formas que os índios Fulni-ô encontraram de inovar seus métodos em relação às atividades econômicas
adaptando para práticas comerciais semelhantes as da cidade, mas com sua particularidade de indígena,
que se manifesta através de seus costumes culturais.
Nesse sentido, assim como os demais grupos que experienciam o mundo capitalista e globalizado,
têm adotado estratégias de sobrevivência para adquirir recursos que viabilizem sua sustentabilidade
financeira.
Os índios Fulni-ô, nesse cenário, se tornam um referente empírico ideal para refletir o modo como
os povos indígenas tem se apropriado das categorias capitalistas e produzido elementos de sua cultura
como bens de consumo para potenciais consumidores.
Fundamentação Teórica
Ao longo dos anos os povos indígenas do Brasil têm passado por um contínuo
processo de dizimação de sua cultural. Como marco deste processo, Pacheco de Oliveira
(1994) observa que temos as reformas pombalinas, em que instituição políticas e práticas
sistemáticas de assimilação foram implementadas pelo estado com o intuído de agregar
os povos indígenas à lógica de mercado europeia de finais do século XVIII.
No século XIX, com o final da escravidão, este processo foi intensificado através
das políticas eugenistas, as quais tinham como principal objetivo, além de promover uma
maior assimilação da população indígena e afrodescendente, purificar o povo brasileiro.
Como marco deste período, foram implementadas uma série de estratégias de e incentivos
à vinda de trabalhadores europeus, brancos, com a finalidade de dirimir a mestiçagem e
formar uma raça pura. Nesse momento histórico acreditava-se que a mistura de raça era
o principal entrave ao desenvolvimento social e econômico do país (LARAIA, 2001).
Cabe destacar que este processo foi mais forte no Nordeste do país, uma vez que
geograficamente ele foi colonizado primeiro, o que não quer dizer que ele não tenha sido tão
violento quanto para com os povos indígenas do Norte do País.
No que se refere mais especificamente aos Fulni-ô, eles foram durante muito tempo considerado
pelos estudiosos como os últimos remanescentes dos históricos índios Karirí, cujo hábitat abarcava todo
o Nordeste do Brasil (BOUDIN, 1949).
No entanto, depois de análises linguísticas, concluiu-se que não havia uma relação direta entre os
dois grupos. O que se sabe é que, de acordo com registros da Informação Geral da Capitania de
Pernambuco (1906), eles eram cerca de 323 pessoas que pertenciam a grupo indígena em meados de
1749. E que já nos anos de 1937 o grupo havia crescido consideravelmente.
Atualmente os povos indígenas da etnia Fulni-ô estão localizados na cidade de Águas Belas,
agreste de Pernambuco, com 40.235 mil habitantes, sendo aproximadamente 4.689 indígenas (IBGE,
2018), e são o único povo indígena do Nordeste a falar sua língua matriz. Não se tem uma data exata de
quando a tribo foi aldeada8, como também existe a possibilidade de que os mesmos tenham obtidos
elementos de outras tribos anteriores que possivelmente deram origem ao seu povo.
8
Se organizar sob forma de aldeia.
A religião é para eles um assunto bem delicado, pois apesar da presença de igreja católica na praça
central da aldeia, muitos dos indígenas Fulni-ô se consideram apenas índios quando lhes perguntam
sobre suas religiões. Esse é um aspecto bem nítido de como esse grupo se adaptou diante do que lhe foi
imposto pelas culturas distintas as deles.
É apenas a partir da Constituição de 1988 que este cenário começa a mudar e os povos indígenas
começam a ganhar direito à voz, tendo como base uma série de direitos garantidos, como direito a terra,
a educação e saúde (PACHECO DE OLIVEIRA, 1994). Todavia, a grande violência simbólica sofrida
ao longo da colonização ainda trazia uma vergonha para que eles buscassem o reconhecimento como
índio, especialmente os povos indígenas do Nordeste.
Diante disso os índios Fulni-ô, de Águas Belas, são um grupo interessante para refletir
as transformações culturais e as estratégias de reafirmação identitária no mundo globalizado,
marcado como observa Hall (2014) pelo estreitamento das fronteiras geográficas e culturais,
aliados em novos processos de comunicação, e mais ainda: de assimilação da lógica capitalista
do mundo globalizado.
Atualmente os Fulni-ô se dividem entre a cidade de Águas Belas e a aldeia onde eles
praticam seu principal ritual, o Ouricuri. Ao longo dos anos eles sobreviveram a sua série de
tentativas de apagar sua cultura, mas conseguiram se manter como único grupo indígena do
Nordeste a falar sua língua materna, além dos seus principais rituais, os quais envolvem
isolamento da cidade na aldeia vizinha ao município.
Ao longo dos anos eles têm enfrentado um violento processo de assimilação, e mesmo
tendo o seus direitos e identidade reconhecidos pela constituição, ainda não tem suas terras
demarcadas. O principal entrave é a deslegitimação de alguns segmentos sociais em reconhecê-
los como índios, utilizando a justificativa de que eles já estão há muito tempo convivendo com
os povos ditos brancos, o que faz com que eles não sejam reconhecidos de um todo como povos
indígenas.
Numa estratégia para se reafirmar como povo indígena, mesmo tendo assimilado uma
série de elementos culturais no mundo globalizado, eles têm divulgado uma série de elementos
da sua cultura, utilizado a mesma lógica de produção cultural na atualidade. Em outras palavras,
uma vez que a cultura no mundo globalizado se torna uma mercadoria, a qual passa por um
processo de produção, distribuição, circulação e consumo (HALL, 2014), eles têm utilizado
alguns elementos de sua cultura, como artesanato, rituais, como forma de divulgar sua cultura
e reafirmar sua identidade indígena.
Dessa forma, se percebe que ao longo de sua trajetória em busca da legitimação de sua
identidade étnica, os Fulni-ô tentam “superar as pressões mantendo sua língua própria e seus
segredos e assiduidade em sua prática religiosa, economicamente praticam uma gama de
atividades que os integram às economias locais, regionais e até mesmo nacionais” (Campos,
2006, p. 62).
Com a dificuldade climática enfrentada para práticas agrícolas na região e mesmo sem
dados que comprovem qual o tipo de economia era praticada pelos Fulni-ô, Campos destaca
que ela, provavelmente, era baseada na agricultura que permanece hoje ainda ativa entre alguns
indígenas.
Com isso, as atividades econômicas que são praticadas se diversificam tanto no âmbito
cultural, como em outras atividades, as quais, por sua vez, são consequentemente resultado do
contato com não índios. Estas discussões se inserem na temática da Economia da Cultura, a
qual trata o simbolismo cultural de uma determinada sociedade, como a ampliação das relações
sociais de maneira a utilizar de ferramentas da economia que ajudam a analisar a importância
que tem a cultura como geradora de emprego e renda.
A participação da vida dos índios com eventos exteriores aos da tribo é significante, uma vez
que a aldeia é considerada um bairro da cidade. Existem membros da tribo que trabalham na cidade com
funcionalismo público e privado, assim como existem comerciantes indígenas, jovens que estudam nas
escolas municipais e estaduais fora do aldeamento, políticos como vereadores, além do futebol
atividades em que os índios são bastantes presentes em relação à interação entre índios e não índios.
As atividades econômicas em uma ordem decrescente, sendo a agricultura a primeira e em
seguida vem o artesanato que é bastante predominante na tribo e, por sua vez, é importado para vários
lugares do Brasil. Além disso, há também os empregos e trabalhos que são exercidos pelos índios na
cidade de Águas Belas e em outras cidades da região. Outra forma de renda é o arrendamento de terra
que são recolhidos anualmente e, por fim, existem as apresentações de danças que têm crescido muito
nos últimos anos (FERREIRA, 1996).
De acordo com as observações obtidas por Campos (2006, p. 64), “no caso dos Fulni-ô, as únicas
atividades exclusivamente indígenas são a produção de artesanato e a apresentação indígena, enquanto
todas as outras também são exercidas pela população regional não indígena”.
Periodicamente muitos índios viajam para cidades grandes para a venda de artesanato e para fazer
apresentações de dança, passando aproximadamente um mês viajando fazendo esse tipo de atividades.
Essa é uma das formas mais comuns de renda dos Fulni-ô, assim como a maneira que buscaram de
divulgar sua cultura e se manterem dentro do que o mundo globalizado exige.
Essas atividades são bastante discutidas na cidade. As discussões giram em torno de elas são uma
prova de que os Fulni-ô estão perdendo sua cultura em meio a tantas tecnologias, e apropriações de
atividades tidas no senso comum como maciçamente executadas por povos “brancos”. Sobre este ponto,
é importante destacar que
Como os demais grupos étnicos no mundo globalizado, esta etnia reformulou sua maneira de
fazer comércio sem deixar de lado seus costumes, isso mantem a ideia de que existem pontos tanto
positivos quanto negativos, no entanto, nenhum deve ser tomado como total verdade absoluta do que
realmente gerou esse processo agregação de lógicas nas suas trocas com os demais grupos sociais.
Estes autores somados aos estudiosos da economia cultural (VALIATI, 2015; SCOTT,
1999) conceitua a analise de como os elementos culturais dos Fulni-ô são transformados em
mercadorias, tendo como principais agentes deste processo eles próprios, contribuindo para
divulgar a cultura indígena, ao mesmo tempo em que garantem renda para a população indígena.
Metodologia
I. Pesquisa bibliográfica da trajetória dos índios do nordeste com enfoque na história dos Fulni-ô.
II. Observação participante na aldeia Fulni-ô, na cidade de Águas Belas/PE, com o objetivo de
analisar e discutir quais elementos da cultura da tribo são utilizados como forma de divulgação
de sua identidade.
III. Verificação da relação da tribo com o conceito de Economia da Cultura.
Conclusão
Diante de tudo que foi levantado, foi possível perceber que os Fulni-ô de Águas belas
adotam a estratégia de transformar sua cultura em um bem de consumo através de elementos como
o artesanato, ou exibição pública de seus rituais em forma de dança, para reafirmar sua identidade
cultural frente ao Estado, e também para conseguir se manter nestes contextos, em que as
fronteiras locais e globais se inter-relacionam na busca da compreensão do grau de importância
de se ter como estratégica a adaptação quando ocorre interação social entre culturas diferentes.
Com a estratégia de sobrevivência e manutenção de sua cultura, os Fulni-ô criaram o
mecanismo de venda de sua arte e sua produção cultural para se afirmarem como índios, mesmo
sendo híbridos.
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Povos Indígenas do Nordeste. In: Atlas das Terras Indígenas/Nordeste. Rio de Janeiro: PETI/ Museu
Nacional/UFRJ. 1994, pp. V-VIII
A EDUCAÇÃO E SEUS DEBATES ATUAIS: O QUE QUEREMOS
NO ENSINO RELIGIOSO?
RESUMO: No contexto atual que estamos inseridos discutir e promover a reflexão acerca
de questões de diversidade cultural religiosa se faz necessária ao combate de preconceitos
e discriminações dentro do âmbito escolar no que se refere às religiões, inclusive as
consideradas religiões “minoritárias”, ou seja, as que não são cristãs. É nessa perspectiva,
que esse artigo tem como objetivo refletir e perceber Ensino Religioso como componente
curricular que possa contribuir para o combate a intolerância religiosa nas escolas, bem
como promover nos educandos o respeito, a valorização, o reconhecimento de si e com o
outro e a cultura de paz. Metodologicamente esse estudo é bibliográfico com
delineamento explicativo de concepções que fazem refletir sobre as questões da
importância do diálogo inter-religioso nas propostas pedagógicas para potencializar o
processo de ensino e aprendizagem. Concluímos, portanto, que é de responsabilidade do
Ensino Religioso enquanto componente curricular reconhecido atualmente na Base
Nacional Comum Curricular (BNCC) na área das Ciências Humanas, superar cada vez
mais as lacunas enfrentadas nas escolas em uma perspectiva não confessional e não
prosélita, em que suas práticas metodológicas e pedagógicas possam incluir temas
emergentes que precisam ser debatidas de acordo com as mudanças e diversidades
religiosas que encontramos no contexto escolar.
INTRODUÇÃO
9
Doutoranda e Mestra em Ciências das Religiões na linha de pesquisa: Educação e Religião pela
Universidade Federal da Paraíba/ UFPB. Graduada em Pedagogia pela mesma instituição. Email:
<mirirodrigues2@gmail.com>
É nesse sentido que esse estudo se robora, por dar esse olhar de significância para
o currículo em prol ao combate de atos de proselitismo, negação do outro e intolerância
quando tratamos de questões de religiões presentes no campo educacional. esse estudo
faz abordagens bibliográficas com interlocuções com autores que dialogam com as
questões de currículo como, Silva (1999 - 2007); Sacristán (1995) entre outros
referenciais. Para as discussões do Ensino Religioso em que partimos das concepções de
Passos (2007); Soares (2015), entre outros autores.
As reflexões desse trabalho estão divididas em dois seguimentos nas quais
faremos primeiramente uma abordagem acerca da formação dos professores que lecionam
a disciplina Ensino Religioso, apontando questões relevantes que podem contribuir para
pensar na formação inicial e continuada dos mesmos. Em seguida entraremos nos debates
acerca do currículo escolar em uma perspectiva de buscar meios - caminhos em aspectos
metodológicos e pedagógicos que possam contribuir para um Ensino Religioso não
confessional, não prosélito e que promova o respeito à diversidade cultural religiosa.
Contudo, podemos afirmar que os sujeitos são efeitos dos discursos, que produz
identidades e diferenças. Desse modo, “[...] o currículo pode ser visto como um discurso
que, ao corporificar as narrativas particulares sobre o indivíduo e a sociedade, nos
constitui como sujeitos – e sujeitos também muito particulares” (SILVA, 2007, p.195).
Assim, historicamente, a escola por meio de seu currículo legitima as identidades
hegemônicas (ocidentais, religiões cristãs, brancas, etc.) que contribuem para posicionar
as não hegemônicas como inferiores: “as culturas ou vozes dos grupos sociais
minoritários e/ou marginalizados que não dispõem de estruturas importantes de poder
costumam ser silenciadas, quando não estereotipadas e deformadas, para anular suas
possibilidades de reação” (SANTOMÉ, 1998, p.161).
Nessa perspectiva, entendemos que o Ensino Religioso é um grande contribuidor
para a formação plena do educando, que visa a sua forma de observar e compreender o
mundo que o cerca. Essa é uma característica importante do Ensino Religioso que é o de
valorizar experiências e saberes dos/as educandos/as, potencializando a formação integral
do ser, para isso requer práticas pedagógicas e postura ética de profissionais que
direcionem suas metodologias, voltadas para a inclusão de componentes curriculares que
contemple as diversidades religiosas sem proselitismo. Conforme Junqueira e Oliveira
(2006, p. 46):
10
Usando a nomenclatura Ciências das Religiões devido ao curso de graduação na Universidade Federal
da Paraíba (UFPB) e esse estudo diz respeito ao contexto paraibano. Lembrando que a nomenclatura do
curso varia em outros Estados. Ver MIELE, Neide; Possebon, Fabricio. Ciências das religiões: proposta
pluralista na UFPB. Numem. Juiz de Fora, v. 15, p. 403-431.
Por falta da formação adequada, atualmente, nas escolas que temos, ainda sente-
se essa dificuldade em separar a convicção religiosa dos conteúdos a serem abordados no
Ensino Religioso. Difícil pensar nessa separação em nosso contexto social, uma vez que
se apresenta laico na constituição, porém ainda está em processo de transição, pois temos
ainda influências religiosas regendo nosso país. O objetivo do Ensino Religioso é quebrar
esses paradigmas, como podemos observar:
Diante disso, vimos que o Ensino Religioso, na teoria, não tem o seu modelo
curricular influenciado por nenhuma religião, mas infelizmente não é o que acontece nas
escolas. Para que haja uma transformação, é necessária uma formação inicial que seja
sólida e contínua para os professores, para que estejam sempre atualizados diante das
mudanças sociais. O Ensino religioso, nessa perspectiva, é importante e contribui para a
formação plena do aluno com o intuito de capacitar os professores, para que possam atuar
de forma que contemplem todas as manifestações religiosas por meio do conteúdo,
legitimando a autonomia do ensino religioso que abandonou seu caráter confessional.
Nesse sentido, é preciso considerar os saberes e construção de concepção de
religião que os profissionais dessa área devem ter, esse cerne de vivência ao longo da sua
história de vida, provocando uma reflexão sobre o contexto das relações sociais. E
possibilitar uma educação que abarque as dimensões e necessidades de uma sociedade,
no qual a laicidade faz parte do nosso cotidiano, entretendo a questão de um estado laico
para o Ensino Religioso é um grande desafio, devido às várias contradições encontradas
em um Brasil que se diz ser laico, mas tem resquícios de uma nação confessionalista.
Diante do exposto, a pesquisa a qual apresentamos aqui apesar de estar em
andamento podemos concluir a respeito os impactos desse nosso estudo, podemos elencar
que, devido às novas políticas educacionais como Plano Nacional de Educação, as
Diretrizes Curriculares Nacionais, e, contudo devido a retirada do Ensino Religioso
enquanto componente curricular na última versão da Base Nacional Comum Curricular
os cursos de graduações e os programas de pós–graduação devem voltar seu olhar para a
educação básica quando nos referimos ao Ensino Religioso.
Tal problemática justifica-se diante das escolas públicas aparentam não terem sido
configuradas para levar em consideração a diversidade cultural e religiosa, acreditamos
que podemos provocar uma discussão que leve os sujeitos da escola a compreender que
os processos de exclusão e desigualdades passam pelas modificações dos padrões gerais
de funcionamento do espaço educacional.
Nossa pretensão é, portanto, não se limitar e nem finalizar nesse estudo as
discussões do Ensino Religioso e o currículo escolar, apontamos alguns sinais de como
poderemos pensar melhor esse ensino em uma perspectiva de respeito à diversidade
cultural religiosa por meio do currículo escolar. Acreditamos, portanto, que é importante
esse ensino estar em constantes discussões no cenário político nacional e regional, pois
muito se tem a avançar tanto nas legislações e principalmente nas práticas teóricas,
metodológicas e pedagógicas que o envolve.
REFERÊNCIAS
PASSOS, João Décio. Ensino Religioso: construção de uma proposta. 1 ed. São Paulo:
Paulinas. 2007.
YOUNG, Michael. Para que servem as escolas?IN PEREIRA, Maria Zuleide da Costa.
Carvalho, Maria Eulina Pessoa de. PORTO, Rita de Cássia Calvalcante. (org)
Globalização, Interculturalidade e Currículo na cena escolar. São Paulo, Alínea,
2009, p.37-54.
A FORMAÇÃO DE DOCENTES AO ENSINO RELIGIOSO E A
INSEGURANÇA PEDAGÓGICA NO ENSINO CONFESSIONAL
RESUMO:
Um dos maiores desafios da educação é ensinar o aluno a conviver, ou viver com o outro,
aprender a ser tolerante, conhecer e respeitar as diferenças. Diante da insegurança pedagógica
provocada pela aprovação do ensino confessional no plenário do Supremo Tribunal Federal,
analisaremos criticamente a formação de professores para o ensino religioso nas escolas;
apresentando uma proposta de educação que promova e assegure o pleno exercício da
cidadania, que lhes proporcione uma convivência solidária e respeitosa com toda comunidade
escolar, onde a diversidade cultural se manifeste na pluralidade de identidades que
caracterizam os grupos e as sociedades. A metodologia aplicada será uma investigação
exploratória de caráter analítico qualitativo, por meio da pesquisa bibliográfica em livros e
sites.
ABSTRACT: One of the greatest challenges of education is to teach the student to live with,
or to live with the other, learn to be tolerant, know and respect the differences. In view of the
pedagogical insecurity caused by the adoption of denominational teaching in the plenary of
the Federal Supreme Court, we will critically analyze the teachers training for religious
teaching in schools; presenting a proposal of education that promotes and ensures the full
exercise of citizenship, which provides them with a solidary and respectful coexistence with
the entire school community, where cultural diversity manifests itself in the plurality of
identities that characterize groups and societies. The applied methodology will be an
exploratory investigation of qualitative analytical character though the bibliographical
research in books and websites.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho se propõe a uma reflexão sobre uma educação que gere
desenvolvimento de habilidades que assegurem a produtividade do cidadão para atuar
com valores que lhe proporcione uma convivência solidária na sociedade e como as
11
Graduada em Pedagogia (FAFI), pós-graduada em Psicopedagogia Institucional (URCAMP), pós-
graduada em Supervisão e Orientação Educacional (CINTEP), cursando especialização em Ciências das
Religiões, Diversidade e Ensino Religioso (IESP). andreiarsnunes@gmail.com
políticas educacionais podem contribuir para a solidariedade e a tolerância em toda a
comunidade escolar e grupos sociais, culturais, religiosos e étnicos, onde a diversidade
cultural se manifeste na pluralidade de identidades que caracterizem os grupos e as
sociedades que compõem a humanidade. Para tanto, como metodologia aplicada fazemos
uso da pesquisa bibliográfica, com consulta em livros, sites e resenhas; por tratar-se de
uma investigação exploratória e de caráter analítico qualitativo.
O ensino religioso exige que o professor dialogue com as diferenças, que saiba
conviver com as diferenças e que esteja aberto ao diálogo, respeitando a pluralidade
cultural presente nas escolas. É essencial que ocorra diálogo entre os sujeitos envolvidos
no processo educacional, escola, família, alunos, professores e outros profissionais da
educação.
Nas escolas brasileiras, espera-se um ensino religioso laico na diversidade cultural
religiosa. A escola procura ser lugar de promoção de diálogo e respeito, desenvolvendo
aprendizagens críticas dos conhecimentos espirituais da humanidade. Não ensinando
religião ou religiões, mas levando o aluno a comparar criticamente e interpretar os fatos,
também religiosos e seus contextos históricos. Religião não se ensina na escola, ensina-
se a refletir o fenômeno humano. Todos têm direito ao esclarecimento das crenças.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Em 1549, chegam ao Brasil seis jesuítas liderados por Manoel da Nóbrega trazidos
pelo governador geral Tomé de Souza. Funda-se, em Salvador, a primeira escola pública
brasileira, o colégio Companhia de Jesus. Inicialmente, a instituição era destinada aos
indígenas, mas os colonos reivindicaram a escola para seus filhos, passando a ser a escola
exclusiva para eles.
Os jesuítas são expulsos de Portugal em 1759, e a escola pública passa a ser
conduzida por outros setores da Igreja Católica. Com a primeira Constituição Federal em
1824 (Constituição Política do Império do Brazil), a religião do império continua sendo
a Católica Apostólica Romana.
A segunda fase da história do Brasil é marcada pela separação do Estado e
Religião. Em 1890, o presidente Manoel Deodoro da Fonseca consagra a plena liberdade
de cultos. E em 1891, fica estabelecido que todas as religiões podem praticar seus cultos
e suas crenças livremente, e que o ensino ministrado nas escolas públicas seria laico. De
acordo com Holmes (2015, p. 37),
A primeira Lei de Diretrizes e Bases (LDB 4024/61) propõe em seu artigo 97:
"O ensino religioso constitui disciplina dos horários das escolas oficiais, é de
matrícula facultativa, e será ministrado sem ônus para os poderes públicos, de
acordo com a confissão religiosa do aluno, manifestada por ele, se for capaz,
ou pelo seu representante legal ou responsável. § 1º A formação de classe para
o ensino religioso independe de número mínimo de alunos. § 2º O registro dos
professores de ensino religioso será realizado perante a autoridade religiosa
respectiva."
Sabe-se que cada escola tem identidade própria. Essa identidade é constituída
por uma trama de circunstancias em que se cruzam diferentes fatores. Cada
escola tem uma cultura própria permeada por valores, expectativas, costumes,
tradições, condições, historicamente construídos, a partir de contribuições
individuais e coletivas. No interior de cada escola, realidades econômicas,
sociais e características culturais estão presentes e lhe conferem uma
identidade absolutamente peculiar.
METODOLOGIA
Podemos respeitar a posição de cada religião, porém isso não quer dizer que
devamos concordar com os seus dogmas, mas tratá-las de maneira coerente
para que possamos compreendê-la e reconhecê-la dentro de suas diferenças e
daí a compreensão do outro a partir da tolerância, respeito e diálogo. A paz no
mundo só se construirá quando houver esse entendimento entre as pessoas e as
tradições religiosas, sendo essa uma busca do próprio ER.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
FILORAMO, Giovanni; PRANDI, Carlo. As Ciências das Religiões. São Paulo: Paulus,
1999.
RESUMO
Este trabalho se propõe a apresentar as experiências religiosas popular do Grupo dos
Bacamarteiros, situado na zona rural da cidade de Cachoeirinha, Agreste de Pernambuco.
O Batalhão 16, assim denominado o grupo, é uma expressão cultural que participa
animando os festejos juninos, as procissões religiosas e as celebrações dos padroeiros na
zona rural. Com base nos traços da religiosidade popular, analisaremos a questão do
processo formativo do grupo, isto é, sua origem, seus membros, suas tradições, que
englobam os traços característicos culturais e religiosos, tais como: as danças típicas, as
rezas, os cantos e as roupas, numa performance ritualística que expressa a sensibilidade
religiosa e a resistência cultural destes Bacamarteiros. Através dessas manifestações,
investigaremos como constroem uma identidade social organizada, que se reflete nos
próprios festejos, inserindo crianças, jovens, adultos e idosos de ambos os sexos. Suas
celebrações realizadas num estilo local e identitário, utilizando-se de cantos e rezas,
reverências e tiros ajudam na manutenção da experiência coletiva.
Esse movimento cultural está situado nos sítios Jucazinho e Jupi na zona rural de
Cachoeirinha – PE, a 06 km de distância da cidade. Acontecia nessas localidades,
12
Licenciado em Filosofia pelo INSAF – Instituto Salesiano de Filosofia em Recife; graduação em Teologia
pelo Instituto de Teologia de Caruaru – PE; mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências da
Religião pela Universidade Católica de Pernambuco.
13
Graduado em Ciências com Habilitação em Matemática – FAMASUL – Faculdade de Formação de
Professores da Mata Sul; Pós-Graduação em Matemática Comercial e Financeira – UFRPE – Universidade
Federal Rural de Pernambuco; mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Religião pela
Universidade Católica de Pernambuco.
principalmente, nas festas juninas de São João e São Pedro, os moradores se reuniam para
contar causos e comer iguarias de milhos colhidos nesses períodos, e por meio desses
fatos agradeciam as farturas dos celeiros e as bênçãos das chuvas que Deus lhes dava.
Havia poucas casas e situavam-se relativamente distantes da realidade atual desses
sítios. As chuvas eram mais intensas nesse período do ano. O acesso à vila de
Cachoeirinha requeria dificuldades de transportes. O contato com os meios de
comunicação era quase inexistente, restava-lhes a criatividade de produzirem alguns
artefatos capazes de suprir essas carências. A distração tornou-se uma necessidade
primária, devido às fadigas dos trabalhos exigidos pelas plantações e árduos serviços
braçais. Uma das principais iniciativas dos moradores foi incrementar nos festejos juninos
os tiros de pólvoras e as danças nos terreiros de algumas casas.
Os principais festejos, comumente, ocorriam na casa do casal André Avelino da
Rocha e Serafina Padilha Freitas, no sítio Jucazinho próximo ao açude municipal 14. A
casa era um ponto de referência social, visto não ter na localidade outro espaço para os
encontros comunitários. Na falta de um templo religioso, a residência do casal substituía
e assumia a importância do espaço sagrado, todavia, essa realidade era assumida apenas
nos meses de maio e junho por ocasião das noites dedicadas à Virgem Maria e aos santos,
Senhor São João e Senhor São Pedro.
Também havia celebrações juninas na comunidade rural de Jupi, sobretudo, na casa
de José Severino da Cruz (Seu Bader) e sua esposa Terezinha. Ambos residiam onde hoje
funciona o grupo escolar Baronesa do Amaraji – nessa escola, atualmente, estuda parte
dos filhos dos Bacamarteiros. Foram as relações entre esses dois casais que fortaleceram
e produziram o desenvolvimento dessa cultura nas duas comunidades. Favorecendo a
participação de muitas pessoas e criando um compromisso de continuidade, visto que, em
Cachoeirinha, fora uma produção originada pela população local, embora, depois venha
a ganhar novos aperfeiçoamentos e padronizando-se de forma mais organizacional.
14
Por ser uma construção feita por esse senhor acabou ficando conhecido com “Açude dos Andrés”. Hoje,
pertence ao município e abastece a população do sítio Jucazinho e outras localidades próximas. André
Avelino e seus filhos, José Quirino, João André, Damião Quirino, Manoel André, Delfim Quirino, Antônio
Quirino, Josefa Avelina, Felícia Avelina e Francisca Avelina, cuidaram do açude por duas gerações. Mas
em 1969, aos 84 anos de idade falece Joaquim Quirino da Rocha, neto de André Avelino, dando fim ao
ciclo de gerações que preservaram familiarmente o reservatório de água. Dado esse fato, na década de 1980,
os moradores solicitaram à Prefeitura de Municipal uma ampliação e reforma para um maior
aproveitamento das águas. As reivindicações foram atendidas, sobretudo, tendo em vista as necessidades
causadas pelas secas no agreste-meridional de Pernambuco.
Em meados do século XIX os vizinhos das redondezas se reuniam nas casas desses
casais para festejarem os santos juninos com alegria, devoção e fé. Alegre porque tinha
os inícios das primeiras colheitas feitas a partir do dia 19 de março, dia de São José,
esposo da Virgem Maria15. Fé porque acreditavam que essa fartura era graça de Deus em
suas vidas. Devotos aos santos festejados pela aproximação humana e afetiva com que os
santos católicos se revelavam na cotidianidade de suas realidades existenciais:
Diante desse contexto, a comunidade tem uma especial devoção a São José 16,
dando início ao ciclo das plantações das lavouras e protetor das famílias do campo,
sobretudo, porque cria a expectativa da proximidade das grandes festas juninas que os
Bacamarteiros mais celebram. Planta-se a esperança de um ano farto para as famílias
nordestinas. Esperam colher seus frutos da terra justamente no mês junino, período das
grandes festas preparadas com comidas típicas, danças, fogueiras, fogos e balões,
sobretudo, pelas reuniões familiares em torno das mesas cheias de iguarias de milho e
mandioca. Essa experiência de preparação das festas e da devoção dos santos fica clara
na fala da porta-bandeira do grupo:
15
Essas informações foram ditas pelo Jairo Calado membro responsável pela nova formação do grupo dos
Bacamarteiros.
16
Ressaltamos que a principal devoção aos santos católicos do grupo está direcionada a São João. No
estandarte dos Bacamarteiros é a figura desse que prevalece com maior vigor. A festa normalmente é
celebrada por grande parte dos nordestinos na véspera do dia 24 de junho, contudo, os atiradores optam
pelo dia da natividade de São João Batista. O grupo se reconhece como o santo, portador e anunciador de
Cristo nos dias atuais. Levam aos moradores à alegria da vinda do Cordeiro e anuncia a remissão dos
pecados e a alegria por serem perdoados e abençoados pelas farturas do campo.
chegavam a casa, madrinha e tio iam recebê-los na porteira. Eles entravam
cantando, atiravam, dançavam ao som da viola, do bumbo e do reco-reco,
almoçavam e à tardinha iam embora. Nós ficávamos com muita saudade, mas
à noite íamos todos para o cruzeiro onde era rezado o terço de São José (Maria
Carlinda da Silva).
2 – Os festejos
17
Segundo o testemunho de Damião Quirino da Rocha, os três primeiros bacamarteiros a aderirem a
brincadeira foram: José Pedro, João Ferreira Calado (João André) e Manoel Batista (Mané Ligeiro).
acesso com uma brasa que era tirada das fogueiras juninas18 com o intuito de provocar
um grande tiro, dizem ser tão forte, que chegava a apagar os candeeiros da casa e do
alpendre.
André Avelino possuía uma dessas armas de tiro artesanal, mas também, uma de
cano grosso e curto, a qual ele nomeou de “nossa menina”. Afirma-se que esse artefato
bélico de cano grosso e curto foi utilizado na Guerra do Paraguai (1864-1870) em meados
do século XIX19. Com efeito, de maneira desconhecida por seus parentes, esta arma veio
para nas mãos dele. Tal posse da arma gerou o resultado do que hoje se denomina
Bacamarteiros do Batalhão XVI. A partir desse único objeto e das experiências praticadas
com as ronqueiras e com as de cano solto começou um processo de aquisição de armas
mais sofisticadas, possibilitando mais adesão e visibilidade das brincadeiras por parte dos
indivíduos.
Entre os relatos dos Bacamarteiros destacam-se as condições sociais e econômicas
das pessoas que compunham as comunidades de Jupi e Salgadinho. Dizem serem todos
cidadãos pacatos, trabalhadores agricultores, pecuaristas e artesãos. Produziam, em
especial, botas, gibão e outros utensílios de montarias, como selas e arreios. As mulheres
se ocupavam do trabalho doméstico e da produção de rendas. Desse modo, contribuíram
de forma direta para a manutenção da economia e do desenvolvimento cultural da cidade
de Cachoeirinha. Esse jeito de ser possibilitou o auto-sustento da comunidade como ainda
na preservação futura do conhecimento comunitário e a salvaguardar o artesanato local
do coro e do aço.
Esses festejos por volta do ano de 1942 foram organizando o primeiro grupo de
Bacamarteiros. Até então o modo com participavam eram muito aleatório, visto que se
reuniam apenas nas festas juninas ou no mês de maio. Por volta da década de 40 tentam
sistematizar a maneira como deveria manter a unidade e a continuidade dos atiradores ao
18
O fogo para acender essas armas só podia ser tirado das fogueiras juninas porque as mesmas eram
dedicadas ao santo do dia. Proibia-se usar fósforos ou outros utensílios que produzissem calor para a
combustão. Pois na compreensão desses indivíduos o fogo era santificado pelo santo devocional, o qual
exigia que todas as oferendas a ele apresentadas deviam ser purificadas. Mais ainda, os tiros não eram para
matar ou assustar as pessoas, mas para celebrarem – semelhantes a gritos humanos que querem despertar
as divindades, chamando a atenção para as necessidades humanas – a presença do divino no meio do povo.
19
Existem inúmeras especulações em torno da origem da existência dos Bacamarteiros. Impõem-se com
mais relevância, a versão de que a brincadeira teve início com as comemorações dos que voltaram da Guerra
do Paraguai. Com relação à arma a hipótese mais comum é a versão original que vem do Clavinote holandês
do séc. XVII ou na Granadeira do Sistema Mineé francês, do meado do século XIX. A arma é citada na
obra Os Sertões, por Euclides da Cunha, como parte do arsenal bélico dos “fanáticos” na histórica e altiva
Canudos do beato Antônio Conselheiro. Pesquisa realizada no dia 12/04/2011.
www.bacamarteirosdepernambuco.blogspot.com.
longo de todo o ano, afim de, permanecer a tradição nas próximas gerações. Este
movimento individual e familiar poder ser compreendido como sujeitos sociais que se
situam numa:
Dado esses fatos, as observações apontadas nesses trabalhos servem para nos
ajudar a perceber que há uma identidade cultural resiliente nas camadas sociais
desfavorecidas na sociedade contemporânea. Esse fato vem historicamente desde a
colonização do Brasil. Os negros, índios foram obrigados a silenciar suas crenças e
culturas a mando de uma compreensão eurocêntrica da realidade humana. A qual se serviu
do abuso do poder para impor seu modelo de sociedade, com efeito, tal imposição
desembocou-se numa multiculturalidade, porque teve suas bases sustentadas pelas
expressões de outros povos, possibilitando uma pluralidade cultural na formação da
sociedade brasileira.
A partir das histórias dos Bacamarteiros de Cachoeirinha, descobrimos que no
grupo existe uma estrutura organizacional construída internamente que favorece a
identidade social de cada membro. No contexto em que se encontram os componentes,
eles não fazem parte de uma massa social, pelo contrário, em suas expressões culturais e
religiosas tornam-se reconhecidas pelo nome e pela tradição familiar que pertencem.
BIBLIOGRAFIA
ELIADE, Micea. O Sagrado e o Profano: a essência das religiões. São Paulo: Martins
Fontes, 1996.
FREITAS, Sônia Maria de. História Oral: possibilidades e procedimentos. São Paulo:
Humanitas, 2002.
GONZÁLES, Ramiro. Piedade Popular e Liturgia. Trad. G. Figueiredo de Moraes. São
Paulo: Loyola, 2007.
LADARIA, Luis F. O Deus Vivo e Verdadeiro. Trad. Paulo Gaspar de Mendes, SJ. São
Paulo: Vozes, 2005.
MATOS, Henrique Cristiano José. Nossa História: 500 anos de presença da Igreja
Católica no Brasil, Tomo I: Período Colonial. São Paulo, Paulinas, 2006.
QUEIRUGA, André Torres. O Diálogo das Religiões. São Paulo: Paulus, 1997.
VI, Paulo. Evangelii Nuntiandi. Edição 19. São Paulo: Paulinas, 2006.
www.bacamarteirosdepernambuco.blogspot.com (acessado em 12/04/2011).
A LEI 11.645/08 NAS ARTES E NA EDUCAÇÃO:
MANIFESTAÇÕES CULTURAIS INDÍGENAS E AFRO-
BRASILEIRAS
Clarissa Suzuki
(ECA/USP - clarissasuzuki@usp.br)20
Maria Pinheiro
(ECA/USP - maria.pinheiro@usp.br)21
RESUMO
INTRODUÇÃO
Decorridos 15 anos da Lei 10.639/03, e sua revisão legal após 10 anos com a
publicação da 11.645/08, acumulamos muitas experiências práticas e teóricas em
decorrência da sua implementação que visam o ensino da história e das culturas afro-
brasileiras e indígenas em todos os níveis de ensino da Educação Básica. Mesmo sabendo
O GRUPO DE TRABALHO