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Projeto Gráfico de Capa e Miolo


Jéssica Macedo
Preparação de Texto
Aline Damaceno
Revisão
Ana Roen

Esta é uma obra de ficção. Nomes de pessoas, acontecimentos, e locais


que existam ou que tenham verdadeiramente existido em algum período da
história foram usados para ambientar o enredo. Qualquer semelhança com a
realidade terá sido mera coincidência.
Para a minha querida leitora Rosi, que
semelhança com a Rosi do livro é apenas no nome
rsrsrs.
Sumário
Sumário
Sinopse
Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 19
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Capítulo 29
Capítulo 30
Capítulo 31
Capítulo 32
Capítulo 33
Capítulo 34
Capítulo 35
Capítulo 36
Capítulo 37
Capítulo 38
Capítulo 39
Capítulo 40
Capítulo 41
Capítulo 42
Capítulo 43
Capítulo 44
Capítulo 45
Capítulo 46
Capítulo 47
Capítulo 48
Capítulo 49
Capítulo 50
Capítulo 51
Capítulo 52
Capítulo 54
Capítulo 55
Capítulo 56
Capítulo 57
Capítulo 58
Sinopse
Gutemberg Toledo, Guto, sempre se destacou pelo talento com os
números, e transformou um mercadinho familiar em uma rede de
supermercados espalhada por todo o país. Astuto, determinado, e um
empresário incrível, ele conquistou tudo, menos o que mais ansiava: uma
família. Ao se divorciar, esse sonho parecia estar mais distante do que nunca.

Sem laços familiares fortes, tudo o que ele tem de mais importante é a
amizade de décadas com o sócio. O que ele não esperava era que a filha do
seu melhor amigo, dezoito anos mais jovem, nutrisse sentimentos por ele, um
amor proibido. ⠀
Guto vai lutar com todas as forças para não ceder à tentação. Dentre
todas as mulheres do mundo, Rosi deveria ser intocável; não era permitida
para ele. Porém, às vezes é difícil escapar de uma rasteira do desejo. ⠀
Prólogo
Dois anos antes...

Apesar de sempre ter sido muito popular, nunca fui de fazer festas
enormes e, depois de toda a pompa do meu aniversário de quinze anos, optei
por algo mais familiar ao completar dezesseis. Meus pais e amigos haviam se
reunido ao redor da piscina na minha casa para um churrasco. Confesso que
festas em roupas de banho ao invés das de gala tinham sua vantagem. Eu
jamais poderia ver o abdômen do Guto se ele estivesse usando um terno.

Virei de lado, me deitando o mais perto da beirada da espreguiçadeira


de madeira onde eu estava, para que pudesse observá-lo melhor. Guto tirou a
camiseta cavada e ficou apenas de bermuda. À medida que ele movia os
braços, os músculos do seu abdômen se ressaltavam. Dava para lavar as
minhas calcinhas naquele tanquinho. Ele mergulhou na piscina com um
movimento gracioso, que quase não espalhou água. Eu suspirei e senti o meu
coração bater mais devagar até que ele emergisse da água, balançando o
cabelo curto e preto.

Estava tão distraída olhando para ele que não vi de onde veio a onda
que me atingiu. Saltei da espreguiçadeira, enquanto chacoalhava minhas
mãos e tentava tirar a água do rosto.

— Acorda, bela adormecida! — gritou Daniel da piscina, e percebi que


ele havia pulado na água de propósito para me atingir com aquele tsunami,
logo no momento em que eu estava mais distraída.

— Filho de uma...
— Olha lá o que vai dizer. — Meu amigo estendeu as mãos e jogou
mais água em mim, impedindo-me de xingar a mãe dele.

Tirei a minha canga e entrei na piscina, descendo os degraus


vagarosamente até que o meu corpo se acostumasse com a água.

— Você sabe que se entrar na água de uma vez seu corpo se acostuma
com a temperatura bem mais rápido, não é?

Movi a minha cabeça e minhas bochechas coraram ao notar que o Guto


estava falando comigo, com a mão estendida para que eu a segurasse.

— É, eu sei, mas mesmo assim ainda tenho um pouco de medo.

— Vem, não precisa ter medo. — Ele balançou a mão, incentivando-


me a segurá-la.

— Obrigada. — Entrelacei os meus dedos nos dele e Guto me puxou


de uma vez para a piscina.

Ele me mergulhou, mas até os ombros, sem afundar a minha cabeça na


água para que não me sufocasse.

— Melhor agora?

Balancei a cabeça em afirmativa e ele sorriu, monstrando os dentes


impecavelmente brancos envoltos pela barba por fazer.

— Obrigada.

— Não por isso. — Deu de ombros. — Você sabe que estou sempre
aqui para te ajudar. Nossa! Dezesseis anos, Rosi. O tempo passou tão rápido;
parece que foi ontem que você começou a andar e a correr pela casa toda,
enlouquecendo a gente.

— É... — Meu sorriso de alegria se transformou em um amarelo sem


graça quando ele me recordou de que havia me visto nascer e crescer.

— Guto, quero ir embora. — Uma mulher apareceu na beirada da


piscina com uma expressão de poucos amigos.

— Agora, Live?

— Sim, por favor.

— Tá bom. — Ele subiu pela escada e se colocou ao lado da esposa,


que entregou para ele uma toalha seca. — Se cuida, Rosi. Feliz aniversário!

— Obrigada. — Acenei para ele e o observei sumir de vista.

— Eu deveria ter trazido um babador de presente e não um pijama.

Virei a cabeça e percebi que o meu melhor amigo estava ao meu lado,
atento a cada uma das minhas reações ante a presença do Guto.

— Acho que já estamos nadando na sua baba.

— Ah, vai a merda! — Cruzei os braços e encarei o Dani com uma


expressão de poucos amigos. Ele poderia ter o cabelo loiro cacheado e uma
expressão de anjo, mas não havia nada de angelical nele.

— Ele é um gato, mas quer que eu cite a lista interminável de


empecilhos para que você tenha alguma coisa com esse homem? Ele é
casado, é o melhor amigo do seu pai, tem mais do que o dobro da sua idade...

— Tá bom! Tá bom! — Joguei água gelada no rosto dele, descontando


o que havia feito comigo. — Você tem um amor platônico pelo Chris Evans,
me deixa sonhar com o melhor amigo do meu pai.

— Você sabe que não é a mesma coisa. — Daniel deu de ombros.

— Nenhum dos dois é modelo de homens que podemos ter — disse


para o Dani, e, no fundo, era nisso que eu acreditava. Mais velho, casado, e
melhor amigo do meu pai desde antes de eu nascer, Gutemberg Toledo era
um homem que eu nunca iria ter.
Capítulo 1

Dias atuais...

— Você precisa tirar! — Elevei o meu tom de voz e segurei a Olivia


pelo pulso, fazendo com que ela me encarasse.

— Eu não vou! — Ela puxou o braço, desvencilhando-se do meu


agarre, e as lágrimas rolaram pelos seus olhos, pesadas e incessantes.

Vê-la chorando daquele jeito partia o meu coração, mas não podia mais
adiar aquela conversa. O tempo estava passando e logo seria tarde demais.

— Você precisa tirar ele, não podemos continuar assim.

— Eu não vou tirar, sabe o quanto isso é importante para mim. — Ela
deu alguns passos cambaleantes para trás, mas foi parada pela parede do
corredor diante do nosso quarto.

— E a minha opinião não conta?

— Está dentro de mim, sou eu quem decido se vou manter ou não.

— Eu sou o seu marido, porra! — Mordi a língua para evitar o grito,


mas já era tarde demais, toda a minha fúria já havia sido externada. Senti o
gosto do sangue inundar a minha boca, mas ele não era mais amargo do que a
tristeza.

— Então, deveria me entender e respeitar a minha escolha.

Caí de joelhos. Me sentia um derrotado; meu coração estava


esmigalhado e já era incapaz de conter a vontade de chorar e gritar.

— Pelo nosso casamento, por favor. — Segurei a cintura dela,


apoiando a minha cabeça no seu ventre. Era humilhante, mas eu me sentia
desesperado.

— Eu não vou tirar o meu DIU, Guto. — Ela me empurrou pelos


ombros e eu bati com as costas no corredor.

— Eu quero ser pai, Olivia.

— Mas eu não quero ser mãe. — Ela levantou a cabeça e me encarou


com um ar de desdém.

— Quando nós nos casamos, você queria; cinco anos depois, estamos
aqui, tendo essa discussão. — Me levantei, enxugando as lágrimas com as
costas das minhas mãos.

— Pois é, as minhas prioridades mudaram. Eu não quero que o meu


corpo deforme, nem pretendo perder alguns dos preciosos anos da minha vida
cuidando de uma criança.

— Não entende que não vai perder nada?

— Quem não está entendendo aqui é você! Se não é capaz de entender


o que eu quero e aceitar isso, talvez nós dois não funcionemos mais juntos.

— O que está dizendo? — Minha garganta se fechou e eu me senti


sufocar, ainda que não houvesse nada físico envolvendo o meu pescoço.

— Eu quero o divórcio.

— Nós poderíamos construir uma família juntos, Olivia.


— Eu não acho que precisamos de filhos para ser completos. Não é a
primeira vez que temos essa discussão e eu estou cansada. Não quero filhos e
não vai ser brigando comigo que você irá me convencer. Estou farta e não
quero mais isso.

Meu coração estava em frangalhos, meus olhos ardiam. A tristeza e a


raiva obscureciam muita coisa, mas eu tentava buscar uma razão por debaixo
de tudo aquilo. Odiava pensar em um divórcio, porém, poderia ser o
caminho. Fazia mais de um ano que Olivia e eu vivíamos brigando, era como
se o nosso amor tivesse evaporado, ou sequer tivesse existido.

— Tem certeza de que quer o divórcio? — Encarei-a com um olhar


firme e a postura ereta.

— Sim.

— Tudo bem. — Enfiei as mãos dentro dos bolsos e deixei a minha


cabeça de pé. Poderia estar me sentindo um derrotado, mas precisava admitir
que Olivia e eu queríamos coisas diferentes para o futuro. Doía, doía muito,
mas eu já havia aprendido nos negócios que se ambos os lados não
trabalhassem juntos no mesmo sentido, não importava o quanto um se
esforçasse, nunca iria dar certo.

Voltei para dentro do nosso quarto, fui até o meu closet, peguei uma
mala pequena e comecei a jogar algumas roupas lá dentro.

— Para onde você está indo?

— Embora, acho que não tem mais motivos para vivermos sob o
mesmo teto. Amanhã, vou contatar os advogados e pedir que providenciem
os papéis do nosso divórcio.
— Rápido assim? — Ela arregalou os olhos castanhos, surpresa com a
minha fala.

— Estou cansado de lutar contra a maré, Olivia. Quando trocamos


votos no altar, eu jurei para mim mesmo que ficaríamos juntos pelo restante
da minha vida, mas é evidente que temos objetivos diferentes, algo que não
percebi há cinco anos atrás quando pedi você em casamento.

— Está certo.

— Ao menos em algo conseguimos concordar, isso já é um avanço. —


Joguei algumas cuecas limpas dentro da mala e a fechei.

— E o restante das suas coisas? — Ela apontou para o closet.

— Eu busco depois. — Puxei a mala e saí do quarto, descendo a escada


e indo até a garagem onde o meu carro estava estacionado.

Abri o porta-malas e joguei a mala lá dentro. Assumi o volante e liguei


o rádio, colocando uma música em volume bem alto, com uma batida de rock
que deixava a minha cabeça doendo, mas eu queria afastar de mim todos
aqueles pensamentos que estavam me causando dor. Eu tinha decidido que
acabar com um casamento de cinco anos era a melhor solução, mas mudanças
não vinham sem sofrimento.
Capítulo 2

— Isso é tão injusto! — Cruzei os braços ao bater as costas no encosto


do banco do carona do carro do Daniel. — É a primeira vez que vamos
sozinhos a uma boate e você estragou o nosso programa que ainda nem havia
começado. — Fiz bico como se fosse uma criança irritada.

— É justamente por ser a primeira vez que não podia deixar você
extrapolar. Vai que fica tonta? Como vou explicar para o seu Ricardo que a
filha dele deu pt e eu tive que levá-la para o hospital?

— Para com isso. — Virei de lado e coloquei uma mão na cintura para
observá-lo melhor enquanto o meu amigo dava partida no carro. — Sabe que
não sou de beber assim. Além disso, eu ainda nem tenho carteira de
habilitação, então você é quem iria dirigir. Não teria problema nenhum eu
tomar alguns drinks.

— Viu? O problema está aí. Se você já tivesse habilitação, eu poderia


me divertir um pouco mais e revezaríamos na direção.

— Se o problema fosse esse, podíamos ter deixado seu carro na minha


casa e viríamos de aplicativo, assim os dois poderiam beber. Porém, não tem
nada a ver comigo que eu sei; você ficou superestranho quando aquela
mulher entrou na boate. Quem era ela? Não sabia que estava tendo casos
héteros com mulheres mais velhas.

— Você a viu? — Daniel arregalou os olhos e colocou as mãos sobre o


painel do carro quando paramos em um sinal vermelho.
Apenas balancei a cabeça em afirmativa, esperando que ele continuasse
a falar.

— Achei que tivesse sido coisa da minha cabeça. Assombração, sei lá.

— Quem era a mulher? — Tombei o meu corpo na direção do dele,


sem qualquer preocupação de esconder a minha curiosidade. Daniel e eu
éramos melhores amigos e contávamos tudo um para o outro, ao menos na
teoria.

— Era uma das clientes do salão da minha mãe.

— E daí? — Dei de ombros, não entendendo o motivo do desespero


dele.

— Sabe como esse povo é fofoqueiro em salão. Fiquei com medo de


que ela visse alguma coisa e acabasse contando para a minha mãe.

— Contar o quê?

Ele fechou a cara e eu entendi. A família do Dani não sabia da


predileção dele por encontros com caras; na verdade, eu era a única pessoa
para quem ele havia admitido que era gay. Às vezes, eu achava que ele
precisava enfrentar a família, dizer do que realmente gostava, e que isso não
mudava em nada o que ele era, porém, Dani continuava sem coragem de
admitir.

Eu não poderia julgá-lo; nem todos os pais eram tão legais quanto os
meus. Eles sempre foram muito abertos comigo, conversávamos sobre tudo,
ou quase tudo, pois nunca admiti para o meu pai a paixão secreta que eu
nutria pelo melhor amigo dele.
— Vai entrar? — Abri o cinto quando o Daniel estacionou na entrada
da minha casa, que ficava em um restrito condomínio fechado.

— Hoje não, gata. A gente se vê amanhã na universidade?

— Se eu tiver tempo de ir no prédio de Direito. — Dei de ombros e ele


fez bico para mim.

— Você vai conseguir. — Ele puxou a porta e a fechou antes de ir


embora.

Daniel e eu havíamos passado no concorrido vestibular da UNICAMP.


Ele estava cursando Direito e eu Publicidade; na verdade, mal havíamos
começado, estávamos na primeira semana de aula, e eu não conseguia conter
a minha empolgação. Finalmente na faculdade, eu não era mais a menina que
todos teimavam em dizer que eu era.

Ajeitei a alça da minha bolsa e passei pelo portão, seguindo até a


enorme porta da sala, que ficava após um belo e muito bem cuidado jardim.
O jardim era a maior paixão da minha mãe e sentia que ela dedicava cada
segundo do seu precioso tempo livre para cuidar dele.

Assobiando, joguei a chave dentro da bolsa ao passar pela porta da sala


e trancá-la atrás de mim. Estava prestes a subir a escada e ir para o meu
quarto, quando ouvi uma voz que fez o meu coração parar.

— Ah, cara, eu entreguei os pontos. — A voz do Guto era firme, mas


parecia carregada de tristeza. — Estou cansado de nadar e morrer na praia.

— Como assim, irmão? — Meu pai também parecia tenso. O tom de


voz de ambos me deixou muito preocupada.
Papai e o Guto tinham negócios juntos, uma grande rede de
supermercados com filiais por todo o país. A tensão deles me fez pensar que
os negócios poderiam estar sendo ameaçados. Eu não entendia nada sobre o
funcionamento de supermercados, apenas sabia que todo o nosso padrão de
vida dependia deles e pensar em uma possível falência me deixava tensa,
embora, felizmente, eu estivesse cursando uma faculdade pública.

Silenciosamente, caminhei para mais perto e me apoiei no batente da


porta da sala de visitas, num ângulo onde meu pai e o Guto não poderiam me
ver. O semblante do meu pai era tenso, mas não aquele tenso temos um
problema, apenas atencioso. Já o Guto, parecia desolado.

— Vocês dois conversaram?

— Tem mais de um ano que eu tento conversar, mas acabamos sempre


brigando muito. A única vez que entramos em consenso sobre alguma coisa
foi hoje, a respeito do divórcio. A verdade, Ricardo, é que nós dois queremos
coisas diferentes e nenhum de nós está disposto a ceder.

— Mas, você não a ama mais?

— Honestamente, eu não sei. Porém, saber que não vou mais ter que
discutir isso com ela, me alivia.

— Então, vai mesmo se divorciar?

— Vou. Não aguento mais isso. Não estamos na mesma sintonia e não
dá mais para ficarmos juntos.

— Cara, sabe que eu sou seu amigo e que estou aqui para apoiar você
no que precisar. — Meu pai esticou a mão e afagou o ombro do Guto, que
abriu um meio sorriso, contente com o carinho do melhor amigo.
— Muito obrigado, Ricardo.

— Disponha. Vai continuar em casa até o divórcio sair?

— Não! Peguei umas coisas e joguei numa mala, que está no carro. Ia
procurar um hotel para passar alguns dias até decidirmos como a nossa
situação vai ficar. Estava saindo do condomínio quando passei aqui na porta e
percebi que precisava de um ombro amigo. Desculpa aparecer à noite, no
meio de uma quinta-feira.

— Relaxa, amigos são para isso. — Meu pai sorriu e o Guto sorriu de
volta.

— Obrigado! É muito bom saber que posso contar com você em um


momento tão difícil.

— Não por isso. — Meu pai se levantou e deu um abraço apertado no


Guto. — Pega lá as suas coisas e deixa o seu carro na minha garagem. Você
pode ficar em um dos meus quartos de hóspedes pelo tempo que precisar.

— Não tem que se preocupar.

— Somos amigos desde criança, minhas portas vão sempre estar


abertas para você.

— Obrigado demais, irmão.

Fiquei observando os dois se abraçarem enquanto me equilibrava para


ver do melhor ângulo possível sem delatar a minha presença.

— Espionando seu pai? Que coisa feia, Rosimeire!

Tomei um susto enorme e dei um salto, colocando as mãos sobre o


peito, na tentativa de segurar o coração que batia acelerado.

— Mãe? — Abri um sorriso amarelo e ela balançou a cabeça em


negativa. — É que eu vi o Guto aqui a essa hora e fiquei curiosa.

— Ele está com problemas pessoais e muito chateado. Não é para ficar
espionando o coitado.

— Desculpa, mãe. Foi mais forte que eu.

Ela cruzou os braços e continuou me encarando com uma expressão


fechada.

— Estou indo para o meu quarto.

— Ótimo!

— Boa noite. — Beijei-a na bochecha e subi a escada.

A vontade de voltar e continuar ouvindo a conversa era maior do que


eu, mas precisei lutar contra isso para não tomar uma bronca da minha mãe,
ou pior, que o Guto soubesse que eu o estava espionando. Porém, não
consegui dormir pensando no que estava acontecendo. Se tinha ouvido bem,
o Guto iria se divorciar, o casamento dele tinha acabado. Essa notícia deveria
me deixar feliz, mas o fato de ele ser um homem casado era apenas um dos
infindáveis motivos pelos quais ele nunca seria um homem para mim.
Capítulo 3

Acordei com o despertador do meu celular tocando e vasculhei por


debaixo do travesseiro buscando o aparelho para que eu pudesse desligá-lo.
Olhei no visor e vi que estava marcando seis da manhã. Respirei fundo e
deixei-o no móvel de cabeceira ao lado da cama. Sentei e observei o teto. O
tom pastel das paredes e o branco do teto se divergiam muito do vermelho e
cinza que Olivia havia escolhido para a decoração da nossa suíte. Porém,
aquele não era o quarto que eu havia dividido por cinco anos com a minha
esposa, era um quarto de hóspedes na casa do meu melhor amigo.

Ricardo e eu morávamos no mesmo condomínio fechado e, pela


primeira vez, me questionei se aquela proximidade era tão boa assim, pois, no
fundo, sabia que a Olivia iria querer a casa. Eu não estava disposto a brigar e
daria para ela.

Levantei da cama e peguei roupas limpas, uma escova de dente, lâmina


e creme de barbear. Estava extremamente chateado, mas precisava trabalhar;
tinha uma reunião importante com alguns possíveis fornecedores de queijo
para os meus supermercados e ainda precisava discutir com o Ricardo a
implantação da nossa marca própria.

Ricardo e eu havíamos nascido em um bairro pobre de Campinas. Ele


tinha quatro anos a mais do que eu, mas brincávamos juntos de bola na rua.
Eram outros tempos. Poderia estar errado, porém, achava que na minha
infância as ruas pareciam ser mais seguras.

Os pais do Ricardo tinham uma mercearia que ia de mal a pior, nem


rendia o suficiente para pagarem as contas. Eu sempre fui muito bom em
administração, e fazia uns trocados que ganhava com a turma render como
nunca. Eu precisava de um emprego e eles de alguém para trabalhar no caixa
durante a noite. Logo, o garoto curioso assumiu a administração do local e
fez as contas irem do vermelho ao azul em pouco tempo. Quando eles
decidiram se aposentar e deram o negócio para o Ricardo, meu amigo me
propôs uma sociedade e, vinte anos depois, tínhamos uma rede nacional de
supermercados e não precisávamos mais contar moedas para colocar gasolina
no carro.

Ricardo e Margarida namoravam desde os tempos da escola e se


casaram quando ela ficou grávida da Rosimeire. Já eu, havia conhecido a
Olivia em uma feira de negócios; ela era representante de uma empresa de
laticínios, que havia me convencido não apenas a comercializar os produtos
que vendia na minha rede, mas colocar um anel no seu dedo. De garoto
pobre, que mal tinha o que comer, a empresário milionário, casado e feliz. Ou
nem tanto... No fundo, havia escolhido a Olivia pela possibilidade de ter uma
família. Não gostava de admitir, nem para mim mesmo, mas sentia um pouco
de inveja da vida do Ricardo. Eu poderia ser melhor com números, mas ele
sempre foi o mais sociável; tinha fechado acordos que, sozinho, talvez eu
nunca tivesse conseguido. As pessoas amavam estar perto dele, tinha uma
aura acolhedora. Era admirável a sua felicidade. Tinha uma esposa que estava
com ele desde os tempos das vacas magras e filhos. Talvez, ser feliz daquele
jeito não fosse para mim e a minha vocação fosse ficar atrás do computador e
ao lado da calculadora, garantindo que o dinheiro que tínhamos se
multiplicasse.

Peguei as minhas coisas e procurei por um banheiro, e descobri que o


quarto de hóspedes onde eu estava não era suíte. Saí pelo corredor à procura
do banheiro social.

Estava distraído e só percebi que algo, ou alguém, havia se chocado


contra o meu peito quando olhei para baixo.

— Oi, Rosi! Desculpa, eu não te vi.

— Oi, Guto. — Ela levantou a cabeça e me encarou. Seus olhos


castanhos estavam afunilados e ela colocou uma mecha do cabelo curto atrás
da orelha. — Você está aqui?

— Estou. Vou ficar aqui por um tempo até resolver uns assuntos.

— Ah! — Ela desviou o olhar. Percebi que estava muito envergonhada,


mas eu não sabia qual era o motivo.

Reparei bem nela. A menininha que tinha visto nascer, quando eu tinha
dezoito anos, e segurara em meus braços, já não era mais tão menininha
assim. Ela tinha feito dezoito anos na semana passada e agora tinha
literalmente a metade da minha idade. Havia comemorado em uma boate com
os amigos e já tinha começado a faculdade. O tempo estava passando e eu
sentia que, de alguma forma, estava ficando para trás.

— Arrumando-se para ir à escola? — puxei assunto, na esperança que


o clima pesado que havia recaído sobre nós dois se dissipasse.

— É, para faculdade. — Torceu os lábios, como se tivesse ficado


descontente comigo falando sobre escola.

— Claro. Está fazendo qual curso mesmo?

— Publicidade e Propaganda.
— Ah, é isso mesmo.

— Você quer usar o banheiro? — Ela deu um passo para o lado e


apontou para a porta no fim do corredor.

— Sim, quero. Obrigado.

— Acho que você vai ter que esperar, porque o meu irmão está lá. Um
cano trincou no banheiro dele e o pedreiro vem arrumar hoje.

— Ah, tudo bem. Eu vou esperar. — Abracei minhas roupas e fiquei


olhando para a porta fechada no fim do corredor. Eu já tive que dividir o
banheiro com três irmãos e meus pais antes, poderia fazer isso novamente por
uma semana ou um pouco mais, até que eu decidisse onde iria morar.

— Você pode usar o meu — sugeriu Rosi, fazendo com que eu


voltasse a olhar para ela.

— Não vai usar?

— Já me arrumei. — Deu de ombros.

— Acha que o seu irmão vai demorar?

— Pode até não demorar, mas eu não asseguro que o banheiro vai estar
respirável quando ele terminar. — Ela fez uma careta e eu ri.

— Bom, então, se eu puder usar o seu, agradeço.

— Meu quarto é aquele. — Apontou para uma porta à minha esquerda.

— Obrigado, Rosi. — Passei por ela e segui para o seu quarto.

Fazia anos que eu não entrava no quarto da Rosimeire e confesso que


me surpreendi com o que vi. No lugar da estante de brinquedos, havia uma
estante de livros, que ocupava toda uma parede do quarto. A casa de bonecas
deu lugar a uma escrivaninha com um notebook. Ao menos ela ainda tinha a
televisão com o videogame. Porém, toda a decoração do quarto não era mais
de uma menininha. Parei de ficar reparando e segui para o banheiro. Deixei
as minhas coisas em um canto da bancada, num pequeno espaço que não
estava preenchido de produtos de beleza.

Tirei a minha roupa e abri o box, deparando-me com uma calcinha


pendurada no registro. Eu a peguei para colocar do lado de fora.
Definitivamente não era a calcinha de uma menina. Era preta, fio dental, com
um laço na parte de trás. A parte da frente era feita de renda e me parecia
transparente.

Eu a coloquei na pia quando a minha mente se encheu de imagens


fantasiosas da Rosi usando uma calcinha daquela. Fiz de tudo para afastar
aqueles pensamentos e consegui quando a água fria me atingiu. Rosi era só
uma menina e a filha do meu melhor amigo. Não poderia me permitir pensar
naquele tipo de coisa.

Tomei banho, fiz a minha barba, e saí do banheiro dela o mais rápido
possível. Eu já estava vivendo uma situação complicada o suficiente, não
precisava complicar ainda mais.
Capítulo 4

Tentei agir normalmente enquanto processava o fato de o Guto estar


morando sob o mesmo teto que eu. Era um sonho e ao mesmo tempo me
fazia congelar, porque eu não sabia o que fazer. Ele estava se divorciando e
estava ao meu alcance, será que era um sinal de que ter aquele homem não
era assim uma impossibilidade?

— Para de moscar e sai da minha frente.

Eu me virei e vi o meu irmão vindo na minha direção. Cerrei os dentes,


mas ele não pareceu se intimidar com a minha expressão, apenas passou por
mim e seguiu o seu caminho para a sala de jantar onde o nosso café-da-
manhã estava sendo servido pela Janaína.

— Aborrecente. — Mostrei a língua para ele.

— Agora que entrou para a faculdade, ela está se achando. — Ele deu
de ombros antes de sumir pela porta da sala.

Continuei pelo mesmo caminho que ele até chegar perto da mesa onde
os meus pais já estavam sentados. Parei ao lado deles e dei um beijo na
bochecha de cada um antes de puxar uma cadeira e sentar-me junto a mesa
diante de um belo bolo de cenoura com cobertura de chocolate. A minha
dieta não iria gostar nem um pouco, mas eu não ia resistir a comer um
pedacinho.

— Filha, não demore para comer. Vou te deixar na faculdade antes de


ir para o consultório. — Minha mãe limpou a boca com um guardanapo e o
colocou no pratinho diante de si.

— Tá! — Puxei uma torrada para o meu prato e estiquei o braço para
pegar o pote de geleia de morango que estava na frente do meu irmão. —
Pai?

— O que foi? — Ele levantou os olhos do prato de ovos mexidos e


olhou para mim.

— Estava pensando sobre aquele carro que você disse que me daria
quando eu passasse na faculdade. Não que eu não goste da carona da minha
mãe, mas ia ser bom ter um pouco de autonomia e não faria com que ela se
atrasasse para o trabalho todos os dias.

— Como você quer um carro se ainda nem tem habilitação, Rosimeire?


— Ele franziu o cenho e me encarou de esgueira.

— Ah, pai, esse é um detalhe fácil de resolver. — Sorri antes de


mastigar a minha torrada.

— Então, resolva esse detalhe e depois pensamos sobre a possibilidade


de você ter ou não um carro.

— Ah, pai. — Fiz bico.

— Sem a ou b, mocinha. Tire a habilitação primeiro, Rosimeire. Sem


ela, você não pode dirigir de qualquer forma.

— Habilitação? — Guto apareceu na sala para o café-da-manhã e o


meu coração parou de bater; quase havia me esquecido de que ele estava por
aqui.

— É. — Meu pai se virou para o amigo no momento em que o Guto


puxou uma cadeira e sentou ao meu lado. — Rosi quer um carro, mas ainda
não tirou a habilitação. Dou o carro quando ela for aprovada na autoescola.

— Não é tão difícil assim. — Ele me encarou com um sorriso e percebi


que havia feito a barba e parecia vários anos mais jovem, poderia ser
facilmente confundido com um dos meus colegas de sala.

Ainda tinha a impressão de que a presença dele ali era um sonho do


qual eu acordaria a qualquer momento.

— Pode ir comigo em uma autoescola depois?

— Eu? — Guto arregalou os olhos, surpreso com o meu pedido.

— Filha, o Gutemberg está ocupado, não tem tempo para bancar o seu
motorista — recriminou-me a minha mãe.

— Tudo bem, Margarida. Não me custa nada levar a Rosi em uma


autoescola. É o mínimo que posso fazer por estarem me recebendo aqui por
uns dias.

— Não se sinta na obrigação, meu amigo — disse o meu pai.

— Não se preocupe com isso. — Guto manteve o sorriso. Nem parecia


o mesmo cara arrasado da noite anterior, mas o Guto feliz de sempre. — Na
segunda estou mais livre no período da tarde, pode ser ou você tem aula?

— Pode ser, sim. — Disfarcei o quanto eu estava surtando por dentro e


tentei manter uma expressão neutra enquanto tomava o meu café-da-manhã.

— Ótimo! — Ele jogou um pão de queijo na boca e se levantou. —


Vamos para o escritório, Ricardo.
— Até mais tarde, amor. — Meu pai se levantou e deu um beijo rápido
na minha mãe. — Se comportem, crianças, e tenham um bom dia — disse
para mim e para o meu irmão antes de seguir o Guto.

Logo depois, eu me levantei e fui com a minha mãe até o carro dela, e
vi que nem o do meu pai nem o do Guto estavam lá mais.

Poderia parecer loucura, mas dentro de mim havia acendido uma


chama de esperança.
Capítulo 5

Saí do elevador e me separei do Ricardo, indo cada um para a sua sala.

— Leda. — Debrucei-me sobre a mesa de madeira onde a minha


secretária estava e atraí sua atenção para mim. — Quero os balanços de todas
as filiais na minha mão até o meio dia.

— Todas? — Arregalou os olhos, surpresa.

— Todas, das capitais ao interior.

— Eu vou providenciar.

— Ótimo! — Sorri ao me afastar da mesa.

— Precisa de mais alguma coisa, senhor?

— Por enquanto é só isso. — Dei as costas e fechei a porta, escorando-


me nela.

Inspirei e expirei profundamente, enquanto tirava o blazer do meu


terno e o colocava pendurado no encosto da minha cadeira. Queria me
inundar em trabalho, deixar que os meus pensamentos se perdessem em
números, em otimizar lucros, ganhar mais dinheiro, porém, eu tinha
concordado com o divórcio e achava que precisava por um ponto final
naquela situação. Não tinha porque ficar tentando jogar uma boia salva-vidas
se o nosso casamento já havia afundado.

Puxei o meu celular do bolso e disquei o número do meu advogado.


Ele tratava de assuntos empresariais, mas deveria conhecer alguém que
lidasse com divórcios.

— Alô, Thiago?

— Ei, Gutemberg, tudo bem? Estava pensando em você de manhã.


Acredito que ainda hoje eu termine de redigir os contratos que você me
pediu.

— Isso é ótimo, mas eu não te liguei para perguntar sobre eles.

— E sobre o que seria?

— Preciso que me recomende um advogado que lide com divórcios. —


Soltei meu corpo no encosto da cadeira com um longo suspiro. Havia
admitido: meu casamento estava acabado.

— Você e a Olivia...

— Acabou.

— Eu sinto muito.

— Também sinto, mas acho que vai ser melhor para os dois.

— Se é assim, só posso torcer para que dias melhores venham. Vou


conversar com um amigo que cuida de divórcios e pedir para ele ligar para
você. Só me tira uma dúvida, qual o regime de casamento de vocês?

— Separação total de bens, como você recomendou na época.

— Ótimo. Isso facilita muito as coisas, pois ela pode querer parte da
empresa.

— Espero que não, mas penso em deixar a casa para ela juntamente
com uma quantia em dinheiro.

— O Danilo vai te ligar e vocês poderão se reunir para pensar em um


bom acordo para oferecer a ela. Quanto mais amigável for esse divórcio,
melhor para vocês dois.

— Peça para fazer isso o mais rápido possível, por favor.

— Sim. No mais, está tudo bem?

— Está sim. Estou passando um tempo na casa do Ricardo, acho que


vai me fazer bem.

— Isso é ótimo. Eu vou ligar para o Danilo e você me dá notícias


depois.

— Muito obrigado, Thiago.

— Por nada. Até mais. — O advogado desligou o telefone e eu fiquei


encarando o aparelho por longos minutos até colocá-lo sobre a mesa.

Ouvi uma batida na porta e levantei a cabeça.

— Pode entrar.

— Senhor? — Leda, minha secretária, que era uma mulher baixa de


meia idade e cabelo curto, entrou na minha sala.

— Sim? — Estalei os dedos.

— Mandei o que me pediu para o seu e-mail.

— Obrigado. — Liguei o computador.


— O Antonio Montreal ligou. Ele não deixou recado, só pediu para que
retornasse para ele assim que possível. Acho que é sobre a AMontreal para a
criação da marca própria da linha de produtos que vai levar o nome dos
supermercados.

— Ah, sim! Peça ao Ricardo para conversar com ele. Ele é melhor com
pessoas. — Abri um sorriso amarelo. Eu já era do tipo pouco comunicativo e,
enfrentando um divórcio, preferia ficar na minha bolha o máximo possível.

— Eu vou falar com o senhor Ricardo.

— Obrigado. — Assenti e ela fechou a porta, me deixando sozinho.

Abri uma aba de buscas no meu navegador e, quando dei por mim,
estava procurando por apartamentos para alugar e comprar. Já que pretendia
deixar a casa para a Olivia, teria que encontrar outro lugar para viver, longe
dela e longe do meu melhor amigo. Não gostava de pensar nisso, morávamos
perto um do outro desde que eu nasci, mas ainda nos veríamos todos os dias
na empresa.
Capítulo 6

— Aceita um pedaço? — Dani sentou ao meu lado no banco debaixo


de uma árvore, onde eu estava sentada olhando fixamente para frente e para
lugar nenhum ao mesmo tempo.

— Ah, quê? — Pisquei várias vezes até fitar o rosto do meu melhor
amigo, com os cachinhos do cabelo dele caindo sobre a testa.

— Está na Terra ou em Nárnia?

— Posso ter ido para a Dimensão Mágica e voltado.

— Anda lendo demais, amiga. Precisa ter um pouco de realidade de


vez em quando.

— A minha viajada de agora não tem nada a ver com os livros, antes
fosse. — Apoiei o meu queixo nas palmas das mãos e os cotovelos na minha
coxa. Com o corpo curvado para frente, voltei a encarar os alunos que
passavam de um lado para o outro do campus, seguindo para os prédios onde
teriam as suas aulas.

— Então o que foi, gata? — Ele puxou o meu queixo e me fez encará-
lo.

Girei o corpo e tombei a cabeça sobre o seu ombro. Daniel era o meu
melhor amigo desde sempre. Nos conhecemos na escola e sempre fomos
inseparáveis; se havia alguém que poderia me ajudar com aquela inquietação
no meu peito, era ele.
— O Guto está morando lá em casa.

— Eita! Como assim? Por quê? — Despejou uma enxurrada de


perguntas sobre mim.

Pisquei algumas vezes demonstrando minha tontura e roubei a barra de


chocolate que estava na mão dele e que havia oferecido para mim ao se
aproximar. Mastiguei um pedaço antes de me arriscar a dizer qualquer outra
coisa.

— Ele está se divorciando. O casamento dele acabou, Dani. — Não


deveria ter sorrido, nem demonstrado toda aquela alegria, mas meus lábios se
alargaram de um canto a outro da minha boca.

— Você não teve nada a ver com isso, né? — Ele franziu o cenho e me
olhou cheio de julgamento.

— Ei, achei que você fosse meu amigo.

— Eu sou, por isso que acho que você não faz o perfil de destruidora
de lares.

— Credo! — Cerrei os dentes. — Claro que eu não tenho nada a ver


com isso. — Joguei uma mexa do meu cabelo loiro e curto para trás. Não sei
o motivo do divórcio, mas posso garantir que não foi culpa minha.

— E como ele foi parar na sua casa?

— Meu pai que convidou. Disse que ele poderia ficar por lá quanto
tempo precisasse. Em uma mansão daquelas, espaço é o que não falta mesmo.

— O que você vai fazer? — perguntou o Dani, curioso.


— Eu não sei. Acha que eu deveria fazer alguma coisa?

— Você quer fazer alguma coisa?

— Não está me ajudando, sabia?

— O que quer que eu diga? Vai lá, tira a roupa, se joga nele e tenham
uma noite louca com o seu pai dormindo no quarto ao lado? Amiga, você
sabe que eu te amo, mas não quero ser culpado pelos seus BO’s depois.

— Meu pai sempre foi muito de boa. Ele nunca achou ruim de nós dois
dormirmos juntos.

— A gente pode nunca ter dito para ele que eu sou gay, mas acho que
ele meio que sabe que eu nunca tiraria o seu cabaço.

Engoli em seco.

— Será?

Daniel apenas balançou a cabeça em afirmativa.

— Pode ser. — Dei de ombros e voltei a me perder em pensamentos.


Algo dentro de mim me dizia que aquela oportunidade, com o Guto tão perto,
era algo que eu não poderia perder, mas não sabia o que fazer.

— Nossa! Você está precisando retocar essas raízes. — Daniel puxou o


meu cabelo e eu o puxei de volta, fazendo a minha cabeça de gangorra.

— Tá, deixa o meu cabelo. Depois vou retocar.

— Quer uma carona para casa?

— Quero. — Peguei o meu celular e verifiquei as horas; não queria


ficar esperando até que a minha mãe atendesse o último cliente na clínica
onde ela era psicóloga antes de vir me buscar. Não via a hora de ter o meu
próprio carro e ganhar a minha autonomia.

Acompanhei o Daniel até o estacionamento diante do prédio de Direito


onde ele havia estacionado o seu carro. Perdida em pensamentos, não falei
muito durante o caminho de volta. Peguei o meu celular dentro da bolsa e
mandei uma mensagem para a Deborah, uma amiga que eu tinha feito durante
a última bienal do livro em São Paulo. Havíamos começado a conversar na
fila de autógrafos de uma autora que nós duas amávamos, trocamos números
de telefone e, depois disso, passamos a conversar direto. Era uma pena que
ela se mudaria de São Paulo. Era muito mais difícil ir vê-la mais ao Sul do
que na capital.

Digitei a mensagem e enviei.

Oi, amiga, como você está? Já viajou?

Levou um bom tempo para que ela me respondesse e imaginei que


estivesse ocupada.

Oi, Rosi! Estou bem e você?

Bem também :D!

Ah, já cheguei. Estou desfazendo as malas.

Legal! Espero que seja bom ficar perto do seu pai.


Sabia que o pai da Deborah era um político conhecido no interior. Ela
não tinha falado muito, também não me dei ao trabalho de perguntar; preferia
que ela me contasse os detalhes sobre a sua vida pessoal quando se sentisse à
vontade para isso.

É!

Deh, queria um conselho.

Conselho?

Sabe o cara que eu disse que eu gosto desde a adolescência?

Aquele gato que você me mostrou o perfil no Instagram?

Esse mesmo!

Mas ele não era casado?


Rosi não se mete em confusão.

Ah, calma! Nem disse sobre o que eu queria o conselho.


Não me julga.
Só estou te lembrando que ele é casado.

Aí é que está. Ele não está mais casado, Deh!


Eu ouvi parte de uma conversa dele com o meu pai.
Ele saiu de casa e vai entrar com o pedido de divórcio.
O casamento dele afundou e antes que pergunte:
Não! Eu não tenho nada a ver com isso.

Tá... Qual conselho?

Acha que eu devo investir nele?

Investir? Está dizendo dar em cima do cara?

Mais ou menos isso.


Preciso pensar num plano melhor do que só dar em cima.
Ele, provavelmente, ainda me vê como a menininha filha do
melhor amigo dele.

Melhor amigo do seu pai?! :O Não, Rosi! Quantos anos ele tem?

36, eu acho.

E você tem 18, né?

Sim.

Ele poderia ser o seu pai.

Mas ele não é.

Ele é muito velho para você. Além disso, acha que seu pai vai
aceitar que vocês tenham alguma coisa? Eles são amigos, pode se
sentir traído.

Meu pai sempre foi de boa com namorados.

Com caras que tem a sua idade.


E...

Rosi, eu preciso ajeitar umas coisas aqui. Mudança, você já viu.


Mais tarde a gente se fala.
Pensa direito e não faz nada que possa se arrepender depois.
Beijos!

— Chegamos — anunciou o Dani, e percebi que já estávamos parados


diante da minha casa.

Eu desprendi o cinto e guardei o meu celular dentro da mochila.

— Valeu pela carona.

— Gata? — chamou, antes que eu saísse do carro.

— O que foi? — Parei com a mão na maçaneta e virei a cabeça para


encará-lo.

— Decidiu o que vai fazer?

— Sobre? — Franzi o cenho, fingindo-me de desentendida.

Daniel bufou, revirando os olhos, e demonstrou o seu


descontentamento comigo.

— A cor da blusa que vai usar amanhã. — Sorriu, sarcástico.

— Ainda não sei, mas, Dani, eu sempre quis aquele cara.

— Seja lá o que for fazer, toma cuidado. — Piscou para mim antes de
colocar a mão sobre a minha e abrir a porta. — Agora, vaza.
— Grosso. — Cerrei os dentes e ele riu. — Vem amanhã para
maratonármos juntos aquela série?

— Só se tiver pipoca com bastante manteiga, porque aquela sem sal e


sem graça ninguém merece.

— É só você trazer a pipoca do jeito que você gosta. — Dei de ombros.

— Você é uma péssima anfitriã, Rosimeire Laerte.

— Você já é de casa, mas para saber que eu sou legal, vou comprar um
estoque caprichado de balas tubos e minhocas cítricas.

— Eu virei, porém, saiba que é só pela bala. — Ele deu partida no


carro e eu segui para a entrada da minha casa, rindo.

Sabia que era uma péssima ideia, assim como o Dani e a Deborah
haviam dito, mas a minha vontade de me atirar nos braços do Guto, agora que
ele era um homem solteiro, havia triplicado. Seria difícil me controlar com
ele morando na mesma casa que eu.
Capítulo 7

Puxei a porta e deixei que o advogado passasse por ela. Assim que
Danilo entrou na minha sala, nos tranquei lá dentro para que não fossemos
interrompidos e apontei para um sofá, indicando-o a se sentar ali.

— Eu agradeço por ter vindo hoje.

— Sabe o quanto você é um cliente importante para nossa firma de


advocacia. Te atenderíamos até se fosse um final de semana.

— De qualquer forma, eu agradeço. — Sentei na poltrona que estava


diante do sofá.

— Thiago me antecipou sobre o seu divórcio.

— Sim. — Abaixei a cabeça, encarando o chão de porcelanato


acinzentado sob os meus pés. Doía pensar no divórcio, principalmente porque
eu achava que o casamento era algo que deveria ser honrado por toda a minha
vida. Porém, não queria viver em pé de guerra com a Olivia sobre um futuro
que não viveríamos juntos. Se ela não queria uma família, seria muito difícil
que entrássemos em um consenso.

— Eu gostaria de saber se você e sua esposa já conversaram a respeito


da separação, se é isso que realmente querem. Casais brigam, e vários já
vieram a mim pedir o divórcio por causa de alguma discussão, mas depois
acabaram se arrependendo.

— Eu imagino que sim e sei o quanto um divórcio é um assunto


delicado. Confesso que não queria nem pensar na possibilidade de me
separar. Eu fui criado com os meus pais dizendo que casamento é para vida
toda, que quando eu escolhesse uma mulher, que eu deveria amá-la e
respeitá-la até o último dos meus dias. Eu achava que seria assim com a
Olivia, queria que fosse, porém, meus pais também me ensinaram que
casamento é para se criar uma família. Tenho três irmãos e fui criado com
muitos primos, em um ambiente familiar grande, mas a Olivia não quer
filhos, não importa o que eu diga, não importa o quanto eu peça; ela é sempre
irredutível.

— Mas você não a ama? — Danilo me encarou e fez uma pergunta que
me deixou sem jeito.

Eu engoli em seco algumas vezes, mas não consegui me livrar da


sensação de que havia algo parado na minha garganta.

— Danilo, honestamente, eu não sei se amei algum dia. Sabe esse amor
que descrevem nos comerciais de televisão, o que nos deixa sem ar e faz com
que os nossos corações parem de bater? A Olivia é uma mulher linda, tem um
sorriso e um jeito encantador. Quando eu me aproximei dela, nós vivemos
ótimos momentos juntos, mas não sei se a atração sexual pode ser descrita
como esse amor todo. No entanto, o principal motivo de ter decidido me
casar com ela foi a possibilidade de construir uma família. Eu quero filhos, ao
menos um. Depois que ela me disse que não queria ter filhos, eu me senti, de
certa forma, enganado. Sei que pode soar horrível, mas ela não me parece
mais a pessoa certa.

— Eu compreendo, realmente é difícil manter um casamento quando o


casal não compartilha os mesmos objetivos.

— Não quero parecer o vilão da história, mas nem eu, nem a Olivia,
estamos dispostos a abrir mão do que queremos. Parece horrível continuar em
um relacionamento desse jeito. A última briga foi a gota d’água para mim.

— Providenciarei os papéis do divórcio. Se fizerem um acordo


amigável, poderemos resolver toda a situação em alguns dias.

— Muito obrigado. — Me levantei e estendi a mão para ele.

— É um prazer estar aos seus serviços, Gutemberg, mesmo em


assuntos delicados como esse. — Danilo apertou a minha mão e saiu pela
mesma porta onde havia entrado.

Alguns instantes depois que o advogado de divórcios desapareceu, meu


melhor amigo se esgueirou para dentro da minha sala.

— Então é isso, você realmente vai se divorciar da Olivia? — Cruzou


os braços ao me analisar cuidadosamente com o olhar.

Apenas balancei a cabeça em afirmativa. Sabia que teria que responder


aquela pergunta diversas vezes para as pessoas mais próximas até que o meu
divórcio saísse.

— Parece menos horrível hoje do que ontem. Sei que você pensa como
eu pensava, que casamento é para o resto da vida, mas a verdade é que acho
que me precipitei e escolhi a esposa errada. Me deixei levar pelo anseio por
ter uma família e não levei em consideração o que queria a mulher com quem
estava me comprometendo.

— Desde quando é a gente que escolhe? — Ricardo riu ao se lembrar


de como havia sido a relação dele com a Margarida. Ela sempre havia sido
apaixonada pelo Ricardo, desde que éramos crianças, e se fez notar até que
ficassem juntos.
— Acho que não tive paciência e me precipitei.

— É possível. Quem sabe agora você espere ser escolhido?

— Vou trabalhar a minha paciência. — Suspirei.

— Vamos embora? Hoje é sexta-feira, podemos sair daqui e fazer um


churrasco, como nos velhos tempos.

— Vai perder para mim no truco de novo.

— Perder? — Ricardo afunilou os olhos como se eu houvesse dito algo


que o irritara, mas eu o havia provocado de propósito. — Até onde eu me
lembro, o pato aqui é você.

— Eu só vou terminar um e-mail que estava escrevendo e o enviar para


a Lena e vamos para casa.

— Beleza, vou desligar o computador lá na minha sala e nos


encontramos na garagem em vinte minutos.

— Combinado.

Assim que o Ricardo saiu da minha sala, eu fiquei pensando a respeito


do que ele havia falado. Não somos nós quem escolhemos... Quando havia
pedido a Olivia em casamento eu achava que ela havia me escolhido também,
mas ao perceber que tínhamos pensamentos tão distintos, era evidente que eu
não estava entre as suas prioridades. Tudo bem, ainda não era tarde demais
para que cada um de nós tivesse o futuro que quisesse.
Capítulo 8

Durante a tarde, eu fiquei no meu quarto lendo alguns textos que o


professor da faculdade havia passado e entretida com um podcast sobre
leitura que a Deborah havia me recomendado. Eu não era muito de ouvir
essas coisas de podcast; quando estava no Ensino Médio eu preferia sair e me
reunir com meus amigos, mas parecia que a vida da Deborah era diferente e
ela teve que encontrar outras formas de passar o tempo.

Depois que me entediei das coisas da faculdade, me lembrei de um


livro novo que havia sido lançado em e-book e fui pegar o meu kindle para
ler. Deborah e eu amávamos aquela autora e depois poderíamos discutir sobre
ele. Enquanto me imergia em atividades que faziam parte da minha rotina, eu
havia me esquecido do Guto e do fato de que ele estava morando sob o
mesmo teto que eu.

— Rosi!

Assustei-me com o meu irmão aparecendo na porta do meu quarto e


levantei o meu olhar do kindle para encará-lo. Minha expressão era de poucos
amigos; estava no meio de uma cena bem quente e não era o meu irmão que
eu queria ver naquele momento.

— O que você quer, pirralho?

— Papai e o Guto chegaram, e disseram que vão fazer churrasco.

— E daí? — Voltei a fitar o kindle; iria ler a cena e fingir que meu
irmão não estava parado na minha porta, encarando o interior do meu quarto.
— Você é chata, hein?

Movi os ombros, sem dar importância para o que meu irmão estava
falando.

— Era só isso?

Rodrigo balançou a cabeça em afirmativa.

— Já avisei, se você quiser, você desce.

— Valeu.

Ele deu as costas e foi embora.

Depois que meu irmão desapareceu de vista, o nome do Guto ecoou na


minha mente e me lembrei como num estalo de que ele estava morando
conosco por um tempo; além disso, a esposa dele não estaria junto, pois ele
estava se divorciando e voltaria a ser solteiro.

Solteiro... A palavra ecoou na minha cabeça e fez meu coração bater


descompassado. O homem que eu amava desde criança estava livre e
desimpedido para viver um novo romance. Comigo? Bem que eu gostaria...

Gutemberg era um homem muito bonito, além de todo o dinheiro que


ele possuía junto com o meu pai. Não iria demorar para que houvesse uma
fila de mulheres esperando por uma chance de estar com ele. Precisava fazer
com que ele me notasse primeiro. Guto tinha que perceber que eu não era
mais uma garotinha, que havia crescido, me tornado uma mulher, e era
completamente apaixonada por ele.

Guardei o meu kindle, decidida a deixar a leitura para depois, e fui para
o meu banheiro. Iria tomar um banho e me ajeitar para o tal churrasco. Vi a
minha calcinha dentro da pia e me perguntei se havia a deixado ali, pois
sempre a esquecia no registro depois que tomava banho. Sorri ao me recordar
que o Guto havia tomado banho no meu banheiro hoje mais cedo antes de
sair para trabalhar. Provavelmente, fora ele quem tirara a minha calcinha do
registro. Fiquei sem graça e ao mesmo tempo muito curiosa com o que
poderia ter passado pela cabeça dele. Ao menos a calcinha era uma das
minhas mais bonitinhas.

Observei meu cabelo e percebi que Daniel tinha razão, eu precisava


retocar as raízes. Eu tinha nascido com o cabelo castanho claro, mas gostava
muito do loiro e havia adotado aquela cor desde que eu tinha feito quinze
anos e a minha mãe me deixara descolorir.

Peguei um biquíni, o menor que encontrei, e me ajeitei da forma mais


chamativa possível para que fosse notada na piscina enquanto o Guto e o meu
pai faziam o churrasco.
Capítulo 9

Ricardo sabia como melhorar o meu astral, mais do que eu mesmo. Era
impressionante como alguém podia me conhecer tão bem. Éramos mais
próximos e mais confidentes do que eu jamais fui com qualquer um dos meus
irmãos, e era difícil pensar na minha vida sem o meu melhor amigo, pois eu
sabia que, independentemente do que acontecesse, sempre o teria ao meu
lado.

Peguei uma peça de picanha e joguei em uma bacia, colocando um


punhado de sal-grosso por cima. Em momentos como aquele era que eu me
lembrava que não importava o quanto dinheiro havíamos ganhado, dentro de
nós ainda havia a humildade de quem nasceu no subúrbio.

— Você é mole demais. O carvão vai acabar de arder na churrasqueira


e você ainda não terminou de arrumar essas carnes.

— Tá reclamando, faz no meu lugar. — Olhei para o meu melhor


amigo.

— Então, sai daí! — Ele me empurrou para o lado e eu joguei o pedaço


de picanha de volta na bacia. — Seu negócio é só a matemática, Guto! Parece
que nem sabe fazer mais nada.

— Não vem com essa. — Olhei torto enquanto lavava a minha mão na
pia da enorme área de lazer da mansão do Ricardo. — Se me deixasse
terminar...

— Se eu te deixasse terminar, nós não iríamos comer carne hoje. —


Ele terminou de preparar as carnes e as colocou na grade da churrasqueira.

Abri a geladeira, que ficava do outro lado da pia, e peguei uma cerveja
para mim e outra para o meu melhor amigo. Ele arrancou a tampa e
brindamos, batendo o pescoço das longnecks um no outro.

— Eu trouxe umas torradas com patê de frango para comermos, porque


parece que esse churrasco não vai sair hoje. — Margarida apareceu,
carregando consigo uma cesta com pão e um pote de vidro com o patê.

— A culpa é do Guto. — Ricardo tirou o dele da reta.

— Não quero saber de quem é culpa. De longe, estava vendo vocês


dois conversarem muito, mas o churrasco que é bom, nada.

— Está incomodada com a conversa? — Ricardo pegou as coisas da


mão da esposa e as colocou sobre a bancada de granito da pia. — Posso falar
menos. — Ele dirigiu um olhar malicioso para ela ao empurrá-la contra a
porta da geladeira.

— Ricardo, as crianças! — Ela tentou protestar, mas ele a silenciou


com um beijo.

— Elas não estão nem olhando e nem eu. — Saí de fininho quando
percebi que o clima entre os dois havia ficado mais quente.

Muitos diziam que o fogo, todo aquele calor que sentíamos das
primeiras vezes, desaparecia com o casamento. Poderia até acontecer com
alguns casais, mas Ricardo e Margarida estavam juntos há vinte anos e eu via
o mesmo brilho no olhar que tinham quando éramos mais jovens.

Pensando sobre o meu próprio casamento fracassado, Olivia e eu


estávamos juntos há bem menos tempo e não compartilhávamos uma relação
como aquela. Refletir sobre isso só me fez ter mais certeza de que o divórcio
era o melhor caminho.

— Oi. — Ouvi uma voz manhosa dita em um tom baixo e me virei.

Rosimeire estava parada ao meu lado e era iluminada pelos postes


acesos na área da piscina. Me recordava de quando ela tinha os cabelos
castanho-claros e Margarida os arrumava em duas tranças. O penteado que a
fazia parecer uma menina também não estava mais lá, havia dado lugar a um
cabelo curto Chanel pintado de loiro. Estava bonito, mas me chocava de uma
forma que eu não sabia explicar.

— Vamos nadar. — Ela tirou a toalha que a envolvia e foi impossível


impedir que os meus olhos passeassem pelo seu corpo.

Mordi o lábio para não engolir em seco. Ela estava usando um biquíni
pequeno que mostrava muito e escondia pouco. A parte de cima era no
formato cortina e quase que só cobria o bico dos seus seios, que eu não me
lembrava de serem tão grandes. A parte de baixo, entrava na sua bunda e a
deixava toda de fora. Vê-la vestida daquele jeito me inquietou e eu não era
capaz de compreender o motivo. Talvez fosse algum instinto paternal que eu
desconhecia por ainda não ter filhos.

— Esse biquíni não está muito pequeno, Rosemeire?

— Você acha? — Ela passou as mãos pelos seios, contornando o tecido


com a ponta dos dedos.

Foi inevitável que a minha atenção não se prendesse ali. Os seios dela
eram firmes, e os mamilos se eriçaram com o toque dos seus dedos. Engoli
com força quando a minha boca se encheu de saliva.

— Acho. — Desviei o olhar para a espreguiçadeira do outro lado da


piscina.

— É, esse é velho e eu cresci.

É, ela cresceu..., pensei, guardando apenas para mim. Uma menininha


não tinha seios do tamanho de laranjas.

— Você não tem outros?

— Tenho, mas e daí? Só tem a gente aqui mesmo. — Deu de ombros


como se não se importasse com o efeito que aquele biquíni minúsculo
poderia causar em mim.

— Tio Guto! Já tem carne? — Rodrigo parou na minha frente e eu


agradeci mentalmente pelo garoto interromper todo aquele momento
constrangedor. Rosi era só uma menininha, não deveria me deixar de pau
duro.

— Vamos lá olhar? — Coloquei uma mão sobre o ombro do garoto e o


levei para perto da churrasqueira.

Assim que nos aproximamos, Ricardo e Margarida apartaram o beijo e


o meu amigo foi para frente da churrasqueira, como se nada estivesse
acontecendo. Ele devia estar acostumado a fingir para os filhos que não vivia
com as mãos em determinadas partes do corpo da mãe deles.

— Pai, já tem carne? — Rodrigo parou ao lado dele.

— Ainda não, filho. Esse seu tio molenga nem sabe preparar carne
direito. — Ricardo me olhou com um ar debochado e eu abri um sorriso
amarelo.

— Ah, falou, viu! — Torci os lábios como se estivesse irritado.

Ouvi o som de algo batendo na água e me virei no momento em que


Rosimeire emergiu do meio da piscina. Molhada, com o cabelo grudado na
nuca, o biquíni pareceu ainda menor e eu tive a sensação de que veria os seus
seios a qualquer momento. Apressei-me a encarar a churrasqueira. Já tinha
problemas demais para lidar, não poderia olhar como estava olhando para a
filha do meu melhor amigo. Ela poderia ter crescido e não ser mais a
menininha com quem estava acostumado, porém, eu ainda tinha o dobro da
idade dela. Poderia ser a minha filha.

— Guto?

Fui obrigado a me virar novamente quando ela me chamou.


Felizmente, Rosi estava escorada na lateral da piscina em um ângulo que me
permitia ver apenas seu rosto, ombros e braços.

— Oi, Rosi. — Sorri para ela.

— Não quer entrar?

— Na piscina, agora?

— É, vem! — Jogou algumas gotas de água em mim.

— Já é noite.

— A água está quentinha. Eu juro.

— Tio Guto tem medo de água fria. — Rodrigo gargalhou ao passar


perto de mim. Percebi que ele estava tentando debochar de mim com uma
brincadeira de criança, mas não sabia que não era da água que eu estava
tentando fugir.

— Eu não tenho medo de água fria, Rodrigo.

— Tem, sim! Tio Guto é mó medroso.

Ri do garoto enquanto ele tirava a camiseta e entrava na água junto


com a irmã. Em outros tempos, eu teria ido até o quarto, pegado uma
bermuda para nadar e entrado com eles na piscina, mas o meu bom senso me
dizia para não fazer isso.

— A carne ficou pronta! — anunciou o Ricardo, e eu fui para perto


dele.

— Quase queimou, né? — Brinquei ao ver uma beiradinha mais


chamuscada do que o restante.

— Antes quase queimar do que queimar de verdade. — Seu ar


debochado deixou claro que não se incomodava com as minhas indiretas.

Peguei algumas tiras de carne e as joguei na boca. Caí na bobagem de


voltar a olhar para piscina no momento em que a Rosi decidiu sair de lá. Ela
balançou a cabeça como um cão quando quer se livrar da água e tive a
sensação de que o biquíni havia reduzido mais com o contato com a água.
Tudo o que eu fazia era para me esforçar em pensar que ela precisava de um
biquíni maior.

— Não quer mesmo entrar? — Ela caminhou para perto de mim,


deixando pegadas molhadas sobre o piso.

— Não. — Apressei-me em pegar a toalha, que ela havia deixado em


uma espreguiçadeira, e a entreguei para ela. — Aqui, se seca ou pode acabar
pegando um resfriado.

— Obrigada. — Ela se envolveu com a toalha e eu estava torcendo


para que se mantivesse coberta o máximo de tempo possível. — Quero carne!
— Ela passou por mim e seguiu para perto do pai, que a serviu.

Enquanto eu via o Ricardo cercado pela esposa e pelos filhos, fiquei


me perguntando se um dia iria conseguir ter uma família assim como ele.
Capítulo 10

Guto tinha notado o biquíni minúsculo, talvez não tanto quanto eu


gostaria, mas o suficiente para dizer que era pequeno. Eu não era mais a
garotinha que ele havia cuidado, tinha me tornado uma mulher, e iria me
esforçar para que ele aceitasse isso.

Depois do churrasco, eu voltei para o meu quarto e entrei no banho.


Não tinha acontecido nada, mas também não poderia esperar que acontecesse
com o meu pai por perto. Contudo, por mais viajem que fosse, morria de
vontade de tê-lo me agarrando e tirando as peças do meu biquíni.

Tive um ou outro namorado durante a minha vida, havia beijado


algumas bocas, mas não consegui esquecer o meu amor pelo melhor amigo
do meu pai. O casamento dele no auge dos meus treze anos fora a maior
frustração da minha adolescência. Até aquele momento, enquanto ele
continuava um solteirão inveterado, eu cultivava esperanças tolas de que,
secretamente, ele poderia estar esperando por mim. Contudo, saber do
divórcio havia reacendido uma chama dentro de mim; eu era uma ingênua
que acreditava na possibilidade de que Gutemberg e eu poderíamos ficar
juntos. Se havia um destino que predestinava o homem certo para nós, aquele
era o sinal que eu precisava. Percebi que o amor, que havia sido apenas
platônico por anos, poderia se aproximar do real. Mas, precisava fazer com
que o Guto também percebesse isso.

Desliguei o chuveiro, fechando o registro, e puxei uma toalha do


suporte na parede para que pudesse me enrolar nela antes de sair da névoa
quente de fumaça do chuveiro. Me sequei e coloquei apenas um conjunto de
calcinha e sutiã, como tinha o costume de dormir. Nem meus pais nem o meu
irmão tinham o hábito de entrar no meu quarto à noite e isso me dava um
pouco de privacidade.

Meus pais sempre foram muito tranquilos com o meu espaço. Minha
mãe era aberta comigo e conversávamos sobre tudo, ou quase tudo... já que
nunca tive coragem de dizer para ela que era completamente apaixonada pelo
Guto. Eles sabiam que não adiantava nada controlar demais, pois os pais da
minha mãe sempre foram muito religiosos e cheios de regras, e isso não
impediu que ela engravidasse de mim aos dezessete. Ela tinha sido expulsa de
casa e ido morar com o meu pai. Anos depois, meus avós tentaram uma
reaproximação, mas ela não parecia disposta a perdoá-los.

Aos dezoito anos, eu ainda era virgem, pois o único homem com quem
já dormi era o meu melhor amigo, que tinha tanto interesse em rapazes
quanto eu. Os orgasmos que tive foram autoinfligidos enquanto eu tentava
conhecer meu próprio corpo. Não que eu fosse uma garota feia e não tivesse
tido oportunidades, mas só não queria nenhum dos caras com quem me
envolvi.

Dani sempre dizia que o meu amor platônico pelo Guto nunca iria sair
disso, mas, no fundo, bem no fundo, eu tinha esperanças. Ele estava se
divorciando e eu agora era maior de idade. Poderia riscar dois empecilhos da
lista quilométrica, e isso aumentava as minhas chances.

***

Não sei quando peguei no sono, mas acordei com o meu celular em
cima do peito e deitada toda torta na cama. Depois ficava com as costas
doendo e não sabia dizer o porquê.
Ouvi uma batida na porta e percebi que fora isso que havia me
acordado. Puxei o meu celular e vi que o visor mostrava oito da manhã de um
sábado.

— Caramba, mãe, me deixa dormir um pouco mais. É sábado! —


resmunguei baixo demais para que quem estivesse do outro lado da porta
fosse capaz de ouvir.

— Rosi? — A voz era grossa e firme, inconfundível, e mudava


completamente o funcionamento do meu organismo, deixando as minhas
pernas bambas e o meu coração acelerado. — Rosi?

Não pensei duas vezes antes de me levantar da cama e sair correndo


para abrir a porta para ele. Até o sono todo que estava sentindo se dissipou
quando percorri a distância entre a minha cama e a maçaneta.

— Oi, Guto, bom dia! — Um sorriso de orelha a orelha se formou nos


meus lábios.

— Rosi. — Ele olhou para mim e se virou de costas de imediato.

Fiquei sem entender a reação dele até me tocar que estava de calcinha e
sutiã. Meus pais e meu irmão estavam acostumados a me ver daquele jeito,
mas ele era a primeira vez.

— Não sabia que você estava trocando de roupa — disse, ainda virado
para o outro lado, envergonhado.

— Não, eu estava dormido. Acordei com você chamando.

— Ah, sim, claro! — Ele nem se esforçou para esconder o embaraço


em seu tom de voz. — Hoje é sábado e me lembrei que tinha combinado de
levar você em uma autoescola. Tem uma aqui perto que abre sábado pela
manhã, mas se você quiser ir na segunda à tarde, como combinamos...

— Não! Podemos ir hoje, eu iria adorar.

— Então, veste uma roupa descente para gente ir.

— Tá bom! — Fechei a porta um tanto irritada. Nem o meu pai


reclamava comigo sobre as minhas roupas, que direito ele tinha para fazer
isso? Era para gostar de me ver daquele jeito e não bancar o careta.

Caminhei para o interior do quarto e fui até o meu closet e, só por


desaforo, escolhi um vestido curto que não dava para usar sutiã, pois as
costas ficavam abertas e o bojo era da própria peça. Troquei a minha calcinha
por uma menor ainda, que tinha pequenos fios que sabia que marcaria o
vestido, mas queria que ele visse o quanto era pequena.

Fui até o banheiro, escovei os meus dentes, e penteei o meu cabelo. Saí
do quarto pronta para fazer com que ele me notasse.
Capítulo 11

Estava sentado na cozinha, tomando meu café, servido por uma


empregada, sozinho. Ricardo e a esposa ainda estavam dormindo e fiquei me
questionando se não havia chamado a Rosi cedo demais. A autoescola ficava
aberta até o meio-dia; eu poderia ter esperado ela acordar sozinha.

A verdade era que eu não tinha conseguido dormir. Já fazia duas noites
que eu passava em claro, desde que havia decidido pelo divórcio. Porém,
precisava me lembrar de que as outras pessoas não tinham nada a ver com
isso e que num sábado todo mundo esperava poder dormir sem o
compromisso de acordar cedo.

Soprei a fumaça branca do café quente enquanto batia o pé na lateral


do banco alto, que ficava junto a uma bancada da cozinha.

— Ah, achei você. — A voz da Rosi me fez procurar por ela pelo
cômodo, até encontrá-la escorada no batente da porta.

Assim que eu a vi, acabei engolindo o café sem cautela e queimei a


garganta, fazendo com que eu começasse a tossir desenfreadamente logo em
seguida.

— Está tudo bem? — Ela chegou mais perto.

— Está, sim. — Deixei a caneca com café quente sobre a bancada


enquanto massageava a garganta, na esperança de que ela parasse de arder.

Ela estava em um vestido vermelho rendado que se moldava às curvas


do seu corpo, ressaltando os seios e a bunda. Fiquei sem saber o que era pior,
aquele vestido ou o biquíni minúsculo da noite passada. Estava com a
sensação de que ela estava fazendo aquilo comigo de propósito, não tinha
outra explicação.

— Essa é a roupa descente que você tem? — Fechei a cara.

— Esse vestido é lindo, não acha? — Ela passou as mãos pela lateral
do corpo, atraindo minha atenção para suas curvas.

Mordi a língua, sentindo o gosto de sangue misturado com a ardência


por ter queimado a garganta com o café quente. A dor me impediu de ficar
excitado e depois me culpar por isso. Por que está fazendo isso comigo,
garota?

— Volta lá e coloca camiseta e calça jeans. — Meu tom de voz foi bem
mais ríspido do que eu gostaria.

— Por quê? — Fez bico, contrariada.

— Você vai para uma autoescola e não para um baile da faculdade.

Ela bufou, mas sua expressão de fúria não me influenciou. Preferia ela
brava comigo do que em uma roupa como essa.

— Gosto do vestido.

— Coloca uma roupa descente, Rosi.

— Nem meu pai me diz o que eu devo ou não vestir. — Cruzou os


braços, irritada.

— Então, pede a ele para levar você, mas eu acho que ele vai
concordar comigo. — Me levantei do banco disposto a sair da cozinha e
deixá-la ali, mas Rosi segurou meu braço, forçando a minha parada.

O calor dos seus dedos contra o meu pulso adentrou a minha pele como
um veneno sútil e paralisante, que me deixou formigando. Odiei o efeito que
o seu toque causou em mim, principalmente pela forma como reagi diante
dele. Por um momento, esqueci de que ela era a filha do meu melhor amigo e
pensei apenas no quanto ficava sensual naquele vestido vermelho e apertado.
Minha boca voltou a salivar e eu umedeci os lábios. Me imaginei tocando os
dela e, nesse momento, como se tivesse sido atingindo por um raio, puxei o
meu pulso. Eu não podia, sob circunstância alguma, me permitir pensar em
algo assim.

— Ai! — Ela cambaleou para trás, supressa com a minha reação bruta.

— O que você quer, menina? — Cerrei os dentes, a minha confusão


havia se transformado em uma raiva sútil, pois eu odiava quando a situação
saía do meu controle.

— Ir para a autoescola. — Encarou-me, confusa com a minha reação.

— Então, coloca uma calça jeans.

— Tá bom! — Ela saiu da cozinha pisando duro e eu voltei para o


banco alto completamente confuso.

Eu não deveria ter alterado o tom de voz com ela, mas não consegui me
controlar. Rosi estava mexendo com a minha cabeça, ou talvez ela já
estivesse bagunçada por causa do divórcio e eu estava vendo coisas onde não
havia.

— Melhor assim? — Ela parou na minha frente usando um jeans


escuro e uma camiseta larga.
— Perfeito. — Sorri para ela. — Desculpa.

— Pelo quê?

— Ter gritado. Eu me preocupo muito com você. É como se fosse uma


filha para mim.

— Você não é meu pai, Guto — disse com rispidez, como se a minha
fala a houvesse deixado muito irritada.

Não entendi a sua reação. Só queria que ela entendesse que eu queria
bem a ela.

— Vamos para a autoescola?

Rosi fez que sim e seguimos em silêncio até a garagem onde o meu
carro estava estacionado. Tirei a chave do bolso, destravei o veículo e a Rosi
entrou pela porta do carona. Seguimos até a autoescola e a Rosi ficou em
silêncio por todo o caminho; ainda parecia emburrada com alguma coisa que
eu havia dito e isso me deixava chateado.

Ao entrarmos na autoescola, não tivemos mais tempo para conversar.


Fomos atendidos rápido por uma moça na recepção, que colheu os dados da
Rosi e, quando terminou, eu paguei pelas aulas do curso teórico. Logo, ela
teria o próprio carro e a independência de ir e vir. Ela, definitivamente, não
era mais uma menininha.

— Rosi — chamei por ela quando voltamos para o meu carro.

— O que foi? — Com a cabeça escorada no vidro, não parecia disposta


a me olhar nos olhos.

— Quando eu disse que você é como uma filha para mim, é porque eu
me orgulho muito de você. Quando eu tiver uma filha, se tiver uma, quero
que ela seja como você.

— Não entende que não é dessa forma que eu quero que me veja? —
Ela coçou os olhos e eu tive a sensação de que estava afastando as lágrimas.
Me senti péssimo por estar a magoando sem saber o motivo.

— Então, como quer que eu te veja?

— Ah, deixa para lá. — Bufou. — Só me leva de volta para casa.

— Rosi, fala comigo. — Soltei o cinto e me aproximei dela.

Rosimeire virou o rosto e nossos narizes quase se tocaram. Meus olhos


se fixaram no castanho dos dela. Não consegui desviar o rosto de imediato,
minha respiração se mesclou com a dela e meu coração se acelerou. Seus
lábios vermelhos me chamavam. Enfrentando um divórcio, com o coração
partido e carente, tudo o que eu queria era um beijo, mas aquela era a última
mulher no mundo que eu deveria cogitar beijar. Rosi poderia não ser mais
uma menininha, mas ainda era a filha do meu melhor amigo. O fato de ela ser
maior de idade não excluía os inúmeros outros empecilhos.

Eu não era um homem religioso, apesar dos meus pais terem me criado
para ser. Sempre gostei de ciência e acreditava em fatos, mas com os meus
lábios a centímetros dos da Rosi, eu consegui entender a definição de
tentação e pecado: era quando se queria muito fazer alguma coisa, mas que
era extremamente errado.

— Vamos voltar. — Libertei-me da força magnética que me puxava na


direção dela e coloquei novamente o meu cinto, atando-me ao banco do
motorista.
Seja racional, Gutemberg! Para de fazer besteira! Você já meteu os
pés pelas mãos com uma mulher antes e acabou em divórcio. Não pode
arriscar perder o seu melhor amigo por um impulso.

Antes de cogitar encostar os meus lábios nos da filha do Ricardo,


precisava me lembrar de que ele era tudo o que eu tinha de mais importante
na minha vida e a melhor relação que eu já havia estabelecido.

Rosi puxou o cinto dela e ficou encarando o lado de fora do carro


enquanto eu dirigia de volta para o condomínio fechado onde morávamos.

Eu amava a presença do Ricardo, ninguém no mundo me fazia tão bem


quanto o meu melhor amigo, mas percebi que continuar morando com ele
poderia colocar a nossa amizade em risco.
Capítulo 12

Apertava os botões do controle da minha televisão sem prestar atenção


em nenhum canal. O movimento automático disfarçava o fato de eu estar
perdida em pensamentos. Estava presa entre a realidade e o sonho. Ao
mesmo tempo em que tinha a sensação de que por pouco o Guto não me
beijara hoje mais cedo, estava certa de que era mais um dos muitos delírios
que já tive com ele.

Você é como uma filha para mim... Sua voz ecoou na minha mente e eu
apertei o controle com força entre os meus dedos, acionando um monte de
botões de uma única vez.

— Filha é o cara... — praguejei, baixinho, omitindo o palavrão que


queria gritar aos quatro ventos.

Não desejava que ele me visse como filha, mas sim como sua futura
esposa. Não alguém que ele colocasse na cama para dormir e para quem
contaria uma história, mas queria ser aquela que ele levaria para cama e
transaria a noite toda.

— Estou entrando... Espero que você não esteja pelada porque não
quero ver as suas tetas.

Virei a cabeça e vi o Dani invadir meu quarto sem qualquer cerimônia


e fechar a porta atrás dele. Nem me mexi no sofá, continuei esparramada,
mexendo a esmo no controle.

— Que bad é essa, amiga? — Ele se sentou ao meu lado e puxou a


minha cabeça para o seu colo.

— Hoje eu saí com o Guto.

— Saiu com o Guto?! Me conta essa história direito. — Ele me


empurrou pelos ombros para que eu me levantasse.

— Não tem nada a ver com o que você está pensando.

— Eu não pensei nada. — Fez-se de desentendido.

— Ele me levou na autoescola. Começo as aulas na segunda-feira.

— Agora, até eu amo esse cara. Vou poder beber e deixar você dirigir.

Fechei a cara e ele riu.

— E por que está triste? Não quer dirigir e ele te obrigou? Isso muito
me surpreende, porque você nunca foi o tipo de garota que aceita que
decidam alguma coisa por você. Me pede conselhos, mas sempre faz tudo ao
contrário.

— Acredita que ele teve coragem de dizer que sou como uma filha para
ele e que se tiver uma filha, quer que ela seja igual a mim?

— Se ele tiver uma filha com você aumenta muito as chances de ser
como ele quer. — Riu todo debochado e eu tive vontade de arrastar a cabeça
do meu melhor amigo na parede.

Olhei torto para ele, mas não disse nada. Dani sabia o quanto eu amava
o Guto e sonhava em ficar com ele, mas tirava sarro de mim na maioria das
vezes. Namorar o melhor amigo do meu pai com o dobro da minha idade
parecia tão impossível quanto querer um ator de Hollywood que nem sabia
quem eu era.

— Vamos ou não ver a série? — Daniel puxou o controle da televisão


de baixo de mim e selecionou o aplicativo do streaming.

— Eu vou buscar a pipoca. — Saltei do sofá e segui para o corredor.

— Traz refrigerante também — disse o Daniel, quando eu quase já não


conseguia mais ouvi-lo.

Desci as escadas indo para a cozinha, mas antes de chegar lá, passei
pela sala de estar onde meu pai e o Guto estavam assistindo algum jogo de
futebol. Estavam compenetrados, atentos a cada movimento e vibravam com
os lances dos jogadores do São Paulo.

— Ah, pelo amor de Deus, seu juiz — resmungou o meu pai, levando
as mãos à cabeça. — Você viu, Guto? O cara entrou com tudo, quase quebrou
a perna do nosso atacante, e o juiz ainda vem dizer que não é falta para
cartão. Cadê o VAR numa hora dessas? Aposto que esse cara é corintiano.

— Safado demais. — Guto bufou, soltando as costas no encosto do


sofá. — Ninguém merece jogo roubado desse jeito.

Parei de prestar atenção neles e segui para a cozinha. Fui até a


despensa, abri uma das enormes gavetas do armário à procura de um pacote
de pipocas com sabor manteiga de cinema. Peguei uns dois e coloquei para
estourar enquanto derretia mais uma colher de manteiga na frigideira. Iria
estar nadando em gordura, mas o Daniel não poderia reclamar.

Joguei tudo numa bacia e peguei um refrigerante e dois copos.


Equilibrando tudo, voltei pelo caminho que levava para o meu quarto.
Olhando através do balde de pipocas que eu equilibrava em um dos braços, vi
que o jogo estava no intervalo. Meu pai e o Guto ainda estavam discutindo a
idoneidade do juiz, mas me notaram passar.

— Daniel está aí? — perguntou o meu pai ao perceber que eu segurava


dois copos.

Apenas fiz que sim. Não era nenhuma novidade para o meu pai; Dani e
eu éramos inseparáveis desde os meus oito anos quando começamos a estudar
juntos na mesma escola.

— Nem vi ele chegar — comentou. Bom, pela forma como estava


compenetrado no jogo, não era nenhuma surpresa que ele não tenha visto
nada além dos marmanjos com camisas do São Paulo e do Corinthians
correndo atrás da bola.

— Ele está lá no meu quarto.

— Vão ver filme?

— Série. Saiu uma nova ontem sobre um bruxo na idade média que
persegue monstros. Estávamos muito a fim de ver.

— Bacana. — Ele sorriu e assentiu.

Percebi que o Guto apenas ficou nos observando, mas não se deu ao
trabalho de dizer nada. O clima entre nós dois ainda estava muito estranho
desde o momento no carro dele depois da autoescola, porém, eu ainda não
havia desistido do Guto. Havia esperado dezoito anos por uma chance com
aquele homem, e poderia esperar um pouco mais.
Capítulo 13

Tomei um gole da minha cerveja enquanto observava com o canto de


olho a Rosimeire subir equilibrando um balde de pipoca, refrigerante, e copos
para o segundo andar da casa. Quando o Ricardo perguntou sobre o amigo
dela, eu me recordei do Daniel. Era um garoto que tinha a mesma idade da
Rosi, uma estatura mediana, cabelo loiro cacheado, e olhos verdes. Eles
estavam juntos para cima e para baixo há muitos anos, cheguei até a imaginar
que eram ou seriam namorados. Nunca havia me atentado a isso, mas,
naquele momento, eu fiquei curioso, ou minimamente incomodado. Não era
problema meu, e se o Ricardo não via problemas com a proximidade deles,
não cabia a mim ver.

— Eles são namorados? — perguntei ao Ricardo, deixando escapar o


meu questionamento mental, ainda que tivesse certeza de que iria me
arrepender poucos minutos depois.

— Nem sei, viu? Essas relações modernas dos jovens me deixam


confuso, mas ele é um bom garoto. Eu tento não ser um pai chato. Você sabe
o que a Margarida passou, né? Prefiro que ela faça as coisas sob o meu teto
do que saia por aí sozinha e sem assistência.

— Ah, ele dorme aqui?

— Dorme direto. Prefiro eles aqui do que a Rosi indo para casa dele,
mas ele é um bom garoto, o conheço desde pequeno. É filho do Thiago,
aquele advogado da firma que trabalha para gente. O moleque também está
fazendo Direito e deve seguir os passos do pai.
— Realmente, parece um bom rapaz. — Voltei a me acomodar no sofá
ao lado do meu melhor amigo quando o segundo tempo do jogo começou.

Tudo o que eu tinha que fazer era torcer para que a Rosi focasse no
garoto e parasse de me tentar. Isso era o melhor para nós dois.

— Ah, esqueci de falar para você sobre a minha conversa com o


Antonio ontem.

— O que é Presidente da AMontreal, de Jargão do Sul? — Franzi o


cenho, tentando buscar na minha mente a informação sobre aquele homem.
Eram tantos nomes, que às vezes eu ficava perdido; era ótimo com números,
mas nunca fui bom com nomes e fisionomias.

— Esse mesmo, chamam ele de Bulldog.

— Imagino o naipe do sujeito. — Ri.

— Ele é um pouco grosseiro, mas me parece uma boa pessoa. Falam


bem dele no meio e na AMontreal. Ele se esforça para tornar o lugar bem
familiar, e é exatamente o que queremos para a marca dos produtos dos
Supermercados Laerte, naquele slogan: de família para família.

— Sabe que eu confio cem por cento no seu julgamento. Acredito que
se fecharmos esse negócio vai ser muito lucrativo para nós. Essa semana eu
estava analisando o desempenho de marcas próprias de outros supermercados
e as perspectivas são muito boas. Se conseguirmos um produto de qualidade,
poderemos reduzir custos com distribuidores e outros atravessadores,
garantindo um menor custo para os nossos consumidores finais.

— Ah, não! — Margarida apareceu na sala com um balde de pipoca


similar ao da filha e se sentou entre nós dois. — Deixem os negócios para o
escritório. Quando chegarem lá, vocês continuam falando sobre isso. É final
de semana e os dois merecem conversar. — Ela esticou a pipoca para que eu
e o Ricardo pudéssemos pegar.

Aceitei, jogando algumas na boca, e fiquei calado enquanto mastigava.

— Isso, bons meninos. — Ela riu enquanto passava as pernas para


cima do colo do marido e o Ricardo colocou uma das mãos sobre a coxa dela.

— O dinheiro para as suas idas ao shopping tem que sair de algum


lugar, meu amor.

— Ah, do meu trabalho, querido. Eu não trabalho nos finais de semana


e vocês também podem descansar. Esqueçam que são sócios e fiquem apenas
como os melhores amigos. — Ela virou o rosto para mim e me encarou com
uma expressão firme e autoritária. — Ouviu bem, Gutemberg?

— Sim, senhora.

— Ótimo! — Ela afagou o meu rosto e deu um selinho no marido.

Margarida era uma mulher radiante, que alegrava a todos a sua volta, e
me achava um cara de sorte por tê-la como amiga. Ela e o Ricardo eram
felizes e a prova viva de que o amor poderia ser real.
Capítulo 14

Acomodei a minha cabeça no ombro do Daniel enquanto assistíamos a


série e comíamos a pipoca no modo automático. Por um momento, junto com
o meu melhor amigo e seguindo a nossa rotina de passar os finais de semana
juntos assistindo séries, eu me esqueci da presença do Guto na minha casa e
do divórcio dele. Ao menos por um tempo...

— Rosi. — Mamãe apareceu na porta do meu quarto.

— Oi, Dona Margarida. — Daniel sorriu para ela.

— Oi, Dani! — Minha mãe retribuiu a expressão de alegria. — Como


você está? E os seus pais?

— Estamos todos bem.

— Que ótimo! Venham jantar. A mesa já está posta.

— Beleza, mãe. — Puxei a mão do Daniel e ele desceu comigo para a


sala de jantar.

Qualquer devaneio, que havia me feito parar de pensar no Gutemberg,


foi posto de lado quando eu o vi ao lado do meu pai. Os dois ainda estavam
conversando sobre o jogo de futebol, mas pararam quando me viram entrar na
companhia do Daniel.

— Oi, seu Ricardo. Gutemberg... — Dani acenou para eles antes de


puxar uma cadeira para se sentar junto a mesa.

— Tudo bem, garoto? — meu pai perguntou a ele.


— Sim, e o senhor?

— Bem, também.

— O que tem pra janta hoje, mamãe? — Rodrigo entrou saltitando e


atraiu a atenção de todos. Pela primeira vez fiquei grata pela atitude
alvoroçada do meu irmão, pois ela fez com que eu parasse de encarar o Guto.

— Yakissoba.

— Oba! — Ele se sentou e foi direto se servir. — Pai, vai ter uma
excursão para o MASP na semana que vem, eu posso ir? Vai ser muito legal.

— Pode, sim — respondeu o meu pai, sem pensar muito.

Nós nos reunimos ao redor da mesa e o jantar foi bem tranquilo,


porém, eu não conseguia parar de encarar o Guto. Toda vez que ele percebia
que eu estava olhando diretamente na sua direção, ele virava o rosto para não
me encarar de volta. Me lembrei dele falando que eu era como uma filha para
ele. Havia poucas coisas no mundo que ele poderia dizer que me deixariam
mais chateada.

Daniel vivia dizendo que não tínhamos nada a ver, que o melhor era
que eu desencanasse. Às vezes, eu sentia que precisava aceitar isso, mas,
quando tentava me desfazer da esperança, a história se tornava outra, pois no
fundo, bem no fundo, acreditava que eu tinha alguma chance. O divórcio dele
depois do meu aniversário de dezoito anos era um sinal.

Após o jantar, Daniel e eu voltamos para o meu quarto e continuamos


assistindo a série. Encontrei o meu celular largado sobre a cama e vi que nele
havia várias mensagens da minha amiga Deborah. Quando ela ainda morava
em São Paulo, era mais fácil nós duas nos encontrarmos, ainda que ela só
pudesse sair para ir à livraria. O pai dela parecia o cara mais chato da face da
terra; nunca deixava ela fazer nada, nem receber amigos.

Estou lendo aquela série de vampiros? Você já começou?


Que fogo, Rosi!
Quero ser mordida por um cara desses.

Kkkk Eu disse que você ia gostar.

Estou terminando o segundo, mas ainda quero arrastar a cara


daquele vampiro no asfalto. Não vou te falar muito para não dar
spoiler, mas tô morrendo de raiva dele.

Ainda estou no primeiro, mas acho que ele tem seus motivos
para agir assim. Ele sempre focou em proteger a irmandade, ele passou
séculos sendo desse jeito.

Ah, não! Ele tem que cuidar da mulher que está grávida dele.
Tenho ranço.
#ProntoFalei.
Kkkk
E o que decidiu sobre o amigo do seu pai?

Eu o quero, mas ainda não sei o que fazer.

Toma cuidado.

Não é a primeira pessoa que me diz isso.

É porque tomar cuidado é importante.


— Larga esse celular! Nem parece que eu estou aqui. — Daniel tomou
o celular da minha mão e eu rosnei para ele.

— Deixa de ser chato. — Fiz bico.

— Assim fico com ciúmes, gata — disse debochado, e eu gargalhei.

— Sabe que eu amo você. — Pulei para o colo dele e o abracei até
sufocá-lo.

— É bom mesmo.

No instante em que eu estava zoando com o Daniel, o Guto surgiu no


corredor e passou pela porta do meu quarto, me vendo no colo do meu
melhor amigo. Não sabia qual parte da nossa conversa ele havia escutado,
mas não ficou por muito tempo me encarando.
Capítulo 15

Sabe que eu amo você... a voz da Rosi se declarando para um cara com
a idade dela ecoou na minha mente enquanto eu estava a caminho do quarto.
Era bem melhor assim, para todo mundo.

Senti um aperto incomodo, mas não dei importância para isso, tinha
outros problemas para resolver e deveria ficar feliz pelo namoro da Rosi. O
garoto sendo filho do Thiago deveria ser uma boa pessoa.

Entrei para o quarto de hóspedes, onde estava vivendo, e peguei


minhas coisas para tomar banho. Felizmente, o banheiro do quarto do
Rodrigo havia sido concertado e eu podia usar o social livremente.

Deixei o creme de barbear, o desodorante, e as roupas limpas na


bancada da pia antes de me despir e entrar no chuveiro.

A presença do Ricardo e da família dele me fazia muito bem e me


ajudava a esquecer do buraco que eu tinha no peito. Porém, quando eu ficava
sozinho com os meus pensamentos, me lembrava que tinha trinta e seis e
ainda estava longe de ter uma família. Eu teria que recomeçar tudo depois do
divórcio, e sair para curtir e paquerar era muito mais difícil quando o seu
melhor amigo era um homem muito bem casado.

Fechei o registro e saí do chuveiro, puxei a toalha da bancada e


comecei a secar o cabelo. Segunda-feira eu precisava começar a dar um jeito
na minha vida. Não poderia continuar morando com o Ricardo para sempre,
precisava de uma nova casa e um novo começo.
Saí do banheiro no momento em que a Rosi deixava o quarto dela.
Acabamos nos cruzando no corredor e foi inevitável não nos encararmos. Ela
estava com uma camisola minúscula e eu odiei o quanto seu corpo me
chamou a atenção. Era errado, muito errado, olhar para aquela menina com
qualquer ar de cobiça. Rosi era a filha do meu melhor amigo e eu tinha que
cuidar dela e protegê-la. Desviei o meu olhar para uma luminária no corredor
atrás dela. Eu não acreditava em pecado até perceber os desejos que aquela
menina provocava em mim.

— Oi, Guto.

— Oi. — Senti um gosto amargo na boca ao, sem querer, olhar para o
decote da sua camisola.

Garanti a mim mesmo que ela não estava vestida desse jeito para
chamar a minha atenção. Era insano sequer cogitar nisso. Rosi estava com o
namorado no quarto e era óbvio que eles deveriam ter transado ou ainda iriam
transar naquela noite.

— Eu vou tomar água. — Apontou para escada.

— Claro. — Pisquei os olhos todo desnorteado ao perceber que estava


encarando o decote dela. Não deveria, mas estava.

Dei um passo para o lado e Rosi virou de costas, descendo pela escada.
Assim que ela sumiu de vista, apressei-me em ir para o quarto de hóspedes
onde eu estava dormindo. Tranquei a porta e me escorei nela, ofegando.
Parecia que quanto mais eu dizia a mim mesmo que não deveria olhar com
cobiça para a filha do meu melhor amigo, mais os meus olhos queriam
passear pelo corpo dela.
Abaixei a cabeça e inspirei, expirei, e inspirei novamente. Queria
controlar as batidas frenéticas do meu coração. Segunda-feira, eu teria que
buscar urgentemente um outro lugar para morar. Eu nunca havia me sentido
tão mal por olhar desse jeito para uma mulher. Só de pensar na reação do
meu melhor amigo ao descobrir que eu havia reparado nos seios da filha dele,
eu mesmo tinha vontade de me dar um soco.

Era a frustração e o divórcio mexendo com a minha cabeça. Eu


precisava passar por esse momento e seguir com a minha vida o mais rápido
possível, antes que cometesse um erro muito maior do que me casar com a
mulher errada.
Capítulo 16

Voltei para o meu quarto após ter saído para tomar água e encontrei o
Daniel me olhando com uma expressão cheia de julgamento, o que me fez
estremecer.

— O que foi?

— Encontrou com ele.

— Ele quem? — Fiz-me de desentendida e o Daniel torceu os lábios,


fechando a cara.

— Ele quem? Ah, fofa, você acha que eu sou idiota? Não teria saído do
quarto com essa camisola promíscua se não fosse para chamar a atenção do
Gutemberg. Ou tem alguma outra pessoa aqui nessa casa que você queria que
a visse assim? Porque não venha me dizer que é só uma camisola. Ninguém
usa uma camisola pequena de cetim e renda se não quer ser notada.

— Eu encontrei com ele. — Encarei o chão, sentindo as minhas


bochechas corarem.

— E...?

— E nada. — Bufei. — Ele não disse nada nem fez nada. — Joguei o
meu corpo na cama ao lado do meu melhor amigo.

— O que você esperava que ele fizesse? Que pegasse você no colo, te
levasse para o quarto de hóspedes, e te desse uma noite de sexo muito louca?
— Deitou-se de lado para me observar melhor e, de cenho franzido, aguardou
a minha resposta.

— Não sei — admiti, percebendo a razão nas palavras do meu melhor


amigo —, mas quero que ele faça algo.

— Não quero ser o pessimista, mas vou te dizer algo que você precisa
parar pra pensar. O cara tem a vida feita, quase quarenta anos, passou por um
montão de coisas, e está se divorciando da esposa. Ele pode não ter o menor
interesse em você, e você está fazendo tudo isso por nada.

Engoli em seco e cerrei os dentes. Não gostei do que o Daniel falou


porque, de certa forma, me magoava muito pensar que o Guto nunca fosse ter
olhos para mim, ainda que essa fosse a ideia mais lógica. Ele tinha o dobro da
minha idade e era o melhor amigo do meu pai, mas algo dentro de mim não
aceitava desistir sem lutar.

— Eu sou uma mulher interessante e vou fazer com que ele note isso.

— Ou passar o maior vexame tentando.

Empurrei-o pelos ombros, irritada, e o Daniel fechou a cara.

— Vamos dormir. Amanhã, você continua com esse seu dilema ou


decide partir para outra e deixar o pobre do cara em paz.

— Tá! — Ajeitei-me na cama e puxei o cobertor para cima dos meus


ombros.

Daniel se acomodou do outro lado da cama e eu fechei os olhos. Tentei


dormir, eu juro, mas não consegui. A vontade de ir para o quarto do Guto era
grande, mesmo sabendo que meus pais enlouqueceriam se me pegassem lá.
Bom, a ideia não estava completamente descartada.
***

Daniel foi embora no domingo pela manhã, bem cedo. Disse que
precisava estudar uma matéria e ler alguns textos que os professores da
faculdade haviam passado para ele. No fim, tinha me deixado sozinha com
meus pensamentos e sonhos platônicos.

Na parte da manhã, depois de ter tomado o café-da-manhã em família,


fui ler os meus próprios textos. Por maior que fosse a minha vontade de ficar
perto do Guto, não podia deixar de lado os meus compromissos com a
universidade.

Enquanto lia um texto sobre teoria das cores, fiquei pensando no que
faria para chamar atenção do Guto. Porque, por maiores que fossem os
nossos empecilhos, eu sentia que ele me queria, apenas não tinha coragem de
dizer.

Esgueirei-me do meu quarto e fui até o banheiro social. Usei uma


chave de fenda para forçar o registro para que ele começasse a vazar. Voltei
para o corredor, certificando-me de que ninguém tinha me visto, e voltei para
os meus textos chatos da universidade.
Capítulo 17

Ajeitei as costas no encosto e sorri ao encarar o Ricardo e o seu filho


Rodrigo que me encaravam com uma expressão de poucos amigos.

— Eu não acredito que ele ganhou de novo, pai! — O menino abaixou


as cartas sobre a mesa, irritado.

— Com um pouco de sorte e estratégia, não é difícil. — Dei de


ombros.

— Que estratégia que nada. Ah, cansei! — Levantou-se da mesa onde


estávamos reunidos e saiu pisando firme. Era só uma criança, mas já tinha o
jeito marrento do pai.

— Ishi, desistiu. — Ri.

— Você continua sendo muito sem graça nos jogos, Guto — disso o
meu melhor amigo ao guardar as cartas, e percebi que a nossa tarde de
domingo jogando baralho tinha ido para o saco.

— Para ser legal eu preciso deixar vocês ganharem?

— É bom você não ganhar sempre.

— Precisa ensinar ao seu filho melhores estratégias ao invés de ficar


reclamando que não consegue ganhar.

— Você é um chato. — Ele fez uma careta e, quando vi, nós dois
estávamos rindo juntos.
— Eu sou um chato, mas eu sei que você me ama.

— Fazer o quê? — Ele deu de ombros.

Encarei o Ricardo enquanto nos divertíamos e pensei no quanto o que


tínhamos era importante para mim. Acima de qualquer impulso sexual,
precisava pensar no quanto a minha relação com o meu melhor amigo era
importante para mim.

— Ah, vocês são uma graça. — Margarida se apoiou na cadeira atrás


do marido. — Amor, o banheiro social está com um vazamento. Fechei o
registro. Amanhã, eu ligo para um encanador vir ver o que aconteceu.

— Sério? — Ricardo revirou os olhos. — Essa casa custou milhões de


reais e ainda parece ter problemas como o barracão que a gente morava na
infância.

— Amor, construções dão problema, e essa é uma casa enorme.

— Tudo bem. Amanhã você vai ligar para o cara arrumar?

Ela fez que sim.

— Ótimo! Obrigado. — Ele passou a mão pelo rosto dela e a puxou


para um beijo carinhoso.

— O que vocês estão fazendo? — Ela puxou uma cadeira e acomodou-


se ao lado do marido.

— Estávamos jogando pife, mas não tem graça nenhuma jogar contra o
Guto, porque ele ganha todas. O Rodrigo até se irritou e já foi embora.

— Ganha todas, é? — Ela me encarou com um ar desafiador e estalou


os dedos, como se estivesse se preparando para me dar uma surra.

— Distribua as cartas, meu amor. Quero ver por quanto tempo esse
engomadinho do seu melhor amigo consegue se manter invicto.

— É por isso que eu amo a minha mulher. — Ricardo riu ao dar as


cartas novamente.

Estava ansioso para jogar uma partida com a Margarida e descobrir se


havia encontrado uma oponente a altura.

Ficamos até à noite jogando. Ela era consideravelmente melhor do que


o marido e o filho. Foi divertido ver a cara do Ricardo quando a mulher dele
ganhou de mim algumas vezes.

— Parece que nós temos uma vencedora aqui. — Ele levantou a mão
dela, todo orgulhoso.

— Sim, preciso admitir que ela é muito boa.

— Muito boa, não! Eu sou ótima! — afirmou, enfática, e nós voltamos


a rir.

Ricardo e eu poderíamos ter ganhado muito dinheiro com os


supermercados, mas sem dúvidas, a melhor parte da nossa relação eram os
momentos como aquele.

— Agora, eu preciso ir ver o que vamos jantar. As empregadas têm


folga no domingo e eu preciso ir para a cozinha. — Ela começou a se
levantar, empurrando a cadeira para trás para abrir espaço.

— Não. — Ricardo segurou a sua coxa e a manteve firme na cadeira.


— Não precisa ir para a cozinha. O Guto vai pagar a pizza.
— Claro! — Puxei o celular do bolso. — É o mínimo que eu posso
fazer. Vocês preferem calabresa ou marguerita?

— Eu gosto de frango com catupiry. — Rosi apareceu, escorando-se no


batente da porta e meus olhos foram direcionados para ela

O meu sorriso desapareceu e eu senti um aperto na garganta que


dificultou a minha respiração. Fiz de tudo para fingir que nada estava
acontecendo, mas não sei se havia saído tão bem quanto gostaria.

— O que foi, Guto? Parece que viu um fantasma, irmão — Ricardo me


chamou e eu pisquei os olhos algumas vezes para direcionar a minha atenção
para ele.

— Só lembrei de uma coisa do trabalho, mas falamos sobre isso


amanhã.

— Bom menino. — Margarida estendeu a mão e deu uns tapinhas no


meu ombro. — Agora, pede logo essa pizza, porque quero comer ainda hoje.

— Claro. Vou pedir uma de calabresa, uma de frango, e uma


marguerita, pode ser?

Margarida fez que sim com um movimento de cabeça e eu finalizei o


pedido no aplicativo.

Meu olhar me traiu e voltou-se na direção da Rosi, que ainda estava


parada na porta da sala onde nos reuníamos. Eu senti que, quanto mais eu
lutava, mais estava perdendo. Não entendi o porquê daquela garota estar
mexendo tanto comigo e, quanto mais pensava a respeito, mais via o quanto
aquilo era errado. Não era apenas uma menina qualquer com metade da
minha idade, era a filha do meu melhor amigo. Ainda assim, a camiseta
apertada e o short com parte da bunda de fora, despertava uma parte de mim
que não deveria reagir a ela e fazia com que eu me sentisse um depravado.

— Guto!

— Oi! — Levei um tempo para notar que a Margarida estava me


chamando.

— Quanto tempo a pizza vai levar para chegar?

— Daqui uma hora.

— Acho que vou tomar um banho antes, então.

— Nós vamos. — Ricardo piscou para ela com um sorriso malicioso e


as bochechas de Margarida coraram. Certamente seria bem mais do que
apenas um banho. — Toma conta das crianças — disse para mim. — Pode
ser que a gente demore.

— Podem ir.

Eles saíram da sala, trocando sorrisinhos e carícias, e eu fiquei


encarando as cartas do baralho espalhadas sobre a superfície de madeira
clara.

— Meus pais foram transar e te deixaram de babá? — Rosi puxou a


cadeira, que antes estava ocupada pelo pai, e se sentou na minha frente.

— Como se vocês precisassem de babá. — Eu a encarei, mas mordi a


língua, arrependido do que eu havia dito segundos depois das palavras terem
saído pela minha boca.

O sorriso dela se alargou e a forma como seus olhos me encararam me


deixou no mínimo desconfortável. Naquele momento, eu entendi da melhor
forma a definição de estar entre a cruz e a espada. Caralho, como ela é linda!

É a filha do seu melhor amigo... É só uma menina... Você não pode!


Repetia aquelas frases mentalmente quase que como um mantra, para que eu
não me esquecesse que, dentre todas as mulheres solteiras que eu conhecia,
aquela era a mais proibida de todas.

— Joga comigo? — Ela passou as mãos pelas minhas, chamando a


minha atenção, e um calafrio me varreu por inteiro; foi como se eu tivesse
sido atingido por um vento gelado.

Você já está jogando comigo, não está, garota? Aquela foi uma
pergunta que eu só fiz mentalmente ao travar meus olhos no castanho dos
seus.

— Claro! — Puxei o baralho e me desvencilhei das suas mãos. — O


que você quer jogar? — A pergunta foi inocente, mas, assim que eu a fiz,
fiquei imaginando que a resposta dela poderia me deixar completamente sem
jeito e eu não conseguiria escapar da saia justa sem algum atrito.

— O que acha de burro? — Ela puxou o baralho das minhas mãos,


embaralhou, cortou, e me entregou quatro cartas.

— Pode ser.

— Burro, eu quero jogar. — Rodrigo brotou na sala e fiquei grato pela


situação não ter saído do controle, ao ponto de darmos alguma brecha para
que o garoto percebesse o clima estranho entre mim e a irmã dele.

— Então senta aí, moleque! — Apontei para uma cadeira ao lado da


irmã.
Fiquei grato por ele estar por perto. A presença do Rodrigo impediria
que a situação fugisse do meu controle. Confesso que me sentia um merda,
pois não tinha certeza se me comportaria ficando sozinho com a Rosimeire.
Eu deveria ser aquele que a protegeria, em quem o pai dela poderia confiar de
olhos fechados, mas nem eu mesmo confiava em mim.

— Dá cartas para mim também, Rosi! — exigiu Rodrigo, sendo o meu


equilíbrio naquele momento tão conturbado.

Enquanto jogávamos, foquei em manter a minha atenção no garoto e


em me lembrar de que eles eram crianças, os filhos do meu melhor amigo.

A pizza chegou pouco antes de Ricardo e Margarida voltarem do


banho. Eu fui buscá-la na entrada da casa, enquanto a Rosi preparava a mesa
para comermos. Se eu conseguisse manter o equilíbrio perto dela, tudo ficaria
bem.
Capítulo 18

Daniel dizia que as chances do Guto sentir algo por mim eram nulas.
Ele era um cara mais velho, que estava em um momento da vida diferente do
meu, porém, depois daquela noite de domingo, da forma como ele se
esforçava para não me olhar diretamente nos olhos ou para não encarar o meu
corpo, percebi que ele estava lutando contra algo que poderia ser um
combustível. Eu apenas precisava acender uma faísca para que pegássemos
fogo.

Eu ainda era virgem e se tinha alguém que eu queria que mudasse esse
meu status era o Guto.

Quando os meus pais subiram para dormir, Guto foi para perto do meu
irmão, que estava estirado no sofá da sala.

— Rodrigo, posso usar o seu banheiro para tomar banho?

— Ishi, tio! Acabei de usar o vaso. Acho que se o senhor esperar uns
dez minutos, dá para entrar de boa.

Guto fez uma careta ao imaginar o cheiro que o meu irmão poderia ter
deixado no banheiro dele. Rodrigo sempre foi um pouco porquinho e ainda
bem que ele possuía o próprio banheiro no quarto.

Coloquei a mão sobre a boca e contive o riso.

— Por que não usa o da Rosi? Tá sempre com cheiro de perfume.

Obrigada, irmãozinho, agradeci em pensamentos. Rodrigo não


costumava me ajudar muito, mas, naquele momento, ele acertou em cheio e
me ajudou muito com os meus planos.

— Pode usar lá, Guto — disse para ele naturalmente, sem deixar que
qualquer comemoração ficasse explícita.

— Obrigado. — Ele me encarou, todo sem graça. Como, felizmente, a


ideia havia surgido do meu irmão, ele não poderia recusar sem dizer o
motivo. — Vou pegar minhas coisas, então.

— Fica à vontade. A porta está aberta.

Ele passou por nós e seguiu para o segundo andar da casa.

Estava prestes a ir atrás dele, quando meu irmão parou na minha frente.

— Tio Guto estava estranho hoje, né?

— Estava? — Coloquei uma mão na cintura e me fingi de


desentendida. — Eu nem notei.

— Deve ser por causa que ele e a tia Olivia terminaram, né? Coitado.

— Pois é, coitado! — Eu o girei e o empurrei pelos ombros na direção


da escada. — Está na hora de você dormir. Amanhã tem aula.

— Queria ver um pouco mais de televisão. — Fez bico e dificultou


para que eu o empurrasse escada acima.

— Amanhã você vê.

— Mas o filme que está passando agora não vai passar amanhã.

— Amanhã, você procura ele em algum site de streaming.


— Tá bom! — Entregou os pontos, descruzando os braços. — Odeio
quando você fica parecendo a mamãe.

— Ela já tinha dito para você ir dormir que eu sei. Quer que eu a
chame?

— Não! Não precisa, ela já está dormindo e eu vou também — disse,


quando chegamos no segundo andar, e o meu irmão entrou para o seu quarto,
fechando a porta na minha cara.

Eu entrei no meu quarto ouvindo o som do chuveiro. Meu coração deu


um galope no peito e eu imaginei o Guto nu, com a água escorrendo pelo seu
corpo. Eu o vira de sunga várias vezes, mas tinha certeza de que as outras
partes do corpo dele não iriam me decepcionar.

Fechei a porta do quarto e, por um minuto, pensei se poderia entrar


debaixo do chuveiro com ele. Meus pais estavam no quarto e dificilmente
sairiam de lá, o mesmo valia para o meu irmão, porém, imaginei que isso o
assustaria e se não quisesse que o homem saísse correndo, teria que agir de
uma forma mais delicada.

Tirei a minha roupa, ficando apenas de calcinha. Olhei-me no espelho


de corpo todo e reparei na transparência da peça que cobria o meu sexo.
Esperava que fosse o bastante para chamar atenção dele.

O som do chuveiro parou e eu prendi a respiração. Virei de costas e


fingi mexer em algo numa gaveta da cômoda, para que não ficasse na cara
que era uma armadilha para ele.
Capítulo 19

Saí do box e peguei a toalha limpa para me secar. Felizmente, daquela


vez não havia nenhuma calcinha minúscula pendurada no registro. Só torcia
para que, no fim, tudo ficasse bem e eu estivesse complexado à toa.

Coloquei a minha cueca boxer preta e uma bermuda folgada para


dormir. Peguei uma camiseta também; gostava de ficar sem, mas eu não
estava na minha casa e precisava respeitar o ambiente; tiraria quando
estivesse no quarto de hóspedes.

Juntei as minhas coisas e saí do banheiro e, assim que puxei a porta, eu


tomei um susto. Rosi estava de costas, debruçada sobre uma gaveta da
cômoda. Ela estava apenas de calcinha e segurava uma toalha na parte da
frente do corpo, cobrindo parcialmente os seios. Lembrei daquelas modelos
sensuais das revistas que via quando era adolescente e meu pau pressionou o
tecido da cueca, esticando a minha bermuda.

A bunda da Rosi não era grande demais, mas era redonda e linda.
Apenas um pequeno fio da calcinha descia por entre as suas nádegas e cobria
o seu buraco enrugado. Acima, na linha da cintura, havia um lacinho delicado
com alguns cristais que brilhavam com os movimentos dela. Achei que
aquela era a pior parte, mas, quando a Rosi se virou para mim, fui tomado por
um tesão, que não sentia por muitas mulheres da minha idade.

Umedeci os lábios quando a minha boca se encheu de água. A parte da


frente da calcinha era ainda pior para o meu bom senso e autocontrole. Era
transparente e me deixava ver seu sexo. Eu estava suando e mal tinha saído
do chuveiro.

— Ah, você saiu. Agora posso tomar banho — disse, como se não
tivesse enxergado problema algum em eu vê-la praticamente nua.

— Não deveria ter esperado eu sair para tirar a roupa?

— Como se fosse a primeira vez que você me vê nua. — Ela puxou a


toalha e vi os seus mamilos marrons, eriçados, e os seios redondos, fartos o
bastante para sobrarem nas minhas mãos.

— Você era um bebê. — Virei o rosto e encarei o chão de porcelanato


branco sob os meus pés.

— É, faz tempo. — Ela passou por mim e entrou no banheiro, mas não
fechou a porta.

Talvez por insinuação, ou meramente costume, pois era o banheiro do


quarto dela e a porta do quarto estava fechada. Eu deveria ter ido embora de
imediato, saído correndo antes que ela sequer tirasse a toalha, mas eu fiquei e
sabia que iria me odiar por isso pelo restante da minha vida.

Com o canto do olho, observei-a tirar a calcinha, abrir o box e entrar no


chuveiro. A água escorreu pelo corpo nu, de mulher, não havia mais nada da
garotinha que eu carreguei nos braços.

Caralho, o que eu estou fazendo? Percebi o quanto estava fora de mim


e pensando apenas com a cabeça de baixo. Saí do quarto dela praticamente
correndo e me tranquei no de hóspedes.

Ofegando, eu esmurrei a parede sentindo os meus ossos sofrerem o


impacto e reclamarem, me causando dor. Estava puto comigo mesmo, puto
por estar excitado, e mais puto ainda por ter sido paralisado pelo tesão. Não
deveria ter ficado para vê-la completamente nua. Tentava com todas as forças
excluir as imagens do seio e do sexo dela da minha mente, mas não
conseguia. Quanto mais fazia força para isso, maior era o efeito contrário.

Soquei de novo e de novo a parede, até que o meu sangue se misturasse


à tinta branca e a massa corrida.

— Porra — gritei baixo. A revolta era comigo mesmo e não precisava


acordar o restante dos moradores da casa.

Nunca senti tanta raiva do meu pau e do fato de ele se mover


involuntariamente. Desejar a Rosi, sentir uma vontade insana de ir até o
quarto dela e a deitar na cama para que fodêssemos até estarmos exaustos foi
o sentimento mais depravado que já experimentei. Eu me senti um animal,
um doente.

Era muito errado, errado demais.

Lágrimas brotaram dos meus olhos e eu continuei socando a parede, já


que não conseguia socar a mim mesmo, pois eu merecia. As costas dos meus
dedos já estavam inchadas, esfoladas, pequenos cortes na minha pele sujavam
a parede de sangue, mas não parei de me autoinfligir dor até que os seios da
Rosi sumissem da minha mente.

Chorei feito criança enquanto pensava em quanto aquilo tudo era


errado e depravado. Com os dedos arrebentados, voltei para cama e deitei
colocando o travesseiro sobre o meu rosto, para que eles abafassem o meu
grito.

Dentre todas as garotas do mundo, por que eu queria tanto trepar com a
filha do meu melhor amigo?

Ficar entre o desejo e a razão foi um dos piores sentimentos que já


senti.

***

Ouvi o som de uma batida na porta e me levantei, mas antes que eu


saísse da cama, vi Rosi entrar em meio a penumbra do quarto escuro. Eu só
conseguia distinguir silhuetas, mas era o suficiente para que eu tivesse a
certeza de que era ela; e o pior, estava nua, assim como eu a tinha visto no
chuveiro.

— Guto... — Sua voz era melodiosa e aveludada enquanto caminhava


na minha direção.

Meu coração parou de bater, minha garganta ficou seca e agarrei o


lençol sob mim. Esperei a cama ranger sob o peso do joelho dela, mas nada
aconteceu. Como uma gazela graciosa, Rosi subiu na cama e montou em
cima de mim.

— Eu quero você, Guto.

— Não podemos. — Segurei-a pelos ombros, mas isso não foi


suficiente para que a Rosi afastasse as mãos, que abriam o velcro da minha
bermuda.

— Por que não? Eu quero e sei que você também me quer.

— Sou um homem velho e o melhor amigo do seu pai.

— Eu não ligo.
Maldita determinação que ela havia herdado da mãe.

Rosi puxou o meu membro para fora da minha bermuda e abaixou a


cabeça, envolvendo o meu pau com a boca. Segurei seu cabelo loiro e curto,
puxando-o para cima e dando liberdade para se mover pela minha extensão.
Os lábios eram tão macios quando eu imaginei que pudessem ser. Ela me
chupava com gosto e eu não conseguia me conter, investindo para dentro da
boca dela. Porém, antes que eu gozasse, puxei-a pela cintura e a deitei no
centro da cama. Distanciei suas pernas e, sem qualquer cerimônia, enfiei num
tranco firme que a fez gemer alto.

A cada estocada, eu sentia que estava perdendo um pouco da minha


sanidade, mas era delicioso.

Tentações eram sempre assim, irresistíveis?

De repente, eu abri os olhos e percebi que estava sozinho no quarto.


Tinha sido apenas um sonho e, felizmente, eu não havia perdido o controle e
transado com a Rosi, ao menos por enquanto. Não sabia por quanto tempo
iria conseguir manter a sanidade diante de toda aquela situação.

Toquei o meu pau sob a bermuda e senti que ele estava pulsando, o
sexo poderia ter sido um sonho, mas o desejo era bem real e estava ali, me
enlouquecendo. Joguei as pernas para o lado e me sentei na beirada da cama.
Segurando o meu pau com uma mão, abaixei a minha bermuda com a outra.

Fechei os olhos novamente e permiti que as imagens que eu tanto


queria fossem formadas. Imaginei a sua boca, seus lábios, e a sua língua se
movimentando pelo meu pênis enquanto ela ficava ajoelhada entre as minhas
pernas. Pensei em como seguraria o seu cabelo curto e loiro enquanto ela me
sugava com a boca úmida e o hálito quente. Cheguei ao ápice imaginando
gozar na boca da Rosi. Se existia um inferno, com certeza aquela punheta
tinha comprado a minha passagem para lá.
Capítulo 20

Uma parte de mim esperava ter uma visita noturna do Guto. A outra, a
racional, recordou-me das palavras do meu melhor amigo e do fato do meu
pai estar dormindo no quarto ao lado.

Apesar da noite não ter sido como eu imaginava, levantei-me


empolgada, escovei os meus dentes e esperei que o Guto entrasse no meu
quarto, mas ele não entrou. Era provável que ele tivesse enfrentado o fedor do
banheiro do meu irmão, ou mesmo tomado banho frio no banheiro que ficava
na área da cozinha. Eu havia pegado pesado ao aparecer nua na frente dele e
esse era um dos resultados, nem de longe o que eu mais esperava, mas, ainda
assim, era uma possibilidade.

Embora meu plano parecesse ter fracassado, ainda não tinha me dado
por derrotada. Eu amava aquele homem desde que conhecera a palavra amor.
Só desistiria dele quando ficasse evidente que eu não tinha mais chance
alguma.

Acordei mais cedo do que o normal, pois iria para a autoescola antes da
minha aula na faculdade. Me arrumei, colocando uma calça jeans ao me
lembrar da surtada do Guto da última vez, mas tentei parecer mais bonita e
sensual possível com uma calça apertada e uma blusa com decote.

Saí do meu quarto à procura do Guto e bati na porta do de hóspedes


que ele estava usando. Ninguém respondeu e empurrei para ver se ele ainda
estava dormindo. Vi que a cama estava arrumada e saí pela casa procurando
por ele.
Eu o encontrei sentado perto da piscina, observando a água parada com
um olhar disperso. Ajeitava os botões da camisa social e parecia tão perdido
nos próprios pensamentos que não notou a minha aproximação.

— Bom dia!

— Rosi! — Ele de um pulo para o lado como se eu o tivesse assustado.

— Oi. Veio tomar banho de ducha?

— Às vezes, a água gelada faz bem para os pensamentos.

— Ainda prefiro a quente.

Ele não fez qualquer réplica à minha afirmação, permanecendo


encarando o nada, e me perguntei se ter ficado nua na frente dele na noite
anterior havia contribuído para a sua reação.

— Tenho a minha primeira aula na autoescola daqui a pouco e queria


que você me levasse.

— Seu pai não pode fazer isso? Ou, sei lá, você não pode pedir um
motorista de aplicativo?

Engoli em seco diante da resposta dele. Guto sempre havia sido muito
carinhoso comigo, mas, naquele momento, parecia um verdadeiro cubo de
gelo. Se me ver nua não significou nada para ele, então por que estava agindo
daquele jeito?

— Eu poderia pedir a alguém, mas gostaria que você me levasse. —


Cruzei os braços na frente do corpo, envergonhada.

— Por que eu? — Encarou-me com o olhar firme.


— Porque você me levou lá para fechar as aulas e gostaria do seu apoio
no meu primeiro dia. Você sabe o quanto isso é importante para mim, Guto.

— Eu tenho que estar no escritório daqui a pouco.

— Você não vai se atrasar, eu juro. E meu pai ainda nem acordou.

Ele ficou me encarando por alguns segundos até que balançou a cabeça
em afirmativa e eu abri um sorriso.

— Tudo bem.

— Muito obrigada!

— Já está pronta para ir?

— Estou. Só vou pegar a minha bolsa com as coisas da faculdade e


encontro você na garagem, pode ser?

— Certo.

Corri para pegar a minha bolsa e reforcei o batom vermelho para


chamar a atenção para os meus lábios. Quando cheguei na garagem, o Guto já
estava dentro do carro, debruçado sobre o rádio, procurando uma música em
sua playlist.

Abri a porta do carona e me sentei do lado dele. Quando o Guto foi se


ajeitar, o rosto dele passou a milímetros do meu e eu prendi a respiração; meu
coração disparou. Pela forma como ele se encolheu rapidamente no banco,
percebi que a nossa proximidade também causava efeitos nele. Eu não estava
delirando, aquele homem me queria, só faltava encontrar a fagulha certa.

— Rosi, isso não pode acontecer... — disse com dificuldade, como se


algo fizesse pressão em seus pulmões, e sua voz soou baixa, quase inaudível
ao se misturar a música que tocava no rádio.

— O que não pode acontecer? — Fiz-me de desentendida ao desligar o


rádio a fim de ouvi-lo perfeitamente.

— Nós. — A voz grave me arrepiava inteira.

— Por que não? — Coloquei a mão sobre a dele, que segurava o


volante. — O que é isso? — Puxei a sua mão ao perceber que ela estava
machucada.

— Culpa. — Guto puxou a mão de volta e observou os machucados. —


Parece que ainda não me arrependi o bastante.

— Por minha causa? — Senti um aperto tomar conta de mim. O desejo


deu lugar a uma angústia terrível.

— Eu não deveria sentir tesão por você. Isso é errado , Rosi. É a filha
do meu melhor amigo.

— Não é como se tivéssemos algum laço de sangue. — Encarei o seu


olhar com firmeza. Aquele era o primeiro momento em que fiquei perto o
bastante para dizer ao Guto o que eu sentia por ele. — Eu quero você, sempre
quis. — Admitir foi bem mais fácil do que eu imaginava.

— Você é só uma menina. — Tentou desviar o olhar, mas eu não


deixei, segurando o seu rosto com uma das mãos.

— Pareço uma menina para você? — Estufei o peito, chamando a


atenção dele para os meus seios.

Vi um brilho de fogo e desejo relampejar nos olhos do Guto e percebi


que a faísca, que eu tanto queria provocar, finalmente havia acontecido.

Com faíscas, surgiam incêndios.

Guto debruçou sobre mim e me puxou para o seu colo. Finalmente


deixou acontecer. Enlacei o seu pescoço com as mãos e ele me encaixou
sobre o seu quadril. Quando os lábios dele finalmente encontraram os meus,
havia uma mistura insana e energizante de fome e desejo. O pudor foi posto
de lado e ele se libertou das amarras que o impediam de me tocar. Foi muito
melhor do que eu poderia ter imaginado.

A língua do Guto invadiu a minha boca e eu levei a minha até ela. Um


volume se formou na sua calça social e eu me esfreguei nele, rebolando, até
que o meu sexo começasse a latejar, pedindo pelo o que a cueca dele
guardava. Havia beijado alguns caras na minha vida, mas nada se comparava
a aquele momento. A paixão que eu sentia pelo Guto e a vontade de estar
com ele tornavam aquele momento ainda mais intenso.

Ele lambeu e mordiscou os meus lábios antes de descer com a boca


pelo meu pescoço. Eu fechei os olhos, pressionando as pupilas com força ao
me entregar ao ciclone de calafrios e arrepios causados pela umidade e o
calor da sua língua, da sua boca, que deixava um rastro de beijos e mordidas.
Guto raspou os dentes na minha garganta, fazendo-me arfar, enquanto puxava
para o lado a alça da minha blusa e do meu sutiã, deixando o meu ombro
exposto. Logo seus beijos foram parar lá e eu quis que minha vida se
resumisse a aquele momento, a estar nos braços do Gutemberg Toledo.

Ele puxou mais a peça até que o meu seio esquerdo saltasse para fora
do sutiã. Eu não imaginava que iria perder a virgindade dentro de um carro,
mas estava tudo bem para mim, porque eu não queria que ele parasse. A
textura úmida e aveludada da sua língua traçou o contorno do meu seio até
que seus lábios envolveram meu mamilo. Pressionei minhas pálpebras,
fechando meus olhos ainda mais, para que eu não perdesse nenhuma daquelas
sensações de prazer e excitação que jorravam pelo meu corpo.

Com uma mão, Guto mantinha a minha blusa abaixada, usando a outra
para pressionar a minha cintura e me apertar contra a ereção na sua calça. Eu
rebolei mais intensamente nele, pedindo que me tornasse sua. Eu poderia ser
virgem, mas conhecia muito bem aquele desejo. Muitas vezes eu havia me
tocado imaginando como seria ter as mãos dele no meu corpo.

De repente, o Guto parou e soltou um rosnado baixo. Ele estava


irritado e eu não compreendi o motivo; não era possível que estivesse tão
bom só para mim. Ajeitou a minha blusa e me tirou do seu colo, colocando-
me de volta no banco do carona.

— É melhor você pedir um motorista em algum aplicativo. Não posso


levar você. — Ele estava ofegando, seu pau ainda estava duro, mas eu não
entendia por que tinha parado.

— Eu posso faltar hoje. — Aproximei a minha mão da sua calça, mas


antes que eu tocasse o seu pênis, Guto me afastou.

— Não entende que não podemos fazer isso, Rosi?! — Vi os olhos dele
se encherem de lágrimas e vi o semblante excitado dar lugar ao ar de
desolação e culpa.

— Eu quero.

— O que a gente quer não importa. — Segurou o volante,


pressionando-o com força entre os dedos.
— Eu já tenho dezoito anos. O que queremos importa, sim.

— Não quando o meu melhor amigo é o seu pai.

— Ele vai entender...

— Ele vai é me matar. Com toda a razão do mundo. — Balançou a


cabeça em negativa.

— Sempre te amei, Guto. Não tem nada de errado em você me querer


também, pelo contrário. Só me deixa feliz em saber disso.

— Eu sou um homem experiente e você é só uma menina.

— Sou uma boa aprendiz.

— É... Vai para sua aula. — Ele distorceu completamente o que eu


queria dizer com aquela fala.

— Guto...

— Vai para a autoescola , Rosi, e esquece o que aconteceu aqui.

— Guto...

— Por favor, Rosi, vai para a sua aula.

— Tudo bem. — Desci do carro a contragosto e pedi um motorista de


aplicativo para que pudesse ir para a autoescola.

Assim que o carro estacionou na frente da minha casa, olhei para o


Guto ainda parado dentro do dele e suspirei antes de ir.

Quando chegamos mais perto foi que eu percebi que o havia afastado
mais. Eu amava aquele homem e, pelo desejo com que ele me beijou, percebi
que o sentimento era mútuo. Por que não poderíamos simplesmente ficar
juntos?
Capítulo 21

— Caralho! — Urrei ao socar o painel do meu carro.

Eu achei que iria conseguir resistir; fui tolo o bastante para pensar que
a situação não sairia do meu controle, porém, lá estava eu, de pau duro e com
o sabor dela na minha boca. Havia beijado a Rosi como nunca tinha beijado a
Olivia e, por pouco, não a fodi na garagem, sujeito a ser pego no flagra pelo
meu melhor amigo.

Por que o pecado tinha um gosto tão bom?

Um lapso de sobriedade havia trazido a imagem do meu melhor amigo


à minha mente. Se não fosse por isso, teria provado cada parte do corpo da
Rosi sem qualquer pudor. Eu ainda a queria, queria mais do que era capaz de
admitir, por isso eu precisava me afastar. Não poderia passar mais um dia sob
o teto do meu melhor amigo desejando levar a filha dele para cama. Saí do
carro e fui direto ao quarto de hóspedes, jogando as minhas coisas na mala de
qualquer jeito, o mais rápido possível, para que pudesse sair dali com
urgência.

— Bom dia, Guto! — Ricardo me cumprimentou com um sorriso


quando eu saí para o corredor.

Depois do que havia acabado de acontecer entre mim e a Rosi, eu mal


tinha coragem de olhar nos olhos do meu melhor amigo.

— Bom dia, cara. — Abri um sorriso amarelo, sem saber o que fazer.

Havia contado para o Ricardo tudo, a vida inteira, mas não sabia como
reagir diante daquela situação. Se eu fosse pai, não iria querer que um cara,
nem mesmo um desconhecido, falasse para mim sobre desejos sexuais e
amassos com a minha filha.

— Onde está indo com essa mala?

— Ah, a minha mala. — Fiquei ainda mais sem jeito quando ele notou
que eu havia juntado as minhas coisas. Além disso, escondi minha mão para
que ele não notasse os machucados.

— É, o que vai fazer com a mala?

O que poderia dizer para ele? Nunca havia mentido para o Ricardo na
minha vida, mas que opção eu tinha? Falar que a filha dele era a minha maior
tentação não era a melhor alternativa.

— Encontrei um lugar para ficar. Um apartamento, bem menor do que


as casas que compramos aqui, mas o suficiente pra mim, por enquanto.

— Desde quando? Você não me falou nada.

— Desculpa, estava olhando pela internet. — Minha garganta ficava


mais seca a cada mentira que saia pela minha boca. Logo eu começaria a
tossir e iria acabar com toda essa história.

— Você que sabe. — Ricardo deu de ombros. — Sabe que é sempre


bem-vindo aqui.

— Obrigado demais, irmão. — Minha boca se retorceu e o aperto no


meu peito aumentou. Como eu tinha coragem de falar com ele assim depois
do que havia acontecido no meu carro há poucos minutos? Um irmão não
beijava a filha do outro.
— Estou aqui para o que precisar. — Ricardo me abraçou e minha
culpa se tornou ainda maior.

— Obrigado, de verdade. Agora eu vou indo. Nos encontramos no


escritório?

— Sim, até mais tarde.

Arrastei a mala até o meu carro e a joguei no porta-malas. Assim que


fiquei sozinho outra vez no interior do meu carro, eu chorei. Chorei de raiva,
chorei de frustração, chorei, principalmente, porque lá no fundo, bem no
fundo, por debaixo de toda a culpa e arrependimento, em uma parte de mim
onde não havia certo ou errado, estava claro: eu queria a Rosi.

Mas, independentemente de como eu me sentisse, o certo e o errado


existiam, e querer a Rosi era muito errado. De todos os envolvimentos
amorosos que eu poderia ter, aquele era o mais proibido.

Liguei o carro e dirigi para o escritório. Precisava me atolar no


trabalho, esquecer meu desejo proibido, e encontrar um lugar para morar.

Deixei o carro no estacionamento e subi de elevador para o décimo


andar do prédio comercial onde ficava a administração da nossa rede nacional
de supermercados.

Pensei que no meu escritório eu teria paz, mas assim que puxei a
pesada porta de madeira , deparei-me com uma pessoa que não queria ver
sentada na minha cadeira, girando como e a sala fosse dela.

— Bom dia, querido.

— Olivia, o que está fazendo aqui?


— Vim conversar com você. Imaginei que não iria me visitar, então
achei que fosse mais adequado vir até aqui, onde com certeza eu te
encontraria. Bom, estava certa, pois aqui está você.

— É claro que estou. Esse é o meu local de trabalho. — Cruzei os


braços, demonstrando que estava pouco receptivo a ela. — Mas ainda não me
disse o que veio fazer aqui.

— Você foi bem rápido, hein? — Ela abriu a bolsa, tirou uma pasta de
papel e colocou sobre a minha mesa.

— O que é isso?

— Os papéis do divórcio. — Seu advogado foi ágil. Admito que não


esperava recebê-los numa segunda-feira, às seis da manhã.

— Você pediu o divórcio. Aí está. Deveria estar feliz com a


proatividade do meu advogado.

— Achei que fôssemos conversar primeiro antes de decidirmos


definitivamente.

— Conversar? — Revirei os olhos, inconformado com o que ela estava


dizendo. — Não sei se você se lembra, mas tudo o que conseguimos no
último ano foi gritar um com o outro.

— Porque é irredutível. Só consegue ver o seu lado, como se fosse seu


útero que teria que carregar uma criança por nove meses.

— Eu entendi, você não quer filhos. Já conversamos sobre isso. Assine


os papéis e siga a sua vida da forma que desejar. Vai ser o melhor para nós
dois.
— Nossa, como um final de semana longe de mim deixou você
determinado. Achei que fosse voltar correndo para mim, pedindo perdão.

— Pensou errado, Olivia.

— E o que aconteceu, tem outra mulher já?

— Não tem nenhuma outra — disse num tom firme. Em partes era
verdade, pois a mulher que estava roubando o meu sono não poderia ser
minha.

— Para ter me oferecido esse acordo, quer mesmo se livrar de mim. —


Ela folheou os papéis do divórcio.

— Cinco milhões mais a casa, que vale uns dez. Acho que é um bom
acordo.

— Você tem muito mais do que cinco milhões nas suas contas.

— Isso não importa. Caso não se lembre, nós nos casamos com
separação de bens. O dinheiro é meu, eu trabalhei por ele. Acho que cinco
milhões é uma quantia suficiente para que você possa ter uma vida
confortável sem se preocupar com trabalho.

— Ah, claro! Você sempre foi muito generoso — falou em um tom


carregado de deboche.

Não respondi ao ataque dela. Tornar aquele clima horrível ainda pior
não era a melhor alternativa para o momento. Esperava que ela apenas
assinasse os papéis sem criar caso.

— É isso mesmo o que você quer? — A expressão no rosto dela


mudou, assumindo um ar mais triste.
Aquilo deveria ter me deixado mal, mas, pela primeira vez, não me
incomodei. Dentre todas as coisas que estavam acontecendo nos meus
últimos dias, aquele divórcio era a que eu mais tinha certeza de que era o
certo a ser feito.

— Sim, é o que eu quero. Não gostaria que arrastássemos essa situação


por meses ou anos em um divórcio litigioso. Assine esses papéis e saiba que
eu estarei aqui caso precise de mim.

— Lamento que nós dois tenhamos terminado desse jeito. — Ela


puxou uma caneta do suporte que estava sobre a minha mesa e assinou os
papéis.

— Obrigado. — Estendi a mão, esperando que ela me entregasse.

— Ainda quero ser sua amiga. — Abraçou as folhas junto ao peito


enquanto me encarava com firmeza.

— Ainda podemos ser amigos. — Insisti com um gesto para que ela
me entregasse.

Olivia suspirou e me deu os papéis.

— Então é isso. — Levantou-se da minha cadeira. — Você sabe qual é


a minha conta bancária e vou aguardar que o seu advogado me entregue os
papéis transferindo a casa para mim.

— Ele vai providenciar tudo ainda essa semana.

— Ótimo! — Ela passou por mim e me deu um beijo rápido, ao qual eu


não correspondi. — Podemos não ter dado certo como marido e mulher, mas,
se ainda me quiser como amante, pode ir me encontrar. Eu amo ter você na
minha cama.

Deixei que ela saísse sem que eu comentasse algo sobre continuarmos
ou não com encontros sexuais depois do fim do nosso casamento. Essa era
uma outra área que andava muito conturbada na minha vida.

Assim que Olivia fechou a porta do meu escritório ao passar por ela,
peguei o telefone sobre a minha mesa e liguei para o Danilo, dizendo que iria
mandar um motoboy entregar para ele os papéis assinados pela minha ex-
esposa.

Ao desligar a chamada, gritei pela Lena e a minha secretária apareceu


no escritório alguns segundos depois.

— Precisa de alguma coisa, senhor?

— Sim. Quero que encontre para mim o mais rápido possível um


apartamento mobiliado para alugar, de preferência aqui na região. Vai ser
bom ficar aqui perto do trabalho.

— Então, o senhor e a dona Olivia realmente vão se divorciar?

Em outros momentos eu poderia ter achado a pergunta dela um tanto


invasiva, mas, naquele momento, eu tinha coisas muito mais importantes para
me preocupar do que uma secretária curiosa. Passei as mãos pelo meu cabelo,
o empurrando para trás, e respirei fundo antes de voltar a encará-la.

— Já nos divorciamos. — Entreguei a pasta com os papéis do divórcio


para ela. — Peça que um dos motoboys entregue no escritório de advocacia,
nas mãos do Danilo, por favor.

— Sim, senhor.
— Obrigado.

Ela deixou a minha sala e eu fui para trás da tela do computador.


Trabalhar era a melhor coisa que eu poderia fazer para mim mesmo.
Mergulhar em relatórios, planilhas, e números fez com que eu me esquecesse,
ao menos por um momento, do que havia acontecido com a Rosi mais cedo
dentro do meu carro.
Capítulo 22

Mal prestei atenção na aula de legislação da autoescola; depois teria


que ler aquele livrinho que havia ganhado no dia da matrícula. Felizmente,
ainda faltavam vários dias até a prova. Havia algo muito mais importante que
estava roubando cem por cento da minha atenção.

— Eu beijei o Guto! — comemorei, dando um gritinho e um saltinho


de empolgação.

Algumas meninas, que estavam passando ao meu lado pelo caminho


que levava ao prédio da Faculdade de Comunicação, tomaram um susto com
o meu grito do nada e me olharam torto. Não me importei; havia milhares de
pessoas naquela universidade, a chance de eu cruzar com elas de novo era
mínima. E daí se achassem que eu era louca? Estava feliz, não seria um olhar
feio que estragaria o meu dia.

Eu e o Guto havíamos nos beijado no carro dele. E que beijo! Minhas


pernas ficaram bambas só de pensar no incêndio que o amasso havia
provocado em mim. Tudo bem que a situação em si não havia acabado do
jeito que eu gostaria, mas era o primeiro passo. Há um ano, sentir os lábios
do Guto era uma impossibilidade, mas a situação havia mudado.

Subi de elevador até a sala onde teria a minha primeira aula e me sentei
bem no fundo. Iria ficar dispersa como na autoescola e não queria que a
professora ficasse incomodada comigo. Peguei o meu caderno e fiz alguns
desenhos, rabiscando a esmo enquanto me lembrava do sabor dos lábios dele
nos meus, das suas mãos pelo meu corpo, e da sua boca nos meus seios...
Eu queria mais dele, muito mais...

Estava muito ansiosa para que o meu dia acabasse. Mal via a hora de
voltar para casa e vê-lo. Queria que o beijo se repetisse e ansiava para que ele
fosse além. O meu amor platônico finalmente não era mais tão platônico
assim.

Enquanto a professora falava algo sobre cores-luz e explicava como o


branco era formado pelas luzes vermelha, azul, e amarela, puxei o meu
celular da bolsa e mandei uma mensagem para a minha amiga Deborah;
estava muito ansiosa para contar para alguém algo que havia sido, no
mínimo, mágico.

Rolou. No carro dele. Estou pegando fogo até agora.

Demorou tanto tempo para vir alguma mensagem, que nem sabia se ela
iria me responder. Era provável que na cidade do interior onde ela havia ido
morar, o celular nem funcionasse direito.

Rolou o quê?

Um beijo! Guto e eu nos beijamos, e foi mais do que só um


beijo. A forma como ele me pegou e me tocou foi nossa... Uau!
Aquele homem é incrível, Deh.
Beijá-lo foi muito melhor do que eu tinha sonhado.
Nossa! Uau! Achei que isso não fosse acontecer.

Eu também não, mas aconteceu e eu estou nas nuvens.

Então ele também quer?

Bom... Aí, já é outra história. ☹

O que você fez, Rosi? Agarrou o cara? Que feio!

Agarrar ele eu não agarrei.


Mas eu acho que descobri o que impede ele de ficar comigo.

O quê?

A amizade com o meu pai.


Ele acha que o papai não vai aceitar bem o nosso envolvimento.

Isso é obvio. Não acha que o seu pai vai dar um treco quando descobrir
que você quer namorar o melhor amigo dele?

Meu pai é de boa. Dani dorme no meu quarto comigo e ele


nunca falou nada.

Daniel é gay e não é o melhor amigo dele...

— Rosi.

— Hum? — Pisquei meus olhos e percebi que o Daniel estava parado


ao meu lado.
Olhei em volta e vi que todos os meus colgas de classe já haviam saído
da sala, inclusive a professora. A aula já havia acabado e me deixaram
sozinha conversando com a minha amiga por mensagem de celular.

— Estava trocando mensagens com quem? — Dani ofereceu a mão


para que eu me levantasse.

— Com a Deborah. Ela já chegou na cidade nova para onde ia se


mudar.

— Ela está bem? — Daniel colocou as mãos dentro dos bolsos


enquanto caminhávamos pelo corredor na direção do refeitório onde faríamos
o nosso lanche de intervalo.

— Acho que está. Não perguntei. Você sabe como ela é estranha,
muito na dela. Apesar de ser muito diferente de mim, eu gosto daquela
garota. Sinto falta de quando ela morava em São Paulo e eu podia ir até lá
para a gente se ver.

— Ah, eu também gostava de ir. — Ele piscou para mim e me lembrei


do rolo que meu amigo teve com o sombra da Deborah.

— Depois a gente fala sobre ela. Tenho que te contar uma coisa que
aconteceu hoje cedo. — Puxei ele pelos ombros até um corredor lateral diante
de umas salas que estavam sempre vazias.

— Você acordou sem despertador? Seria uma baita surpresa se você


tivesse conseguido — debochou e eu fiz bico.

— Não tem nada a ver com disso. — Empurrei seus ombros.

— Então, o que foi?


— Guto e eu nos beijamos.

— Você está falando sério? — O queixo do Daniel caiu, foi no chão e


voltou. — Não foi só mais um dos sonhos que você teve e está confundindo
com a verdade?

— Não teve nada de sonho. Guto e eu nos beijamos. Foi no carro dele e
foi muito real.

— Você conseguiu. — Gargalhou. — Ele simplesmente beijou você?


Vão namorar agora?

— Quem dera fosse tão simples. — Abaixei a cabeça, chateando-me


um pouco ao meu recordar do que o Guto havia falado comigo depois do
beijo.

— O que ele disse? — questionou o Dani ao perceber que havia algo


de errado.

— Que ele não deveria sentir tesão por mim. Disse que era errado e
está muito preocupado com o que o papai vai achar disso tudo.

— Ao menos um dos dois é sensato.

— Dani! — rosnei, mostrando os dentes. — Você é o meu melhor


amigo, deveria estar ao meu lado.

— Eu sou o seu melhor amigo, por isso mesmo que me sinto na


obrigação de abrir os seus olhos. Rosi, o cara tem o dobro da sua idade e é o
melhor amigo do seu pai. Tem noção do quanto isso é insano?

— Você não dizia isso antes. — Cruzei os braços, estufando o peito,


emburrada.
— Porque eu achei que era óbvio. Amiga, era tipo gostar do Chris
Evans, todo mundo baba nele. Ele tem a idade do Guto, um cabelo e um rosto
lindo, dava fácil para ele, mas é só da boca para fora, porque o cara está lá em
Hollywood e a gente aqui.

— Quem liga para diferença de idade? — Dei de ombros.

— Todo mundo vai ligar.

— Você está dizendo que eu devo desistir do cara que eu amo só


porque as pessoas vão achar que eu não deveria ficar com ele? — Encarei o
meu melhor amigo com firmeza. — Se é assim, você tinha que arrumar uma
namorada e bancar o hétero, só porque é o que os seus pais esperam de você.

Daniel engoliu em seco, e vi a raiva que a minha fala provocou nele


brilhar intensamente em seus olhos.

— Desculpa. — Virei o rosto, sentindo-me mal pelo o que havia falado


para o meu melhor amigo sem pensar. — Não é porque estou frustrada que
tenho o direito de te ofender.

Dani inspirou profundamente e abriu um meio sorriso, puxando-me


para um abraço.

— Você tem razão. Parece louca, mas tem razão. Meus pais iriam
surtar tanto quanto o seu pai se soubessem da verdade. Porém, não quero um
relacionamento hétero só porque eles acham que é o certo. Você ama o Guto,
sempre amou. Acho que a sua situação é tão complicada quanto a minha.

— Não quero ter que escolher um outro cara, um prêmio de


consolação, só porque todo mundo me diz que não posso ficar com quem eu
quero de verdade.
— Entendo, mas e o Guto? Ele quer você?

— Ele está lutando contra isso, porque acha que é errado, só porque as
pessoas dizem que é errado. Não sei onde, porque não tem nenhuma lei que
proíba um cara de trinta e seis namorar uma mulher de dezoito. Porém, hoje,
quando ele me beijou, tive a certeza de que ele me queria.

— Bom, amiga, torço por vocês.

— Obrigada. — Uma lágrima escorreu no canto do meu olho e a


limpei com as costas da mão.

— Vamos comer alguma coisa, que eu estou faminto.

— É, temos que ir antes do início da próxima aula.

— Como se você fosse prestar atenção nela.

— Sempre fui uma ótima aluna. — Dei de ombros e ele riu, como se
não acreditasse em mim, mas, no fundo, eu sabia que era puro deboche.
Capítulo 23

Não consegui um apartamento para me mudar às pressas, e isso não foi


uma surpresa, por mais que eu tivesse esperanças. Porém, teria que dar um
jeito nisso até o fim da semana, pois o Ricardo iria surtar se soubesse que eu
estava morando em um hotel. Infelizmente, não havia como explicar os
motivos para o meu melhor amigo sem correr o risco de perder sua amizade.
A vantagem de se ter dinheiro era que podíamos agilizar as coisas, então, não
precisaria mentir para o meu amigo sobre ter encontrado um apartamento por
muito tempo.

Quando saí do escritório naquele fim de tarde, uma chuva fina caía
mansa e escorria pelos vidros do meu carro. Era como se nem o clima
estivesse em seu melhor momento. Sozinho no carro, parado no trânsito a
caminho do hotel, onde passaria à noite, não me restava mais nada para me
manter longe dos meus devaneios. Liguei o som alto, coloquei uma batida de
rock pesada, que ecoava em minha cabeça, porém, não foi o suficiente para
afastar meus pensamentos, pois a letra da música Forbidden Love do The
Darkness falava sobre um amor proibido. Nada poderia ser mais adequado
para o momento que eu estava vivendo.

♫Nosso amor é proibido

Isso só me faz te querer mais

Eu mantenho tudo escondido


Meu sogro me trataria como um fora da lei

Mas eu não acho que posso simplesmente me sentar e assistir

De longe

Algo tão bonito como você é ♫

Era errado e proibido desejar a Rosi, porém, quanto mais eu dizia para
mim mesmo que não podia, que não deveria, mais eu a queria. Agradecia o
lapso de sanidade, pois, caso contrário, teria transado com ela na garagem do
Ricardo, no local onde meu melhor amigo poderia nos ver e a situação ficaria
ainda pior.

Se eu pudesse apagar aquelas imagens da minha mente e a inquietação


no meu coração, era algo que eu faria sem pensar duas vezes. Eu era um
homem maduro, com a vida feita, já havia batalhado e conquistado minhas
próprias coisas e a minha própria fortuna, dado aos meus pais uma vida que
eles não teriam conseguido sozinhos. Não deveria ter que esconder os meus
sentimentos, não deveria estar morrendo de medo do pai da garota que eu
estava a fim. Rosi me fazia sentir como se fosse um adolescente, alguém com
medo de ser julgado, alguém cheio de incertezas.

Rosi poderia ser uma mulher agora, mas não era uma mulher para mim.
Qualquer sentimento que eu nutrisse por ela era errado e proibido. Deveria
usar todas as minhas forças e energias para mantê-lo escondido no canto mais
obscuro de mim. Ricardo não iria saber o quanto eu desejava a filha dele e eu
nunca mais iria tocar a Rosi.

Iria inventar desculpas e ficar o mais longe dela possível. Seria


doloroso, tinha certeza disso, mas era melhor lidar com a dor de esconder os
meus sentimentos do que perder o meu melhor amigo. Ser pai era um dos
meus maiores sonhos e eu poderia me dedicar a ele, adotar uma criança e
tornar ela a minha prioridade, sem me preocupar com as confusões que uma
mulher poderia trazer para minha vida.

Estacionei na entrada coberta do hotel e entreguei a minha chave para o


manobrista antes de dar a volta no carro e pegar a minha mala. Desviei de
uma poça de água que estava no meu caminho até a recepção e segui até o
balcão, debruçando-me perto de onde uma mulher mexia distraidamente no
celular.

— Boa noite. Meu nome é Gutemberg Toledo. A minha secretária fez


uma reserva para mim de uma suíte.

Ela levantou o olhar do celular e buscou o meu rosto e, assim que me


encontrou, um sorriso surgiu nos seus lábios e ela passou a mão pelo cabelo.
Porém, seu sorriso se apagou quando ela viu a marca que o sol fez no local
onde ficava a minha aliança. Não me dei ao trabalho de explicar que era um
homem divorciado.

— Gutemberg Toledo? — Correu os olhos pela tela do computador.

— Isso.

— Vai ficar no mil e três. — Pegou um cartão-chave na parte de baixo


do balcão. — É só discar o número zero no telefone em seu quarto que você
consegue falar aqui na recepção, caso precise de algo. — Piscou para mim e
eu percebi que ela não estava mais se importando se eu era ou não casado.

— Obrigado. — Peguei o cartão-chave e segui para o elevador


arrastando a mala.

Quando eu entrei no quarto, teve algo que me deixou animado: lembrar


que teria de volta um banheiro só para mim, sem me preocupar com o cheiro
que o Rodrigo deixava no ar ao usar o vaso ou em me deparar com a Rosi
pelada.

A Rosi...

Jurava que estava tentando manter o nome e a imagem dela fora da


minha mente. Contudo, estava me sentindo como um viciado. Ora ou outra,
eu era pego em uma armadilha, pensava em uma coisa boba que me fazia
lembrar dela e isso provocava uma recaída.

Ela era proibida para mim, mas, às vezes, parecia difícil me lembrar
disso. Desabotoei o meu blazer e o coloquei sobre uma poltrona ao lado da
cama, e fiz o mesmo com a minha camisa, antes de tirar os sapatos, a calça e
a cueca. Precisava de um banho relaxante, depois do gelado que havia
tomado pela manhã.

Abri a porta do banheiro, depois o box e o registro do chuveiro.


Tombei a cabeça, para que a água descesse pela minha nuca e escorresse por
todo o meu corpo. Deixei que a água lavasse minhas frustações, minhas
tristezas e, principalmente, o meu tesão.

Diziam que não se mandava no coração e que, às vezes, a escolha dele


poderia ser a mais improvável, porém, o meu não poderia escolher aquela
garota. Tinha que escolher outra, porque a Rosi não era para mim.

— Ela não é para mim — murmurei, ao socar a parede azulejada,


recordando-me que meus dedos ainda estavam machucados.
Fechei os olhos e a minha boca salivou com a imagem dos seios firmes
e redondos que a Rosi tinha. Lambi os lábios ao me recordar do sabor de ter
um deles dentro da minha boca. Meu pau ficou duro apenas com a imagem
mental dela rebolando no meu colo.

Como era difícil lutar contra aquele desejo. Eu estava falhando


miseravelmente. Nenhuma mulher, não importava a idade, havia despertado
algo assim em mim antes. Estava me sentindo uma criança birrenta, quando
os pais diziam que não deveria fazer algo, que não podia fazer, mas a criança
ia lá e fazia.

Queria arrancar aquela tentação de mim. Por que era tão difícil?

Eu amo você, Guto... A voz doce da Rosi ecoou na minha mente,


tornando a minha situação ainda mais complicada.

— Por que, Rosi? Com tantos homens da sua idade, por que gostar de
mim?

Havia outra coisa que eu estava esquecendo. A Rosi já tinha um


namorado. Um garoto que tinha a idade dela e que o Ricardo apoiava. Não
deveria ficar entre os dois, para o bem de todo mundo.

Virei a cabeça e deixei que a água escorresse pela minha nuca e


aliviasse a tensão sobre os meus ombros.

Deixei que os meus pensamentos vagassem e, outra vez, eles foram


para a imagem do corpo nu dela enquanto entrava no chuveiro para tomar
banho. Pensei que se fosse outra garota, que se não tivéssemos todos os laços
que tínhamos, eu teria entrado com ela, pressionando-a contra o box enquanto
esfregava o meu pau entre as suas pernas. Eu a teria feito se empinar para
mim e metido sem pensar duas vezes. Teria passado as minhas mãos nas
curvas daquele corpo lindo e a feito gemer bastante.

Quando dei por mim, estava com os olhos fechados e a mão no pau. Na
minha mente, eu me encaixava na Rosi e ela deitava a cabeça no meu ombro,
gemendo baixinho, enquanto eu começava a me mover em seu interior.
Deveria ser quente e apertada... a sua bunda macia esfregando em mim
tornaria tudo ainda mais delicioso. Gozei, pensando no quanto gostaria de
estar dentro dela.

Ao menos ainda era dono dos meus próprios pensamentos. Enquanto


eu fizesse sexo com a Rosi apenas em pensamentos, tudo estaria bem, ou era
o que eu acreditava.
Capítulo 24

— Pai, onde está o Guto? — Não sabia se era adequado fazer aquela
pergunta, mas quando vi o meu pai chegar sozinho e se sentar na sala como
fazia todos os dias para ver o jornal, fiquei curiosa. Estávamos na sala de
jantar, horas já haviam se passado e nenhum sinal dele. Como sempre
chegava com o meu pai, deveria haver algum motivo para ele ainda não estar
ali.

— Guto arranjou um apartamento para ele. — Meu pai fincou o garfo


em uma rodela de linguiça, que estava em seu prato, e a comeu.

— Ah!

Eu não possuía qualquer prova disso, mas a sensação que eu tive era
que ele estava fugindo de mim. Certamente, ele se preocupava mais com o
que as outras pessoas e o meu pai pensavam do que com o que sentíamos um
pelo outro.

Guto me queria, mas parecia que isso não era o bastante.

Foquei no meu jantar, ou ao menos tentei, empurrando um brócolis de


um lado para o outro do prato, sem a menor vontade de comê-lo. Doía pensar
na possibilidade de que talvez nunca fôssemos ficar juntos.

Depois de ter comido com muito esforço, empurrei a cadeira, fui até a
cozinha lavar a louça e subi para o meu quarto. Tinha uns textos da faculdade
para ler e um trabalho para concluir.

Precisava me lembrar de que havia passado anos sem qualquer


interação física com o Guto; não podia esperar que do dia para noite nos
tornássemos amantes.

Talvez o Dani, me botando para baixo e dizendo que não ia rolar,


estava apenas tentando me proteger de uma frustração ainda maior. Quebrar a
cara não era fácil.

Entrei no meu quarto, fechei a porta e me permiti pegar um livro para


ler antes de ter que mergulhar nos textos tediosos da faculdade. Era indicação
da Deborah que, apesar de ser virgem como eu, adorava os eróticos. Ficava
me perguntando se na vida real teria toda aquela magia dos livros. Bom, no
carro com o Guto, foi ainda mais quente do que qualquer livro que eu havia
lido por indicação dela.

Cheguei em uma cena que a protagonista estava no carro do cara e um


beijo havia avançado muito rápido para um sexo oral. A forma como ele se
introduzia dentro da boca dela me deixou salivando e me perguntei se Guto e
eu teríamos chegado nesse ponto se ele não houvesse interrompido o nosso
momento.

Minha mãe entrou no meu quarto sem bater e eu fechei a capinha do


kindle. Não que ela se incomodasse se eu lia ou deixava de ler cenas de sexo,
porém, ainda assim, eu ficava envergonhada.

— Oi, mãe.

— Oi, Rosi. — Ela fechou a porta e eu franzi o cenho.

Fazia um bom tempo que a minha mãe não aparecia no meu quarto
daquele jeito. Na adolescência, costumava ser para me dar broncas longe do
meu pai e do meu irmão.
Ela se sentou na minha cama e bateu no colchão ao lado dela para que
eu me sentasse ali. Ao fazer isso, ela me deu a certeza de que pretendia
conversar comigo. Se era para me dar uma bronca ou um conselho, eu só
descobriria em breve.

Sentei-me perto dela e minha mãe virou de lado para me encarar.

— O que foi? — Mordi o lábio.

— Você e o Guto.

— O que tem ele? — Fiz-me de desentendida, mas, no fundo, estava


me perguntando se o Guto havia contado para a minha mãe o que havia
acontecido entre nós dois.

— Ele foi embora por sua causa, não foi?

— Por que está dizendo isso, mãe?

Ela sempre foi ótima em arrancar informações de mim, mesmo quando


eu não queria dizer, mas não poderia deixar que isso acontecesse, não
daquela vez.

— Rosemeire? — Afunilou os olhos.

— Oi, mãe.

— O que você fez?

— Não fiz nada.

— Você jura?

Engoli em seco, aquilo era golpe baixo.


Quando eu era criança, mamãe sempre me dizia que se eu jurasse em
vão, algo terrível iria acontecer com ela. Desde esse momento, eu nunca mais
jurei sobre nada que não tivesse absoluta certeza.

Fiz que não.

— Quero saber o que aconteceu, filha. Não adianta me dizer que não
houve nada. Conheço muito bem o Gutemberg, e ele ficava superestranho
perto de você. Parecia fazer de tudo para te evitar.

Olhei para o chão, fitando as unhas feitas dos meus pés. Entendi toda a
dificuldade que o Dani tinha em dizer para a família dele que era gay. O
medo de ser julgada era muito grande, porém, a minha mãe costumava ser
uma pessoa muito insistente, e eu não teria paz até que ela arrancasse de mim
a verdade.

— Rosimeire.

— Oi, mãe.

— Você ainda não me respondeu. — Puxou o meu rosto pelo queixo e


fez com que eu a encarasse.

— Não tem nada para te responder, mãe.

— Acha que a sua mãe que te carregou nove meses no ventre não sabe
quando tem algo acontecendo? Ele fez algo com você, querida?

— Quê? Não! — respondi para que a minha mãe não criasse nenhuma
imagem mental ruim do Guto, porém, acabei dizendo rápido demais. — Bom,
ele não fez nada que eu não quisesse.

— Que história é essa, Rosimeire? — Ela fechou a expressão, ficando


bem séria, parecendo um cão prestes a me atacar.

Mordi a língua ao perceber que havia trocado os pés pelas mãos e


acabara me entregando.

— História nenhuma.

— Vai me contar ou prefere que eu chame o seu pai para termos uma
conversa em família?

— Por favor, deixa o meu pai fora disso.

— Então fala. — Cruzou os braços.

Segurei o fôlego, fechando os olhos. Era a minha vez de sair do meu


armário, ao menos para a minha mãe.

— Eu amo o Guto, mãe.

— Como assim, Rosimeire?! — ela gritou, e eu balancei as mãos para


que falasse mais baixo. Não queria que a minha confissão virasse um grande
escândalo.

— É o que a senhora ouviu, mãe. — Voltei a desviar o olhar para o


chão. Minha mãe costumava ser um porto seguro para mim, sempre estava lá
para me apoiar, mas, naquela situação, eu não sabia como ela iria reagir, pois
até os meus melhores amigos achavam que eu tinha que desencanar dele.

— Não faz sentido... — Balançou a cabeça, confusa.

— Essas coisas do coração precisam fazer sentido, mãe?

Percebi que a deixei sem palavras, mas ela continuou me encarando,


pensando no que deveria me dizer em seguida.

— Guto é mais velho do que eu, filha.

— O papai também.

— Mas a minha diferença de idade para o seu pai é de cinco anos e não
de dezoito.

— E daí? — Dei de ombros.

— E daí que você é uma menina e ele é um homem feito.

— Era por isso que eu não queria contar. — Me levantei da cama, mas
a minha mãe me segurou pelo pulso e me puxou de volta.

— O que aconteceu hoje? — insistiu a minha mãe.

Não queria contar, porém, senti a necessidade, e sabia que ela não iria
me dar paz.

— Ele ia me levar para a autoescola, mas acabamos nos beijando no


carro dele. Ele disse que não deveríamos ter feito aquilo e me mandou pedir
um motorista por aplicativo.

Minha mãe balançou a cabeça em negativa enquanto massageava as


têmporas.

— Agora está explicado o porquê dele sair praticamente fugido daqui


de manhã, que nem se deu ao trabalho de se despedir de mim.

— É... — Resmunguei baixinho, sem saber ao certo o que dizer.


Definitivamente, eu não estava contente por ele ter ido embora.
— Querida, o Guto não é homem para você. — Ela afagou o meu
ombro ao me direcionar uma expressão de conforto. Seu olhar era gentil, mas
as palavras me machucaram.

— Não acha que sou eu quem tem que definir isso, mãe? Seus pais
também achavam que o papai não era o cara certo para você e te expulsaram
de casa quando você não quis me abortar. Se você não tivesse seguido o seu
coração, eu nem estaria aqui. — Meus olhos se encheram de lágrimas e
minha mãe também chorou.

Ela me abraçou apertado e me puxou para o colo dela. Eu havia tocado


em um ponto muito delicado. Quando meus pais começaram a namorar, papai
não tinha nada e a família da minha mãe achava que os dois não tinham
futuro. Tudo piorou quando ela engravidou de mim. Anos depois, quando o
meu pai já tinha ficado rico, a família da minha mãe tentou se aproximar de
nós, mas já não tinha mais espaço para eles nas nossas vidas.

— Eu vou apoiar você na escolha que tomar seguindo o seu coração.


— Ela me deu um beijo na testa e passou as mãos pela lateral dos meus
olhos, removendo as lágrimas que ainda havia ali. — Porém, querida, isso
não significa que as coisas serão fáceis. Lutar contra o que acham que
devemos ser ou fazer é sempre muito mais difícil.

— Mas a senhora conseguiu.

— É, eu consegui.

— Espero conseguir também. — Joguei para trás os fios do meu cabelo


que estavam caindo sobre o rosto.

Ficamos abraçadas por um momento e me deixou feliz saber que eu


teria o apoio dela. Havia sido difícil dizer, mas, no fundo, fora o melhor.
Capítulo 25

Assisti a semana passar mergulhado no trabalho, nos números, e no que


eu sabia fazer de melhor, ganhar dinheiro. Sem o contato constante com a
Rosi, estava conseguindo voltar ao meu normal. Lá pela quinta-feira, parei de
ter sonhos eróticos com ela e de ter que me aliviar em seguida. Porém,
mesmo que o desejo sexual não estivesse mais tão aflorado pela falta de
contato com o corpo dela, a diminuição não resolveu muita coisa, pois
percebi que era mais do que apenas sexo.

Desejava estar perto dela, queria poder ouvir sua voz, ou apenas
observar o seu sorriso. Essa vontade aumentava exponencialmente a cada dia
que passava sem vê-la. Esse deveria ser o tal sentimento que chamavam de
saudade.

— Senhor. — Lena entrou na minha sala e percebi que estava quase


caindo sobre a tela do computador. — Cansado?

— Tive algumas noites mal dormidas.

— Algo que eu possa ajudar?

— Não, mas eu agradeço a sua gentileza.

— É sobre o divórcio?

Ah, o divórcio... fui casado com a Olivia por cinco anos, mas, na última
semana, eu não tinha pensado nela e nem em nenhum dos momentos em que
vivemos juntos. Talvez eu devesse estar triste, lamentando pelo fim do meu
casamento, porém, eu sentia um certo alívio. Era horrível pensar assim, mas
parecia que eu havia me livrado de um obstáculo na minha vida. Eu estava
livre, mas livre para quê?

Para Rosi...

Eu ri, mas, no fundo, estava rindo de tristeza por minha cabeça sequer
cogitar aquela possibilidade. Não adiantava nada eu ficar livre para a Rosi,
pois ela nunca poderia ser minha, nem que eu jamais tivesse me casado.
Talvez, se eu tivesse dez anos a menos e o Ricardo não fosse o meu melhor
amigo, mas esses eram dois fatores que eu não poderia mudar.

— Senhor? — Lena me chamou e eu percebi que estava perdido em


meus pensamentos novamente.

— É, divórcio sempre é complicado.

— Está arrependido? A Olivia é tão linda e gentil.

— Arrependido? — Arqueei uma sobrancelha. — Não, Lena, não estou


arrependido do divórcio; essa foi uma das decisões mais sensatas que tomei
nos últimos dias. Olivia pode ser uma ótima mulher, mas nunca foi a certa
para mim.

— Ainda faz pouco tempo. Pode ser que se arrependa.

— Tenho certeza de que não irei, mas sei que não entrou aqui para
falar sobre o meu divórcio. O que foi?

— O corretor de imóveis está lá fora. Ele veio até aqui para


acompanhá-lo na visita a alguns empreendimentos.

— Ah, sim! — Abaixei a tela do notebook e peguei minha carteira, o


celular, e as chaves do carro na gaveta. Fiquei me perguntando por que a
Lena não havia dito logo que o cara estava me aguardando ao invés de
desviar o assunto para algo que eu não queria falar a respeito. — Eu vou sair
com ele, mas volto mais tarde. Se o Ricardo perguntar aonde eu fui, diga que
saí para encontrar um possível investidor.

Ela moveu os olhos, provavelmente estranhando o fato de eu ter pedido


para contar uma mentira para o meu melhor amigo, porém, não questionou.
Não queria que o Ricardo soubesse que eu havia passado os últimos dias num
quarto de hotel ou acabaria insistindo para que eu voltasse a ficar na casa
dele.

Das poucas coisas que eu tinha tanta certeza, uma era o fato de que
acabaria fazendo besteira se continuasse tão perto da Rosi. Muito sêmen
havia descido pelo ralo do banheiro do hotel enquanto eu pensava nela.

Saí da minha sala e encontrei o corretor de imóveis sentado em um


sofá, que ficava diante da mesa da Lena. Era ali que as pessoas esperavam
para que pudessem falar comigo. Muitos que conheceram Ricardo e eu
quando ainda éramos moleques e andávamos de chinelo remendado, jamais
imaginariam que alcançaríamos àquela posição algum dia.

— Bom dia, senhor Toledo. — O corretor estendeu a mão para me


cumprimentar e eu a apertei.

— Bom dia.

— Eu separei alguns apartamentos aqui na região, que acredito que


irão agradá-lo. Tem alguns à venda e outros para locação.

— Podemos ir? — Apontei para o elevador.

— Claro. — Ele me seguiu e apertei o botão para o térreo do prédio


comercial.

Não queria ficar conversando na entrada da minha sala pela


possibilidade do meu melhor amigo interceptar a nossa conversa e descobrir
que eu ainda estava procurando um lugar para ficar.

— Eu queria apenas uma locação. Seria um lugar provisório.

— Pretende comprar algum definitivo em breve?

— Eu gostava da casa que deixei para minha ex-esposa, mas não sei o
que quero agora; pretendo ter um tempo para pensar antes de decidir qual
rumo vou tomar para minha vida.

— Compreendo, por isso a locação?

Fiz que sim.

Nós dois caminhamos até onde o carro dele estava estacionado junto à
uma vaga na rua e aceitei a carona para que ele me levasse ao primeiro
endereço, que ficava apenas a poucas quadras dali.

O exterior do prédio era moderno e eu o analisei bastante antes de


descer do carro. Pela altura, deveria ter uns vinte ou trinta andares. Eu
costumava gostar mais de ambientes menos tumultuados e mais familiares,
mas poderia comprar uma casa depois em outro condomínio fechado. Talvez,
até no mesmo, assim que conseguisse vencer a impulsividade de beijar e
transar com a Rosi.

Passamos pela recepção e seguimos até um dos elevadores.

— Você pode ver a excelência do acabamento. — Ele apontou para o


chão e eu vi que era feito de granito escuro.
— Esse é um prédio comercial com alguns apartamentos residenciais?

— Não. Ele é todo residencial. Tem flats e apartamentos de dois


quartos, que geralmente são alugados por empresários como você para visitas
rápidas ou ponto de reuniões.

— Reuniões? — Franzi o cenho e ele riu.

Pela cara do corretor, eu soube que não seria uma surpresa se alguns
dos inquilinos daquele prédio usassem o lugar como um motel particular.
Porém, não cabia a mim julgar quem se deitava ou não nas camas ali. Eu
apenas precisava de um canto para ficar por um tempo até que que decidisse
qual rumo iria dar para a minha vida.

Entramos no elevador e o corretor me levou até o vigésimo quarto


andar. Saímos em um corredor muito bonito. O piso era o mesmo granito
escuro da entrada e as paredes tinham um efeito 3d com retângulos brancos
saltando. A iluminação do teto era embutida nas molduras de gesso e
provocava um efeito muito bonito. Realmente era um prédio de luxo.

Caminhamos até uma porta com o número 2405 contido nela e o


corretor a abriu com uma chave que carregava consigo.

— Esse é um flat. Também tenho um apartamento com dois quartos no


fim do corredor, mas como você disse que estava procurando um lugar para
morar sozinho por um tempo, acredito que esse possa ser o mais adequado.

Entrei no apartamento com o homem e ele acendeu a luz para que eu


pudesse observar melhor o ambiente. Apesar de ter apenas um quarto, a sala
era bastante espaçosa. Continha um sofá largo no tom cinza, uma mesa de
centro em vidro, e uma enorme televisão. Havia até uma estante cheia de
livros, que me fez recordar daquela que eu vira no quarto da Rosi.

Suspirei, balançando a cabeça. Não seria nada fácil parar de pensar


nela se a todo tempo eu via algo que me lembrava daquela menina.

A sala era separada da cozinha por uma meia parede no estilo


americano. Segui sozinho até a cozinha e abri a geladeira com duas portas na
vertical e um dispenser em uma delas, bem parecida com a que eu tinha na
casa que deixei para a Olivia. Pensar nisso me fez recordar que eu precisava
buscar os meus pertences, como roupas, livros, sapatos e outras coisas que
ainda estavam lá.

— O quarto fica aqui.

Fechei a porta da geladeira e segui a indicação do corretor. Passei por


um pequeno corredor que levava a um quarto com uma enorme cama e um
guarda-roupa espaçoso, e vi uma porta aberta que levava a um banheiro.

— Não tem nenhum banheiro social?

— Não, apenas esse. É um espaço pensado para morar sozinho.

— Compreendo.

Sozinho... A palavra ecoou na minha mente e fincou no meu peito,


afiada, como se fosse uma estaca. Queria tanto uma família, mas, no fim,
tinha me divorciado e iria me mudar para um local com espaço apenas para
mim.

— O que achou? — O corretor parou na minha frente com um sorriso


simpático e a empolgação de quem esperava fechar negócio.

— Gostei. Gostei , bastante. Quando posso me mudar?


— Vou agilizar os papéis para que possa se mudar amanhã.

— Consegue agilizar um pouco mais rápido para que eu me mude


ainda hoje no fim do expediente? Não queria ter que passar mais uma noite
em um quarto de hotel. Estou sentindo falta do meu próprio espaço.

— Compreendo, senhor. Farei o possível.

— Obrigado.

Nós voltamos pelo mesmo caminho e ele me levou de volta para o


prédio onde eu trabalhava. Porém, antes de voltar para a minha sala, peguei o
meu celular e liguei para a Olivia. Ela atendeu logo após alguns toques e eu
me sentei em uma das poltronas da recepção para conversar com ela.

— Guto!

— Oi, Olivia, tudo bem? — perguntei por mera cordialidade.

— Poderia estar melhor.

— Uma pena que não esteja.

— Nossa! Você tinha o hábito de ser mais carinhoso comigo.

— Ainda sou o mesmo cara.

— Se você está dizendo...

— Olha, Olivia. Não liguei para você para que discutíssemos. O


divórcio foi justamente para fazer isso parar.

— Então, me ligou para quê? — Manteve o tom ríspido, mas eu o


ignorei. Ela havia dito que queria que continuássemos amigos, mas sabia que
isso era bem difícil de acontecer.

— Tem muitas coisas que eu deixei na casa. Posso passar aí mais tarde
para buscar?

— Hoje? — Seu tom de voz mudou do arredio para o surpreso.

— Se não puder , podemos combinar outro dia da semana.

— Não! Pode ser hoje. Que horas espero você?

— Vou passar aí depois que sair da empresa. Deve ser lá pelas sete.

— Ótimo! Vou aguardar.

— Se pudesse já ir empacotando as minhas coisas, eu ficaria muito


grato.

— Tudo bem.

— Obrigado, Olivia.

— Por nada.

Desliguei a chamada e guardei meu telefone. Iria pegar as minhas


coisas na casa , que agora era da Olivia , e começaria uma nova etapa da
minha vida.
Capítulo 26

Achei que, contando para a minha mãe o que eu sentia pelo Guto e a
nossa situação, as coisas fossem ficar mais fáceis. Em uma realidade utópica,
ela contaria para o meu pai, ele diria ao amigo que aprovava o nosso
relacionamento, e seríamos felizes para sempre, porém, isso não aconteceria
nem nos meus sonhos.

Já fazia uma semana que eu não via o Guto. Queria perguntar para o
meu pai como ele estava, já que se viam todos os dias no trabalho, porém,
tive medo de que pudesse causar alguma reação ruim.

Estava arrependida pela forma como agi com ele, fui com sede demais
ao pote e acabei o espantando. Talvez , se eu não tivesse me insinuado tanto ,
ele ainda estaria hospedado na minha casa.

Meu celular vibrou na escrivaninha e levantei os olhos de um texto da


faculdade para ver quem havia mandado mensagem. Sorri ao perceber que
era a minha amiga Deborah. Odiava o fato do pai dela ser tão mala ao ponto
de levá-la para uma cidade onde Judas perdeu as botas, lá na esquina com o
fim do mundo. Porém, ela parecia estar ganhando um pouco mais de
autonomia do que a que tinha em São Paulo e isso era bom para ela.

Esse é o Bulldog.

Logo abaixo da mensagem dela havia uma foto de um cara. Ele era
alto, com cabelo castanho e musculoso. Pelos traços do rosto, imaginei que
pudesse ter a idade do Guto, ou algo parecido. Ela estava reclamando do jeito
do cara e da rivalidade que ele tinha com o seu pai, porém estava achando
que era mais no nível do quem desdenha quer comprar.

Ele é casado?

Rosi!!!

Se ele não for , já facilita muito as coisas.

Só você mesma. Ele é velho demais para mim.

Não sou como você que gosta desses caras bem mais velhos.

Não é como se eu gostasse de todos, tá?

Eu gosto de um em específico. Só do Guto.

Mesmo se... mas só, se eu tivesse qualquer interesse nele, não ia


rolar .

Por que não?

Meu pai nunca iria aprovar.

Então, bem-vinda ao clube.

Por que está dizendo isso? Achei que o seu pai fosse um cara
legal.

Ah, meu pai é um cara legal, sim. Porém, parece que não é
legal o bastante para aprovar um relacionamento entre mim e o
Guto.
Já falou para ele?

Claro que não!

Então, como sabe que ele não vai aprovar?

Porque é o que todo mundo diz.

Entendi. Nossa! Que chato.

Nem me fala. Achei que eu e o Guto finalmente teríamos


alguma coisa, depois do que rolou no carro, mas ele foi embora.

Kkkk Ele fugiu de você?

Vai rindo. Queria ver se fosse você no meu lugar.

Ainda bem que não sou eu.

Ah, deixa isso para lá! Vamos mudar de assunto. Terminou de


ler aquela série?

Devo começar o dos filhos hoje.

Ansiosa para saber como o pai dela vai reagir com o namoro.

Ele surta kkkk.

Você já leu?

Estou no capítulo dez.

Me espera que eu vou te alcançar.

Pode ir. Estou lendo umas coisas da faculdade agora.


Mando mensagem para você mais tarde com o que estou
achando.

Beleza. Beijos!

Voltei minha atenção para os textos da faculdade, folheando sem


qualquer interesse. Era difícil manter os meus pensamentos longe do Guto e
no que ele poderia estar fazendo naquele momento.

Será que ele não havia gostado do beijo tanto quanto eu? Bufei,
soltando o ar com força. Não era possível que um mesmo momento pudesse
ser tão diferente para duas pessoas. A forma como ele tinha me beijado e
percorrido o meu corpo com as mãos e com a boca, dava a impressão de que
ele estava gostando bastante, mas será que o Dani e o os outros estavam
certos? O Guto não era homem para mim?

Odiava estar vivendo aquele dilema. Era tão injusto gostar tanto de
uma pessoa e não poder simplesmente ficar com ela.
Capítulo 27

Ouvi uma batida na porta e levantei a minha cabeça da tela do


computador. Ricardo entrou alguns segundos depois, com o maior sorriso do
mundo nos lábios e parou diante da minha mesa, apoiando as suas mãos nela.

— Já está tudo resolvido com o Bulldog e a AMontreal. Esse contrato


será um grande passo para a nossa rede.

— Tenho certeza que sim — falei, fitando o quadro do pôr-do-sol, que


estava em uma das paredes atrás do meu melhor amigo.

— O que foi? Parece tão disperso. — Ele tombou a cabeça na minha


direção, afunilando os olhos para que pudesse me analisar melhor.

— Só ando pensando demais esses dias. Muito mais do que eu deveria.

— No divórcio?

Fiz que sim e ele afagou o meu ombro.

— Vou até a minha antiga casa buscar algumas coisas que deixei lá e
terei que encontrar a Olivia.

— E é isso que está te deixando tão perturbado?

— É. — Abri um sorriso amarelo. Mentir para o meu melhor amigo


estava se tornando uma atividade cada vez mais frequente. Não gostava de
pensar nisso, pois me incomodava demais.

Se o Ricardo soubesse quantas noites eu havia passado em claro nos


últimos dias pensando na filha dele, duvidava muito que fosse continuar me
encarando com aquele sorriso todo e aquela expressão afetuosa.

— A Margarida vai fazer um ensopado para o jantar e queria saber se


você não quer ir lá para casa mais tarde. Acha que vai demorar muito lá na
Olivia?

— Acho — respondi, rápido demais e tão enfático, que fiz o meu


amigo recuar com o susto. — É, eu acho. — Tentei me retratar usando um
tom mais descontraído e Ricardo parou de me encarar com os olhos
arregalados. — Tenho muitas coisas lá. Até juntar tudo e empacotar, vai levar
bastante tempo.

— Entendo. Que pena! Mas podemos deixar para outro dia.

— Sim, outro dia será perfeito.

— Está se adaptando em morar num apartamento?

— É bem melhor do que eu imaginava — menti, mas fiz o possível


para que ele não percebesse.

— Sabe que minha casa vai sempre estar de portas abertas para você.

— Sei e te agradeço demais por isso.

— Amigos são para essas coisas. — Ele deu uns tapinhas no meu
ombro. — Sei que, se eu estivesse no seu lugar, você estaria fazendo o
mesmo por mim.

— Pode apostar que sim.

Lembrei-me da Rosi, de tudo o que estava sentindo por ela, e do que


havia acontecido dentro do meu carro na garagem do Ricardo. Tinha certeza
de que ele não estaria dizendo aquilo se soubesse. Porém, o que eu poderia
fazer? Contar e deixar que a nossa amizade de décadas acabasse? O melhor
que pude fazer foi me afastar da Rosi. Longe da tentação, a vontade de pecar
desapareceria. Por mais que eu gostasse da Margarida e do Rodrigo, iria
evitar a casa do meu melhor amigo por um tempo; isso faria com que a
situação com a Rosi não me enlouquecesse tanto.

— Bom, então nos vemos amanhã. — Ricardo sorriu para mim. — Boa
sorte com a Olivia. Se seguir seu coração, tudo ficará bem. — Ele acenou e
deixou a minha sala.

Tinha certeza de que se o Ricardo soubesse a verdade em meu coração,


não iria me dizer para ouvi-lo. Seguir o meu coração significava ir atrás da
Rosi e isso era algo que eu não poderia fazer.

Assim que o expediente terminou, eu finalizei o envio dos últimos e-


mails e relatórios, peguei a minha carteira e a chave do carro, que deixava na
primeira gaveta da escrivaninha, e saí para ir até a Olivia. Estando
divorciados e a casa pertencendo a ela, não havia motivos para deixar coisas
minhas lá. Isso apenas abriria precedentes para discussões que não deveriam
mais existir.

Desci de elevador até a garagem do prédio, entrei no meu carro e liguei


o som. Ouvindo batidas de rock que vibravam na minha alma, segui para a
rua, dirigindo até a casa onde eu me acostumei a morar nos últimos sete anos.
Conseguir comprá-la havia sido um grande marco na minha vida; de garoto
que morava em uma casa pequena e mal-acabada ao homem dono de uma
mansão. Eu tinha evoluído muito e chegado a uma posição em que poucos
apostariam, até mesmo os meus pais.
Ao pensar neles, eu me recordei que nem havia falado sobre o divórcio,
mas esse seria um assunto para outro dia, pois não estava com saco para ouvir
a minha mãe defender a Olivia e dizer o quanto ela era uma mulher ótima
para mim. Isso apenas eu poderia decidir.

Dirigi quase em modo automático e, quando dei por mim, já estava


passando pela catraca do condomínio fechado onde a casa ficava. Segui por
mais algumas ruas até acionar o controle e entrar pela garagem. Pelo visto,
Olivia ainda não havia retirado os meus acessos.

Joguei a chave do carro no bolso e segui até a sala, esperando ver todas
as minhas coisas empacotadas em algumas caixas, para que eu pudesse ir
embora o mais rápido possível. Porém, não estavam lá. Olivia,
possivelmente, nem havia se dado ao trabalho de pedir que uma das
empregadas juntasse as minhas coisas por ela.

— Olivia? — chamei da sala, antes de ir entrando ao me recordar de


que a casa não era mais minha.

— Guto, estou no quarto. Pode vir aqui?

— Estou indo. — Subi a escada ao seguir o som da voz dela e parei na


porta do que antes era o nosso quarto.

O cômodo estava silencioso e se não fosse por ter ouvido a voz dela há
alguns minutos, eu teria achado que a Olivia não estava ali. Empurrei a porta
e entrei a passos lentos, mesmo sabendo que havia sido convidado a entrar.

— Olivia?

— Estou aqui.
Virei a cabeça e a vi sentada na cama. Ela estava com uma fina
camisola de seda e os cabelos escuros soltos ao redor do rosto, emoldurando-
os. O que havia dado nas mulheres para quererem usar tantas roupas
provocativas diante de mim? Ou não usar roupa nenhuma... lembrei-me da
Rosi nua na minha frente e essa imagem me perturbou. Deveria apagá-la da
minha memória, precisava, mas simplesmente não conseguia.

— Desculpa. Não sabia que você já estava indo dormir. Se quiser, eu


posso voltar outro dia.

— Não, Guto! — Ela se aproximou de mim e parou na minha frente.

Como de costume, ela estava usando a camisola sem sutiã e seus


mamilos marcaram o tecido fino vermelho.

— Não quero atrapalhar você.

— Você nunca atrapalha. — Ela pegou as minhas mãos e as colocou ao


redor da cintura. — Imaginei que fosse gostar de relembrar os bons
momentos. A cama às vezes é tão vazia sem você.

— Olivia! — Arregalei meus olhos. Não estava esperando vir buscar as


minhas coisas e receber um convite para transar da minha ex-esposa. — Nós
nos divorciamos, não fazemos mais isso, esqueceu? — Puxei as minhas mãos
e me afastei dela. Não era o momento para arrumar mais confusões do que
aquelas em que eu já estava metido.

— Quer dizer que um papel faz com que você me ache menos gostosa?

— Não foi o que disse.

— Então vem. — Tentou me puxar novamente para a cama, mas eu me


mantive irredutível. A magia que eu enxergava nela já havia se esvaído há
tempos e eu só havia me esforçado para estender tanto a nossa relação porque
éramos casados.

— Não, Olivia! Eu não vim até aqui para transarmos.

— Então, quer dizer que mal nos separamos e você já está trepando
com outra? — Cerrou os dentes e fez um bico, irritada com algo que só
existia na cabeça dela, ou talvez fosse eu o equivocado e o meu tesão pela
Rosi estivesse bem evidente.

— Não estou fazendo sexo com ninguém, Olivia.

— Então, por que está recusando uma foda comigo?

— Porque nós não somos mais um casal.

— Porque você cismou que precisávamos de um filho. Acho muito


nobre homens como você, que acham que precisam ter uma criança, e até
escolhem o momento em que querem ter um filho, porém, todo mundo sabe
que a criação e todas as responsabilidades acabam sendo da mãe.

— Se eu fosse pai... bom, seu eu for pai algum dia, eu serei um bom
pai.

— Egoísta da porra — esbravejou, mas eu a ignorei enquanto ia para o


closet pegar as minhas coisas que estavam ali.

— Estou falando com você, Gutemberg! — Apareceu na porta,


bufando feito um touro.

— Não tenho mais o que discutir com você, Olivia. — Peguei as


minhas camisas sociais e joguei dentro de uma mala, com cabide e tudo.
— Se acha que vai simplesmente me apagar da sua vida como se eu
nunca tivesse existido, você está muito enganado.

Deixei-a continuar gritando e peguei minhas meias e sapatos. Enquanto


Olivia falava alto e tentava me puxar para que eu prestasse atenção nela, fui
juntando as minhas coisas, pelo menos todas as que eu me lembrava onde
estavam. Inevitavelmente, acabaria deixando algo para trás e teria que dar
como perdido.

— Eu duvido que vá encontrar essa esposa perfeita que você tanto quer
— disse em tom de maldição, mas fingi não estar ouvindo, pois, no fundo,
nem queria cogitar que ela pudesse estar falando a verdade.

Terminei de juntar tudo em três enormes malas, que ficaram cheias de


roupas, sapatos, e outros pertences, como relógios. Ajeitei as três da melhor
forma para que eu pudesse as puxar, e saí do quarto ouvindo a Olivia
resmungar.

Reencontrar-me com ela havia sido bem pior do que eu havia


imaginado.
Capítulo 28

Tirei a tampa do batom e fiz biquinho para o espelho antes de deslizá-


lo pelos meus lábios, deixando-os vermelhos. Encarei a minha imagem diante
do espelho. Meu cabelo havia sido penteado de lado e estava com uma
pequena trança embutida. O penteado havia sido feito por um cabeleireiro
que viera arrumar a mim e a minha mãe.

Aquela noite era muito importante para o meu pai. Finalmente, o


projeto da marca própria da rede de Supermercados Laerte seria lançado,
porém, não era isso que estava me deixando com as pernas bambas e as mãos
suando frio.

Depois de quase duas semanas sem nos ver, com desculpas e mais
desculpas para não ir à minha casa, Guto e eu ficaríamos frente a frente.
Aquele era o evento mais importante em anos e ele não poderia simplesmente
desaparecer.

Minha barriga estava se revirando; eu estava louca para revê-lo, porém,


não poderia me jogar nos braços dele como eu gostaria. Era um evento que eu
certamente o veria, mas todos estariam lá, inclusive a imprensa. Não era o
melhor lugar e, certamente, não ficaríamos sozinhos, porém, bem no fundo,
eu estava contente sabendo que poderia pelo menos encará-lo nos olhos
novamente.

Depois de muito progresso, poderia acabar voltando à estaca zero.


Tudo o que eu poderia fazer era apenas encará-lo como uma garota
apaixonada, que sonhava com o homem, mas que nunca poderia tê-lo.
Meu celular vibrou em cima da cama e vi que era uma mensagem da
minha amiga. Tinha falado para ela da festa e no quanto eu estava ansiosa e
com medo na mesma proporção.

Boa festa!

Obrigada!

Joguei o celular na minha bolsinha de mão e calcei as sandálias poucos


segundos antes do meu pai passar no corredor nos chamando para ir.

A festa seria no supermercado que fora dos meus avós, pais do meu
pai, em um bairro do subúrbio, onde tudo havia começado.

O mercadinho do Seu Laerte havia ganhado proporções que meu avô,


provavelmente, nunca teria sido capaz de imaginar. Nada mais justo do que
comemorarmos outro grande passo no local onde tudo havia começado.

— Está bonita, filha — disse meu pai com gentileza, e eu retribui o


sorriso dele.

— Obrigada.

Suspirei quando segurou a minha cintura. Esperava que o outro sócio


também notasse isso.

Seguimos até o carro do meu pai e eu me sentei atrás dele, enquanto


meu irmão se jogava ao meu lado mexendo em um videogame portátil.

— Seus pais vêm para festa, amor? — Minha mãe tombou para o lado,
prendendo o cinto antes de procurar os olhos do meu pai.
— Meu pai disse que vem, mas você conhece o velho, depois que
compraram aquela chácara, eles não saem de lá por nada.

— Ah, vai ser legal ver o vovô. — Rodrigo deu um pulinho no banco e
percebi que, apesar de não parecer, meu irmão estava prestando atenção no
que os nossos pais estavam falando.

— Podíamos combinar um domingo de ir para a chácara e ficar com


eles o dia todo, o que acha, meu amor? — meu pai perguntou à minha mãe,
antes de dar partida no carro.

— Isso me parece uma ótima ideia.

— Eu também acho. Vou perguntar para eles qual semana eles acham
que é melhor.

— Perfeito.

Meu pai dirigiu por quase meia hora até chegarmos ao supermercado.
Ele deu a volta e estacionou na área de carga e descarga, onde havia um
caminhão com a logo da rede. Nós descemos do carro e seguimos até a
entrada. Já passava das oito horas da noite e o mercado já estava fechado para
os compradores e, transitando em seus corredores, estavam apenas os
convidados para o momento solene. Na entrada, em uma área mais aberta e
mais ampla, havia algumas mesas montadas para o coquetel e um espaço com
cadeiras diante de um pequeno púlpito onde o meu pai e o Guto deveriam
fazer alguns pronunciamentos falando sobre a marca própria de produtos.

Segui atrás dos meus pais para um pequeno círculo de pessoas e não
demorou muito para que eu o visse. Guto estava conversando com um cara,
mas não dei muita importância, pois meus olhos ficaram focados na razão dos
meus sonhos desde que eu era capaz de fantasiar com algum homem. Percebi
que ele ficou tenso, mudando o peso de uma perna para outra, mas não
desviou o olhar. Ele estava lindo, não que já não fosse bonito no dia a dia,
mas estava ainda mais, dentro de um terno preto bem alinhado, como se
houvesse se vestido para um grande baile. Os olhos castanhos dele passearam
por mim e o meio sorriso me indicou que ele havia gostado do que tinha
visto.

— Oi, Rosi.

— Oi, Guto. — A breve troca de palavras me fez perder o fôlego, que


eu só recuperei quando meu pai chegou perto do Guto e do outro homem. A
atenção daquele que eu tanto almejava deixou de ser minha.

Gostaria que ele não mexesse tanto comigo; era difícil me controlar
daquele jeito; não sabia o que fazer, e obviamente, metia os pés pelas mãos.
Porém, a vontade de me jogar nos braços dele ainda era muito forte. Era
pedir demais que a situação fosse mais fácil?

— Antonio, essa é a minha esposa Margarida e esses são os meus


filhos Rosemeire e Rodrigo.

O sujeito se voltou para mim e me encarou. Foi inevitável não arregalar


os olhos e ficar boquiaberta diante do susto que eu tomei; não era qualquer
cara, mas o cara da Deborah, a não ser que eles fossem sósias.

— Bulldog? — resmunguei. Era para ter falado apenas para mim,


porém minha voz soou alta e ele me ouviu.

— Nos conhecemos de algum lugar? — Ele me lançou um olhar


malicioso que me deixou vermelha. Não sabia se ele tinha esse poder, mas
senti que ele me despia com os olhos.

Diante de um homem daquele, não me surpreendia que até a santinha


da Deborah ficasse de pernas bambas.

— Ela deve ter ouvido o Ricardo ou eu comentar sobre seu apelido de


cachorro — Guto se intrometeu na conversa, parecendo visivelmente
incomodado com a forma com que o cara que estava com ele olhava para
mim.

— É, foi isso! — Apressei-me em concordar. Não podia dizer para o


cara que o conhecia de uma foto que uma amiga havia me mandado, porque
iria soar muito estranho e poderia colocar a Deborah em alguma confusão,
algo que eu não queria.

— Entendi. — Ele não tirou os olhos de mim e isso fez com que eu
ficasse ainda mais vermelha.

— Vem comigo, Bulldog. — Guto o puxou pelo braço. — Quero te


mostrar umas coisas sobre os produtos lá no fundo.

— Tudo bem! — O cara se deixou arrastar e, assim que eles saíram de


vista, peguei o meu celular e mandei uma mensagem para a minha amiga.

Deus me livre! Mas quem me dera. KKKK

Quê? Ficou doida, Rosi? Não era para você estar na festa?

Eu estou, mas você não faz ideia de quem também está


aqui e me lançou um olhar que deixou as minhas pernas
bambinhas.
Quem?

O seu Bulldog.
É bem mais bonito pessoalmente do que pela foto que você me
mandou.

Então era com o supermercado do seu pai que a cooperativa


estava fechando uma parceria. Nossa! Que coincidência.

Pois é! Mas voltando aqui para o Bulldog. Vai investir nele ou o


cara está livre?

Rosi! Você não gostava do Guto?

Eu amo o Guto, mas enquanto o cara certo não decide se


vai ficar comigo, posso me divertir com os errados.
Nossa! Esse errado...

Rosimeire, nem pensa nisso!

Ele é seu?

Me diz que é seu que vou soltar fogos por você finalmente estar
paquerando.

Está falando isso, mas é virgem como eu. Só me promete que


com ele não.

Fica tranquila, não dou em cima dos homens das amigas.

Obrigada.

Vou ficar de olho nele por você.


Boa festa, Rosi.

— Oi, Rosi. — Ouvi a voz do meu melhor amigo e vi que ele estava se
aproximando de mim. Guardei o meu celular na bolsa e me espichei para
abraçá-lo.

— Oi, Dani. — Sorri e ele me deu um beijo no rosto.

— Hum, tá gata!

— Obrigada!

— Oi, Margarida e Rodrigo! — Ele acenou para a minha mãe e para o


meu irmão, que retribuíram ao cumprimento.

— Vem! — Puxei ele pelo braço e o arrastei comigo por entre as


gôndolas até encontrar o Guto e o Bulldog olhando para uma prateleira com
os produtos da cooperativa com a logo do supermercado.

— Vai ficar espionando-o agora? Que feio, Rosimeire!

— Não é o Guto que eu quero que você veja, é o outro cara.

— Nossa! Desistiu do tio um para investir no tio dois? — Dani


umedeceu os lábios e continuou encarando o Bulldog.

— Não é para mim.

— Ah! — O sorriso nos seus lábios aumentou. — Parece com o


lenhador de um dos filmes que eu estava assistindo.

— Que filme? — Franzi o cenho, mas logo me arrependi da pergunta.


— Um pornô gay.

Eu fiz uma careta e ele riu.

— Não é para você, Daniel!

— Ah, não? — Ele fez bico, desapontado.

— É o cara da Deborah.

— A Deborah sua amiga? — Arregalou os olhos surpreso. — Mas ela


não tinha ido para Jargão do sei lá onde?

— Jargão do Sul.

— Isso mesmo!

— Parece que a empresa que o meu pai e o Guto fecharam negócios é


de lá. Olha como o mundo é pequeno.

— Eles são namorados?

— Não sei. Ela não falou nada, nem admitiu que estava a fim, mas me
pediu para ficar longe dele.

— Troncudo, braços fortes, bem do jeito que gosto... — Daniel mordeu


o lábio percorrendo o cara com o olhar. Quase fiquei com vergonha pelo tal
Bulldog. — Amiga, você vai me desculpar, mas eu sou mais esse aí do que o
Guto.

— Cala a boca! — Eu o empurrei e o Daniel acabou esbarrando em


uma das gôndolas e o barulho fez com que o Guto e o Bulldog se virassem
para nós, notando a nossa presença.
— Oi! — Acenei com um sorriso amarelo.

— A filha do Ricardo e o namorado — disse o Guto para o Bulldog.

Espera! Namorado? De onde ele havia tirado isso?

— Não! Nós dois? — Dani apontou para a gente. — Não sei de onde
tirou isso, mas, definitivamente, não somos namorados.

— Somos só amigos. — Abracei os ombros do Dani.

Vi uma ruguinha se formar na testa do Guto, como se ele estivesse


processando aquela informação, e me perguntei se o Guto realmente havia
pensado que o Daniel e eu éramos namorados.

— É bom saber disso. — Bulldog piscou para mim e minhas bochechas


voltaram a ficar vermelhas.

Havia prometido a Deborah que não me aproximaria dele, e realmente


não ia fazer nada, mas decidi aproveitar os efeitos que o flerte dele causava
na expressão do Guto.

— É a primeira vez em Campinas, Bulldog? — Fui rebolando para


perto deles e parei diante dos dois.

— Não, mas acho que essa pode ser a mais interessante.

— Fica longe da filha do Ricardo. — Guto colocou a mão sobre o


ombro do associado em uma postura mais ofensiva.

— Não vou morder ela, cara. Bom, só se ela quiser.

— Talvez eu goste de mordidas. — Coloquei a mão sobre os lábios e


dei uma risadinha.

— Vem comigo. — Guto passou a mão pelo meu pulso e saiu me


arrastando para a parte de trás do supermercado.

Ele só me soltou quando estávamos diante da porta de um velho


escritório de administração. Me lembrei de quando era criança, que eu ficava
brincando ali entre as duas mesas enquanto o Guto e o meu pai trabalhavam,
durante o tempo em que minha mãe estava na Universidade.

— O que pensa que está fazendo? — questionou-me com a voz firme e


o olhar autoritário.

— Um amigo.

— É isso que você faz? Provoca e enlouquece todo mundo?

— Eu não estava provocando o Bulldog.

— Ele pode ser que não.

— Essa conversa não é sobre ele, ou é? — Devolvi o olhar firme e


quando nos encaramos, eu senti uma faísca, como se os nossos olhares
houvesse nos dado choque.

Guto voltou a segurar o meu pulso e deu um tranco na porta velha,


fazendo com que ela se abrisse, me puxou para dentro e fechou a porta atrás
de nós. A sala estava escura, mas eu não precisava de luz para saber que ele
estava bem perto de mim, pois sua respiração se mesclava com a minha. Era
urgente, acelerada, e demonstrava toda a sua tensão.

Ele bateu a mão no interruptor, a luz acendeu, e meus olhos se


fecharam por um instante pelo choque com a claridade. Nós nos encaramos e
nossos olhares provocaram uma faísca, seguida de um calafrio que varreu
todo o meu corpo e me deixou trôpega.

Nenhuma palavra foi dita; Guto queria tanto quanto eu. Pouco nos
importamos com a festa que estava acontecendo no supermercado. Daquela
vez, Guto não iria interromper o nosso momento.

Ele abaixou os lábios, levando-os até os meus, e a fome que eu


experimentei era incontrolável. Suas mãos, firmes e fortes, foram parar na
minha cintura e ele me ergueu no ar, sentando-me na mesa velha onde
costumava passar horas a fio trabalhando.

Em meio a um beijo que me deixava completamente entregue, senti as


mãos dele descerem pela minha cintura e apertarem a minha coxa. Cada parte
de mim vibrou com o toque firme que me apertava e amassava. Não
precisava ler pensamentos para saber que o Guto estava desesperado para me
ter, pois ele demonstrou isso com as mãos e a boca, beijando-me de forma
afoita.

Ele passou a língua pelos meus lábios ao puxar meu cabelo pela nuca e
tombar minha cabeça para o lado. Seus dentes rasparam a pele frágil da
minha garganta e o chupão que veio em seguida me fez gemer baixinho.
Segurei na beirada da mesa e fechei os olhos, entregando-me ao momento
que eu sempre sonhei, o de me tornar mulher nos braços de Gutemberg
Toledo.

Guto puxou meu vestido para cima, enrolando-o na minha cintura, e se


acomodou entre as minhas pernas. Esfregou a ereção, que estufava o tecido
da sua calça, em mim e meu gemido foi abafado pelos seus lábios que
estavam de volta aos meus.
Minha língua procurava pela sua enquanto eu laçava o seu pescoço
com os braços, e subi com uma das mãos pela sua nuca, embrenhando meus
dedos no seu cabelo macio e curto.

Guto passou a mão por entre os nossos corpos e tocou a minha vagina,
sob minha calcinha. Eu me espichei sobre a mesa, rebolando na madeira
velha e empoeirada, que rangeu. Torci para que a música da festa abafasse
nossos sons.

— Rosi... — Guto afastou a boca da minha e começou a falar.

— Eu quero — disse determinada, sem dar brecha para que ele


mudasse de ideia. Havia esperado a vida toda para perder a minha virgindade
com aquele homem.

Ele se afastou um pouco, apenas para puxar a minha calcinha; fez com
que ela escorregasse pelas minhas pernas e a colocou dentro do bolso.
Enquanto abria a própria calça e tirava o membro dela, Guto percorreu com a
boca o meu decote e empurrou com os dentes, para que pudesse abocanhar o
meu mamilo.

A expectativa estava me corroendo. Queria me tornar dele, queria logo.


Porém, não precisei esperar muito, pois o Guto esfregou o pau em mim e o
encaixou na minha entrada. Com um tranco firme, ele me rasgou. Ele não
sabia que eu era virgem e eu duvidava que chegaríamos naquele momento se
eu tivesse contado. Senti dor e abracei os seus ombros, mas me contive para
não gritar ou deixar que ele percebesse. Sabia que iria doer e estava preparada
para isso, mas estava em êxtase por ter a minha primeira vez com o homem
que eu amava.

Ele voltou a me beijar e as suas mãos passeando pelo meu corpo


aumentaram a minha excitação e diminuíram a minha dor. Guto gemia muito
e, sentir o seu prazer, aumentava ainda mais o meu. Apertou as minhas coxas
ao ejacular, o sêmen atingindo meu interior com a pressão do seu desejo.

Sem sair de mim, Guto tirou uma das mãos das minhas coxas e a
colocou sobre o meu clitóris. Com pressão e movimentos circulares, e com
ele me estimulando, apertei mais os seus ombros, porém, dessa vez, não era
por dor. Rebolei nele, esfregando as minhas pernas na lateral das suas e logo
fui invadida por uma onda que espantou a dor e me deixou toda formigando.

— Droga! — Ele praguejou baixinho ao sair de mim. — Perdi o


controle...

— Perdemos juntos. — Sorri, enquanto olhava em volta buscando por


alguma coisa com que pudesse me limpar.

— Sangue? — Guto franziu o cenho ao encarar o pênis.

— Acho que sim. — Abri um sorriso amarelo.

— Você está menstruada?

— Não.

— Rosi — arregalou os olhos, surpreendendo-se quando a sua ficha


caiu —, você é virgem?

— Era. — Dei de ombros. — O sangue significa que eu não sou mais,


ao menos, eu acho que é isso.

— Porra! — Ele passou uma mão pelo cabelo, puxando-o para trás,
quase o arrancando. — Eu tirei a virgindade da filha do meu melhor amigo.
Onde eu estava com a cabeça? — Ele estava falando sozinho, mas quando
voltou a me encarar, percebi que o questionamento a seguir seria para mim.
— Você e o Daniel... nunca?

Neguei com a cabeça.

— Dani gosta de caras tanto quanto eu.

Balançando a cabeça, confuso como se tivesse sido atingido por um


caminhão, Guto caminhou até um armário no fundo da sala e pegou uma
embalagem de lenços umedecidos. Ajoelhou-se entre as minhas pernas e
começou a me limpar.

— Rosi, me desculpa. Eu... — Engasgou, e percebi que não sabia o que


dizer.

Puxei seu rosto pelo queixo e fiz com que me encarasse.

— Guto, sempre quis que você fosse meu primeiro.

— Não, Rosi. — Ele se levantou e segurou a minha mão entre as suas.


— Não deveria ser assim. Deveria ter perdido a virgindade com carinho e
com cuidado. Não em cima de uma mesa velha, em meio a um coito
desesperado.

— Se eu tivesse dito para você que era virgem, você teria transado
comigo?

— Não. Com toda a certeza que não.

— Então, não estou arrependida de como foi.

— Isso faz com que eu me sinta péssimo.


— Você não deve se sentir péssimo. — Trouxe o rosto dele para mim
e, sem ressalvas, Guto me beijou com carinho e depois apertou-me contra o
seu corpo, abraçando-me. — Eu amo você, Gutemberg.

— Não deveria amar, Rosi.

— Não é como se você fosse um homem terrível.

— Depois do que acabamos de fazer, eu tenho as minhas dúvidas. Me


comportei feito um animal. Não se trata uma mulher assim, muito menos uma
virgem.

— Sei que na próxima vez você vai me recompensar. — Passei os


dedos pelo rosto dele e empurrei os fios do seu cabelo para trás da orelha.
Havia alguns brancos, mas só eram perceptíveis de perto.

— Próxima? — Voltou a arregalar os olhos.

— Sim, na próxima vez que for transar comigo.

— Rosi, você é só uma menina.

— Não, Guto! — Esfreguei a minha perna nele. — Eu sou uma mulher


que esperou para ser sua.

— Eu vou apodrecer no inferno.

— Você nem acredita nisso. — Ri.

Ele me encarou e eu vi algo diferente no seu olhar, que me fez vibrar.


Ainda ajoelhado na minha frente, Guto puxou as minhas pernas para cima
dos seus ombros. Seu hálito quente tocou meu sexo e eu cravei minhas unhas
nos seus ombros. Rebolei quando suas mãos foram parar na minha bunda e
ele me puxou para frente, enterrando o rosto em mim. Sua língua tocou o
meu clitóris e joguei a cabeça para trás, regozijando-me. Se era assim que ele
achava que eu merecia ser tratada, não iria reclamar nenhum pouco.

Espichei-me enquanto ele me introduzia um dedo; meu canal ainda


estava dolorido, mas a lubrificação fez com que ele não me causasse
desconforto, mas sim, prazer. Seus lábios envolveram o meu clitóris, sua
língua o contornou, provocou e enlouqueceu. A pressão e a temperatura, ora
quente e ora fria, levavam-me a experimentar algo que jamais conseguiria
sozinha. Eu me levava ao rosto dele, pedindo por mais, ao passo que a sua
língua memorizava a textura dos meus lábios vaginais. Soltei os ombros do
Guto e apoiei minhas mãos na mesa, tombando o corpo para trás.

Quando eu gozei dessa vez, tive que morder meus lábios para não
gritar alto. O prazer era intenso e arrebatador. Estava completamente sem
forças e meu corpo todo tremia.

Uma batida forte na porta fez com que o Guto se levantasse e ajeitasse
a calça.

— Amiga! — Ouvi o Dani do outro lado. — Odeio ser o empata foda,


mas o seu pai está procurando pelo Guto. Não sei o que estão fazendo aí
dentro, mas imagino que não seja algo que você queira que o seu pai veja.

— Eu preciso ir — falou o Guto em um tom firme.

— Só se me der mais um beijo. — Segurei o seu pulso e fiz com que


me encarasse.

Ele sorriu, segurou a minha nuca e me deu um selinho antes de sair


porta afora.
— Guto! — chamei por ele, mas já estava longe e com a minha
calcinha no bolso.

Iria ficar um pouco envergonhada por passar o restante da festa sem


ela, mas seria uma lembrança muito agravável do que havia acontecido.
Capítulo 29

Cheguei no carro após o fim da festa, assim que me despedi do


Antonio e do Ricardo. Tentei sorrir, parecer empolgado e compenetrado.
Escondi de todo mundo que estava surtando por dentro, mas, quando fiquei
sozinho, eu gritei.

— Eu tirei a virgindade da filha do meu melhor amigo — falei em voz


alta o fato que havia me atormentado durante toda a noite.

Pelos sorrisinhos que a Rosi me direcionou pelo restante da noite,


soube que não era mero delírio fantasioso meu. Tateei o meu bolso à procura
da chave do carro e encontrei um pequeno tecido. Era a calcinha da Rosi,
vermelha, pequena, e com o cheiro do seu sexo. Aquela era a prova que não
me deixava pensar que eu havia sonhado.

Havia feito o meu melhor para me manter afastado dela por semanas,
porém, encontrara com a Rosi por alguns minutos em um evento público, e
bastou um cara flertando com ela para que eu perdesse completamente a
razão. Num piscar de olhos, a arrastara para uma sala velha e suja e trepei
com ela feito um animal.

Ela era só uma menina virgem. VIRGEM! Rosi tinha apenas dezoito
anos e eu a fodi sem qualquer cuidado. Só de pensar na dor que ela pode ter
sentido pela forma bruta com que eu agi, sentia vontade de socar a minha
própria cara.

Eu tinha batido muita punheta para aquela garota, mas estar dentro dela
foi inigualável, e pensar no prazer que eu senti, mesmo que tivesse sido uma
trepada desesperada, fazia com que eu sentisse ainda mais culpa.

Na próxima vez você me compensa... A voz da Rosi ecoou na minha


mente. Próxima? Não deveria haver próxima. Eu era um monstro que havia
tirado a virgindade de uma garota, não deveria estar pensando na próxima
vez, mas estava.

O sabor da boca dela, o perfume do seu corpo, e a pressão da sua


vagina tornariam ainda mais reais os meus sonhos.

— Caralho!

Era errado, era muito errado, mas eu a queria tanto! Além disso, a Rosi
não colaborava, fazia de tudo para que eu a desejasse ainda mais.

Eu havia provado do proibido e seria difícil demais me manter longe.


Evitar a Rosi parecia ser o melhor a se fazer, mas quando nos víssemos
novamente, eu sabia que a chama iria me contagiar e poderíamos parar em
um beco outra vez.

Liguei o carro, pois precisava sair dali ou iriam estranhar a minha


demora. Fiz o máximo para focar a minha atenção no trânsito enquanto
dirigia para o apartamento alugado onde eu estava morando. A minha mente
estava longe, perdida entre a culpa e o desejo.

Eu tinha tirado a virgindade da Rosi; merecia um tipo de punição maior


do que apenas um soco na cara. O fato de ela ser virgem tornava pior o meu
crime. Sentia que a tinha violado, acabado com a sua pureza.

A Rosi tinha apenas dezoito anos, metade dos meus trinta e seis. Estava
no início da vida e eu não tinha o direito de violá-la como eu violei. Um oral
não recompensava o fato de ter rompido o seu hímen; na verdade, só piorava.
Não bastava tê-la invadido com o pau, também fiz com a língua.

Deixei o carro na garagem do prédio e subi para o apartamento.


Precisava de um banho. Assim que me despi e entrei no box, peguei o meu
pau e o analisei, havia sangue nele, sangue seco. O sangue da Rosi...

Será que eu a tinha machucado demais? Havia sido bruto e tornado um


momento que deveria ser mágico para ela em algo ruim? Engoli em seco e
debrucei-me sobre a parede. Meus pensamentos me castigavam e eram cruéis
comigo. Deveria protegê-la e não ser um monstro para ela.

Era a primeira vez que eu tirava a virgindade de uma mulher, mas sabia
que não deveria ter sido feito daquele jeito. Muito carinho e sem pressa era o
mínimo. Virgindade não era algo que se tirava com uma trepada, algo bruto e
faminto como eu tinha feito.

Na próxima vez você me recompensa... Por que eu ainda estava


pensando nisso? Balancei a cabeça, fazendo água voar para todo lado. Estava
furioso. Não teria uma segunda vez, eu não podia transar com a Rosi
novamente, porém, era aquela lembrança de sexo que eu queria deixar para
ela? Algo descuidado e afoito, beirando a selvageria? Esse não era o homem
que eu costumava ser, mas aquela garota me fazia perder o juízo.

Eu amo você, Guto... Será que amava mesmo ou era só uma paixonite
adolescente? Não poderia negar que ela era bem determinada. Havia me feito
extrapolar a linha do bom senso e o resultado foi ter tirado a virgindade dela
feito uma besta.

Eu queria recompensá-la, fazer direito, e deixar que ela fizesse sexo do


jeito que deveria ser. Com cuidado, com carinho, e paixão. Porém, isso não
era algo fácil de se resolver. Não deveria ter feito nada com ela naquela noite,
para início de conversa. A Rosi era filha do meu melhor amigo e eu não
poderia deixar que o meu pau continuasse se esquecendo disso.

Então, eu deveria deixá-la com aquela lembrança de sexo ruim até que
conhecesse outro cara que cuidasse dela como merecia? Soquei a parede.

Não era como se ela estivesse em um bar qualquer e transasse com o


primeiro cara que pagasse uma bebida. Eu tinha sido o primeiro, o único; a
Rosi havia se guardado para mim e experimentou aquilo.

Durante o banho, foi como se eu estivesse em um daqueles filmes em


que o diabo falava de um lado e o anjo do outro. O anjo me lembrava que a
Rosi era filha do meu melhor amigo, uma menina que eu precisava ficar
longe para não fazer a ela algo pior do que já tinha feito. Esse mesmo anjo
me xingava, dizia que eu deveria ser até preso pelo o que eu tinha feito. Mas
o diabo... Ah, esse era sedutor! Me dizia que eu precisava ir até a Rosi e dar a
ela a melhor noite de sexo de todas para consertar a burrada que eu tinha feito
com ela. Não poderia devolver a virgindade da Rosi, mas lhe daria prazer,
como ela merecia. O pior de tudo era que eu queria ouvi-lo, mesmo sabendo
que levar a Rosi para cama só pioraria tudo.

Errar uma vez é humano, duas é burrice... O anjo debochava, mas,


talvez, ele estivesse certo, pois eu saí do banheiro, enrolei-me em uma toalha
e fui procurar pelo meu celular. Encontrei o número da Rosi nos meus
contatos e mandei uma mensagem.

Eu preciso consertar o que eu fiz com você.


Capítulo 30

— Está tudo bem, Rosi? — Meu irmão me cutucou e virei para o lado
para encará-lo quando chegamos na nossa casa.

— Por que não estaria? — Tentei conter o suspiro enquanto me sentia


literalmente nas nuvens.

— Você está rindo feito uma pateta.

— Ah, garoto, não enche! Não posso ficar feliz? Foi um dia importante
para o papai.

— Sim! — gritou o meu pai um pouco mais à frente. — Foi uma


grande noite. Essa marca própria dos supermercados trará muito dinheiro
para todos nós.

— Dinheiro é bom, mas também não é tudo. — Mamãe massageou os


ombros do meu pai quando percebi que ela estava tentando nos educar.

— Tá... Parabéns, pai! — Passei por ele e dei um beijo em sua


bochecha antes de sair correndo para o meu quarto.

Queria ficar sozinha e poder surtar um pouco, porque o que acontecera


entre mim e o Guto era tão improvável que ainda parecia um sonho. Fechei a
minha porta, escorei-me nela e coloquei as mãos no peito em meio a suspiros
apaixonados.

Finalmente Guto e eu tínhamos transado. O cara pelo qual eu tanto


esperei tinha, finalmente, tirado a minha virgindade.
Tirei o meu vestido para tomar um banho, e me toquei que estava sem
calcinha. O Guto havia tirado e provavelmente ficara com ela. Isso me fez
sorrir ainda mais. Era uma lembrança minha que ele teria.

Antes de entrar para o chuveiro, peguei o meu celular e mandei uma


mensagem para a minha amiga Deborah.

Meu status de virgem foi atualizado.

Já era tarde e pensei que ela pudesse estar dormindo, mas, para a minha
surpresa, Deborah respondeu rápido.

Quê? Como assim, Rosi?

Não sou mais virgem. Rolou lá na festa. Numa salinha, bem


estilo livro.

Ela levou uma eternidade para responder e pensei que poderia estar
processando a informação. Será que a Deh achava que eu iria ficar virgem
para sempre?

Você e o Bulldog?

Não, amiga!
Eu não tive nada com o seu cara. Pode ficar tranquila.

Ah! Então com quem foi?

Como assim, com quem? Com o Guto!


Com quem mais você acha que poderia ter sido?

Sei lá, Rosi! Você é meio louca.


Nossa! Também não é assim.
Já tive a oportunidade de perder a virgindade antes, mas estava
esperando pelo Guto.
Rolou com ele, exatamente como eu sempre quis que fosse.

Foi romântico?

Não é como se ele tivesse me levado para sair, nem me


pagado um jantar.
Não sei se entra na sua definição de romântico.

Doeu muito?

Para caramba!

Nossa, Rosi! Que horrível!

Não, Deh! Foi bom. Depois ele fez um oral incrível em mim.
Apesar de toda a urgência, Guto me fez gozar duas vezes.
Estar nos braços dele foi muito melhor do que eu imaginei que seria.
Sempre sonhei com esse momento e finalmente aconteceu.

Fico feliz por você. É um momento que ficará marcado na sua


vida.

Espero que você e o Bulldog também passem para esse passo.


Ele é uau! Superintenso.

Rosi!
Eu preciso ir dormir agora.

Tudo bem. Boa noite.


Esperava que a Deborah não tivesse ficado chateada com a minha
brincadeira de ficar com o Bulldog. Era óbvio que eu não iria me envolver
com ele. Não queria ninguém que não fosse o Guto, mas usar os flertes do
cara ao meu favor havia tido um retorno melhor do que o imaginado.

Larguei o celular sobre a cama e me levantei para tomar um banho. Por


mais que o Guto houvesse me limpado, eu sentia que ainda havia sêmen dele
dentro de mim.

— Não sou mais virgem — murmurei, ao dar um pulinho de


empolgação dentro do box.

Apesar da dor, que eu sabia que iria sentir, pois todos os relatos de
perda de virgindade diziam que doía, tinha sido incrível. Sentir o corpo dele
no meu, a boca dele na minha enquanto me fazia mulher era um sonho se
tornando realidade.

Abri o registro e deixei que a água escorresse pelo meu corpo enquanto
fechava os olhos e revivia as imagens do que havia acontecido entre nós dois.
No momento em que ele me tomou, justificou toda a minha espera. Era como
se o meu corpo e a minha alma pertencessem àquele homem.

Peguei um sabonete íntimo e lavei a minha vagina. Sentia uma


dormência no meu canal, mas a sensação era uma doce lembrança de que
momentos atrás o Guto esteve dentro de mim. Esperava que nas próximas
vezes não doesse tanto.

Desliguei o registro e e me enrolei numa toalha. Saí do banheiro me


enxugando, peguei um pijama no meu closet e o vesti antes de escovar os
meus dentes e me jogar na cama. Estava ansiosa para dormir, pois os meus
sonhos com o Guto seriam bem melhores agora com as novas informações
que o meu corpo havia adquirido sobre o dele.

Peguei o meu celular ao me ajeitar sobre os travesseiros e tomei um


susto enorme ao notar que havia uma mensagem dele.

Eu preciso consertar o que eu fiz com você.

Engoli em seco. Consertar? Será que estava arrependido do que havia


acontecido entre nós dois? Ele poderia ter esperado ao menos até amanhã
para jogar um balde de água fria nos meus suspiros apaixonados.

Minha virgindade não é algo que se pode consertar, Guto.


Uma vez tirada, ela não volta para o lugar.

Fiquei olhando para o celular e para a foto que ele usava, uma dele
sorrindo com uma praia ao fundo. Ele poderia até não ser, mas eu o achava o
homem mais bonito do mundo. Sofri por antecipação enquanto aguardava
uma resposta.

Deixei que o celular escorregasse das minhas mãos e caísse sobre a


cama. Encarando o teto, eu me perguntei se ele estava arrependido do que
acontecera entre nós dois e a resposta era óbvia, apesar de muito incômoda.

O celular vibrou e meu coração quase saltou do peito. Não era outra
mensagem, ele estava ligando para mim. Precisei recuperar o fôlego e
demorei alguns segundos para atender.

— Guto...

— Rosi, achei melhor ligar do que ficar mandando mensagens.

— É... — Minha garganta estava seca e eu não sabia como reagir.


Estava pronta para que ele destruísse o momento mais mágico da minha vida
com arrependimentos e empecilhos, por isso eu sofri por antecipação.

— Eu sinto muito pelo o que aconteceu.

— Não diz isso. Fala qualquer coisa, mas não me pede desculpas.

— Eu tenho que pedir. Agi impulsivamente e tirei a sua virgindade.

— Porra, Guto! Eu queria o sexo — gritei, sem me preocupar ou dar


importância se alguém poderia acabar nos ouvindo. — Acha que eu teria ido
com você se não quisesse? Não precisa ficar lamentando, porque eu não vou
lamentar, nem me arrepender. Aconteceu com você porque eu ansiava que a
minha primeira vez fosse com você.

— Nunca tinha transado com uma virgem antes, mas imagino que não
seja desse jeito que se tire a virgindade de alguém. Preciso consertar isso, não
quero que o sexo seja uma lembrança ruim para você.

Estava bem longe de ser uma lembrança ruim para mim, mas algo me
impeliu a não contar isso para ele antes que me dissesse o que pretendia.

— Quero corrigir o que eu fiz com você, Rosi.

— Como?
— Fazendo direito.

Senti um calor agradável no peito, uma sensação que deveriam chamar


de alegria, e um sorriso se formou nos meus lábios.

— Vamos fazer de novo?

— Você quer? Me deixa fazer do jeito certo?

— Quero muito. — Tentei não demonstrar o quanto estava vibrando


em êxtase e mantive o tom de voz mais neutro. — Quando, amanhã?

— Você pode me encontrar amanhã?

— Posso. Vou dizer que vou dormir no Daniel e te encontro onde você
quiser.

— Eu vou te passar o endereço do restaurante e nos encontramos lá.

Restaurante? Guto estava planejando um encontro de verdade? Se


aquela ligação era um sonho, por favor, eu não queria acordar de jeito
nenhum.

— Mando o endereço para você.

— Combinado.

— Até amanhã, Rosi.

— Até amanhã, Guto.

Ele desligou a ligação e eu fiquei com o celular no ouvido por mais


alguns minutos. Paralisada. Nunca iria prever uma proposta daquela. Estava
contente com a rapidinha às escondidas na festa do supermercado e achava
que era o melhor que eu conseguiria dele, porém, a imagem de homem
romântico e protetor que eu sempre tive do Guto se manteve.

Ele não poderia devolver a minha virgindade, mas me daria uma noite
digna de uma primeira vez, e isso era tudo o que eu queria.
Capítulo 31

Por fim, cedi ao diabo achando que estava me comportando como um


anjo. Mal dormi na noite que sucedeu a festa de lançamento da marca própria
dos supermercados. Não conseguia tirar a Rosi da cabeça e o que havia
acontecido entre nós dois.

Imaginava que fosse manter o meu desejo por ela silenciado com
punhetas e sofrimento autoinfligido, porém, bastou um estopim para que eu
arrastasse a menina para uma sala e tirasse a virgindade dela, sem qualquer
hesitação.

Não importa quantas vezes ela tenha dito que queria o que aconteceu
entre nós dois, porque ainda me sentia culpado, mas eu tinha esperanças de
corrigir esse momento com ela. Bem no fundo, algo dentro de mim me dizia
que seria bem mais fácil se eu aceitasse que nós dois queríamos um ao outro,
pois Rosi fazia questão de deixar isso bem evidente, mas o meu racional e a
minha moral diziam que isso era muito errado.

Rosi tinha metade da minha idade e era a filha do meu melhor amigo.
Eu a tinha visto crescer, cheguei a trocar fraldas dela! Ricardo confiava em
mim para cuidar da sua filha, mas ali estava eu, programando como seria uma
noite de sexo com ela.

Só naquela noite, prometi a mim mesmo, convicto de que manteria a


promessa, mesmo não tendo mantido nenhuma que me fiz em assuntos que
envolviam a Rosimeire.

Puxei o meu celular do bolso e mandei uma mensagem com o endereço


do restaurante onde a levaria para jantar. O certo seria ir buscá-la, mas com
que cara eu iria olhar para o meu melhor amigo quando chegasse em sua casa
para tirar a filha debaixo da sua proteção para levar para a minha cama?

Com que cara iria olhar para o meu melhor amigo? Certamente não
seria nada fácil encará-lo durante a próxima semana, mas esse era um assunto
com o qual deveria me preocupar depois.

Quando aquela noite acabasse, eu me afastaria da Rosi de uma vez por


todas e iria parar de ser um estúpido perto dela.

Encarei-me diante do espelho do pequeno quarto do flat que estava


alugando e penteei meu cabelo castanho, antes de ajeitar os botões da camisa
branca de mangas longas. Era o conflito mais angustiante saber que iria sair
com uma mulher, a levaria para cama, mas, apesar disso, não poderia pensar
nela como mulher.

Apesar de ter permanecido solteiro por muito tempo, nunca fui do tipo
cafajeste e galinha. Sempre tratei as mulheres com o carinho e o amor que
mereciam, porém, isso nunca me impediu de meter os pés pelas mãos e, às
vezes, fazer péssimas escolhas, como o meu casamento com a Olivia.

Eu queria ter uma família, ter filhos e uma esposa ao meu lado, uma
mulher que eu amasse incondicionalmente e que me amasse também, porém,
parecia que era algo que eu nunca iria ter.

Peguei o blazer do meu terno e coloquei algumas gotas de perfume no


meu pescoço. Fazia tempo que não me arrumava daquele jeito, que me
olhava no espelho e me sentia bonito. Contudo, a noite merecia isso, o
melhor de mim.
Saí do quarto e me despi da culpa. Iria me julgar pelas minhas
péssimas decisões e pela minha atitude impulsiva com a Rosi depois. Havia
prometido uma noite de sexo digna e era isso que daria a ela.
Capítulo 32

Desci do carro com o celular escorregando por entre os meus dedos.


Estava muito ansiosa e o nervosismo saía pelos meus poros em forma de um
suor frio.

Despedi-me do motorista de aplicativo e pensei no quanto queria que a


autoescola terminasse logo para que eu pudesse ter o meu próprio carro.

Segui para a entrada do restaurante, e me perguntava se deveria entrar


ou esperar ali, pois o Guto apenas havia me enviado o endereço, mas não me
passara nenhuma outra instrução. Estava com medo da ansiedade acabar me
boicotando. Estava ali, prestes a ter um jantar romântico com o Guto, mas
isso era algo tão improvável de acontecer, que era difícil de acreditar que
estava se realizando.

Olhei para a tela do celular e vi que não havia nenhuma mensagem


dele. Já havia se passado alguns minutos do horário combinado e imaginei
que ele pudesse estar lá dentro.

Senti uma mão quente tocar o meio das minhas costas e todo o meu
corpo estremeceu. Soltei um gemido abafado, seguido de um suspiro, e
espichei o corpo para cima.

— Rosi.

— Guto.

— Desculpa, eu me atrasei um pouco. — A voz dele soou rouca, bem


próxima ao meu ouvido, e pareceu mais sexy do que nunca.
— Não tem problema.

— Vamos entrar?

Balancei a cabeça em afirmativa e ele entrelaçou os dedos aos meus.


De mãos dadas, para o meu total deleite, Guto me levou para o interior do
restaurante. Ele aproximou-se da recepcionista e deu seu nome, então a
mulher nos direcionou para uma mesa para dois no fundo do salão.

— Bom jantar — disse, antes de se afastar de nós.

— Obrigada.

Guto puxou a cadeira para mim e deu a volta na mesa, para sentar-se na
minha frente. Ele era ainda mais romântico do que eu imaginava.

Fiquei paralisada, apenas olhando para o rosto dele. Era a primeira vez
que me levavam para um jantar romântico, e um com o Guto era ainda mais
especial. Ele estava lindo, com um terno bem alinhado e a barba feita,
fazendo com que ele parecesse ter uns dez anos a menos do que tinha de fato.

Pegamos o menu e fizemos o nosso pedido. Era um restaurante italiano


e começaríamos com uma salada antes da massa como prato principal.

Eu não parava de olhar para ele, não conseguia fazê-lo. Era como se
quisesse me garantir a todo momento que ele estava ali comigo.

— Você gosta de vinho? — perguntou, forçando-me a piscar os olhos e


sair do sonho para me concentrar no momento.

— Não sou acostumada a beber.

— Prefere um suco ou refrigerante?


— Pode ser o vinho, mas algo doce.

— Tem um branco suave que você vai gostar.

— Parece perfeito para mim.

Estava sendo realmente um encontro. Em nenhum momento, Guto me


disse que era mais velho do que eu ou que era o melhor amigo do meu pai.
Ele me olhava como mulher e não como menina, e isso me deixou eufórica.

Ele gesticulou para o garçom que se aproximou de nós e anotou os


nossos pedidos.

— Como está indo a autoescola?

— Bem. — Segurei a mão dele, que estava sobre a mesa e Guto sorriu
para mim. — Já terminei toda a parte de legislação e vou fazer a prova
amanhã.

— Isso é ótimo. — Ele colocou a outra mão sobre a minha,


envolvendo-a com as suas e a acariciou. — Logo vai poder ter o seu próprio
carro.

— Estou contando com isso. — Envergonhada, usei a mão livre para


colocar uma mecha do cabelo atrás da orelha.

Daniel costumava dizer que eu era uma garota estranha, sempre muito
para frente, mas que, às vezes, ficava envergonhada do nada. Provavelmente,
fosse porque aquele homem mexia com todos os meus sentidos.

— Vai me levar para onde você está morando?

— Calma, Rosi. — Ele esticou a mão, curvando-se sobre a mesa e


tocou o meu rosto, afagando a minha bochecha, o que me fez fechar os olhos.
— A nossa noite mal começou. Não se preocupa com isso agora.

Poderia ser fácil para ele falar, mas a minha ansiedade estava me
deixando louca. Mal via a hora em que ele me tomaria nos braços para fazer
amor comigo a noite toda.

— Estou ansiosa.

— Perto de mim, você não precisa ficar.

— Perto de você é quando eu mais fico. — Ri, sem graça.

— Então, precisamos trabalhar isso.

— É...

O garçom voltou para perto de nós e colocou os pratos na nossa frente.

— Você é linda — murmurou o Guto, antes de se afastar


completamente e as minhas bochechas ficaram muito vermelhas.

— Obrigada. Você também. Não tem ideia do quanto sempre achei


você lindo.

— Rosi, eu não...

Estiquei meu dedo e toquei o seu lábio com a ponta, silenciando-o


antes que começasse a citar a lista de empecilhos para que ficássemos juntos.
Já conhecia todos eles de cor e não me importava.

— Você me prometeu essa noite.

— Prometi.
— Esquece tudo e pensa só em nós dois.

— Tudo bem. — Ele pegou a minha mão e beijou o dorso.

— Eu amo você, Guto.

— Não faz ideia... — Silenciei ele de novo.

— Acho que eu sou a melhor pessoa para saber sobre os meus


sentimentos, não acha?

— Você tem razão, Rosi. — Ele se ajeitou na cadeira e pegou os


talheres para comer a salada.

Guto poderia até não acreditar nos meus sentimentos, mas eu os


entendia melhor do que ninguém, pois convivi com eles a vida toda. Poderia
ter sido virgem até a noite passada, mas não era uma menina boba; sempre
soube muito bem o que eu queria e quem eu queria. E quem eu queria era
esse homem parado na minha frente.

Virgem sim, mas muito determinada. Eu tinha guardado o meu amor e


o meu corpo para ele por muito tempo.

Comemos a salada e eu experimentei o vinho. Tomei algumas goladas


e coloquei a taça ao lado do prato outra vez.

— É muito bom!

— Não disse! — Sorriu, orgulhoso. — Eu adoro esse restaurante.

— Espero que você me traga aqui mais vezes.

Guto não disse nada, mas percebi que as suas bochechas coraram,
como acontecia comigo o tempo todo quando estava com ele. Será que isso
era um sinal de talvez?

Sabia que era sonhar alto, mas quem sabe ele não me tornaria a sua
namorada? Não me importava, nem um pouco, de manter o nosso
relacionamento as escondidas.

O prato principal foi servido e, entre uma garfada e outra, trocávamos


olhares e toques de mão. Estava ansiosa para que esses toques fossem parar
em outros locais do meu corpo.

— A faculdade, está empolgada? — perguntou, e percebi que ele


estava puxando assunto, querendo saber mais sobre mim, da Rosi, e do que
eu fazia da vida, e não ser apenas a filha do melhor amigo dele.

— Estou no primeiro período ainda, acho que é meio cedo para ter uma
opinião formada.

— Mas está gostando?

— Muito! Apesar dos textos chatos e sem sentido, mas, como sempre
fui uma boa leitora, eu me livro deles bem rápido.

— Que tipo de coisa você gosta de ler?

— Romance. — Joguei um ravióli na boca e virei o rosto em outra


direção, fitando o casal que estava em outra mesa atrás do Guto, para não
parecer envergonhada.

— Aqueles melosos?

— Os mais quentes... Você fez Administração de Empresas, não é? —


apressei-me em perguntar, pois queria desviar o assunto. Sabia a faculdade
dele, pois sempre fiz questão de saber tudo sobre o Guto.

— Sim. — Ele gargalhou.

— O que foi? O que tem de divertido no curso de Administração?

— No meu curso, nada. Eu ri imaginando você com essa carinha lendo


um romance erótico.

— Tem algo contra?

— Não. Só não era o que eu esperava.

— Olha, posso não ter feito, mas eu imaginava bastante.

— Com os personagens?

— Com você.

Guto engoliu em seco e foi a vez dele desviar o olhar.

— Mas essa noite eu não vou precisar imaginar — falei firme,


lembrando-o da noite que ele havia me prometido.

— Não, Rosi. Eu estarei lá de verdade — admitiu, fazendo com que


um calafrio subisse pela minha espinha.

Me perdi no seu olhar enquanto encarávamos um ao outro. Ele


finalmente parecia ter deixado de lado a ladainha e os empecilhos. Aquela
noite éramos apenas nós dois e a realização de todos os meus sonhos.

— Vai esfriar. — Fincou o garfo em um ravióli no meu prato e levou


na minha boca.
Afastei os lábios para que ele me servisse. Por debaixo da mesa, Guto
colocou a mão sobre a minha coxa. Isso fez com que a possibilidade de nós
virarmos um casal se tornasse uma imagem ainda mais viva na minha mente.

Também coloquei um ravióli na boca dele para retribuir. Quando dei


por mim, estávamos servindo um ao outro.

— Isso é bobo. — Ele riu.

— Isso é romântico. — Suspirei.

Guto afastou o prato já vazio e se debruçou sobre a mesa para tocar os


meus lábios com os seus em um selinho carinhoso.

— Quer a sobremesa? — Acariciou o meu queixo.

— E se eu for a sua sobremesa?

— Rosi!

— Eu tentei. — Dei de ombros e ele sorriu.

— Que tal uma torta de chocolate?

— Parece bom. — Ele gesticulou para o garçom e pediu duas.

Entrelacei os meus dedos aos dele sobre a mesa e o Guto me beijou


mais uma vez. Vivendo aquele sonho, suplicava para que não acordasse
nunca.
Capítulo 33

Finalmente, saímos do restaurante e seguimos para o carro dele.


Mesmo sem o sexo, que era o objetivo da noite, eu já estava muito feliz. O
jantar com o Guto, certamente, havia sido um dos momentos mais especiais
da minha vida. Havia sonhado e planejado muitas vezes, porém, em nenhuma
delas consegui mensurar o quanto ficaria feliz.

Guto não me olhava como se eu fosse alguém com que ele precisava
conviver, mas sim como se estivesse ali por mim.

Ele abriu a porta do carro e esperou que eu me acomodasse no banco


antes de dar a volta e assumir o volante.

Meu coração voltou a bater acelerado quando ele deu a partida no carro
e avançou para a rodovia. Em poucos minutos, estaríamos sozinhos, e não
seria como na festa, com a possibilidade do meu pai ou de qualquer outra
pessoa nos pegar no flagra; seriamos apenas nós dois, com toda calma e
paciência do mundo.

Coloquei uma mão sobre a sua coxa e ele tirou uma do volante para
tocar a minha.

Memorizei aquele momento, guardando-o nas lembranças, junto com


os demais que já tinha daquela noite.

Meu coração estava quente, e batia apertado de expectativas, mas eu


não podia estar mais feliz. Não queria pensar que poderia ser apenas aquela
noite; apenas me preocupei em aproveitá-la ao máximo.
Para a minha surpresa, Guto estacionou na entrada de um hotel. Não
um motel de beira de esquina, mas um hotel de luxo com uma recepção
grande e bem decorada com um lustre enorme na entrada.

— Nossa! — exclamei alto demais.

— Vem. — Guto abriu a porta e me deu a mão, entrelaçando os dedos


nos meus.

Seguimos direto pela recepção até os elevadores e achei estranho o


Guto não pegar a chave nem nada.

— Não tinha que conversar com o recepcionista antes? — Apontei.

— Já estive aqui mais cedo. A chave está comigo.

— Ah. — Abri um sorriso amarelo, sem graça, enquanto entrava no


elevador com ele e Guto apertava o botão para o último andar.

Saímos em um corredor enorme e bem decorado, com acabamento em


gesso e iluminação embutida, nas paredes havia uma textura metálica e o
chão era claro e lustroso. Segui atrás do Guto para uma porta bem no fim da
longa sequência. Ele tirou a chave do bolso e girou a maçaneta, permitindo
que eu pudesse ver o que havia lá dentro.

Eu abri a boca várias vezes, mas não consegui emitir nenhum som, pois
estava completamente em choque. Eu imaginava uma noite romântica, mas
não estava preparada para aquilo. Busquei os olhos do Guto e encontrei o seu
sorriso antes de voltar a fitar o quarto. Havia mais velas e rosas do que eu era
capaz de contar. Sobre os móveis, a mesa, e até na cabeceira da cama, havia
arranjos de rosas vermelhas, o chão também estava coberto de pétalas, e as
velas destacavam as chamas por entre as flores. Guto nem precisou acender a
luz do quarto, pois elas eram tantas, que ofereciam uma iluminação agradável
e amarelada.

— Guto, isso é incrível! — Finalmente consegui dizer ao jogar os meus


braços sobre os ombros dele.

— Nada menos que você merece. — Abraçou a minha cintura.

Eu já o achava um homem maravilhoso, mas, naquela noite, eu tive a


certeza de que não havia mais ninguém que eu quisesse que não fosse ele.

Tombei a cabeça para trás e elevei meus lábios, pedindo pelos dele e
Guto me atendeu, me beijando. Foi um beijo carinhoso, mas não menos
intenso do que os outros que já havíamos trocado antes.

Ele subiu uma das mãos e tocou o meu rosto, segurando-o enquanto
aprofundava o beijo. A sensação da sua língua tocando a minha era mágica,
afrodisíaca e enlouquecedora. Eu me entreguei para ele como na primeira
vez, sem ressalvas ou medo. Meu coração já era do Guto, mas agora o meu
corpo havia se tornado também.

Toquei a sua nuca, sentindo os pelos arrepiados do seu pescoço, e


embrenhei meus dedos no seu cabelo macio. Na ponta dos pés, esfregava os
meus lábios nos do Guto, beijando-o até ficar sem fôlego.

Deixei que as minhas mãos caíssem e segurei na lapela do seu blazer,


disposta a tirá-lo, mas o Guto afastou as minhas mãos.

— Espera.

— O que foi? Por favor, não me diz que você mudou de ideia.

— Calma, Rosi. — Ele contornou meus lábios com o polegar,


deixando-me paralisada. — Nós temos a noite inteira.

— Podemos fazer de novo... e de novo.

— Não é assim que funciona.

— E como funciona?

— Você vai me mostrar.

— Eu? — Franzi o cenho e afunilei os olhos, confusa.

— Sim. — Segurou a minha mão e me puxou para a cama.

Guto se sentou na beirada e me deixou de pé, na frente dele e entre as


suas pernas. Tirou o blazer e a gravata e ficou me olhando.

— O que quer que eu mostre? — Cruzei os braços atrás do corpo,


acanhada.

— Quero que tire a roupa para mim e me diga como e onde eu devo te
tocar.

— Guto... — resmunguei. Queria que ele me pegasse e jogasse na


cama, sem jogos. No fundo, ainda havia um grande medo de que ele mudasse
de ideia.

— Só vou tocar onde você me indicar, Rosi. — Cruzou os braços.

Bufei e ele riu da minha expressão de descontentamento, porém, não


pareceu se incomodar com ela.

— São as minhas condições.


— Isso não é nada justo.

— Lidamos com injustiças na nossa vida o tempo todo, Rosi —


afirmou em tom sério, e eu tive a certeza de que não conseguiria nada dele se
não entrasse no jogo.

Tentei puxar o vestido para cima, a fim de me livrar dele de uma vez,
porém, Guto segurou a minha mão e me fez voltar a encará-lo.

— Com calma.

— Está bem. — Expirei e inspirei, profundamente.

Puxei o vestido, vagarosamente, porém, só consegui subir a saia, pois


os botões ainda estavam fechados nas minhas costas.

— Pode abrir para mim? — Fiquei de costas para ele e indiquei o


primeiro botão pouco abaixo da minha nuca.

Guto se levantou e ficou atrás de mim.

— Esse? — Segurou o vestido.

— Sim. — Estremeci com as pontas dos seus dedos tocando a minha


pele. Eles estavam gelados e me provocavam calafrios.

Guto o tirou da casa e fez o mesmo com os restantes, até que meu
vestido fosse aberto. Puxei uma das mangas para o lado e indiquei o meu
ombro.

— Me beija.

Guto aproximou os lábios, roçou-os na minha pele e deu um leve,


porém, demorado chupão que bambeou as minhas pernas.

— Aqui também. — Expus o outro ombro.

Guto segurou o ombro anterior e o usou como apoio para me manter


firme enquanto beijava o outro. Imaginei que ele fosse passear com os lábios
pelas minhas costas, mas permaneceu com eles no local que eu havia
indicado. Não sabia se iria sobreviver a essa tortura.

Joguei a cabeça para o lado, puxei o meu cabelo e indiquei o meu


pescoço. Sem demora, os lábios do Guto subiram até ali e eu fechei os olhos,
entregando-me às nuances de cada efeito que ele provocava em mim.

Enquanto ele beijava o meu pescoço, mordia e dava leves chupões,


puxei o meu vestido e deixei que ele caísse aos meus pés, ficando apenas de
calcinha e sutiã.

— Onde mais? — disse com a boca na minha orelha, e o meu coração


parou de bater instantaneamente.

— Abre o meu sutiã.

Guto passou os dedos por debaixo do fecho e os moveu até que a peça
abrisse, mas ele não a removeu, atendendo exatamente o que eu havia pedido.

— Tira... — Tinha que me conter para não dizer que queria que ele me
jogasse na cama e arrancasse a minha roupa o mais rápido possível.

Os dedos do Guto contornaram os meus ombros, fizeram pequenos


redemoinhos até entrarem por debaixo das alças do meu sutiã. Lentamente,
ele as escorregou pelos meus antebraços, braços, até que caíssem dos meus
pulsos.
Eu me girei, na ponta dos pés, e fiquei de frente para ele. Nossos olhos
se encontraram e eu vi um desejo tão grande, que aumentou a palpitação no
meu peito. Parado, encarando-me, Guto me analisou, observando meus seios
e meus mamilos, mas não aproximou as mãos ou a boca.

Com as mãos, percorri a elevação dos meus seios, passei pelos


mamilos e segui até onde eles encontravam a região do meu diafragma. Guto
salivou, umedeceu os lábios, mas não me tocou.

— Meus seios em suas mãos.

— O que acha da minha boca?

— Parece melhor ainda. — Meu sorriso malicioso foi o suficiente para


que ele se abaixasse, curvando o corpo para frente, e lambesse o meu
mamilo, que ficou ainda mais rígido com o estímulo.

Peguei uma das mãos dele e a trouxe até o seio que estava livre. Guto o
apertou e eu joguei a cabeça para trás, gemendo. Ele sugou meu mamilo,
mordiscou o meu seio, e me enlouqueceu. Queria mais, muito mais, queria
sua boca em mim inteira.

Peguei suas mãos e as coloquei na minha cintura.

— Tira a minha calcinha.

Ele não parou de sugar o meu seio para puxar o elástico da minha
pequena e fina calcinha de renda e brincar com o tecido, antes de puxá-la
para baixo. Rebolei para que terminasse de escorregar pelas minhas coxas e
finalmente fiquei completamente nua na frente dele. Chutei a minha calcinha
e o meu vestido para algum canto do quarto antes de afastar as minhas pernas
o máximo que consegui.
— Agora, quero a sua boca aqui. — Coloquei seu indicador sobre o
meu clitóris.

O Guto se ajoelhou diante de mim e segurou a minha cintura com as


duas mãos antes de aproximar o rosto da minha vagina. Seu hálito foi o
primeiro a tocar o meu sexo e eu rebolei com a excitação, que se intensificou
em mim como se eu tivesse jogado álcool em uma fogueira. A expectativa
que antecedia ao seu toque me fazia desejá-lo ainda mais.

— Na cama vai ser melhor, eu posso?

— Com toda certeza.

Guto se levantou com os olhos grudados nos meus outra vez e me


pegou no colo, sem desviar o olhar, e me deitou na cama sobre os
travesseiros, sobre o lençol macio e as pétalas de rosa.

Ele afastou as minhas pernas, pegou um dos meus pés, tirou a minha
sandália, beijou meu tornozelo, a batata da minha perna, seguiu até o meu
joelho e a face interna da minha coxa. Sua respiração tocava a minha pele tão
sensível e me arrepiava por inteira, provocando diversos calafrios.

Guto lambeu a minha virilha, onde minha perna se unia ao corpo e,


quando finalmente achei que ele fosse afundar a boca na minha vagina, ele
pegou a minha outra perna, retomando o processo. Delicadamente, colocou a
minha sandália no chão ao lado da outra, segurou o meu pé para cima,
mordeu a batata da minha perna e deslizou a língua pelo interior da minha
coxa. Revirei os olhos e meu corpo resetou, movi a cabeça para cima e dei
uma cabeçada nos travesseiros.

Antes que o Guto colocasse a boca onde eu havia pedido, eu já estava


enfiando as unhas no lençol da cama e delirando. O desejo que pulsava entre
as minhas pernas era intenso, e Guto havia começado um incêndio que
precisava apagar.

— Guto — gemi, agarrando o seu cabelo e fazendo com que me


encarasse.

— Você quer?

— Sim, por favor... — Esfreguei as coxas uma na outra, mas isso não
era o suficiente para aplacar a necessidade que ele havia criado ali.

Ele ajeitou as minhas pernas sobre os seus ombros, veio com a boca na
direção do meu sexo, soprou um hálito quente, que me retorceu de dentro
para fora, e beijou o meu ventre, fazendo-me gemer em desespero. Já não
estava aguentando mais.

— Guto!

Ele riu baixinho e o vi enfiar a mão no bolso, tirar algo, desembalar e


jogar na boca. Provavelmente uma bala, mas não era isso que eu queria vê-lo
chupando. Ele voltou a aproximar a boca do meu sexo e o hálito refrescante e
gelado arrancou um gritinho desesperado do fundo da minha garganta. Meu
coração já não tinha mais espaço no peito de tanto que ele saltitava. A aflição
e a ânsia aumentavam a necessidade, que eu sempre tive por ele, a níveis
indescritíveis.

Finalmente, depois de muito desespero, ele me presenteou com a sua


língua. Ela estava refrescante, assim como o seu hálito, e eu me retorci ainda
mais na cama, sentindo formigamentos e pequenos choques enquanto ele
percorria os lábios do meu sexo e subia novamente até encontrar o meu
clitóris. Guto o rodeou com a boca e eu me senti na queda de uma montanha-
russa, que abalava tudo o que havia dentro de mim. O frio na barriga, a
adrenalina, e a sensação de não ter controle de nada, era exatamente assim
que ele me fazia sentir e eu amei cada segundo em que a sua língua deslizava
pelo meu sexo e seus lábios estimulavam o meu clitóris.

A cada vez que ele parava e soltava o seu hálito refrescante em mim,
eu dava um gritinho alucinado e enterrava ainda mais os meus dedos no
lençol. Depois do que estava fazendo comigo, Guto não poderia me culpar
por estragar a roupa de cama. Ele me atirou de um precipício, apenas para me
amparar em um colchão macio.

Era insano, arrebatador, intenso e o momento mais prazeroso que


experimentei na vida. Sem pressa, tocando-me com devoção, ele me levou a
um orgasmo, que me abalou como um terremoto, mexeu com todo meu
equilíbrio e percepção. Senti que havia chegado ao fim da montanha-russa,
mas, como o próprio Guto havia dito, tínhamos a noite toda.

Fiquei estatelada na cama por alguns minutos, sem forças, fôlego ou


equilíbrio. E ele ficou parado, encarando-me e me observando ofegar.

Assim que o quarto parou de girar ao meu redor, sentei-me na cama e o


puxei pela gola da sua camisa. Eu o trouxe até mim e requisitei o direito aos
seus lábios. Sua boca tinha gosto de menta e presumi que era pela bala que
ele tinha usado para me levar a loucura.

Em meio ao desespero e a necessidade, eu arfava. Com o Guto


ajoelhado na cama, subi no seu colo e meu sexo, molhado e ainda pulsando
pelo orgasmo, esfregou no volume que esticava o tecido da sua calça.
Mordisquei a sua boca e Guto lambeu os meus lábios enquanto suas mãos
passeavam pelo meu corpo, redesenhando cada uma das minhas curvas.

Meus dedos trêmulos puxavam os botões das casas de sua camisa e a


minha ânsia era tamanha que eu me via arrancando alguns deles a qualquer
momento. Eram tantos, que eu levei uma eternidade para abrir a sua camisa.
Eu a puxei pelos seus ombros e a arranquei pelos seus braços. Não me
importava nem um pouco com o fato de que tínhamos a noite inteira, minha
vontade era arrancar a roupa dele o mais rápido possível.

Abri a fivela do cinto e o puxei, fazendo com que estalasse na lateral da


cama, desci o zíper e o Guto me tirou do seu colo para que pudesse remover a
calça. Ele se livrou da peça e da cueca boxer branca.

— Tem mais bala? — Minha voz era tremida e ofegante e, só de


encará-lo, eu sentia faíscas estourarem por todo o meu corpo, quase como
fogos de artifício.

Guto tateou o bolso da calça e me entregou uma. Tirei do papel e


joguei na boca. Chupei um pouco, saboreando o doce e a menta, antes de
segurar o pau do Guto e o enfiar na boca, faminta e afoita. A ousadia que
tinha dentro de mim havia se libertado completamente e eu queria retribuir
parte do prazer que ele havia me dado, além disso, olhar para o seu pau
rígido, me deixava salivando.

— Calma! — Gemeu, agarrando o meu cabelo com força e parando os


meus movimentos. — Assim. — Guiou os meus movimentos e eu voltei a
envolvê-lo com os lábios.

Eu sugava o Guto, sentindo o sabor dele misturado à refrescância da


bala. Era insana a vontade que me impulsionava além do racional. Eu me
deliciava com a presença dele na minha boca, queria mais e mais. À medida
que eu me movia, o Guto deixava que aumentasse a velocidade. Porém, de
repente, ele me fez parar novamente.

Iria perguntar o que tinha acontecido, mas ele me puxou de volta para o
seu colo e me acomodou sobre o seu pênis. Esfreguei-me no membro que
latejou debaixo de mim. Eu havia gozado com o oral, mas estava longe de
estar satisfeita.

— Pronta? — Guto segurou meu queixo e não me deixou olhar para


nenhum outro lugar que não fosse dentro dos olhos dele.

Apenas balancei a cabeça em afirmativa e coloquei as mãos entre os


nossos corpos, segurando-o, para que pudesse me acomodar nele. Seu pau me
invadiu e gememos juntos, deixando que o nosso prazer ecoasse por todo o
quarto. Não houve dor daquela vez, apenas um prazer imensurável. Eu estava
muito molhada e o Guto escorregava dentro de mim com facilidade. Ele
agarrou as minhas nádegas, segurando-as com firmeza, e me colocou para
quicar. A fricção me levou para uma parte de mim que eu desconhecia,
roubou qualquer gota de racionalidade que ainda poderia haver na minha
mente e me fez experimentar o inexplicável.

Eu abracei o Guto e meus seios, muito sensíveis, esfregavam no seu


peito enquanto eu me movia, subindo e descendo no seu colo, aumentando
ainda mais o meu prazer. Ele me fez tombar para trás e eu apoiei as mãos na
cama com as palmas abertas. Sua boca voltou para os meus seios, alternando
mordidas e chupadas entre os dois, e isso aumentava a minha vontade de me
esfregar nele. Naquela posição, sentia que o meu clitóris era estimulado pelo
contato com o corpo dele. Não demorou para que eu fosse varrida por uma
onda de orgasmo ainda mais intensa do que a provocada pelo oral. Foi como
se todo o ar houvesse sido sugado do quarto. Quando consegui voltar a
respirar, enchi os meus pulmões de uma única vez.

Guto enterrou os dedos na minha bunda e percebi que os seus músculos


haviam enrijecido, segundos antes do seu líquido quente ser jorrado para
dentro de mim. Sorri ao perceber que ele também havia chegado lá e tombei a
cabeça no seu ombro, satisfeita e exausta.

Seria difícil uma noite que superasse aquela.


Capítulo 34

Meu coração estava estranho, não sabia se essa era a melhor definição,
mas foi a que eu encontrei. Estava culposamente feliz. Não deveria ter
gostado tanto daquela noite, mas gostei.

Percorri com os dedos os fios do cabelo curto e pintado de loiro da


Rosi. Aquela garota sempre teve uma personalidade forte e determinada. O
cabelo tingido era uma das provas disso. Lembrava claramente do dia, há uns
dois anos, em que ela havia saído de casa para ir ao salão de beleza e voltara
com o cabelo tingido de loiro. Ricardo tinha ficado louco, mas teve que
acabar aceitando a decisão da filha.

O nosso relacionamento não era como um cabelo pintado e


dificilmente seria aceito com facilidade pelo meu melhor amigo.

A noite havia sido ótima, mas não poderia se repetir. Rosi estava na
lista das mulheres com quem eu não poderia ficar e o que eu estava sentindo
não importava. Já tinha ido longe demais. Tê-la nua nos meus braços, depois
de uma noite de sexo, era algo que nunca deveria ter acontecido, mas aquela
seria a última péssima decisão que eu tomava em relação a ela.

Depois que saíssemos daquele quarto, Rosi voltaria a ser a filhinha do


meu melhor amigo e eu nunca mais a tocaria.

— Rosi — chamei baixinho, ao tirar uma mecha do seu cabelo que


estava cobrindo o rosto deitado no meu peito.

Já era dia, alguns pequenos pontos de sol entravam pelas frestas da


cortina. Por mais que não quisesse estourar a bolha, Rosi precisava ir para a
faculdade e eu tinha que trabalhar.

Ela resmungou baixinho, mas não abriu os olhos nem se mexeu.

— Rosi — chamei novamente, ao depositar um beijo na sua testa.

Ela abriu vagarosamente os olhos castanhos e me encarou sorridente.

— Bom dia! — Espichou o pescoço para tocar seus lábios nos meus e
eu não recusei o beijo, deveria, mas não recusei. — Foi a melhor noite que eu
já tive. — Aninhou-se mais, apertando o seu corpo no meu.

Não disse nada sobre a frase dela, mas, sem dúvidas, também fora a
melhor noite que eu havia tido nos últimos anos.

— Bom dia. Temos que nos levantar.

— Não — resmungou, fazendo bico.

— Rosi, você tem que ir para faculdade e eu preciso trabalhar. Ainda


preciso passar em casa, trocar de roupa. Nem sei que horas são.

Tentei me levantar, mas ela soltou o peso sobre o meu peito,


dificultando.

— Fica aqui comigo hoje.

— Sabe que eu não posso. — Encarei-a, sério.

— Você trabalha tanto. Tenho certeza de que não vai ser um dia que
vai te prejudicar.

— Não é por isso, Rosi. Era uma noite. Não podemos continuar
fazendo isso.

— Você não gostou? — Deixou que os olhos caíssem, tristes.

— Sabe que não é isso.

— Eu gostei, você gostou, não entendo por que não continuar. Algo tão
bom não deveria ser proibido.

— Mas é. — Afastei-a de cima de mim e me levantei, procurando pela


minha calça para pegar o celular que deveria estar dentro dela.

Puxei meu telefone do bolso e vi que ainda eram seis da manhã, daria
tempo de me arrumar e chegar para trabalhar como se nada houvesse
acontecido.

Entrei no chuveiro, girei o registo e me surpreendi ao perceber que a


Rosi havia entrado no box junto comigo.

— Rosi. — Girei o meu corpo e a encarei. Esse, provavelmente, havia


sido o meu erro, pois seus olhos firmes e seu corpo nu eram um convite
muito incisivo para a minha total depravação.

— Guto, nós não precisamos parar.

— Precisamos, sim, Rosi. Isso não é uma brincadeira. Foi uma noite,
apenas uma. Não sou o homem certo para você e, com o passar do tempo, irá
perceber isso.

— Você não quer? — Ela passou a mão pelo seio e minha boca
salivou, meu pau, que já estava muito rígido, ficou ainda mais ereto quando
olhei para o corpo dela com malícia.
— Era só a noite passada, Rosi, não vamos transar de novo.

— Só mais uma vez. — Ajoelhou-se diante de mim.

— Rosi, não! — Segurei o seu cabelo, mas não consegui impedir que
ela aproximasse a cabeça do meu pênis.

Por que queria tanto algo que era tão proibido?

— Deixa. — Passou a língua pelos lábios de um jeito sexy que eu não


consegui resistir.

Com os dedos enterrados no seu cabelo, trouxe sua cabeça para mim e
passei o meu pau nos seus lábios. Deveria ser mesmo um pervertido, pois me
retorci de prazer com isso. Rosi envolveu meu pau com suas mãos pequenas
e delicadas, acolhendo-me dentro da sua boca molhada e quente.

Ela me chupou com ousadia. Era uma menina com o atrevimento de


uma mulher e me deixava louco no melhor e no pior sentido. Seus lábios
escorrendo pela minha extensão me embriagavam com as mais deliciosas
sensações. Com a mão na sua cabeça, eu fazia com que ela se movesse mais
rápido e me enfiava mais fundo, até tocar a sua garganta. Com sua língua, ela
me provocou e com a língua me ensandeceu até me fazer gozar, derramando-
me na sua boca.

Rosi se levantou, limpando o canto dos lábios com a ponta dos dedos e
com um sorriso travesso que me provocou além do limite.

— Você é muito terrível para uma virgem.

— Graças a você, eu não sou mais virgem.

— Bem lembrado. — Puxei-a pela cintura e a fiz girar.


Coloquei Rosi de costas para mim e ela se apoiou com as mãos abertas
no vidro do box. Colei meu corpo no seu, encaixando sua bunda em mim e a
pressionei contra o vidro, fazendo a Rosi ofegar e gemer. Aproximei a minha
boca da sua orelha e os seus pelos se eriçaram com o arrepio que provoquei
nela. Estava quente, havia acabado de gozar, e meu pau já estava duro de
novo. Aquela garota me deixava louco; perto dela, eu também era um jovem
inconsequente.

— Só mais uma vez — murmurei com a boca na sua orelha, e ela


estremeceu, esfregando a bunda em mim.

— Mais uma vez. — Rebolou em mim, incitando-me a continuar e


acabou com o pouco de racionalidade que me restava.

Segurei a sua cintura, puxando-a para trás e Rosi escorregou as mãos


pelo vidro, deixando a marca molhada das suas palmas. Subi uma das mãos,
puxando o seu cabelo, enrolando-o, e trouxe a sua cabeça para o meu ombro
no momento em que a penetrei. Ela estava molhada e excitada, e eu deslizei
com facilidade. Ela esfregou seu corpo no meu, rebolando, e me tornei
selvagem diante do prazer. Culpa e impedimentos foram colocados de lado
enquanto me movia dentro dela, numa busca insana e irresponsável por
prazer. Nós dois ofegávamos e o box só ficava mais embaçado.

Saí de dentro dela num rompente e a surpreendi, virando-a de frente.


Puxei uma das suas pernas e a joguei ao redor da minha cintura. Quando
peguei a outra, tirando o seu equilíbrio, Rosi enlaçou meu pescoço e me
abraçou com pernas e braços.

Bati suas costas na parede do banheiro e a penetrei outra vez. Rosi


buscou os meus lábios e eu devorei sua boca em um beijo faminto enquanto
movia-me para dentro dela com estocadas firmes. Nossos corpos molhados
esfregavam-se um no outro e minha excitação era ainda maior.

Os gemidos dela na minha orelha a cada uma das minhas investidas


eram um deleite à parte. Não consegui me conter por muito tempo, todos os
meus músculos foram paralisados por uma força mais intensa do que eu, e
acabei gozando novamente. Porém, continuei me movendo, os gritinhos
alucinados da Rosi eram o indicativo que logo se juntaria a mim. Percebi que
ela também havia chegado lá quando jogou o peso dos seus braços sobre os
meus ombros e o seu peito começou a subir e descer com uma respiração
frenética.

Esperei que nós dois nos recuperássemos, para colocá-la de volta no


chão, mas Rosi continuou usando o meu peito como apoio.

— Não é possível que isso só seja bom para mim. — Colocou a mão
sobre o peito, que se movia acelerado.

— Não é uma questão de ser bom ou não, Rosi, mas de ser certo ou
errado.

— Nada é errado se nos faz feliz.

— Quem dera que as coisas fossem tão fáceis. — Bufei, enfiando a


cabeça debaixo da água corrente do chuveiro.

— Não percebe que é você quem está complicando tudo, Guto?

— Quem sabe um dia você entenda. — Passei a mão pelos meus


cabelos enquanto sentia a água cair em gotas pequenas pelas costas das
minhas mãos.
— E que você também entenda que eu estou aqui porque quero ficar
com você e que vou continuar querendo, não importa quantos empecilhos
você liste.

— Você é bem determinada.

— Talvez essa seja uma das minhas maiores qualidades. — Sorriu ao


começar a se lavar quando saí debaixo do chuveiro.

Eu me sequei e vesti o meu terno, enquanto a Rosi colocava roupas


limpas que havia trazido dentro da bolsa. Fiquei feliz por ela ter pensado
nesse detalhe.

Nós descemos e eu entreguei a chave do hotel. Iria deixá-la na


faculdade e tudo o que haví