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Soteriologia

Welerson Alves Duarte

Aula 4: A Vocação

INTRODUÇÃO:

Na aula passada vimos que a soteriologia trata da aplicação das bênçãos da salvação na vida
do pecador.

Vimos que é possível estabelecer uma ordem lógica para os vários aspectos desta aplicação,
ainda que a bíblia não seja explícita na apresentação de uma Ordem da Salvação
completa uma vez que ela oferece a base suficiente para a referida ordem. A melhor
aproximação a algo como a ordo salutis na Bíblia é a declaração do apóstolo Paulo em
Rm.8:29,30. A Bíblia nos dá uma completa e rica enumeração das operações do Espírito
Santo na aplicação da obra realizada por Cristo a pecadores individuais, e das bênçãos
da salvação comunicadas a eles. A Bíblia mostra, em muitas passagens e de muitas
maneiras, a relação que os diferentes movimentos atuantes na obra de redenção
mantêm uns com os outros Rm.3:30; 5:1,2; 6:18,22; 8:15-17; 10:17; Gl.2:16-20; Gl.4:4-
6; Ef.1;13,14; 4:1,2; Fp.3:9, 10 e 1ª Pe.1:23.
A partir desta aula e até o final deste curso comentaremos estes vários aspectos da aplicação
da salvação, ou seja, a vocação, a regeneração, a conversão, a justificação, a adoção, a
santificação e a perseverança.

Começaremos nesta aula falando sobre a vocação.

Vocação

Por vocação entendemos o chamado que é feito ao pecador para a salvação. Este chamado
pode ser divido em dois, o externo e o interno.

Vocação Externa

A vocação externa pode ser definida como sendo a


oferta da salvação em Cristo às pessoas, junto com
um convite para receber a Cristo em arrependimento
e fé, para que recebam o perdão dos pecados e
tenham a vida eterna.

Sobre a vocação externa John Murray diz o seguinte:

Podemos falar com propriedade de uma vocação que


não é eficaz em si mesma. Esta é, com frequência,
expressa como o chamamento universal do
evangelho. Os convites da graça no evangelho,
dirigidos a todos os homens, sem distinção, são mui
verdadeiros, e devemos sustentar esta doutrina com todas as suas implicações para a graça de
Deus, por um lado, e a responsabilidade e privilégio para o homem, por outro lado. Não é
apropriado referir a este convite universal como um chamamento universal. É muitíssimo
provável que este chamamento seja aquele mencionado em Mt 22.14: “Porque muitos são
chamados, mas poucos escolhidos”. E existem diversos textos no Velho Testamento que
poderiam ser evocados para corroborarem esta conclusão (J. Murray, Redenção Consumada e
Aplicada, São Paulo: Editora Cultura Cristã, 1993, p. 99).

Não resta dúvidas de que a chamada externa precisa ser feita a todas as pessoas e isto é papel
da igreja. Ainda que a igreja de confissão reformada defenda a eleição incondicional e a expiação
limitada, ela também defende que o chamado do evangelho deva ser feito a todos quantos seja
possível fazê-lo.

A partir da definição dada acima para a vocação externa podemos destacar três elementos
compreendidos nela: Uma apresentação dos fatos e das ideias do evangelho, um convite para
receber a Cristo com fé e arrependimento e uma promessa de perdão e salvação.

Apresentar os fatos do evangelho é declarar de modo claro, numa linguagem compreensível


ao povo, a obra que Cristo fez. Isto deve ser feito não apenas com uma linguagem clara, mas
especialmente com fidelidade às Escrituras.

Convidar a receber a Cristo é chamar o homem, diante da seriedade do pecado, a se arrepender


e crer em Cristo como Senhor e Salvador. Este convite não deve ser algo que deixe a pessoa livre
para aceitar ou declinar, como alguém que é convidado para uma festa, mas é uma ordem do
soberano Senhor de toda a criação que manda que o pecador dele se aproxime para ser salvo.

A promessa de perdão e salvação é a parte que precisa estar presente no convite, mostrando
que aqueles que responderem ao chamado receberão o perdão e a vida eterna em comunhão
com Cristo.

Nos Cânones de Dort encontramos dois artigos que tratam a respeito desta vocação. Eles dizem
o seguinte:

É a promessa do evangelho que qualquer que creia em Cristo crucificado não pereça mas tenha
a vida eterna. Essa promessa, junto com o mandamento de se arrepender e crer, deve ser
anunciada e declarada sem diferença ou discriminação a todas as nações e pessoas, às quais
Deus se agrada em enviar o evangelho (Capítulo II, Artigo 5)

Todos os que são chamados pelo evangelho são seriamente chamados (serio vocantur). Séria e
genuinamente (serio et verisime) Deus faz conhecido na sua Palavra aquilo que o agrada: que
aqueles que são chamados se acheguem a ele. Seriamente (serio) promete também descanso
para a alma e vida eterna a todos que venham a ele e creiam (Capítulo III, Artigo 8).

Esta vocação externa pode, e muitas vezes é rejeitada pelo pecador e o porquê disto, tem sido,
ao longo da história, motivo de debate na igreja.

É ainda preciso dizer que o chamado externo não é apenas uma obra especial feita vez ou outra.
Infelizmente a leitura que alguns fazem do “Ide, portanto, fazei discípulos de todas as nações,
batizando-os em nome do Pai, do filho e do Espírito Santo; ensinando-os a guardar todas as
coisas que vos tenho ordenado. E eis que estou convosco todos os dias até à consumação do
século” (Mateus 28.19, 20) é equivocado o que pode ser provocado pelo modo como a termo
grego para “ide” foi traduzido. A traduz nos induz a crer que há um imperativo ali, no entanto,
o único imperativo neste texto está no “fazei discípulos”. O termo que foi traduzido por “ide”, o
traduzido por “batizando” e o por “ensinando” não estão no imperativo, mas no particípio de
modo que a ideia é a de que enquanto se vai, faz discípulo, batizando e ensinando.

Desta forma, ser instrumento nas mãos de Deus para realizar o chamado externo não é uma
tarefa à parte mas um estilo de vida, ou seja, parte integrante do nosso cotidiano.

É claro que há aqueles que são chamados por Deus para abandonar sua
terra e vão pregar a povos distantes.
Sempre que se pensa em missões é preciso lembrar dos moravianos.
Este grupo nasceu no século 18 na Morávia. Em 27 de agosto de 1727 24
homens e 24 mulheres comprometeram-se a orar 1 hora por dia por
missões de forma sequencial o que garantia que nas 24 horas do dia sempre
havia alguém orando por missões. Isto durou mais de 100 anos e eles não
oravam por aquilo que não estavam dispostos a fazer.
Com eles temos uma história que deveria nos fazer corar de vergonha:
Dois jovens Moravianos, de 20 anos ouviram sobre uma ilha no Leste da
Índia onde três mil africanos trabalhavam como escravo e cujo dono era um
Britânico agricultor e ateu. O coração dos jovens se contorceu só de
imaginar que todas essas pessoas passariam o resto de suas vidas
confinadas sem jamais ouvir falar sobre o amor do Pai. Então esses dois
jovens fizeram contato com o dono da ilha e perguntaram se poderiam ir
para lá como missionários, a resposta do dono foi imediata: ” Nenhum
pregador e nenhum clérigo chegaria a essa ilha para falar sobre essa coisa
sem sentido”. Isso seria o ponto no qual a maioria de nós desistiria, para
eles foi a motivação para tomar a decisão mais difícil de suas vidas: vender-
se como escravo. Eles poderiam suportar o fato de viverem confinados pelo
resto de seus dias, mas jamais suportariam saber que tantas almas
morreriam sem salvação. O valor da venda pagou a viagem até a ilha, depois
disso jamais se receberam notícias dos dois.

Na hora da partida houve orações choros e abraços, amigos e familiares


puderam dar o último adeus para seus irmãos. E algumas pessoas falaram:
porque vocês estão fazendo isso? Vocês nunca mais irão ver seus familiares
e amigos, e vão ser escravos para o resto de suas vidas! Mas, quando o
barco estava se afastando do porto os dois jovens levantaram suas mãos e
declararam em voz alta:

“Para que o Cordeiro que foi imolado receba a recompensa por seu
Sacrifício através das nossas vidas”.
Também é verdade que por vezes há ocasiões especiais em que saímos
em evangelismo, porém chamar o pecador ao arrependimento não pode
se limitar a estas ocasiões.

Leitura Obrigatória:

A Grandeza da Grande Comissão, de Gary North

A Grande Comissão no Antigo Testamento, de Michael Morales

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