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Acórdãos STA Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo

Processo: 0672/18.0BEPRT
Data do Acordão: 20-10-2021
Tribunal: 2 SECÇÃO
Relator: ISABEL MARQUES DA SILVA
Descritores: RECURSO DE REVISTA
NÃO ADMISSÃO DO RECURSO
Sumário:
Nº Convencional: JSTA000P28322
Nº do Documento: SA2202110200672/18
Data de Entrada: 07-07-2021
Recorrente: A........., S.A.
Recorrido 1: AT - AUTORIDADE TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA
Votação: UNANIMIDADE
Aditamento:

Texto Integral

Texto Integral: Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal


Administrativo:

- Relatório –

1 – A……….., S.A., com os sinais dos autos, veio, ao abrigo do


disposto no artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo
Tributário (CPPT), interpor recurso para este Supremo Tribunal do
acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 25 de março de
2021 que negou provimento ao recurso por si interposto da sentença
do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgara verificada
excepção peremptória de caducidade do direito de deduzir
impugnação judicial.

A recorrente termina as suas alegações de recurso formulando as


seguintes conclusões:

A) Estabelece o artigo 285º do CPPT, sob a epígrafe “Recurso de


Revista” que: “1. Das decisões proferidas em segunda instância pelo
Tribunal Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista
para o Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a
apreciação de uma questão de importância fundamental ou quando a
admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor
aplicação do direito. 2. A revista só pode ter como fundamento a
violação de lei substantiva ou processual.

3. Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido o tribunal de


revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue mais
adequado.

4. O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais


em causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de
uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para
a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de
prova.

5. Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência


cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a
decisão recorrida, substitui-a por o acórdão que devida a questão
controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências
cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.

6. A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se


preenchem os pressupostos do nº 1 compete ao Supremo Tribunal
Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária,
a cargo de uma formação constituída por três juízes entre os mais
antigos da Secção de Contencioso Tributário.”

B) Como resulta do nº 1 do artigo transcrito a excecionalidade do


recurso de revista estando a sua admissibilidade condicionada por um
critério qualitativo que exige que em causa esteja a apreciação de
uma questão que pela sua relevância jurídica ou social, se revista de
importância fundamental ou que a admissão do recurso seja
necessária para uma melhor aplicação do direito.

C) Ora, no caso dos presentes autos, o douto Tribunal a quo,


considerou erradamente, “(…) os vícios invocados na petição inicial
não são sancionáveis com a nulidade, uma vez que estes se
reconduzem ao erro sobre os pressupostos de direito.”

D) Acrescentando, no douto acórdão de que aqui se recorre que “Ora,


atento todo o vertido supra, não sendo o vício de erro sobre os
pressupostos de direito gerador de nulidade dos atos de liquidação,
mas sim de anulabilidade, a Impugnação não podia ser deduzida a
todo o tempo, mas apenas no prazo de 90 dias contados a partir do
termo do prazo para pagamento voluntário das liquidações, ou seja, a
contar de 30/06/2007 (cf. Ponto 1. Do probatório). Sendo tal prazo de
natureza substantiva e contado de acordo com as regras do artigo
279º do CC ex vi n.1 do artigo 20º do C.P.P.T. Resultando dos autos
que presente impugnação foi remetida via postal sob registo apenas
em 20/03/2018 (cfr. ponto 3 do probatório), impera concluir pela sua
manifesta intempestividade. Destarte na improcedência do
fundamento do recurso apreciado, fica prejudicado o conhecimento
das demais questões suscitadas pela Recorrente.”

E) Salvo o devido respeito, esta questão é de elevada relevância


jurídica e social, até porque, provado que foi que as liquidações
adicionais padecem de vícios de erro sobre os pressupostos de
aplicação de direito, as mesmas criam obrigações pecuniárias não
previstas na lei, e concomitantemente, reconduzem à nulidade das
mesmas e do consequente imposto a liquidar. Logo, é impreterível
determinar a nulidade das liquidações de IVA impugnadas.

F) Pois que, o entendimento na doutrina expressa pela administração


fiscal, que na sequência do despacho nº 384/99-XII, de sua Exa. o
Ministro das Finanças de 13/10/1999, foi elaborado o Ofício -
Circulado nº 30019 de 04/05/2000, da Direção de Serviços do IVA,
que, tendo em vista uniformizar procedimentos, divulga a não
sujeição a impostos das operações de cedência de pessoal em todas
as situações em que o montante debitado comprovadamente
corresponda ao reembolso exato de despesas com ordenados ou
vencimentos, quotizações para a Segurança Social e quaisquer
outras importâncias obrigatoriamente suportadas pela empresa e que
pertence ao trabalhador, por força de contrato de trabalho ou
previstas na legislação aplicável (v.g. prémios de seguros de vida,
complementos de pensões, contribuições para fundos de pensões,
etc.).

G) Assim, e nos termos do entendimento preconizado pela


Administração Pública, a cedência de pessoal, não consubstancia a
aplicação de imposto. Logo, as Liquidações Adicionais que apliquem
um montante de imposto a liquidar que têm por base, as operações
económicas de cedência de pessoal, não podem produzir efeitos no
ordenamento jurídico português pelo que têm de ser declaradas
nulas.

H) Pois que, caso contrário, verifica-se a aplicação de dois critérios


divergentes, a AT considera que não há lugar à aplicação de imposto
sobre o valor acrescentado (IVA), ao passo que o poder judicial
determina que as Liquidações Adicionais de IVA, tendo por base as
operações de cedência de pessoal, devem produzir efeitos no
ordenamento jurídico.

I) Acresce que, como ficou provado os atos de liquidação adicional


objeto dos presentes autos, encontram-se feridos de ilegalidade, por
assentar em pressupostos de errónea qualificação e quantificação
dos rendimentos. É indubitável, que os mesmos se encontram feridos
de nulidade e não de anulabilidade.

J) Nulidade que se encontra expressamente consagrada na alínea k)


do nº 2 do artigo 161º do Código de Procedimento Administrativo
(CPA).

K) Desta forma, é indubitável que a utilidade da decisão a proferir nos


presentes autos extravasa os limites do caso concreto e das partes
envolvidas no litígio. Na medida em que, é de interesse geral de todos
os contribuintes, que estes saibam a forma e o tempo adequado que
dispõem para impugnar atos que criem obrigações pecuniárias não
previstas na lei.

L) A mesma jurisprudência do STA tem igualmente sublinhado a


excecionalidade deste recurso, referindo que o mesmo só pode ser
admitido nos estritos limites fixados neste preceito e que se trata não
de um recurso ordinário de revista, mas antes, como o legislador
cuidou de sublinhar na exposição de motivos das Propostas da Lei
nºs. 92/VII e 93/VIII, de uma válvula de segurança do sistema, que
apenas deve ser acionada naqueles precisos termos.

M) Ora, salvo o devido respeito, e nos termos do acima exposto, a


Recorrente, demonstra nas presentes alegações de recurso que a
questão colocada a apreciação de V/ Exas. assume uma relevância
jurídica e social de extrema importância, e consequentemente, sendo
o mesmo necessário para uma melhor aplicação do direito. Pelo que,
deve o mesmo ser admitido.

N) O douto acórdão de que aqui se recorre, julgou incorretamente,


que o prazo para apresentação da presente impugnação foi
largamente ultrapassado e, portanto, pela extemporaneidade da
presente Impugnação Judicial.

O) Salvo o devido respeito, tal não pode merecer acolhimento. Não


podendo, consequentemente, o acórdão recorrido produzir efeitos no
ordenamento jurídico. Tendo, indubitavelmente, de ser substituído por
outro.

P) Pois que, a aqui Recorrente intentou a presente ação de


Impugnação Judicial contra os atos de Liquidação Adicional de IVA,
com os números 07073055 e 07073049, no valor de €81.201,66
(oitenta e um mil, duzentos e um euros e sessenta e seis cêntimos) e
€91.280,40 (noventa e um mil duzentos e oitenta euros e quarenta
cêntimos) respetivamente.

Q) As Liquidações adicionais supra descritas, tiveram origem nas


seguintes faturas: (i) Venda a Dinheiro nº 1/2005 de 31/07/2005; (ii)
Venda a Dinheiro nº 2/2005 de 31/08/2005, cujas cópias foram juntas
aos presentes autos com a Petição Inicial.

R) Ora, da breve análise das supra mencionadas faturas constata-se


que as mesmas se referem única e exclusivamente a cedência de
pessoal, tal como consta do contrato de prestação de serviços,
Subcontratação celebrado entre esta entidade e a sociedade
B…………., S.A., outorgado em 21 de novembro de 2004.

S) Constata-se, ainda que a entidade cedente, in casu, a aqui


Recorrente apenas e somente pretende ser reembolsada dos
montantes despendidos relativos ao pessoal cedido.

T) Nestes casos, a cedência de pessoal não é considerada para


efeitos de tributação em sede de IVA, como prestação de serviços,
desde que o montante debitado à entidade a quem foi cedido o
pessoal, corresponda comprovadamente, ao reembolso exato das
despesas com ordenados ou vencimentos, os respetivos encargos
com a segurança social, e quaisquer outras importâncias,
obrigatoriamente suportadas pela entidade a quem pertencem
trabalhadores, por força de contrato de trabalho ou outra legislação
aplicável.

U) É este, efetivamente, o caso vertido nos presentes autos.

V) Concomitantemente, é este o entendimento na doutrina expressa


pela administração fiscal, que na sequência do despacho nº 384/99-
XII, de sua Exa. o Ministro das Finanças de 13/10/1999, foi elaborado
o Ofício – Circulado nº 30019 de 04/05/2000, da Direção de Serviços
do IVA, que, tendo em vista uniformizar procedimentos, divulga a não
sujeição a impostos das operações de cedência de pessoal em todas
as situações em que o montante debitado comprovadamente
corresponda ao reembolso exato de despesas com ordenados ou
vencimentos, quotizações para a segurança social e quaisquer outras
importâncias obrigatoriamente suportadas pela empresa e que
pertence ao trabalhador, por força de contrato de trabalho ou
previstas na legislação aplicável (v.g. prémios de seguros de vida,
complementos de pensões, contribuições para fundos de pensões,
etc.).

W) Sendo este, o entendimento e a obrigatoriedade desde o ano de


2000, aquando da emissão das faturas aqui em causa, em 2005, e
que originaram as Liquidações Adicionais aqui impugnadas, a
Recorrente não devia, nem podia liquidar IVA.

X) E isto, porque, como acima descrito, as operações pela mesma


efetuadas “Cedência de Pessoal”, não estão sujeitas a IVA.

Y) Contudo, e erradamente a Recorrente emitiu a fatura e liquidou o


IVA correspondente. E isto, porque a mesma estava na data dos
factos a ser alvo de um procedimento inspetivo, e foi a indicação dada
pelos técnicos tributários que se encontravam a realizar o referido
procedimento de inspeção. Ou seja, a Recorrente emitiu as faturas
com IVA porque foi a informação incorreta que lhe foi transmitida
pelos técnicos tributários.

Z) Consequentemente, tais faturas originaram os montantes de IVA


constantes das Liquidações Adicionais, criando desta forma um
imposto que não é devido.

AA) Por conseguinte, tais liquidações deram origem a uma dívida


indevida de IVA para a aqui Recorrente, e inclusive é ainda imputado
ao administrador da mesma a alegada prática de ilícito criminal.

BB) Por tudo o exposto, e como ficou devidamente provado nos


presentes autos, os atos de liquidação adicional encontram-se feridos
de ilegalidade, por assentar em pressupostos de errónea qualificação
e quantificação dos rendimentos por criarem obrigações pecuniárias
não previstas na lei. É indubitável, que os mesmos se encontram
feridos de nulidade e não de anulabilidade.

CC) Nulidade que se encontra expressamente consagrada na alínea


k) do nº 2 do artigo 161º do Código de Procedimento Administrativo
(CPA).

DD) Desta forma, e nos termos do disposto no nº 3 do artigo 102º do


Código de Procedimento e de Processo Tributário permite que a
Impugnação Judicial seja deduzida a todo o tempo, se o fundamento
for a nulidade.

EE) Ora, no caso dos presentes autos, e contrariamente ao vertido no


douto acórdão, o vício de que padecem os atos de liquidação
adicional não são geradores de anulabilidade, mas sim de nulidade.

FF) Pois que, não estando prevista em qualquer lei fiscal o regime de
nulidade dos atos, é aplicável subsidiariamente (ex vi artigo 2º alínea
d) do CPPT), o nº 1 do artigo 161º do Código de Procedimento
Administrativo, o qual prevê que “São nulos os atos a que falte
qualquer dos elementos essenciais ou para os quais a lei comine
expressamente essa forma de invalidade.”

GG) Por sua vez, o nº 2 do artigo 161º do CPA, enuncia


taxativamente os atos nulos, nos quais se encontra o fundamento
elencado pela Recorrente, pois que, os atos ora impugnados a
manterem-se no ordenamento jurídico, criariam, indubitavelmente,
uma obrigação pecuniária não prevista na lei.

HH) Verifica-se, assim, que o vício assacado aos atos de liquidação


adicional de IVA aqui em escrutínio, gera a pretendida declaração de
nulidade.

II) A nulidade, conforme é recorrentemente afirmado, constitui a forma


mais grave de invalidade. Assim, um ato ferido de nulidade é ineficaz,
não produzindo qualquer efeito ab initio, é insanável, quer pelo
decurso do tempo, quer pela ratificação, reforma ou conversão (cfr. nº
2 do artigo 162º e nº 1 do artigo 166º do CPTA).

JJ) É suscetível de impugnação a todo o tempo e perante qualquer


tribunal e pode ser conhecida a todo o tempo por qualquer órgão
administrativo e o seu reconhecimento tem natureza meramente
declarativa (artigo 162º nº 2 do CPA).

KK) Como já supra alegado e sobejamente demonstrado, os atos de


liquidação adicional de IVA, objeto nos presentes autos, são nulos em
virtude de criarem obrigações pecuniárias não previstas na lei, porque
as operações que as originaram, são operações não sujeitas a
Imposto Sobre o Valor Acrescentado.

LL) Nesta conformidade, tendo o vício alegado pela Recorrente, a


virtualidade, de gerar nulidade do ato tributário, logo, a ação não está
vinculada ao prazo previsto no artigo 102º nº 1 do CPPT, pois que
nos termos do nº 3 do mesmo dispositivo legal, verifica-se a ausência
de prazo para intentar Impugnação Judicial.

MM) Concomitantemente, andou mal o Tribunal a quo, ao considerar


verificada nos presentes autos a exceção peremptória da caducidade
do direito de ação, por extemporaneidade da Impugnação Judicial

NN) Assim, e por tudo supra explanado, e provada com saciedade a


nulidade de que padecem os atos de liquidação adicional, os mesmos
não podem ser mantidos na ordem jurídica, tendo impreterivelmente,
de ser declarados nulos, com todas as cominações legais.

OO) Mais, urge, reafirmar, que sendo a nulidade invocável a todo o


tempo, os presentes autos de Impugnação Judicial não estavam
sujeitos a qualquer prazo processual e a Recorrente pode, a qualquer
momento solicitar a intervenção judicial para atacar o vício de
nulidade verificado nos atos de liquidação.

PP) Pelo que, com a devida vénia, sempre terá de se afirmar, que
andou mal o Tribunal a quo, ao considerar que nos presentes autos
se verifica a exceção peremptória de caducidade do direito de ação
por intempestividade da impugnação judicial.

QQ) Concomitantemente, o acórdão proferido pelo Tribunal a quo,


merece total censura, devendo, o mesmo ser revogado e substituído
por outro que considere os atos de liquidação adicional nulos.

Nestes termos e nos mais de Direito aplicáveis, sempre com o mui


douto suprimento de V/ Exas. deve o presente recurso ser admitido, e
o acórdão proferido pelo Tribunal a quo substituído por outro que
considere o Recorrente parte legítima e que conheça do objeto dos
presentes autos.
2 – Não foram apresentadas contra-alegações.

3 – A Excelentíssima Procuradora-Geral Adjunta junto deste STA


emitiu douto parecer no sentido da não admissão do recurso por
ausência dos respectivos requisitos legais.

4 – Dá-se por reproduzido o probatório fixado no acórdão recorrido


(fls. 7 da respectiva numeração autónoma).

Cumpre decidir da admissibilidade do recurso.

- Fundamentação -

5 – Apreciando.

5.1 Dos pressupostos legais do recurso de revista.

O presente recurso foi interposto e admitido como recurso de revista,


havendo, agora, que proceder à apreciação preliminar sumária da
verificação in casu dos respectivos pressupostos da sua
admissibilidade, ex vi do n.º 6 do artigo 285.º do Código de
Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).

Dispõe o artigo 285.º do CPPT, na redacção vigente, sob a epígrafe


“Recurso de Revista”:

1 – Das decisões proferidas em segunda instância pelo Tribunal


Central Administrativo pode haver, excecionalmente, revista para o
Supremo Tribunal Administrativo, quando esteja em causa a
apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou
social, se revista de importância fundamental ou quando a admissão
do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do
direito.

2 – A revista só pode ter como fundamento a violação de lei


substantiva ou processual.

3 – Aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, o tribunal de


revista aplica definitivamente o regime jurídico que julgue adequado.

4 – O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais


da causa não pode ser objeto de revista, salvo havendo ofensa de
uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para
a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de
prova.
5 – Na revista de decisão de atribuição ou recusa de providência
cautelar, o Supremo Tribunal Administrativo, quando não confirme a
decisão recorrida, substitui-a por acórdão que decide a questão
controvertida, aplicando os critérios de atribuição das providências
cautelares por referência à matéria de facto fixada nas instâncias.

6 – A decisão quanto à questão de saber se, no caso concreto, se


preenchem os pressupostos do n.º 1 compete ao Supremo Tribunal
Administrativo, devendo ser objeto de apreciação preliminar sumária,
a cargo de uma formação constituída por três juízes de entre os mais
antigos da Secção de Contencioso Tributário.

Decorre expressa e inequivocamente do n.º 1 do transcrito artigo a


excepcionalidade do recurso de revista em apreço, sendo a sua
admissibilidade condicionada não por critérios quantitativos mas por
um critério qualitativo – o de que em causa esteja a apreciação de
uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de
importância fundamental ou quando a admissão do recurso seja
claramente necessária para uma melhor aplicação do direito –
devendo este recurso funcionar como uma válvula de segurança do
sistema e não como uma instância generalizada de recurso.

E, na interpretação dos conceitos a que o legislador recorre na


definição do critério qualitativo de admissibilidade deste recurso,
constitui jurisprudência pacífica deste Supremo Tribunal
Administrativo - cfr., por todos, o Acórdão deste STA de 2 de abril de
2014, rec. n.º 1853/13 -, que «(…) o preenchimento do conceito
indeterminado de relevância jurídica fundamental verificar-se-á,
designadamente, quando a questão a apreciar seja de elevada
complexidade ou, pelo menos, de complexidade jurídica superior ao
comum, seja por força da dificuldade das operações exegéticas a
efectuar, de um enquadramento normativo especialmente intricado ou
da necessidade de concatenação de diversos regimes legais e
institutos jurídicos, ou quando o tratamento da matéria tem suscitado
dúvidas sérias quer ao nível da jurisprudência quer ao nível da
doutrina. Já relevância social fundamental verificar-se-á quando a
situação apresente contornos indiciadores de que a solução pode
constituir uma orientação para a apreciação de outros casos, ou
quando esteja em causa questão que revele especial capacidade de
repercussão social, em que a utilidade da decisão extravasa os
limites do caso concreto das partes envolvidas no litígio. Por outro
lado, a clara necessidade da admissão da revista para melhor
aplicação do direito há-de resultar da possibilidade de repetição num
número indeterminado de casos futuros e consequente necessidade
de garantir a uniformização do direito em matérias importantes
tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória
- nomeadamente por se verificar a divisão de correntes
jurisprudenciais ou doutrinais e se ter gerado incerteza e instabilidade
na sua resolução a impor a intervenção do órgão de cúpula da justiça
administrativa e tributária como condição para dissipar dúvidas – ou
por as instâncias terem tratado a matéria de forma ostensivamente
errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a
intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do
sistema.».

Vejamos, pois.

O acórdão do TCA Norte sob escrutínio confirmou a sentença do TAF


do Porto que julgara verificada a excepção de caducidade do direito
de deduzir impugnação de liquidações de IVA, deduzidas para além
do prazo de três meses fixado no artigo 102.º n.º 1 do CPPT.

No seu recurso para o TCA a recorrente invocou, como invoca agora


no presente recurso, que o acto é sindicável “a todo o tempo” ou
“independentemente de prazo” (art. 103.º, n.º 2 do CPPT) porque a
sanção legalmente prevista para o vício de que enferma é a da
nulidade (art. 161.º, n.º 2, alínea K) do CPA), pois que, não sendo o
IVA devido, porque as operações que as originaram, são operações
não sujeitas a Imposto Sobre o Valor Acrescentado, estamos perante
a criação de obrigações pecuniárias não previstas na lei.

O TCA, em plena sintonia com a jurisprudência dos tribunais


superiores da jurisdição sobre a matéria a questão e citando a
jurisprudência pertinente, designadamente deste STA, confirmou o
julgado no sentido da intempestividade da impugnação, porquanto o
prazo aplicável é o de três meses do n.º 1 do artigo 102.º do CPPT,
visto que o vício imputado ao acto é gerador de anulabilidade, e não
de nulidade.

Não obstante a alegação da recorrente no sentido de demonstrar que


se verificam in casu os pressupostos de que depende a admissão da
revista – relevo jurídico e social da questão e clara necessidade da
revista para melhor aplicação do direito -, manifesto é que a tal
admissão do recurso não se justifica, nem pela natureza da questão
suscitada – de resposta há muito unânime na jurisprudência-, nem
pela resposta que lhe foi dada pelo TCA, plenamente conforme ao
entendimento fixado.

Nada há, pois, que justifique a revisitação da questão por este STA.

Pelo exposto, o recurso não será admitido.


- Decisão -

6 - Termos em que, face ao exposto, acorda-se em não admitir o


presente recurso de revista, por não se verificarem os respectivos
pressupostos legais.

Custas do incidente pela recorrente.

Lisboa, 20 de Outubro de 2021. - Isabel Marques da Silva (relatora) -


Francisco Rothes - Aragão Seia.

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