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Colecgio eae Paiologia Clinicae Piquitria m2 11 Coordenagio da Coleco Oscar F. Gongalves| Capa Vietor Hugo Edigio Quarteto Ealitora Al. Calouste Gulbenkian Lote 5, Sala 6 3004-503 Coimbra E-mail: quarteto_editora @ip.pt huipi/quarteto.regiaocentra net Execuciia Gratien Quartere Editora Impressio ‘Tipogratia Are Pronta f Reservadostodis dies de scordo com alegslagto em vigor Pscoterapia, Discurso e Narrativas a Construgio Conversacional da Mudanca Miguel M. Gongalves é Oscar E Gongales Terapia como Construgio Soci Capitulo 2 Caracteristicas, Reflexdes e Evolugdes Kenneth Gergen & Lisa Warhous A medida que entranos num novo século, testemunhamos uma con- vergencia, gradual mas cada vez mais intensiva, nas conceptualizagbes do proceso terapéutico. No centro desta converpéncia esté a atengio dada aos Drocessos humanos de significagio. Em primeiro lugar, tomnou-se claro que, na relago terapéutia,o significado humano nao 36 é importante, mas & central para 0 processo de mudanca. Contibuigées importantes para este movimento contemporineo surgiram de muitas fonts: psieslogos huma- nistas/fenomenol6gicosshermenéuticos tém, hé muito: tempo, vindo a defender a centralidade do significado pessoal para o processo terapéntico; © trabalho pioneiro de George Kelly (1955) ~ e os didlogos posteriores sobre o construtivismo (et. Neimeyer & Mahoney, 1995) -colocaram tam- bbém os processos de construgdo individual no centro da relagio terapéuti- a. A emergéncia da teori das relagdes objectais nos efteulas psicanaliti- 0s salientou ainda mais a interdependéncia dos significados no seio das relagOes familiares © entre 0 tarspenta ¢ 0 cliente (Asbach & Schermer, 1987; Mitchell, 1995); o trabalho do gropo de Palo Alto — exemplificado no clissico de Watzlawick, Jackson e Beavin (1967), Pragmatics of Human ‘Communication ~ ampliou esta énfase nos signiticados interdependentes dentro das familias; c os terapeuts sistémicos de Milao levaram este orien- tacto ainda mais ckém, em direcedo a um conjunto de préticas novas e esafiantes. A medida que estes didlogos iniciais sobre o significado se desenvol- veram e interagiram, a comunidade tcrapéutica tomnou-se cada ver. mais aberta ao vénice do intercmbio critico e construcionista no seio da comu- nidade intelectual mais alargads'.O resultado tem sido uma mudanga per " Bste sentido de um movimento convergent aparece trauzido numa vatiedade de volumes editados ao longo dos dhimos anos, incluindo o trabalho de McNamee e 30 icaterapia, discurso e narrativa: a construsio conversacional da mudanga sistente, embora avidentada, em direcgdo a uma concepstio comum de sig- nificado: da sua localizagio tradicional deniro das mentes individuais para ‘2 $ua criago nos contextos relacionais: da consirugdo mental para a cons- trugio social, Para alguns, a mudanca € subil e os ajustamentos a fazer so reduzidos; no entanto, na sua forma mais radical, esta transformagao faz rnada menos do que subverter todos os fundamentos existentes sobre 0 pen- ‘samento e pritica terapéuticos. Na verdade, este snovimento provocou um gran substancial de antagonismo (cf. Held, 1996; Sass, 1992; Mancuso, 1996; Lannamann, 1998). No entanto, de uma perspectiva mais produtiva, eu origem a um conjunto de questdes significativas: quais sAo, se € que cexistem, as linhas significativas que unem estes movimentos diversos?; ‘existirdo diferengas importantes entre eles?; de que forma € que uma re- conceptualizagio construcionista rompe corn as tradigBes terapEuticas exis- tentes?; deveremos antecipar ou desejar um modo tinieo de tratamento?; ‘como & que estas orientagdes deverio ser reconcitiadas com os investimen tos tradicionais no diagndstico e nas poiticas de satide mental?; 0 que é que se gana e perde com esta transformagao? i neste contexto de agitagto ¢ auto-reflentio que o presente texto se situa. Iremos tentar, em primeiro lugar, articular um eonjunto de pressu- postos centrais que atravessam os diflogos emergentes sobre o significado relacional, clarificé-los através da comparagio com as tradigdes existentes « analisar alguns dos problemas centrais que eles levantam. Tal conduziré 4 clarificagdo de um conjunto de pressupostos interfigados que os partici pantes nos diélogos acima referidos subscrevem em graus variéveis. Nio pretendemos articular um nove fundamento para a terapia, nem uma for- ‘molagdo canénica do que é 2 “terapia pés-moderna’; estas duas aspiracdes seriam mesmo antitéticas relativamente aos debates que tém vindo a ocor rer no Ambito do construcionismo social. Espera-se, pelo contrétio, que ‘uma discussio deste tipo possa contribuir para conversagtes generativas, para uma maturagdo de sensibilidades e para a emergéncia de novas priti- cas. Este titimo objectivo seré particularmente importante & medida que finalmente empregarmas a estrutura analitica aqui apresentada como uma heuristica pata o enriquecimento da prética terapeutica ‘Gergen (1992), Therapy as social construction; Friedman (1993), The new language of change: Constructive collaboration in psychotherapy: Hoyt, Consiructive therapies (1994, 1988), e Rosen ¢ Kuchlwein (1997), Constructing realities ‘Terapia como Construgio Social: Caracterisicas, Reflexbes © Evolugo 1, Construgio § cial ¢ Postura Terapéutica conjunto de quatotansigaes que caractenzam a sancepyo eneneats da terapia come umn process de consrugo telco, Aine de ne wan sigdes, em desenvolvimento, terem uma diversidade de implicagdes prét estmulagto da sensbldae terapsutc,convidano& conse ‘optdesdsponiveis e fornentmao a reflex sobre 9 proceso de searna ee 1.1, Dos Fundamentos & Flexibilidade AS orientagdesterapdutcastradicionas hase nas haseiam-se no que € comum Ite it como ndanenty rac d concn, ssf lamentos esto tipieamente alojados dentro da i if ito daguilo que 6 estéitamente definido por concepsao empiita do conhecimento, de forma mais a pla, como o zeitgeist do moderismo cultura A medida quc esta tadigio se tem desenolado nas cinciassoias, a mairia dos pofssontis ve dafendes que a teorias do comportamento humand se Geveriam haseat ha etre. Com um esto nuns grso, deverinos aprximar fo uma compreensfa verdadeia e objectiva das acg5 58s, tanto nocmais como aberranes, Para além disso, deste pont de vist, a investgaguo de seit caer por vevelar ua dean vsedue de iiss erpeatin, ‘Amais eficaz para tratar varias formas de anormalidade. Podem cexistir ma ie ‘oscandidats a verdad sobre as pessots, as dsfimgtese a ctraz mas ain "Taos deensare dpa ome do : uml. No ean ean aaa eas pa poco: pcan {=a wl pins emp renao dram mls pe Foul €2depoargnw um coins det ane does pec De ieee ei vi gi Kely (8 on its nevi 8 pressupastos empiristas, a teoria, procura, cssencialmente, 7 espn i a. pos, serio, defender nae * Pan mai goa mas informa sabre o lg do caphismo no modemismo edt ‘Hollinger (1994), Rosneau (1992) e Gergen (1991). ae 32 PPsiooterapia, discurso e narraiva: a construe conversacional da mudanya ‘vestigagio empfrica deveria, na abordagem tradicional, permitir-nos selec- cionar dlgumas das muitas opeSes e, por fim, talvez mesmo uma sé. ‘Para os construcionistas socials, as teorias da aege humana nfo partem ‘ou derivam da observagio, mas antes se desenvolvem a partir de urna estro- tura prévia de compreensio. Séo as convengdes de inteligibilidade parti Thadas no seio do enclave profissional de cada individuo que iro determi- bar a forma como interpretamos 0 mundo observacional. Assim, um tera- peuta psicodindmico rd encontrar provas de desejos reprimidos, enquanto tim terapeuta cognitivista ind identificar problemas no modo de processa- mento de informagio do individuo, © um terapeuta familiar sistémico seré ttrado pelos padres de comunicacio da familia, Dado que as teorias per ‘item construir 0 mundo nos seus préprios fermos, nfo hé meios para realizar testes emplticos de comparagao entre elas. Cada “teste” ind, inevi- tavelmente, construir 0 campo de factos relevantes nos seus prOprios ter- ‘mos ¢, assim, servira para privilegiar um determinado ponto de vista tebri- ‘co em oposicio a ovtro. A investigagio de resultados terapéuticos também est sujeita a0 mestno problema: um resultado positive a partir de um deter- rminado ponto de vista (e.g. redugo de sintomas, expresso de raiva) sig- nificaré uma regresstio ou uma exacerbagio do problema, para outres. ‘Com base nesta linha de raciocinio, 0 construcionismo convida a um abandono da procura de furdamentos, de uma visio singular do conheci- ‘mento ou do funcionamento humano que prevalega sobre todas as outras. ‘Tal implica também colocar-se em questio 0 construcionismo enquanto filosofia final. Deste ponto de vista, somos encorajados a abandonar competigio hé muito existente entre diferentes escolas de terupia, junta- mente com as concepgées associadas de diagndsticos fixos, “melhores” priticas e comparagdo de resultados terapéutices, Se, em ver. disso, virmos fs vérias escolasterapeuticas como comunidades de significado, entéo cada ‘uma possui um potencial de transformago; cada uma oferece uma abertu~ ra a.uma forma de vida. Lynn Hoffman (1985) apresenta esta mesma ideia ha sua concepgdo das diversas teorias em terapia familie. Para ela, a t©0- siag “representam conjuntos de lentes que reforgam a conseiéncia de que faguilo que uma pessoa penson ser de urna determinada forma, imutavel- mente e para sempre, pode ser visto de um outro modo. A. pessoa mio sabe {que um ‘facto’ é mais uma ‘opinio’ até ficar chocada com a descoberta de foutro “facto” igualinente persuasivo @ exaclamente contraditério a0 pri- ‘meiro, Entio, este par de factos apresenta d pessoa um enquadramento mais lato, que he permite alternar ou escolher. © que se perde ao abdicar de a 33 ‘Terapia como Construgio Social: Caracteristicas, Reflexes e Evolugbes albsolutos morais ecientficos, ganh-se no sentido alargado de escolha que as construgGes sociais adquitem” (p.4). De forma semelhante, Cecchin, Lane e Ray (1992) eserevem que “ao ter demasiada f€ em qualquer posigio ‘ou hist6ria, corres 0 risco de criar uma reaidade terapéuticainflex‘vel e rpc por isso que) questionamos como é que nos podemos corp seo eens lg ms tr gun cl dea de A principal implicagdo desta linha de raciocini ritica teal otros ¢omvad a pero 0 domi das tig dades ¢ prticas terapEuticas € a empregar qualquer uma que possa ser dil no contexto terapeutico imediato. Neste sentido, nao existe um “método construcionista social” de terapia. Formalizar um determinado método ~ ‘canonizar os seus printeipios ~ é congelar o significado cultural. E partir do principio que 0s processos eficazes de criagdo de significado no presente {fo manter-se da mesma forma 20 longo do tempo, independentemente da circunstancia ¢ do contexto de interpretagao. E também afirmar que a eriti- ‘e2 comum & comunidade terapéutica ~ que o campo da teoria e pritica, inhiplo e em constante mudanga, revela um estado de contusio ¢ uma fatta de conhecimento teal ~esté mal fundamentada, Festa mesma riqueza Ge ilgili cxpcidas da comanidade trapeze coniaus ‘mente remodelar corm Es mene rol comprento que represen, ver, aso compte ‘As implicagdes desta posigao sio, contudo, mais radicais do que a dete- 0 do eclectismo tedrico ¢ pritico. Na tradigdo fundacionalista, privilegia- vva-se a abordagem profissional da pessoa ¢ do processo terapéutico, com- parativamente com a do senso comum. Enguanto se considerava o entendi- ‘mento cultural quotidiano repleto de enviesameitos, mal-entendidos ¢ superstigdes, supunha-se que o discurso profissional propotcionava uma compreensto mais exaustiva e correcta da realidade. Pata 0 consirucio- nista, 0 crtério de “compreensao mais correeto ou objectivo” éeliminado, dado que todas formas de compreenséo so construgées culturalmente cenraizadas. A terapia eficaz pode requerer — ¢ tipicamente requer ~ 0 uso dde milkiplos géneros discursivos, incluindo os da cultura envolvente, Tal significa que, para efeitos da pritica terapéutica, a porta estd aberta a todo © leque de significados culturais. Desta forma, podem-se incluir todas as formas existentes de terapia — desde a psicanalitica, & comportamental, cognitiva, do grito primal ow outras. Ao mesmo tempo, devemos estar preparados para expancir, de forma radical, o dominio de significados uti- 4 Psicoterapia, discurso e natrativa: a construg ‘conversacional da mudanga lizaveis, Esta posigio oferece, por exemplo, um forte suporte aqueles que desejam incluir 0 discurso espiritual no seio do processo terapeutico (cf. por exemplo, Griffith & Griffith, 1992; Richards & Bergin, 1997; Butler, Gardner & Bird, 1998). Para grande parte da popblagio, este discurso é poderoso e negligenciar a sua significdncia € terapeuticamente mfope. No centanto, o ferapeuta flexivel ndo deverd afastar da sua esfera outros discur- 508, tais coma os do romance, da New Age, do marxismo, ou do budismo Zea, entre outros. Nama légica construcionista, o (erapeuta competente poderd estar tio & vontade ao usar uma linguagem “de rua" como ao domi nar as nuances da analitica lacaniana, Cada uma das novas inteligibilidades ‘enriquece 0 leque e a flexibilidade do momento interactive. Nio deveremos, contudo, coneluir desta anilise que as teorias profs: sionais nfo t&m mérito especial, ou que se deveria abandonar a preocupa- ‘glo com os resultados terapéuticos. As tcorias desenvolvidas profissiona mente podem ser especialmente significativas na sua capacidade em ofe- rocer alternativas ndo facilmente encontradas na cultura comum. As teorias ‘erapéaticas representam parte das inovagdes mais importantes do século. ro que diz respeito a tomar a acgdo humana inteligivel. Neste sentido, as, teotias profissionais culturalmente desviantes podem ter um poder genera- tivo tnico. Ao desviar-se do senso comum, podem desafiar significativa- mente o status quo e oferecer direcges genuinamente novas de pesquiss. Para além disso, as linguagens profissionais tormam aos terapeutas posst vel patticipar em reflexes comuns, interagir ce forma significativa e coor denar os seus esforgos de forma mais eficaz. Um discurso desse tipo torna também possivel & comunidade terapéutica reflectir criticamente sobre as, inteligibilidades difundidas na cultura ~ reflexio esta que no pode ser feita do interior destas mesmas inteligibilidades (e.g, uma pessoa no pode reflectir criticamente sobre 0 discurso espiritual a partir do ponto de vista de alguém que adere firmemente a essa visio do mundo). De igual modo, 0 abandono dos fundamentos no significa o fim da pesquisa sobre os resultados da terapia, Todo o resultado terapeutico ~ des de a redugio do consumo de dlcool, da violéncia doméstica ow da de- pressio, até A criaco de um sentido de crescimento pessoal ou & conscien- clalizagio dos arquétipos -reflecte uma tradicdo, uma forma de vida ou um enclave de valores. A questio nio esté, ent#o, no abandono dos modos tradicionais de valorizagiio, Em vez disso, 0 caminho mais proveitoso con- siste em (1) expandir o leque do que é valorizado na andlise dos resultados (eg. consideragées alargadas sobre 0 que pode contar como um resultado eau Ee ‘Terapia como Construgio Social: Caracteristieas, Reflexdes ¢ Evolugies terapéutico positive) e (2) por em pritica dislogos em que os valores ou resultados em competigio e em conilico possam ser diseutidos* Levando ‘em conta méltiplos critérios de bem estar, io s6 expandimos o dominio do que significa ser adequado, como também geramos um quadro mais dife- renciado daguilo que conta como “o bem”, quando e para quem, 1.2, Do Essencialismo & Consciéncia da Consrugaio Como foi suger, aio trapdrica modernist seta na nog de verdad. Asim, arp est tpeament evenads pan loca probes rel “eases de difeclede” "as forgn em agto® asc, ts determinants ences semxthares, pga sale or elas das frets erenagies erapeias Pao eonsraiontn, no cxey problemas, casas, frst on eatuturss qu no derive exe se eta de nerpcabes prada por una comunidae ao no pected ro potane nada exist”, ou que“ns nance poderemos conser ease “ma-enndioscomuns dconionima nats gu, sneer iamos artulr 0 que existe, quando procarimos dito ane di agen, enaos num mundo de sipniends secsinete goralos Poder ser mas il nto ier queo consrcionsmo opera cont tendéncia par esSenciliar a linguagem, bu sje de tart eles coro ee ose imagens, maps au plcasds snc gue est nde pendentemente es pesos qu iterretam as exitaca denn fon Com efi, o constuconsma fron como uns contnus chm de send ata mdsina de Gregory Ds que" mapa mb Ectao que a popes dos terapeuts para asia formas pels quis os rls dos cents sabre o see o anda flham en conepan ag testo tem sido um ict irda de profs, deed tabs Proniro de read sb teres. Na vercade st vvetenente sma tndas escola tapes tm pressupoto, tno sean dene como aang es alas ena ugents de mapeamont. cars bse nesses pressuposts€queteroe como lion stra ere de nar “Pau explo do ‘ plo do une ag dca elaivanene a degree resultados terspeuticos, cf Seikulla, Aaltonen ¢ Alkare (1995). : 36 Psicoterapia, discurso e narrativa: a construgio conversacional da mudanga cepedo” ou “erro atribucional” sio inteligtveis. O construcionismo, pelo cconirério, convida-nos a ver esses termos num plang horizontal e nao ver- tical, ou s9ja, como indicadores do formas altemativas de construgtio do ‘mundo, Acusar uma pessoa de ser delirante é primordialmente afirmar que la no partilha as nossas convengGes interpretativas. O movimento per cursor em ditecgto ao plano horizontal pode ser encontrado no trabalho i cial da escola de Milfo, em particular na pritica do questionamento circ lar. A importincia das questdes circulares neste contexto é que estas no representam uma exploragio de “como é a realidade” na familia, mas pro- ccuram antes gerar informacio que possa fazer diferenga na compreensio partilhada dos membros da familia (Selvini-Palazzoli et al, 1980). Uma questio circular tal como “De qual dos seus dois filhos pensa que a sua mulher esté mais proxima, da Vicki ou do Joe?” nio serve para iluminar a verdade sobre a estrutura familiar, mas para apresentar possiveis ideias que possam desafiar a légica problemética partlhada pela familia, Uma tenta- tiva semethante para substituir o essencialismo por uma conseiencializaco dos processos de construcdo é evidente na terspia breve, particularmente no trabalho de de Shazer (1991, 1994). Como Berg ¢ de Shazer (1993) pro- piem, “os significados obtidos numa conversa terapéutica sdo desenvolvi- dos através de um processo mais parecido com uma negociagio do que com © desenvolvimento da compreensio ou com ums revelago do que esté ‘realmente’ a passar-se” (p.7), Esta compreensio da terapia como um em- preendimento na construgao de mundos é agora amplamente visivel. Esta énfase nas realidades construidas deve ser acompanhada por uma adverténeia importante. O construcionismo reconhece a significancia da verdade em contexio. No scio de qualquer comunidade de interlocutotes, haverd tendéncias para essencializar os modos de discurso comummente pantithadas e esta essencializagio ¢ de uma importancia inestimdvel para ‘manter as tradiges da comunidade. Podemos chamar a esta erianga Diana © a outta David e, apesar dos nomes serem arbitrarios, (e.g. “Diana é a minha filha”, “O David esta na escola”) os nomes essencializadores so necessérios para manter as ordens locais da familia, da escola, da amizade, etc. De forma semelhante, apesar da linguagem da biologia nao ser requeri da “pelo que existe”, 0 acordo sobre a forma pela qual a linguagem dos geties © dos cromossomas é usada no seio da profissio é essencial para aquilo que chamamos “fertilizagdo in vitro” e “testes de ADN”, Isto quer também dizer que a consciencializagiio da construgiio no com vida necessariamente os terapeutas a uma postura de desconstruczo das, 37 eas, Reflexdes e Evolugdes ‘Terapia como Construgio Social: Caracteri realidades do cliente. A terapia eficaz no requer crises ontoldgicas ¢ 6, de facto, frequentemente provavel que deixe a maior parte dos entendimentos do cliente intactos. Como Harlene Anderson (1997) afirma, “o meu papel como terapeuta & participar com o cliente numa abordagem linguistica na primeira pessoa aos seus acontecimentos ¢ experiéncias de vida relevantes” (p.114); da mesma forma, Tom Andersen (1991) escreve que, “se as pes soas sto expostas ao vulgar, tendem a ficar iguais. Se elas encontram algo invulger, este invulgar pode induzir uma mudanca. Se a novidade que cencontrarem for demasiado invulgar, elas fecham-se” (p.19). A consciencializagao da consirugdo & mais valiosa enquanto posturs ‘que convida 2 suspensao da realidade nos momentos em que esta, tomada ‘como inquestiondvel ou essencializada, prove ser dolorosa ov probleméti- a, Se 0 “problema’” de um cliente parece intratfvel, ento a desconstrugio do significado pode ser um precursor essencial da reconsttusao, 1.3. Da Especialidade & Colaboragao Como foi dito, nto existe um conjunto tnico de préticas que sigam ou possam ser derivadas de uma meta-teoria construcioniste, Por exemplo, nio existe nada no construcionismo que conduza a optar necessariamente. contra “o assumir uma postura de saber” numa relaciia terapéutica; opi- nides fortes podem pot vezes ser titeis. No entanto, se tomarmos em con- sideragdo as implicagdes do construcionismo como uma teoria da acylo humana, novas portas so abertas para a prética. Em particular, a teoria construcionista convida o terapeuta a considerar alternativas & posigao tradicional de autoridade ¢ a explorar uma otientagao colaborativa com 0 cliente. Esta mudanca de estito no é uma tarefa pequena. Como escreve Hoffman (1993), “a mudanga de um estilo hierirquico para um estilo colaborative... é um passo radical. Coloca em questi a estrutura top-down deste campo quase médico chamado satide mental e desafia séculos de pritica tradicional ocidental... Desafiar estes elementos € desafier toda uma fortaleza” (p.4). A medida que Andersen (1995) descreve o seu trabalho {erapéutico, prope um redireccionamento para a “heterarquia”: “A hierar quia governa ‘de cima para baixo' e a heterarquia governa através do outto. (.) Palavras mais comuns para uma relago heterdquica seriam ‘relagao democritica’,‘relagao de iguais’ ou uma “relagio com contribuintes igual- ‘mente importantes’ * (p.18). 38 Pricoterapia, discurso e narraliva: a constragio conversacional da mudanga De forma mais controversa, Anderson € Goolishian (1992; Goolishian, 1992; Goolishian & Anderson, 1997), na abordagem designada por “sis- temas de linguagem colaboratives”, propdem uma parceria colaborativa com o cliente, na qual o terapeuta assume inicialmente uma posigo de “nio saber”, “Nao saber” refere-se a “uma atitude e crenga de que o terapeuta niio ‘em acesso a informagto privilegiada, nunca pode compreender totalmente 4 outra pessoa, precisa sempre da informacao fornecida pelo outro ¢ precisa sempre de aprender mais sobre 0 que foi dito ou o que pode nfo ter sido dito. A interpretagio € sempre um dislogo entre o terapeuta ¢ 0 cliente no o resultado de narrativas te6ricas pré-determinadas, essenciais para a significagio, competéncia ou modelo te6rico que terapeuta defende” (Anderson, 1997, p.134). Tal nao quer dizer que o terapeuta nfo traga com petEncias tnicas para a relacio. Significa, no entanto, que tais competéncias néo derivam da sua mestria em relago a um conjanto de versGes descriti- vas e explicativas da terapia, Blas so principalmente competéncias em saber como por oposicdo a saber o qué ~ de movimentar-se fluidamente na relagio, de colaborar na construgao maitua de novos faturos. Muitos, sensibilizados por esta visio, desenvolverain uma animosidade ‘em dircogao as opedes estratégicas tradicionais. De uma forma geral, as imervengdes estratégicas so vistas como monolégicas (por oposiga0 a dial6icas), ditadas pelo ponto de vista privado do terapeuta. Para o espe- cialista colaborativo, essa acgio estratégica é, ndo s6 manipulativa, mas também geradora de um sentido de participago inauténtica na relagio tera- péutica (e.g. a realidade do terapeuta est fora de cena). Na nossa perspec- tiva, estas reacgdes no estio totalmente fundamentadss. Mais uma vez, nada € necessariamente exciuido pelo construcionismo e, certamente, ninguém desejaria abandonar o processo que tomamos por “pensumento racional”, Assim, em vez. de abandonar a orientacio esteatégica, poderemos ‘optar por discutir sobre como ¢ porqué essa intervengio pode ser vantajosa € sob que condigdes ela ¢ problemtica, Poderia ser dada especial atengio uma orientacdo amaigamada que designamos por estratégia sinada. Deste ponto de vista, o pensamento estratégico & uma imersio numa l6gi- ca colectiva endo privada, tipicamente uma légica associada com um enclave terapéutico circunscrito. A disponibilidade destas légicas, espe- cialmente como alternativas para a construgiio do mundo efectuada pelo cliente, enriquece o espectto de acco possivel. De novo, em vez de esta- Delecer antecipadamente uma estratégia ~ reduzindo os cursos de acgao possfveis — as esttatégias podem ser vistas como potenciais, como “un a acerca 39 ‘Terapia como Construsio Social: Caracteristicas, Reflexdes e Evolugaes asso possivel entre muitos outros", Neste sentido, a intervengo estraté- sgica toma o seu lugar no seio do vocabulério do possfvel, para ser utiliza. dds ou nao, & medida que a conversacio terapeutica se desenrola. 1.4, Da Neutratidade & Relevncia dos Valores De um ponto de vista modemistafempirist, a terapia ndo é um forum Para 0 envolvimento politico, ideolSgico ou ico, O bom terapeuta, tal om0 © bom médico, deveris realizar uma observacio atenta ¢ uma reflex cuidada, sem o enviesamento dos seus valores particulares, AAs criticas @ este suposigio da neutralidade dos valores nfo s20 de hoje. Os trabalhos de Szase (1970), Laing (1967) e dos participantes no movimento de psiquiatrie critica tomaram-nos vivamente conscientes das formes pelas auais os terapeutas melhor intencionados podem contribuir para a jopressio, Em consontncia com a critica de Foucault (1979) aos efeitos ‘Aisiptinares” das prévicas terapeuticas,analistas mais recentes focaram. s¢-nas formas pelas quais vires terapiase categorias de diogndsticas con- tribuem para o sexisino, racismo, heterossexismo, individualism, opressdo de classe © outios preconceitas divisores’. De um ponto de vista construcionista, mesmo uma postura de nio-compromisso ou “neutrali- dade” € vista como ica ¢ politica nas suas consequéncias (Mackinnon & Miller, 1987: Taggart, 1985). Conscientemente ou no, para o bem e para © mal, 0 trabalho terapéutico € necessariamente uma forma de activismo Social /potitico. Qualquer aegto no seio de uma socicdade est simattanea. mente acriar 0 futuro dest ‘Maitos terapeutas, conscientes da elago ente as eonstragbes terapeuticns 05 valores societais, comegaram a explorar as implicagoes de uma terapia, ‘ica e politieamente, comprometida. Em vez de ignorar consideracoes re. ferentes aos valores, o comprometimento ideolégico constitui a razio de ser daterapia. Assistimos, entlo, ao desenvolvimento de terepias expecil ‘camente preocupadas, por exemplo, com 0 desafio & ordem dominante (cf, por exemplo, White & Epston, 1990) e a prossecugtio de objectivos fem. * Veja-se, por exempt, Parker e al. (1995), Kulchins ¢ Kirk (1997), Mustin (1996) «Gergen (1994) 40 Pieoterapia, discurso e narrativa: a construgio conversacional da mudanga nistas, gay ou de outras metas politicas. As terapeutas feministas, por exemplo, focam-se frequentemente na opressio das mulheres como tema ferapéutico fundamental, ou desconsirGem as categorias de género para fomecerem aos clientes um conjunto alargado de opgdes para a vida (Sheinberg, 1992). Com o crescente poder do debate politico em torno da ‘dentidade temos fortes razes para antecipar uma expansio destes investi ‘mentos. Mais uma vez, apesar de os didlogos construcionistas convidarem a este tipo de movimentos, a reflexio critica tomna-se necessétia, Conirontamo-nos com a possibilidade de uma fragmentago inguictante — © desenvolvimento de maltiplos enclaves terapSuticos, cada um reclaman- do un valor moral superior, cada um isolado e indignado com a sua raza Desta forma, nao s6 nos arriscamas a negar os frutos de um diéloga mais, globalmente partilhado, como nos aproximariamos de um estado belicoso ‘no mundo terapéutico, em que todos-estiio-contra-todos. A questio esta no facto de saber se hi, nos dislogos construcionistas, implicagtes que apon- tem para uma alternativa a esse resultado final. Nos acreditamos que sim. Como afirmémos anteriormente, 0 construcionismo coloca um forte €nfese, tanto no pluralismo como na relaco. Uma condigio Hobbesiana de animosidade pandémica iriasubverter estes dois objectivos na sua ess@ncia, conduzindo, nao a uma expansio de pontos de vista mas, finatmente, 2 erradicag3o de todos menos um. A alternativa a uma condigo dosse tipo pode comegar por ser encontrada a partir da premissa construcionista de {que ndo existem fundacies ~ no existem justificagSes finais ~ para qual- ‘quer reivindicagio ética ou politica. Ou seja, os mesmos esforgos descons- trutivos utilizados para minar a autoridade da ciéncia podem também ser usados reflexivamente em relaeZo aqueles que gostariam de substituir (ou suplementar) a ciéncia por um determinado sistema de valores. Isto nao sig- nifica que deveriamos evitar posigées valorativas; como foi acima referido, dificilmente podemos sair fora da cultura e é implaustvel que desejemos. abandonar as nossas tentativas de criar uma soviedade justa. No entanto, construcionismo retira a autoridade final de tis investimentos — exacta mente 0 tipo de compromissos que é, do nosso ponto de vista, mais fre quentemente utilizado para sitenciar ou eliminar aqueles cujas vozes dife- rem das nossas (cf. ParE & Sawatzky, 1999}. Do mesmo modo, convida os ferapeutas pars um diglogo mutuamente ransformativo com clientes que do partilham os seus pontos de vista sobre assuntos tais como 0 aborto, © divéreio ou 0 abuso fisico, Para além disso, com o seu énfase na interde~ pendéncia final de todos os significados, os argumentos construcionistas ~ a ‘Terapia como Construsio Social: Caracteristicas, Reflexdes e Evolugdes tami m sugerem um novo e diferente papel para os terapeutas. Para além das opedes, quer de evitar questées politicas quer de perseguir ardente. ‘mente a mudanga social, os terapeutas podem explorar de forma frutifera 5 possibilidades de coordenagdo de grupos incompativeis, tormando lin- ‘guagens alienadas mais permedveis, possibilitando que as pessoas falem ‘em miltiplas vozes e, finalmente, reduzindo o potencial para a erradicayig métua. O comprometimento com os valores é substituide por préticas de. co-criagao.* Construgie Social e Pritiea Terapéutica Como vimos, os ditilogos construcionistas favorecem quatro movimen- (os principais na postura © nas metas terapSuticas ~ movimentos em direc ‘#0 2 flexibilidade, consciencializagto da construcao, colaboragio e prit- ‘ca baseada em valores relevantes. No entanto, estes didlogos favorecern ‘mudangas adicionais na compreenséo ¢ convidam a um novo conjunto de ‘iticas. Tragamos, de seguida, as formas emergentes de prética, bem como @ reteorizacao construcionista de préticas wadicionais, Serio tratadas cinco dimensSes centrais da mudanga, 2:1. Da Mente ao Discurso A terapia adicional, nos moldes modemistas, preocupase escencial- mente com os estadet mentalsindividuas. Da Satase paicaaliica nas ingaieas interes, das preocupagies Rogesanas com as avaliagdes des © realizagbes organiSmicas até terapia cognitiva contempordnea, a trea central do terapeuta & explora, compreender e,finalmente, conduzit & transformagio nas ments idividuais. AW a psieoterapia de grupo conser ‘vou um forte investimento nos prineipios psicodinamicos. & no ambito aquilo que comegou por sera terapia familiar sistémica que encontamos ‘Para uma discusso mais aprofundeda sobre a formas ¢ meios de ating estes fins integrativos, ef: Becker, Chasin, Chasin, Herzog © Roth (1995), Pestce e Litdejokn (1997) e McNamee e Gergen (1999) 2 Peicoterapia, discurso e narrativa: a constugdo conversacional da mudanca ‘2 mudanga mais concertada em direc¢do ao exterior ~ da mente para @ fin- ‘guagem. Decerto que nela permaneceram vestigios de essencialismo psi- colégico ~ por exemplo, no Ambito das orientagdes consinitivistas e da ‘ibernética de segunda ordem ~mas 0 movimento mais significative foi em direcedo & compreensio das estruturas ¢ dinamicas dos padres de comu- nicagio familiares. Contudo, no seio dos didlogos emergentes sobre a cons- ‘rugdo social, tornou-se evidente que mesmo estes movimentos so insufi- cientes, pois no essencial eles partem de uma orientagio modernistal Jempitista, na qual as estruturas ou dinfimicas relacionais sto essencial- izadas, objectificadas e tratadas a partir de uma posigio de “saber que””. No fentanto, uma vez que os significadas entre as pessoas so, em larga medi- dda, conseguidos através da conversagio, a atengio é deslocada para os processos discursivos. Como afirmow Sluzki (1992), a terapia pode ser entendida como um processo de “transformaeao do diseurso”. Se 0 signif cado é gerado no ambito dos processos linguisticos, entio € a esses proces- sos que devemos estar atentos (ef. Kogan & Brown, 1998) Esta mudanca para o discurso € talvez o aspecto mais visivel da terapia num enquadramento construcionista ¢ deu origem a um vasto leque de ino- vvagGes terapéuticas. A maior parte do trabalho inovador tern correspondi- do. vaga de interesse das eiéneias socinis na narrativa ou, mais essen- cialmente, na construcio historiada do self ¢ do mundo (Brunet, 1986; Sarbin, 1988; Polkinghorne, 1984), Para muitos terapeutas, o trabalho de Donald Spence (1982) - Narrative truth and historical truth — representou tum ponto critico de viragem. Aqui estava um terapeuta, com uma longa experitncia, que no defendia mais que a verdade histdrica pode ser cap- turada nos relatos do(a) paciente sobre os primeiros anos da sua vida € que explorou a utilizagdo positiva das verdades narrativas desenvolvides em terapia. Talver. a expresso mais proeminente desta orientagto seja encon- trada naguilo ® que Mel.cod (1997) chama o “movimento narrativo pés- ‘moderno”, tal como foi desenvolvide por ferapeutas como White e Epston (4990) e Hudson e O'Hanlon (1991), e enriquecido e expandido diversas vezes 20 longo dos anos (Freeman, Epston & Lobovis, 1997; Pary & Doan, 1994; Zimmerman & Dickerson, 1996; Freedman & Combs, 1992; Olver, 1997; MeL.eod, 1997, 1998; Neimeyer, 1999). A preocupagao domi- * Lusuative disso &, por exemplo, © movimento em diveegio ao diagndstco de relagies (ct. Kasiow, 1996) 43 ‘Terapia como Construgio Social: Caracteristicas, Reflexbes e Lvolugées nante & com as formas pelas quais a linguagem vonstr6i o selfe o mundo ¢ as implicagBes destas construgdes para o bem-estar do cliente. Mais radical do que Spence — que pressuipds que a verdade histérica era, em prinetpio, alcangével — a implicagio deste trabalho & que os acontecimentos no determinam as formas de compreensio dos individuos, mas que, em vez disso, sao as convengies lingufsticas & nossa disposig&e que determinain © ‘que conta como acontecimento de vida e @ forma como ele deve ser avalia- do. esta mesma preocupagto com a forga da linguagem na construgao das realidades do cliente que estimulon « utilizagio terapéutica de metdforas (Combs & Freedman, 1990; ParF, 1996; Schnittman, 19% Whynot, 1997; Snyder, 1996), a combinagdo da narrativa e da metéfora (Gongalves, 1995) e o desenvolvimento das prticas de escsta dos clientes como instrumentos terapéuticos (Bacigalupe, 1996; Lange, 1996). Aida assim, apesar de muito se ter ganho com esta separagio de Aguas, também esti presentes perigos ¢ limitagdes. Quatro destes perigos e limi tagdes merecem uma atengZo particular. Em primeiro lugar, mesmo com ‘uma perspectiva construcionista presente, existe uma tendéncia generalizada para objectficar o discurso, isto &,tratar 0 significado como “algo natural” nto como sendo ele préprio um resultado conversacional. £ apenas quan- do 0 discurso em si mesmo (aquilo que tomamos como sendo a narrativa ou :metéfora de uma pessoa) € visto como “uma forma de pir as coisas” que se ‘gana liberdade para revorrer a alternativas. Em termos priticos, pode haver alturas em que seja mais frutifero tratar 0 discarso coma, por exemaplo, uma ‘manifestagdo de process0s psicodindmicos ou impulses emocionais. Com feito, € importante manter a postura reflexiva na qual mesmo o pr6prio construcionismo pode ser trtado como uma perspectiva entie outs, Em segundo lugar, existe uma forte tendéncia para tratar 0 discurso ‘como uma possessfo individual, compreendendo-se o significado como algo que reside na consciéncia pessoal. De facto, um dos suportes princi- pais da tradigao ocidental € a crenga que as palavras si0 manifestagdes de significados originados na mente. No entanto, este énfase no significado individual obscurece a Enfase construcionista na linguagem como rela- cional e pragmitica, gerada ndo no interior das pessoas, mas entre elas, tal como ¢ utilizada nas suas relagées, Dito de outro modo, para os construe cionistas uma pessoa nunca pode construir significado fora das relagdes, * Para uma jlustragéo excelente da génese relacional do significado em terapia ef, O'Neill (1998). “4 Psicoterapia, discurso ¢ narrativa: a construgio conversacional da mudanga Esta énfase no significado pessoal é muitas vezes associada a um ter- ceito problema, que é 0 de tratar uma mudangs no discurso como sendlo equivalente & cura, Como muitas vezes foi afirmado, se ume pessoa apren- dea vera vida de uma forma diferente a re-narraro selfou a passar de wma concepgdo culturalmente dominante para uma concepcio individualizada do self entdo foi conseguida uma melhoria. Afirmagées como esta no $6 so herdeiras da heranga individualista (e.g., uma mudanga mental desen- cadearé alteragdes na aogo) mas favorecem também wa vis do signif cado como a forga motriz na vida das pessoas. Se as narrativas e as meté- foras so formas de discurso, como os textos construcionistas sugerem, entio elas sio sobretudo recursos utilizados por pessoas a0 gerarem sig- nificado em conjunto € nfo tanto determinantes da acg3o de um individuo (Gergen & Kaye, 1994; Newman & Holzman, 1999). Se as histérias sto

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