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Tiago Barroso
Por cada Sebenta vendida no Samju, 40 cêntimos
serão doados à Associação Acreditar
(Associação dos Pais e Amigos das Crianças com Cancro)
Isto é importante porque muitas crianças moram longe dos grandes centros hospitalares
e teriam de outro modo de ficar internadas durante o tratamento,
com consequente perda de qualidade de vida
2
A menos que seja dito algo em contrário, todos os números aqui apresentados são inven-
tados por mim.
Esta sebenta foca apenas a parte mais “matemática” da matéria, e mesmo assim podem
ter ficado algumas coisas de fora. Aconselho a leitura dos slides das aulas pelo menos uma
vez para ver o que é que falta aqui, e decidir o que é que tem de ser estudado pelos slides ou
pelas desgravadas. Não estudem só por aqui.
Peço desculpa por os exemplos serem um bocado monótonos. Eu sei que há outras razões
para ter cancro sem ser fumar, e que fumar faz mais coisas para além de dar cancro, mas isto
foi feito um bocado à pressa e eu estou preguiçoso.
Quis incluir outros exemplos mais engraçados, mas foram censurados com boas razões :)
Agora a sério: isto está uma m**** e nem sequer fala de Pokémon. Não leiam.
Esta sebenta é dedicada às seguintes pessoas (sem nenhuma ordem em particular):
À Larissa, que para além de ser linda reviu a actual versão desta sebenta em tempo
record, dando contribuições valiosas.
Ao Vitor Veríssimo, que me encorajou a fazer esta sebenta, e que sugeriu títulos que eu
não pude incluir por razão de decoro público.
À Inês Portela, que me chateou a cabeça até mais não para ver se eu acabava isto (agora
é bom que a leias...)
À minha Fofinha, por ser fofinha todos os dias.
À Lena, ao António Pinheiro, ao Rafa e à Mariana por serem quem são e por estarem
sempre lá para mim. Para além disso, a Mariana também é linda.
À Fred, por aturar o meu s’taque mad’rense.
À Nô, por ser querida :)
Ao Esperança por ser o maior barão.
Ao Vieira e ao Mendes, por serem os reis da massa (vai ganhar massa, Ricardo!) e pelo
nosso convívio nas Olimps.
Ao Vasco, o único, o S. baronnii de onde emana toda a baronice.
Aos porcos, (e porcas :) porque sim.
À Gabi, porque eu sei que vai ler esta sebenta e corrigir muitos erros.
À Pim, a nossa princesa mais nerd, como presente de anos!
À máfia do CSCM que eu adoro (e à Diana Marques, que também é fixe)
À mixf , pela citação mais random que aqui aparece e que ela sabe qual é.
À dupla KiVi.
A muitos outros e outras que não cabem aqui por falta de espaço.
Aos alunos do curso de 2011/2017 que vão ler isto para o ano e chumbar todos tal como
aconteceu com a biostatística1 :)
1 cortesia da Larissa
Índice
Índice 3
1 Estatística 5
1.1 Testes de hipóteses . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.2 Estimação de parâmetros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9
1.3 Intervalos de confiança . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
1.3.1 Intervalos de confiança na prática . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11
1.4 Tipos de Erro . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15
1.4.1 Erro Tipo I . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
1.4.2 Erro Tipo II . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2 Medição em Epidemiologia 21
2.1 Tipos de variáveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21
2.2 Escalas de medida . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.2.1 Escala Nominal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23
2.2.2 Escala Ordinal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
2.2.3 Escala Nominal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25
2.2.4 Escala de Razão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2.3 Precisão e exactidão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 26
2.4 Unidades de Medida e Percentagens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28
2.5 Medidas de Risco . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
2.5.1 Medidas de Frequência . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.5.2 Medidas de Efeito . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.5.3 Medidas de Associação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.5.3.1 Risco relativo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
2.5.3.2 Odds ratio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
2.5.4 Medidas de Impacto . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33
2.5.4.1 Risco atribuível . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 34
2.5.4.2 Fracção Etiológica de Risco . . . . . . . . . . . . . . . 36
2.5.4.3 Risco Atribuível Populacional . . . . . . . . . . . . . . 37
2.5.5 Correlação, Associação e Causalidade . . . . . . . . . . . . . . . . 40
3 Estudos Epidemiológicos 43
3
4 ÍNDICE
Estatística
1. Dados (data): A natureza dos dados que vão servir de base ao teste de
hipóteses deve ser compreendida, porque isso vai determinar o tipo de
teste que vai ser empregue (frequências ou medidas, por exemplo).
5
6 CAPÍTULO 1. ESTATÍSTICA
H0 . Neste caso, não podemos rejeitar a hipótese nula. É por isso que é
importante fixar α antes de calcular o valor p; se α não estiver fixo antes
do cálculo de p, podemos ser tentados a escolher α > p de maneira a
poder rejeitar a hipótese nula. Se α estiver fixo, não podemos cair nessa
tentação. ATENÇÃO: Não confundir o valor p com o parâmetro p,
que corresponde à proporção de uma população (por exemplo, qual a
proporção de ex-fumadores na nossa população de doentes com DPOC).
Estes passos são somente um procedimento que nos permite a maior exacti-
dão possível quando queremos determinar se uma determinada afirmação é
verdadeira ou falsa (conceito de exactidão discutido mais à frente). Como já
foi referido, não é de modo nenhum essencial saber isto tudo de cor.
• se a < θ < b então não podemos concluir nada. Só sabemos que não
podemos afirmar com 95% de confiança que θ 6= θ0
Exemplos práticos
Se isto tudo foi um bocado abstracto, vamos dar exemplos concretos para
ilustrar.
Cálculo do odds ratio: O odds ratio (OR) é uma medida que traduz
o aumento ou a diminuição do risco de desenvolver uma determinada doença
em associação com a exposição a um factor. Se o OR associado com um de-
terminada exposição é maior que 1, então dizemos que é um factor protector.
Se o OR é menor que 1, então dizemos que é um factor protector. Se o OR
é igual a 1, dizemos que o factor não está associado ao risco de vir a desen-
volver doença. Para vermos que tipo de factor é, temos de saber se OR < 1,
OR = 1, OR > 1. Agora imaginemos que calculamos a partir da amostra
um OR = 2.6. Será que há risco aumentado? Só a partir de uma estimativa
pontual do OR não podemos concluir nada. Não nos podemos esquecer que
1.3. INTERVALOS DE CONFIANÇA 13
por exemplo, que o Celecoxib aos 14-30 dias é factor de risco. No entanto, já
não podemos afirmar que o mesmo Celecoxib aos 0-7 dias é factor de risco,
porque apesar da estimativa pontual para o HR ser maior que 1, o intervalo
de confiança inclui o 1. Isto quer dizer que a um nível de confiança de 95% (ou
equivalentemente, um nível de significância de 5%), não temos significância
estatística para o HR aos 0-7 dias.
O gráfico apresentado neste exemplo é típico de ensaios clínicos, e por-
tanto das aulas de farmacologia. Independentemente da medida representada
na horizontal (que normalmente é o hazard ratio ou odds ratio), existe signifi-
cância estatística se a linha horizontal não cruza a linha vertical sobre o valor
crítico da estatística (neste caso 1, mas pode ser diferente).
Quando testamos uma hipótese, nunca podemos ter a certeza de que a hipó-
tese nula é verdadeira ou falsa (como é óbvio, também não temos maneira de
saber se a hipótese alternativa é verdadeira ou falsa). Não queremos rejeitar
uma hipótese nula verdadeira nem deixar de rejeitar uma hipótese nula falsa.
Os estatísticos inventaram nomes (muito imaginativos, aliás) para estes tipos
de erro:
Suponhamos que o efeito existe, mas que é pequeno. O que é que isto quer
dizer? Quer dizer que o fármaco A é mesmo melhor, mas é só um bocadinho
melhor. Por exemplo, pode ser apenas 2% melhor. Dependendo de vários
factores, o estudo pode ser incapaz de demonstrar que existe uma diferença
de 2%, por esta ser tão pequena. Se aumentarmos a amostra, é possivel que
passe a ser possivel detectar uma diferença de 2%.
Isto é intuitivo se pensarmos no exemplo das moedas: obter 60% vs 40%
de caras quando se lança uma moeda 10 vezes, não é o mesmo que obter uma
diferença de 60% vs 40% quando se lança uma moeda 1000 vezes. Enquanto
é provável obter com moedas idênticas 60% vs 40% de caras quando se lança
as moedas 10 vezes, não é nada provável obter uma diferença de 60% vs
40% quando se lança moedas as idênticas 1000 vezes. Assim, já podemos por
em causa a nossa hipótese nula de que as moedas têm a mesma probabilidade
de cair cara
Da mesma maneira, não é igual ter uma redução de 2% na sobrevida a
30 anos num estudo com 100 doentes e num estudo com 10.000. Claro que
num estudo com 10.000 vamos dar muito mais peso a uma diferença de 2%
(é improvável que esta diferença surja por acaso numa amostra tão grande)
do que num estudo com 50 doentes. Basta ver que num estudo com 100
dontes, se dividirmos o grupo em dois grupos de 50, no grupo A morrerem 22
e no grupo de controlo morrerem 23. As sobrevidas são respectivamente 44%
e 46%, os valores do exemplo anterior. Mas será que podemos dizer que o
fármaco é melhor quando só um doente a mais é que morreu? Pelo contrário,
numa amostra de 10.000 doentes é muito mais provável que uma diferença de
sobrevida (2% de 10.000 é 200 pessoas) seja real e não apenas um artefacto
da amostra.
Parta um dado estudo é possível (mas não está no programa) calcular a
probabilidade de se cometer erros tipo II. A probabilidade de se cometer um
erro tipo I representa-se por β. Um estudo em que não se detectou diferenças
apesar de elas existirem (isto é um estuo em que se cometeu um erro tipo I)
diz-se um falso negativo (false negative). Assim, podemos dizer que β é a
probabilidade de no estudo se obter um falso negativo2 .
À quantidade 1 − β chama-se o poder estatítico (power) de um estudo.
2 eusei que isto é óbvio, mas está aqui incluído porque afirmações deste tipo parecem material
provilegiado para escolhas múltiplas e verdadeiro e falso
1.4. TIPOS DE ERRO 19
É óbvio que é mais facil perceber que há diferença nas médias de dois grupos
em que a variância da amostra é pequena do que entre dois grupos em que a
variância é grande. Uma variância grande mascara pequenas diferenças entre
as médias.
3 Quanto maior 1 − β, menor β. Por definição, β é a probabilidade de cometer um erro tipo II.
Assim, quanto maior 1 − β, menor é a probabilidade de cometer um erro tipo II
4 A definição rigorosa de tamanho de efeito (effect size) é complicada e não é para aqui
chamada.
5 O desvio padrão é igual à raiz quadrada da variância. Assim, se o poder do estudo diminui
com o aumento da variância, é óbvio o que quando aumenta o devio padrão também diminui o
poder do estudo.
Capítulo 2
Medição em Epidemiologia
21
22 CAPÍTULO 2. MEDIÇÃO EM EPIDEMIOLOGIA
ou “olhos azuis + olhos verdes”. De igual maneira não faz sentido subtrair,
multiplicar ou dividir cores dos olhos ou sexos.
Relembrando as fórmulas da Biostatística, toran-se claro que não pode-
mos calcular a média nem o desvio padrão destas variáveis (porque envolve
pelo menos somas) e nem sequer podemos ordenar os elementos. Apesar de
podermos definir uma ordem, ela seria arbitrária e não iria trazer nenhuma
informação útil.
Se não podemos ordenar os elementos, não podemos calcular as estatísticas
que dependem da posição dos elementos da amostra. Assim, não podemos
calcular a mediana, os quartis ou percentis)3 . Podemos, no entanto, contar os
membros de cada classe e assim calcular as frequências e consequentemente
a moda.
Portanto, basicamente a única coisa que podemos fazer com variáveis que
pertençam a uma escala nominal é contá-las e calcular frequências.
Um caso especial das variáveis que são medidas numa escala nominal são as
variáveis dicotómicas (dicotomic variables), que são medidas numa escala
dicotómica (dicotomic scale). Nesta escala, cada variável apenas pode tomar
dois valores. Por exemplo: homem/mulher, casado/solteiro, morto/vivo.
de gravidade, mas na qual não faz sentido comparar a diferença entre a Classe
IV e a Classe III com a diferença entre a Classe III e a Classe II.
Esta escala é mais poderosa que a anterior, porque não só nos permite
classificar os dados e calcular frequências como também nos permite ordenar
os valores, permitindo-nos calcular as medidas de dispersão, como a mediana,
os quartis e os percentis. No entanto, ainda não podemos efectuar operações
aritméticas com os valores, porque não tem sentido somar ou subtrair muito
melhor a melhor, por exemplo, porque os números apenas nos indicam a
hierarquia e não “distância” a que as categorias estão umas das outras.
Assim, não faz sentido calcular a média nem o desvio padrão destes valores,
porque ambas estas estatísticas são calculadas pelo menos a partir de somas
e subtrações.
• exactidão sem precisão: isto também não é muito mau porque desde
que haja exactdão, estamos à volta do valor certo. De um ponto de vista
estatísticao, o que podemos ter é um intervalo de confiança maior
• sem exactidão nem precisão: também é mau mas não tanto como
a anterior. Ao menos temos uma pista de que as medições não são lá
grande coisa.
pessoa-ano, por exemplo, significa que uma pessoa esteve exposta durante 1
ano. Um valor de 3 pessoas ano pode querer dizer que 1 pessoa esteve exposta
durante 3 anos ou que 3 pessoas estiveram expostas durante 1 ano cada uma
As percentagens apesar de paracerem unidades de medida (x% é parecido
com xcm), não são. O significado de x% (x por cento) é exactamente o mesmo
do que x/100 (x a dividir por 100). Assim, dizer que uma certa proporção é
de 5% é exactamente o mesmo que dizer que uma proporção é de 0.05. Isto
quer dizer que uma percentagem é adimensional.
Tudo isto é um pouco óbvio, mas ajuda a perceber algumas coisas que vão
aparecendo por aí.
Ie
RR =
Ine
onde
Vamos ilustrar com um exemplo concreto: temos uma população com 100
pessoas. Dessas pessoas, 30 fumam e 70 não fumam. Ao longo de um ano, das
30 que fumam, 6 desenvolvem cancro e das 70 que não fumam, 7 desenvolvem
cancro.
Queremos calcular o risco relativo. A taxa de incidência no grupo exposto
é 6/30 = 0.2. Assim, na fórmula anterior, Ie = 0.2. A taxa de incidência no
grupo não exposto é 7/70 = 0.1. Assim, na fórmula anterior, Ine = 0.1. O
risco relativo é a eazão entre as taxas e portanto, RR = 0.2/0.1 = 2. Isto
quer dizer que a incidência de cancro nas pessoas que fumam é duas vezes
maior do que nas pessoas que não fumam.
Quando é que consideramos que um determinado factor causal é factor de
risco?
Como é óbvio, quando RR > 1, porque isto quer dizer que a incidência da
doença nos expostos é maior do que nos não expostos.
Quando é que é um factor protector?
Quando RR < 1, porque isto quer dizer que a incidência da doença nos
expostos é menor do que nos não expostos.
Por fim, se RR = 1, então o factor causal não é nem factor de risco nem
factor protector para a doença. Diz-se que não existe associação.
Para além do que ja foi dito, define-se, um tanto arbitrariamente, valores
para os quais o RR representa uma força de associação elevada, moderada ou
baixa. Estes valores são os seguintes:
32 CAPÍTULO 2. MEDIÇÃO EM EPIDEMIOLOGIA
• RR = 1 — Ausência de Associação
0 1/5 1/3 1 3 5
para os que têm a exposição (daí se chamar odds ratio de exposição). Este
odds ratio calcula-se nos estudos de caso-controlo. Como no caso anterior,
isso faz sentido porque nos estudos de caso-controlo também partimos dos
que têm a doença para os que estiveram ou não expostos.
É importante manter presente a distinção entre estes tipos de odds ratio.
RA = Ie − Ine
onde:
Vamos ilustrar com um exemplo concreto: temos uma população com 100
pessoas. Dessas pessoas, 30 fumam e 70 não fumam. Ao longo de um ano, das
30 que fumam, 10 desenvolvem cancro e das 70 que não fumam, 7 desenvolvem
cancro.
A taxa de incidência de cancro nas pessoas que não fumam é 7/70 = 0.10.
Logo, Ine = 0.10. A taxa de incidência de cancro nas pessoas que fumam
é 10/30 = 0.33. Logo, Ie = 0.33. A diferença entre as incidências dos que
fumam e dos que não fumam é de 0.33 − 0.10 = 0.23. Simbolocamente, a
diferença corresponde à fórmula Ie − Ine . O que é que este valor quer dizer?
Quer dizer que as pessoas que fumam têm uma taxa de incidência que é
maior do que as pessoas que não fumam. E quão maior é? É maior em 0.23
ou em 23%. Agora cuidado com uma coisa: eu evitei dizer é 23% maior.
Normalmente, diz-se que Ie é 23% maior do que Ine se Ie = 1.23Ine . Repare-
se que não é disto que estamos a falar! O que nós estamos a dizer é que a
diferença absoluta entre as duas taxas de incidência é 0.23 ou 23%.
2.5. MEDIDAS DE RISCO 35
O conceito de risco atribuível pode ser representado pela diferença das alturas
das duas barras no seguinte gráfico (o gráfico também menciona o conceito
de risco relativo, definido mais à frente). Neste caso, a cirurgia é um factor
protector.
8A desgravada que se refere a isto está mal. O valor de cutoff para o risco é 0 e não 1 como lá
aparece.
36 CAPÍTULO 2. MEDIÇÃO EM EPIDEMIOLOGIA
• RA é o risco absoluto
Medidas de Medidas de
Associação Impacto
Ou então este10 :
9 Atenção: Alerta Nerd! As duas tiras que eu meti aqui são uma amostra representativa do
que lá vão encontrar.
10 Qual era a única condição necessária? Sim, essa mesmo.
2.5. MEDIDAS DE RISCO 41
Capítulo 3
Estudos Epidemiológicos
Nos tipos de estudos epidemiológicos, não há outra opção sem ser decorar os
nomes todos. Eu tento fazer com que isto pareça o mais lógico possível, mas
ainda assim é muito trabalho de decorar. Quanto às vantagens e desvantagens
de cada estudo, eu não aconselho a que se decore tudo, até porque é imensa
coisa. Se se perceber as razões para cada vantagem, nao há necessidade de as
decorar, porque é possível raciocinar de modo a chegar às conclusões correctas
acerca de quais são os pontos fortes e os pontos fracos de cada estudo.
Por outro lado, sinceramente, alguns não fazem sentido nenhum.
Uma doença vai afectar uma determinada população com uma determinada
frequência. Para estudar os efeitos da doença na população, definem-se vá-
rios termos. É necessário saber muito bem as definições destes termos para
sabermos do que é que estamos a falar. Esta parte parece um bocado um
dicionário, e é chata como tudo, mas é para saber...
43
44 CAPÍTULO 3. ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS
de mortalidade por uma certa doença vai ser igual ao número de pessoas que
morreram dessa doença, a dividir pelo número total de pessoas na população
no intervalo de tempo considerado. Porque é que o intervalo de tempo con-
siderado é importante? Porque não é a mesma coisa morrerem 1.5% durante
ano ou 1.5% por dia. Por exemplo, vamos calcular a taxa de mortalidade de
um tumor maligno: suponhamos que há 1.000.000 pessoas na nossa popu-
lação, de que ao fim de 1 ano morreram 350 pessoas com o tumor. A taxa
de mortalidade é igual ao número de pessoas que morreram (350), a divi-
dir pelo número de pessoas na nossa população (1.000.000) por ano (nunca
nos podemos esquecer do intervalo de tempo). Fazendo as contas obtemos:
350/1000000 = 0.000350 por ano, ou 0.0350% por ano, ou 350 por cada
milhão de habitantes por ano.
epidemiologia analítica, porque é aquela que nos diz o que fazer (se A causa
B, então se eliminarmos A deixamos de ter B). Continuando com o espírito
geral da sebenta, seja A = tabaco e B = DPOC...
O gráfico mostra que, pelo menos nas quatro barras da direita (Eastern
Mediterranean, South-East Asia without India, South-East Asia, Africa) não
há correlação entre a percentagem de partos que se dão na presença de pre-
sença de pessoal qualificado e a mortalidade materna. Isto signifca que e
indiferente a presença ou não de pessoal qualificado, visto que as diferenças
na mortalidade são provocadas por outros factores. Assim, nestas quatro re-
giões do mundo, não vale a pena ter durante o parto uma pessoa qualificada
a vigiar.
Ou será que vale?
De facto isto parece tudo um bocado suspeito... E quando um estudo
demonstra algo demasiado suspeito, devemos investigar melhor. Ora, que
dados é que nós temos? Sabemos que em África e no Sudeste Asiático a
percentagem de partos sem pessoal qualificado é a mesma e a mortalidade
materna é muito diferente.
No entanto, não sabemos mais nada acerca destas duas regiões! Não esta-
mos a fazer qualquer esforço para que o a exposição seja a única diferença entre
as populações em estudo. Existe um grande número de factores confusionais,
isto é, factores que podem ser responsáveis pelo efeito que estamos a medir
(mortalidade materna). Assim, é possível que a África e o Sudeste Asiático
sejam diferentes e que estas diferenças expliquem as variações na mortalidade,
e ainda assim ao nível do índivíduo, a presença de pessoal qualificado diminua
a mortalidade materna.
3.3. TIPOS DE ESTUDOS 51
• Desvantagens
utilizamos para estimar vão ser de natureza não estatística, e nenhum esta-
tístico vos pode dizer o qe fazer neste caso. Os critérios vão depender daquilo
que se sabe da doença em concreto (patogénese, factores de risco conhecidos,
determinantes genéticos conhecidos, etc.).
Outra maneira de estimar a prevalência é conduzir um estudo com uma
amostra mais pequena. A partir desse estudo mais pequeno obtém-se uma
estimativa pontual da prevalência da população. Nesta fase não nos preo-
cupamos muito com as margens de erro nem com intervalos de confiança.
Depois, usamos esta estimativa pontual para estimar a prevalência que va-
mos utilizar para calcular a dimensão da amostra. É complicado? Vamos
ver um exemplo (estúpido, mas simples, que é o que se quer para perceber):
queremos determinar a prevalência de insuficiência cardíaca em fase III da
classificação de New York na província de Trás-os-Montes. Não temos dados
suficientes para fazer uma estimativa preliminar. Então, vamos conduzir um
estudo mais pequeno, com 200 pessoas, por exemplo, e obtemos nesta amostra
mais pequena uma prevalência de 3%. A partir desta prevalência, estimamos
que vai ser precisa uma amostra de 6000 pessoas para termos uma margem
de erro de 1% com um intervalo de confiança de 95%.5
Como é que isso se calcula? Com matemática de m****, como é óbvio.
Para quem não quer saber disto, é possivel saltar para o fim desta secção, que
começa com “Na prática”.
Margem de erro No caso das proporções, a fórmula que se usa para cal-
cular intervalos de confiança é:
v
u p(1 − p)
u
p ± z(1−α/2) σp = p ± z(1−α/2) t
n
Na fórmula anterior, σp representa o desvio padrão da população (portanto
um parâmetro). A margem de erro (margin of error) deste intervalo é
z(1−α/2) p(p − 1)/n.
q
5 Números aldrabados. É possível calcular isto a sério mas agora não me apetece.
3.3. TIPOS DE ESTUDOS 55
2. Coeficiente de significância (1 −
q α), dadas a margem de erro (d), n e
p: resolve-se a equação z(1−α/2) p(1 − p)/n = d em ordem a z(1−α/2) e
vai-se à tabela ver qual é o valor de (1 − α/2) que corresponde àquele
z. Sabido (1 − α/2) é fácil calcular (1 − α).
p(1 − p)
n = z(1−α/2)
2
d2
Na prática, como o nível de significância é quase sempre 95% por cento,
1 − α = 0.95 ⇔ α = 0.05, isto é, α é constante. Por causa das propeiredades
da distribuição normal, sabemos que se α = 0.05, então z(1−α/2) ≈ 1.96.
Podemos assim simplificar a equação para o cálculo da dimensão da amostra,
escrevendo:
p(1 − p)
n ≈ (1.96)2
d2
6a sério, façam mesmo isto porque se conseguirem fazer isto nunca mais se esquecem no exame.
E melhor ainda, se se esquecerem podem deduzir na altura. É o que eu faço
7 fizeram o exercício para o leitor, não fizeram? Se fizeram tudo bem percebem como é que se
chega aqui
56 CAPÍTULO 3. ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS
• Vantagens
• Desvantagens
• Vantagens:
• Desvantagens:
Estudo de campo (field trial) é uma experiência feita numa base comuni-
tária, ou seja na população que está em observação. Estes estudos aplicam-se
a pessoas saudáveis, mas que se pensa estarem em risco. Isto deve ser con-
trastado com ensaios clínicos, que envolvem pessoas doentes.
Fase 0 Nesta fase fazem-se testes com doses subterapêuticas, para determi-
nar uma relação dose-efeito.
Fase II Nesta fase testa-se a relação dose / eficácia. Utilizam-se até 200
indivíduos. É nesta fase que vão ser definidas as doses.
Fase III Nesta fase testa-se a eficácia das doses definidas na fase anterior
e se procura o aparecimento de efeitos adversos. É nesta fase que se procura
a significância estatística e se aplicam as considerações fixes que já foram
estudadas na biostatística.
vamos querer indivíduos que tenham uma boa adesão ao tratamento (o que
pode excluir pessoas sem capacidade para controlarem a própria medicação
e sem um cuidador que se responsabilise), que sejam fáceis de seguir durante
o follow-up (um trabalhador de construção civil com projectos de construção
em vários lugares do mundo que saltita de casa em casa de 6 em 6 meses pode
não ser um candidato muito bom para o estudo).
Queremos também critérios que sejam abrangentes o suficiente para po-
dermos generalizar os resultados à população em geral. Se tivermos critérios
muito restritos (por exemplo, niguém se atreva a generalizar resultados de
estudos de iECAs apenas a indivíduos de raça negra à população em geral,
porque é mais que sabido que há polimorfismos genéticos importantes na an-
giotensina convertase que determinam a eficácia terapêutica destes fármacos)
torna-se difícil fazer essa generalização.
Em termos de validade, podemos dizer que os critérios de inclusão e ex-
clusão mais estritos tendem a fortalecer a validade interna mas a diminuir
a validade externa.
Talvez mais importante do que tudo isto, os critérios devem ser definido
a priori, isto é, antes de se iniciar o estudo. Os critérios devem ainda ser
suficientemente rigorosos para nao ser ambígua a inclusão de um dado doente
num estudo. Os critérios ajudam ainda a diminuir os efeitos do viés (bias) e
do acaso
3.4.4 Validade
Num estudo, distinguem-se dois tipos de validade: validade interna e validade
externa.
População alvo
Legenda:
= Judeu Ashkenazi
1
NNT =
RRA
3.4. ENSAIOS CLÍNICOS 73
3.4.6 Aleatorização
A aleatorização (randomization, não se diz randomização nem randomizado
porque é feio) é uma parte essencial de um ensaio clínico bem conduzido.
A aleatorização é a forma pela qual se distribuem os sujeitos pelos grupos
experimentais.
Os estudos podem ser divididos em dois tipos de acordo com o tipo de
aleatorização. São os estudos paralelos ou cruzados.
Um estudo é paralelo quando há um grupo que faz um tratamento A e
ao mesmo tempo outro grupo faz um tratamento B.
74 CAPÍTULO 3. ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS
3.4.7 Ocultação
A ocultação (blindness) pode ser definida como: “manutenção em segredo
sobre o grupo em que foram incluídos os participantes de um ensaio clínico
aleatorizado na aleatorização inicial”. Manter em segredo de quem? Conso-
ante as pessoas que são mantidas em segredo, podemos distingur três tipos
de ocultação: simples, dupla e tripla
3.4.8 Comparador
Um ensaio clínico deve ter sempre pelo menos dois grupos, visto que o objec-
tivo é sempre comparar. Esses grupos podem ser:
Análise mais à frente). Podem revelar tendências que não são óbvias
olhando só para estudos individuais.
• excluir os estudos com falhas ao nível dos métodos (por exemplo, alea-
torização inadequada)
De tudo isto, o mais difícil é decidir que estudos excluir e que estudos incluir.
Tal como os critérios de inclusão e exclusão dos ensaios clínicos, também
estes critérios de inclusão e exclusão de estudos numa meta-análise devem ser
rigorosos e não ambíguos. Se os critérios não forem rigorosos o suficiente, é
possivel que o resultado seja afectado pelos viéses (bias) do investigador, que
pode decidir incluir só os estudos que lhe dão jeito.
É ainda importante que os resultados dos estudos estejam todos medidos
na mesma escala, para que possam ser comparados.
Qual é a grande vantagem das meta-análises? A grande vantagem é que a
análise dos resultados combinados de vários estudos pode revelar informação
que nenhum estudo isoladamente revela. Um caso típico é o de ter vários
estudos que mostram o benefício de um certo tratamento. No entanto, nem
14 que é uma possibilidade para o trabalho de final do curso
78 CAPÍTULO 3. ESTUDOS EPIDEMIOLÓGICOS