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Projeto Arquitetônico

Habitação Unifamiliar
Material Teórico
Construção do Repertório – Parte II

Responsável pelo Conteúdo:


Prof. Me. Altimar Cypriano

Revisão Textual:
Prof.ª Esp. Kelciane da Rocha Campos
Construção do Repertório – Parte II

• Vivenciar a Arquitetura;
• Visitas Técnicas em Campo;
• Fluxogramas.

OBJETIVO DE APRENDIZADO
• Sistematizar os levantamentos e pesquisas como base para o processo de projeto.
Orientações de estudo
Para que o conteúdo desta Disciplina seja bem
aproveitado e haja maior aplicabilidade na sua
formação acadêmica e atuação profissional, siga
algumas recomendações básicas:
Conserve seu
material e local de
estudos sempre
organizados.
Aproveite as
Procure manter indicações
contato com seus de Material
colegas e tutores Complementar.
para trocar ideias!
Determine um Isso amplia a
horário fixo aprendizagem.
para estudar.

Mantenha o foco!
Evite se distrair com
as redes sociais.

Seja original!
Nunca plagie
trabalhos.

Não se esqueça
de se alimentar
Assim: e de se manter
Organize seus estudos de maneira que passem a fazer parte hidratado.
da sua rotina. Por exemplo, você poderá determinar um dia e
horário fixos como seu “momento do estudo”;

Procure se alimentar e se hidratar quando for estudar; lembre-se de que uma


alimentação saudável pode proporcionar melhor aproveitamento do estudo;

No material de cada Unidade, há leituras indicadas e, entre elas, artigos científicos, livros, vídeos e
sites para aprofundar os conhecimentos adquiridos ao longo da Unidade. Além disso, você tam-
bém encontrará sugestões de conteúdo extra no item Material Complementar, que ampliarão
sua interpretação e auxiliarão no pleno entendimento dos temas abordados;

Após o contato com o conteúdo proposto, participe dos debates mediados em fóruns de discus-
são, pois irão auxiliar a verificar o quanto você absorveu de conhecimento, além de propiciar o
contato com seus colegas e tutores, o que se apresenta como rico espaço de troca de ideias e
de aprendizagem.
UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Vivenciar a Arquitetura
Vimos que para a ampliação do repertório são necessários o estudo e a análise
de projetos, entretanto vivenciar a arquitetura é também essencial para a boa práti-
ca projetual. Quando Bruno Zevi (1996) afirma que “tudo que não tem espaço in-
terior não é arquitetura” e afirma ainda: “um obelisco, uma fonte, um monumento
[...] um arco do triunfo, são todos feitos da arte que encontramos nas histórias da
arquitetura, [...] podem ser obras-primas poéticas, mas não são arquitetura”, ele em
seguida também esclarece dois equívocos que as suas afirmações podem suscitar:
1. que a experiência espacial arquitetônica só é possível no interior de um
edifício, ou seja, que o espaço urbanístico praticamente não existe ou
não tem valor;

2. que o espaço não somente é o protagonista da arquitetura, mas esgota a


experiência arquitetônica, e que, por conseguinte, a interpretação espacial
de um edifício é suficiente como instrumento crítico para julgar uma obra
de arquitetura. Esses equívocos devem ser imediatamente dissipados.

A experiência espacial própria da arquitetura prolonga-se na cidade, nas


ruas e praças, nos becos e parques, nos estádios e jardins, onde quer que a
obra do homem haja limitado ‘vazios’, isto é, tenha criado espaços fechados
[...] Ora, visto que todos os volumes arquitetônicos, todos os invólucros mu-
rais, constituem um limite, um corte na continuidade espacial, é óbvio que
todos os edifícios colaboram para a criação de dois espaços: os interiores,
definidos perfeitamente pela obra arquitetônica, e os exteriores ou urbanís-
ticos, encerrados nessa obra e nas contíguas. Então, é evidente que todos
os temas que excluímos da arquitetura autêntica – pontes, obeliscos, fontes,
arcos de triunfo, grupos de árvores, etc. e particularmente as fachadas dos
edifícios, todos entram em jogo na formação dos espaços urbanísticos. [...]
O segundo equívoco leva o raciocínio aos limites extremos e ao absurdo,
com ilações totalmente estranhas às intenções dos que defendem a inter-
pretação espacial da arquitetura. Dizer que o espaço interior é a essência da
arquitetura não significa efetivamente afirmar que o valor de uma obra ar-
quitetônica se esgota no valor espacial. Cada edifício caracteriza-se por uma
pluralidade de valores: econômicos, sociais, técnicos, funcionais, artísticos,
espaciais e decorativos. [...] Mas a realidade do edifício é consequência de
todos esses fatores, e sua história válida não pode esquecer nenhum deles
[...] é claro que o espaço em si, apesar de ser o substantivo da arquitetura,
não é suficiente para defini-la. (ZEVI, 1996)

László Moholy-Nagy1 (2005) descreve, por volta de 1928, que apesar da “gran-
de incerteza” acerca da sua definição, “o espaço é uma realidade de nossas expe-
riências sensoriais. Uma experiência humana como as outras”, complementando
que “a configuração do espaço é a configuração de relações das posições dos cor-
pos” (volumes) e que para compreender ou apreender essa definição corretamente

1 László Moholy-Nagy, pintor, escultor e artista, nascido em 1895 na Hungria. Foi professor da Bauhaus entre 1923
e 1928. Faleceu em Chicago, EUA, em 1946.

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temos que confrontá-la com a vivência orgânica do espaço. Para Moholy-Nagy
(2005), “o homem toma consciência do espaço – das relações de posição dos cor-
pos -, em primeiro lugar, por meio do seu sentido da visão [...] e pode ser vivencia-
da paralelamente por meio do sentido do tato” e complementa: “o caminho para
a vivência da arquitetura vai além de uma determinada capacidade de apreensão
biológica-funcional”. Ainda segundo Moholy-Nagy (2005), o homem comum ou
“erudito” não tem “certeza, nem consciência para julgar as obras arquitetônicas”.
Bruno Zevi (1996) afirma que o desconhecimento sobre arquitetura que errone-
amente em geral é atribuído ao desinteresse do público é na verdade resultado de
uma gama de condições, e que os meios de comunicação, como jornais, revistas e
outras mídias, pouco fazem na difusão de uma “cultura arquitetônica”:
É quase uma praxe iniciar um estudo de crítica ou de história da arquitetura
com uma censura ao público. Dezenove livros em cada vinte dentre os citados
na bibliografia começam com diatribes e apologias:

• O público interessa-se por pintura e música, por escultura e literatura,


mas não por arquitetura. [...]

• Os jornais dedicam colunas inteiras a um novo livro de Koestler2 ou


a uma exposição de Burri3, mas ignoram a edificação de um novo
palácio, ainda que seja obra de um famoso arquiteto. E, se todos os
jornais que se prezam têm um noticiário sistemático de música, de
teatro, de cinema e pelo menos uma coluna semanal sobre artes, a
arquitetura continua a ser a grande esquecida pela imprensa.

• Assim como não existe uma propaganda adequada para difundir a


boa arquitetura, também não existem instrumentos eficazes para im-
pedir a realização de edifícios horríveis. A censura funciona para os
filmes e para a literatura, mas não para evitar escândalos urbanísticos
e arquitetônicos, cujas consequências são bem mais graves e mais
prolongadas do que as da publicação de um romance pornográfico.

• Todavia (e aqui começam as apologias), qualquer um pode desligar o


rádio e abandonar os concertos, não gostar de cinema e de teatro e
não ler um livro, mas ninguém pode fechar os olhos diante das cons-
truções que constituem o palco da vida citadina e trazem a marca do
homem no campo e na paisagem.

O desinteresse do público pela arquitetura não pode, contudo, ser conside-


rado fatal e inerente à natureza humana ou à natureza da produção de edi-
fícios, de tal forma que tenhamos de nos limitar a constatá-lo. Existem sem
dúvidas dificuldades objetivas, e uma incapacidade por parte dos arquitetos,
dos historiadores da arquitetura e dos críticos de arte para se fazerem por-
tadores da mensagem arquitetônica, para difundir o amor pela arquitetura,
pelo menos entre a maioria das pessoas cultas. (ZEVI, 1996)

2 Arthur Koestler foi um jornalista, escritor e ativista político judeu húngaro radicado no Reino Unido. Nasceu em Buda-
peste na Hungria em 05/09/1905 e faleceu em Londres, Reino Unido, em 03/03/1983. (Fonte: ENCYCLOPAEDIA
BRITANNICA. Disponível em: <https://goo.gl/mcyRR7>. Acesso em: 13 dez. 2018. Nota do autor da disciplina).
3 Alberto Burri nasceu em 12/03/1915, em Città di Castello, Itália. Formado em medicina pela Università degli Studi
di Perugia. Foi prisioneiro de guerra durante a 2ª Guerra mundial. Com o fim da guerra iniciou sua carreira de pin-
tor. Faleceu em 15/02/1995 em Nice, França. (Fonte: GUGGENHEIM. Disponível em: <https://goo.gl/XKriRi>.
Acesso em: 13 dez. 2018. Nota do autor da disciplina).

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Para Zevi (1996), não é o interesse do público pelo assunto que o afasta de um
maior conhecimento arquitetônico; para o autor, “saber ver arquitetura” passa por
uma nova “atitude crítica” que consiga aproximar as pessoas do entendimento de
conceitos e termos mais claros e precisos que são utilizados em arte e arquitetura
“por diversos autores”, “muitas vezes sem especificar a que se referem”.

Construímos e vivemos em casas e cidades, projetadas por arquitetos ou não, a


arquitetura nos fornece o cenário da vida, da nossa identidade e da própria existên-
cia e história. As memórias que possuímos são compostas de nossas experiências
sensoriais e todos os nossos sentidos participam desse processo perceptivo.
Precisamos de apenas oito moléculas de uma substância para desenca-
dear um impulso olfativo em uma terminação nervosa, e conseguimos
detectar mais de dez mil diferentes odores. Frequentemente, a memória
mais persistente de um espaço é seu cheiro. Não consigo me lembrar da
aparência da porta da casa da fazenda de meu avô quando eu era muito
pequeno, mas lembro muito bem a resistência imposta por seu peso e a
pátina de sua superfície de madeira marcada por décadas de uso, e me
recordo especialmente do aroma de sua casa que atingia meu rosto como
se fosse uma parede invisível por trás da porta. Cada moradia tem seu
cheiro individual de lar. (PALLASMAA, 2011)

A participação do tato e do paladar é para Pallasmaa (2011) também essencial


na experiência de vivenciar a arquitetura:
A pele lê a textura, o peso, a densidade e a temperatura da matéria [...] É um
prazer apertar a maçaneta da porta que brilha [...] A maçaneta da porta é o
aperto de mãos do prédio [...] Quando entrei no magnífico espaço externo
do Salk Institute, de Louis Kahn, em La Jolla, na Califórnia, senti uma ten-
tação irresistível de caminhar diretamente até a parede de concreto e tocar
a maciez aveludada e a temperatura de sua pele [...] Há uma transferência
sutil entre as experiências do tato e do paladar [...] Muitos anos atrás, quando
estava visitando a DL James Residence, em Carmel, na Califórnia, projetada
por Charles e Henry Greene, senti-me compelido a ajoelhar e tocar com a
língua a soleira de mármore branco da porta de entrada, que brilhava delica-
damente. (PALLASMAA, 2011)

Pallasmaa (2011) procura fazer uma reflexão sobre a exploração da visualidade


da arquitetura por meio de formas exóticas ou as geometrias complexas e defende
que o tato desempenha uma grande “importância para experimentarmos e en-
tendermos o mundo”, assim como convoca todos os sentidos a participarem da
experiência de sentir a arquitetura, não apenas a visão.
É evidente que uma arquitetura ‘que intensifique a vida’ deva provocar
todos os sentidos simultaneamente e fundir nossa imagem de indivíduos
com nossa experiência do mundo. A tarefa mental essencial da arqui-
tetura é acomodar e integrar. A arquitetura articula a experiência de se
fazer parte do mundo e reforça nossa sensação de realidade e identidade
pessoal; ela não nos faz habitar mundos de mera artificialidade e fantasia.
(PALLASMAA, 2011)

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É fato que a visão tem um papel fundamental na percepção e consequentemente
na construção da experiência humana, na cultura ocidental especialmente o sentido
da visão é considerado o mais nobre dos sentidos, a filosofia grega “baseava as cer-
tezas” na visão (PALLASMAA, 2011).

A filosofia usualmente aborda a questão da priorização do sentido da visão na


cultura e pensamento. Para Pallasmaa (2011), “Na nossa era, a hegemonia da visão
tem sido reforçada pelas incontáveis invenções tecnológicas e a infinita multiplicação
e produção de imagens” e para David Harvey (apud Pallasmaa, 2011), “as imagens
visuais se tornaram mercadorias. Assim, é de se supor que há uma busca incessante
de novidades, no que diz respeito à investigação formal na arquitetura e, portanto,
quanto mais exótica, mais interessante. Alguns autores defendem que o valor arqui-
tetônico está no próprio fato de essas formas serem exuberantes e provocarem sen-
sações de bem-estar; outros, porém, argumentam que essa exacerbação da forma
afasta as pessoas de um maior envolvimento e experiência individual e coletiva, que
produz um imaginário arquitetônico superficial (PALLASMAA, 2011).

A procura por formas diferentes na arquitetura muitas vezes parece ser o obje-
tivo dos arquitetos. A arquitetura como síntese articula diversas premissas, forma,
conceito, proporções etc. Com relação às proporções na arquitetura, Rasmussen
(1998) faz uma comparação entre arquitetura e música:
[...] quando uma pessoa está ouvindo música não tem a menor ideia dos
comprimentos das cordas que a produziram [...] Mas, qualquer que seja
o raciocínio dos gregos, o certo é que eles descobriram a existência de
alguma relação entre simples proporções matemáticas no mundo visual e
a consonância no mundo audível [...] Mas era óbvio que o homem possuía
uma intuição especial que lhe possibilitava perceber simples proporções
matemáticas no mundo físico. Isso pôde ser demonstrado em relação à
música e acreditava-se que também devia ser verdadeiro no tocante às di-
mensões visíveis. A arquitetura, que frequentemente emprega dimensões
simples, era então, assim como viria a ser repetidas vezes depois, com-
parada à música. Foi chamada de música congelada. É indiscutível que
escala e proporção desempenham um papel muito importante em arqui-
tetura. Mas não existem proporções visuais que tenham o mesmo efeito
espontâneo em nós que aquelas a que vulgarmente chamamos harmonias
e desarmonias visuais [...] Não obstante, inúmeras tentativas foram feitas
para elaborar princípios de proporcionalidade arquitetural análogos aos
princípios matemáticos de escalas musicais. (RASMUSSEN, 1998)

O que Rasmussen (1998) apresenta nessa comparação entre música e arquitetura


é que se trata de uma aproximação metafórica, harmonia ou desarmonia não são
tão percebidas em arquitetura como são na música, ou seja, pequenas distorções
(sonoras) são muito mais perceptíveis aos nossos ouvidos do que pequenas distorções
(dimensões) em um edifício. A proporção áurea seria o maior exemplo da busca de
encontrar essas relações de harmonia entre as dimensões utilizadas em arquitetura.
Le Corbusier fundamentou o seu “Le Modulor” nos conceitos da proporção áurea.

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Diz-se que um segmento de linha está dividido de acordo com a seção


áurea quando é composto de duas partes desiguais, das quais a primeira
está para a segunda como a segunda está para o todo. Se chamarmos as
duas partes de a e b, respectivamente, então a razão de a para b é igual
à razão de a para a + b.

Na arquitetura, as dimensões utilizadas sempre tiveram uma relação direta com


as dimensões do próprio homem, e isso não poderia ser diferente, pois desde os
primórdios o homem constrói o seu abrigo para atender às suas necessidades,
portanto sua relação com o espaço é direta. Espaços são pensados para acolher,
acomodar, alojar. Por volta de 1490, Leonardo da Vinci4 representa essa relação
das proporções humanas aplicadas na arquitetura, baseado nas informações de
Vitrúvio5, no desenho “O Homem Vitruviano”.
Nessa referida ilustração são apresentadas as teorias de Vitrúvio. Um dos
exemplos é colocar um homem com os braços e mãos bem estendidos. A
medida obtida entre uma mão até a outra é equivalente à medida da sua
altura. Coisa simples! Mas é com isto que Vitrúvio demonstra a proporcio-
nalidade entre as partes do corpo do homem e chama a atenção para o
entendimento do projetar as edificações a partir do mesmo princípio. As
diferentes partes do corpo do homem formam um interessante conjunto de
proporções que cabem em um círculo, bem como em um quadrado. Para
Vitrúvio a arquitetura deveria seguir o mesmo entendimento de ter a pro-
porcionalidade das partes para completar o todo harmoniosamente, pois as
partes formam o todo. (LOPES FILHO e SILVA, 2003)

Le Corbusier utiliza uma metodologia semelhante à de Leonardo da Vinci e,


utilizando como base o “Homem Vitruviano, cria, em 1946, o “Le Modulor”, para
aplicação na arquitetura.
Sabemos que um módulo é uma medida reguladora das proporções de
uma obra arquitetônica. Com o seu trabalho Le Corbusier quis mostrar que
a natureza é matemática. Ele criou a sua escala humana por entender ser
complicada a existência e uso de dois sistemas de medidas: o anglo-saxão e
o métrico decimal. Suas pesquisas sobre a escala humana se basearam nos
estudos de Leonardo Pisano Fibonacci (1170-1250), na seção áurea e na
procura da harmonia visual na arquitetura. No entanto é importante lem-
brar que os sistemas métricos e o de polegadas dificultam a aproximação e
entendimento dos diferentes países quando dos tratados de antropometria,
de ergonomia, das normas e critérios de acessibilidade para pessoas por-
tadoras de deficiência ou pessoas idosas. (LOPES FILHO e SILVA, 2003)

4 Leonardo da Vinci, cientista, matemático, engenheiro, inventor, anatomista, pintor, escultor, arquiteto, botânico, poeta
e músico, nasceu em 15/04/1452, em Anchiano, Itália, e faleceu em 02/05/1519, em Clos Lucé, Amboise, França.
5 Marco Vitrúvio Polião, arquiteto romano, já citado anteriormente.

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Figura 1 – O Homem Vitruviano, Leonardo da Vinci
Fonte: iStock/Getty Images

Figura 2 – Le Modulor, Le Corbusier


Fonte: Wikimedia Commons

Leia o artigo inteiro sobre Antropometria (Homem Vitruviano e Le Modulor):


Explor

LOPES FILHO, José Almeida; SILVA, Sílvio Santos da. Antropometria. Sobre o homem como
parte integrante dos fatores ambientais. Sua funcionalidade, alcance e uso.
Disponível em: https://goo.gl/CLvwiQ.

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Visitas Técnicas em Campo


Pallasmaa (2011) explora a relação de coexistência entre o homem e a arquite-
tura, a partir da filosofia de Merleau-Ponty, que, segundo o autor, define e deter-
mina um e outro:
Eu confronto a cidade com meu corpo; minhas pernas medem o compri-
mento da arcada e a largura da praça; meus olhos fixos inconscientemen-
te projetam meu corpo na fachada da catedral, onde ele perambula sobre
molduras e curvas, sentindo o tamanho de recuos e projeções; meu peso
encontra a massa da porta da catedral e minha mão segura a maçaneta
enquanto mergulho na escuridão do interior. Eu me experimento na ci-
dade; a cidade existe por meio de minha experiência corporal. A cidade
e meu corpo se complementam e se definem. Eu moro na cidade, e a
cidade mora em mim.

As visitas em campo são fundamentais. Ábalos (2010) afirma que “a exposição


dessas ideias”, ou seja, uma maneira de se entender, apreender e pensar a arqui-
tetura, “dá-se através de visitas guiadas a um grupo de habitações, reais ou imagi-
nárias”, ou seja, aprende-se visitando os projetos; mais do que isso, vivenciando-se
esses espaços. A fotografia permitiu, sem sombra de dúvidas, uma revolução na
disseminação de informações; a partir das imagens de edifícios reproduzidas em
publicações específicas, destinadas ao público interessado em arquitetura, se pode
conhecer edifícios existentes, ou destruídos. Conhecer a arquitetura por meio das
imagens e desenhos é, certamente, fundamental para a construção do repertório,
entretanto, quando possível, a visita presencial a edifícios estudados irá consolidar
completamente a experiência arquitetônica:
Quem quer que tenha visto um lugar primeiramente numa foto e depois
o tenha visitado sabe como a realidade é bem diferente. Sente-se a at-
mosfera à volta e já não se depende do ângulo de onde a foto foi tirada.
Respira-se o ar do lugar, ouvem-se os seus sons, nota-se como eles são
ecoados pelas casas que não vemos atrás de nós. (RASMUSSEN, 1998)

Pallasmaa (2011) defende que vivenciar o espaço complementa a experi-


ência arquitetônica:
[...] uma obra de arquitetura gera um todo indivisível de impressões. O en-
contro ao vivo com a Casa da Cascata, de Frank Lloyd Wright6, funde em
uma experiência totalizante e única a floresta do entorno com os volumes,
as superfícies, as texturas e as cores da casa, e até mesmo os aromas da
floresta e os sons do rio. Uma obra de arquitetura não é experimentada
como uma coletânea de imagens visuais isoladas, e sim em sua presença
material e espiritual totalmente corporificada. Uma obra de arquitetura
incorpora e infunde estruturas tanto físicas quanto mentais. A frontalidade
visual de um desenho de arquitetura desaparece na experiência real da
edificação. (PALLASMAA, 2011)

6 Frank Lloyd Wright – arquiteto norte-americano, nasceu em 08/06/1867, em Wisconsin – EUA, e faleceu em
09/04/1959, no Arizona – EUA.

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Portanto, de certa forma, Pallasmaa (2011) corrobora com a resposta dada por
Rasmussen (1998), para a questão por ele mesmo levantada: “a arquitetura pode
ser ouvida?”
Raramente nos apercebemos do quanto podemos ouvi-la. Recebemos
uma impressão total da coisa para a qual estamos olhando e não presta-
mos atenção aos vários sentidos que contribuíram para essa impressão.
Por exemplo, quando afirmamos que uma sala é fria e formal, é raro
querermos dizer com isso que a temperatura é muito baixa. A reação,
provavelmente, decorre de uma antipatia natural pelas formas e materiais
que se encontram nessa sala – em outras palavras, essa afirmação é decor-
rente de algo que sentimos. Ou talvez as cores sejam frias, e, nesse caso,
a impressão advém de algo que vemos. Ou, finalmente, pode ser que a
acústica seja áspera, de modo que o som – especialmente os tons altos –
reverbera nele; portanto, tal impressão é proveniente de algo que ouvimos
[...] Se meditarmos sobre isso, descobriremos a existência de um certo
número de estruturas que sentimos acusticamente [...] Recordo, dos meus
tempos de infância, a passagem abobadada que leva à antiga cidadela de
Copenhague. Quando os soldados marchavam através dela com pífaros e
tambores, o efeito era terrificante. Uma carroça que passasse por ela soa-
va como o ribombar de trovões. Até um garoto podia enchê-la com uma
tremenda e fascinante algazarra... quando a sentinela não estava à vista.
(RASMUSSEN, 1998)

Portanto, sentimos a arquitetura com todos os nossos sentidos, podemos dizer


que vemos, ouvimos, sentimos os odores, tateamos as texturas e até os sabores
do espaço arquitetônico. Todos os nossos sentidos atuam em conjunto, devemos
então estar atentos e explorar essas possibilidades.

Fluxogramas
Como já foi apresentado na Disciplina Fundamentação de Projeto Arquitetôni-
co, o fluxograma7 é um diagrama, portanto uma representação gráfica que procura
demonstrar a organização espacial do programa de necessidades e as relações
entre os espaços.

Por meio do fluxograma pode-se entender como os espaços serão conectados, se


haverá elementos espaciais de separação, união e distribuição, como halls, circula-
ções horizontais e/ou verticais etc. Também por meio do fluxograma, pode-se perce-
ber antecipadamente se haverá algum problema de conflito de circulação e acessos.

O fluxograma permite que se entenda como os espaços específicos ou setores mais


gerais se relacionam (previstos na setorização). O diagrama abaixo, apresentado na dis-
ciplina Fundamentação de Projeto Arquitetônico, demonstra essa organização genérica.

7 Ver disciplina “Fundamentação de projeto arquitetônico”, “Fluxograma | setorização”, Prof. Me. Tiago A. Collet.

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Setor
Íntimo

Setor
Social

Setor de
Serviços
Figura 3
Após essa organização geral, é necessário que se desenvolva um fluxograma
específico para cada setor, dessa maneira examinando-se cada setor de forma mais
criteriosa e entendendo suas conexões.
Abaixo um exemplo de fluxogramas específicos, também já apresentados na
disciplina Fundamentação de Projeto Arquitetônico.
Fluxograma do setor íntimo:

Circulação para o setor social

Suíte do Casal Suíte dos Filhos Quarto


de Hospedes
Sanitário Sanitário
do Casal dos Filhos Sanitário

Figura 4
Fluxograma do setor social:

Circulação para o setor Íntimo

Acesso da Rua
Varanda Sala de Estar Sala de Jantar

Sanitário Social

Circulação para o setor de Serviços

Figura 5

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Fluxograma do setor de Serviços:

Circulação para o setor de Serviços

Acesso da Rua
Garagem Área de Serviço Copa - Cozinha

Dormitório Sanitário
de Empregada Empregada
Figura 6

O processo de projeto, como já apresentado nas unidades anteriores, não é


um processo linear, ou seja, pressupõe ajustes durante o processo; assim, tanto
o fluxograma vai auxiliar na construção da setorização, como a setorização pode
implicar uma reordenação dos espaços. A organização dos espaços vai se con-
solidando como volume a partir desses diagramas de fluxogramas e setorização
especializados. Durante o processo de estudo e análise de projetos, estudar o
fluxograma contribui para o entendimento das conexões dos espaços e da sua
concretização volumétrica.

Frank Lloyd Wright – Casa da Cascata, Mill Run,


Pennsylvania, Estados Unidos da América
A Casa da Cascata, construída na Pensilvânia, Estados Unidos, entre 1936 e
1939, é considerada a obra mais importante do arquiteto Frank Lloyd Wright.
Podemos reconhecer o prisma (ou o cubo) como base formal a partir de um nú-
cleo vertical que estrutura o edifício construído em concreto armado tendo um
contraponto da horizontalidade das lajes e balanços (CHING, 2003). Há uma
relação muito grande entre o edifício e o seu entorno, uma clara integração com
a natureza, por meio dos terraços que se projetam e evidenciam a horizontalidade
desses espaços, contrapostos por um núcleo vertical que estrutura a edificação.
Explor

Veja as imagens disponíveis nos links a seguir: https://goo.gl/mYnUC4 e https://goo.gl/vbhoHc.

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Figura 7 – Planta nível 1


Fonte: Frank Lloyd Wright, 1939

Figura 8 – Planta nível 2


Fonte: Frank Lloyd Wright, 1939

Figura 9 – Planta nível 3


Fonte: Frank Lloyd Wright, 1939

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Figura 10 – Alas hóspedes, planta 1
Fonte: Frank Lloyd Wright, 1939

Figura 11 – Alas hóspedes, planta 2


Fonte: Frank Lloyd Wright, 1939

Mies Van der Rohe – Casa Farnsworth, Plano,


Illinois, Estados Unidos da América
Esta casa, construída em Illinois, Estados Unidos, possui seu volume de um único
pavimento quase que totalmente transparente. Está apoiada em oito pilares de aço
e basicamente suas vedações são panos de vidro que contribuem para uma perme-
abilidade visual, “ampliando” a área externa, “trazendo” a natureza para o interior
da residência. Mies optou por elevar o edifício em relação ao nível do lote, uma vez
que a casa está situada às margens do Rio Fox, que enche periodicamente.
Explor

Veja a imagem disponível no link a seguir: https://goo.gl/ZoRxqF.

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Figura 12
Fonte: Adaptado de Mies van der Rohe, 1951

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Figura 13
Fonte: Adaptado de Mies van der Rohe, 1951

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UNIDADE Construção do Repertório – Parte II

Material Complementar
Indicações para saber mais sobre os assuntos abordados nesta Unidade:

  Sites
FallingWater - Frank Lloyd Wright - Tour the house today - Pennsylvania
https://goo.gl/ypnT6S
Frank Lloyd Wright Foundation
https://goo.gl/8dmwGC
ArchDaily
Sugestão de projetos para pesquisa virtual: Oscar Niemeyer – Casa das Canoas, São
Conrado, Rio de Janeiro, Brasil; Marcos Acayaba – Residência Milan, São Paulo,
Brasil; Marcos Acayaba – Residência Milan, São Paulo, Brasil; Studio MK27 – Casa
Paraty, Paraty, Rio de Janeiro, Brasil; Lina Bo Bardi – Casa de Vidro, São Paulo,
Brasil; Terra e Tuma Arquitetos Associados – Casa Vila Matilde, São Paulo, Brasil.
https://goo.gl/hT7DvS

 Vídeos
REC CBA - Villa Savoye de Le Corbusier - Recorrido Virtual
https://youtu.be/Plis2dtwFV8
Villa Savoye - Le Corbusier
https://youtu.be/hQZ81_TwFqE
La Villa Dall’Ava - Rem Koolhaas
https://youtu.be/O6rx1mH4DwE
Villa dall`ava, Rem Koolhaas
https://youtu.be/aFJ71mYYMXI
Farnsworth house by Mies Van der Rohe
https://youtu.be/XZ1hpOjdkgw

 Leitura
Homem Vitruviano e Le Modulor
LOPES FILHO, José Almeida; SILVA, Sílvio Santos da. Antropometria. Sobre o homem
como parte integrante dos fatores ambientais. Sua funcionalidade, alcance e uso.
https://goo.gl/CLvwiQ

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Referências
ÁBALOS, Iñaki. A boa-vida. Barcelona: Gustavo Gili, 2003.

CHING, Francis D. K. Introdução à arquitetura. 1. Porto Alegre: Bookman,


2013. Recurso online, ISBN 9788582601020.

MOHOLY-NAGY, László. Do material à arquitetura. Barcelona: Gustavo Gili,


2005 (Publicado originalmente por Gebr. Mann Verlag, Berlim, 2001, que por sua
vez já era uma reimpressão fac-símile da edição de 1929.)

MONEO, Rafael. Inquietação teórica e estratégia projetual na obra de oito


arquitetos contemporâneos. São Paulo: Cosac Naify, 2008.

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