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Teologia Sistemática II:

Cristologia
Antropologia e
Hamartiologia
Prof. Josadak Lima da Silva

2009
Copyright © UNIASSELVI 2009

Elaboração:
Prof. Josadak Lima da Silva

Revisão, Diagramação e Produção:


Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri


UNIASSELVI – Indaial.

240
S5861t Silva, Josadak Lima da.
Caderno de Estudos: Teologia Sistemática II:
Cristologia, Antropologia e Hamartiologia/ Josadak
Lima da Silva.Centro Universitário Leonardo da
Vinci–Indaial: Grupo UNIASSELVI, 2009. x ; 110 p. : il.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7830- 210-8

1. Teologia 2. Moral e Pratica Religiosa


I.Centro Universitário Leonardo da Vinci Núcleo de
Ensino a Distância. II. Título.

Impresso por:
Apresentação
Caro(a) acadêmico(a)!

Ao iniciar os estudos de “Teologia Sistemática II”, cada acadêmico(a)


precisa ter em mente que, hoje, somos constantemente tentados a corromper
a fé cristã genuína, na qual Cristo é o seu Autor e consumador. No Brasil
contemporâneo, há inúmeras manifestações de religiosidades falsas, em suas
variedades de religiões, que, ao passar pelo crivo da teologia ortodoxa, são
reprovadas, visto que a Pessoa de Jesus Cristo não é o elemento central da fé
nessas religiões.

Na Unidade 1 (Cristologia), ressaltamos que o homem chamado Jesus


é singular.

Na Unidade 2 (Antropologia), você aprenderá que o Deus que criou o


homem e lhe deu a capacidade de crer e pensar, pode nos ensinar, pela Sua
Palavra, como usar a razão para o nosso bem, para o progresso da humanidade
e para a glória de Deus. Portanto, não existe conflito entre fé e razão. Ambas
andam de mãos dadas. A rigor, não existe contradição entre o cristianismo e o
pensamento, o que existe é contradição entre alguns cristãos e alguns pensadores.

Na Unidade 3 (Hamartiologia), procuramos mostrar que o pecado


herdado de Adão é pecado ontem, hoje e sempre.

No campo do relativismo ético, o grande mal de nossos dias, imposto


aos homens em nossa cultura pós-moderna, é preciso entender que não se
pode impor um elemento de nossa cultura, como um princípio de definição
teológica. Neste caso, é tarefa do acadêmico(a) aprender fazer distinção entre
a cultura e a teologia cristã autêntica, discernir o que é pecado e o que não é.

Para assimilar bem os conteúdos aqui apresentados é indispensável


que você faça uma séria imersão nas Escrituras Sagradas, pois, tudo que for
afirmado como objeto de fé e prática deve ser feito, tomando como ponto de
partida a Bíblia. A rigor, uma teologia escriturística é espiritualmente relevante.

Como você já percebeu, neste Caderno, estaremos tratando de três


doutrinas da área da Teologia Sistemática (Cristologia, Antropologia e
Hamartiologia). Nosso objetivo é conduzir você, caro(a) acadêmico(a) a
conhecer mais a Jesus Cristo, para que seu estilo de vida e o modo de pensar
passe por uma mudança significativa.

Bom estudo!

Prof. Josadack Lima da Silva


III
NOTA

Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto


para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é


o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,


apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
 
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de


Desempenho de Estudantes – ENADE.
 
Bons estudos!

UNI

Olá acadêmico! Para melhorar a qualidade dos


materiais ofertados a você e dinamizar ainda mais os
seus estudos, a Uniasselvi disponibiliza materiais que
possuem o código QR Code, que é um código que
permite que você acesse um conteúdo interativo
relacionado ao tema que você está estudando. Para
utilizar essa ferramenta, acesse as lojas de aplicativos
e baixe um leitor de QR Code. Depois, é só aproveitar
mais essa facilidade para aprimorar seus estudos!

IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA) ...................................... 1

TÓPICO 1 – TEORIAS SOBRE A PESSOA DE JESUS CRISTO NA HISTÓRIA.................... 3


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 3
2 O ESTUDO DA CRISTOLOGIA..................................................................................................... 3
3 TEORIAS ACERCA DA DUPLA NATUREZA DE JESUS CRISTO......................................... 4
3.1 CONTROVÉRSIAS ACERCA DA PERSONALIDADE DE JESUS CRISTO....... 4
4 O CONSENSO CRISTÃO SOBRE A PESSOA DE JESUS CRISTO........................................ 6
4.1 O DOCUMENTO DE CALCEDÔNIA............................................................................... 7
4.2 IMPLICAÇÕES DA DECLARAÇÃO DE CALCEDÔNIA........................................... 7
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 9
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 11
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 12

TÓPICO 2 – A DOUTRINA DA ENCARNAÇÃO DE CRISTO................................................... 13


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 13
2 O CRISTO PREEXISTENTE............................................................................................................. 14
2.1 AS PROFECIAS SOBRE JESUS CRISTO.......................................................................... 14
2.2 JESUS JÁ EXISTIA ANTES DE TODAS AS COISAS................................................... 14
3 ENTENDENDO A ENCARNAÇÃO DE JESUS CRISTO........................................................... 15
3.1 O AUTOESVAZIAMENTO DO FILHO DE DEUS....................................................... 15
3.2 A CONCEPÇÃO VIRGINAL DO FILHO DE DEUS..................................................... 16
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 17
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 19
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 20

TÓPICO 3 – A VERDADEIRA IDENTIDADE DA PERSONALIDADE DE


JESUS CRISTO................................................................................................................ 21
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 21
2 A HUMANIDADE DE JESUS CRISTO E SUA IMPECABILIDADE....................................... 22
2.1 SUAS LIMITAÇÕES.................................................................................................................. 22
2.2 AS TENTAÇÕES......................................................................................................................... 23
3 A SUBLIMIDADE DA PERSONALIDADE DE JESUS.............................................................. 23
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 26
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 28
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 29

TÓPICO 4 – JESUS CRISTO COMO MODELO DE VIDA ......................................................... 31


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 31
2 A SINGULARIDADE DE JESUS CRISTO.................................................................................... 31
3 O SENHORIO DE CRISTO E SUAS IMPLICAÇÕES PRÁTICAS.......................................... 33
4 CHAMADO AO DISCIPULADO DE JESUS CRISTO............................................................... 34
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 37
RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 39
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 40
VII
UNIDADE 2 – DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)............................... 41

TÓPICO 1 – A ORIGEM DO HOMEM............................................................................................. 43


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 43
2 CRIAÇÃO OU EVOLUÇÃO: COMO TUDO COMEÇOU?....................................................... 45
2.1 A TEORIA EVOLUCIONISTA............................................................................................. 45
2.2 O CRIACIONISMO.................................................................................................................. 46
3 A UNIDADE DA RAÇA HUMANA............................................................................................... 47
3.1 TEORIAS QUE NEGAM A UNIDADE DA RAÇA....................................................... 48
3.2 ARGUMENTOS A FAVOR DA UNIDADE DA RAÇA HUMANA........................ 48
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 50
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 52
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 53

TÓPICO 2 – A NATUREZA DO HOMEM........................................................................................ 55


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 55
2 TEORIAS SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO HOMEM................................................................ 55
2.1 A TEORIA UNITARISTA OU MONISMO....................................................................... 55
2.2 A TEORIA DICOTOMISTA................................................................................................... 55
2.3 A TEORIA TRICOTOMISTA................................................................................................ 56
3 ANÁLISE DO ENSINO BÍBLICO SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO HOMEM..................... 57
3.1 PRIMEIRA TESSALONICENSES, 5:23.............................................................................. 57
3.2 HEBREUS, 4:12............................................................................................................................... 57
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 58
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 60
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 61

TÓPICO 3 – A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM....................................... 63


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 63
2 O QUE É IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM?............................................ 63
2.1 A IMAGO DEI............................................................................................................................. 64
2.2 QUAL É A NATUREZA DESTA IMAGEM?.................................................................... 65
3 ASPECTOS DA IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM................................. 66
3.1 AFINIDADE DO HOMEM COM O CRIADOR (ATOS, 7:24-28)............................... 66
3.2 DOMÍNIO DO HOMEM SOBRE A TERRA (GÊNESIS, 1:26)..................................... 67
3.3 CARÁTER MORAL E RAZÃO DO HOMEM.................................................................. 67
3.4 CAPACIDADE PARA A IMORTALIDADE DO HOMEM........................................ 67
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 68
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 70
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 71

UNIDADE 3 – DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)............................ 73

TÓPICO 1 – A ORIGEM DO PECADO............................................................................................. 75


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 75
2 COMO O PECADO ENTROU NO MUNDO?.............................................................................. 76
2.1 O PECADO TEVE ORIGEM NO MUNDO ANGÉLICO............................................. 76
2.2 TEORIAS SOBRE O PECADO.............................................................................................. 77
3 A ORIGEM DO PECADO NO MUNDO....................................................................................... 78
3.1 TENTAÇÃO E QUEDA DO HOMEM................................................................................ 78
3.2 O JUÍZO DIVINO...................................................................................................................... 80
3.3 A CONSCIÊNCIA E CULPA................................................................................................. 81

VIII
3.4 A PROMESSA DE REDENÇÃO........................................................................................... 82
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 83
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 85
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 86

TÓPICO 2 – A NATUREZA DO PECADO E SUAS CONSEQUÊNCIAS.................................. 87


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 87
2 A NATUREZA DO PECADO........................................................................................................... 87
2.1 A NATUREZA DO PECADO SEGUNDO A BÍBLIA................................................... 87
2.2 PERSPECTIVA TEOLÓGICA............................................................................................... 88
3 A TRANSMISSÃO DO PECADO................................................................................................... 89
3.1 O ENSINO BÍBLICO SOBRE A UNIVERSALIDADE DO PECADO..................... 89
3.2 TEMOS UMA NATUREZA PECAMINOSA POR CAUSA DA
TRANSGRESSÃO DE ADÃO................................................................................................ 90
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 91
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 93
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 94

TÓPICO 3 – OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)............................................................................ 95


1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 95
2 A NATUREZA HUMANA APÓS A QUEDA................................................................................ 95
2.1 INTERPRETAÇÕES QUE NEGAM A RELAÇÃO DO PECADO DE ADÃO
COM A RAÇA HUMANA...................................................................................................... 96
2.2 INTERPRETAÇÕES QUE AFIRMAM A RELAÇÃO DO PECADO DE
ADÃO COM A RAÇA.............................................................................................................. 96
3 O PECADO NOSSO DE CADA DIA.............................................................................................. 97
3.1 A VIDA HUMANA SOB O DOMÍNIO DO PECADO.................................................. 97
3.2 UM ESTILO DE VIDA QUE SE OPÕE AO PECADO.................................................. 99
3.3 A TENSÃO PERMANENTE ENTRE O QUERER E O FAZER................................. 100
3.4 CLASSES DE PECADO........................................................................................................... 102
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 104
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 106
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 107
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 109

IX
X
UNIDADE 1

DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO


(CRISTOLOGIA)

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade, você será capaz de:

• pontuar algumas teorias a respeito da pessoa de Cristo na História;

• explicar a encarnação do Verbo de Deus para tornar a salvação divina uma


realidade;

• compreender a verdadeira identidade da personalidade de Jesus Cristo,


como perfeitamente Deus e perfeitamente homem;

• indicar como a Pessoa de Jesus Cristo é modelo para os cristãos.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos, sendo que, no final de cada um
deles, você encontrará atividades que o(a) ajudarão a fixar os conhecimentos
adquiridos.

TÓPICO 1 – TEORIAS SOBRE A PESSOA DE JESUS CRISTO NA


HISTÓRIA

TÓPICO 2 – A DOUTRINA DA ENCARNAÇÃO DE CRISTO

TÓPICO 3 – A VERDADEIRA IDENTIDADE DA PERSONALIDADE DE


JESUS CRISTO

TÓPICO 4 – JESUS CRISTO COMO MODELO DE VIDA

1
2
UNIDADE 1
TÓPICO 1

TEORIAS SOBRE A PESSOA DE JESUS


CRISTO NA HISTÓRIA

1 INTRODUÇÃO
O termo “Cristologia” (o estudo da Pessoa, natureza, obra e ofício de
Cristo) vem de duas palavras gregas, Christo, que significa “Ungido”, “Messias”;
e logia traduzido por “estudo”.

2 O ESTUDO DA CRISTOLOGIA
Concordo com Ryrie (2004), quando diz que a Cristologia pode incluir
tanto um estudo da Pessoa de Jesus quanto de sua obra. No entanto, uma
vez que sua principal obra foi seu sacrifício na cruz, o estudo da doutrina da
salvação (Soteriologia), normalmente, é separado da Cristologia. Em nosso caso,
a Soteriologia foi tratada na “Teologia Sistemática I”.

Segundo Ryrie (2004), o estudo da Cristologia pode ser organizado de


maneira mais ou menos cronológica. Um estudo do Cristo pré-encarnado deve
vir primeiro. Ele é seguido pela análise de Cristo em sua humilhação, ou seja, de
sua vida aqui na Terra. Então, viria o estudo de seu ministério presente e futuro.

A Cristologia é uma das doutrinas fundamentais da Bíblia e da Teologia


cristã. Ao tratar do lugar de Jesus Cristo na teologia cristã, o teólogo Alister
McGrath (2005, p. 405-407), professor de teologia histórica na Universidade de
Oxford, diz que a Pessoa de Jesus Cristo é de central importância para a teologia
cristã. Embora a “Teologia” pudesse ser definida como “falar acerca de Deus”
em geral, a “teologia cristã” confere um papel central a Jesus Cristo. A natureza
desse papel é complexa e mais bem compreendida ao se considerar seus vários
elementos. O primeiro desses elementos é histórico, ao passo que os outros são
mais de caráter teológico.

● Jesus Cristo é o ponto de partida histórico para o Cristianismo.


● Deus revela-se em Jesus Cristo.
● Jesus Cristo é o fundamento da salvação.
● Jesus Cristo modela a vida redimida.

A rigor, o que os homens pensaram acerca da Pessoa de Jesus Cristo no


decorrer da história? Ora, na história surgiram inúmeras especulações acerca da
personalidade de Jesus, tanto no campo religioso como no filosófico.
3
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

3 TEORIAS ACERCA DA DUPLA NATUREZA DE JESUS


CRISTO
Logo nos primeiros séculos da Era Cristã surgiram fortes discussões
e controvérsias em torno da doutrina correta (ortodoxia), sendo que o assunto
principal em debate era a Pessoa de Jesus Cristo. “Discutia-se se Jesus era só
divino ou só humano, ou se ambos, quanto de divindade ou de humanidade
tinha ele. E como que as duas naturezas se relacionavam na pessoa de Cristo”
(AGUIAR, 1999, p. 222).

De fato, o Cristianismo é Jesus. Jesus Cristo é a realidade mais importante


para o Cristianismo, motivo pelo qual crer corretamente n’Ele é crucial para
preservar o Cristianismo autêntico (OLSON, 2000).

3.1 CONTROVÉRSIAS ACERCA DA PERSONALIDADE DE


JESUS CRISTO
A despeito das opiniões divergentes dos homens, Jesus continua o mesmo
ontem, hoje e para todo sempre.

Vejamos as principais especulações teóricas acerca de Cristo nos primeiros


séculos:

a) Ebionismo (107 d.C.). Os ebionistas diziam que Jesus era apenas humano,
desprovido da natureza divina. Eles aceitavam Jesus como Messias, todavia,
recusavam admitir suas credenciais divinas.

b) Docetismo. Os docetas (70-170 d.C.) adotavam a opinião filosófica, corrente


entre os GNÓSTICOS, de que a matéria é má. Portanto, diziam que Jesus era
só divino, negavam sua humanidade. Ensinavam que Jesus se apresentava aos
homens como se tivesse um corpo, e como se sujeitasse às condições humanas,
porém, na verdade, Ele não tinha natureza humana.

NOTA

GNOSTICISMO – do grego gnostikós, conhecimento. Escola teológica que


floresceu nos primórdios do Cristianismo, contrariando as pregações dos apóstolos.
Seus adeptos diziam ser os únicos a possuírem um conhecimento perfeito de Deus. Seu
arcabouço doutrinário considerava a matéria irremediavelmente má. Por isto, diziam que a
humanidade de Cristo era apenas aparente. (ANDRADE, 1998, p. 167).

4
TÓPICO 1 | TEORIAS SOBRE A PESSOA DE JESUS CRISTO NA HISTÓRIA

c) Arianismo. Esta heresia foi defendida por Ário, um presbítero da cidade de


Alexandria, no Egito. Os arianos também negavam os atributos da divindade
de Jesus Cristo. “Eles diziam que Jesus era Deus, mas não igual ao Pai, que é
absoluto [...]. Para eles, Cristo foi a primeira criação de Deus, através de quem
o universo foi criado. A posição de Ário foi condenada no Concílio de Niceia,
em 325 d.C.” (AGUIAR, 1999, p. 223).

d) Apolinarianismo. Apolinário, bispo de Laodiceia, afirmava que Jesus possuía


somente um corpo humano e uma vida animal. Para o apolinarianismo,
Jesus não tinha alma humana. Esta teoria foi condenada no Concílio de
Constantinopla, em 381 d.C.

e) Nestorianismo. Nestório, Bispo em Constantinopla, negava a união entre as


duas naturezas de Cristo. O nestorianismo ensinava que as duas naturezas de
Cristo (humana e divina) estavam separadas em duas personalidades. Diziam
que as duas naturezas estavam associadas, mas não unidas. Esta linha de
pensamento foi condenada e Nestório expulso do bispado de Constantinopla,
em 431 d.C.

f) Eutiquianismo. Eutiques, monge em Constantinopla, afirmava que a natureza


divina de Cristo absorveu a natureza humana. Portanto, Cristo teria apenas
uma natureza. Esta teoria foi condenada no Concílio de Calcedônia, em 451
d.C.

NOTA

CONCÍLIO DE CALCEDÔNIA – Concílio (do lat. Concilium, reunião, assembleia),


reunião convocada pelos representantes de uma igreja, para deliberar acerca de uma linha
comum e pugna pela ortodoxia doutrinária. O Concílio de Calcedônia foi convocado por
Marcion, imperador oriental, em 451, e teve como principal finalidade: estabelecer a unidade
eclesiástica do Oriente. Na ocasião, foi sancionada a redação final do Credo de Calcedônia,
que viria a se tornar padrão da ortodoxia cristológica. (ANDRADE, 1998, p. 88).

Agora, vejamos um excelente resumo da Cristologia na história, feito por


Horrell ( apud Ferreira, 2007, p. 492-495):

● até 500 d.C., a Cristologia foi estabelecida com posições extremas entre a
humanidade e a divindade de Jesus Cristo;

● de 500 a 1800, a Cristologia foi preservada;

● de 1800 até hoje, ela foi desmontada.

5
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

Dentro destes grandes períodos houve algumas variações. Por exemplo:


no Período Medieval (600 a 1500), embora preservada, a Cristologia sofreu um
desequilíbrio, enfatizando mais a divindade de Jesus em detrimento da Sua
humanidade.

Já no Período da Reforma (1500-1800), todos seguiram a Cristologia


Ortodoxa. Lutero destacou a humanidade de Jesus e defendeu um inter-
relacionamento das duas naturezas em Cristo, em que o homem foi divinizado
e o divino humanizado. Calvino, por outro lado, ressaltou a divindade de Jesus,
destacando a obra divina do Logos.

De 1800 para cá, uma variedade de opiniões tem surgido em torno de


Cristo. Contribuíram para isto: a cultura do Iluminismo, novas filosofias (Kant,
Hegel, Kierkegaad etc.) e o criticismo bíblico. Temos, então, o antigo liberalismo
buscando o Jesus da história (e não o da Escritura). Depois do liberalismo, surgiu
a neo-ortodoxia, enfatizando o Cristo da fé, um Cristo descoberto no encontro
existencial com Deus. Assim, a objetividade histórica da Cristologia foi cedendo
espaço para uma Cristologia subjetiva. Hoje, a maioria dos teólogos diz que
devemos manter juntos o Jesus histórico e o Cristo da fé, porque se apoia em fatos
históricos. (AGUIAR, 1999).

NOTA

ILUMINISMO – (do lat. Iluminare, de lúmen, luz). Foi um movimento intelectual


do século XVIII, que defendia a autonomia da razão humana e questionava o papel tradicional
das autoridades. Sistema filosófico que só admitia a luz natural da razão na resolução dos
problemas humanos.

Convém ressaltar que muitas destas especulações sofreram grande


influência do pensamento filosófico grego. Seus autores, assim como seus
seguidores, foram considerados heréticos.

4 O CONSENSO CRISTÃO SOBRE A PESSOA DE JESUS


CRISTO
Foram feitos muitos esforços, no decorrer da história, para explicar as
relações das duas naturezas da personalidade de Jesus, mas a que prevaleceu e
que até os nossos dias é sustentada, por estar mais de acordo com a Verdade das
Escrituras Sagradas, é a chamada Doutrina Ortodoxa de Calcedônia, de 451. O
teor desse documento reflete a rejeição de todas as cristologias alternativas que
surgiram neste período.

6
TÓPICO 1 | TEORIAS SOBRE A PESSOA DE JESUS CRISTO NA HISTÓRIA

4.1 O DOCUMENTO DE CALCEDÔNIA


O Concílio de Calcedônia firmou e aprovou o seguinte documento de
doutrina ortodoxa:

Fiéis aos santos padres, todos nós, perfeitamente unânimes, ensinamos


que se deve confessar um só e mesmo Filho, nosso Senhor Jesus
Cristo, perfeito quanto divindade, e perfeito quanto humanidade,
verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem, constando de
alma racional e de corpo; consubstancial (homoousios), segundo a
divindade, e consubstancial a nós, segundo a humanidade; “em todas
as coisas semelhantes a nós, excetuando o pecado”, gerado segundo a
divindade, antes dos séculos pelo Pai e, segundo a humanidade, por
nós e para nossa salvação, gerado da Virgem Maria, por parte de Deus
(“theotókos”).
Um só e mesmo Cristo, Filho, Senhor, Unigênito, que se deve confessar,
em duas naturezas, inconfundíveis e imutáveis; inseparáveis e
indivisíveis; a distinção de natureza de modo alguma é anulada
pela união, mas, pelo contrário, as propriedades de cada natureza
permanecem intactas, concorrendo para formar uma só pessoa e
substância (hipóstasis); não dividido ou separado em duas pessoas.
Mas um só e mesmo Filho Unigênito, Deus Verbo, Jesus Cristo
Senhor; conforme os profetas outrora a seu respeito testemunharam,
e o mesmo Cristo nos ensinou e o credo dos pais nos transmitiu”.
(GRUDEN, 2006, p. 263-266).

A definição da Doutrina Ortodoxa, formulada no Concílio de Calcedônia,


é considerada oficial pelas igrejas:

Ortodoxa

Católica Romana

Luterana

Presbiteriana

Anglicana

Batista

Pentecostal

4.2 IMPLICAÇÕES DA DECLARAÇÃO DE CALCEDÔNIA


Como vimos, este Concílio debateu as duas naturezas distintas de Jesus,
mas nunca separadas, porém, integradas a uma só pessoa, o Filho eterno de Deus,
a segunda Pessoa da Trindade.

7
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

Na época (451 d.C.), a aceitação desta definição foi quase imediata. As


expressões como “inconfundíveis” e “imutáveis”, “inseparáveis” e “indivisíveis”
mostram a convicção deles na salvação, na Pessoa de Jesus Cristo.

A forma brilhante como o teólogo Louis Berkhok resumiu em quatro


pontos as implicações desta declaração, merece nossa atenção. (FERREIRA, 2007.
p. 491):

a) As propriedades de ambas as naturezas podem ser atribuídas a uma só


Pessoa, como por exemplo, onisciência e conhecimento limitado.

b) Os sofrimentos do Deus-homem podem ser reputados como reais e


verdadeiramente infinitos, ao mesmo tempo em que a natureza divina não é
passível de sofrimento.

c) É a divindade, e não a humanidade, que constitui a raiz e a base da


personalidade de Cristo.

d) O Logos não se uniu a um indivíduo humano distinto, e sim à natureza


humana. Não houve primeiro um homem já existente com quem o eterno
Filho de Deus teria associado. A união foi efetuada com a substância da
humanidade no ventre da Virgem.

Como vimos, umas teorias negam a divindade de Cristo, outras negam Sua
humanidade, outras O tem como um fantasma. O pior é que, de uma forma ou de
outra, algumas dessas heresias e formas de pensamento estão sendo disseminadas
hoje, via espiritismo, testemunhas de Jeová e outros grupos conhecidos como
teosóficos. Portanto, estejamos alerta para sustentar a verdadeira identidade de
Cristo, conforme expressa na definição ortodoxa de Calcedônia.

8
TÓPICO 1 | TEORIAS SOBRE A PESSOA DE JESUS CRISTO NA HISTÓRIA

LEITURA COMPLEMENTAR

O HOMEM-DEUS E OS SEUS ATRIBUTOS

Severino Pedro

A questão maior entre os pensadores se liga aos atributos naturais da


divindade e às limitações de Jesus:

Onipotência. Nas Escrituras, é apresentado o supremo poder pessoal do


Filho de Deus, evidenciando-se os seus atributos naturais e morais, próprios de
Deus Pai. Em várias passagens, menciona-se a onipotência do Senhor Jesus. Em
Isaías, são citados cinco nomes de Cristo em uma mesma passagem; um deles
(Deus forte) refere-se à onipotência de Cristo: “Por que um menino nos nasceu,
um filho se nos deu; e o principado está sobre os seus ombros; e o seu nome será:
Maravilhoso, Conselheiro, Deus forte, Pai da eternidade, Príncipe da paz” (Isaías,
9:6).

Onipresença. “Como Jesus continuou onipresente se, ainda na terra,


estava limitado pelo tempo e o espaço, ocupando apenas um só lugar ao mesmo
tempo?” Como Filho do homem (sua humanidade), Ele estava limitado às
dimensões geográficas: quando estava na Galileia, não se encontrava, é claro, na
Judeia. No entanto, como Filho de Deus (sua divindade), sempre esteve presente
em todo o lugar (Mateus, 28:20).

Como homem, o Senhor estava na Terra; como Deus, podia estar no Céu,
ao mesmo tempo: “Ora, ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o
Filho do homem, que está no céu” (João, 3:13). Depois de sua ressurreição, Ele
declarou: “[...] estou convosco todos os dias, até a consumação dos séculos”
(Mateus, 28:20).

Onisciência. “Se Jesus é onisciente, porque fracassou, em certa ocasião,


não saber o dia nem a hora de sua Segunda Vinda?” Como coexistiam Deus e
Homem numa mesma Pessoa, sabemos que “toda a plenitude” da divindade
se encontrava em Jesus Cristo. Daí o profeta Isaías ter afirmado profeticamente
que Ele seria possuidor da septiforme sabedoria divina: “E repousará sobre Ele o
mesmo espírito do Senhor, o espírito de sabedoria e de inteligência, o espírito de
conselho e de fortaleza, o espírito de conhecimento e de temor do Senhor” (Isaías,
11:2).

Cristo é uma das Pessoas da santíssima Trindade. Sendo igual a Deus em


seus atributos, pôde administrar, sem nenhum empecilho, as naturezas divina e
humana. As expressões ditas por Ele, que mostram certas limitações, estão ligadas
à sua humanidade. Mas, quando preciso, Ele fez valer os seus atributos divinos.

9
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

Quando Jesus disse: “Mas daquele dia e hora ninguém sabe, nem os anjos
que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai” (Marcos, 13:32), fê-lo como Homem,
não se valendo de seu atributo divino da onisciência. Ao dizer “nem o Filho”,
expressou a sua humilhação e o seu esvaziamento decorrente de sua encarnação
(Filipenses, 2:6-8).

A despeito disso, a Ele foi dado todo o poder no Céu e na Terra; neste “todo”
está incluído o atributo da onisciência (Mateus, 28:18; João, 16:30; 21:17), que Ele
nunca perdeu, em potencial (cf. João, 6:61), mas dele abriu mão parcialmente e
em alguns momentos em que agiu como Homem.

FONTE: PEDRO, Severino. Teologia Sistemática Pentecostal. Rio de Janeiro: CPAD, 2008. p. 128-129.

10
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico você estudou que:

 É de suma importância entender a verdadeira identidade de Jesus Cristo,


segundo as Escrituras, para não cairmos em erros doutrinários, como foi o
caso de Ário, Apolinário e outros.

 Havia n’Ele, sem dúvida, duas naturezas: a divina e a humana. Porém, estas
duas naturezas se uniam em uma só Pessoa. Não havia dois Cristos. Jesus não
era uma pessoa dividida, sofrendo de esquizofrenia.

 A maneira da união das duas naturezas é um mistério. Porém, não é mais


misteriosa do que a união de alma e corpo da vida humana.

11
AUTOATIVIDADE

1 Qual é a diferença básica entre as teorias do ebionismo e do docetismo?

2 Complete:

Até 500 d.C., a Cristologia foi ________________.

3 O Concílio de Calcedônia firmou e aprovou o quê?

12
UNIDADE 1
TÓPICO 2

A DOUTRINA DA ENCARNAÇÃO DE
CRISTO

1 INTRODUÇÃO
A doutrina da encarnação do Verbo divino está claramente exposta na
abertura do quarto evangelho. O apóstolo João apresenta Jesus como um homem
real exatamente como os outros, mas que possui os atributos da divindade.

O termo “Verbo”, aplicado a Jesus, procede do original grego Logos e,


apesar do seu significado secular amplo (razão, palavra), em João, 1:1 aparece
com o sentido de “Palavra Divina”.

NOTA

LOGOS – título cristológico que designa o Senhor Jesus como o Eterno, o


Criador e verdadeiro Deus.

Vejamos os diversos significados empregados para a palavra Logos, fora


o sentido bíblico (João, 1:1), como a denotação à preexistência e à divindade de
Cristo (LADD, 2003, p. 360-361):

● Em primeiro lugar, em Heráclito, o logos é o princípio cósmico eterno, que traz


ordem ao universo.

● Em segundo lugar, para os filósofos estoicos, este mesmo princípio cósmico


permeia todas as coisas e provê o padrão de conduta para o homem racional.

● Em terceiro lugar, para Filo, é a emanação divina que intermediou a criação do


universo.

● Em quarto lugar, à luz do Antigo Testamento, seria a Palavra de Deus como


poder criador e mantenedor de todas as coisas (Gênesis, 1:3, assim como a
Sabedoria como personificação do poder de Deus (Provérbios, 8:22-31),
conceito paralelo de logos e Palavra de Deus.

13
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

2 O CRISTO PREEXISTENTE
As profecias referentes a Jesus, o Messias vindouro, ocorrem em grande
número no Antigo Testamento. Muitas vezes, elas são detalhadas e precisas.
(KENDALL, 2008).

2.1 AS PROFECIAS SOBRE JESUS CRISTO


Logo em Gênesis (3:15) temos a profecia de que ele seria do sexo masculino.
Já em Isaías, (7:14), temos a profecia de que ele seria um ser humano, não um anjo.
Ele viria de Israel, da tribo de Judá e nasceria em Belém (Gênesis, 49:10; Miqueias,
5:2). Este Filho haveria de ser Deus (Salmo 110.1).

Kendall (2008) afirma que muitas das profecias do Antigo Testamento,


acerca da vinda do Messias, é de natureza cifrada (que oculta a mensagem de
natureza enigmática). Por exemplo, poucas dessas profecias foram com clareza
literal: não nos foi dito os nomes de Maria ou José com antecedência. Somente
pôde ser entendida em retrospectiva, após seu cumprimento. Belém é definido
como o lugar de nascimento; mas ninguém era capaz de ver antecipadamente
como isso aconteceria.

Por que as profecias do Antigo Testamento foram dadas de forma cifrada?


Kendall (2008) responde que é porque Deus-Vida preserva algumas surpresas
para seu povo, para o desfecho derradeiro. Isto mantém humildes todos os
intérpretes das profecias, ou seja, Deus não deixaria para nenhum “especialista” a
última palavra sobre como, quando, quem, onde e por que as coisas aconteceriam.

2.2 JESUS JÁ EXISTIA ANTES DE TODAS AS COISAS


Antes de todas as coisas, inclusive antes de o tempo ter início, Jesus já
existia. Vejamos: “Ele é antes de todas as coisas, e nele tudo subsiste” (Colossenses,
1:17). “O Filho é o resplendor da glória de Deus e a expressão exata do seu ser,
sustentando todas as coisas por sua palavra poderosa. Depois de ter realizado
a purificação dos pecados, ele se assentou à direita da Majestade nas alturas”
(Hebreus, 1:3).

O texto bíblico de João (1:1-5) descreve o “Verbo” divino na perspectiva


da Eternidade, ou seja:

a) “No princípio era aquele que é a Palavra” (v.1) – fala do estado preexistente
de Jesus Cristo e expressa sua relação dinâmica com o Pai, pois “Ele estava
com Deus, e era Deus”. Observe que a Bíblia não está enfatizando apenas a
preexistência do Verbo, mas a natureza e igualdade d’Ele com o Pai, mesmo
sendo distinto do Pai.

14
TÓPICO 2 | A DOUTRINA DA ENCARNAÇÃO DE CRISTO

Este versículo também ensina claramente sobre a doutrina da Santíssima


Trindade. O Filho sempre existiu, juntamente com o Pai e Deus Espírito Santo.

Entre os seres humanos, a noção de gerado e de gerador implica


em noção cronológica, pois temporalmente um pai precede o Filho.
Todavia, não é assim com o mistério da paternidade eterna. A
distinção é apenas lógica. O Pai não pode, em sentido algum, preceder
o Filho, pois a noção de eternidade elimina qualquer noção temporal; a
eternidade é aquilo que faz contraste com o que é temporal. A relação
do Pai com o Filho é simultânea. É uma tolice e, ao mesmo tempo,
uma impossibilidade falar das coisas eternas de modo compreensível
a nós. Os termos Pai e Filho, usados na Escritura e na teologia cristã,
devem sugerir coigualdade em natureza e, além disso, com conotação
de eternidade (CAMPOS, 2008, p. 295).

Observe que o versículo 2 é o resumo do versículo 1: “Ele estava com Deus


no princípio”.

b) “Todas as coisas foram feitas por intermédio dele” (v.3) – apresenta a


atividade divina de Jesus à parte da relação com a divindade. Jesus não é uma
mera criatura, Ele é Criador. Jesus não é parte da criação, transcende-a. Jesus é
o Criador de todas as coisas (Hebreus 1.1-2).

c) “Nele estava a vida...” (v.4-5) – estes versículos falam de várias coisas:

● A Palavra divina, como Deus Pai, tem vida em si mesmo, vida incriada (ou seja,
é a fonte da vida eterna).
● Esta vida revelou a pessoa e a natureza de Deus para todas as pessoas. ‘Luz’,
neste ponto, pertence à revelação autorizada e autêntica de Deus.

3 ENTENDENDO A ENCARNAÇÃO DE JESUS CRISTO


O Verbo divino tornou-se em tudo semelhante a nós, exceto quanto à
natureza pecaminosa. A palavra “encarnação” não aparece nas Escrituras, mas
seus componentes, sim (“em” e “carne”, João, 1:14; 1 João, 4:2).

3.1 O AUTOESVAZIAMENTO DO FILHO DE DEUS


No que consistiu o autoesvaziamento do Verbo divino? O termo
“esvaziamento” (do grego ekenosen) trata da autorrenúncia de Jesus ao assumir a
natureza humana, sendo Deus, sem deixar de ser Deus. (Filipenses, 2:5-8).

Convém ressaltar que este “esvaziamento”, não é de sua divindade, mas de


sua glória, visto que Jesus deixou o Céu, despojando-se de sua própria majestade.
Seu autodespojamento aconteceu por vontade própria. Foi uma limitação de
si mesmo para um propósito. Portanto, a teoria de que Jesus renunciou a sua

15
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

divindade quando se encarnou, isto é, deixou de ser Deus, é contrária ao ensino


das Escrituras Sagradas, pois, ao se autoesvaziar, Jesus estaria renunciando sua
natureza divina, tendo Nele unicamente uma pessoa humana. Não é isto que a
Bíblia ensina.

A encarnação de Cristo é um grande mistério oculto aos humanos (1


Timóteo, 3:16; Romanos, 9:20), que sua mente frágil e limitada é incapaz de
encontrar a linha divisória entre divindade e humanidade do Filho de Deus. O
teólogo Kierkegaard (1813-1875) defendeu a irracionalidade da encarnação, mas
disse que devemos acreditar nela, apesar disso.

NOTA

SOREN KIERKEGAARD – filósofo e teólogo existencialista, que exerceu


poderosa influência sobre o existencialista e a teologia neo-ortodoxa do século 20. É um
dos autores mais discutidos e citados.

As implicações da encarnação de Jesus Cristo foram:

a) Jesus Cristo submeteu-se às leis naturais, quanto à sua concepção e nascimento.

b) O autoesvaziamento de Cristo acomodou-se às leis de crescimento, não apenas


corporal, mas também mental (Lucas, 2:52).

c) Na encarnação, Jesus Cristo tornou-se obediente e sujeito ao Espírito Santo


quanto a seus conhecimentos, ensinamentos etc. Esta é a razão porque vivia
numa estreita comunhão com o Pai.

d) O autoesvaziamento maior consistiu em ter que arcar com os pecados de toda


a raça humana, vindo a sofrer e morrer na cruz.

3.2 A CONCEPÇÃO VIRGINAL DO FILHO DE DEUS


A concepção virginal de Jesus foi um evento sobrenatural. Convém
ressaltar que não houve nascimento virginal, como pensam alguns, mas concepção
virginal. Conforme foi profetizado por Isaías (7:14) e ratificado em Lucas (1:35),
o que se deu foi o mistério da concepção virginal do Filho de Deus, operada pelo
Espírito Santo. Porém, Jesus nasceu naturalmente. Maria sentiu dores como as
demais mulheres ao dar à luz um filho.

16
TÓPICO 2 | A DOUTRINA DA ENCARNAÇÃO DE CRISTO

À luz de Lucas (1:35), a operação sobrenatural do Espírito Santo, na


concepção de Jesus, foi tão poderosa e santificadora em seu efeito, que não houve
transmissão de pecado ou culpa de Maria para Jesus.

A vinda do Espírito Santo sobre Maria também lembra o relato da


criação. Assim como Adão foi criado sem pecado, o segundo Adão,
Jesus Cristo, também foi gerado pelo Espírito Santo, sem pecado,
marcando assim o surgimento da nova criação. Podemos acrescentar
que o nascimento virginal é uma prova da singularidade de Jesus,
sendo uma evidência do poder e da soberania de Deus sobre a
natureza” (ERICKSON, 1997, p. 294-295).

Vejamos um esboço simples (RYRIE, 2004, p. 280-281) sobre os propósitos


da encarnação de Jesus Cristo:

● revelar Deus a nós (João, 1:18);


● dar um exemplo de vida (1 Pedro, 2:21);
● prover um sacrifício efetivo pelo pecado (Hebreus, 10:1-10);
● cumprir a aliança davídica (Lucas, 1:31-33);
● destruir as obras do diabo (1 João, 3:8);
● ser um sumo sacerdote misericordioso (Hebreus, 4:14-16);
● ser um juiz qualificado (João, 5:22-27).

LEITURA COMPLEMENTAR

O PRIMOGÊNITO DE TODA A CRIAÇÃO


Esequias Soares

O Senhor Jesus é chamado, ainda, de primogênito: “o qual é a imagem do


Deus invisível, o primogênito de toda a criação” (Colossenses, 1:16). Esse, porém,
é um dos versículos prediletos das testemunhas de Jeová, pois elas acreditam
que essa passagem bíblica apoia a sua teologia, pois afirmam que Jesus não pode
ser Deus porque é chamado na Bíblia de “primogênito da criação”, sendo assim,
seria criatura, e não eterno. Esse pensamento está baseado numa interpretação
errada. O texto diz que Jesus é o primogênito de Deus.

O termo “primogênito” aparece com o sentido de destaque, por exemplo:


Davi é o filho mais novo de Jessé (1 Sm 16:11), entretanto, é chamado de
“primogênito”, como afirma o salmo 89:27: ‘’Também por isso lhe darei o lugar
de primogênito: fá-lo-ei mais elevado do que os reis da Terra”. Esse primogênito
não quer dizer o mais velho ou o primeiro numa série, mas uma posição de
destaque, uma preeminência, uma posição de certa primazia. Significa domínio.
Sabemos que o povo de Israel não foi o primeiro povo da Terra. Antes mesmo de
Abraão, já existiam os sumérios, os acádios, os amorreus . Nos dias de Abraão,
havia os egípcios, os cananeus, os heteus e muitos outros povos. O povo de Israel,
no entanto, é chamado de primogênito em Êxodo, 4:22: ‘’Assim diz o Senhor:
Israel é meu filho, meu primogênito“. Da mesma forma acontece com Efraim,

17
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

embora fosse filho mais novo de José, nascido no Egito (Gn 48:18,19), é chamado
de primogênito . A Bíblia declara: ‘’[...] porque sou um pai para Israel, e Efraim é
o meu primogênito “ (Jr 31:9).

Esse conceito está presente, também, no Novo Testamento e pode ainda


ser visto com relação à Igreja, cujos membros são chamados de primogênitos,
em Hebreus 12:23, que diz: ‘‘à universal assembleia e Igreja dos primogênitos,
que estão inscritos nos céus’’. Agora, procure o leitor, aqui, dar o sentido de “o
mais velho” ou “o primeiro de uma série” ao vocábulo “primogênito”, e veja
o absurdo. Substitua a expressão “primogênito” por “mais velho” em Hebreus
12:23 e veja o absurdo. A Igreja de Jesus Cristo é formada de primogênitos,
afirma essa passagem. Qual, pois, é o sentido dessa palavra? Esaú jogou fora seu
direito de primogenitura (Hb 12:16,17), nós, como membros do corpo de Cristo,
desfrutamos os privilégios de primogênito, isso fala de posição, excelência, e não
de idade. Devemos, portanto, guardar essas prerrogativas para não as jogarmos
fora (Ap 3:11).

FONTE: SOARES, Esequias. Cristologia: a doutrina de Jesus Cristo. São Paulo: Hagnos, 2008. p.
38-39.

DICAS

Leia o livro: PIPER, John; TAYLOR, Justin. A Supremacia de Cristo em um


Mundo Pós-Moderno. Rio de Janeiro: CPAD, 2007. Em nosso mundo pós-moderno, no
qual a Pessoa de Jesus vem sendo duramente atacada no tocante à sua deidade, realidade e
ofício, os autores nos auxiliam, pois discutem os temas relacionados à supremacia de Cristo.

18
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico você viu que:

 Quando Cristo se encarnou e habitou entre nós (João, 1:14), Ele se tornou carne,
sentimento, desejo e afeto. Vejamos, no quadro a seguir, as duas naturezas de
Jesus, facilitando o resumo deste tópico.

QUADRO 1 – NATUREZA DIVINA E HUMANA DE JESUS

De acordo com a sua natureza De acordo com a sua natureza


Divina, o Redentor era: Humana, o Redentor era:
Infinito Finito
Independente Dependente
Imutável Mutável
Não sujeito ao espaço Sujeito ao espaço
Não sujeito ao tempo Sujeito ao tempo
Não passível de tentação Passivo de tentação
Todo-poderoso Todo-fraqueza
De conhecimento ilimitado De conhecimento limitado
FONTE: Heber Campos (2004, p.120-121)

 O professor Vedoato (2002, p. 34) afirma: “[...] no personagem histórico


Jesus de Nazaré, como homem-Deus na Palestina do primeiro século, viveu
plenamente um caminho de humanização, de maturação e crescimento rumo à
sabedoria”. “Jesus ia crescendo em sabedoria, estatura e graça diante de Deus
e dos homens” (Lucas, 2:52).

19
AUTOATIVIDADE

1 Complete as lacunas da seguinte frase:



O termo logos, como título cristológico, designa que Jesus Cristo é
_______________ e _________________________ .

2 Qual a diferença entre “concepção virginal” de Jesus Cristo e nascimento


virginal?

3 Cite três propósitos da encarnação de Jesus Cristo.

20
UNIDADE 1
TÓPICO 3

A VERDADEIRA IDENTIDADE DA
PERSONALIDADE DE JESUS CRISTO

1 INTRODUÇÃO
Qualquer tratado sobre a Pessoa do Cristo encarnado precisa levar em
conta o tríplice ministério de Jesus, como o único mediador entre Deus e os
homens:

● Profeta
● Sacerdote
● Rei

Como não pretendemos detalhar a vida terrena de Jesus (nascimento,


batismo, ensinos, milagres etc.) neste Caderno, vamos apenas expor seu tríplice
ofício.

a) Jesus Cristo como Profeta: No Antigo Testamento, os profetas eram


homens que falavam com autoridade. O termo “profeta” origina-se de uma
palavra grega que significa “o que fala por outro”. Não necessariamente alguém
que faz predições. Uma palavra que define bem o ministério profético é “porta-
voz”.

Jesus, como profeta, foi o maior de todos. A grande obra de Jesus,


como profeta, era manifestar Deus aos homens. Os contemporâneos de Jesus
reconheciam suas credenciais de profeta (João, 7:46). Contudo, Jesus não se
limitou à pregação, ele também revelou o futuro.

b) Jesus Cristo como Sacerdote: No Antigo Testamento, o sacerdote era


alguém nomeado por Deus para funcionar como mediador. Diante de Deus,
o sacerdote era como um advogado dos homens ou representante oficial. Ele
intercedia pelo povo diante de Deus.

Porém, pela cruz, Jesus tornou-se nosso único Mediador (2 Timóteo 2:5).
Ele aboliu para sempre a necessidade do sacerdote e do sacrifício (oficiante e
vítima) para efetuar a aproximação do homem a Deus (Hebreus, 9:21-22).

c) Jesus Cristo como Rei: O ofício real de Jesus aparece na Bíblia de várias
maneiras. Por exemplo, no Novo Testamento, como Rei, Jesus inaugura o Reino
de Deus (Lucas, 17:21), e após a ressurreição Ele ressaltou Sua realeza ao afirmar:
“Foi-me dada toda autoridade nos céus e na Terra” (Mateus, 28:18).

21
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

Como herdeiro do trono de Davi, Jesus assumirá o governo do mundo


durante o Milênio, levando as nações remanescentes à obediência (Isaías, 11:1-10;
Apocalipse, 19:16).

2 A HUMANIDADE DE JESUS CRISTO E SUA IMPECABILIDADE


É de suma importância destacar que o pecado não entrou no relacionamento
entre a natureza divina e humana de Jesus. Tratando sobre a humanidade de Jesus
Cristo, Ferreira (2007), desenvolveu três fortes argumentos sobre a humanidade
do Filho de Deus:

a) Em primeiro lugar, se Jesus não tivesse assumido uma real humanidade,


não poderia haver salvação. A validade e a aplicação da obra realizada na
cruz dependem da realidade de sua humanidade, assim como a sua eficácia
depende da genuinidade da sua divindade.

b) Em segundo lugar, se Jesus não fosse um ser humano real, não poderia
realizar o tipo de intercessão que o sacerdote deve fazer em favor daqueles
que ele representa (Hebreus, 2:17).

c) Em terceiro lugar, se Jesus era humano, tendo sido tentado como os homens,
então Ele pode compreender e ajudar os homens em suas lutas (Hebreus,
2:18; 4:15-16).

A Bíblia, especialmente os quatro evangelhos, descreve de forma clara


e inequívoca a humanidade de Jesus. Ele está inserido numa lista genealógica
humana (Mateus, 1:1-16). Ele nasceu e se desenvolveu dentro dos padrões
normais da vida humana (Lucas, 2:7 e 40-52).

2.1 SUAS LIMITAÇÕES


Como qualquer humano, Jesus estava sujeito às limitações físicas, como
cansaço, fome, sede etc. (João, 4:6; Mateus, 11:19; 21:18). Bem como, também,
enfrentou todas as questões de ordem emocional dos humanos: alegria, tristeza,
amor, compaixão etc. (Lucas, 10:21; Mateus, 26:37; João, 11:5; Mateus, 9:36).

O professor Aguiar (1999) assegura que, embora Cristo fosse


incomparavelmente superior aos homens no seu conhecimento (João, 1:47; 4:29;
Lucas, 6:8; 9:47) e compreendesse a Escritura do Antigo Testamento de maneira
singular (Mateus, 22:29; 26:54 e 56), contudo, Ele mostra um conhecimento de
alguma forma limitado (Marcos, 5:30ss; 6:38; 9:21; Lucas, 2:46). Esta circunstância,
de ter seu conhecimento limitado, evidencia sua natureza humana.

22
TÓPICO 3 | A VERDADEIRA IDENTIDADE DA PERSONALIDADE DE JESUS CRISTO

2.2 AS TENTAÇÕES
Em Hebreus (4:15), Jesus Cristo foi tentado em todas as coisas como
qualquer mortal, mas nunca pecou. Isto indica que Jesus tinha a mesma natureza
que nós. Todavia, estava livre da depravação moral (natureza corrompida)
provocada pela queda.

Há uma pergunta que não quer calar: qual era a natureza das tentações de
Jesus? Certamente que as tentações de Jesus foram um apelo às suas necessidades
físicas, como a fome e o desejo legítimo de assumir seu Reino. Nesta perspectiva,
concordo com Bonhoeffer (apud FERREIRA, 2007), quando diz que as tentações de
Cristo foram intensamente reais. Elas apelaram à preservação de sua humanidade,
à busca de um sinal de poder de Deus e à preservação de seu senhorio – fora do
plano de Deus e sem confiar em Deus. A intenção do diabo era dirigir a lealdade
e a adoração de Jesus para si, em lugar do Pai (Mateus, 4:1-11).

3 A SUBLIMIDADE DA PERSONALIDADE DE JESUS


Quando a Bíblia diz que “[...] a Palavra tornou-se carne e viveu entre nós.
Vimos a sua glória [...]” (João, 1:14), mostra que a natureza humana de Jesus foi
plena e completa. Jesus tinha um corpo, podia ser visto, ouvido e tocado.

Isto significa que a compreensão do desenvolvimento intrínseco da


Cristologia, enquanto explicitação e aprofundamento da realidade de Jesus
como caminho que leva ao Pai, implica entender que Cristo era verdadeiramente
homem e verdadeiramente Deus.

Um homem que fosse somente um homem e dissesse as coisas que


Jesus disse não seria um grande mestre da moral. Seria um lunático
– do mesmo grau de alguém que pretendesse ser um ovo cozido – ou
então o diabo em pessoa. Faça a sua escolha. Ou esse homem era, e é,
o Filho de Deus, ou não passa de um louco ou coisa pior. Você pode
querer calá-lo por ser um louco, pode cuspir nele e matá-lo como a
um demônio; ou pode prosternar-se a seus pés e chamá-lo de Senhor
e Deus. Mas ninguém venha com paternal condescendência, dizer
que ele não passava de um grande mestre humano. Ele não nos deixa
essa opção, e não quis deixá-la. [...] Ora, parece-me óbvio que ele não
era nem um lunático nem um demônio; consequentemente, por mais
estranho, assustador ou insólito que pareça, tenho de deixar a ideia de
que ele era e é Deus. Deus chegou sob a forma humana no território
ocupado pelo inimigo (LEWIS, 2005, p. 69-71).

Deus revelou-se de forma gradativa e progressiva aos homens ao longo


da história. E, nesse processo, em especial no período do Antigo Testamento, Ele
falou e se manifestou de variadas maneiras, dentre as quais preferiu, na maioria
das vezes, comunicar-se através da palavra profética ou do ministério de anjos
(Hebreus, 1:1). Porém, o escritor aos Hebreus deixa bem claro, ao se referir a
Jesus, que Ele não se tratava de mais um profeta ou anjo vindo de Deus, mas do
Filho unigênito de Deus, Criador, Redentor e Senhor do Universo.

23
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

O texto de Hebreus (1:1-12) fala da verdadeira identidade da personalidade


de Jesus Cristo. Ao estudarmos essa passagem, em especial os versículos 2 e 3,
temos a revelação, primeiramente, que a missão terrena de Jesus Cristo foi a de
revelar a Pessoa de Deus. Porém, o autor vai um pouco mais longe, ao designar a
Jesus Cristo atributos somente destinados à divindade:

● Criador (v.2)

● Sustentador e Redentor dos homens (v.3)

● Deus (v.8)

● Imutável (v.12)

Portanto, tudo o que Deus é pode ser encontrado na Pessoa maravilhosa


de Jesus Cristo, pois Ele é a perfeita, plena e exata imagem da divindade. A
Bíblia apresenta essa verdade, afirmando que o “Verbo era Deus” (João, 1:1),
Jesus Cristo “é” sempre Deus. Entretanto, atenção: essa imagem não se refere à
aparência física, pois nem ao menos sabemos qual foi a aparência de Jesus em sua
encarnação. Porém, ela trata, basicamente, da natureza e do caráter de Deus, sua
bondade (Atos, 10:38); seu amor (João, 3:16;Rm 5:8) e seu cuidado (Mt 6:25-34).

Ao lermos os quatro Evangelhos, podemos ver que a razão principal


da hostilidade dos judeus com Jesus se deveu ao fato d’Ele se declarar Deus
ou se igualar à divindade (João, 5:18;10:33). Embora a verdade da divindade
de Jesus esteja explícita nos Evangelhos, é verdade também que os Evangelhos
O descrevem como um homem normal, que desfrutou de relações familiares,
esteve frequentemente em círculos de amigos e parentes, sentiu cansaço, sede e
fome e, na cruz, demonstrou a mais profunda preocupação filial com sua mãe;
experimentou a emoção humana da tristeza, chorou ante a sepultura de um amigo
que morrera (João, 11:35); foi tanto homem como Deus, numa nova experiência
em relação aos homens.

Por que razão o Filho precisou se manifestar em forma humana?


(Colossenses, 1:19-22; Hebreus, 2:5-18). A resposta é tão simples quanto profunda:
porque somente assim Ele podia ser o portador da vida aos homens, através de
seu sacrifício vicário. Embora não se possa absolver os que O julgaram como
malfeitor, a ponto de condená-lo à morte, é preciso lembrar que Jesus estava
cônscio que precisava morrer para que assim pudéssemos ter vida por meio d’Ele
(João, 1:39;10:10;17:18).

Deus fez-se homem em Cristo, a fim de poder resolver o problema maior


do homem: o pecado. Daí a razão da encarnação. (Hebreus, 2:9-10 e Colossenses,
1:19-22). Jesus tornou--se parte da obra criada, a fim de pagar a pena do pecado
resultante da desobediência do primeiro casal. Somente pelo Seu sacrifício
perfeito foi possível satisfazer a justiça de Deus quanto ao pecado e, ao mesmo
tempo, providenciar a restauração do homem e a comunhão perdida no Éden.

24
TÓPICO 3 | A VERDADEIRA IDENTIDADE DA PERSONALIDADE DE JESUS CRISTO

No texto de Hebreus (2:14-17), encontramos três palavras-chave que


expressam o maravilhoso plano de salvação de Deus em Cristo Jesus. São elas:

a) “derrotasse” (v.14). Esse verbo declara que, pela morte de Jesus, os grilhões do
pecado e da morte foram definitivamente quebrados.

b) “libertasse” (v.5). Aqui está em evidência a consequência imediata do sacrifício


de Cristo: Agora, porém, já não existe nenhuma condenação para aqueles que
estão em Jesus Cristo (Rm 8:1).

c) ‘‘propiciação” (v.17). Este termo teológico trata do perdão consumado em favor


de quem precisava, embora não tivesse meios em si para alcançá-lo. Através de
Cristo, Deus tornou- -se “propício” a nós. E, em consequência da experiência da
tentação (ou a “provação”) severa pela qual passou, Ele agora pode nos socorrer
em nossas próprias lutas cotidianas pela fé.

25
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

LEITURA COMPLEMENTAR

O EXEMPLO DE UMA VIDA SANTA


Alister MacGrath

O Iluminismo levantou uma série de desafios para a Cristologia [...]. Um


desses desafios era a noção de Jesus Cristo como um ser humano diferente dos
demais. Se Jesus Cristo era diferente dos demais seres humanos, esta era uma
questão apenas relacionada à proporção com que ele possuía certas qualidades
– qualidades que eram, em princípio, capazes de ser imitadas ou possuídas por
qualquer pessoa. O particular significado de Cristo reside em Ele ser um exemplo
de uma vida santa, isto é, que reflete a vontade divina para a humanidade.

Esta perspectiva pode ser vista como um aspecto da Cristologia da Escola


de Antioquia, que se interessava especialmente em apresentar os aspectos morais
do caráter de Cristo. Para uma série de escritores de Antioquia, a divindade
de Cristo serve para dar autoridades e peso a seu exemplo moral como pessoa
humana. É também um importante aspecto da Cristologia do escritor medieval
Pedro Abelardo, que estava preocupado em enfatizar o impacto subjetivo de Cristo
sobre os cristãos. Entretanto, todos os escritores mantiveram a concepção clássica
das “duas naturezas” de Cristo. Com o Iluminismo, a afirmação da divindade de
Cristo se tornou cada vez mais problemática. Duas principais abordagens vieram
a ser desenvolvidas.

O Iluminismo testemunhou o desenvolvimento de Cristologia escalonada


que situava o significado de Jesus Cristo em seu exemplo moral como pessoa
humana. Em sua vida, Cristo foi um admirável mestre, cujos ensinamentos eram
determinantes, não em função de sua identidade, mas devido ao fato de refletir os
valores morais do Iluminismo. Em sua morte, ele forneceu um exemplo de amor
sacrificial que o Iluminismo considerava como fundamental, de acordo com a ética
e a moralidade. Se podemos falar de Jesus Cristo como “divino”, é no sentido de
que Ele incorpora ou exemplifica o tipo de vida que deveria caracterizar a pessoa
que mantém um correto relacionamento moral com Deus, com os outros seres
humanos e com o mundo de maneira geral.

O protestantismo liberal situou seu foco na vida espiritual de Jesus Cristo,


ou em sua “personalidade religiosa”, como de importância decisiva. Em Jesus
Cristo, o apropriado relacionamento interior ou espiritual do cristão com Deus
pode ser facilmente discernido. É a “vida espiritual de Jesus”, que é tida como de
importância decisiva para a fé cristã. A “personalidade religiosa de Jesus” é vista
como alguma coisa atrativa, capaz de ser assimilada pelos cristãos, a qual, até
agora, não tem paralelo na história religiosa e cultural da humanidade [...].

26
TÓPICO 3 | A VERDADEIRA IDENTIDADE DA PERSONALIDADE DE JESUS CRISTO

É a “impressão de Jesus”, a qual o cristão recebe dos evangelhos, que é


de fundamental importância. Ela dá origem a uma certeza pessoal da fé, que é
fundamentada em uma experiência interior. “Assim, nessa experiência, surge em
nosso coração a certeza de que o próprio Deus se volta para nós”.

FONTE: MACGRATH, Alister. Teologia Sistemática, Histórica e Filosófica. São Paulo: Shedd, 2005.
p.424-425.

27
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você viu que:

 A Pessoa de Jesus Cristo, como nosso Salvador e Senhor, tornou-se nosso


intercessor e advogado (Hebreus, 7:25; 1 João, 2:1). Por mais santo que tenha
sido o cristão na Terra, ou qualquer dos anjos, ninguém pode fazer esse
trabalho, a não ser Jesus, por sua divindade.

 Ele voltará para os Seus (João, 14:18). As limitações da encarnação aceitas por
Jesus foram desfeitas após a ressurreição e ascensão aos céus, quando então
Ele reassumiu a posição anterior de glória. E a Sua volta se fará com a mesma
glória que sempre teve desde a eternidade (João, 17:5).

 Jesus Cristo recompensará o cristão fiel (Apocalipse, 2:10; 22:12). A Bíblia


denomina esse acontecimento como o “tribunal de Cristo”, em que todos os
salvos receberão a recompensa pela vitória da caminhada de fé (2 Corintios,
5:10).

 O sentimento que deveria existir no mais profundo de nosso ser é o de amor


intenso por Aquele que nos amou e a Si mesmo se entregou por nós, Jesus
Cristo (Galátas, 2:20).

28
AUTOATIVIDADE

1 Qual é o ministério tríplice de Jesus?

2 Como explicar a impecabilidade de Jesus?

3 Cite dois dos atributos da divindade de Cristo.

29
30
UNIDADE 1
TÓPICO 4

JESUS CRISTO COMO MODELO DE


VIDA
1 INTRODUÇÃO
Já se passaram mais de 2.000 anos e a figura intrigante de Jesus Cristo
continua em evidência. Hoje, há bilhões de seguidores de Jesus, das mais
diferentes correntes do Cristianismo, todos influenciados pela Sua personalidade
única e surpreendente.

Pesquisadores e escritores das mais diversas áreas (religião, ciências


sociais, liderança etc.) têm buscado, na trajetória humana de Jesus de Nazaré,
discernir sua personalidade e entender por que a Sua vida e seus ensinamentos
são tão determinantes.

2 A SINGULARIDADE DE JESUS CRISTO


O teólogo MacGrath (2005) afirma que o Cristianismo é singular entre
todas as religiões do mundo, porque a figura histórica de Jesus se constitui
no seu centro. Segundo MacGrath (2005), para o Evangelicalismo, Jesus
Cristo é de importância constitutiva e definitiva para o Cristianismo; retém
autoridade intrínseca, fundamentada e enfocada nele mesmo e em sua obra. Sua
autoridade não está baseada em considerações externas; fosse esse o caso, essas
considerações seriam elas mesmas fundamentais, em que a autoridade de Cristo
seria dependente da sua autoridade. No caso do Novo Testamento, a autoridade
máxima legitimadora para Jesus Cristo é o próprio Deus, vindicando e exaltando
Jesus pela ressurreição e, com isso, retrospectivamente, validando seu ministério.

NOTA

EVANGELICALISMO – trata-se de um movimento surgido nas últimas décadas


do século XX, cuja tônica é o retorno ao Evangelho como Jesus entregou aos seus apóstolos.
Este movimento prisma pela ortodoxia doutrinária.

31
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

A singularidade de Cristo foi explanada por MacGrath (2005, pp.32-44)


em cinco aspectos, resumidos a seguir:

a) A importância revelacional de Jesus Cristo. O retrato


neotestamentário de Cristo inclui elementos fortemente relacionais [...]. No
Novo Testamento, este “descerramento”, esse “mostrar” e “tornar conhecido”,
está enfocado na pessoa e na obra de Cristo. Para notar duas das declarações
mais fortes do Novo Testamento a esse respeito, a que é preciso dar seu peso
total em qualquer análise cristológica, Jesus Cristo é “o resplendor da glória
de Deus e a expressão exata de seu ser (Hebreus, 1:3) e “a imagem do Deus
invisível” (Colossenses, 1:15).

Para os cristãos, Jesus Cristo é a personificação e a autorrevelação de


Deus. No cerne da fé cristã, está uma pessoa viva, não um livro.

b) A importância soteriológica de Jesus Cristo. O Novo Testamento


afirma que a salvação só se torna possível por meio da morte e ressurreição
de Jesus Cristo [...], uma gama ampla de imagens soteriológicas é apresentada
dentro do Novo Testamento, para explicar o sentido da morte e ressurreição
de Cristo.

De longa data, a centralidade da cruz de Cristo é tema principal da


teologia e espiritualidade evangélica:

● A cruz é vista como a base exclusiva da salvação.

● A cruz é tratada como o ponto inicial da teologia autenticamente cristã.

● A cruz é vista como o centro de todo o pensamento cristão.

c) A importância mimética (exemplificadora) de Jesus Cristo. Jesus


Cristo não é somente a base da salvação; Ele encarna os contornos da vida
redimida. Cristo é o supremo exemplo de homem, que evidencia um estilo de
vida autenticamente humano, a quem supostamente somos capazes de imitar.

Pela fé, o cristão é conforme Cristo – ou, mais acertadamente, o


processo de conformação a Cristo tem seu início. As afirmações claras desse
– estabelecer a conformidade da estrutura da existência do crente a Jesus – já
estão claramente evidentes no Novo Testamento. Particularmente, nos escritos
paulinos, a participação em Cristo aponta para uma conformidade da existência
da pessoa dele. Pela fé, o cristão é apanhado em uma nova visão da vida, uma
nova estrutura de existência [...].

d) A importância doxológica (culto, adoração) de Jesus Cristo. Os hinos


cristológicos no Novo Testamento são uma indicação clara do grau de exaltação
atribuída ao Cristo ressurreto dentro das comunidades cristãs primitivas,
indicando que o senhorio de Cristo se tornara completamente integrado,

32
TÓPICO 4 | JESUS CRISTO COMO MODELO DE VIDA

tanto no culto como no pensamento das comunidades neotestamentárias [...].


A coerência do entendimento evangélico da importância de Cristo amplia
a maneira com que Ele é cultuado e adorado, assim como o modo por Ele é
entendido teologicamente.

e) A importância querigmática (proclamação) de Jesus Cristo. Há uma


natureza fortemente querigmática no Novo Testamento, no qual Cristo é visto
como alguém para ser proclamado e para quem uma resposta é esperada. O
conteúdo da proclamação cristã é Jesus Cristo (Gálatas, 1:16).

Em geral, o teor da pregação cristã primitiva pode ser assim resumido:


uma proclamação da morte, ressurreição e exaltação de Jesus, que levou a uma
avaliação de sua pessoa, tanto como Senhor quanto como Cristo, confrontando o
homem com a necessidade de perdão, e prometendo perdão dos pecados. Assim,
a dimensão querigmática do Novo Testamento enfoca Jesus como Senhor, Cristo
e Salvador.

3 O SENHORIO DE CRISTO E SUAS IMPLICAÇÕES PRÁTICAS


O tratado sobre Jesus, como modelo de vida, começa com o entendimento
sobre o senhorio de Cristo. “Senhor” é o nome mais elevado de Jesus Cristo. O
termo quer dizer “dono, proprietário, chefe” ou “amo”. Dentre os 119 títulos
dados a Jesus na Bíblia, os dois que mais se destacam são:

● Salvador – 17 vezes.
● Senhor – 470 vezes.

Portanto, pelo número de vezes que o nome “Senhor” aparece em relação


ao nome Salvador, o assunto do senhorio de Cristo deve ser de suma importância
para o cristão. Jesus tanto é Salvador porque é Senhor como é Senhor porque é
Salvador.

Para os cristãos primitivos, o senhorio de Cristo era uma questão de vida


ou morte. Afinal, César era quem dizia ser o Senhor, e eliminava a quantos dele
discordassem. Hoje, fala-se mais do “Salvador” do que no “Senhor” Jesus. Será
isso um reflexo de nossa intransigência em não aceitar o Seu senhorio em nossas
vidas? E você, acadêmico(a), como tem se posicionado quanto ao senhorio de
Cristo?

A verdade é que a afirmação bíblica continua tão válida hoje como o foi
nos tempos antigos: ”ninguém pode dizer Senhor Jesus senão pelo Espírito” (1
Coríntios, 12:3b), ou seja, ninguém pode confessar Jesus como tal se não tiver um
compromisso real com Ele. Façamos como os pregadores primitivos que primeiro
confessavam a Jesus como Senhor e depois como Salvador (Atos, 2:36; Romanos,
10:8-9; Tiago, 1:1; Judas, 1).

33
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

Só o senhorio de Cristo em nossas vidas pode glorificar realmente a Deus.


Jesus quer ser o nosso Senhor e não somente Salvador. Isso significa que Ele deve
ser o Senhor de nossos bens, nosso dinheiro, nosso emprego, família, ministério e
destino. Mas como isso é possível?

4 CHAMADO AO DISCIPULADO DE JESUS CRISTO


Seguir os passos de Jesus é o mais fascinante projeto de vida. Nesta
perspectiva, a nossa compreensão da profissão de fé cristã deve ser feita a
partir do exemplo de vida deixado por Jesus de Nazaré, que implica em nosso
compromisso de segui-lo e imitá-lo.

O conceito do seguimento de Jesus (discipulado) começa com o texto de


João (17:4), em que Jesus orou dizendo: “Eu te glorifiquei na Terra, consumando
a obra que me deste a fazer’’. Observe que isto foi antes da cruz, que ainda estava
por vir. Então, a que obra Ele se referia? Lendo o versículo 4 com o versículo 6,
descobrimos que esta obra era a do discipulado dos doze.

Isto explica que Jesus Cristo, em sua vida terrena, tinha duas obras para
realizar:

a) uma, por meio da sua morte = a cruz;

b) outra, por meio de sua vida = discipulado.

Portanto, quando Jesus bradou na cruz “está consumado” e rendeu


o Espírito (João, 19:30), Ele se referia ao sacrifício de sua morte. Porém, para
consumar a obra de Sua vida, Ele teve que andar por três anos com os doze
discípulos, discipulando-os. E este foi o principal trabalho da Sua vida, assim
como entregá-la pelos pecadores, foi a Sua morte.

Por que seguir a Jesus? Porque Ele é o modelo moral e ético. A Cristologia
como compreensão histórica culturalmente situada da comunidade crente em
Jesus, no decorrer da história, sempre teve esta compreensão.

A compreensão da figura de Jesus, descrita pelos evangelhos, deve ser


discernida a partir de sua historicidade (relacionalidade sociopolítica-econômica-
cultural e religiosa), que sempre aponta para o “Jesus histórico”, como opção
para se concretizar nosso caminhar com Deus. Tudo no Cristianismo histórico
tem a sua iluminação a partir da pessoa de Jesus Cristo, logo, o caminhar com
Deus significa, em primeira ordem, entrar no caminho de Jesus, para conhecê-lo
histórico e espiritualmente.

Este discipulado de Jesus implica em buscar conhecer e vivenciar o


conjunto de sua vida, palavras, atitudes, atos e o caminho da cruz.

34
TÓPICO 4 | JESUS CRISTO COMO MODELO DE VIDA

Foi o próprio Jesus quem declarou: “[...] Se alguém quiser acompanhar-


me, negue-se a si mesmo, tome a sua cruz e siga-me” (Marcos, 8:34).

Este é um chamado que só entra quem tem coragem de correr riscos, de


sair de seu casulo, de pensar a história pelo reverso da lógica imperante. Neste
caminho, só atinge a sabedoria quem “vê” o visível e o invisível, o real e o sonhado,
a injustiça e a justiça, o óbvio e o desejável, a certeza contra toda a desesperança
que um novo dia ainda vai renascer e as nossas exigências ganharão mais encanto
a partir desse mundo. (VEDOATO, 2002).

A convocação que Jesus faz aos que desejam seguir seus passos na trilha
do discipulado (Marcos, 8:34) implica em três requisitos básicos:

a) “Negue-se a si mesmo” – negar-se é tirar o EU do centro, esquecendo-


se de si mesmo, pelo grande privilégio de desfrutar da maravilhosa graça de
Deus. É por isso que o aperfeiçoamento cristão está relacionado à obediência e à
submissão a Jesus Cristo, como Senhor.

“Negar-se a si mesmo” é ver somente a Jesus. Não mais o EU, não mais a
minha vontade, não mais isto e aquilo, mas somente a Jesus.

b) “Tome a sua cruz” – O carregar a cruz significa que o “negar-se a si


mesmo” não acontece uma única vez. A vida do verdadeiro discípulo de Jesus é
um constante “negar-se”, pois a “cruz” serve justamente para manter nosso EGO
crucificado. Se o nosso “EU” não ficar na “cruz”, não há verdadeiro significado
na vida cristã. Tudo é ativismo e religiosidade.

Jesus é o nosso modelo. Ele não disse – “pegue sua cruz e vá adiante”
– o que Jesus disse foi: “pegue a sua cruz e siga-me”. Quando vemos Jesus
“carregando” sua própria cruz à nossa frente, nossas forças aumentam.

c) “Siga-me” – Este “siga-me” traz duas implicações: a primeira é a


imitação e a segunda é a obediência.

- Imitação. O alvo do “siga-me” é sermos semelhantes a Jesus, em Seu


caráter. O plano de Deus, para a redenção da humanidade, não se limita a salvar
o homem do pecado e da morte; vai mais além. O propósito divino é restabelecer
sua imagem em cada um de nós. É recriar em nós aquilo que está faltando para
contemplar a formação de nosso ser, conforme o propósito do Criador – que
conheçamos a Deus e revelemos sua Pessoa e presença em nosso viver, pela sua
plenitude em nós.

- Obediência. O verdadeiro discípulo faz exatamente o que o mestre


ordena. Qual é o lugar da fé em Jesus nisso tudo? A fé surge na obediência, pois
ninguém aceita a convocação do “siga-me” de Jesus, se não crê naquele que o
convoca.

35
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

Jesus foi categórico: “se alguém quiser acompanhar-me”. Foi um convite.


O Senhor Jesus continua convidando o discipulado.

Jesus Cristo é o maior de todos. Vale a pena segui-lo.Vejamos:

a) Todos os registros bíblicos da revelação de Deus, tanto do Antigo como


do Novo Testamento, devem ser interpretados a partir da Pessoa de Jesus Cristo.

b) Na Pessoa de Jesus, temos a Palavra encarnada na vida, pois “o Verbo


se fez carne e habitou entre nós”.

c) Jesus nos deixou o padrão de vida moral e ético para que sigamos suas
pisadas em nossa vida diária.

DICAS

Assista ao filme “O CORPO”, no qual se discute a influência do homem Jesus,


em todo mundo.

36
TÓPICO 4 | JESUS CRISTO COMO MODELO DE VIDA

LEITURA COMPLEMENTAR

O CRISTO COMO JESUS


Giovani Mariot Vedoato

Uma vez que nossa reflexão será pautada pelo caráter cristológico, cabe
logo de início a pergunta sobre o núcleo central de toda Cristologia, do que trata
sistematicamente o tratado da Cristologia. Ora, a Cristologia ou o tratado acerca
de Jesus Cristo trata de afirmar que Jesus não é outro senão o Cristo, palavra
grega equivalente a messias em hebraico: “Depois que Silas e Timóteo chegaram
da Macedônia, Paulo se dedicou exclusivamente à pregação, testemunhando aos
judeus que Jesus era o Cristo” (Atos, 18:5).

Essa profissão de fé primitiva e fundamental para a fé cristã está no centro


do Cristianismo, como pilastra-mestra na qual é edificada toda Cristologia, isto
porque ela sintetiza o conteúdo vital no qual organiza sistematicamente a fé
cristã e, ao mesmo tempo, pontualiza seus elementos fundantes, ou seja, afirmar
que Jesus é o Cristo, significa afirmar que a fé cristológica é uma profissão de fé
consciente em Jesus como o messias, enviado de Deus entre os homens.

Mas, como o subtítulo anunciou acima, dá para pensar de outra forma


cristológica? De pensar na importância do Cristo enquanto Jesus? Sim, pois sua
importância consiste no fato de afirmar que existe uma continuidade entre o
ressuscitado e crucificado, ou seja, o Jesus que viveu, andou e se alimentou, sofreu
calúnias, foi perseguido, condenado, crucificado e morto, num determinado
momento da história. Na ressurreição, não deixou de ser Aquele que viveu sua
historicidade no primeiro século da Palestina. Como ressuscitado, Ele não deixou
de ser Jesus de Nazaré, logo, o ressuscitado não foi outro senão aquele que foi
crucificado, conforme atesta Atos, 2:36: “Porquanto, todo o Israel fique certo disto:
este Jesus, a quem vocês crucificaram, Deus o fez Senhor e Cristo”.

Assim, se por um lado a Cristologia é a reflexão sistemática, organizada


em torno de Jesus Cristo como aquele que na periferia de Jerusalém – Belém –
nasceu, em Nazaré cresceu e aprendeu vários ofícios normais a qualquer judeu de
sua época e que, em Jerusalém, foi perseguido, condenado, morto e ressuscitado,
por outro lado, pensar o Cristo como Jesus significa pensá-lo enquanto histórico
[...].

Diante de tal inversão, de Jesus como o Cristo, para o Cristo enquanto


Jesus, pode surgir uma pergunta: “não corremos o risco de dicotomizar, separar
Jesus como o Cristo, ou dicotomizar o Cristo enquanto Jesus como uma espécie de
duas pessoas distintas?” Infelizmente isso já aconteceu e continua acontecendo.
Por um lado, é possível cair numa espécie de jesuologia (ver Jesus somente como
terreno); por outro lado, é possível valorizar somente a Cristologia como estudo
e fé na ressurreição (ver Jesus somente como ressuscitado). A segunda realidade
aparece muito de história ou mundo que são vistos somente como plataforma

37
UNIDADE 1 | DOUTRINA BÍBLICA DE CRISTO (CRISTOLOGIA)

do pecado. É comum ouvirmos decorrente dessas dicotomizações, ou operações


em torno do ressuscitado como aquele que foi crucificado, frases do tipo: “Agora
entreguei meu coração para Jesus, não quero saber mais das coisas do mundo”.
“Gosto mais do Cristo ressuscitado, do que aquele Cristo ensanguentado que
aparece em quadros”.

Na verdade, as divisões em torno da figura de Jesus Cristo que há muito


perfuram, em que alguns valorizam sua natureza humana e outros sua natureza
divina, foi até o motivo de um Concílio Ecumênico no século V de nossa Era.
Com o objetivo de solucionar os mal-entendidos sobre o evento Jesus Cristo, na
cidade de Calcedônia, no ano de 451, cerca de seiscentos bispos afirmaram que
o dogma sobre Jesus Cristo atesta que n’Ele existem duas naturezas, divina e
humana, ambas inteiras, distintas e unidas numa só pessoa, sem mistura nem
confusão, conservando cada qual suas propriedades mediante a união chamada
hipostática.

FONTE: VEDOATO, Giovani Mariot. Breve Tratado de Cristologia. Petrópolis: Vozes, 2002. p.35-
37.

NOTA

“HIPÓSTASE” – (do grego hypo, sob, debaixo + stasis, o que está, o suporte) –
significa natureza ou substância. Esta palavra foi utilizada para contrastar a natureza essencial
da divindade em relação aos seus atributos. Com frequência, é aplicada para mostrar a
distinção entre a natureza humana e divina do Senhor Jesus Cristo.

DICAS

SUGESTÕES DE LEITURA

1. ZACARIAS, Ravi. Por que Jesus é Diferente? São Paulo: Mundo Cristão, 2003.

2. PIPER, John. Um Homem Chamado Jesus Cristo. São Paulo: Vida, 2005.

3. HANCK, Osvaldo. Identidade de Jesus. Curitiba: A.D. Santos, 2008.

4. BRIGTH, Bill. Um Homem Sem Igual. São Paulo: Candeia, 2001.

38
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico vimos que:

 O nosso estudo da Cristologia não enfatizou quase nada dos três anos de
ministério público de Jesus (outro caderno terá esta incumbência). Então, em
resumo, e como pontos de um roteiro, observem uma visão panorâmica do
ministério terreno de Jesus.

 Após ser batizado por João Batista, Jesus iniciou seu ministério com a
preparação no deserto.

 O ministério teve início na região da Galileia, na qual se deu a convocação


dos doze discípulos, para enviá-los em missão específica de anunciação do
Evangelho do Reino.

 Jesus decidiu ir para Jerusalém para a sua última visita àquela cidade. No
caminho, Ele realizou algumas atividades na Pereia. Em seguida, fez sua
entrada triunfal em Jerusalém, onde foi aclamado rei.

 Depois disto, temos os registros dos acontecimentos no templo em Jerusalém,


seguindo-se a prisão, morte, ressurreição e ascensão.

39
AUTOATIVIDADE

1 Em sua vida terrena, Jesus tinha duas obras para realizar. Quais eram?

2 Quais são as três frases que resumem o convite de Jesus ao seu discipulado?

3 A expressão de Jesus “siga-me” traz duas implicações. Quais?

40
UNIDADE 2

DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM


(ANTROPOLOGIA)

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

A partir desta unidade, você será capaz de:

• definir a origem do homem, cuja criação foi o clímax da obra Divina;

• ponderar sobre a natureza do homem, na perspectiva tricotômica;

• explicar em que consiste a imagem de Deus no homem.

PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos, sendo que, no final de cada um
deles, você encontrará atividades que o(a) ajudarão a fixar os conhecimentos
adquiridos.

TÓPICO 1 – A ORIGEM DO HOMEM

TÓPICO 2 – A NATUREZA DO HOMEM

TÓPICO 3 – A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM

41
42
UNIDADE 2
TÓPICO 1

A ORIGEM DO HOMEM

1 INTRODUÇÃO
A Antropologia Teológica é a área da Teologia Sistemática que estuda, à
luz da Bíblia, a criação do homem, a imagem de Deus no homem, a constituição
da natureza e destino do homem. Há várias teorias acerca da origem do homem,
todas contrárias ao ensino ortodoxo da Bíblia. Porém, a partir de uma análise
detalhada dessas teorias, constata-se que não passam de especulações:

Filósofos e cientistas têm dado respostas das mais diversas para


a questão. Alguns veem o homem como um animal que pode ser
condicionado ou como uma máquina que age na maneira como foi
programada. Outros veem o homem como um ser sexual, controlado
por seu subconsciente, os instintos e os eventos da sua infância. Há os
que veem o homem como um ser político--econômico, cujo fator mais
importante é sua situação econômica, seu poder político. Ou ainda,
numa visão mais otimista, os que pensam no homem como ser livre
por natureza, bom, e com poder de controlar seu destino desde que
seja provido de um pouco mais de educação e tecnologia. (AGUIAR,
1999, p. 163).

A Bíblia Sagrada é a única fonte confiável e autorizada sobre a doutrina


do homem. No Salmo 8, versículo 4, o salmista faz uma pergunta atualíssima e
indispensável ao estudo da antropologia teológica:

“Que é o homem?”

Tornando essa pergunta pessoal, outra pergunta poderia ser feita: “Quem
sou eu?”

De todas as teorias acerca da natureza do homem, a meu ver, a mais


preocupante é a do Naturalismo.

43
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

Entre todos os naturalistas, a filosofia de Karl Marx é a que tem tido


maior impacto na vida das pessoas, especialmente no Ocidente. O
marxismo reduziu a natureza humana ao resultado dos embates de
forças econômicas e sociais, ao dizer especificamente que o modo
de produção econômica é o que determina a consciência do homem.
Segundo Marx, na sociedade capitalista, o proletariado é alienado de
seu trabalho, pois não detém a propriedade dos meios de produção,
mas é obrigado a vender sua mão de obra à burguesia. Além disso,
o proletariado é vítima de uma consciência falsa, que o engana, ao
aceitar ser explorado por uma burguesia rica, proprietária dos meios
de produção. E é justamente a religião, uma das ferramentas burguesas
que ajudam na opressão dos trabalhadores – o “ópio do povo”, aquilo
que permite sua passividade diante dessa exploração. (FERREIRA,
2007, p.387).

NOTA

NATURALISMO - (Do francês naturalisme) – Trata de uma teoria filosófica


(ateísta, materialista) sobre a existência única da natureza humana. Os naturalistas defendem
que a realidade última e suficiente se encontra exclusivamente no reino natural, descartando
por completo o espiritual, por julgá-lo contrário à razão.

O teólogo Ferreira (2007) assegura que, no século XX, o desenvolvimento


da ciência e de diversas tradições psicológicas e filosóficas, como, por exemplo,
o existencialismo, colocou a busca da solução no centro do palco. As pessoas
indagam: “Quem sou eu e qual é o significado da vida, especialmente da
minha vida pessoal?” Num mundo secularizado, as respostas são evasivas. Os
sociólogos acreditam que a alienação das pessoas se exacerbou com o estresse do
modernismo, presente na sociedade tecnológica dos últimos dois séculos.

Além do problema da crise de identidade pessoal, vivemos numa


época de controvérsia entre visões opostas a respeito de várias
questões morais e éticas importantes. Questões polêmicas como pena
de morte, aborto, a noção de guerra justa, a sexualidade e o casamento,
a natureza da família, entre tantas outras, não apenas assuntos de
discussão acadêmica, mas ponto de debate de política pública [...]. A
busca por um caminho para se tentar resolver essa divisão revela que,
no fundo desta discussão, existe uma completa discordância sobre
os conceitos básicos acerca da natureza do ser humano. (FERREIRA,
2007, p. 385).

Qual é a visão cristã do ser humano? Os dois primeiros capítulos de


Gênesis trazem os detalhes da criação do homem e da mulher. Deus, nos seis
primeiros dias da semana da criação, criou o Universo material e toda a vida
animal. Contudo, Sua vontade e Seu propósito não atingiram a plenitude nessa
etapa da Criação, sendo antes uma preparação para o ponto culminante da Sua
obra – a criação do homem. E assim, Seu último ato foi criar o homem à Sua
imagem e conforme Sua semelhança, para O servir e ter com Ele comunhão.
44
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO HOMEM

O homem foi a obra-prima do Criador (“a coroa da criação”) distinta


de todas as demais criaturas terrenas (Gênesis, 1:24-26). Isto significa que a sua
formação foi o clímax da obra Divina e que, por isso mesmo, tornou-se especial
dentro dela. Ao contrário do que pensam os evolucionistas, que dizem ser o
homem subproduto de um processo evolutivo, tendo seu início no hipotético Big
Bang, estendeu-se por milhões de anos, até que o homem aparecesse na Terra.

NOTA

BIG BANG (grande explosão) – é a teoria segundo a qual o Universo, em seu


estado inicial, formou-se a partir de uma grande explosão.

2 CRIAÇÃO OU EVOLUÇÃO: COMO TUDO COMEÇOU?


A seguir, apresentaremos os dois ensinos que se contrapõem ao explicar a
origem do homem, seu propósito e destino. Acompanhem!

2.1 A TEORIA EVOLUCIONISTA


Essa teoria afirma que o homem é fruto de um processo evolucionário, no
qual todas as formas de vida tiveram uma só origem e forma e que as espécies
superiores também vieram de espécies inferiores.

Segundo essa teoria, tudo surgiu do aparecimento inexplicável de uma


célula, na qual havia uma centelha de vida, da qual se originaram todas as coisas
vivas, desde os vegetais até o homem. Assim teriam surgido as diversas espécies,
que seguindo uma ascensão gradual e constante, desde as formas inferiores de
vida, prosseguiram até chegar às formas mais superiores (leia-se homem).

Os teólogos Pipper & Taylor (2007, p. 55), foram irônicos ao afirmar:

O teísmo cristão responde ao questionamento da natureza do homem,


vendo-o como uma criação especial feita à imagem de Deus (cf.
Gênesis, 1:26-28; 9:6). Em comparação, o humanismo secular pós-
moderno vê o homem como um organismo monocelular enfurecido
– um primata glorificado, que perdeu a maior parte de seus pelos e
ganhou polegares opositivos, um acidente cósmico sem pé nem cabeça.

O mínimo que se pode dizer, depois da análise do que foi escrito


anteriormente, é que essa teoria exige bem mais fé para ser criada do que o ensino
bíblico revelado (visão criacionista).

45
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

Afinal, ela não responde às questões mais simples, tais como: de onde veio
essa célula primária? Como pode ela se subdividir em tantas espécies, com tantas
formas de instintos básicos? Como explicar o instinto religioso básico relativo a
todo ser humano? E, até a mais simples: quem veio primeiro: o ovo ou a galinha?

Na verdade, diferente do que ocorre com o ensino das Escrituras Sagradas,


que mostra Jesus Cristo vindo ao mundo para unir o homem a Deus, a teoria
evolucionista procura unir o homem ao irracional. Porém, essa é apenas mais
uma das tentativas humanas para desacreditar a Bíblia e lançar o ser humano
num atoleiro de dúvidas. No entanto, apesar desse esforço, a Palavra de Deus
continua afirmando tanto a origem Divina do homem quanto a sua necessidade
de comunhão com Ele, como veremos no tópico a seguir.

2.2 O CRIACIONISMO
O relato da criação do homem está registrado em dois textos bíblicos
básicos (Gênesis, 1:26-27 e 2.7:21-23). Contudo, há inúmeras referências bíblicas
que confirmam que o homem foi criado por Deus.

Quanto às questões relativas à origem do homem, precisamos ser


fundamentados no ensino revelado na Bíblia, pois sempre estaremos nos
defrontando com os ensinos conflitantes com a Palavra de Deus. Daí a importância
do estudo da doutrina da Criação, pois a qualidade de vida cristã exige uma
formação espiritual ortodoxa.

NOTA

ORTODOXA – Ortodoxo (do grego ortho, direito + doxa, opinião). Portanto,


ortodoxia significa qualidade de uma declaração doutrinária que se acha de acordo com
o ensino (conjunto de doutrinas) revelado no Antigo e Novo Testamento (em oposição
à heresia). É o conjunto de doutrinas extraídas da Bíblia, e tidas como verdadeiras de
conformidade com credos, concílios e convenções da Igreja.

Então, ser ortodoxo implica se identificar de forma sistemática, com


crença e com a adoração da fé cristã, conforme o testemunho das Escrituras, dos
primeiros escritores cristãos, do ensino oficial, dos credos, concílios, convenções e
da liturgia da igreja (GRENZ, 2000). Uma destas doutrinas formuladas pelos pais
da igreja primitiva é a doutrina da criação do homem, a qual deve ser preservada.

46
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO HOMEM

A Bíblia ensina que o homem veio à existência por um ato criativo de


Deus. Neste ato criativo, conforme os relatos bíblicos, encontraremos certas
particularidades que fazem com que o homem se diferencie dos outros seres vivos
na sua origem. Essas particularidades da criação do homem foram brilhantemente
esboçadas pelo teólogo calvinista Berkhof (1990, p.182):

a) O homem foi criado por um solene conselho divino, realizado dentro


da Trindade: “Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança”
(Gênesis, 1:26).

b) O homem foi formado por um ato direto de Deus: “[...] o Senhor Deus
formou o homem do pó da Terra” (Gênesis, 2:7).

c) O homem foi formado segundo o tipo divino: “Criou Deus o homem à


sua imagem, à imagem de Deus o criou” (Gênesis, 1:27).

d) O homem foi formado de elementos material e imaterial: “pó da terra”,


“soprou em suas narinas” (Gênesis, 2:7).

e) O homem foi formado e colocado numa posição exaltada acima de toda


ordem criada (Gênesis, 1:28), para dominar a Terra (aspecto físico), exercitar a
capacidade de escolha entre o bem e o mal (aspecto moral) e ter comunhão com
Ele (aspecto espiritual). O homem estava apto para assim agir, não porque fosse
superior fisicamente, mas por causa de sua inteligência e capacidade de raciocínio.

f) O homem foi formado com livre arbítrio, ou liberdade de escolha;


com capacidade de decidir entre o bem e o mal, sendo, porém, responsável pelas
consequências de seus atos. Criado em perfeita habilitação racional, o homem
estava apto a realizar tarefas grandiosas como, por exemplo, nomear todas as
criaturas terrestres feitas por Deus (Gênesis, 2:19).

NOTA

LIVRE-ARBÍTRIO – é a capacidade que o ser humano possui de pensar ou agir,


tendo como única motivação a sua vontade. “Em linguagem filosófica, é o instituto moral e
ontológico que nos faculta escolher entre o bem e o mal. Através do livre-arbítrio, podemos
exercer um poder sem outro motivo que não a própria existência desse poder” (ANDRADE,
1998, p. 207).

3 A UNIDADE DA RAÇA HUMANA


A Bíblia ensina que a humanidade toda procede de um único tronco –
Adão, mas existem teorias humanas que procuram negar esta verdade.
47
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

3.1 TEORIAS QUE NEGAM A UNIDADE DA RAÇA


Berkhof (1990, 188-189) menciona algumas destas teorias, das quais
destaco apenas duas:

a) A teoria dos coadamitas, de Algassiz, presume que houve diferentes


centros de criação.

b) A teoria dos preadamitas, de Peyrerius, em 1655, partiu do pressuposto


de que havia homens antes de Adão ser criado.

Estas e outras teorias são apenas teorias. O que nos importa mesmo é o
que a Bíblia diz. E ela diz que o tipo de homem que nós conhecemos procede de
um mesmo tronco, Adão.

24
O Deus que fez o mundo e tudo o que nele há é o senhor dos céus e
da Terra, e não habita em santuário feito por mãos humanas. 25 Ele não
é servido por mãos de homens, como se necessitasse de algo, porque
ele mesmo dá a todos a vida, o fôlego e as demais coisas. 26 De um
só fez ele todos os povos, para que povoassem toda a Terra, tendo
determinado os tempos anteriormente estabelecidos e os lugares
exatos em que deveriam habitar. 27 Deus fez isso para que os homens
o buscassem e talvez, tateando, pudessem encontrá--lo, embora não
esteja longe de cada um de nós. 28 Pois nele vivemos, nos movemos e
existimos, como disseram alguns dos poetas de vocês: ‘Também somos
descendente dele’”. (Atos 17.24-28)

3.2 ARGUMENTOS A FAVOR DA UNIDADE DA RAÇA


HUMANA
Neste campo, a ciência tem contribuído muito com a posição bíblica da
unidade da raça. Segundo Aguiar (1999, p.176), os principais argumentos são:

a) O argumento da História. A História das migrações do homem tende


a mostrar que houve uma distribuição partindo de um único centro: a Ásia.

b) O argumento da Filologia. O estudo das línguas da humanidade


indica que houve um tronco comum. As línguas indo-europeias têm em suas
raízes um idioma primitivo comum. Também há prova de que o antigo idioma
egípcio é o elo de ligação entre a língua indo-europeia e a semita.

c) O argumento da Psicologia. A Psicologia revela claramente que as


almas dos homens são idênticas. Eles têm em comum os mesmos apetites,
instintos e paixões, as mesmas tendências e capacidades, as mesmas qualidades
superiores, as características morais e mentais que pertencem exclusivamente
ao homem.

48
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO HOMEM

d) Argumentos das ciências naturais ou Fisiologia. A raça humana


constitui uma única espécie. Esta é a opinião comum dos especialistas em
Fisiologia comparada. Há pontos de conexão entre todos os indivíduos: sangue,
reprodução, características dentárias etc. As diferenças encontradas entre as
famílias da humanidade são consideradas apenas como variedades da mesma
espécie humana.

Portanto, a ciência apenas confirma o que a Bíblia afirma: todos os homens


vieram de um mesmo tronco – Adão.

49
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

LEITURA COMPLEMENTAR

QUESTÕES RELATIVAS À ORIGEM DO HOMEM


Zacarias Aguiar

A pessoa de Adão

Quem foi Adão? Quando e como foi criado? Estas são algumas das
perguntas que são levantadas em relação à origem do homem. Para estas
perguntas, não temos respostas finais, mas podemos fazer algumas considerações.

Adão deve ser visto como uma pessoa real, que viveu na história ou
apenas figura simbólica? A pergunta pode ser difícil, pela dificuldade que temos
de determinar o gênero da literatura nestes primeiros capítulos de Gênesis. Para
Emil Brunner (1889-1966), os capítulos 2 e 3 de Gênesis devem ser entendidos
como uma parábola, como a do filho pródigo, uma história que ilustra o que
acontece com toda pessoa. Neste caso, Gênesis 2 e 3 não é história, é uma espécie
de biografia de cada pessoa.

Entretanto, a interpretação de Emil Brunner não parece se harmonizar


com o uso que Paulo faz de Adão em Romanos, 5:12s e 1 Coríntios, 15:21-22.
Nestas passagens, o apóstolo contrasta Adão com Jesus Cristo, referindo a Adão
como “um só homem”, pelo qual o pecado e a morte entraram no mundo, e a
Jesus Cristo como “um só” pelo qual veio a graça e a vida eterna. Assim, Adão
é tratado como sendo uma pessoa tão real quanto Jesus Cristo. Não teria muito
sentido se Jesus fosse visto como o “segundo Adão” se o primeiro não foi pessoa
histórica. Portanto, embora o nome Adão, que significa homem, possa ter um
significado simbólico, o mais provável é que Adão existiu como pessoa histórica.

O tempo da criação

Qual é a idade do homem? A ciência debate-se com esta questão. Os


geólogos e antropólogos acharam os ossos do homem de Neandertal de 100 mil
anos atrás, e falam do homo sapiens que teria dado origem ao homem moderno,
há acerca de 30 mil anos. Outros ossos são muito mais antigos, como os do homo
faber e do homo erectus (estes de 250 mil anos). Porém, Gênesis 4 descreve uma
civilização de cerca de 10 mil anos atrás. Quando Adão foi criado? E em qual
sentido Adão foi o primeiro homem?

Uma possibilidade é que a descrição de Gênesis 4 tenha omitido algumas


gerações, e assim aquela civilização é mais antiga do que a soma daqueles anos.
Muito tempo pode ter se passado, com muitas gerações, entre Adão e Caim. O
mesmo pode ter acontecido com Adão no Jardim do Éden. Talvez o tempo de
Adão possa ser estendido até 30 mil anos atrás, e Caim e Abel dentro de 10 mil
anos. Mas isto se for necessário interpretar o relato bíblico à luz de qualquer
verdade cientificamente provada quanto à idade mais antiga do homem sobre a
Terra.
50
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO HOMEM

Outra posição, defendida por Kidner (1979, p. 25-29), é que Adão pode
ter sido criado há cerca de 10 mil anos atrás e representa um tipo de homem
diferente daquele mais primitivo e conhecido pela ciência. Os ossos que os
antropólogos acharam teriam pertencido a criaturas que não eram homens,
com as características como nós conhecemos e como a Bíblia nos apresenta. Os
antropólogos definem o homem em termos da habilidade de fazer instrumentos
(homo faber) ou alguma outra marca na sua civilização. A Bíblia define o homem
em termos de criaturas diferentes, feito à imagem e semelhança de Deus. Segundo
esta teoria, teria começado com Adão, e os vestígios descobertos pela ciência não
pertencem a esta categoria de homem.

A narrativa bíblica não impossibilita que o homem tivesse uma origem


num tempo mais remoto do que aquele de sua cronologia histórica. Também é
certo que o personagem Adão representa o tronco do qual o tipo de humanidade
que conhecemos procede.

FONTE: AGUIAR, Zacarias. Manual de Teologia Sistemática. Curitiba: A.D. Santos, 1999. p.167-
168.

51
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico você viu que:

 O homem é uma criação especial de Deus. Ele não é resultado evolutivo de


formas inferiores de vida da Terra.

 As teorias acerca da origem do homem não passam de especulações. A única


fonte realmente autorizada e verdadeira acerca da origem do homem é a Bíblia
Sagrada. O que passar disto é simples hipótese.

52
AUTOATIVIDADE

1 No que consiste o Naturalismo?

2 Quais são as duas perspectivas que se contrapõem ao se tratar da origem do


homem?

3 Quais dos argumentos a favor da unidade da raça você considera ser o mais
eficaz? Por quê?

53
54
UNIDADE 2 TÓPICO 2
A NATUREZA DO HOMEM

1 INTRODUÇÃO
Quando Deus criou o homem, Ele o fez associando a substância material
(“pó da terra”), para a formação do corpo, com o imaterial (“sopro divino”),
para a formação dos elementos espirituais. Assim, o homem é tanto físico quanto
espiritual.

2 TEORIAS SOBRE A CONSTITUIÇÃO DO HOMEM


O cristianismo inclui a crença tanto nos aspectos físicos quanto espirituais
da humanidade (corpo, alma/espírito). Contudo, como diz Olson (2000), muitos
cristãos confundem a crença no aspecto espiritual da humanidade com a crença do
tipo gnóstico da divindade interior. Também tendem, muitas vezes, a interpretar
desse modo a “imagem de Deus” (imago Dei) ou pensam nela como semelhança
física entre os seres humanos e Deus. Por isso, há basicamente três linhas de
pensamentos sobre a constituição do homem: a primeira ensina que o homem
é um só todo, uma só parte (unitarismo). A segunda defende que o homem é
constituído de apenas corpo e alma (dicotomista). A terceira entende que o ser
humano é constituído de corpo, alma e espírito (tricotomista).

2.1 A TEORIA UNITARISTA OU MONISMO


Esta corrente não acredita na existência da alma e do espírito, admitindo
que essas expressões se referem apenas a uma unidade psicofísica do ser humano.

As palavras “carne” no Antigo Testamento (hb. basar) e Novo Testamento


(gr. sarx), bem como “corpo” (gr. soma), referem-se ao ser humano por
inteiro, porque, nos tempos bíblicos, ele era considerado unificado
(HORTON,1997, p. 250).

2.2 A TEORIA DICOTOMISTA


Esta linha de pensamento defende que o homem é formado apenas de
corpo e alma (ou espírito). Afirma que o corpo consiste na parte material do ser
e a alma (ou espírito) consiste na parte imaterial, ou seja, o homem é um ser
natural-físico e transcendente-espiritual.

55
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

Assim, os seres humanos são tanto animais (seres naturais, biológicos,


mortais) quanto transcendentes à natureza (espirituais, possuindo uma qualidade
supranatural, imortal). (OLSON, 2000).

Agora, precisamos saber, qual é a distinção entre a alma e o espírito


humano? Berkhof (1990, p. 193) argumenta:

A distinção, que as Escrituras fazem entre os dois, não concorda com o


que é mais comum na filosofia, de que a alma é o elemento espiritual
do homem, conforme se relaciona com o mundo animal, enquanto
que o espírito é aquele mesmo elemento em sua relação com o mundo
espiritual superior, e com Deus.

A rigor, as palavras “alma”, “espírito” e “coração”, no Antigo e Novo


Testamento, são empregadas para descrever uma única substância espiritual, o
homem interior. E este interior abrange o intelecto, a vontade e as emoções.

E mais: a palavra “alma” é, muitas vezes, utilizada na Bíblia (e no


pensamento cristão) como sinônimo de pessoa. Às vezes, também, é usada para
explicar o aspecto espiritual da pessoa e o aspecto imaterial, que sobrevive à
morte corporal até a ressurreição.

2.3 A TEORIA TRICOTOMISTA


As duas passagens bíblicas mais utilizadas pelos tricotomistas são 1
Tessalonicenses (5:23) e Hebreus (4:12). Eles reconhecem que não é fácil explicar
a tricotomia humana, mas acreditam que ela é uma realidade.

Segundo esta teoria, o corpo é a parte material da natureza humana;


a alma é o princípio da vida animal; e o espírito é o elemento humano
racional, imortal, relacionado a Deus” (AGUIAR, 1999, p. 178).

Para o teólogo Ferreira (2007, p. 417), uma implicação desta teoria é que
Deus não se relaciona com o ser humano por meio da mente, mas por meio de
intuição mística. Através da intuição, a mente pode conhecer a mente de Deus
diretamente e receber a orientação divina. O espírito também experimenta
comunhão com Deus, muito mais profunda do que pode ser experimentada
por meio da mente. Este ensinamento gnóstico foi muito difundido no Brasil
por meio dos livros do místico chinês Watchman Nee. Este autor defende que o
espírito humano é aquela parte que se relaciona com Deus, enquanto que a alma
é a parte que tem o intelecto, as emoções e a vontade. Nee e todos os tricotomistas
acreditam numa hierarquia, em que o espírito ocupa o lugar mais alto, vindo
depois a alma e por último o corpo.

O fato é que não é possível se relacionar com Deus sem o intelecto. Chega
ser uma aberração a anulação do raciocínio na nossa relação com Deus. Assim,
até mesmo o estudo da Palavra de Deus passa a ocupar um lugar secundário

56
TÓPICO 2 | A NATUREZA DO HOMEM

em comparação com a intuição, ou seja, a experiência pessoal mística torna-se o


critério último para determinar a verdade. Aqui reside o grande perigo!

Todavia, vale a pena ressaltar que, na história, esse debate raramente


levou anátemas ou condenações.

3 ANÁLISE DO ENSINO BÍBLICO SOBRE A CONSTITUIÇÃO


DO HOMEM
A primeira referência bíblica a respeito da constituição do homem é em
Gênesis (2:7), na qual aprendemos que a natureza humana material procede do
pó da terra e a espiritual foi outorgada pelo Criador, através do sopro divino
nas narinas do homem. Portanto, a vida física é representada pelo corpo e a vida
imaterial é representada pela alma e pelo espírito.

3.1 PRIMEIRA TESSALONICENSES, 5:23


“Que o próprio Deus da paz os santifique inteiramente. Que todo o
espírito, a alma e o corpo de vocês sejam preservados irrepreensíveis na vinda
de nosso senhor Jesus Cristo” (1 Tessalonicenses, 5:23-24). Este está enfatizando
a tríplice divisão da natureza humana? Vejamos a perspectiva do teólogo Aguiar
neste assunto (1999, p. 183):

Em Tessalonicenses, 5:23 o apóstolo Paulo está apelando para que o


homem todo seja plenamente santificado para a vinda do Senhor, e,
então, usa os termos comuns na Escrituras para referir-se ao homem
na sua totalidade, mas sem querer fazer qualquer distinção substancial
entre alma e espírito.

3.2 HEBREUS, 4:12


“Pois a palavra de Deus é viva e eficaz, é mais afiada que qualquer espada
de dois gumes; ela penetra até o ponto de dividir alma e espírito, juntas e medulas,
e julga os pensamentos e intenções do coração” ( Hebreus, 4:12). Este texto está
tratando da ação da Palavra de Deus na natureza humana. Agora, vejamos uma
visão mais profunda desta passagem:

Em Hebreus, 4:12 a intenção do autor é mostrar como a Palavra de


Deus pode penetrar até ao ponto mais recôndito do ser humano, até
a “divisão de alma e espírito, e de juntas e medulas, e [...] discernir
os pensamentos e intenções do coração”. Também aqui a intenção do
autor inspirado não é dizer em quantas partes que constitui o homem,
mas referir-se ao poder da Palavra de Deus de sondar o íntimo do ser
humano (AGUIAR, 1999, p.183).

57
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

LEITURA COMPLEMENTAR

A NATUREZA DA HUMANIDADE
William Menzies
Stanley Horton

Várias importantes implicações acerca da natureza dos seres humanos


fluem da narrativa de Gênesis sobre a criação especial. Uma destas implicações
é que todas as pessoas têm dois ancestrais em comum: Adão e Eva. Isto testifica
da unidade dessa criação. Basicamente, existe só uma raça, a raça humana. O
ensino de Romanos, 5:12-21, acerca da queda, tem bases firmes na solidariedade,
sobre a unidade da raça humana. Por causa dessa unidade, a tendência para o
pecado, ocasionada pela queda de Adão, atingiu a raça humana inteira. De modo
semelhante, a redenção que é nossa por intermédio de Cristo, o segundo Adão,
tem o potencial similar (Romanos, 5:18).

Quando Deus criou Adão, primeiramente formou-lhe o corpo com a terra


úmida. Ato contínuo, soprou em seu nariz o sopro da vida. No hebraico, a palavra
sopro, chayyim, está no plural. Alguns veem aqui a indicação de que Deus colocou
em Adão, ao mesmo tempo, tanto a vida espiritual quanto a física. E foi assim que
Adão se tornou “alma vivente”. Termo hebraico nephesh é traduzido aqui por
“alma”, mas por “seres” em Gênesis, 1:24. [...] A ênfase, em Gênesis, 2:7, é que
Adão se tornou uma pessoa real, viva.

Mais adiante, a Bíblia fala sobre o corpo material, a alma imaterial e o


espírito imaterial. Os que enfatizam essas três categorias são chamados de
tricotomistas [...]. Outros aceitam as declarações de 2 Coríntios, 4 e 5 como
indicações de que existem duas categorias básicas: o corpo e a pessoa interior.
Aqueles que enfatizam o aspecto duplo, o material e o imaterial, sem fazer
distinção entre a alma e o espírito, são chamados de dicotomistas.

Sem importar o grupo com que a pessoa se identifique, está claro que
existem três funções na natureza humana, indicadas pelas três categorias. O corpo
é o aspecto consciente do mundo em nosso ser. O aparelho sensorial que Deus nos
deu – visão, tato, audição, olfato e paladar – fornece-nos a consciência de nosso
ambiente físico. É principalmente através dessa via que nos comunicamos com
nosso meio ambiente. Nossos apetites corporais fazem parte de nossa formação
fisiológica e psicológica.

Em parte alguma da Bíblia os apetites corporais são considerados maus


em si mesmos. Isto é importantíssimo. Os gregos, bem como outros pagãos dos
primeiros séculos, consideravam o corpo uma prisão. Os escritores da Bíblia
oferecem uma visão diferente. Deus criou o corpo humano bom, para que servisse
de habitação do Espírito Santo. Algum dia, será ressuscitado. Precisaremos um
corpo para plena expressão da nossa natureza, mesmo em estado e glorificação,
porquanto sempre seremos finitos. Compreender o corpo humano e o valor que

58
TÓPICO 2 | A NATUREZA DO HOMEM

Deus lhe dá é da mais alta significação, para termos um comportamento ético


apropriado. Se o corpo fosse em si mesmo mau, então poderíamos argumentar
que somos vítimas de circunstâncias contrárias, quando fôssemos guiados pelos
nossos apetites ao pecado, e, em desespero, nos entregássemos à indulgência.
Como crentes, não devemos permitir que os apetites corporais nos governem o
comportamento; antes, mediante o exercício da disciplina, devemos tornar nossos
corpos instrumentos úteis a Deus (Romanos, 6:13 e 1 Coríntios, 9:27).

As duas facetas de nossa natureza espiritual – alma e espiritual – estão


intimamente vinculadas e são virtualmente inseparáveis; não obstante, são
usadas em caminhos suficientemente distintos para mostrar a diferença. Pode-se
dizer que o termo “alma” é usado teologicamente para denotar o próprio “eu”,
particularmente em relação à vida consciente, aqui e agora (Apocalipse, 6:9). A
alma humana provê a nossa autoconsciência. É a alma que torna o indivíduo
uma personalidade genuína, dotada de características ímpares. As faculdades
da alma, comumente consideradas, são: intelecto, emoções e vontade.[...]. Elas
dão uma consciência interior da própria pessoa, e ligam o espírito ao corpo. Isto
governa a personalidade total.

Também temos um espírito. Em sua própria natureza, Deus é espírito


(João, 4:24). Por outra parte, a Bíblia fala sobre o espírito do homem como estando
“nele” (1 Coríntios, 2:11). Em outras palavras, o ser humano não é espírito, mas
abriga um espírito. O espírito é o aspecto de nossa pessoa que se relaciona com
o mundo espiritual, seja este mau ou bom. Os não regenerados têm corpo, tal
quais os crentes. Também desfrutam da capacidade psicológica de raciocinar,
demonstrar vontade e ter sentimentos. No entanto, estão “mortos” no que
concerne a Deus. Estão separados d’Ele e são espiritualmente inertes. Quando o
Espírito Santo revive os não regenerados, produzindo neles uma vida nova, sua
capacidade de se relacionar com Deus é restaurada.

FONTE: MENZIES, William; HORTON, Stanley. Doutrinas Bíblicas – uma perspectiva pentecostal.
Rio de Janeiro: CPAD, 1995. p. 85-87.

59
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico vimos que:

 Os seres humanos são seres biológicos, físicos e finitos, criados por Deus do
“pó da terra” (Gênesis, 2:7), sujeitos às limitações, doenças, fragilidades físicas
e morte corporal.

 Embora o homem seja “pó”, é também um ser espiritual. É constituído de uma


existência tanto físico-natural quanto espiritual-sobrenatural. Ambos formam
os dois lados da boa criação de Deus.

60
AUTOATIVIDADE

1 Quais são as duas principais passagens bíblicas que os tricotomistas mais


utilizam para apoiar suas ideias?

2 O que há de errado em ser dicotomista ou tricotomista?

61
62
UNIDADE 2 TÓPICO 3

A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS


NO HOMEM
1 INTRODUÇÃO
À luz deste estudo da Antropologia Teológica, até este ponto, observamos
que o homem é uma criação especial de Deus. Na sua constituição, ele é tanto do
mundo físico como do mundo espiritual; relaciona-se com o mundo físico e com
o mundo espiritual. O que faz o homem ser assim, deve-se ao fato dele ter sido
formado à imagem e semelhança de Deus, aspecto essencial da antropologia
teológica.

Agora, vamos tratar da constituição do homem, na perspectiva do que


vem ser a imagem e semelhança de Deus no homem. Olson (2000) levanta uma
importante questão ao afirmar que a humanidade ou a natureza humana é
essencialmente boa por ser imagem e semelhança de Deus. Olson acrescenta
(2000, p. 287):

Pergunta à maioria dos cristãos se a natureza é essencialmente boa


ou má e a resposta afirmará com frequência a malignidade essencial
da humanidade. No entanto, a revelação de Deus em Jesus Cristo e o
testemunho bíblico, bem como a tradição consensual cristã, afirmam a
bondade essencial da natureza humana.

Para firmar sua linha de raciocínio, Olson (2000, p. 287) faz a seguinte
pergunta: “[...]que é natureza nessa acepção?. É a humanidade como Deus a criou
[...]”. De acordo com o testemunho bíblico, Deus declarou que tudo o que ele
criou é “bom” (Gênesis, 1:31).

2 O QUE É IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM?


O que significa o homem ser criado “à imagem e semelhança de Deus?”
Desde o primeiro século, começando com os pais da Igreja, este tema tem sido
alvo de intensa análise, passando a ser uma das expressões das Escrituras mais
discutidas na história da Teologia cristã.

63
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

2.1 A IMAGO DEI


O ponto de partida para se entender os termos “imagem” (hb. tiselem) e
“semelhança” (hb. demut) é a doutrina da IMAGO DEI no homem.

● tselem: “imagem”, “figura”, “padrão”, “reprodução”.


● demut: “assemelhar-se”, “o que é semelhante ou comparável”.

NOTA

IMAGO DEI – imagem de Deus – termo que designa a singularidade do ser


humano como criatura de Deus. [...] a imago Dei pode incluir a presença da vontade, das
emoções e da razão, a capacidade de pensar e de agir com criatividade ou a de interagir em
sociedade. (GRENZ, 2000, p.73).

O paralelismo entre as duas palavras dá o sentido pleno da noção da


imagem de Deus e, assim, elas não devem ser interpretadas como conceitos
distintos. Quando a ideia é repetida em Gênesis (1:27; 5:1 e 9:6) é suficiente utilizar
apenas uma delas para comunicar a mesma ideia (FERREIRA, 2007). Grandes
teólogos, como Lutero e Calvino, não viam também distinção entre “imagem”
e “semelhança”. O que queremos dizer, é que estes dois termos são sinônimos.
Trata-se de uma expressão do hebraísmo chamada de paralelismo.

Em 1 Coríntios (11:7), Paulo diz que o homem é “imagem” (gr. eikon) de


Deus. O vocábulo eikon significa um retrato, algo que tem uma forma igual a outra.
Tiago (3:9) também afirma que os homens foram feitos “à semelhança de Deus”.
Neste sentido, com a queda, o homem não perdeu a sua semelhança com Deus,
embora nossa mente, emoção e vontade tenham sido profundamente afetadas
pelo pecado, tornando a existência humana alienada, caída e corrompida.

TUROS
ESTUDOS FU

Este é outro aspecto da Antropologia Teológica, que trataremos na Unidade 3.

64
TÓPICO 3 | A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM

A opinião de Erickson (1997, p.205) é conclusiva aqui: “a imagem de Deus


é intrínseca à humanidade. Não seríamos humanos sem ela. De toda a criação,
somente nós somos capazes de ter relacionamento pessoal consciente com o
Criador e de reagir a ele”.

Alguns teólogos modernos estão mais inclinados a ver a imagem de


Deus na pessoa completa do homem, e não numa parte dele apenas.
Isto resulta da ênfase na visão “integral” do ser humano. Assim, a
totalidade do homem deverá ser a imagem de Deus.
A imagem de Deus constitui a diferença essencial entre o homem e
outras criaturas. O que é que faz a diferença. Alguns entendem que
a palavra chave que expressa essa diferença entre o homem e outras
criaturas e que abrange totalidade do ser humano é a palavra pessoa.
Deus fez o homem uma pessoa à semelhança da Sua própria pessoa.
Nenhuma outra coisa em toda a criação pode chamar-se pessoa.
(AGUIAR, 1999, p. 189).

2.2 QUAL É A NATUREZA DESTA IMAGEM?


Vejamos três concepções básicas e explicativas:

a) É funcional: a imago Dei consiste naquilo que o homem faz, na ação


humana de domínio sobre a Criação.

b) É relacional: a imago Dei está presente quando um relacionamento, com


Deus ou com o próximo, está em atividade.

c) É substancial: a imago Dei não é física, mas moral, espiritual, mental e


relacional.

Concordo com Tomás de Aquino (1225-1274), quando argumenta que,


num certo sentido, todo ser humano carrega a imagem de Deus. Todavia, a
imagem de Deus nos não cristãos se encontra “quase obscurecida”, “a ponto de
quase não existir”.

NOTA

TOMÁS DE AQUINO – Um dos maiores teólogos de todos os tempos, que


construiu uma síntese da teologia cristã, que viria a se tornar num dos maiores monumentos
doutrinários da Igreja. Ele buscou harmonizar a doutrina cristã à filosofia de Aristóteles. Na
Súmula Teológica, empreende Aquino provar racional e filosoficamente a existência de
Deus. É o teólogo oficial da Igreja católica (ANDRADE, 1998, p. 340).

65
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

Como afirmamos anteriormente, o assunto “imagem de Deus” no homem


foi sempre um tema de debate teológico. Haja vista que, para Tomás de Aquino,
a imagem de Deus está situada no intelecto humano. Enquanto que João Calvino
entendia que a imagem de Deus é a capacidade moral e espiritual do homem,
por outro lado, Lutero entendia que as capacidades morais e espirituais foram
perdidas com a queda.

Já no século XIX, os teólogos reformados passaram a definir a imagem


de Deus em termos de imagem espiritual (incluindo a imortalidade), raciocínio
(incluindo a vontade, os sentimentos e a inteligência), imagem moral (ou seja,
a justiça original que Adão recebeu), domínio sobre os animais e a criação e o
reflexo desta imagem no corpo (o que quer dizer, em outras palavras, que o
corpo funciona para permitir à alma agir e se expressar no mundo). No século
XX, Berkhof (apud FERREIRA, 2007) enfatizou que o homem é a imagem de
Deus, e isto significa que o homem tem moral e elementos como espiritualidade
e imortalidade (apud FERREIRA, 2007).

3 ASPECTOS DA IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO


HOMEM
Como vimos, a Bíblia atribui a imago Dei exclusivamente ao ser humano.
Quando foi criado por Deus e por Ele tornado alma vivente, o homem tornou-se
semelhante a Deus no que se refere aos aspectos característicos que passaremos
a considerar:

3.1 AFINIDADE DO HOMEM COM O CRIADOR (ATOS,


7:24-28)
Este texto de Atos mostra que, embora possua instintos básicos comparados
aos animais (preservação, procriação etc.), o homem recebeu algo que o distingue
inteligentemente do mundo animal. Alguém já disse que a palavra para homem
no grego (antropos) significa “o que olha para cima”. Embora muitos tentem negar
sua relação com o Criador, na hora do perigo ou sofrimento, ninguém é ateu.

Na verdade, a grande diferença entre os homens e os animais é o que


se pode chamar de dignidade. Não se pode esperar que um leão, por exemplo,
seja diferente do que é, para melhor ou pior. Assim, a expressão “seja homem”
implica em um chamado imperativo e tem em si um significado verdadeiro para
aquele que se afunda no pecado.

66
TÓPICO 3 | A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM

3.2 DOMÍNIO DO HOMEM SOBRE A TERRA (GÊNESIS, 1:26)


Esta característica é relacionada à soberania de Deus. O homem possui a
consciência de ser superior aos demais seres, conforme o domínio determinado
pelo Criador. Quando vemos um homem dominando um elefante domesticado,
compreendemos o que isso significa. Tivesse o animal consciência da diferença de
força e poder entre ele e o homem, jamais este o dominaria. Contudo, o homem,
corrompido pelo pecado, tem coordenado as forças e leis da natureza a seu favor,
tem subido às nuvens e descido às profundezas dos mares, pela capacidade de
suas invenções e descobertas.

Certo é que, embora o pecado tenha obscurecido e desfigurado a imagem


de Deus em si, a sua capacidade dominadora ainda continua ativa. Jamais
saberemos ao certo o potencial de criatividade e capacidade do homem, caso o
pecado não tivesse entrado no mundo.

3.3 CARÁTER MORAL E RAZÃO DO HOMEM


Somente o ser humano é capaz de distinguir entre o certo e o errado, o
bem e o mal. Um animal pode ser ensinado a diferenciar algumas coisas, como
não comer bolinhos de carne atirados por estranhos, por exemplo, mas faz isso
não porque saiba que aquilo é mau, mas porque é a vontade de seu domesticador.
Porém, o homem possui um elemento que identifica a qualidade de seus
pensamentos, palavras ou ações. E essa capacidade é chamada consciência,
ou seja, o reconhecimento da comparação de sua conduta com a lei interior
implantada por Deus.

Da mesma forma, a capacidade de racionalizar, comparar os fatos, para


deles extrair novas lições ou conceitos, é algo que só pode ter origem numa mente
superior. E como todo homem é fruto da mesma espécie, só se pode concluir sua
origem em Deus.

3.4 CAPACIDADE PARA A IMORTALIDADE DO HOMEM


Deus criou o homem para não morrer, visto ser a morte o “salário do
pecado”. A existência da árvore da vida no Éden já é, por si só, uma prova de
que isso seria uma realidade para a raça humana. Porém, a entrada do pecado no
mundo subverteu a ordem das coisas, introduzindo algo na história do homem
que não fazia parte do plano original do Criador. E esse elemento estranho é o
que conhecemos por pecado, a maior catástrofe ocorrida com o homem.

67
UNIDADE 2 | DOUTRINA BÍBLICA DO HOMEM (ANTROPOLOGIA)

LEITURA COMPLEMENTAR

O LUGAR DA HUMANIDADE NA CRIAÇÃO


Alister McGrath

A tradição cristã, partindo sobretudo dos relatos da criação registrados no


livro de Gênesis, enfatiza que a humanidade representa o apogeu da criação de
Deus, ocupando, assim, uma posição de superioridade em relação aos animais.
De um modo geral, a justificativa teológica para essa premissa se baseia, em
grande parte, na doutrina de que o ser humano foi criado à imagem de Deus, que
passamos a analisar agora.

Um texto de importância fundamental para uma compreensão cristã a


respeito da natureza humana está em Gênesis (1:27), que apresenta o ser humano
como alguém criado à imagem e semelhança de Deus – uma ideia que muitas
vezes se expressa por meio da expressão latina imago Dei. Qual o significado dessa
locução? Especialmente no início do período patrística, fazia-se uma distinção
entre as duas expressões: “à imagem de Deus” e “à semelhança de Deus”. Para
Tertuliano, a humanidade continuou a refletir a imagem de Deus após a Queda;
no entanto, só poderia ser, novamente, semelhante a Deus por meio da atividade
restaurada do Espírito Santo.

Orígenes adotou uma abordagem parecida, argumentando que o termo “à


imagem de Deus” refere-se à humanidade após a Queda, enquanto o termo “à semelhança
de Deus” refere-se à natureza humana após seu aperfeiçoamento na consumação final.

Uma segunda abordagem, encontrada no período da patrística, interpreta


“à imagem de Deus” como algo relacionado à razão humana. A “imagem de
Deus” é entendida como a capacidade racional humana, que nesse ponto reflete
a sabedoria de Deus. Agostinho defende que é esta capacidade que diferencia
os seres humanos dos animais [...]. A tese de Agostinho apresenta-se no sentido
de que o elemento característico central da natureza humana é sua capacidade,
concedida por Deus, para ele se relacionar. Embora a natureza humana tenha
sido corrompida pela queda, pode ser transformada pela graça.

A doutrina da criação à imagem de Deus também foi vista como algo


diretamente relacionado à doutrina da redenção. A redenção implica trazer a
imagem de Deus à sua plena realização, por meio de um perfeito relacionamento
com Deus, culminando na imortalidade. [...] escritores gregos do período patriótico
deram ênfase ao estado de plena felicidade em que Adão e Eva viviam no Jardim
do Éden. Atanásio ensinou que Deus criou os seres humanos “à sua imagem” e,
dessa forma, dotou a humanidade de uma capacidade que não foi concedida a
nenhuma outra criatura – a capacidade de se relacionar e participar da perfeição
no jardim do Éden, quando Adão desfrutou de um perfeito relacionamento com
Deus. Entretanto, as coisas não ocorreram bem. Atanásio enfatiza que Adão e
Eva poderiam desfrutar de um perfeito relacionamento com Deus, desde que não
fossem atraídos pelo mundo material.
68
TÓPICO 3 | A IMAGEM E SEMELHANÇA DE DEUS NO HOMEM

Deveríamos, entretanto, observar que os escritores gregos do período


patrística não expressaram esse aspecto por meio da doutrina do pecado original,
como faria Agostinho mais tarde. Muitos desses escritores gregos insistiam no fato
de que o pecado se originou do abuso do livre-arbítrio pelo ser humano. Gregório
de Nazianzo e Gregório de Nissa pregaram que as crianças nasciam sem pecado,
uma ideia que se opõe à doutrina do pecado universal de uma humanidade
caída, formulada por Agostinho. Crisóstomo, referindo-se à declaração de Paulo,
de que muitos foram feitos pecadores por intermédio da desobediência de Adão
(Romanos, 5:10, interpreta que essa passagem significa que todos se tornaram
sujeitos à punição e à morte. A ideia de uma culpa herdada, característica central
da futura doutrina do pecado original de Agostinho não aparece, de forma
alguma, na tradição grega do período patrística.

Entretanto, pode-se notar certos aspectos da noção do pecado original,


posteriormente criada por Agostinho, nas obras desse período. O estudioso do
período patrística da Universidade de Oxford, J. N. Kelly, identifica três áreas nas
quais é possível verificar a presença da noção do “pecado original” na tradição
grega do período patrística:

Entende-se que toda humanidade esteja envolvida, de alguma maneira, na


desobediência de Adão. Um forte sentido da união mística de toda humanidade
com Adão pode ser observado nas obras desse período. Toda humanidade é, de
alguma forma, afetada pela desobediência de Adão.

Entende que a queda de Adão afeta o caráter moral do ser humano. Todas
as deficiências morais do ser humano, inclusive a luxúria e a ignorância, podem
ser atribuídas ao pecado de Adão.

Normalmente, apresenta-se o pecado de Adão como algo que é transmitido,


de alguma maneira indefinida, à sua posteridade. Gregório de Nissa fala da
existência de uma predisposição ao pecado que é inerente à natureza humana e
que pode ser atribuída, pelo menos em parte, ao pecado de Adão.

FONTE: McGRATH, Alister. Teologia – Sistemática, histórica e filosófica. São Paulo: Shedd Publi-
cações, 2005. p. 502-506.

DICAS

SUGESTÕES DE LEITURA

1. GAMA, Tácito. O Homem em Três Tempos. Rio de Janeiro: CPAD, 2000.

2. SMALLEY, Gary; TRENT, John. O Valor Oculto do Homem. Rio de Janeiro: CPAD, 2008.

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RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico você estudou que:

 A passagem bíblica de Gênesis (1:26-27) deixa absolutamente claro que o


homem foi criado por Deus, com uma biforme natureza: material e espiritual.
O homem não veio à existência por si só, mas por Deus e com um fim especial
na Terra.

 A Bíblia diz que o homem foi criado segundo à imagem e semelhança de Deus.
Entendemos também que “imagem” e “semelhança” são termos sinônimos.
Além dessa imagem ter vínculo afetivo, inclui também o domínio do homem
sobre toda a criação. É ela que faz os seres humanos serem distintos dos
animais.

 Com a queda e a entrada do pecado no mundo, esta imagem “perdeu” um


pouco do seu brilho.

70
AUTOATIVIDADE

1 No entendimento de João Calvino, em que consiste a imagem de Deus no


homem?

2 Como entender a capacidade de criação do homem, mesmo após ser


corrompido pelo pecado?

71
72
UNIDADE 3

DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO


(HAMARTIOLOGIA)

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

A partir desta unidade, você será capaz de:

• definir o que é pecado e suas implicações à luz da Bíblia;

• explicar a natureza do pecado e sua malignidade no mundo;

• mostrar a relação do pecado com o cotidiano do homem.

PLANO DE ESTUDOS
Esta Unidade está dividida em três tópicos, sendo que, no final de cada um
deles, você encontrará atividades que o(a) ajudarão a fixar os conhecimentos
adquiridos.

TÓPICO 1 – A ORIGEM DO PECADO

TÓPICO 2 – A NATUREZA DO PECADO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

TÓPICO 3 – OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

73
74
UNIDADE 3
TÓPICO 1

A ORIGEM DO PECADO

1 INTRODUÇÃO
A doutrina do pecado, na Teologia Cristã, chama-se Hamartiologia, que
se ocupa com o estudo da origem, natureza e universalidade do pecado, conforme
a revelação das Escrituras Sagradas – a Bíblia.

O termo Hamartiologia procede de duas palavras gregas: hamartia,


traduzida como pecado, e logia, que significa estudo, oráculo ou declaração.

A imagem de Deus no homem fez dele, originalmente, um filho de Deus.


E essa relação resultou nas características associadas à imagem de Deus no
homem (imago Dei), conforme estudamos na Unidade 2. No entanto, assim como
em um organismo sadio, o vírus torna-se um fator de doença, da mesma forma, a
entrada do pecado no mundo desencadeou uma reação que modificou a história
do homem e da humanidade.

Portanto, temos que concordar com Paul Tillich (apud FERREIRA, 2007,
p. 495), o maior teólogo protestante liberal do século XX, ao afirmar que o homem
é “essencialmente bom, mas existencialmente alienado”.

Todo homem nasce na condição de pecaminosidade (o pecado como


corrupção). Para se libertar, é preciso se arrepender de seus pecados e ter fé na
obra de Cristo na cruz. Arrepender-se e crer em Jesus é uma necessidade humana
universal que Deus impõe para o homem ser salvo do pecado. Nesta perspectiva,
faz sentido a afirmação de Aguiar (1999, p. 197): “O grande problema da
humanidade é o pecado, e o grande propósito de Deus é libertar o homem dele”.

O pecado original [...] não é um jogo de imaginação, mas um fato


límpido e claro. Diariamente constamo-lo com os olhos e ouvimo-lo
com os ouvidos. Gentios, turcos, judeus, cristãos, de qualquer nação,
assim as pessoas são descritas ali. Assim são os temperamentos, assim
as maneiras de senhores, cavalheiros, clérigos, na Inglaterra, bem como
de comerciantes e do baixo vulgo. Nenhuma pessoa de sã consciência
pode negá-lo; e ninguém consegue explicá-lo a não ser suposição do
pecado original (WESLEY apud OLSON, 2000, p.295).

Antes de fazer a citação de Wesley, Olson (2000) foi preciso ao comentar


que o consenso cristão, sobre a condição humana, em contraste com a humanidade
essencial, é que nossa vida cotidiana real é integralmente permeada desde o
nascimento pelo pecado como tendência ao orgulho (autoidolatria), ao egoísmo
e à desobediência a Deus.

75
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

Para Olson (2000), o problema básico da nossa condição de pecaminosidade


é que estamos alienados espiritual, psicológica, emocional e fisicamente, ou
seja, de acordo com o Cristianismo clássico, todos sempre fomos pecadores
até mesmo antes de cometermos pecados conscientes, intencionais, pelos quais
somos culpados. Nascemos depravados ou destituídos, mas isso não é a nossa
humanidade doente. Não é nem sequer nossa verdadeira natureza, ainda que
se tenha tornado nossa segunda natureza. Porém, está aí no começo de nossa
vida, até mesmo se for apenas como uma bomba-relógio herdada que faz tique-
taque dentro da vida espiritual, conduzindo-nos inevitavelmente – a menos que
amadureçamos para o despertar consciente, moral para o certo e o errado – a
sermos rebeldes contra Deus, carentes de perdão pessoal e de reconciliação com
Deus.

2 COMO O PECADO ENTROU NO MUNDO?


A Bíblia diz que o pecado entrou no mundo através dos nossos primeiros
pais. Contudo, esta é apenas parte da história, pois quando se analisa Gênesis
(3:15), percebe-se outro elemento envolvido – a serpente, que a Bíblia identifica
como sendo o próprio diabo (Apocalipse 12:9; 20:2).

NOTA

DIABO - (do grego, diabolos) - significa “caluniador”, agente do mal e inimigo de


Deus. Outro dos seus nomes é “Satanás” (adversário).

2.1 O PECADO TEVE ORIGEM NO MUNDO ANGÉLICO


O diabo é a causa primária do pecado. Esta origem do pecado remonta à
sua rebeldia e queda, segundo o registro de Isaías (14:12-14):

12
Como você caiu dos céus, ó estrela da manhã, filho da alvorada!
Como foi atirado à Terra, 13 você, que derrubava as nações! Você, que
dizia no seu coração: ‘Subirei aos céus; erguerei o meu trono acima das
estrelas de Deus; eu me assentarei no monte da assembleia, no ponto
mais elevado do monte santo. 14 Subirei mais alto que as mais altas
nuvens; serei como o Altíssimo.

Outra passagem bíblica esclarecedora é Ezequiel (28:13-16), que também


descreve a rebeldia e queda de Satanás:

76
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO PECADO

13
Você estava no Éden, no jardim de Deus; todas as pedras preciosas
o enfeitavam: sárdio, topázio e diamante, berilo, ônix e jaspe, safira,
carbúnculo e esmeralda. Seus engastes e guarnições eram feitos de
ouro; tudo foi preparado no dia em que você foi criado. 14 Você foi
ungido como um querubim guardião, pois para isso eu o designei.
Você estava no monte santo de Deus e caminhava entre as pedras
fulgurantes. 15 Você era inculpável em seus caminhos desde o dia em
que foi criado até que se achou maldade em você. 16 Por meio do seu
amplo comércio, você encheu-se de violência e pecou. Por isso eu
o lancei, humilhado, para longe do monte de Deus, e o expulsei, ó
querubim guardião, do meio das pedras fulgurantes.

Observe que tanto no texto de Isaías como no de Ezequiel está descrito


o início de tudo, o momento em que surge no coração, até ali puro, do “filho
da alvorada” (Isaías 14:12), o “querubim guardião” (Ezequiel 28:16), a centelha
da tentação, então, por sua livre vontade, optou pelo caminho da transgressão
(infringir, violar, quebrar a lei, passar dos limites). Assim, esse anjo foi destituído
de suas funções celestiais e execrado eternamente.

Vale lembrar que esse ser foi criado por Deus, mas tinha o livre-arbítrio
como o homem também possui. Portanto, desde o Éden (o pecado original), e
através dos tempos, o diabo tem se utilizado de todos os meios para corromper a
humanidade. Gênesis 3 é o melhor exemplo para se averiguar como ele age para
tentar o homem à desobediência a Deus.

2.2 TEORIAS SOBRE O PECADO


Assim como em outras áreas da Teologia Cristã, sobre o pecado não é
diferente, há muitas teorias. São especulações filosóficas que pretendem abrandar
o verdadeiro significado da Bíblia da palavra pecado.

a) O ateísmo. A doutrina do ateísmo nega a existência de Deus e, por


conseguinte, nega também a realidade do pecado, visto que o pecado é dirigido
contra Deus.

b) O gnosticismo. Esta teoria nega o caráter ético do mal e, por isso, trata
o pecado como algo puramente físico.

c) O determinismo. Os deterministas ensinam que tudo que acontece


está condicionado ao meio e às circunstâncias. Então, negam o livre-arbítrio, por
acharem que o homem é um ser desprovido de responsabilidade moral. Esta
teoria argumenta que não há mérito em fazer o bem e quem faz o mal não pode
ser punido.

d) O hedonismo. Os hedonistas não se preocupam com o certo e o errado.


Pregam que não se deve reprimir os desejos físicos, porém dar vazão a eles.

77
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

NOTA

HEDONISMO – (do gr. hedoné) – Doutrina filosófica, da época pós-socrática,


segundo a qual o prazer individual e imediato é o supremo bem da vida humana. (ANDRADE,
1998, p. 172)

3 A ORIGEM DO PECADO NO MUNDO


Teologicamente, a essência do primeiro pecado, no Éden, está na
desobediência à vontade de Deus. Deus havia dado a ordem a Adão, antes da
criação da mulher. “Mas não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal,
porque no dia em que dela comer, certamente você morrerá” (Gênesis 2:17).

Portanto, o pecado de Adão e Eva foi uma transgressão deliberada ao


limite que fora determinado por Deus.

NOTA

TRANSGRESSÃO – (do lat. Transgressio) – Infração premeditada e consciente


de um preceito ou princípio. Assim é considerado o pecado em relação à Lei de Deus.
(ANDRADE, 1998, p. 278).

No caso da tentação específica de Eva, podemos afirmar que foi uma


tentação tanto externa quanto interna, visto que passou pelo processo mental,
pelo qual Adão não passou.

3.1 TENTAÇÃO E QUEDA DO HOMEM


Desde o Éden, e através dos tempos, Satanás tem se utilizado de todos os
meios para corromper a humanidade. No entanto, a Bíblia, para o nosso próprio
bem, revela que ele usa um padrão em seu trabalho de tentar o homem, baseado
nos três aspectos básicos. Veja isto em 1 João 2:16: “Pois tudo o que há no mundo,
a cobiça da carne, a cobiça dos olhos e a ostentação dos bens não provém do Pai,
mas do mundo”.

Ou seja: cobiça da carne, cobiça dos olhos e ostentação dos bens.

78
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO PECADO

“Cobiça” é a corrupção dos instintos naturais dados por Deus. Já


“ostentação” é o orgulho resultante daquilo que se possui. Estes três aspectos
podem ser identificados tanto na tentação do Éden como na de Jesus (Mateus 4),
e um ou outro, nas demais ocorridas na Bíblia.

a) O tentador. O Novo Testamento apresenta o tentador como sendo


Satanás, o qual se utilizou da serpente para tentar Eva. Em toda a Bíblia, a
serpente é descrita como um animal perigoso, que possui um maligno e astuto
veneno mortal. Ela é símbolo de Satanás (Gênesis 3:1; Provérbios 25:32; Isaías 59:5;
2 Coríntios 11:3; Apocalipse 12:9,13,15). À luz do relato de Gênesis 3, a serpente é
a personificação do mal, com o qual o homem se defrontará em toda sua história.

b) A tentação. A tentação veio de fora, de Satanás, personificado na


serpente, que instigou Eva a desobedecer ao mandamento de Deus. Convém
ressaltar que Adão não foi tentado pela serpente, mas por Eva, que o seduziu.

Leia o seguinte trecho, para averiguar como Satanás agiu para induzir
nossos primeiros pais ao pecado:
1
Ora, a serpente era o mais astuto de todos os animais selvagens
que o SENHOR Deus tinha feito. E ela perguntou à mulher: “Foi isto
mesmo que Deus disse: ‘Não comam de nenhum fruto das árvores
do jardim’?” 2 Respondeu a mulher à serpente: “Podemos comer do
fruto das árvores do jardim, 3 mas Deus disse: ‘Não comam do fruto
da árvore que está no meio do jardim, nem toquem nele; do contrário
vocês morrerão’ ”. 4 Disse a serpente à mulher: “Certamente não
morrerão! 5 Deus sabe que, no dia em que dele comerem, seus olhos
se abrirão, e vocês, como Deus, serão conhecedores do bem e do mal”.
6
Quando a mulher viu que a árvore parecia agradável ao paladar,
era atraente aos olhos e, além disso, desejável para dela se obter
discernimento, tomou do seu fruto, comeu-o e o deu a seu marido,
que comeu também. (Gênesis 3.1-6).

Estando no “meio” do jardim (v. 3), a árvore proibida tornou-se um ponto


de convergência, para onde se dirigiu a mulher quando pela primeira vez se viu
sozinha. A tentação só existe em relação ao que prende a nossa atenção. A árvore
do conhecimento estava no meio do jardim. A mesma coisa acontece com aquilo
que nos é proibido: ele se torna o centro em torno do qual gravitam todos os
nossos desejos e ideais. E, por isso, vai adquirindo qualidades ressaltadas pelo
espírito maligno, sussurrando em nossos ouvidos, de tal forma que se transforma
mais e mais no alvo de toda a nossa atenção.

Veja a sequência da ordem dada por Deus: “não comam do fruto”, “nem
toquem nele”, “do contrário vocês morrerão”. Agora observe como Satanás torce
as palavras de Deus, no versículo 4 e 5, de modo a confundir Eva: “certamente não
morrerás”, “Deus sabe que, no dia em que dele comerem, seus olhos se abrirão”,
“e vocês, como Deus, serão conhecedores do bem e do mal”.

79
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

A árvore proibida no Éden foi uma espécie de elemento de teste pelo


qual o homem pudesse escolher, pelo amor, servir a Deus. Para aqueles que não
entendem a razão de Deus assim o permitir, sugerimos a leitura da provação
pela qual Jó passou (Jó 1), como um teste que se revelou em bênção pela sua
aprovação. Infelizmente, tal não aconteceu com Adão e Eva.

c) A queda do homem. Gênesis 3:6 é chave para revelar o processo pelo


qual o objetivo da tentação foi alcançado:

- “Quando a mulher viu” (cobiça dos olhos).


- “Agradável ao paladar” (cobiça da carne).
- “Desejável para dar entendimento” (ostentação dos bens).

Agora, compare este mesmo processo com a tentação de Jesus no deserto,


segundo o registro de Lucas 4:1-12:

- “Manda esta pedra transformar-se em pão”. (Cobiça da carne).


- “Mostrou-lhes num relance todos os reinos do mundo”. (Cobiça dos
olhos).
- “Joga-te daqui para baixo”. (Ostentação dos bens).

Por que razão, Adão participou do fruto, quando aparentemente não


havia sido tentado? Ora, a isso só se pode responder pelo processo denominado
pela psicologia como identificação, quando alguém faz algo que viu outro fazer,
pelos laços que os unem, sejam eles políticos, culturais ou afetivos. Não têm sido
poucos os casos de esposas que levam seus maridos ao erro (e vice-versa), pelo
simples fato de um não querer discordar do outro. Atos dos Apóstolos, capítulo
5, tem um desses tristes exemplos.

3.2 O JUÍZO DIVINO


A Bíblia diz, em Gênesis 3:7, que depois da queda, abriram-se os olhos de
Adão e Eva. Esse abrir de olhos tem um sentido metafórico, eles não viram aquilo
que Satanás havia dito que veriam. O que viram foi a expectativa de um juízo
inevitável, a destruição de suas vidas. Aliás, Deus havia declarado que o juízo
seria inevitável: “[...] mas não coma da árvore do conhecimento do bem e do mal,
porque no dia em que dela comer, certamente você morrerá”. (Gênesis 2:17).

a) O juízo divino em relação ao homem. Ele passaria a arcar com trabalho


penoso, morte física e espiritual (Gênesis 2:17; 3:17-19). E se ele persistir em seus
delitos, haverá de experimentar a segunda morte: o lago de fogo (Apocalipse
21:8).

b) O juízo divino em relação à mulher. Ela passaria a sofrer com a gravidez


(Gênesis 3:16).

80
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO PECADO

c) O juízo divino em relação à natureza. A Terra tornou-se maldita


(Gênesis 3:17-18), pois seria tomada de espinhos e ervas daninhas. A Bíblia diz
que a natureza geme em consequência da transgressão adâmica:

“20 Pois ela foi submetida à inutilidade, não pela sua própria escolha,
mas por causa da vontade daquele que a sujeitou, na esperança
21
de que a própria natureza criada será libertada da escravidão da
decadência em que se encontra, recebendo a gloriosa liberdade dos
filhos de Deus. 22 Sabemos que toda a natureza criada geme até agora,
como em dores de parto”. (Romanos 8.20-22).

d) O juízo divino em relação à serpente. Ela seria maldita entre os animais


domésticos e selvagens. Passaria a rastejar sobre seu ventre, comendo pó. E, por
fim, seria ferida pela semente da mulher, Jesus Cristo.

3.3 A CONSCIÊNCIA E CULPA


O pecado envolve culpa. Todavia, para a culpa vir à tona, é necessário
a revelação da Lei. A Bíblia diz que “[...] onde não há lei, não há transgressão”
(Romanos 4:15).

Essas leis foram reveladas aos homens, quer através de palavras,


que hoje encontramos nas Escrituras (revelação especial), quer
diretamente na própria consciência moral de cada um (revelação
geral, Romanos 2:14-15). Sem a revelação, mesmo que algo contrário a
Deus tenha havido, não poderia haver culpa. [...] uma vez dada a lei,
cabe ao homem a responsabilidade de procurar conhecer e cumprir
as determinações divinas (Deuteronômios 29:29). Se o indivíduo não
procurar conhecer a vontade de Deus, sua ignorância não o isenta de
culpa. E se sabia a vontade de Deus e não a cumpriu, sua culpa será
maior do que a daquele que não sabia e por isto pecou, Lucas 12:47-48.
(AGUIAR, 1999, p. 201).

Agora, leia Gênesis 3:7 a 10, para constatar que, ao pecarem, Adão e Eva
se sentiram culpados diante de Deus.
7
Os olhos dos dois se abriram, e perceberam que estavam nus; então
juntaram folhas de figueira para cobrir-se. 8 Ouvindo o homem e sua
mulher os passos do SENHOR Deus que andava pelo jardim quando
soprava a brisa do dia, esconderam-se da presença do SENHOR Deus
entre as árvores do jardim. 9 Mas o SENHOR Deus chamou o homem,
perguntando: “Onde está você?” 10 E ele respondeu: “Ouvi teus passos
no jardim e fiquei com medo, porque estava nu; por isso me escondi”.

Observe que eles perceberam sua nudez e sentiram vergonha. Por isso,
esconderam--se de Deus, pois tiveram medo. O que houve foi consciência da
transgressão, pois violaram um mandamento. Isto é chamado teologicamente de
culpa legal.

81
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

No tocante à nossa posição legal perante Deus, qualquer pecado, mesmo


aquilo que nos pareça um pecado leve, torna-nos legalmente culpados perante
Deus e, portanto, dignos de castigos eternos. Adão e Eva aprenderam isso no
jardim do Éden, onde Deus lhes disse que um só ato de desobediência resultaria
na pena de morte (Gênesis 2.17). E Paulo afirma que “[...] o julgamento derivou
de uma só ofensa, para a condenação” (Romanos 5.16). Esse único pecado tornou
Adão e Eva pecadores perante Deus, já incapazes de permanecer na santa presen-
ça divina (GRUDEN, 2006).

3.4 A PROMESSA DE REDENÇÃO


Deus providenciou um juízo redentor através da promessa de redenção
com a “descendência da mulher” que pisaria a cabeça da serpente: “Porei
inimizade entre você e a mulher, entre a sua descendência e o descendente dela;
este lhe ferirá a cabeça, e você lhe ferirá o calcanhar”. (Gênesis 3:15).

A serpente era o Diabo, o injetor do pecado no mundo, mas a descendência


da mulher é o Verbo Divino, Jesus Cristo. No calvário, Jesus venceu a antiga
serpente e garantiu a redenção do homem.

Adão e Eva morreriam, mas, através da sua descendência, surgiria uma


nova vida, para gerações futuras. E é justamente no fruto da mulher que está a
esperança do ser humano – Jesus Cristo esmagaria a cabeça da serpente, vencendo
o pecado e a morte, como ser humano perfeito, que viveu e morreu para trazer
redenção aos homens.

82
TÓPICO 1 | A ORIGEM DO PECADO

LEITURA COMPLEMENTAR

CONCEITOS HISTÓRICOS SOBRE A ORIGEM DO PECADO


Raimundo Oliveira

São os mais diversos os conceitos que ao longo da história surgiram


acerca da origem do pecado. Irineu, bispo de Lyon, na Ásia Menor (130-208 d.C.),
talvez, o primeiro dos pais da Igreja Antiga a assegurar que o pecado no mundo
se originou na transgressão voluntária do homem no Éden.

O conceito de Irineu logo tomou conta do pensamento e da teologia da


Igreja, especialmente como arma no combate ao gnosticismo, pois este ensinava
que o mal é inerente à matéria.

Do Gnosticismo a Orígenes

O gnosticismo ensina que o contato da lama humana com a matéria era


que a tornava imediatamente pecadora. Esta teoria naturalmente despojou o
pecado do seu caráter voluntário como é apresentado na Bíblia.

Orígenes (185-254 d. C.) sustentou este mesmo ponto de vista por meio
de sua teoria chamada “preexistencialismo”. Segundo ele, as almas dos homens
pecaram voluntariamente em existência prévia, e, portanto, todas entraram
no mundo numa condição pecaminosa. Este conceito de Orígenes sofreu forte
oposição mesmo nos seus dias.

Os pais da Igreja grega

Em geral, os Pais da Igreja grega dos séculos III e IV se mostraram


inclinados a negar a relação direta entre o pecado de Adão e seus descendentes.
Em contraposição, os Pais da Igreja latina ensinaram com bastante clareza que a
presente condição pecaminosa do homem encontra sua explicação na primeira
transgressão de Adão no Éden.

Os pais da Igreja do Ocidente

O ensino da Igreja do Ocidente quanto à origem do pecado teve seu ponto


mais elevado na pessoa de Agostinho. Ele insistiu no ensino de que em Adão
toda a humanidade se acha culpada e maculada. Já os teólogos semipelagianos
admitem que a mancha do pecado, e não o pecado mesmo, é que era causada
pelo relacionamento da humanidade – Adão. Durante a Idade Média, o que se
cria a respeito do assunto era uma mistura de agostinismo e pelagianismo. Os
reformadores, particularmente, comungaram do ensino de Agostinho.

83
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

Do Racionalismo a Karl Barth

Sob a influência do racionalismo e da teoria do evolucionismo, a doutrina


da queda do homem e de seus efeitos fatais sobre a raça humana foi se descartando
gradualmente. Começou a se difundir a ideia de que, se realmente houve o que
a Bíblia chama “queda” do homem, essa queda foi para o alto. A ideia do pecado
odioso aos olhos santos de Deus foi substituída pelo mal, e este mal se aplicou
de diferentes maneiras. Por exemplo, Emmanuel Kant o considerou como patê
inseparável do que há de mais profundo no ser humano, e que não se pode
explicar. O evolucionismo chama esse “mal” de oposição das baixas inclinações
ao desenvolvimento gradual da consciência moral. Karl Barth, teólogo suíço
(1886-1968), fala da origem do pecado como um mistério da predestinação.

Em suma: O que muitas correntes da teologia racionalista erradamente


ensinam é que Adão foi na verdade o primeiro pecador, porém sua desobediência
não pode ser considerada como causa do pecado no mundo. O pecado do homem
estaria relacionado, de alguma forma, com a sua condição de criatura. A história
do Paraíso nada mais proporciona ao homem do que a simples informação de
que ele necessariamente não precisa ser pecador.

FONTE: OLIVEIRA, Raimundo. As Grandes Doutrinas da Bíblia. Rio de Janeiro: CPAD, 2001. p. 191-192.

84
RESUMO DO TÓPICO 1

Neste tópico você viu que:

 A Bíblia afirma que “[...] o pecado entrou no mundo por um homem, e pelo
pecado a morte” (Romanos 5:12). Essa pecaminosidade do homem está
registrada em toda extensão das Escrituras Sagradas, e a história é testemunha
desta verdade.

 Adão, como representante da raça humana, ao pecar, sujeitou todos seus


descendentes aos aguilhões do mal moral, tornando, assim, o pecado universal.
Seja em grandes metrópoles como São Paulo ou nas mais esquecidas aldeias
africanas, o flagelo do pecado é diário.

Finalmente, importa observar que todo pecado é em última análise


irracional. Na verdade não faz sentido que Satanás se tenha rebelado
contra Deus na esperança de poder exaltar-se acima de Deus. Nem que
Adão e Eva tenham pensado que poderia advir algum benefício da
desobediência às palavras do seu Criador. Foram decisões insensatas.
A persistência de Satanás na rebelião contra Deus, mesmo hoje, é
ainda decisão insensata como a decisão de qualquer ser humano de
continuar num estado de rebeldia contra Deus. Não é o homem sábio,
mas o “insensato”, que diz [...] no seu coração: Não há Deus (Salmo
14:1). (GRUDEN, 2006.p. 406).

85
AUTOATIVIDADE

1 Onde o pecado teve origem?

2 Por que razão Adão participou do fruto, quando aparentemente não havia
sido tentado?

3 Qual foi o juízo do pecado sobre a mulher?

86
UNIDADE 3
TÓPICO 2

A NATUREZA DO PECADO E SUAS


CONSEQUÊNCIAS

1 INTRODUÇÃO
Estamos estudando a doutrina bíblica do pecado: sua origem, natureza
e consequências. Como vimos na Unidade 2, nas condições com que o homem
foi criado e colocado no jardim do Éden, era para ele escolher o bem. Todavia,
ao invés disto, ele fez a escolha errada. Adão e Eva escolheram, de forma livre
e voluntária, o mal; desta forma, o pecado foi imputado a toda raça humana.
Então, “[...] todos pecaram e estão destituídos da glória de Deus” (Romanos
3:23).

NOTA

O PECADO IMPUTADO. Imputar significa atribuir, identificar ou entregar algo a


alguém. O pecado imputado implica na consequência da transgressão de Adão, recaindo
sobre seus descendentes, por meio da transmissão da natureza caída (ou, como alguns
pensam, por imputação de Deus, creditando a todos o pecado de Adão).

A doutrina da pecaminosidade universal do ser humano, ensinada


exaustivamente na Bíblia e testemunhada pelas religiões e a filosofia, tem uma
única exceção: a Pessoa de Jesus Cristo.

2 A NATUREZA DO PECADO
O que é pecado? Esta pergunta tem deixado muitos pensadores perplexos.
Contudo, a Bíblia tem a resposta absoluta.

2.1 A NATUREZA DO PECADO SEGUNDO A BÍBLIA


As Escrituras definem pecado através de vários termos hebraicos e gregos,
os quais revelam a sutileza e a variedade de atos humanos considerados pecados
na Palavra de Deus.

87
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

QUADRO 2 – AS ESCRITURAS E O PECADO

Termo Descrição Referência bíblica


Hebraico
awon Iniquidade; perversão Gênesis, 15:16
chattath Errar o alvo Gênesis, 4:7
pesha Revolta contra o padrão, transgredir Gênesis, 50:17
tame Ser impuro, imundo Isaías, 6:5

Grego
adikia Injustiça; injusto Romanos, 6:13
anomia Sem lei; iniquidade 1 João, 3:4
asebeia Impiedade; falta de reverência Romanos, 1:18
kakia Malícia; malignidade Romanos, 1:29

FONTE: O autor

Estes vários termos não descrevem apenas a multiplicidade da natureza


do pecado, mas também a sua universalidade. Portanto, numa análise minuciosa
destas palavras, verifica-se que, tanto no hebraico como no grego, o sentido da
palavra pecado é “errar o alvo” ou “acertar o alvo errado”.

A Bíblia é categórica ao afirmar: “[...] Este é o caminho, siga-o” (Isaías,


30:21).

2.2 PERSPECTIVA TEOLÓGICA


Teologicamente, o pecado pode ser definido como “transgressão
deliberada e voluntária das leis estabelecidas por Deus”. Porém, em 1 João (3:4),
temos uma definição curta, mas essencial e completa:

“[...] o pecado é a transgressão da Lei”.

Em termos práticos, o pecado não consiste apenas numa transgressão da


Lei de Deus; é também uma afronta à Sua santidade.

Vejamos, agora, o que é pecado, na visão de alguns teólogos:

● “Pecado é qualquer coisa contrária ao caráter de Deus” (RYRIE, 2004).


● “Pecado é falta de conformidade com a lei moral de Deus, seja em ato,
disposição ou estado” (BERKHOF, 1990).
● “Pecado é um estado mau da alma ou da personalidade” (LANGSTON, 1977,
p. 152).
● “Pecado é deixar de se conformar à lei moral de Deus, seja em ato, seja em
atitude, seja em natureza” (GRUDEN, 2006).

88
TÓPICO 2 | A NATUREZA DO PECADO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

Percebemos pela experiência que o pecado é nocivo a nós, que traz dor
e consequências destrutivas para nós e para os outros atingidos por
ele. Mas se definirmos o pecado como a inconformidade à lei de moral
de Deus, então pecar é mais do que meramente doloroso por Deus,
não deve haver pecado. O pecado se opõe diretamente a tudo o que é
bom no caráter de Deus, e assim como Deus necessária e eternamente
detesta o pecado. É, em essência, a contradição da excelência do
caráter moral de Deus. Contradiz a sua santidade, e portanto ele tem
de detestá-lo. (GRUDEN, 2006. p. 404).

Sendo um pouco mais abrangente, o teólogo Aguiar (1999) diz que pecado
é um mal moral que consiste em ação, omissão ou estado contrário a qualquer lei
de Deus, dada às suas criaturas racionais.

3 A TRANSMISSÃO DO PECADO
O pecado afasta o homem do centro da realidade divina.

A Bíblia apresenta o pecado como estado de separação e alienação da


humanidade caída em relação a Deus e também como desobediência
deliberada do indivíduo para com a vontade divina, evidenciada em
pensamentos concretos ou ações. Sendo inerente à condição humana,
o pecado é universal, sendo tanto coletivo como individual (GRENZ,
2000, p. 102).

3.1 O ENSINO BÍBLICO SOBRE A UNIVERSALIDADE DO


PECADO
O pecado de Adão atingiu toda humanidade. Adão, como pai de todos
os homens, e formador da espécie, transmitiu aos seus descendentes, a herança
maligna do pecado. Quando Adão pecou, Deus considerou todos os seus futuros
descendentes como pecadores.

12
Portanto, da mesma forma como o pecado entrou no mundo por um
homem, e pelo pecado a morte, assim também a morte veio a todos os
homens, porque todos pecaram; 13 pois antes de ser dada a lei, o pecado
já estava no mundo. Mas o pecado não é levado em conta quando não
existe lei. 14 Todavia, a morte reinou desde o tempo de Adão até o de
Moisés, mesmo sobre aqueles que não cometeram pecado semelhante
à transgressão de Adão, o qual era um tipo daquele que haveria de
vir”. (Romanos 5.12-14)

Esta consciência universal do pecado, ensinada nas Escrituras e


comprovada na história das religiões e pela Filosofia, é chamada de universalidade
do pecado. Desta forma, cada ser humano nasce com um pequeno “defeito de
fabricação”, reconhecida na tendência natural do ser humano em pecar.

89
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

No debate teológico sobre a universalidade do pecado, surge o tópico


pecado herdado (veja, a seguir leitura complementar), fala do pecado original,
que consiste no estado de separação em relação a Deus comum a todos os homens.
Qualquer mãe ou pai sabe que a capacidade do filho de aprender o que é certo é
muito inferior a de aprender o que é errado.

3.2 TEMOS UMA NATUREZA PECAMINOSA POR CAUSA


DA TRANSGRESSÃO DE ADÃO
A ideia de que Deus considera todos os homens culpados por causa do
pecado de Adão é afirmado em Romanos (5:18 e 19):
18
Consequentemente, assim como uma só transgressão resultou na
condenação de todos os homens, assim também um só ato de justiça
resultou na justificação que traz a vida a todos os homens. 19 Logo,
assim como por meio da desobediência de um só homem muitos
foram feitos pecadores, assim também, por meio da obediência de um
único homem muitos serão feitos justos.

Nesta perspectiva, o salmo 51, versículo 5, faz duas declarações conclusivas:

1) Ao sair do ventre da mãe, já nascemos em pecado: “em iniquidade fui formado”.

2) Desde o momento da concepção, já possuía uma natureza pecadora: “em


pecado me concebeu minha mãe”.

Concordo com o teólogo Norte Americano, Wayne Gruden (2006), quando


afirma que cada parte do nosso ser está maculada pelo pecado - o intelecto, as
emoções e desejos, o coração (o centro dos desejos dos processos decisórios), as
metas e motivos e até o corpo físico.

● “O coração é mais enganoso que qualquer outra coisa e sua doença é incurável.
Quem é capaz de compreendê-lo?” (Jeremias, 17:9).
● “Eles estão obscurecidos no entendimento e separados da vida de Deus por
causa da ignorância em que estão, devido ao endurecimento do seu coração”
(Efésios, 4:18).
● “Para os puros, todas as coisas são puras; mas para os impuros e descrentes,
nada é puro. De fato, tanto a mente como a consciência deles estão corrompidas”
(Tito, 1:15).

90
TÓPICO 2 | A NATUREZA DO PECADO E SUAS CONSEQUÊNCIAS

LEITURA COMPLEMENTAR

O PECADO HERDADO
Charles Rirye

Definição

O pecado herdado é o estado pecaminoso em que nascem todas as pessoas.

Os teólogos usaram vários nomes para descrever esse conceito. 1) como


indica o título acima, alguns o chamam de pecado transmitido ou herdado. Isso
enfatiza a verdade de que todas as pessoas herdam esse estado pecaminoso de
seus pais, os quais herdaram esse estado pecaminoso de seus pais, os quais,
herdaram de seus pais e assim sucessivamente, até chegar a Adão e Eva. 2) Outros
chamam isso de natureza pecaminosa, que se concentra no fato de que o pecado
corrompeu totalmente a natureza. A expressão “natureza pecaminosa” apresenta
um contraste claro entre essa natureza básica e seus frutos (atos particulares do
pecado). 3) Outros preferem, ainda, o termo “pecado original”, alegando que
o pecado original de Adão produziu a corrupção moral da natureza humana
transmitida, por herança, a cada geração posterior.

A evidência das Escrituras

A Bíblia diz, claramente, que todos os aspectos do ser humano estão


corrompidos. Somos, “por natureza, filhos da ira” – ou seja, objeto dessa ira
(Efésios, 2:3). É verdade que, por causa das nossas ações, também somos objeto da
ira de Deus, mas esse versículo refere--se a algo inato. Salmo 51:5 indica que isso
é algo que temos desde nossa concepção; não o adquirimos por ações praticadas
ao longo da vida.

A natureza pecaminosa afeta todos os aspectos da vida humana. (1)


Seu intelecto foi cegado (2 Coríntios, 4:4.). Sua mente é considerada reprovável
(Romanos, 1:28). Seu entendimento está obscurecido, alheio à vida de Deus
(Efésios, 4:18). (2) Suas emoções foram corrompidas e enganadas (Romanos,
1:21,24,26). (3) Sua vontade foi aprisionada ao pecado, portanto, está em oposição
a Deus (Romanos, 6:20; 7:20).

Depravação total

As evidências das Escrituras apresentam a base para o que normalmente


é chamado de depravação total. A palavra “depravação” significa perversão ou
corrupção. Embora não seja usada na versão de Almeida, algumas traduções
modernas utilizam como equivalente a adokinos em Romanos, 1:28. Essa expressão
grega tem a ideia de “ser reprovada em um teste” e fornece uma indicação de

91
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

como definir o conceito de depravação. Significa que o homem foi reprovado no


teste de agradar a Deus. Denota sua absoluta falta de mérito perante o Senhor.
Essa falha é total, pois: (a) afeta todos os aspectos da vida humana e (b) atinge
todas as pessoas [...].

As penalidades ligadas ao pecado herdado

A morte espiritual é a penalidade relacionada, de maneira particular, ao


pecado herdado. A morte sempre indica algum tipo de separação. Logo, a morte
espiritual significa separação da vida de Deus em nossa vida atual (Efésios, 2:1-
3). Se essa condição continuar imutável durante toda a vida, então ocorre a morte
eterna ou “segunda morte” (Apocalipse, 20:11-15).

A transmissão do pecado herdado

O próprio título indica como o pecado original é transmitido de uma


geração para outra, e para a seguinte, e assim sucessivamente. Herdamos o pecado
de nossos pais, como eles o herdaram de seus pais; tem sido assim desde Adão e
Eva. Após eles terem pecado, só seriam capazes de procriar e de gerar criaturas
em iguais condições, ou seja, seus filhos eram pecadores desde o nascimento
(Gênesis, 4:1; Salmo, 51:5; Romanos, 5:12). Isso significa que todo aquele que já
nasceu bom, tampouco nasceu parcialmente bom e parcialmente pecador. Todos
são igualmente pecadores aos olhos de Deus. Se isso não fosse verdade, então
os que fossem, digamos, 50% pecadores precisariam de apenas 50% da salvação
provida por Deus.

O remédio para o pecado herdado

O remédio é duplo: (1) A redenção inclui o julgamento da natureza


pecaminosa para que o cristão não esteja mais preso ao pecado (Romanos, 6:18;
8:1; Gálatas, 5:24). Tudo o que pertence à antiga natureza foi crucificado com
Cristo. A morte sempre implica separação; portanto, sua morte nos separou do
domínio do pecado original. (2) No entanto, a antiga natureza não é erradicada
até a ressurreição; por isso, Deus concedeu seu Espírito Santo para nos dar vitória
sobre o pecado em nossa vida diária.

Estamos separados do domínio do pecado pela morte de Cristo e livres de


seu domínio pelo poder do espírito.

FONTE: RIRYE, Charles. Teologia Básica. São Paulo: Mundo Cristão, 2004. p.251-252.

92
RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico você viu que:

 A tentação e queda no Éden começaram com o diabo – serpente – pondo dúvida


na mente da mulher, alegando que Deus estava privando-a de seus direitos.

 Na tentação, o tentador colocou Deus como inimigo da mulher e a instigou a


ser igual a Deus (Gênesis, 3:5). Então, a mulher viu que o fruto era bom para
se comer, agradável aos olhos e desejável para dar entendimento, e comeu do
fruto, dando-o também ao homem; e ambos pecaram.

 Ao transgredir, o homem errou o alvo para o qual Deus o criou: viver dentro
da vontade de Deus, em comunhão íntima com Ele.

 Ao pecarem, Adão e Eva sentiram-se alienados de Deus. Sentiram vergonha


e medo. Sentiram sua pequenez diante de Deus. Outra reação causada pela
transgressão foi evasiva, a desculpa que cada um colocou no outro: o homem
colocou a culpa na mulher, e esta, na serpente.

 Ao tratar sobre o assunto: o pecado de nossos primeiros pais, temos que levar
em conta duas questões:

1) Foi uma queda de seres perfeitos – alguns anjos e o homem passaram por
um período de teste de obediência; eles tinham capacidade de escolher entre
o bem e o mal.

2) Houve permissão de Deus para a tentação da serpente – a tentação, neste


contexto, é como uma experiência para purificar o homem.

93
AUTOATIVIDADE

1 Como você definiria pecado?

2 No que consiste o pecado herdado?

3 Segundo Charles Ryrie, qual é o remédio para o pecado herdado?

94
UNIDADE 3
TÓPICO 3

OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

1 INTRODUÇÃO
Adão e Eva pecaram e sofreram as consequências de sua transgressão.
Os homens continuam transgredindo a Lei de Deus e continuam sofrendo suas
consequências.

A raça humana vive em um estado de depravação, que abrange todas as


faculdades do homem, desfigurando, assim, a imagem de Deus nele. Os homens
tornaram-se incapazes para amar e se integrar. Por conta disto, estão tomados de
sentimentos de culpa, que os destroem. Por isso, sofrem. Morrem. Tudo por causa
do pecado.

NOTA

DEPRAVAÇÃO (universal) é a verdade bíblica que ensina estar toda humanidade


debaixo do domínio do pecado.

A rigor, todas as pessoas são pecadoras perante Deus. É a própria Palavra


de Deus quem diz que a pecaminosidade é universal.
8
Se afirmarmos que estamos sem pecado, enganamos a nós mesmos,
e a verdade não está em nós. 9 Se confessarmos os nossos pecados, ele
é fiel e justo para perdoar os nossos pecados e nos purificar de toda
injustiça. 10 Se afirmarmos que não temos cometido pecado, fazemos
de Deus um mentiroso, e a sua palavra não está em nós. (1 João 1.8-10).

2 A NATUREZA HUMANA APÓS A QUEDA


Agora precisamos pensar sobre a relação do pecado de Adão com a raça,
distinguindo o pecado herdado dos pecados que cometemos pessoalmente, por ação,
palavra ou pensamento.

95
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

2.1 INTERPRETAÇÕES QUE NEGAM A RELAÇÃO DO


PECADO DE ADÃO COM A RAÇA HUMANA
O que vamos elencar a seguir, são especulações (teorias) que negam haver
uma relação do pecado de Adão conosco hoje:

a) Pelagianismo. Esta teoria alega que a descendência de Adão não


herdou a natureza pecaminosa. Ensina que cada um peca, porque escolhe pecar
e que nossos primeiros pais foram apenas maus exemplos. Vale lembrar que esta
teoria foi condenada no Concílio de Cartago, em 418.

b) Liberalismo teológico. Seguindo a mesma linha do pelagianismo


(apenas com algumas variáveis), alguns teólogos liberais propõem a evolução do
homem e negam a historicidade de Adão.

c) Neo-ortodoxia. Alguns teólogos neo-ortodoxos consideram o relato


da queda como lenda, mito, que embora aponte para uma verdade espiritual,
contudo não se refere a fato histórico. (AGUIAR, 1999).

2.2 INTERPRETAÇÕES QUE AFIRMAM A RELAÇÃO DO


PECADO DE ADÃO COM A RAÇA
Assim como há aquelas teorias que negam a relação do pecado de Adão
com a raça, há aquelas que afirmam haver relação do pecado de Adão com a raça
humana.

a) Perspectiva arminiana. O arminanismo assegura que o homem herdou,


sim, a natureza pecaminosa, devido ao pecado original no Éden. Todavia, não é
responsável, nem tampouco tem culpa por isso.

NOTA

ARMÍNIO (1560-1609) foi pastor e teólogo holandês, que se postou contra a


predestinação absoluta ensinada por João Calvino.

b) Perspectiva federalista. Esta teoria defende que Adão teria duas relações
com a humanidade: a de chefe e a de chefe representativo de toda a raça humana
na “aliança das obras”. Pela sua relação natural com a humanidade, Adão não
poderia lançar sobre os seus descendentes a culpa dos seus erros, mas pela relação
pactual sim. (AGUIAR, 1999).

96
TÓPICO 3 | OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

c) Perspectiva realista. O ponto de vista desta teoria é orgânico e vital.


Ou seja, Adão é o cabeça natural da humanidade. Nesta perspectiva, a natureza
pecaminosa de Adão é transmitida para seus descendentes.

3 O PECADO NOSSO DE CADA DIA


O teólogo Inglês Packer (apud RYRIE, 2004, p.262) sintetizou: “Ninguém
é tão mau quanto poderia ser, enquanto que, nenhum de nossos atos é tão bom
quanto deveria ser”.

Aqui, precisamos dar uma breve explicação sobre a diferença entre pecado
original e pecados atuais. Leiamos 1 João (1:8-9), para facilitar nossa compreensão:
‘‘Se afirmarmos que estamos sem pecado, enganamos a nós mesmos, e a verdade
não está em nós. Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para perdoar
os nossos pecados e nos purificar de toda injustiça.’’

Quando você lê “pecado” no singular (v. 8), significa pecado original, ou


seja, a natureza caída do homem. Mas quando você lê “pecados” no plural (v. 9),
refere-se ao pecado atual, o pecado nosso de cada dia.

Portanto, a seguir, iremos pensar sobre “o pecado nosso de cada dia”, a


partir de Romanos, 5: 6 e 7.

3.1 A VIDA HUMANA SOB O DOMÍNIO DO PECADO


Agora, com uma caneta na mão, você pode sublinhar, no texto a seguir,
expressões negativas como: pecado, pecaram, pecou, pecadores, morte, morreram,
transgressão, juízo, condenação, desobediência:
12
Portanto, da mesma forma como o pecado entrou no mundo por
um homem, e pelo pecado a morte, assim também a morte veio a
todos os homens, porque todos pecaram; 13 pois antes de ser dada
a Lei, o pecado já estava no mundo. Mas o pecado não é levado em
conta quando não existe lei. 14 Todavia, a morte reinou desde o tempo
de Adão até o de Moisés, mesmo sobre aqueles que não cometeram
pecado semelhante à transgressão de Adão, o qual era um tipo daquele
que haveria de vir. 15 Entretanto, não há comparação entre a dádiva e
a transgressão. Pois se muitos morreram por causa da transgressão
de um só, muito mais a graça de Deus, isto é, a dádiva pela graça de
um só homem, Jesus Cristo, transbordou para muitos! 16 Não se pode
comparar a dádiva de Deus com a consequência do pecado de um só
homem: por um pecado veio o julgamento que trouxe condenação,
mas a dádiva decorreu de muitas transgressões e trouxe justificação.
17
Se pela transgressão de um só a morte reinou por meio dele, muito
mais aqueles que recebem de Deus a imensa provisão da graça e a
dádiva da justiça reinarão em vida por meio de um único homem,
Jesus Cristo. 18 Consequentemente, assim como uma só transgressão
resultou na condenação de todos os homens, assim também um só ato
de justiça resultou na justificação que traz vida a todos os homens. 19

97
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

Logo, assim como por meio da desobediência de um só homem muitos


foram feitos pecadores, assim também, por meio da obediência de um
único homem muitos serão feitos justos. 20 A Lei foi introduzida para
que a transgressão fosse ressaltada. Mas onde aumentou o pecado,
transbordou a graça, 21 a fim de que, assim como o pecado reinou na
morte, também a graça reine pela justiça para conceder vida eterna,
mediante Jesus Cristo, nosso Senhor. (Romanos, 5:12-21).

Todas estas expressões indicam que o pecado é um vírus que afetou toda
raça humana. É uma chaga universal. É um tormento coletivo. Este texto nos
mostra, também, que muitas coisas se tornaram más em consequência do pecado
de Adão, mas também mostra que Deus, pela Sua infinita misericórdia, apresenta
o remédio eficaz para este terrível mal que assola a humanidade: a graça de Deus
em Cristo Jesus.

Uma leitura criteriosa do texto revela que o pecado aqui descrito não é
apenas do ponto de vista moral, mas como um poder pernicioso ao qual todo o
homem está submetido, em que a morte é o destino comum de toda humanidade.
Expressão como “[...] a morte reinou desde o tempo de Adão até o de Moisés”
(v. 14) mostra que o juízo de Deus paira sob todos os membros da raça humana
que não estão em Cristo. Porém, não foi só o pecado de Adão que trouxe o juízo
de Deus, mas os pecados de cada um de nós (v. 16). Cada homem paga pelo seu
próprio pecado.

Somente em Jesus Cristo há solução para o pecado do homem. Na cruz,


Jesus propõe uma vida sem condenação. Uma vida sob a graça. A vida eterna (v.
21). Veja a seguir o quadro 3:

QUADRO 3 – CONTRASTE ENTRE ADÃO E CRISTO

ADÃO Romanos, 5:15-21 CRISTO


1. Muitos morreram por causa da 1. A dádiva pela graça de um só homem,
transgressão de um só (v.15). Jesus Cristo, transbordou para muitos
2. Por um pecado veio o julgamento que (v.15).
trouxe condenação (v.16). 2. A dádiva decorreu de muitas transgressões
3. Pela transgressão de um só a morte e trouxe justificação (v.16).
reinou (v.17). 3. A imensa provisão da graça e a dádiva da
4. Uma só transgressão resultou na justiça reinarão em vida (v.17).
condenação de todos os homens (v.18). 4. Um só ato de justiça resultou na justificação
5. Por meio da desobediência de um só que traz vida a todos os homens (v. 18).
homem muitos foram feitos pecadores 5. Por meio da obediência de um único
(v.19). homem muitos serão feitos justos (v.19).
6. A Lei foi introduzida para que a 6. Onde aumentou o pecado, transbordou
transgressão fosse ressaltada (v.20). a graça (v.20).
7. O pecado reinou na morte (v.21). 7. A graça reine pela justiça para conceder
vida eterna (v.21).
FONTE: Romanos (5:15-21)

98
TÓPICO 3 | OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

3.2 UM ESTILO DE VIDA QUE SE OPÕE AO PECADO


O pecado é o que mais atrapalha nossa relação com Deus. Em Cristo, o
pecado, a morte, a lei e a ira são destruídos (não aniquilados). Romanos (6:1 a
14) descreve o que aconteceu conosco através de Jesus Cristo, para vivermos em
novidade de vida: a pena do pecado é satisfeita. A morte de Jesus quitou a pena
do pecado. Assim, estamos livres do legalismo da Lei, para viver sob o domínio
da graça.

Leia com atenção os versículos 15 a 23, em que temos respostas claras às


perguntas: (1) de quem somos escravos? (2) Qual a recompensa da escravidão?
15
E então? Vamos pecar porque não estamos debaixo da Lei, mas
debaixo da graça? De maneira nenhuma! 16 Não sabem que, quando
vocês se oferecem a alguém para lhe obedecer como escravos, tornam-
se escravos daquele a quem obedecem: escravos do pecado que leva
à morte, ou da obediência que leva à justiça? 17 Mas, graças a Deus,
porque, embora vocês tenham sido escravos do pecado, passaram
a obedecer de coração à forma de ensino que lhes foi transmitida. 18
Vocês foram libertados do pecado e tornaram-se escravos da justiça.
19
Falo isso em termos humanos, por causa das suas limitações
humanas. Assim como vocês ofereceram os membros do seu corpo
em escravidão à impureza e à maldade que leva à maldade, ofereçam-
nos agora em escravidão à justiça que leva à santidade. 20 Quando
vocês eram escravos do pecado, estavam livres da justiça. 21 Que fruto
colheram então das coisas das quais agora vocês se envergonham? O
fim delas é a morte! 22 Mas agora que vocês foram libertados do pecado
e se tornaram escravos de Deus, o fruto que colhem leva à santidade,
e o seu fim é a vida eterna. 23 Pois o salário do pecado é a morte, mas
o dom gratuito de Deus é a vida eterna em Cristo Jesus, nosso Senhor.
(Romanos, 6:15-23).

O texto acima revela que pecado não é um mito ou uma invenção para
amedrontar o homem, como dizem os teólogos liberais, mas é uma realidade que
opera na vida das pessoas.

Na verdade, dois senhores lutam pelo domínio de nossa vida: Deus e o


pecado. É decisivo saber de qual senhor estamos sendo servos. Aqueles que estão
“em Cristo” devem se conscientizar que são servos de Deus e não do pecado. Esta
vitória começa com a obediência a Deus. A forma como esta passagem bíblica
descreve o pecado é para nos encorajar a levá-lo a sério. Deus trata o pecado como
uma realidade terrível. O pecado é uma realidade que leva o homem à prática do
mal e como consequência gera opressão, guerra, sofrimento e, por fim, a morte.
Portanto, por causa da fraqueza da nossa carne (v.19), devemos utilizar as armas
de Deus contra o pecado: a oração, a leitura bíblica etc.

Segundo o teólogo McGrath (2005, p. 508), ‘‘[...] para Agostinho toda a


humanidade é afetada pelo pecado em consequência da Queda [...]. Agostinho
desenvolveu essa ideia por meio de três importantes analogias: o pecado original
como “doença”, como “força” e como “culpa”.’’

99
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

a) A primeira analogia trata o pecado como uma doença hereditária


passada de geração em geração como vimos anteriormente. Essa doença
enfraquece a humanidade e não pode ser curada por nenhum ato humano. Cristo
é, desta forma, o médico divino, aquele por quem nossas feridas são curadas
(Isaías, 53:5), sendo a salvação entendida em termos essencialmente médicos e
curativos. Somos curados pela graça de Deus, de forma que nossas mentes possam
conhecer a Deus e nossos desejos possam corresponder à oferta da graça divina.

b) A segunda analogia trata o pecado como uma força que nos mantém
cativos e de cujo domínio somos totalmente incapazes de nos libertar. O livre-
arbítrio é rendido pela força do pecado e somente pode se libertar por meio da
graça. Assim, Cristo é visto como o libertador, a fonte da graça que destrói a força
do pecado.

c) A terceira analogia trata o pecado como um conceito essencialmente


forense ou jurídico – culpa – transmitida de uma geração a outra. Para uma
sociedade que valorizava excessivamente a Lei, como é o caso da sociedade do
antigo império Romano, em cujo contexto Agostinho viveu e trabalhou, essa era
considerada uma maneira particularmente proveitosa de entender o pecado.
Nesta analogia, Cristo veio para trazer absolvição e o perdão.

3.3 A TENSÃO PERMANENTE ENTRE O QUERER E O FAZER


É inegável o conflito de todo homem com o pecado. Apesar de estarmos
libertos da condenação do pecado, por meio da morte de Jesus Cristo na cruz,
ainda estamos expostos às influências pecaminosas. Todavia, como afirma
Gruden (2006), “[...] nossa posição legal perante Deus fica inalterada”.

Romanos 7 revela a expressão interna desse conflito. Nos versículos 4 a 6,


a Bíblia utiliza uma analogia do conflito (ilustração do casamento), para ensinar
que, espiritualmente, estamos mortos para a lei por meio da morte de Cristo, ou
seja, uma vez que Cristo morreu por todos, estamos livres do poder da Lei. Isso
tudo, porque a função básica da Lei é revelar o pecado. Portanto, em si mesma, a
Lei é santa, boa e justa. As exigências da Lei foram cumpridas por meio da morte
de Jesus na cruz.

NOTA

LEI. A palavra “Lei” é utilizada em três sentidos: como um princípio (v.21), como
a lei de Deus (v.22), e como lei do pecado (v.23). Todas essas leis entram em atuação na vida
do homem e fazem com que ele se sinta “miserável” (v.24).

100
TÓPICO 3 | OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

A lei expõe o pecado do homem, mas não faz nada para curá-lo. Então,
os judeus, como também os gentios, têm de se confessar moralmente
falidos. Se existe alguma esperança para qualquer dos dois grupos,
terá de ser achada na misericórdia de Deus, e não em alguma
reivindicação que os homens ou as nações possam fazer-lhe. Em vista
do fato do pecado universal, o caminho para a aceitação por parte de
Deus em razão de nossas obras de justiça está fechado – e o avisto é
perfeitamente claro: nesta direção não há nenhuma entrada”. (BRUCE,
1999, p. 80).

Em Romanos, 7:13-25, temos a descrição da tensão entre o ideal e o real.


O texto mostra o drama do homem em seu estado corrompido pelo pecado e de
morte espiritual, ele é incapaz de responder positivamente a Deus, pois mesmo
sabendo o que precisa fazer (a vontade de Deus), mas quando olhamos para os
seus atos cometidos, vê quão longe está do ideal divino:
13
E então, o que é bom se tornou em morte para mim? De maneira
nenhuma! Mas, para que o pecado se mostrasse como pecado, ele
produziu morte em mim por meio do que era bom, de modo que por
meio do mandamento ele se mostrasse extremamente pecaminoso. 14
Sabemos que a Lei é espiritual; eu, contudo, não o sou, pois fui vendido
como escravo ao pecado. 15 Não entendo o que faço. Pois não faço o
que desejo, mas o que odeio. 16 E, se faço o que não desejo, admito que
a Lei é boa. 17 Neste caso, não sou mais eu quem o faz, mas o pecado
que habita em mim. 18 Sei que nada de bom habita em mim, isto é, em
minha carne. Porque tenho o desejo de fazer o que é bom, mas não
consigo realizá-lo. 19 Pois o que faço não é o bem que desejo, mas o mal
que não quero fazer, esse eu continuo fazendo. 20 Ora, se faço o que não
quero, já não sou eu quem o faz, mas o pecado que habita em mim. 21
Assim, encontro esta lei que atua em mim: Quando quero fazer o bem,
o mal está junto a mim. 22 No íntimo do meu ser tenho prazer na Lei
de Deus; 23 mas vejo outra lei atuando nos membros do meu corpo,
guerreando contra a lei da minha mente, tornando-me prisioneiro da
lei do pecado que atua em meus membros. 24 Miserável homem que
eu sou! Quem me libertará do corpo sujeito a esta morte? 25 Graças
a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor! De modo que, com a mente,
eu próprio sou escravo da Lei de Deus; mas, com a carne, da lei do
pecado. (Romanos, 7:13-25).

A expressão “corpo sujeito a esta morte” (v.24) representa a herança


adâmica, que significa morte espiritual.

O conceito de pecado descrito anteriormente é de um poder demoníaco


que escraviza o homem. Nesta condição, Berkhof (1990), afirma que o homem não
é capaz de fazer sozinho o que é preciso para agradar a Deus, a saber, abrir mão
de sua autonomia e rebeldia e se submeter a Deus como Rei-Criador, dando a ele
toda a glória. Porém, nesta mesma linha de pensamento, Gruden (2006) diz que a
incapacidade total não significa que o homem caído é incapaz de fazer o bem em
todos os sentidos. Pela graça comum, ele pode realizar o bem, na forma de atos
de bondade e amor. Ele pode realizar, em certa medida, a justiça civil e criar um
governo que consiga sustentar a ordem na sociedade. Pode criar cultura, arte e
toda a sorte de instrumentos que reflitam beleza, tecnologia e conhecimento.

101
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

O versículo 18 sugere que o pecado corrompeu o intelecto, as emoções, a


vontade e até mesmo o corpo do homem. Como diz Ferreira (2007, p. 459), “[...] a
depravação total significa justamente isto: a contaminação de todas as esferas da
humanidade pelo pecado”. Contudo, nos versículos 24 e 25, Paulo fala da vitória
sobre o pecado. Qual é o segredo desta vitória? Manter a carne sob o domínio do
Espírito Santo, conforme está descrito no capítulo 8 de Romanos.

3.4 CLASSES DE PECADO


Do ponto de vista do perdão divino, o pecado não está dividido em classe.
Porém, para facilitar nossa compreensão deste item, podemos apontar quatro
tipos de pecados:

a) Pecados de presunção: são os que resultam da premeditação e de uma


vontade a serviço da injustiça (Salmo 19:12-13; Isaías, 5:18; Mateus, 7:2-3; Efésios,
4:14).

b) Pecados de comissão e omissão: em Mateus, 25:31-46, no grande


julgamento, são mencionados cinco pecados de omissão.

c) Pecados sociais: são pecados de infidelidade no cumprimento de nossas


responsabilidades diante de Deus (Gênesis, 39:9; Êxodo, 23:7).

d) Pecados contra o Espírito Santo: são aqueles pecados que se atribui


maliciosamente a poderes malignos, o que é realizado pelo poder do Espírito
Santo (Mateus, 12:32; Lucas, 12:10).

Em suma, o teólogo Elliff (2004) elencou 35 razões para não pecar. Veja-as:

1. Porque um pequeno pecado leva a mais pecados.


2. Porque o meu pecado evoca a disciplina de Deus.
3. Porque o tempo gasto no pecado é desperdiçado para sempre.
4. Porque o meu pecado nunca agrada a Deus; pelo contrário, sempre O
entristece.
5. Porque o meu pecado coloca um fardo imenso sobre os meus líderes
espirituais.
6. Porque, no devido tempo, o meu pecado produz tristeza em meu coração.
7. Porque estou fazendo o que não devo fazer.
8. Porque o meu pecado sempre me torna menor do que eu poderia ser.
9. Porque os outros, incluindo a minha família, sofrem consequências por causa
do meu pecado.
10. Porque o meu pecado entristece os santos.
11. Porque o meu pecado causa regozijo nos inimigos de Deus.
12. Porque o meu pecado me engana, fazendo-me acreditar que ganhei, quando,
na realidade, eu perdi.

102
TÓPICO 3 | OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

13. Porque o pecado pode impedir que eu me qualifique para a liderança


espiritual.
14. Porque os supostos benefícios de meu pecado nunca superam as
consequências da desobediência.
15. Porque o arrepender-me do meu pecado é um processo doloroso, mas eu
tenho que arrepender-me.
16. Porque o meu pecado pode influenciar outros em troca de uma perda eterna.
17. Porque o meu pecado pode influenciar outros a pecar.
18. Porque o meu pecado pode impedir que outros conheçam a Cristo.
19. Porque o pecado menospreza a cruz, sobre a qual Cristo morreu, com o
objetivo específico de remover o meu pecado.
20. Porque é impossível pecar e seguir o Espírito Santo, ao mesmo tempo.
21. Porque Deus escolheu não ouvir as orações daqueles que cedem ao pecado.
22. Porque o pecado rouba a minha reputação e destrói o meu testemunho.
23. Porque outros, mais sinceros do que eu, são prejudicados por causa do meu
pecado.
24. Porque todos os habitantes do céu e do inferno testemunharão sobre a tolice
deste pecado.
25. Porque a culpa e o pecado podem afligir minha mente e causar danos ao
meu corpo.
26. Porque o pecado misturado com a adoração torna insípidas as coisas de
Deus.
27. Porque o sofrer por causa do pecado não tem alegria nem recompensa, ao
passo que sofrer por causa da justiça tem ambas as coisas.
28. Porque o meu pecado constitui adultério com o mundo.
29. Porque, embora perdoado, eu contemplarei novamente o pecado no
Tribunal do Juízo, onde a perda e o ganho das recompensas eternas serão
aplicados.
30. Porque eu nunca sei por antecipação quão severa poderá ser a disciplina
para o meu pecado.
31. Porque o meu pecado pode indicar que ainda estou na condição de uma
pessoa perdida.
32. Porque pecar significa não amar a Cristo.
33. Porque minha indisposição em rejeitar este pecado lhe dá autoridade sobre
mim, mais do que estou disposto acreditar.
34. Porque o pecado glorifica a Deus somente quando Ele o julga e o transforma
em uma coisa útil; nunca porque o pecado é digno em si mesmo.
35. Porque eu prometi a Deus que Ele seria o Senhor de minha vida.

Renuncie seus direitos.


Rejeite o pecado.
Renove sua mente.
Confie em Deus.

103
UNIDADE 3 | DOUTRINA BÍBLICA DO PECADO (HAMARTIOLOGIA)

LEITURA COMPLEMENTAR

ALGUMAS APLICAÇÕES PRÁTICAS DA DOUTRINA DO PECADO

Franklin Ferreira
Alan Myatt

Em primeiro lugar, o pecado é o mal sem par, não existe nada mais
nocivo do que o pecado. O pecado é errar o alvo estabelecido pela lei de Deus, é
infidelidade, desvio do caminho, saída do aprisco, cegueira e surdez, transgressão
e incapacidade. “pecado é uma fera rosnando à porta”. Por isso, concordamos
com o que escreveu Ralph Venning; “O mal do pecado é pior do que qualquer
outra perturbação e aflição, pior que a morte, pior que o próprio diabo, pior que
o inferno. Essas quatro coisas são verdadeiramente terríveis: oramos pedindo a
Deus que nos livre delas. Todavia, nem todas elas juntas são tão nocivas para
nós quanto um estilo de vida pecaminoso”. Isto porque “pode-se sofrer e não
pecar; mas é impossível pecar não sofrer. O pecado tem poder de desfigurar e
perverter tudo que foi criado bom por Deus. Seu poder é caricatural e parasitário,
uma anomalia, loucura e vício. Por isto, devemos odiar o pecado, fugindo dele
em direção ao Deus santo, em humildade, contrição, lágrimas e arrependimento
contínuo.

Em segundo lugar, a doutrina do pecado é importante para a formulação


da doutrina da salvação. O pecador, por ser incapaz de se voltar para Deus,
depende de uma intervenção radical em sua vida, para ser salvo. Ele não consegue
se tornar cristão por força de sua própria decisão. Estando preso ao seu pecado, a
única escolha que ele fará, ao ouvir o chamado, é rejeitar a Jesus. Por isso, é preciso
que o espírito Santo intervenha para capacitar o pecador a receber a Cristo. Assim,
não cabe aos pregadores e evangelistas a tarefa de converter as pessoas, por meio
de métodos humanos de persuasão. O resultado da evangelização é determinado
pelo Senhor. E ele promete que sua Palavra cumprirá o seu propósito.

Em terceiro lugar, a doutrina do pecado revela uma realidade que é


absolutamente necessária encarar para ser salvo. No dia do juízo final, muitos
que acham que são cristãos descobrirão que não são. Eles podem até ter tido uma
experiência religiosa, mas nunca se arrependeram de verdade. Muitas vezes isso
pode ser por não entender quão grave é o pecado. Não basta ter um folheto, recitar
uma oração escrita ou levantar a mão durante o apelo, para alcançar a vida eterna.
É preciso chegar a um arrependimento profundo, e isso não acontece sem que a
pessoa conheça a depravação e o estado de desamparo total no qual o pecador
vive. Por isso, o evangelista deve pregar sobre o pecado e mostrar ao pecador
o horror do estado de sua existência. O pecador deve entender a natureza da
sujeira e maldade que poluem o seu coração. Somente assim, ele deve confessar
sua incapacidade de se salvar, e confiar totalmente na graça infinita do Senhor. O
pregador, então, não deve deixar de pregar sobre o pecado.

104
TÓPICO 3 | OS PECADOS REAIS (PESSOAIS)

Em quarto lugar, o fato de Deus não derramar sua ira e juízo sobre os
pecados ao nosso redor não deve nos levar a uma atitude cínica ou descuidada.
Temos a tendência de pensar que Deus ignora o pecado, porque os seus juízos
não são imediatos. Porém, se Deus fosse trazer juízos tão logo quanto os homens
e mulheres pecassem, em pouco tempo não haveria mais nenhuma pessoa sobre
a face da Terra! Todavia, o pecado será finalmente punido, ainda quando não
seja punido imediatamente. Que a longanimidade de Deus seja ocasião de ainda
encontrá-lo!

Uma última aplicação tem a ver com nossos relacionamentos uns com
os outros. Francis Schaeffer disse que, em toda interação com outras pessoas,
devemos sempre lembrar duas coisas. Por um lado, o outro é criado à imagem de
Deus, e assim merece ser tratado com toda dignidade, que reflita o valor infinito
que ele recebeu de Deus. Por outro, o outro é pecador, carente do amor e da
justiça de Deus, assim como de nossa paciência, amor e perdão. Nunca devemos
nos enganar, achando que somente o outro que pode cair e não nós mesmos. A
doutrina do pecado deve manter-nos vigilantes, e em dependência total de Deus,
em nossa luta para vencer o pecador.

FONTE: FERREIRA, Franklin; MYATT, Alan. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 2007.
p.477-479.

105
RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico você viu que:

 Todos somos pecadores diante de Deus.

 Deus é infinitamente misericordioso para perdoar nossos pecados.

 Podemos dividir os pecados em classes para melhor compreensão.

106
AUTOATIVIDADE

1 Na sua perspectiva, qual é a diferença entre “pecado original” e “pecados


atuais?”

2 Estabeleça um contraste entre Adão e Cristo.

3 Quais são as três analogias que Agostinho utilizou para explicar o pecado
original?

107
108
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