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Extrato de Ata
Data da Sessão
Órgão Julgador
27/04/2021
DECISÃO PROFERIDA
EMENTA: HABEAS CORPUS. DEFESA CONSTITUÍDA. DESERÇÃO DE OFICIAL. ART. 188, INCISO II,
DO CÓDIGO PENAL MILITAR. AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. ERRO NA CONTAGEM DOS DIAS DE
AUSÊNCIA NECESSÁRIOS PARA CARACTERIZAÇÃO DO CRIME DE DESERÇÃO. TRANCAMENTO DA
AÇÃO PENAL MILITAR. IMPROCEDÊNCIA. OFICIAL AGREGADO ANTECIPADAMENTE. IMPEDITIVO
DA CONSUMAÇÃO DELITIVA. REJEIÇÃO. ORDEM. DENEGAÇÃO. DECISÃO POR UNANIMIDADE.
Com a suspensão do prazo de graça, por força de Decisão liminar proferida pelo Tribunal
Regional Federal da 2ª Região, no bojo de recurso de Agravo de Instrumento, a publicação de
posterior Decisão cassando os efeitos da citada liminar é suficiente para autorizar a retomada
imediata da contagem do prazo necessário para configurar a deserção.
Perfeitamente hígidos estão a lavratura do termo de deserção, bem como o consequente ato
de agregação do oficial, visto que o Oficial da Marinha foi agregado logo após se tornar
desertor, nos exatos termos do § 1º do art. 454 da Lei Adjetiva Castrense, não havendo,
portanto, falar em agregação prévia à consumação delitiva, como mencionado pelo
impetrante.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Superior Tribunal Militar, em sessão de
julgamento por videoconferência, sob a presidência do Ministro Gen Ex LUIS CARLOS GOMES MATTOS, na
conformidade do Extrato da Ata de Julgamento, por unanimidade, em conhecer do writ e em denegar a
Ordem por falta de amparo legal.
RELATÓRIO
Trata-se de Habeas Corpus impetrado pelo advogado Dr. Jorge Cesar de Assis, em favor do Capitão de Corveta
MIESHER LAGE RODRIGUES, visando o trancamento da Ação Penal nº 0000035-10.2014.7.02.0102, em curso
na 1ª Auditoria da 2ª CJM, por ausência de justa causa, em face de erro na contagem dos dias de ausência
necessários para caracterizar o crime de deserção, além do fato de ter sido o oficial agregado
antecipadamente, impedindo a consumação delitiva.
Registra a exordial que o MPM ofereceu Denúncia no dia 22/5/2014, em face do paciente ter supostamente
praticado o crime previsto no art. 188, inciso II[1], do CPM (evento 1, documento 3, da APM) e não ter se
Consta dos autos que ele desertou e não retornou ao serviço após uma licença de 2 (dois) anos para tratar de
interesse particular, encontrando-se, atualmente, na condição de trânsfuga, residindo em outro país, nos EUA,
endereço: 1215- Lockood Drive, Buffalo Crove, Illinois, CEP 600089, USA.
No dia 22/6/2014, o Juiz Federal Substituto da 1ª Auditoria da 2ª CJM recebeu a Denúncia oferecida em
desfavor do aludido réu (evento 1, documento 4, da APM).
Em Sessão de Julgamento de 17/9/2019, o Plenário do STM, por unanimidade, conheceu do writ e, por maioria,
denegou a ordem por não verificar qualquer tipo de constrangimento ilegal ou abuso de poder em face da Ação
Penal Militar em questão.
No dia 15/10/2019, a combativa Defesa interpôs novo Habeas Corpus, distribuído nesta Corte sob nº
70001167-76.2019.7.00.0000, requerendo, em sede liminar, a suspensão da Ação Penal Militar nº 35-
10.2014.7.02.0102 e, no mérito, o trancamento da referida APM. O pedido liminar restou indeferido pelo
Ministro-Relator Gen Ex Luis Carlos Gomes Mattos.
Em Sessão de Julgamento de 19/12/2019, os Ministros desta Corte, por unanimidade, conheceram do Habeas e
denegaram a ordem, consoante se observa da Ementa do julgado, in verbis:
Como é cediço, a hermenêutica, como uma das suas regras fundamentais, alinha a de que a
interpretação da lei não pode conduzir ao absurdo, que, in casu, começaria a revelar-se com o
empréstimo a uma regra adjetiva, procedimental - qual seja a prevista no § 4º do art. 454 do
CPPM - de um significado de preceito de natureza material - isto é, de causa interruptiva da
prescrição, nos moldes do inciso I do § 5º do artigo 125 do CPM -, resultando daí a aberrante
conclusão de que o oficial pode, ao seu alvedrio, frustrar a Ação Penal Militar por Deserção com
o mero artifício de se manter na condição de trânsfuga por mais de 4 anos.
Em 16/1/2021, o impetrante, uma vez mais, interpôs novo Habeas Corpus, distribuído sob o nº 7000030-
88.2021.7.00.0000. Inicialmente, postulou pela concessão de medida liminar, a fim de suspender o processo de
deserção nº 0000035-10.2014.7.02.0102, até final do julgamento. No mérito, insistindo pela confirmação
liminar, requereu o trancamento da Ação Penal por ausência de justa causa em face de erro na contagem do
prazo de graça, além do fato de ter sido o oficial agregado antecipadamente, impedindo a consumação
criminosa. Por fim, a Defesa requereu direito de sustentação oral por ocasião do julgamento.
Na recente Decisão, datada de 19/1/2021, período de recesso forense, o Ministro-Presidente deste Tribunal
indeferiu o pleito liminar (evento 6), conforme se observa in verbis:
"(...) Verifica-se que, ao contrário do que alega a Defesa, a decisão de primeira instância que
indeferiu o pleito defensivo também ora pretendido (autos 35-10.2014.7.02.0102, evento 89)
está fundamentada ao aferir não existir vícios nos autos do processo.
Deste modo, nesta análise perfunctória dos autos, não verifico a fumaça do bom direito,
requisito necessário para o deferimento da liminar.
Em 21/1/2021, foram prestadas relevantes informações pela 1ª Auditoria da 2ª CJM (evento 12).
Instada a se manifestar, em 25/1/2021, a Procuradoria-Geral da Justiça Militar, por meio de seu Subprocurador-
Geral Dr. Carlos Frederico de Oliveira Pereira, opinou pelo conhecimento e pela denegação da ação
constitucional por falta de amparo legal.
A Defesa constituída acostou Petição em 3/2/2021, na qual renovou o pedido para sustentar oralmente suas
razões pelo sistema de videoconferência, conforme dispõe o Ato Normativo nº 426/2020 editado por esta
Corte.
É o Relatório.
VOTO
Preenchidos os requisitos de admissibilidade, deve ser conhecido o presente Habeas Corpus.
No seu arrazoado, aduz que "o agravo de instrumento nº 0000508-31.2012.4.02.0000, do Egrégio Tribunal
Regional Federal da 2ª Região, foi julgado prejudicado em data de 13/1/2014, e sua decisão disponibilizada em
23 de janeiro e publicada em 24 seguinte. Prejudicado o AI, cessou a causa suspensiva que ele, em sede de
liminar, determinara. Publicada a decisão em 24/1/2014, uma sexta-feira, o prazo recursal iniciou-se na
segunda feira dia 27/1/2014, e tendo transcorrido in albis, ocorreu o trânsito em julgado da decisão no dia
10/3/2014, conforme constou da certidão da 11ª Vara Federal do Rio de Janeiro".
Argumenta que "ainda que se considerasse o trânsito em julgado somente para o CC MIESHER LAGE
RODRIGUES (agravante), iniciado o prazo recursal em 27/1/2014, o decurso do referido prazo ocorreria às
23:59h, do dia 31/1/2014, e o prazo de graça recomeçaria a contagem a partir da zero hora do dia 1º de
fevereiro, consumando a deserção a zero hora do dia 4/2/2014 - e nunca no dia 28/1/2014".
Inicialmente convém registrar que o termo "trancamento" não encontra menção na legislação. A propósito, o
doutrinador Paulo Rangel[2] pontua que "não se tranca ação penal ou inquérito policial"; se arquiva o inquérito
ou se extingue o processo com ou sem resolução do mérito, já que a ação penal "tem seu pedido julgado
procedente ou improcedente, mas jamais trancado". Todavia, a linguagem forense consagrou o termo
"trancamento", à margem da legislação, tendo, inclusive, ganhado reconhecimento doutrinário.
Após uma profícua análise, verifiquei que o conjunto probatório acostado aos autos não permite um veredicto
favorável ao ora impetrante.
Para bem esclarecer a evolução e o atual estágio da quaestio sub judice, convém trazer a lume o relevante
teor das informações apresentadas pelo Juiz Federal da Justiça Militar da 1ª Auditoria da 2ª CJM (evento 12), in
litteris:
"Senhora Ministra-Relatora,
1. Em atenção à Decisão exarada nos autos do HC em epígrafe, impetrado pelo advogado Dr.
Jorge César de Assis, em favor do paciente Capitão de Corveta Miesher Lage Rodrigues,
encaminho as informações esclarecedoras e necessárias ao julgamento do writ.
7. O Ministério Público Militar ofereceu denúncia em face do Capitão de Corveta Miesher Lage
Rodrigues em 22.05.2014, como incurso no crime tipificado no artigo 188, inciso II, do Código
Penal Militar (fls. 02/03 da APM nº 0000035-10.2014.7.02.0102/evento 1, documento 3, página
8. A denúncia foi recebida em 20.06.2014, pelo então Juiz-Auditor Substituto, Dr. Jorge
Marcolino dos Santos, determinando que os autos permanecessem aguardando a apresentação
voluntária ou a captura do acusado, conforme disposto no artigo 454, §4º, do Código de
Processo Penal Militar (fl.6 da APM nº 0000035-10.2014.7.02.0102 / evento 1, documento 4,
página 3).
11. Em 06.03.2020, foi proferido despacho determinando a requisição à Polícia Federal dos
registros de entrada e saída do acusado do país nos últimos 5 (cinco) anos, bem como para
informar a atual situação do seu passaporte (se válido ou vencido e a data de vencimento).
13. A seguir, este Juízo oficiou ao Escritório de Representação do Ministério das Relações
Exteriores em São Paulo - ERESP/MRE solicitando as informações sobre a situação de possível
passaporte requerido pelo acusado e expedido pelo MRE (data de validade, local de expedição
e endereço indicado pelo requerente).
14. Em novo ofício, a Polícia Federal informou que "(...) foi localizado o documento de viagem
abaixo, expedido em nome do interessado: Passaporte comum brasileiro; Série/Número:
YB237716; Data de emissão: 22/03/2013; Data de validade: 21/03/2018; Órgão expedidor:
Ministério das Relações Exteriores (...) Ainda, em consulta ao Sistema de Tráfego Internacional
- STI - consta como último movimento em nome do interessado o de saída do país, em
15/11/2013 (...)". Na ocasião, a Polícia Federal solicitou encaminhar eventual Mandado de
Prisão válido e/ou medida que o impeça de obter novo documento de viagem, a fim de
responder a demanda enviada pelo procurador do interessado que pleiteava emissão de novo
passaporte junto ao MRE.
15. Desse modo, em 24.04.2020, este Juízo oficiou à Polícia Federal para reiterar a solicitação
feita por meio do Ofício nº 646/17-Sec.jr, deste Juízo, para que fossem adotadas as medidas
necessárias de averiguação e captura do desertor, caso este entrasse novamente em território
nacional. Além disso, solicitou a adoção das providências necessárias para que fosse feito o
registro no sistema STI-MAR (Medidas de Alertas e Restrições Ativas) da situação do referido
desertor como "procurado pela Justiça", status que impede o cidadão brasileiro de obter
passaporte, conforme dispõe o artigo 22 do Decreto nº 1.983, de 14.08.1996, caso esse
registro ainda não tivesse sido efetivado.
21. Em 29.07.2020, foi certificada a existência e anexados extratos de dois Habeas Corpus
impetrados em favor do acusado, quais sejam, HC nº 7000900-07.2019.7.00.0000 (originário
do HC nº 7000262-11.2019.7.02.0002) e HC nº 7001167-76.2019.7.00.0000, bem como de
Recurso Ordinário em face da Decisão proferida pela Corte Castrense nos autos do HC nº
7001167-76.2019.7.00.0000, em trâmite no STF sob o nº RHC nº 182161.
22. Em relação ao pedido da Defesa, este Juízo deixou de apreciar o pleito tendo em vista que
"(...) estando a quaestio juris (prescrição da ação penal militar) em trâmite recursal final sob o
crivo jurisdicional do eg. Supremo Tribunal Federal, descabe a este Juízo de 1ª instância decidir
o mérito do pedido formulado, sob pena de incorrer em indevida usurpação de competência e
descumprimento das decisões denegatórias emanadas pelos c. STM e STF (...)".
24. Assim, em 24.08.2020, o pedido da Defesa foi indeferido, tendo em vista que a
extinção da punibilidade decorrente da prescrição para o crime de deserção exige
uma dupla configuração: o transcurso do lapso temporal geral e o advento etário do
agente. A seguir, as partes não recorreram da decisão.
27. Desse modo, em 11.01.2021 , este Juízo indeferiu o pedido da Defesa, tendo em
vista que "(...) iniciado o período de graça em 31/12/2011, suspenso em 05/01/2012
e retomado em 25/01/2014, perfeitamente hígidos estão a lavratura do termo de
deserção e consequente ato de agregação do oficial, visto que a deserção
consumou-se em 28/01/2014 (...)".
28. Em 15.01.2021, decorreu o prazo do artigo 518 do CPPM, sem que houvesse interposição
de recurso pela Defesa.
32. Por fim, cabe esclarecer que os autos estão sobrestados aguardando a
apresentação voluntária ou captura do acusado, não tendo havido até a presente
data qualquer informação referente a eventual prisão.". (Grifos nosso.)
Como se observa, o paciente responde à ação penal pela prática de deserção por não retornar ao serviço
militar, após a concessão de uma licença de 2 (dois) anos para tratar de assuntos particulares, incorrendo
assim na prática do delito sub examine.
Os autos registram que o paciente, juntamente com a família, mantém residência fixa nos Estados Unidos da
América, país que não admite, conforme estipulado no Tratado de Extradição firmado com a República
Federativa do Brasil (artigo V, Item 5, do Decreto nº 55.750/1965), pedido de extradição tendo por base crime
propriamente militar, como é o caso em análise. Ressalte-se que, embora o oficial agregado permaneça
atualmente na condição de trânsfuga, exerce trabalho fixo desde 28/3/2016 em uma renomada empresa norte-
americana - Siemens Medical Solutioons (evento 53, documento 4, fl.2, da APM).
Posteriormente, com a publicação da Decisão que julgou prejudicado o Agravo de Instrumento no Diário Oficial
da União (DOU) de 24/1/2014, retomou-se, no dia seguinte ( 25/1/2014), a contagem do prazo, completando-
se mais de 8 (oito) dias de ausência, com consumação delitiva em 28/1/2014, de acordo com o art. 188,
inciso II, do CPM (evento 1, documento 1, fl. 84 da IPD). Ou seja, completaram-se os 3 (três) dias que
faltavam para consumar a deserção.
Com efeito, tendo sido o prazo suspenso por força de Decisão liminar (datada de 5/1/2012), proferida pelo
TRF2 no bojo de recurso de Agravo de Instrumento, a publicação de posterior Decisão cassando os
efeitos da citada liminar é suficiente para autorizar a retomada imediata da contagem do prazo
necessário para configurar a deserção, conforme ocorreu.
Publicado no Diário Oficial da União de 24/1/2014 o decisum que julgou prejudicada a suspensão da contagem
Nesse sentido, coaduno com argumento descrito pelo Juiz de primeira instância na decisão primeva (evento 89
da APM), in verbis:
Não há se falar, portanto, em vício a macular o presente feito especial de deserção." (Grifos
nosso.)
Ademais, a contagem do prazo necessário para a consumação da deserção obedece a regramento de natureza
material, ex vi do art. 16 do CPM[3], haja vista ser capaz de, inevitavelmente, influenciar na caracterização do
crime em espécie, bem como na consequente sanção apenatória estatal. Leia-se: Art.16. No cômputo dos
prazos inclui-se o dia do começo. Contam-se os dias, os meses e os anos pelo calendário comum.
Ao referir-se acerca da especialidade do prazo previsto no mencionado dispositivo legal, Guilherme de Souza
Nucci explica que "o prazo penal conta-se de maneira diversa do prazo processual penal. Enquanto neste não
se inclui o dia do começo, mas sim o do vencimento, naquele é incluído o primeiro dia, desprezando-se o
último". [4]
"Os prazos de natureza penal são improrrogáveis, mesmo que terminem em sábados,
domingos ou feriados. (...).
No Direito Processual Penal, por outro lado, a contagem dos prazos obedece fórmula diversa.
Estabelece o art. 798, §1º, do Código de Processo Penal que "não se computará no prazo o dia
do começo, incluindo-se, porém, o do vencimento".
Percebe-se, assim, ser o prazo processual mais amplo do que o penal" [5].
Verifica-se, pois, que os argumentos sustentados pelo impetrante têm suporte, por analogia, na contagem do
Direito Processual (art. 224 do CPC e art. 798 do CPP), que difere do prazo material incidente no caso em tela.
Nesse raciocínio, com precisão, assentou o Subprocurador-Geral da Justiça Militar Dr. Carlos Frederico de
Oliveira Pereira, em seu Parecer (evento 15), in verbis:
" A contagem do prazo de graça segue a regra do artigo 16 do CPM, de modo que,
diferentemente dos prazos processuais, inclui o dia do início. Ademais, conta-se
pelo calendário comum (os meses não são contados pelo exato número de dias, mas
de um certo dia do mês à véspera desse dia no mês seguinte, desprezando-se os
feriados ou se o ano é bissexto) e não é contado de hora a hora, como consta da
impetração. Ele é contado por inteiro, desprezando-se as frações do dia e de hora,
regra implícita no CPM, por interpretação lógica, posto que leva em consideração o
calendário comum, porém expressa no CP comum, no art. 11. Ou seja, o prazo conta-se
de 0 a 24 horas, por inteiro, desprezando-se as frações do dia (horas) e incluindo o dia inicial.
O impetrante para realizar a sua argumentação utiliza-se da contagem processual, que é
totalmente diferente e exclui o dia inicial, art. 224 do CPC e art. 798 CPP, por analogia.
Dessa forma, se o paciente se ausentou no dia 30/12/2011 - não importa a hora - a contagem
iniciou-se a zero do dia 31/12/2011. Foi suspenso em 06/01/2012 por decisão da justiça federal
comum. Admitindo-se a não contagem do dia 06 - os autos dão a entender que a decisão foi
Tudo isso apenas para argumentar sobre a contagem do prazo de graça, porque o paciente,
como dito, continua na condição de trânsfuga e, curiosamente, integrando os
quadros da Marinha de Guerra até hoje.
Ademais, não há amparo legal, nem jurisprudencial, para que este Tribunal considere que a retomada da
contagem do período de graça, para efeito de caracterizar a deserção do oficial (agregado), somente deveria
ocorrer a partir da data que publicou o trânsito em julgado da Decisão cassatória da liminar (ou seja, a partir
de 11/3/2014), e não, no dia 25/1/2014, dia posterior ao da publicação da mesma decisão.
Desconsiderar a data de publicação da Decisão judicial (24/1/2014) que cassou a medida liminar, fazendo
cessar a causa suspensiva da contagem do prazo de graça da deserção, para levar em conta somente a data
do trânsito em julgado, caracterizaria uma interpretação confusa em relação aos prazos penais e processuais,
e acarretaria, inevitavelmente, enorme prejuízo à aplicação da Lei penal castrense. Ora, a legislação militar
vigente considera ser a deserção uma falta gravíssima, mormente em se tratando de um oficial da Marinha, à
vista de o abandono injustificado causar prejuízos à defesa armada e à soberania do Estado, bem assim à
preservação da ordem pública da sociedade.
Não prospera o argumento do impetrante de que "ainda que se considerasse o trânsito em julgado somente
para o CC MIESHER LAGE RODRIGUES (agravante), iniciado o prazo recursal em 27/1/2014, o decurso do
referido prazo ocorreria às 23:59h, do dia 31/1/2014, e o prazo de graça recomeçaria a contagem a partir da
zero hora do dia 1º de fevereiro, consumando a deserção a zero hora do dia 4/2/2014 - e nunca no dia
28/1/2014".
Como mencionado, o prazo necessário de 8 (dias) para a configuração do delito de deserção é de direito
material, não estando sua contagem condicionada ao esgotamento do prazo recursal elencado pela Lei
processual civil, tampouco, pelo trânsito em julgado da decisão, mesmo que para o paciente, como
referendado pelo impetrante.
Para além, se a decisão prolatada pela Justiça Federal permitindo a suspensão da contagem do prazo,
provocou efeito instantâneo, impedindo o transcurso do tempo necessário para a consumação da deserção,
penso que, de igual modo, posterior decisão que cassou a medida liminar mencionada também é capaz de
produzir efeito apto a autorizar a imediata retomada do cômputo de dias legalmente necessários para
configurar a deserção, como deveras ocorreu.
A propósito, corroboro o argumento apresentado pelo Juízo da APM a que responde o paciente, quando expôs,
in verbis:
"Exigir o trânsito em julgado da referida decisão cassatória da liminar para o fim da retomada
Por outro lado, as informações prestadas pela 1ª Auditoria da 2ª CJM (evento 12) registram que o paciente foi
agregado em 28/1/2014, conforme Portaria nº 726/DPMM, de 10/4/2014, publicada em 16/4/2014 (evento 1,
documento 1, fl. 238, da APM).
Desse modo, ao revés do que sustenta o impetrante, perfeitamente hígidos estão a lavratura do termo de
deserção, bem como o consequente ato de agregação do oficial, visto que o Oficial da Marinha foi
agregado logo após se tornar desertor, nos exatos termos do § 1º do art. 454 da Lei Adjetiva
Castrense, não havendo, portanto, falar em agregação prévia à consumação delitiva como mencionado pela
Defesa.
Verifica-se inexistir erro na contagem do prazo de graça, nem sequer circunstância alguma que demonstre ter
sido o paciente agregado antes da prática delitiva, impedindo assim a consumação da deserção.
Cumpre observar que, para situações que se assemelham à da presente quaestio, o ordenamento jurídico
castrense, como cediço, exige maior responsabilidade pessoal e funcional e, por conseguinte, prescreve maior
reprovabilidade criminal frente à conduta de um oficial que abandona injustificadamente a unidade militar em
que serve.
Daí, por inexistir vício algum capaz de macular o processo de deserção deflagrado em face do Capitão de
Corveta Miesher Lage Rodrigues, denego a ordem por falta de amparo legal.
[2] RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 4. Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2001. p. 608.
[3] Contagem de prazo
Art. 16. No cômputo dos prazos inclui-se o dia do começo. Contam-se os dias, os meses e os
anos pelo calendário comum.
[4] Código Penal Militar comentado / Guilherme de Souza Nucci. - 2. ed. rev., atual. e ampl. - Rio
de Janeiro : Forense, 2014.
[5] Masson, Cleber, Direito Penal: parte geral (art.1º a 120) - v. 1 / Cleber Masson - 14ª ed. - Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2020. Pg. 153.