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O Alienista de Machado de Assis

Maria de Fátima Silva Gomes

maria.cmj.1001@gmail.com

Resumo

Neste breve ensaio apresentarei traços gerais sobre a vida de Machado de Assis que
foi um cronista e poeta com duas fases (a do romantismo e do realismo) assim como o
contexto social que o acompanhou. O foco recairá sobre a obra O Alienista da qual
será feito um resumo do enredo, uma breve análise de alguns pontos da construção da
obra e ainda sobre a temática da loucura (que começa a ser estudada a partir do
século XIX).

Palavras-chave: Realismo, Loucura, Machado de Assis, O Alienista, Ciência

Machado de Assis – a pessoa e a época

Joaquim Maria Machado de Assis nasceu ao vigésimo primeiro dia do mês de junho de
1831 no Rio de Janeiro no seio de uma família humilde: o pai era decorador e a mãe
(açoriana) era lavadeira. Apesar de se ter iniciado na área da escrita por volta dos
vinte anos e sem formação universitária, Machado considera que nada escreveu de
grande qualidade e tenta até ocultar a sua produção literária até aos trinta anos.
Podemos definir o alcance do estágio da maturidade literária de Machado de Assis
com a publicação de obras como Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas
Borba (1891) e Dom Casmurro (1899).

Casou-se com uma mulher portuguesa e foi cronista, poeta e crítico literário sendo que
a sua vasta obra abarca os mais diversos géneros.

Vai ser um dos fundadores da Academia Fluminense.

Em 1873 publica um ensaio intitulado “Instinto de Nacionalidade” no qual faz um


balanço sobre as tendências nacionalistas, nomeadamente o indianismo.

Os seus romances apresentam duas fases: uma voltada para o realismo e para a
observação; e uma outra para o lado das fantasias românticas assente no naturalismo.
A sua produção acaba por ser sul-generis, isto é, não apresenta características apenas
de uma escola literária, mas sim uma espécie de ecletismo. Podemos até dizer que o
seu estilo literário acompanha as mudanças filosóficas e políticas do Brasil. A sua data
de nascimento faz com que se enquadre na terceira e última geração romântica.
A sua obra Memórias póstumas de Brás Cubas marca o início do realismo no Brasil. O
escritor fluminense pode ser caracterizado pelo apreço ao nacionalismo que é muitas
vezes a sua fonte de inspiração. Porém, esta característica não está presente na
escolha do tema, mas sim na índole e nas personagens e na “sub-raça brasileira
cruzada” 1.

Alguns acontecimentos que marcam a época em que viveu Machado de Assis são o
pleno período regencial em que nasce; presencia o início da exportação do café;
assiste à aprovação da Lei do Ventre Livre que dizia que todos os filhos de escravos
seriam livres e à Lei dos Sexagenários, datada de 1885, na qual todos os escravos com
60 ou mais anos foram libertados. Depois de uma grande luta, em 1888 deu-se a Lei
Áurea, libertando assim todos os escravos e no ano seguinte, dá-se a proclamação da
república brasileira.

Na década de 1890, a situação do país não é muito próspera uma vez que se encontra
numa enorme crise económica devido às secas do interior. No campo da política, em
1991, é aprovada a primeira Constituição da República.

A Loucura

Uma questão que começa a ser estudada com afinco a partir do século XIX é a loucura,
porém, era um tema já abordado desde a idade média ainda que não se mencionasse
“loucura”, mas sim a distinção entre normalidade e anormalidade.

Na obra apresentada, é possível observar uma certa crítica aos psiquiatras que se
dedicavam a construir métodos que estudassem a loucura. Esta obra faz parte duma
tríada de obras que abordam a loucura de formas diferentes.

No Brasil, José Clemente Ferreira iniciou uma campanha para a criação de uma
instituição que pudesse acompanhar e tratar de pessoas ditas “loucas” ou como define
Machado de Assis: “alienistas”.

Em 1852 constrói-se o Hospício Pedro II – o primeiro hospital psiquiátrico do Brasil.

Graças ao tempo que se vivia, o positivismo, o darwinismo e o cientificismo iam


ganhando poder sobre a razão humana.

Uns anos mais tarde, é criada uma cadeira de psiquiatria e inserida no plano de
estudos das faculdades de medicina.

1
Romero, Sílvio. História da literatura brasileira. 5ª edição. Rio Janeiro: José Olympio,
1954. Vol. 5. p. 5.
Sobre O Alienista

O Alienista é uma obra publicada em 1881 e pertence à corrente literária do realismo.


Começa inicialmente por sair em fascículo na revista Estação e depois em Papéis
Avulsos. Aborda o tema da loucura.

A história desenrola-se na vila de Itaguaí no final do século XIX.

O primeiro personagem a ser apresentado e também protagonista é Simão Bacamarte,


um médico que veio de Portugal para Itaguaí. O médico entrega-se à ciência e casa-se
com D. Evarista não por amor, mas sim porque considerava que ela, devido a todo o
seu histórico de saúde, seria a mulher mais indicada para procriar. Infelizmente, terá
um desgosto desse ponto de vista uma vez que não terá filhos.

D. Evarista, por sua vez, ama o seu marido e respeita a sabedoria dele mas os ciúmes
pelo conhecimento dele e até pelo tempo que ele dedica à ciência. Face a isto, Simão
meio que a tenta manter ocupada ou distante para ela não se sentir assim e ao mesmo
tempo para que ela o deixe trabalhar em paz. Vai oferecer-lhe uma viagem ao Rio de
Janeiro e com ela vai a sua tia e a mulher do boticário que procurava louros à custa do
conhecimento de Simão.

É possível identificar as diferenças entre os dois: Simão só presta contas à ciência, tem
os olhos postos no futuro enquanto Crispim Soares limita-se a viver o presente, não
tem aspirações e é muito agarrado à mulher.

A Casa Verde, o hospital criado por Simão, vai ser lugar de repouso para muitas
pessoas que aparentemente estavam bem, mas que o médico diagnosticava como
desequilibradas psicologicamente segundo o seu estudo e as pessoas começam a
estranhar alguns internamentos.

Vendo que o padrão do normal mais parecia o oposto, ou seja, ser-se louco (do seu
ponto de vista, Simão Bacamarte decide começar a internar apenas quem segundo ele,
estariam perfeitamente bem a nível mental.

Depois de os “curar” tornando-os desequilibrados mentais e cada vez mais obcecado


com a ciência, Simão Bacamarte decide internar-se na Casa Verde e ser o seu próprio
objeto de estudo.

Após dezassete meses de retiro, Simão Bacamarte falece da mesma maneira que
iniciou os seus estudos: sem saber a verdadeira teoria.

O tipo de discurso utilizado é o discurso indireto livre uma vez por vezes, é o narrador
que nos conta o que foi conversado em determinada altura pelas personagens.

Sobre as personagens podemos salientar D. Evarista que já foi caracterizada


anteriormente; o boticário Crispim Soares que esteve sempre do lado de Simão
Bacamarte que o tinha como um protegido e o barbeiro Porfírio que foi consumado
pela ambição de poder, visto que foi ele que encabeçou as principais revoltas da
população contra o trabalho desenvolvido pelo Dr. Simão com o objetivo de ascender
ao poder da Câmara Municipal.

Machado de Assis explora o humano através das suas personagens e vai além do
exterior expondo a vaidade humana. De certa forma pode-se até dizer que existe uma
aproximação do personagem principal com o próprio autor uma vez que este estava
também interessado na exploração das atitudes humanas.

O título chega a ter uma certa carga de ironia porque dá a entender que existe alguém
alienado e ao longo do texto são identificados personagens que supostamente são
“malucos”, mas depois, desde o primeiro capítulo que o próprio Simão Bacamarte que
era responsável por identificá-los, é designado por “alienista”. Acabamos por ter uma
ideia de que o único “louco” seria mesmo ele e não quem ele internava.

A obra é narrada na 3ª pessoa e o narrador é omnisciente.

Atentando no excerto:
O vigário indagava do Rio de Janeiro, que ele não vira desde o vice-reinado anterior; e D.
Evarista respondia entusiasmada que era a coisa mais bela que podia haver no mundo. O
Passeio Público estava acabado, um paraíso onde ela fora muitas vezes, e a Rua das Belas
Noites, o chafariz das Marrecas … Ah! O chafariz das Marrecas! Eram mesmo marrecas – feitas
de metal e despejando água pela boca fora. Uma coisa galantíssima. O vigário dizia que sim,
que o Rio de Janeiro devia estar agora muito mais bonito. (Machado de Assis, Joaquim., O
Alienista)

É possível identificarmos o fenómeno na imagologia através da descrição do Rio de Janeiro


feita por D. Evarista.

Conclusão

O objetivo do autor e do narrador era estudar os limites do desequilíbrio mental e termina a


obra sem o conseguir ter feito. Começou por internar na Casa Verde os que considerava com
distúrbio mental e depois, mudou a técnica de estudo e ponderou que os verdadeiros doentes
fossem os que ele considerava bem a nível mental. No final, acaba ele mesmo por se internar
vindo a falecer mais tarde.

A partir das personagens do texto, ele vai representar a sociedade brasileira da altura que
servirá de inspiração para outros autores tardios.
Bibliografia

Andrade, Maria., Lima, Aluísio., Santos, Maria. A razão e a loucura na literatura: um


estudo sobre o alienista, de Machado de Assis. Revista Psicologia e Saúde, v.6, n. 1, p.
37-47, jan./jun. 2014.

Machado de Assis, Joaquim., O Alienista. Editora Guerra & Paz.

Romero, Sílvio. História da literatura brasileira. 5ª edição. Rio Janeiro: José Olympio,
1954. Vol. 5.

Salles, Henrique., O Império do Brasil no contexto do século XIX. Escravidão nacional,


classe senhorial e intelectuais na formação do Estado. 2012.

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