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Motricidade Humana
Autores: Prof. André De Fillipis
Prof. Gil Oliveira da Silva Junior
Profa. Cássia Regina Palermo Moreira
Colaboradoras: Profa. Vanessa Santhiago
Profa. Tânia Sandroni
Professores conteudistas: André De Fillipis / Gil Oliveira da Silva Junior /
Cássia Regina Palermo Moreira
André De Fillipis
Graduado em educação física pela Universidade Metodista de Piracicaba (2007), especialista em educação física
Escolar pela Universidade Nove de Julho (2011), mestre em educação física pela Universidade Metodista de Piracicaba
(Unimep), com trabalho desenvolvido na linha de pesquisa: Lazer, Educação e Movimento Humano. Atualmente é
docente da Universidade Paulista (UNIP) no curso de educação física licenciatura e bacharelado. Professor de educação
física do Ensino Médio do Colégio Madre Alix. Ministrou o módulo de recreação e lazer para o curso de técnico em
hotelaria no Senac/Piracicaba. Experiência na área de educação física, atuando principalmente nos seguintes temas:
recreação, lazer, educação física, motricidade humana e formação profissional, experiência na área de hotelaria e
turismo com viagens de estudo do meio e cruzeiros.
Formou-se em educação física pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Fez mestrado em Treino Desportivo para
Crianças e Jovens na Universidade de Coimbra, em Portugal, tendo o título reconhecido pela Escola de Educação Física
e Esporte da Universidade de São Paulo (EEFE-USP). Trabalha com treinamento esportivo com pessoas com deficiência
e alto rendimento na modalidade remo. Desde 2012, é professor no Ensino Superior, atuando, principalmente, com
ensino do esporte, aprendizagem e desenvolvimento motor, crescimento e desenvolvimento humano.
Bacharel em educação física (1996). Mestre em educação física (2002), com bolsa Capes, pela Escola de Educação Física
e Esporte da Universidade de São Paulo (USP). Doutora em Ciências (2011), com bolsa CNPq, pelo Instituto de Psicologia
(USP). Graduanda em direito pelas Faculdades Integradas de Guarulhos (FIG – Unimesp). Docente no Ensino Superior em nível
de graduação desde 2003. Pesquisadora nas áreas de: aspectos psicológicos e filosóficos da educação física e do esporte –
formação e intervenção profissional; ética e direitos humanos: questões sobre dignidade e corporeidade.
CDU 796
U504.20 – 20
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem
permissão escrita da Universidade Paulista.
Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Comissão editorial:
Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)
Apoio:
Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
Projeto gráfico:
Prof. Alexandre Ponzetto
Revisão:
Marcilia Brito
Vitor Andrade
Sumário
Corporeidade e Motricidade Humana
APRESENTAÇÃO.......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO............................................................................................................................................................7
Unidade I
1 CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA............................................................................................9
1.1 A corporeidade na história da humanidade..................................................................................9
1.1.1 O pensamento do corpo da Grécia Antiga à Idade Moderna................................................ 10
1.1.2 O corpo – do Renascimento a uma nova concepção, com o capitalismo....................... 20
1.1.3 A corporeidade contemporânea........................................................................................................ 28
2 A MOTRICIDADE HUMANA NA EDUCAÇÃO FÍSICA E NA FISIOTERAPIA.................................... 37
3 A CORPOREIDADE NA EDUCAÇÃO FÍSICA E NA FISIOTERAPIA...................................................... 40
4 O PROFISSIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA, A FISIOTERAPIA E A CORPOREIDADE..................... 46
Unidade II
5 QUALIDADE DE VIDA E CORPOREIDADE................................................................................................. 55
5.1 A percepção objetiva da qualidade de vida................................................................................ 59
5.2 A percepção subjetiva da qualidade de vida.............................................................................. 63
5.3 A relação entre as esferas das percepções objetiva e subjetiva......................................... 65
6 INSTRUMENTO PARA MEDIÇÃO DA QUALIDADE DE VIDA.............................................................. 68
6.1 Índice de Desenvolvimento Humano – IDH............................................................................... 69
6.2 Os instrumentos WHOQOL - 100 e WHOQOL - bref............................................................... 70
7 QUALIDADE DE VIDA E CORPOREIDADE................................................................................................. 77
8 EDUCAÇÃO FÍSICA, FISIOTERAPIA E QUALIDADE DE VIDA.............................................................. 81
8.1 Esporte e qualidade de vida.............................................................................................................. 90
APRESENTAÇÃO
Esta disciplina tem a finalidade de analisar as vivências da corporeidade ao longo da história, mediante
a identificação dos paradigmas científicos e das teorias que influenciam suas diversas concepções de
corpo, trazendo à tona o discurso da corporalidade, e a vivência das possibilidades de identificar o corpo,
de modo sensível e reflexivo, nas relações consigo mesmo, com o outro e com o mundo, bem como o
corpo enquanto lugar de construção de saberes e abrigo de múltiplas inteligências, sensações, emoções
e inciativas crítico-criativas.
Ao fim desta disciplina, com o auxílio deste livro-texto, você será capaz de:
INTRODUÇÃO
Hoje em dia, o corpo pode ser estudado por diversas formas e contextos, principalmente dentro
da educação física e da fisioterapia, em que as áreas de estudos podem ser divididas em contextos
biológico, psicológico e social. Contudo, a observação do corpo deve ser vista e reconhecida como
uma totalidade de aspectos, que se interligam e interagem criando uma reflexão de sensações que
constituem esse corpo.
Contudo, para entendermos essa totalidade, é necessário colocar em evidência “esse corpo”, o qual
pertence a uma (ou mais) cultura(s) e com ela(s) se relaciona e se altera, havendo diversas ideias e objetos de
interação, em especial, mediante o movimento. Assim, a corporeidade é caracterizada pelo preenchimento
do espaço pela ação do corpo em movimento, criando um homem como o ser no mundo, resgatando a
ideia de interação do sujeito influenciado pela cultura, e a cultura sendo modificada pelo sujeito.
Ainda, é preciso refletir como a corporeidade e sua relação com a cultura em que o corpo está
inserido afetam, juntamente com a motricidade, a qualidade de vida do indivíduo.
8
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Unidade I
1 CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Os estudos sobre as ações do corpo do ser humano são divididos em diversas áreas de pesquisa.
As investigações sobre o corpo humano são divididas em áreas como a Psicologia, a Anatomia, a
Biologia, a Fisiologia Humana e do Exercício, dentre outras.
Todavia, essa segregação do corpo humano em partes não é capaz de retratar o corpo em
sua totalidade, especialmente o diálogo entre as diversas áreas de estudos, pois são inúmeras
as vertentes de entendimento, seja na segregação entre corpo e mente e as influências que o
mundo exerce sobre ambos, seja no inverso, isto é, corpo e mente alterando o mundo em que estão
inseridos (SCORSOLINI-COMIM; AMORIM, 2008).
Essa separação do corpo em partes, principalmente a relação do corpo com a mente (SCORSOLINI-COMIM;
AMORIM, 2008), não é algo contemporâneo. Ela vem desde os primeiros pensadores, que são os filósofos
da Grécia Antiga, em suas reflexões acerca da existência e função do ser humano no mundo.
Com o passar dos anos, ao longo da Idade Média e no período renascentista, também ocorreu uma
mudança na concepção de como o corpo era entendido. A Revolução Industrial, que se iniciou na
Inglaterra, alterou completamente a forma como o corpo é tratado, principalmente sua relação com o
trabalho. Contemporaneamente, o corpo passa a sofrer um processo controverso, de submissão e poder.
Como pode ser observada nos parágrafos anteriores, a forma como o homem lida com sua corporeidade
é resultado de construções sociais, as quais são consequência de um extenso processo histórico, em que o
contexto social interage de uma forma extremamente dinâmica, direcionando e modificando como o corpo se
expressa. Com isso, o corpo do ser humano carrega a história acumulada de uma sociedade que contém seus
valores, suas leis, suas crenças, ou seja, sua base para uma construção social.
O homem, ao longo de toda a sua história, apresenta diversas formas e variações de como ele
entende e trata seu corpo, o qual se comporta e se apresenta de formas distintas, de acordo com
determinados contextos sociais. Nesse sentido, Gonçalves (2012) retrata que os corpos, em diferentes
contextos sociais, apresentam diversas técnicas em relação aos seguintes aspectos:
• Movimentos corporais expressivos (exemplos: gestos, posturas, expressões faciais), que são formas
de expressão não verbais.
• Ética corporal, que contempla as ideias, os conceitos e os sentimentos sobre a aparência do próprio
corpo e do corpo de outrem (exemplo: pudor e ideal de beleza).
Os primeiros pensadores da Era Antiga, como os filósofos Heráclito de Éfeso (540‑470 a.C.),
Parmênides de Eleia (530-460 a.C.) e Empédocles de Agrigento (490‑435 a.C.), mais precisamente
da Grécia Antiga – que é considerada como o berço do pensamento ocidental (CESTARI, 2002) –,
não tinham a preocupação ou não colocavam em questão uma separação entre corpo e alma –
entendida como mente (CARDIM, 2009).
Essa ideia de separação não existia, pois o corpo e a mente eram concebidos de modo harmônico,
compondo um ser único, indivisível e visível. O corpo do ser humano, para os gregos, apresentava uma
grande abrangência de estruturas em sua constituição. Primeiramente se tinha o soma, que é o corpo
composto de uma matéria; em seguida se tinha a psique, que é considerada a alma ou a inteligência do
ser humano, e, por último, mas sem uma ordem hierárquica, tinha-se a pneuma, que era considerado o
sopro que daria a vida a essa quantidade definida de matéria (GALLO, 2006).
Para exemplificar como o corpo não era visto de uma maneira segregada da mente (alma), na obra
Ilíada, de Homero (séc. VIII a.C.), e Antígona, de Sófocles (496-406 a.C.), ocorrem dois episódios de
morte, nos quais fica claro que o corpo na sociedade grega tinha muita importância, pois era necessário
enterrá-lo para que a alma pudesse se separar desse ser humano que perdera a vida para se juntar ao
reino das sombras ou dos mortos.
Além disso, as obras gregas apresentam uma representação do corpo nas pinturas, nos afrescos e nas
esculturas com grande detalhe e fidelidade às formas do ser humano (CARDIM, 2009).
Com isso, soma e psique, ou seja, corpo e alma não eram realidades segregadas ou separadas, mas
ao contrário, se completavam, ou seja, um dependia do outro (GALLO, 2006).
Porém o filósofo grego Platão (429-347 a.C.) dá início ao Platonismo, com o gesto teórico de
fundação da oposição entre corpo e alma, ao considerar um contrário ao outro, obtendo, dessa forma,
um dualismo (CARDIM, 2009; CAVALCANTI, 2005).
Platão trouxe essa concepção de separação entre o corpo e a alma do ser humano a partir do
desenvolvimento de uma noção de divisão do mundo em duas realidades: uma realidade real e uma
10
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
realidade ideal (GALLO, 2006). Assim, há dois mundos: o mundo sensível e o mundo inteligível (ou
mundo das ideias), a saber:
• Mundo sensível: é conhecido por meio dos sentidos, em que os corpos nascem e morrem, sendo
esta uma realidade sensível, captada pelos sentidos, compostos de matéria, que são dados à
corrupção e à mentira. Os objetos produzidos nesse mundo são cópias das ideias (mundo ideal)
perfeitas, porém a matéria é corroída pelo tempo e está fadada ao desaparecimento.
• Mundo inteligível: só poderia ser conhecido por meio do pensamento e da alma, sendo esta uma
realidade ideal, captada somente pelo intelecto – a última verdade de todas as coisas –, intelecto
que é perfeito e eterno, sem transformações, pois as coisas sempre serão como elas são, não sendo
possível o desaparecimento e a destruição pelo tempo.
O ser humano é composto de: um corpo, porção de matéria que habita o mundo real ou sensível,
portanto, corruptível e que tende à morte; uma alma, que é pertencente ao mundo ideal, logo, perfeita,
eterna e imortal. Com isso, tudo o que o homem percebe e entende do mundo em que vive não passa
de uma cópia malfeita do mundo inteligível.
O homem, por ser composto de um corpo material e também ter uma alma, acaba por participar ou
pertencer aos dois mundos, porém o corpo material torna-se um obstáculo para que a alma possa atingir a
verdade. A alma somente conseguiria atingir a verdade absoluta se conseguisse dominar o corpo, com isso o
corpo se tornava um túmulo que aprisionava a alma, impedindo ela de conhecer a plena verdade.
Para Platão, a alma comandava e polarizava todas as ações do corpo, ou seja, movia o corpo do seu
interior, sendo ela o princípio do movimento. E o corpo, que é movido pela alma, é ao mesmo tempo a
prisão da alma. Mesmo com essa afirmação, o homem não é somente corpo físico ou somente alma, mas
necessariamente uma junção dessas duas realidades (GALLO, 2006).
Com essa separação, a alma acaba assumindo um papel de uma “quase divindade”, apresentando
imortalidade, tendo a capacidade de pensar, denotando, assim, um ser único e com identidade. Por
11
Unidade I
outro lado, o corpo é tido como mortal, assumindo várias formas, desprovido de inteligência, sujeito ao
processo de decomposição, por isso nunca permanecerá idêntico (CARDIM, 2009).
Com isso, o homem acaba apresentando três tipos de alma, que, segundo Platão, são distintos, sendo
duas almas de natureza inferior, totalmente ligadas ao corpo e suas sensações enganadoras, portanto,
imperfeitas e mortais, e a terceira alma ligada a uma natureza superior, ao mundo ideal, ou seja, perfeita
e imortal (GALLO, 2006).
Corpo
Alma superior
A alma superior está ligada à racionalidade e é responsável pelos pensamentos, que são sua principal
virtude. Segundo Platão, essa alma está localizada na cabeça do ser humano.
A alma inferior está ligada aos bens materiais e à luxúria, que são responsáveis pelos desejos e
necessidades básicas; sua localização é a região abaixo do abdômen. Por fim, a alma irascível, que é
responsável pelas emoções e paixões, dando ao homem o ânimo necessário para enfrentar os problemas
e os conflitos, e que se encontra no peito do ser humano (GONÇALVES, 2012).
Observação
Alma: identificação de diversas faculdades, das mais simples para as
mais complexas.
Faculdade sensitiva: função de sentir dor e prazer.
Figura 3 – Platão
12
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Com essa ideia de separação entre o corpo e a alma, proposta por Platão, é interessante observar,
conforme dito anteriormente, a noção de imortalidade da alma e a relação do homem com as divindades
gregas, pois é mediante a alma que os homens se relacionavam com os deuses e estes os influenciavam.
Assim, “por intermédio do corpo, a alma dá expressão ao que quer manifestar” (CARDIM, 2009, p. 25).
Tendo essa ideia de corpo sendo controlado pela alma, Platão afirma que existem três tipos de
temperamentos (ou caráter) que advêm dessas almas, os quais determinavam a ordem social e
educacional da Grécia Antiga (GALLO, 2006):
• Caráter concupiscível: a alma inferior é predominante e faz tomar decisões com base nos desejos.
• Caráter irascível: a alma que predomina marca as decisões do ser humano baseadas nas emoções.
• Caráter racional: a alma superior predomina, e as decisões são baseadas na racionalidade ou no
uso da razão.
Alma racional
ou intelectual
Alma irascível
Alma concupiscente
Na obra República, Platão (2000) descreve que os tipos de caráter determinam como seria a educação
das crianças e de toda a população, a partir da identificação da alma predominante, e essa identificação
iria direcionar o lugar de cada pessoa na sociedade.
Para as pessoas com caráter concupiscível, eram destinados trabalhos como artesanato e agricultura.
Pessoas com essas funções eram submissas às outras duas “classes sociais” consideradas superiores,
as quais tinham função de manutenção e conservação econômica do Estado. Pessoas dessas classes
superiores eram educadas até os 20 anos de idade.
Para os indivíduos que apresentavam uma predominância de caráter irascível, lhes era conferida
a função de guerreiros e guardiões das cidades, pois eles representavam a força de servir do direito,
recebendo educação até os 30 anos de idade.
E por último, os cargos de filósofos, magistrados e governantes das cidades, eram ocupados pelas
pessoas com predominância de caráter racional, constituindo a classe social mais elevada e que, por
conseguinte, exercia o domínio sobre as outras classes. Para Platão, quem apresentava um caráter
13
Unidade I
racional, conhecia a realidade das coisas, a ordem ideal do mundo e da sociedade, e por isso estavam
aptos a orientar racionalmente o homem e a sociedade para o caminho da verdade. Esses indivíduos
recebiam educação até os 50 anos de idade.
Para Platão, o corpo era algo tão insignificante que ele considerava que a alma de um filósofo deveria
se afastar do corpo, pois atrapalhava o raciocínio e os impedia de perceber a verdadeira realidade. Esse
obstáculo para perceber a verdadeira realidade era causado pelos sentidos e sensações do corpo, como
a visão, a audição ou a dor (QUEIROZ, 2008).
O corpo, na óptica platônica, acaba causando guerras, sendo corrupto, e a inteligência ou a alma é
a única esfera que deve ser investida a respeito de se ter um conhecimento total do mundo em que se
vive (QUEIROZ, 2008; CARDIM, 2009).
14
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
É importante deixar claro que essa relação que Platão impõe, da alma sobre o corpo, está estreitamente
ligada a um entendimento de que existe uma compreensão total do mundo e da humanidade.
Esse dualismo foi desenvolvido por Platão, com base na ideia de que corpo e alma possuem realidades
completamente distintas, porém necessariamente relacionadas. Se o corpo é mortal e imperfeito, se faz
necessário que a alma seja exercitada, para que o indivíduo se aproxime cada vez mais da perfeição que
está muito distante do mundo físico (GONÇALVES, 2012).
Dentro do pensamento a respeito dessa relação entre o corpo e a alma, também na Grécia Antiga, deve-se
citar o filosofo Aristóteles, que sustenta um pensamento diferente do platonismo, uma vez que coloca a alma
como uma forma interior da vida, mas que está inteiramente ligada ao corpo (CARDIM, 2009).
Figura 7 – Aristóteles
De acordo com Aristóteles, o homem deve investigar a realidade da natureza, e esse corpo (humano)
pertencente à natureza, contemplar essa realidade, em um mundo que já é o ideal. E a alma deve ser entendida
como um princípio vital de todo ser vivo, e ainda mais, é o ato do corpo organizado (CARDIM, 2009).
15
Unidade I
Como retratado no trecho descrito anteriormente, Aristóteles considerava que a percepção da alma
se dá através da capacidade do corpo de ser sensível aos diversos estímulos presentes no mundo. Essa
ação de receber um determinado estímulo acaba por desenvolver um processo em que cada órgão
responsável em receber os diversos estímulos irá interpretá-los de uma forma diferente. Portanto, essa
interpretação indica um componente cognitivo (AGGIO, 2009).
Observação
Aristóteles também criou a teoria Hilemorfismo, a qual considera que toda a realidade se fundamenta
em dois princípios: a matéria e a forma. O filósofo entende que esses dois princípios são distintos
e absolutamente complementares. Nesse sentido, ele considera que o conteúdo (alma) não poderia
ser separado da forma (corpo), pois um fazia parte do outro, ou seja, o corpo era uma extensão, uma
realidade física limitada por uma superfície (MOREIRA, 2006). Portanto, corpo e alma são dois aspectos
distintos, porém inseparáveis, de uma mesma realidade.
A alma era responsável por conservar e reproduzir a vida, e apresentaria três funções distintas – o que
levava Aristóteles a falar da alma constituída por três partes. A primeira parte com função vegetativa,
ou faculdades anímicas, tendo como finalidade a regulação das funções biológicas do corpo, e estava
presente em todos os seres vivos do planeta. Ela era a responsável pelos instintos, impulsos, crescimento,
reprodução e nutrição (GALLO, 2006).
A segunda parte da alma exercia função ou faculdade sensitiva, sendo responsável pelos sentidos,
sensações e percepções dos objetos, e ainda, por coordenar os movimentos corporais.
A última parte é a alma intelectiva ou pensante, exclusiva do ser humano. Ela determina a capacidade
de pensar, elaborar teorias e formular juízos sobre a realidade (GALLO, 2006).
Como mencionado anteriormente, para Aristóteles era inconcebível uma visão dualista de separação
entre corpo e alma, pois as ações das faculdades anímicas são possíveis somente por meio de uma
16
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
relação entre corpo e alma, logo, é impossível haver pensamento sem uma atividade coordenada entre
corpo e a alma (GALLO, 2006).
Observação
Mediante esta relação colocada por Aristóteles, a alma é aquilo que anima o corpo, gerando, assim,
o movimento. Qualquer movimento físico somente é realizado por intermédio da alma e também só é
realizado o pensamento, que é uma faculdade da alma, porque temos o corpo, estabelecendo assim uma
relação de dependência entre o corpo e a alma.
A preocupação desse filósofo com o corpo fica clara quando ele faz recomendações às mulheres
para que, durante o período da gravidez, não fiquem ociosas, que se alimentem bem, exercitem
o corpo e mantenham o equilíbrio espiritual para um bom desenvolvimento de suas crianças
(MOREIRA, 2006).
Para Aristóteles é importante que o corpo se mantenha ativo e seja educado desde a infância,
porém sem excessos e esgotamentos físicos, evitando problemas e, inclusive, danos físicos
(GALLO, 2006).
Já na Idade Média, período que é compreendido do século V ao século XV, o corpo do ser
humano acaba por sofrer um processo de descorporalização, em razão de uma evolução ou uma
importância contínua da racionalização ou processo racional – ideia muito semelhante à de Platão
(GONÇALVES, 2012).
As ações humanas em relação à noção temporal estão ligadas ao desenrolar natural do tempo, por
exemplo, trabalhar durante o dia e descansar no período noturno, assim como as estações do ano, que
irão determinar os períodos de plantar e de colher o que se plantou, ainda, ao crescimento das plantas
e ao ritmo de reprodução dos animais. Assim, todas as ações humanas são determinadas por uma
demanda temporal, seja qual for o referencial de tempo.
A ideia de personalidade se relaciona com as ações do corpo do homem ao sistema de castas, sistema
esse imposto durante a Idade Média, em que o indivíduo nascia “dentro ou fora dos muros”, e ele não
poderia sair desta condição. Esses muros são referência ao espaço delimitado por altas paredes; em
seu interior, era comum haver um castelo e algum comércio (como se vê em filmes que retratam essa
17
Unidade I
época, por exemplo), constituindo uma cidadela (pequena cidade). Essa era uma estrutura típica do
sistema feudal: um modo de produção de economia em que as terras pertenciam a um dono, o senhor
feudal, que cobrava altos impostos das pessoas que moravam em suas terras. Normalmente o senhor
feudal vivia nesses grandes castelos, ao passo que o restante da população desenvolvia sua vida ao
redor – ou dos muros deste castelo (em especial, os artesãos e comerciantes), ou em locais um pouco
mais afastados (como as próprias áreas agrícolas pertencentes ao senhor feudal, ou em áreas florestais
razoavelmente próximas).
A economia da Idade Média era orientada para a subsistência, ou seja, os indivíduos tinham atividades
como agricultura, criação de animais, caça e pesca, para o seu sustento e de sua família. As sensações
de fome e sede regiam a relação econômica, em que quase não se conhecia a necessidade de haver
um planejamento e cálculos com ideias monetárias, logo, a economia estava ligada à satisfação das
necessidades básicas (HUIZINGA, s/d).
A personalidade das pessoas, sobretudo as que moravam fora dos castelos, eram renegadas,
ou seja, a individualidade não era reconhecida e, portanto, não era valorizada; reconhecia-se
apenas a classe social à qual a pessoa pertencia. O sistema feudal, que era fundamentado no
trabalho braçal forçado das classes sociais mais baixas, sendo a nobreza e o clero (Igreja Católica)
dominante sobre as demais pessoas.
Figura 8 – Representação da sociedade feudal, durante a Idade Média, com separação em classes
sociais, que determinava a forma como seu corpo e suas ideias iriam se comportar
Assim, no sistema feudal, que ocorreu em grande parte da Idade Média, o corpo era
compreendido a partir das ideias de subsistência, conformismo e submissão em relação às suas
condições de vida e desenvolvimento do indivíduo e da população. Com isso inicia-se o processo
18
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
de descorporalização, liderado por uma instituição que tinha grande poder e influência, social,
econômica e religiosa nessa época.
Essa descorporalização se dá principalmente por questões religiosas impostas na Idade Média, uma
vez que a Igreja Católica tinha grande influência no sistema social, comercial e político nessa época
(DUBY, 2011). Um dos responsáveis pela concepção de corpo dentro dessa Igreja foi Santo Agostinho,
que o definiu como um cárcere da alma, sendo uma parte orgânica, concebida ao homem, como forma
de punição (SILVA, 2013).
Essas ideias vão ao encontro do conceito platônico e acabaram por se constituir um dos
fundamentos da Igreja, aplicando esse dualismo de oposição entre: bem e mal, graça e pecado,
alma (etérea) e corpo (matéria), Deus e homem e, principalmente, luz divina e trevas eternas
(ALMEIDA; PETRAGLIA, 2008).
Com essa fundamentação, Agostinho defende uma superioridade da alma, em que o espírito deve se
sobrepor ao corpo, pois a alma é uma criação divina que deveria reinar e guiar o corpo a praticar o bem.
Agostinho tinha um pessimismo em relação ao corpo do ser humano, em razão das sensações que
ele produzia e das criações terrenas, que poderiam ser belas e atraentes, mas que não passavam de
objetos sem qualquer valor (AGOSTINHO, 1996).
Além das sensações, o homem, considerado pecador, apresenta o livre-arbítrio, que é o poder
de escolher se quer ou não seguir determinada religião ou ordem de fé, e este livre‑arbítrio
costuma inverter a chamada “ordem ideal” defendida por Agostinho. O corpo passa a ter um
controle sobre a alma, provocando assim uma submissão do espírito em relação ao corpo,
trazendo uma vida de pecado, luxúria e prazer, considerada uma vida de “escravidão” em relação
ao pecado (CONTRIM, 2000).
O homem somente conseguiria abandonar a vida de escravo do pecado e retornar aos caminhos
divinos se houvesse a salvação por intermédio da combinação de um esforço pessoal e a vontade de
Deus. Sem essa vontade, o homem não teria forças para conseguir realizar tal tarefa. Além do mais,
segundo Agostinho, nem todas as pessoas são dignas de receber a graça divina, e sim apenas uma
parcela da população (CONTRIM, 2000).
Mediante essa concepção, a alma deveria governar e manter vigilância constante sobre o
corpo e seus sentidos, para que esses não impedissem que se conhecesse a verdade divina e que
somente a alma pudesse salvar o corpo, colocando-o no caminho da verdade divina (AGOSTINHO,
1996; QUEIROZ, 2008).
Essa visão dualista e negativa do corpo, primeiramente colocada por Platão e incorporada aos
ensinamentos da Igreja, teria reflexos sociais, políticos e educacionais por muitos séculos seguintes
(ALMEIDA; PETRAGLIA, 2008).
19
Unidade I
No campo do pensamento e reflexão a respeito do local ou lugar em que o corpo e a alma ocupam,
o filosofo francês René Descartes (1596-1650) apresenta na base de seu pensamento a importância do
método como ponto principal para a construção do conhecimento (CARDIM, 2009).
O método era dividido em quatro partes, que são a evidência, a análise, a síntese e a última parte,
o exaustivo.
A evidência diz respeito a não aceitar uma verdade antes que se conheçam todas as evidências e as
condições que a fizeram se tornar uma verdade.
A segunda etapa, após se conhecer as evidências, envolve dividi-las e analisá-las em quantas partes
ou unidades de análises fossem possíveis.
A síntese, terceira etapa do método, consiste em refletir a respeito das análises realizadas sobre
as evidências e conferir uma ordem cronológica ou hierárquica aos pensamentos realizados, sempre
partindo dos pensamentos mais simples para os pensamentos com maiores complexidades.
E a última etapa é fazer uma revisão completa de todo o processo realizado anteriormente, para ter
certeza de que todas as anteriores foram contempladas e assim conseguir justificar ou verificar se dada
informação ou conhecimento é realmente verdadeiro.
20
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Esse método desenvolvido por Descartes (2009) é considerado a única maneira de obter o
entendimento do conhecimento e da ciência, aplicando-se a todas as perspectivas da sociedade, até
mesmo para o próprio corpo, ao considerar “um pensamento puro, a correspondência ou adequação da
ideia ao ideado, do sujeito e objeto, a existência e a veracidade divinas [...] e a distinção real entre alma
e corpo” (CARDIM, 2009, p. 30).
Lembrete
Como mencionado anteriormente, o que está em pauta é uma busca pela verdade, porém essa
procura é de difícil realização, uma vez que as informações são oferecidas pelos cinco sentidos
(visão, audição, tato, paladar, olfato), e isso não é considerado por Descartes como uma fonte
segura de informação.
Por causa dessa desconfiança do filósofo a respeito dos sentidos do corpo humano, a solução foi
criar o processo de duvidar de tudo, resultando na formulação da expressão cogito ergo sum, que
significa “penso, logo existo”, trazendo a ideia de racionalidade como verdade inquestionável (SILVA;
HENNING, 2011).
21
Unidade I
Essa separação proposta por René Descartes pode parecer semelhante ao proposto por Platão, que
também apresentava uma separação entre o que é sensível (corpo) e o que é inteligível (alma/mente).
Entretanto, nessa nova forma de se separar corpo e alma coloca-se uma concepção cartesiana, quase
que matemática, em que a alma é o pensamento, e o corpo é somente uma extensão da alma, sendo
ambos independentes um do outro (CARDIM, 2009).
O ser humano é composto de duas substâncias: o corpo é a substância extensa ou a coisa extensa, e
a alma é a substância pensante, ou a coisa pensante. Assim, Descartes (2009) confere ao corpo e à alma
uma autonomia completa e independente; apesar de a alma estar inserida no corpo, o pensamento
(alma) e a extensão (corpo) não estão ligados.
Espírito
Corpo
Figura 11 – Mesmo tendo passado muito anos, ainda existe o dualismo corpo e mente
Com essa divisão proposta pelo filósofo tem-se a construção do dualismo cartesiano na ideia
de formação do ser humano. De acordo com essa interpretação, o homem passou a ser “dividido”,
“recortado”, o que levou a uma série de conhecimentos segregados (separados) a respeito do ser humano.
Para esse filósofo, fica claro que é o pensamento que controla a extensão, ou seja, o corpo não é
capaz de se movimentar, sentir, pensar, mas é movido por algo que lhe é tocado; no caso, o que move
o corpo é a alma (GALLO, 2006).
Logo, o corpo é movido, porém não por si mesmo, trazendo a ideia de corpo-máquina, que é
manipulado e dominado, com base em um modelo mecanicista (GALLO, 2006; CARDIM, 2009).
22
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Quadro 1
Mente Corpo
Pensamento Movimentos
Compreensão/vontade
Áreas confusas entre mente e corpo
(emoções e percepções)
Julgamento
A filosofia cartesiana proposta por Descartes toma como verdade a alma em detrimento do
copo por causa da busca do conhecimento verdadeiro. A razão – única forma de obter e produzir
esse conhecimento – constitui-se em uma faculdade da alma; o corpo, mediante os sentidos e
sensações (como sede, fome, desejos sexuais etc.), é capaz de enganar o ser humano.
Com esse pensamento, Descartes foi um dos precursores da Era Moderna com o paradigma
cartesiano (VILELA; MENDES, 2003), pelo qual se julgava que a única forma de obtenção de
conhecimento era por meio da razão e do pensamento intelectual.
Além da racionalidade, a crescente ideia do capitalismo mudou a forma como o corpo é visto e
encarado, pois se perde a ideia de proibição que era proposta pela Igreja na Idade Média, em que
não era permitida a sua manipulação (CAVALCANTI, 2005).
Na perspectiva científica o corpo passa a ser um objeto de estudo por diversas áreas,
principalmente pela medicina, em estudos da anatomia, chegando ao ponto de submeter pessoas
ainda vivas a estudos anatômicos para tentar compreender como acontecia o comportamento do
corpo junto com a alma, pois a vida estava ligada à presença de uma alma (CAVALCANTI, 2005;
CARDIM, 2009).
Com o surgimento de uma nova visão a respeito do corpo como um objeto científico, o capitalismo
encerra uma nova percepção sobre a forma como o corpo é encarado dentro da sociedade; por
outro lado, a religião não mais apresenta tanta legitimidade sobre essa nova perspectiva.
23
Unidade I
Friedrich Nietzsche (1844-1900) descarta a ideia de que o corpo é mera extensão controlável da
alma (GALLO, 2006).
Nietzsche trata o corpo vivo como uma perspectiva ambiente, ou seja, o corpo inserido em um
contexto social, diferente da visão platônica e da visão religiosa, que despreza o corpo e o mundo
em que ele está presente. O filósofo investiga o estado de saúde e doença, bem como a vida afetiva e
fisiológica que dominam as experiências de um homem vivo.
Com essas palavras, o filósofo inverte as concepções anteriores segundo as quais a alma não somente
se sobrepõe ao corpo, como também o substitui – conforme era abordado pela religião.
A partir dessa perspectiva de corpo vivo, Nietzsche reconhece que é necessário interpretar o que o
corpo faz, decifrando as linguagens que ele transmite, pois é por meio do corpo que se conhece a alma,
e não o inverso (CARDIM, 2009).
24
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Lembrete
Na mesma concepção de um corpo interagindo com o meio em que vive, o filósofo Karl Marx
(1818‑1883) entende que os sentidos são recursos tão importantes quanto o pensamento. Com base nesse
referencial, ele observa que o trabalho é a ideia central para se entender o homem e sua corporeidade.
Para esse filósofo, no trabalho o homem exerce movimentos que pertencem à sua corporalidade –
braços e pernas, entre outras partes – com o objetivo de alterar e utilizar a matéria natural para sua
utilidade; assim, o corpo torna-se humano por sua atividade produtiva (GONÇALVES, 2012).
No livro Manifesto Comunista, os autores Marx e Engels condenam com veemência esse fundamento
capitalista de exploração do corpo do trabalhador, de sua força de trabalho. No trabalho, conforme
ocorria na época em que esses autores teciam sua crítica, as características corporais do ser humano,
como idade e sexo, não têm qualquer tipo de valor ou significado, ou seja, “diferenças de sexo e idade
não têm qualquer relevância social para a classe trabalhadora. Só instrumento de trabalho, cujo preço
varia conforme a idade e o sexo” (MARX; ENGELS, 1998, p. 15).
Aquele corpo vivo, participante do processo de criação, produção e transformação da matéria natural,
tornou-se um corpo mecanizado, diferente da ideia de Descartes, principalmente após a Revolução
25
Unidade I
Industrial, na qual é inserida a mecanização e a automatização das tarefas, sendo mínima a participação
criativa e de expressão corporal do homem.
Figura 14
Saiba mais
26
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
O quadro a seguir apresenta, de forma sucinta, as ideias dos principais filósofos mencionados
neste texto, ao quais se dedicaram (entre outros assuntos) a estabelecer relações entre os constructos
(conceitos) de corpo e de alma (mente/espírito).
27
Unidade I
A visão dualista, desenvolvida principalmente pelos filósofos Platão e René Descartes, é antiga,
porém permanece fortemente no homem e principalmente na sociedade.
O filósofo Merleau-Ponty traz em seus trabalhos a ideia totalmente contrária ao dualismo, visão
cartesiana e mecanicista introduzida por Descartes, ao afirmar que o homem é um ser vivo, inserido
em um meio definido, que parte de um desenvolvimento de projetos e atua na mudança desse meio
(QUEIROZ, 2008).
28
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Michel Foucault trata o corpo como manifestação da esfera política, sendo alvo de relações de
poderes dentro da sociedade moderna. Essa percepção de manipular o corpo de acordo com interesses
políticos é utilizada desde a Idade Média, mediante castigos corporais e torturas, os quais se estendem
até a Idade Moderna e Pós-Moderna (Contemporânea), sendo o corpo treinável, submisso e “dócil”,
passível de controle e manipulação (QUEIROZ, 2008).
O filósofo francês Maurice Merleau-Ponty dá início a uma nova época, em uma filosofia para a vida,
considerando-se de forma imprescindível a historicidade, a subjetividade, a cultura e a sociedade, que
interferem no desenvolvimento individual, na formação da pessoa.
A partir desta perspectiva mais ampla e complexa (pois se considera vários fatores em interação), o
sujeito tem sua plenitude em subjetividade, sendo este recortado pela história, em que o corpo é o elo
entre o indivíduo e a sua história. Entende-se que isso irá refletir em diversas decisões teóricas e práticas
de sua vida e do seu conhecimento (NÓBREGA, 2007).
Saiba mais
29
Unidade I
Observação
A ciência, com uma visão positivista, entende a percepção como algo distinto das sensações, mesmo
sendo uma casualidade na questão de uma resposta condizente com um estímulo dado pelo mundo
(NÓBREGA, 2008). Com isso a percepção é um ato pelo qual a consciência compreende um determinado
objeto, utilizando as sensações como instrumento.
Para Merleau-Ponty, a sensação não é um estado de consciência nem uma qualidade – como é
definido por diversas correntes intelectuais –, e sim uma compreensão em movimento (NÓBREGA,
2008). Portanto, para esse filósofo, a percepção é uma atitude corpórea.
Essa mudança de paradigma realizada por Merleau-Ponty a respeito das sensações modifica
a forma como a percepção pode ser interpretada, ou seja, diferentemente de como é adotada pela
razão, pelo intelectualismo, que descrevem a percepção somente como uma “causalidade linear de
estímulo‑resposta” (NÓBREGA, 2008, p. 142).
Segundo Merleau-Ponty, a percepção é a apreensão do sentido ou dos sentidos que se faz através
do corpo, pelo corpo, sendo essa uma expressão criadora, com diferentes formas de observar e interagir
com o mundo (NÓBREGA, 2007; 2008).
Esse pensamento tem como objetivo buscar a compreensão do homem de uma forma
integral, desenvolvendo a ideia de um “ser-no-mundo”, o qual recebe um caráter ambíguo, sem
a separação de corpo e alma, nem de corpo e objeto, e sim de pensar no corpo sob a experiência
do próprio corpo, em uma relação com o mundo ou com outros corpos (GONÇALVES, 2012;
CARDIM 2009).
O corpo é tratado como um campo criador de sentidos, porque a percepção não é uma
representação da mente, mas sim um acontecimento da corporeidade. O corpo sensível, que é
feito da mesma matéria que o mundo, pode assim interagir com ele, dando ao mundo um sentido
aos seus acontecimentos, e ao mesmo tempo tem a difícil tarefa de escolher e tomar decisões
(NÓBREGA, 2007; 2008).
Dessa forma, é interessante observar um ponto primordial: o corpo tem uma intencionalidade.
Essa intencionalidade é refletida pelo movimento, que é a concepção principal dessa
30
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Portanto, com essa nova realidade do corpo, a sua intencionalidade é refletida pelos movimentos,
que permitem ao corpo sentir e perceber o mundo, os objetos e os outros corpos, e ainda, possibilita
ao indivíduo imaginar, sonhar, desejar e pensar em outras características do corpo e do sujeito. Esse
comportamento é reconhecido como exercício da corporeidade, sendo esse um aspecto da consciência
e da relação do olhar com o “espírito” que vem do mundo (MERLEAU-PONTY, 2006; NÓBREGA, 2007;
2008; MACHADO, 2010).
Essa realidade e intencionalidade, ou seja, a subjetividade proposta por Merleau-Ponty, está ligada
à noção de liberdade, em que o mundo existe independentemente das formulações individuais do
homem a respeito dos fatos, porém o mundo não está totalmente constituído e essa construção
depende de ações individuais e coletivas.
Logo, a liberdade é a interação entre o interior e exterior do ser humano, e as escolhas são feitas em
determinadas situações. Essas escolhas são resultado de uma estrutura psicológica e histórica, tendo
uma mistura entre o tempo natural, o tempo afetivo e o tempo histórico.
Merleau-Ponty também considera o que ele denomina campo da subjetividade: o contexto histórico,
as relações sociais, o diálogo em relação à afetividade do sujeito, já que é uma experiência corporal e
não intelectual, e que é conquistada pelo movimento e pela percepção:
Considerando desta forma, o homem desaprendeu a conviver com a realidade do corpo e a experiência
que os sentidos trazem, sempre privilegiando a razão ou o intelecto (NÓBREGA, 2008).
31
Unidade I
Saiba mais
Merleau-Ponty não concebe o corpo em partes, ou um conjunto de órgãos dos sentidos com
funções e atitudes passivas de somente captar os estímulos, mas o corpo de um indivíduo/sujeito
que olha, observa e sente. Essa experiência faz com que o corpo reconheça o espaço como
expressivo e simbólico. Esse comportamento é o potencial da atividade do ser humano criativo,
sendo o principal constructo da capacidade de superar e criar estruturas nas experiências vividas
pela percepção (MACHADO, 2010; NÓBREGA, 2008).
Os significados trazidos pela percepção do mundo expressam realidades estruturais que são
manifestadas na corporeidade. Pelo corpo do ser humano de forma sensível, ele se efetiva no mundo, o
qual envolve toda a percepção do ser humano, e também cuja percepção é envolvida pelo corpo.
Cardim (2009, p. 89) relata que “não podemos abrir mão nem do ponto de vista subjetivo, nem
do objetivo. O homem é simultaneamente sujeito e objeto, ativo e passivo”, em uma tensão dialética
(GONÇALVES, 2012).
A reflexão não é constituída por uma consciência pura, mas, sim, enraíza-se na
experiência sensível, na qual se encontram a gênese do sentido e o fundamento
do mundo cultural [...]. A reflexão nunca abarca a realidade em sua totalidade,
mas permanece aberta para novas significações (GONÇALVES, 2012, p. 68).
composto de partes com receptores sensíveis, como olhos e mãos, ou seja, uma estrutura reflexiva do
corpo. Não se pode cometer o erro de pensar que o corpo é somente corpo nem somente “espírito”, e
sim a união dessas estruturas contrárias.
A história dos seres humanos é criada por diversos meios, e esse corpo reflete a cultura em que ele
está inserido, tornando-se sujeito e apresentando três linhas conceituais (ALMEIDA; BELLO, 2015):
• O modo como o sujeito se constitui ao longo da vida, por questões internas e externas.
Esse poder que interfere materialmente na realidade mais concreta do sujeito – o seu corpo, o corpo
social, adentrando sua vida cotidiana, é caracterizado como micropoder ou subpoder (SILVEIRA, 2007).
O controle que Foucault retrata em seus trabalhos não está relacionado ao poder político
governamental, como disseminado pela filosofia marxista, mas em todos os locais, como as esferas
sociais e as diversas classes sociais, atingindo todas as pessoas no processo de instalação das relações,
nas ações (ou conjuntos de ações) de um indivíduo sobre o outro.
De acordo com esse entendimento, é estabelecido não um poder único, mas diversas práticas de um
poder cotidiano, o qual abrange todas as estruturas socais, por algum mecanismo de poder, do qual se
destaca a disciplina.
Essa disciplina, por sua vez, instaura uma política no corpo humano mediante uma série de intervenções
e controles reguladores, sendo denominada biopolítica da população, ou seja, um controle de massa – e
não individual, como era realizado na Antiguidade – por meio de penitências e suplícios, portanto, em uma
microestrutura e uma macroestrutura (ALMEIDA; BELLO, 2015; CARDIM, 2009).
O poder disciplinar é fruto de transformação de uma sociedade burguesa, que desloca o poder soberano
para o corpo social, e com isso o poder é exercido na forma de micropoderes ou uma micropolítica.
33
Unidade I
O poder é aplicado sobre os corpos individualmente, por meio de exercícios direcionados para a
ampliação de suas forças, criando assim o adestramento e corpos docilizados (SOUZA; MENESES, 2010).
34
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Figura 21 – O sistema prisional é utilizado para uma doutrinação, por meio de uma disciplina punitiva,
para os sujeitos que não têm ações condizentes com as estruturas sociais vigentes
Um corpo disciplinado significa um corpo mantido sob um controle – controle que o mantém
“introjetado”, ou seja, sem a consciência de questionamento por parte do indivíduo. Essa disciplina
acaba por levar a um autocontrole, portanto, sem necessitar de comandos externos (GALLO, 2006).
Os dispositivos de poder disciplinar são caracterizados pelo detalhe, no sentido de que o corpo
sofrerá uma forma de poder que irá separar e desmontá-lo para, em seguida, corrigi-lo por meio de uma
nova mecânica de poder (SOUZA; MENESES, 2010).
35
Unidade I
Com isso as práticas disciplinares vão permitir o controle das diversas operações do corpo e a
subordinação constante de suas forças, impondo-lhe docilidade e utilidade.
Esse corpo dócil está relacionado a uma política de controle da energia produtiva individual, cuja
disciplina se baseia em quatro elementos (ALMEIDA; BELLO, 2015):
• O controle da atividade individual pela reconstrução do corpo como portador de forças dirigidas.
• Composição de forças, pela articulação funcional das forças corporais em aparelhos eficientes.
Segundo Foucault (1987), a origem da disciplina se configura por meio de três formas de adestramento
do corpo: a vigilância hierárquica, as sanções normalizadoras e o exame.
Vigilância hierárquica
Um sistema de controle sobre o corpo que integra uma rede de controle vertical (hierarquia),
utilizando-se de meio de observação e conferindo o efeito de fiscalização de produção, principalmente
em sistemas produtivos, tendo como objetivo o lucro (por exemplo, as fábricas).
Sanção normalizadora
36
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Exame
O exame está relacionado às duas técnicas anteriores (vigilância e sanção) cujas relações de poder
constroem o saber e constituem o sujeito de relações de poder e saber.
Esses são mecanismos disciplinares com os quais o poder é utilizado sobre o corpo, que o torna
objeto e alvo de submissão. Por isso a disciplina tem como objetivo fabricar corpos exercitados para
desempenhos e tarefas específicas, aumentando, assim, a força dos corpos, em questões econômicas de
utilidade e, ao mesmo tempo, diminuindo o corpo em sentidos políticos de obediência (ALMEIDA; BELLO,
2015; MOREIRA, 2008; SANTIN, 2008).
Foucault compreende o fenômeno corpóreo como um ponto de vista bélico, um jogo de forças,
mediante o disciplinamento do corpo por uma força política, em que a disciplina estabelece novas
relações nos meios em que ela ocorre.
Assim, o corpo é educado com relação a sua expressividade, sensibilidade e criatividade, havendo
uma reflexão sobre os poderes e as práticas que moldam esse corpo na idade atual.
O corpo até hoje não alcançou uma libertação, pois sempre esteve preso a esquemas que o
controlassem, desde um corpo “manchado”, que continha uma alma purificada, até um corpo objeto de
poder, que perpassa a docilidade proposta por Foucault. Hoje o corpo esportivizado pode ser a última
forma de uma imagem corporal – belo e forte – pela qual se pode ter a ideia de mente sã em corpo são,
criando os padrões de beleza atuais.
O corpo humano em movimento sempre foi um dos “encantos” para a educação física e a fisioterapia,
independentemente de em qual contexto esse movimento está sendo executado, por exemplo, em um
jogo recreativo, um ambiente escolar, uma dança, um programa de reabilitação ou de intervenção
ergonômica, ou em esportes de alto rendimento.
37
Unidade I
No entanto, se a compreensão desse movimento for realizada de uma maneira segregada – por
exemplo, somente nos aspectos fisiológicos, como a via energética utilizada, ou nos aspectos psicológicos
como a aferição dos níveis de estresse ou ansiedade –, será que os resultados dessas variáveis irão
expressar de maneira geral e completa a complexidade do movimento?
Em muitos casos, a educação física e a fisioterapia acabam por ter uma visão reducionista do homem
em movimento, sem o entendimento das necessidades do corpo ou do ser humano em movimento,
excluindo a complexidade de um ser e reduzindo-o apenas a um corpo físico, desconsiderando os aspectos
psicológico, cultural, econômico e político, ou seja, sem uma interação complexa e interdependente
desses elementos (ZOBOLI; BARRETO, 2011).
Tojal (2011) tem como base o trabalho e a obra do filósofo português Manuel Sérgio, intitulada
Motricidade Humana: uma Ciência do Homem, livro em que a motricidade emerge como um sinal da
corporeidade de quem está no mundo para algum objetivo. Com esse pensamento, o movimento está
relacionado ao entendimento de uma interação com o mundo, assim como o mundo interage com o
corpo/sujeito, que é um ser complexo.
Sérgio (1986, p. 11) relata que “não estou diante do meu corpo, estou no meu corpo, sou o meu
corpo”. Com isso, tem-se a ideia de uma linha complexa entre componentes internos, por exemplo, o
sistema nervoso; e componentes externos, como a cultura, que é captada a partir das experiências do
sujeito, conferindo, desse modo, uma intencionalidade a esse indivíduo.
História Sociologia
Áreas científicas
Motricidade Humana
(objeto de estudo)
Figura 25 – A motricidade humana envolve diversos aspectos e áreas de estudos do ser humano
38
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Com esse pressuposto, a motricidade irá evidenciar a busca pela superação de algo que interessa o
sujeito, que é particular de cada indivíduo, sendo a busca por um rendimento máximo (físico, motor etc.)
apenas um dos seus possíveis focos (TOJAL, 2011).
A educação física e a fisioterapia não podem observar o corpo somente como uma estrutura
composta de músculos, esqueleto e articulações, que compõem o sistema locomotor, portanto, não
devem se preocupar exclusivamente com o movimento produzido, mas com o sujeito, o ser humano que
produz o movimento (MOREIRA; NÓBREGA, 2008).
A motricidade, partindo do próprio corpo, tem um significado para esse corpo, pois apresenta
uma intencionalidade, um sentido, refletindo e manifestando, assim, a intenção do próprio corpo,
aumentando o entendimento da percepção, sendo essa a ligação entre o corpo e o mundo (MOREIRA;
NÓBREGA, 2008).
Dessa forma, motricidade é muito mais que um organismo, composto de um conjunto de conceitos;
ela é o homem integral em movimento, expressando sua corporeidade nos belos movimentos corporais,
sempre com intencionalidade, em consonância com o mundo, se relacionando com as coisas e inserindo
o ser humano em um processo construtivo.
Pela motricidade, o homem tem suas primeiras experiências de exploração do mundo pelo
movimento, constituindo um processo de humanização, pois a aprendizagem de cada indivíduo ocorre
em sua relação com o meio social.
A motricidade humana é um fenômeno com extrema complexidade, pois ela não nasce pronta, não
tem uma ordem cronológica nem um determinado estágio para ocorrer, pois é influenciada pelo meio
social, dependendo de uma interação entre o ser humano e esse meio.
Apesar de se observar o ser humano como uma única expressão, esse ser unitário apresenta múltiplas
dimensões que vão influenciar a sua motricidade, e, em decorrência disso, a construção pode ser feita
por uma infinidade de possibilidades.
Lembrete
39
Unidade I
Existe uma tendência a uma visão dualista do homem, principalmente pelas pesquisas realizadas,
cuja procura estava relacionada a constatações de corpos medidos, comparados, desmembrados em
variáveis e tipologias (GONÇALVES, 2012).
Essas formas de atividades físicas representam a cultura ou fenômenos culturais de uma determinada
região ou sociedade; isso corresponde a uma apropriação pelo sujeito ou pelo homem, integrando assim
a sua história, sendo uma realidade socio-histórica pertencente ao processo de formação da história da
humanidade.
Diferentes discussões envolvendo a corporeidade, mediante diversas perspectivas teóricas, têm como
objetivo restabelecer a relação entre o corpo e a mente, ou seja, a corporeidade se apresenta como uma
proposta de superar a visão mecanicista ou a dicotomia fragmentadora da unidade do ser humano.
Nesse sentido, o movimento passa a ser o reflexo ou a intencionalidade de um corpo com dimensões
indissociáveis na constituição do sujeito (JOÃO; BRITO, 2004).
40
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Mesmo por meio da ciência, na tentativa de compreensão do ser humano em suas diversas facetas,
ele, sendo um “ser-no-mundo”, necessita ter o seu relacionamento com o meio em que se desenvolve,
para que lhe confira um significado.
Na educação física e na fisioterapia, ainda se desenvolve uma abordagem em que o corpo é tratado
como uma máquina de reprodução de movimentos preestabelecidos e determinados, muitas vezes
chamados de técnicas, retratando assim um ser mecanizado (RECHINELI, PORTO, MOREIRA, 2008;
CONDRADE et al., 2010).
É importante retomar que a ideia de corpo-máquina – ou corpo objetivo – foi desenvolvida por
Descartes. De acordo com sua perspectiva, o corpo é concebido como o cárcere da alma ou da mente, e
só se movimenta pela ação da mente sem qualquer tipo de reflexão ou intencionalidade.
Figura 26 – Corpo-máquina: o corpo é tratado como um objeto, que pode ser reparado
e modificado, sem considerar o contexto individual e cultural no qual foi desenvolvido
Esse conceito de corpo-objeto pode ser observado em elementos estéticos das sociedades modernas,
em que se tem um padrão a ser seguido na questão corporal, segundo um modelo preestabelecido;
por exemplo: se está faltando volume nas mamas ou nas nádegas, implantam-se organismos não
pertencentes ao corpo, tratando-o como um objeto passível de manipulação, em busca de uma beleza
padronizada (MOREIRA; SIMÕES, 2013).
Logo, o corpo nunca será real, mas haverá modelos corporais, e a eles a realidade corporal
deverá ajustar-se ou reajustar-se, por meio de transições e mudanças corporais. Segundo Melani
41
Unidade I
(2011), esses modelos instigam e forçam o consumo de bens do corpo real para se atingir o
corpo ideal; porém os modelos normalmente são inatingíveis, gerando um fracasso pessoal e,
consequentemente, uma angústia.
Qual a função ou os objetivos de se realizar ações sem a reflexão acerca dos motivos que
estão envolvidos nessa prática? Por exemplo: correr em volta da quadra, ou realizar movimentos
preestabelecidos de alongamento, sem saber o motivo e as funções desses movimentos, em
processos repetitivos e, em alguns casos, até a exaustão. E quando não se consegue obter os
resultados esperados, apela-se para o uso de anabolizantes com o intuito de passar o limite
imposto pelo corpo (MOREIRA; SIMÕES, 2013).
Como foi apontado e criticado por Foucault, na concepção de corpo-máquina há ideias do corpo
como um corpo dócil, um objeto de poder de outra pessoa, pois esse corpo pode ser manipulado,
modelado, treinado, sendo o homem passivo perante o mundo real, e o ato de se obter conhecimento é
uma mera adequação à realidade vivente, ou seja, um conformismo.
Perante isso, se traz a ideia de um corpo-mercadoria, um corpo que pode ser comprado, modificado
e trocado, de acordo com “ondas de modismos” da cultura social vigente, em estreita relação com o ideal
capitalista atual, que leva as pessoas ao consumo exagerado e desenfreado. Isso pode ser observado
em diversas ações de marketing para padrões e expressões corporais da atualidade, que apresentam
resultado econômico extremamente vantajoso para quem controla as tendências, porém vendendo
ideias distorcidas (MORAIS, 2008).
42
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
O formato, o tamanho e a aparência do corpo desempenham papéis importantes nas funções sociais,
pois podem fornecer informações, por exemplo, sobre a posição/classe social à que o sujeito pertence,
seu modo de vida etc.
No decorrer do século XX, principalmente após 1960, o padrão vem se alterando. Busca-se um
corpo magro com formas musculares bem-definidas, adotadas como um padrão de beleza e com boa
aceitação pela sociedade, que passa a constituir um corpo-objeto de consumo, tendo em vista um
mercado crescente (BOSI et al., 2006; SAIKALI et al., 2004).
Tal busca pelo padrão de corpo ditado pela sociedade pode acarretar alguns problemas, como uma
visão deturpada da imagem corporal, que consiste na figura do próprio corpo construída na mente da
pessoa, em relação ao tamanho, à imagem e às formas corporais. Essa construção inclui processos que
podem ser influenciados por vários fatores, entre eles, crenças e valores inseridos pela cultura (RIBEIRO;
VEIGA, 2010; SCHERER et al., 2010).
De acordo com Saikali et al. (2004), o conceito de autoimagem ou imagem corporal envolve três
componentes:
• Perceptivo: relacionado à forma precisa da aparência física, que envolve estimativa do tamanho e
do peso corporal.
• Comportamental: relacionado a situações de fuga pelo indivíduo, por ter momentos de desconforto
ligado à aparência corporal.
Buscando essa afirmação pela sociedade, acaba-se gerando uma insatisfação com o próprio corpo,
“frequentemente associada a uma discrepância da percepção e o desejo relativo a um tamanho e uma
forma corporal” (BOSI et al., 2006, p. 109).
Com essa percepção deturpada da autoimagem podem ocorrer os transtornos de conduta alimentares,
como a anorexia nervosa e a bulimia, que têm nas mulheres as principais vítimas, acarretando problemas
clínicos de comprometimento da saúde, levando ao afastamento de atividades profissionais e, em casos
extremos, à morte (RIBEIRO; VEIGA, 2010).
A anorexia ou autoinanição pode ser fatal, e os indivíduos acometidos por esse transtorno apresentam
uma imagem corporal distorcida, porque embora, geralmente, estejam abaixo do peso ideal, acreditam
que estão gordos ou obesos.
43
Unidade I
Figura 28 – Apesar de ser um transtorno alimentar, uma pessoa que tem anorexia não necessariamente terá bulimia
44
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Apesar de as mulheres serem mais suscetíveis à anorexia e à bulimia, os homens também estão
passíveis de apresentar algum tipo de transtorno de imagem corporal.
Ocorre uma grande pressão principalmente por parte da mídia e da sociedade em relação ao
aprimoramento corporal, vinculando o corpo perfeito à prática de atividade física como uma promoção
da saúde e credibilidade social. Todavia, o excesso de atividade física pode acarretar riscos à saúde e
desenvolver o transtorno de imagem corporal, como a disformia muscular (LIMA; MORAES; KIRSTEN,
2010; DEZAN; MACHADO, 2011).
Ademais, pessoas com vigorexia não tendem a fazer atividades com características aeróbias, pois
acreditam que esse tipo de atividade acarreta perda de massa muscular, além de evitar a exposição de
seus corpos por sentirem vergonha (CAMARGO et al., 2008; DEZAN; MACHADO, 2011).
Para homens, a principal faixa etária acometida pela vigorexia é entre 18 a 35 anos, porém as
mulheres que realizam atividades esportivas, principalmente musculação de forma intensa e contínua,
sem respeitar as características de descanso e recuperação, com a intensão de aumentar a massa
muscular e ter maior definição muscular possível, não se importam com as consequências da rotina de
atividade ao sacrificar a vida social, os relacionamentos e o emprego, não estão isentas de apresentarem
esse quadro (DEZAN; MACHADO, 2011).
Pope Júnior, Phillips e Olivardia (2000) listam uma série de sinais de uma pessoa com vigorexia, como:
• Preocupação frequente de que seu corpo não seja magro, e sim musculoso.
• Perda de oportunidades sociais que teria usufruído em outras circunstâncias, porque prefere estar
na academia.
• Evitar a exposição de seu corpo, principalmente em situação em que outras pessoas possam vê-lo,
como piscina, praia e vestiários.
45
Unidade I
As principais causas na alteração da percepção da imagem corporal é uma imposição pela mídia,
sociedade e meio esportivo, de um padrão considerado ideal e que sem ele o indivíduo não terá sucesso
e felicidade, tornando o corpo prisioneiro de um sistema de poder, ditado e modificado por regras,
afetando a corporeidade de um indivíduo e até mesmo de uma parte da população.
O corpo carrega regras sociais, por isso é importante que, durante o processo de educação, ou reabilitação,
o profissional tenha que conhecer como o corpo do indivíduo funciona (os sistemas corporais), porém
considerando que o movimento humano é mais do que uma mera junção ou resultado de aspectos fisiológicos
ou biomecânicos ou de um processo de aprendizagem motora (GONÇALVES, 2012).
A corporeidade implica vida e existência do ser que pensa no mundo em que está inserido, pensa no
outro e em si, com o intuito de perceber e entender as relações. Assim, reaprende a todo o momento a ver
a vida e o mundo. Buscar a existencialidade, ver os objetos tendo a perspectiva de entendê-los e, assim,
aprender ou incorporar os mais variados significados com o maior número possível de perspectivas.
A concepção do homem como uma unidade que se relaciona com o mundo permite uma visão e
um entendimento mais amplo do ser humano, que pode se tornar um facilitador, trazendo um sentido
teórico-prático às diversas especializações ocasionadas pela racionalidade (mutilação), juntamente com
uma conexão entre as diversas ciências que compõem a educação física e a fisioterapia.
Contudo, cada indivíduo deve formular uma concepção diferenciada em relação ao corpo humano,
porém sem ter a ideia de que o corpo é uma máquina perfeita ou a ser melhorada nas questões de
rendimento, mas sim procurar observar e refletir acerca de uma corporeidade viva, existencial, racional
e sensível (MOREIRA et al., 2006).
46
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Ao mesmo tempo em que a corporeidade considera o sujeito um ser biológico, ela o considera um
ser social, relacionado ao seu contexto social, o que muitas vezes não é entendido ou concebido por
algumas áreas de conhecimento, principalmente por causa das ideias de divisão do ser humano.
Os profissionais de educação física e de fisioterapia devem ser capazes de compreender o homem em
sua totalidade e produzir uma intervenção condizendo com essa realidade de um novo homem.
Conseguir aplicar essa concepção em sua atuação irá exigir do profissional a busca por um corpo
possível em um tratamento fisioterapêutico ou na prática de atividade e exercícios físicos sistematizados,
deixando de lado a ideia de um corpo ideal ou perfeito, ou seja, abandonando o modismo que acontece
sazonalmente na sociedade.
A corporeidade está relacionada a uma interação do ser humano com o mundo em que vive, e isso
é representado pelo movimento, ou seja, pela motricidade, que é a intencionalidade, ocasionando a
superação. O sujeito, por intermédio da prática de atividades físicas ou tratamento fisioterapeutico, tem
de buscar a superação e ir além das possibilidades. No entanto, é preciso considerar as características e
limitações de cada pessoa, e não se utilizar exclusivamente tabelas e referências gerais de desempenho
de aptidões físicas.
Além disso, os profissionais têm de buscar a inclusão de diversos tipos de corpos nos exercícios
físicos, e não somente aqueles que apresentam um suposto potencial para atingir a perfeição estética e
performática (RECHINELI, PORTO, MOREIRA, 2008).
Como dito anteriormente, o corpo não é uma junção de diversas partes ou diversos órgãos com
funções distintas, como se fosse uma máquina, nem é um ser que sobrevive baseado em meras relações
de causa e efeito, por exemplo, que recebe um estímulo e apresenta uma resposta adequada a esse
estímulo, sem qualquer tipo de reflexão ou pensamento. O corpo é uma unidade integrada e complexa,
com sentidos, razões e diversas experiências com o mundo, com o qual mantém relações complexas de
dependência e individualidade.
O profissional não pode desprezar as experiências do sujeito e o sistema social ou a cultura em que
ele está inserido, por isso sempre deve procurar contribuir para o desenvolvimento desse corpo real ou
existencial que, quando se movimenta, busca a constante superação.
Isso faz com que o profissional utilize do corpo do sujeito, o qual ele é o autor de toda a sua história
e sua cultura, que saiba trabalhar com o “sujeito relacional, criativo, dependente de conhecimento de si,
dos outros e do mundo” (MOREIRA et al., 2006). Sendo assim:
Viver é conviver, ou seja, viver com o outro, seja esse outro homem, mulher, criança,
idoso, corpo escultural pelos padrões da moda, corpo dotado de restrições, mas
todos, indistintamente buscando superação (MOREIRA et al., 2006, p. 121).
Essa corporeidade exigirá um trabalho amplo do profissional, pois ele irá atuar com uma gama de
sujeitos em diversos contextos socioculturais, ou seja, não apenas com aquele que apresenta dificuldades
em suas habilidades, mas também com dificuldade em conseguir uma nova concepção no que diz
respeito ao corpo, principalmente pelas mensagens vinculadas em diversos meios de comunicação em
relação aos padrões estéticos e tipos de corpos aceitos pela sociedade e até mesmo as atividades que
devem ser realizadas para atingir esse corpo.
Resumo
Mas todas as ações dos indivíduos também estavam ligadas aos aspectos
sociais da Idade Média, no caso, ao sistema de castas, ou seja, quem
nascia em determinada classe social não tinha a possibilidade de mudar
e melhorar suas condições sociais. A Idade Média também é marcada por
um processo de descorporalização, principalmente por questões religiosas
cujas instituições tinham o controle sobre diversas questões da ordem
social vigentes.
49
Unidade I
51
Unidade I
Exercícios
A busca exagerada pelo físico perfeito atinge jovens que estão cada dia mais preocupados
com a aparência. O problema acontece quando isso se torna uma doença e eles passam a praticar
exercícios físicos em excesso e fazem uso de anabolizantes, ignorando efeitos e complicações
ocasionados por tal procedimento.
A) Proibir que esses jovens façam qualquer menção ou tirem dúvidas acerca do uso de esteroides
anabolizantes, de modo a não dar publicidade a esse tema.
C) Criar um selo que ateste a autenticidade dos esteroides anabolizantes para impedir a
comercialização e o uso de produtos falsificados.
D) Estimular a prática de exercícios físicos para uma vida saudável e esclarecer as finalidades e os
riscos do emprego dos esteroides anabolizantes.
E) Divulgar, entre esses jovens, casos de uso dos esteroides anabolizantes com fins estéticos que
priorizam o culto ao corpo idealizado.
A) Alternativa incorreta.
Justificativa: pois também é responsabilidade do profissional de educação física informar quais são
os malefícios do uso de esteroides anabolizantes e, assim, criar uma consciência sobre os danos desse
uso no corpo humano.
52
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
B) Alternativa incorreta.
Justificativa: uma vez que a fiscalização sobre a venda de tais produtos cabe à Federação, aos estados
e aos municípios, e essas substâncias ergogênicas só podem ser receitadas por médicos e dentistas, de
acordo com a Lei nº 9.965, de 27 de abril de 2000.
C) Alternativa incorreta.
Justificativa: está incorreta, pois quem libera e atesta se um produto é verdadeiro e confiável para
o uso em seres humanos é a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os profissionais de
educação física não têm essa autonomia.
D) Alternativa correta.
Justificativa: essa abordagem cria uma consciência a respeito do uso de recursos ergogênicos,
principalmente o uso em tempo prolongado, e também dos motivos que levam um indivíduo a usar
essas substâncias para a obtenção de um corpo aceito por uma sociedade padronizada.
E) Alternativa incorreta.
Justificativa: em partes. É correto divulgar casos do uso de esteroides anabolizantes, porém não
com o viés de que o seu uso seja a única forma de se obter um corpo idealizado por uma cultura que
manipula o corpo para determinado estereótipo.
Questão 2. (Enade 2007) Um profissional de educação física, no âmbito em que trabalha, diagnostica
o grande interesse dos jovens pelas práticas corporais divulgadas pelas mídias impressas e nos programas
de televisão que indicam dietas, medicamentos, cremes, peças de vestuário, calçados e aparelhos de
musculação de última geração, que prometem que a pessoa atinja, em tempo reduzido, um corpo nos
padrões divulgados como ideais pela mídia.
O profissional, então, sente-se desafiado a satisfazer essa demanda e, ao mesmo tempo, promover a
capacidade crítica desses jovens.
53
Unidade I
A) Alternativa incorreta.
Visto que, normalmente, as dietas são publicadas em revistas sem qualquer tipo de embasamento
científico, sem fazer a relação das privações nutricionais que elas trazem, mas sempre com o objetivo de
perder massa corporal para atingir o padrão corporal tido como “ideal”.
B) Alternativa incorreta.
Pois as práticas corporais têm de ser realizadas de uma forma intencional pelos indivíduos, no entanto
nem todas as práticas podem ser realizadas por todas as pessoas, observando, sempre, os diversos tipos
de características, não somente a “modalidade da moda”.
C) Alternativa incorreta.
Pelo fato de serem divulgadas apenas as características positivas, uma vez que as propagandas têm
como função a venda e o consumo dos equipamentos esportivos. Por exemplo: “com esse tênis, você faz
o que o jogador faz”, porém as características individuais nem sempre condizem com as especificações
mostradas pela propaganda, levando, muitas vezes, a práticas corporais danosas ao corpo.
D) Alternativa incorreta.
A carga cultural que cada pessoa carrega em seu corpo faz com que ela enxergue e observe os demais
corpos que se relacionam de formas diferentes, além do que a influência da mídia pode gerar distorções
a respeito da concepção que se tem sobre o próprio corpo. Assim, é necessário ter uma discussão, não
para criar uma harmonia entre os jovens, mas, sim, para que conheçam e sejam críticos às tendências
impostas por diversas formas de poder.
E) Alternativa correta.
Com isso, os jovens passam a ter consciência e a refletir sobre as práticas corporais que são inseridas
pela cultura, proporcionando conhecimento sobre seu próprio corpo e o mundo em que ele se relaciona.
54
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Unidade II
Quando alguém é questionado ou algum indivíduo indaga: “você considera ter qualidade de vida?”
“estou em busca de mais qualidade de vida?”, quais são os aspectos e as características que estão
envolvidos na expressão qualidade de vida?
Ao se falar em “qualidade de vida”, essa expressão pode ter diferentes significados e conceitos,
pois irá retratar diversos conhecimentos, experiências e valores individuais e coletivos, os quais irão
refletir o momento histórico, a classe social e a cultura pertencentes aos indivíduos (DANTAS; SAWADA;
MALERBO, 2003).
O termo qualidade de vida tem sido utilizado desde os anos 1960, principalmente com força política.
O primeiro a utilizar essa expressão foi o presidente dos Estados Unidos, Lyndon Johnson, em seu discurso,
ao relatar que “os objetivos não podem ser medidos através de balanços de bancos. Eles só podem ser
medidos através da qualidade de vida que proporcionam às pessoas” (PIRES, 2007).
O conhecimento popular se apropriou dessa expressão como uma forma de simplificar a melhora ou
um padrão elevado de bem-estar nas vidas dos indivíduos, seja de ordem social, emocional ou econômica
(ALMEIDA; GUTIERREZ; MARQUES, 2012). Todavia, a compreensão sobre a qualidade de vida remete a
inúmeras variáveis do conhecimento humano, nos âmbitos biológico, médico, social, econômico, político
entre outros, portanto, há inter-relações de inúmeras variáveis.
De acordo com Seidl e Zannon (2004), o termo qualidade de vida é utilizado em duas vertentes
de pensamentos:
55
Unidade II
O grupo de estudos sobre qualidade de vida da Organização Mundial da Saúde (WHOQOL GROUP) definiu
que a qualidade de vida é a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistemas
de valores e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (WHOQOL GROUP, 1995).
Há seis domínios considerados principais, quais sejam: saúde física, estado psicológico, níveis de dependência,
relacionamento social, características ambientais e padrão espiritual (DANTAS; SAWADA; MALERBO, 2003).
Guiteras e Bayés (1993) delimitam que qualidade de vida está relacionada à saúde como uma valorização
subjetiva que o paciente faz de diferentes aspectos de sua vida quanto ao seu estado de saúde.
Para Cleary, Wilson e Fowler (1995), o termo se refere a vários aspectos da vida de uma pessoa que
são afetados por mudanças no seu estado de saúde e que são significativos para a sua qualidade de vida.
Já Patric e Erickson (1993) conceituam que qualidade de vida é o valor atribuído à duração da
vida, modificado pelos prejuízos, estados funcionais e oportunidades sociais que são influenciados por
doenças, danos, tratamentos ou políticas de saúde.
Com uma visão mais generalista, Martin e Stockler (1998) percebem que a noção de qualidade de
vida pode ser mensurada pela distância das expectativas individuais e a realidade vivida, ou seja, quanto
menor for essa distância, melhor será a qualidade de vida.
• Cultural: refere-se aos valores e necessidades dos povos ou sociedades, revelando assim seus
costumes e suas tradições.
• Classes sociais: em sociedades que apresentam uma grande desigualdade entre classes, o padrão
de qualidade de vida se relaciona ao bem-estar das camadas superiores e ascensão de classes
inferiores para superiores.
Além dessa percepção individual de qualidade de vida, esse conceito é intrínseco, isto é, próprio de
cada indivíduo e sofre influências de propagandas da mídia, dos alimentos e das campanhas políticas.
56
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Assim, cria-se a ideia de que elevar a qualidade depende somente dos esforços do sujeito (ALMEIDA;
GUTIERREZ; MARQUES, 2012).
Satisfação
pessoal
Estabilidade
Trabalho financeira
Ambiente de
Saúde qualidade
Pela diversidade de domínios que estão relacionados ao termo, não existe uma concordância para
um conceito único e definitivo, já que alguns destacam a importância de um bem-estar econômico,
outros o sucesso pessoal ou o desenvolvimento social (PIRES, 2007). Portanto, se faz necessário ter
atenção a uma multiplicidade de fatores que envolvem o universo da qualidade de vida.
Conforme mencionado anteriormente, a qualidade de vida sempre esteve presente na vida humana,
pois está relacionada ao interesse pela vida, tanto individual como socialmente.
Dessa forma, a abordagem da qualidade de vida está relacionada à percepção de como as pessoas
vivem, sentem e compreendem seu cotidiano, envolvendo questões como educação, saúde, transporte,
moradia e participações nas decisões que lhe dizem respeito (ALMEIDA; GUTIERREZ; MARQUES, 2012).
Mas para alguns autores a qualidade de vida tem uma ligação estreita com o desenvolvimento
do ser humano, que representa as diversas combinações que um indivíduo está apto a fazer, ou seja,
as diversas funcionalidades que compõem e que representam o estado da pessoa, abrangendo os
diversos componentes que permeiam o cotidiano do indivíduo ou o modo como age em sua história e
desenvolvimento (HERCULANO, 2000).
Com essas definições, a qualidade de vida é avaliada de acordo com a capacidade para alcançar as
funcionalidades, como as funções elementares, por exemplo, de se alimentar adequadamente, assim
como de obter e manter a saúde, e ainda as funções que envolvem autorrespeito e integração social. Essa
capacidade está vinculada a um conjunto de diversos valores, como a personalidade, e principalmente às
características e às possibilidades sociais (HERCULANO, 2000).
Retornando a definição dada pela Organização Mundial da Saúde (1995) de que a qualidade de
vida é “a percepção do indivíduo de sua inserção na vida do contexto da cultura e sistemas de valores
nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”, é possível
estabelecer alguns aspectos para se conceber os indicadores de esferas objetivas e subjetivas, sempre
tendo como perspectiva a visão do indivíduo (ALMEIDA; GUTIERREZ; MARQUES, 2012).
57
Unidade II
A análise sobre a perspectiva objetiva está relacionada aos elementos passíveis de serem quantificados
e concretos, que podem sofrer transformações pelo ser humano. São considerados elementos objetivos
fatores como alimentação, moradia, acesso à saúde, emprego, ou seja, necessidades que garantem a
sobrevivência do indivíduo na sociedade.
Tomando por base esses aspectos objetivos são traçados índices de referência sobre características
sociais e econômicas da população, e a partir desses índices criam-se políticas e ações voltadas para a
melhoria da qualidade de vida da população (ALMEIDA; GUTIERREZ; MARQUES, 2012).
Nesse sentido, a caracterização da qualidade de vida não se dá somente por aspectos objetivos,
mas também leva em consideração fatores subjetivos e emocionais, expectativas e possibilidades de
um grupo social ou de um indivíduo quanto a suas realizações e percepção de sua vida, considerando
inclusive questões referentes a prazer, felicidade e tristeza (ALMEIDA; GUTIERREZ; MARQUES, 2012).
Percepção
objetiva
+ Qualidade
de vida
Percepção
subjetiva
Existe uma relação muito estreita entre os elementos objetivos e subjetivos, e nenhuma análise
ou compreensão da qualidade de vida de um sujeito pode ser contextualizada sem antes estabelecer
a qualidade de vida coletiva, observando o que é representado na definição da OMS, que contempla
aspectos subjetivos e objetivos.
O verbo ter está relacionado às condições necessárias para uma sobrevivência fora da situação de
miséria, como habitação, emprego, condições físicas de trabalho, saúde e educação.
O verbo amar diz respeito a relacionar-se com outras pessoas e, assim, formar uma identidade social.
58
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Esses indicadores podem ser mensurados tanto em aspectos objetivos quanto subjetivos:
Quadro 3
A esfera de percepção objetiva de qualidade de vida está relacionada à garantia e satisfação em ter
acesso aos elementos essenciais e necessários para a sobrevivência do ser humano, como: água potável,
alimentos, vestuário, serviço de saúde, trabalho digno, lazer, entre outros (MINAYO, 2000).
Pelo fato de serem bens de consumo (água, alimentos etc.) e atividades concretas (trabalho, serviços
de saúde) não dependem, em princípio, de uma avaliação subjetiva ou interpretação do indivíduo
(ALMEIDA; GUTIERREZ; MARQUES, 2012).
Figura 31 – A percepção objetiva não depende de uma avaliação subjetiva – Rio de Janeiro, Brasil
59
Unidade II
Esses indicadores têm como objetivo refletirem as características gerais de uma população, e não
levam em consideração características históricas e culturais, e sim apenas questões socioeconômicas em
relação aos bens de consumo (GONÇALVES; VILARTA, 2004).
Nessa abordagem é possível realizar uma comparação objetiva de uma mesma população em
diversas épocas históricas ou entre diferentes sociedades. É possível classificar os grupos por critérios
mais quantitativos e excluir as “percepções individuais e especificidades culturais dos sujeitos e das
coletividades”, sendo utilizado como índices gerais, com sentido político e mostrando hegemonia
(ALMEIDA et al., 2012, p. 25).
A percepção objetiva tem pontos positivos pela facilidade de obtenção de dados, criando um índice
geral das condições de qualidade de vida, pois esses dados estão ligados a elementos como saúde,
moradia, educação, transporte, entre outros seguimentos, sendo esse enfoque quantitativo, ou seja, lida
com a presença ou ausência de determinado elemento em uma população.
Segundo o PNUD (2016), o IDH é formado por três pilares: saúde, educação e renda, que são avaliados
da seguinte forma:
— Média de educação dos adultos, que é avaliada pela média de anos de estudos recebidos
durante a vida após os 25 anos de idade.
— Expectativas de anos de escolaridade para crianças na idade de iniciar a vida escolar.
• Padrão de vida (renda) – avaliada pela renda nacional bruta per capita, que é expressa em poder
de paridade de compra.
A classificação para determinar se um local tem um alto ou baixo desenvolvimento humano varia de
0 a 1. Quanto mais próximo do 1, maior é o desenvolvimento humano (PNUD, 2015):
60
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
61
Unidade II
Figura 33 – Niamey, capital do Níger, país com o menor indicador de IDH mundial
1
0,9
0,8
0,7
0,6
IDH
0,5
0,4
0,3
0,2
0,1
0
1990 2000 2010 2011 2012 2013 2014
Ano
IDH Brasil IDH Noruega IDH RCA
Um exemplo disso é a aplicação de IDH para a esfera municipal no Brasil, realizado com os dados do
IBGE, segundo o qual a nação apresenta municípios com altíssimos escores de IDH, como São Caetano
do Sul – SP (0,862), Brasília – DF (0,824) e Florianópolis – SC (0,847), e, em contrapartida, escores muito
baixos, como Melgaço – PA (0,418), Fernando Falcão – MA (0,443) e Japorã – MS (0,526) (PNUD, 2013).
Conforme os dados apresentados identifica-se que o IDH nacional não reflete a verdadeira realidade
ou as verdadeiras realidades que um país comporta, ou seja, a qualidade de vida de uma população,
tendo como parâmetros somente a percepção objetiva de elementos concretos.
Por essa razão, a percepção da qualidade de vida somente por critérios objetivos, muitas vezes, é
utilizada como propaganda política, dando uma visão generalista e homogênea de uma realidade que
ainda apresenta muita desigualdade e é extremamente heterogênea principalmente no Brasil. Com isso,
os dados que compõem essa percepção acabam englobando diferentes sujeitos em um mesmo contexto.
62
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Apesar de identificar os níveis de qualidade de vida como uma percepção do indivíduo, não
apresentando o que ocorre em um contexto mais global, a análise objetiva é importante para determinar
uma melhor intervenção em áreas que necessitam de um melhor desenvolvimento, como saúde e ações
sociais, direcionando uma melhoria para um determinado grupo.
A esfera de percepção subjetiva em um primeiro momento trabalha com as ações individuais diante
da vida do próprio sujeito, como a expectativa de seus próprios níveis de qualidade de vida (ALMEIDA
et al., 2012).
Por percepção subjetiva se compreende o estilo de vida do sujeito, caracterizado pelos hábitos
aprendidos e adotados durante a vida, que têm relação com a realidade social, ambiental e familiar. Desse
modo, as ações que refletem na vida desse indivíduo, como os valores e as oportunidades, devem estar
relacionados ao bem-estar do sujeito, como o controle do estresse, a nutrição, a prática de atividades
físicas regulares, os cuidados com a saúde e o convívio social.
Essa percepção está relacionada a três questões: o bem-estar dentro das experiências individuais; a
presença de aspectos positivos na vida do indivíduo (não apenas de aspectos negativos); uma medida
global, não somente um único aspecto da vida (GIACOMONI, 2004).
Além disso, essa percepção relaciona-se com os valores não materiais como amor, felicidade,
inserção social e realização social. Como é uma percepção subjetiva, é preciso levar em consideração
as possibilidades de uma conceituação e valorização individual de muitas variáveis não possíveis de
mensuração, e isso irá refletir no cotidiano do sujeito (MINAYO, 2000).
Ainda, essa percepção subjetiva, como a felicidade, a satisfação, o “estado de espírito”, entre outras,
de uma forma geral vai criar a perspectiva de como os sujeitos avaliam suas vidas, ou seja, se as pessoas
experimentam suas vidas positivamente (GIACOMONI, 2004). Assim, a esfera subjetiva está muitas vezes
atrelada à ideia de felicidade.
Por conseguinte, a felicidade está ligada a questões externas, não como algo subjetivo, mas uma
qualidade desejada. Um segundo ponto está relacionado à forma como as pessoas avaliam os termos
positivos da vida e uma terceira categoria considera a percepção positiva se sobrepondo a uma percepção
negativa de satisfação da vida (GIOCOMONI, 2004).
Com isso, o ambiente e a cultura que o sujeito incorpora e as condições de desenvolvimento possíveis
do sujeito são muito importantes para a formação da esfera de percepção subjetiva, que envolve
sentimentos e valores de juízo, direcionando as diversas possibilidades de ações na sociedade, dentre
63
Unidade II
elas, a percepção e o julgamento de sua vida que estão atrelados a expectativas e ao entendimento de
bem-estar do grupo ou da sociedade em que ele está inserido.
Cada sociedade irá determinar, por meio de sua cultura, quais são seus padrões de vida e assim
direcionar as expectativas e os níveis de satisfação dos indivíduos que a compõem, e isso refletirá sobre
o que é ou não é uma boa qualidade de vida, como o grau de satisfação pelas realizações dos indivíduos
ou acesso a bens de consumo. Isso pode variar de acordo com a sociedade e os valores pessoais.
Um exemplo de como a cultura interfere nas escolhas pessoais e repercutirá na percepção subjetiva
de uma população são as medidas tomadas pela Suécia, que em 2014 recusou ser uma das candidatas
a receber as Olímpiadas de 2022, pois seus representantes no governo tinham outras prioridades para
investir os recursos provenientes dos impostos. “Não é possível conciliar um projeto de sediar os Jogos
Olímpicos com as prioridades de Estocolmo em termos de habitação, desenvolvimento e providência
social” (DEARO, 2014).
Pelo fato de a percepção subjetiva ser mais complexa, as expectativas e os gostos dos indivíduos irão
variar de acordo com a sua classe social; essa perspectiva influenciará de forma direta a sua percepção
individual a respeito da vida. Além das divisões de classes sociais, questões como diferenças culturais,
separadas pela história ou grupos étnicos, fazem com que o tipo de percepção também se altere
(ALMEIDA et al., 2012).
Para conseguir mensurar os fatores culturais que constroem a percepção sobre a qualidade de vida
e com isso a esfera subjetiva, é necessário a análise da percepção do indivíduo a respeito da satisfação
e das expectativas que irão considerar as diversas primícias culturais da sociedade contemporânea em
que ele está inserido.
Só é possível falar e compreender a qualidade de vida tendo como ponto inicial a percepção do
indivíduo sobre a sua própria vida.
Mesmo que a variável seja constituída de uma percepção, isto é, uma visão subjetiva de um indivíduo,
ela caracteriza a sua realidade histórica, econômica e de saúde, e isso é construído em relação à carga
cultural, a qual é derivada das relações do homem com os bens materiais que exercem algum tipo de
interferência em sua vida. Logo, a esfera subjetiva é válida e de extrema importância para as discussões
e o entendimento a respeito da qualidade de vida.
64
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Percepção do
indivíduo
Características
da sociedade
Contexto
cultural
Há dois tipos de perspectivas – uma objetiva e outra subjetiva –, e ambas não podem ser mensuradas
de maneira segregada, pois elas se complementam, formando assim o conhecimento da qualidade de
vida. Contudo, se faz necessário saber quais são as diferenças entre essas duas esferas de percepção, pois
essa divisão se apresenta de maneira muito sútil. A questão é que a qualidade de vida lida com inúmeros
fatores que afetam a vida do sujeito, e esses fatores estão relacionados entre si.
Pelo fato de ocorrer essa interdependência entre os fatores que compõem as esferas objetiva e
subjetiva, é difícil definir em qual esfera determinado fator se encaixa, ou seja, as relações são inevitáveis,
por causa da influência entre as esferas de percepção (ALMEIDA et al., 2012).
A relação confusa entre essas esferas pode estar relacionada ao conceito de qualidade ambiental
que, de acordo com Barbosa (1998), é constituído por um conjunto de juízo de valores relacionados
ao estado ou às condições que o ambiente proporciona, ou seja, a forma como o ambiente influencia
a qualidade de vida dos sujeitos. O ambiente, então, irá refletir o contexto social em que o sujeito
está inserido, sendo um determinante para suas possibilidades de desejos, necessidades e realizações
(ALMEIDA et al., 2004).
Perante essa reflexão, a posição que o sujeito ocupa na sociedade, seus hábitos e seu comportamento
serão delimitados pela hierarquia social; o que os sujeitos de determinado grupo consomem e utilizam,
além de seus bens, diferenciarão as estruturas sociais. E para assumir as características simbólicas
de determinado grupo, o indivíduo precisa ter as condições que lhe permitam realizar esses desejos
(ALMEIDA et al., 2012).
65
Unidade II
Em reportagem do portal UOL economia, foram divulgadas as marcas consumidas pela camada
mais elitizada da população e que começam a ser utilizadas pelas pessoas que compõem as camadas
economicamente “inferiores” da população, excluindo o caráter exclusivo e elitista dos produtos em
questão. Por outro lado, tais marcas não querem ser vistas com essa “parcela da sociedade”:
Boa parte das marcas tem vergonha de seus clientes mais pobres. São marcas
que historicamente foram posicionadas para a elite, e o consumidor que
compra exclusividade pode não estar muito feliz com essa democratização
do consumo [...] Algumas empresas me procuram dizendo “minha marca
está virando letra de música, febre na periferia e não quero estar associado
a esse pessoal” (NEUMAN, 2014).
Essa diferenciação entre as classes ou estruturas sociais irá reproduzir diversas possibilidades e
expectativas de realizações para a obtenção de bem-estar e conforto na sociedade. Isso se deve porque
os indivíduos que integram cada camada social têm objetivos e necessidades diferentes, as quais são
exteriorizadas no estilo de vida – construção histórico-social do sujeito que influencia seus hábitos
(ALMEIDA et al., 2004).
O estilo de vida é representado por um conjunto de ações que repercutirá em atitudes, valores
e oportunidades na vida de um indivíduo (NAHAS, 2003); essas ações mostrarão a carga cultural do
sujeito, interferindo em seu cotidiano. Também estão ligadas às possibilidades de escolhas e adoções ou
não de práticas em seu dia a dia (ALMEIDA et al., 2012).
Na sociedade contemporânea, a escolha por um estilo de vida saudável é um fator determinante para
as situações de saúde e de vida do indivíduo, porém muitas vezes essa escolha não é possível por causa de
problemas nas condições socioeconômicas. Alguns fatores, como nutrição adequada, horas de descanso,
acesso ao sistema de saúde, práticas de atividade física, não são possíveis ou acessíveis a todas as pessoas,
em decorrência das condições de vida que possam possibilitar tais ações (ALMEIDA et al., 2004).
Minayo (2000) discorre que em sociedade divididas em classes, os padrões de bem-estar vêm das
classes superiores, que são as possuidoras de grande parcela da economia e têm acesso às inovações
tecnológicas, estabelecendo uma percepção positiva sobre a vida ou o que seria um nível adequado de
qualidade de vida.
66
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Pelo processo de transmissão cultural, a sociedade atual cria os padrões de qualidade e estilo de vida
que devem ser seguidos, de uma forma consciente ou não, e isso é absorvido e incorporado pelo sujeito,
construindo assim sua percepção e expectativas sobre sua própria vida.
Não é possível entender ou conceber uma qualidade de vida não atrelada a uma política de Estado
ou mesmo do mercado econômico, uma vez que seria uma visão mínima sobre o conceito. Muitas vezes,
o emprego dessa temática remete a uma atenção a determinada demanda de mercado ou de produtos
específicos e promessas políticas, principalmente em épocas eleitorais. Assim, tem-se a ideia de que a
qualidade de vida está atrelada a determinado produto ou determinado acesso a uma ação política ou
programa político.
O Estado, então, assume a ideia mínima de responsabilidade, em que somente ele tem de ofertar as
condições ou a melhoria em determinados setores de serviços para a população, como saúde, transporte
e educação, melhorando a qualidade de vida; essas ações, porém, têm de possibilitar que os indivíduos
adquiram e incorporem estilos de vida mais saudáveis (ALMEIDA et al., 2012).
Ter uma boa perspectiva de qualidade de vida dependerá de quais possibilidades o sujeito tem para
satisfazer as suas necessidades fundamentais, e isso está relacionado com a capacidade de realização do
indivíduo, o qual depende das oportunidades reais para que as ações ocorram – em outras palavras, o
sujeito deve ser o principal ator social, isto é, alguém que atua, que age na sociedade. Segundo Almeida
et al. (2012), a construção de uma boa ou má percepção de qualidade de vida está ligada:
Essas supostas necessidades o sujeito incorpora ou não como uma verdade para sua própria vida.
Um sujeito, para considerar que está vivendo com qualidade de vida, provavelmente consegue realizar
as expectativas criadas pela sociedade em que ele vive e pelas escolhas determinadas em consonância
com as possiblidades que o sistema social lhe proporcionou.
Assim, a percepção de diferentes níveis de qualidade de vida irá se tornar ampla, o que não pode
ser determinado por uma análise global e homogênea. Convém mencionar que os indicadores objetivos
são determinantes para traçar o perfil de grupos sociais, e são muito utilizados com a finalidade de
determinar ações necessárias em uma área deficiente. Todavia, indicadores objetivos não refletirão
67
Unidade II
a percepção dos indivíduos como os principais beneficiários para a incorporação dessa melhoria de
qualidade de vida (ALMEIDA et al., 2004).
A qualidade de vida vem recebendo uma crescente atenção, principalmente dentro das áreas das
ciências biológicas e humanas, com o objetivo de criar um amplo controle das variáveis de estudos
dessas áreas.
Como dito anteriormente, a expressão qualidade de vida passou a ser usada cotidianamente como
uma noção de satisfação geral com a vida, seja de maneira global, seja dividida em esferas, que, quando
estão agrupadas, podem indicar uma aproximação ao conceito mais geral. Essas esferas são abordadas e
estão ligadas aos interesses do que será mensurado ou por quem será mensurado, como uma abordagem
jornalística, uma pesquisa de mercado ou avaliação e operacionalização de uma ação social (ALMEIDA
et al., 2012).
A qualidade de vida abrange muitos fatores – de percepção objetiva e subjetiva – e a sua medição,
muitas vezes, não contempla a realidade, principalmente a de cada indivíduo. A qualidade de vida é
apresentada como um conceito de difícil compreensão e tem diversas delimitações que possibilitam a
completa medição em qualquer tipo de trabalho.
Os estudos sobre essa temática, segundo Almeida et al. (2012), podem ser classificados de acordo
com quatro abordagens:
• Econômica: tem como principais elementos os indicadores sociais, como renda, transporte, acesso
aos serviços públicos, entre outros.
• Psicológica: busca indicadores que tratam das reações subjetivas do indivíduo com suas
experiências sobre qualidade de vida, sendo avaliado por sua própria vida, felicidade e satisfação.
• Geral: abordagem multidimensional que apresenta uma organização mais complexa e dinâmica dos
componentes. Valores, inteligência e interesses pessoais são fatores que devem ser considerados.
A representação social, que retrata a qualidade de vida, é criada tendo parâmetros objetivos e subjetivos
referentes à satisfação das necessidades básicas e das necessidades criadas pelo desenvolvimento
econômico e social de determinada cultura (ALMEIDA et al., 2012).
68
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Sendo assim, os parâmetros mais complexos estão relacionados às ideias de ser, pertencer e transformar.
O ser se relaciona com as habilidades individuais, a inteligência, os valores e as experiências de vida; o
pertencer se associa às ligações interpessoais, às escolhas, além da participação em grupos e da inclusão em
programas sociais; o transformar trata das práticas, como trabalho, programas educacionais, oportunidades
de desenvolvimento das habilidades em estudos formais e informais (ALMEIDA et al., 2012).
Esses parâmetros apresentam uma organização de muito dinamismo entre si, que considera a pessoa
e o ambiente, bem como as oportunidades e os obstáculos.
Ser
Pertencer
Transformar
Qualidade de vida
Figura 36 – Representação do dinamismo da organização da qualidade de vida
Gutierrez e Almeida (2006) ainda qualificam que a noção de qualidade de vida remete à relação
entre o sujeito e a sociedade, tendo como parâmetros alguns referenciais:
• Separações sociais, pois as ideias de qualidade de vida se relacionam aos ideais de bem-estar das
camadas superiores e à passagem para essas camadas.
Os instrumentos que são utilizados para a avaliação e a mensuração da qualidade de vida variarão
de acordo com a abordagem e os objetivos dos estudos. O IDH e o WHOQOL são uma tentativa de
padronização de medida, permitindo a comparação entre sociedades (ALMEIDA et al., 2012).
Uma das formas mais tradicionais e usadas como classificação em nível mundial para avaliar a
qualidade de vida em grandes populações ou nos diversos países é o Índice de Desenvolvimento Humano.
O IDH é um instrumento que tenta obter uma visão da realidade global de um país, e tem como
parâmetros os âmbitos de saúde, educação e renda, porém não abrange os componentes relacionados
ao desenvolvimento do ser humano.
69
Unidade II
O próprio PNUB (2016) considera que o desenvolvimento humano não pode ser aferido somente
pela perspectiva econômica, pois se relaciona com a renda ou os recursos que um indivíduo ou uma
sociedade pode gerar. Essa renda é importante para a manutenção das condições básicas de sobrevivência
e a aquisição de bens materiais, entretanto:
Com isso, é reforçado que a qualidade de vida de um indivíduo ou população não pode ser medida
somente de uma perspectiva objetiva, como a renda, por exemplo, mas também é necessária a perspectiva
subjetiva da pessoa a respeito da forma como ela concebe e entende o contexto social.
Logo, essa qualidade é construída a partir da relação entre diversos fatores, como biológicos, sociais
e psicológicos, além da integração entre o sujeito e a sociedade, considerando-se o período da vida e o
meio sociocultural em que ele está inserido (REIS JUNIOR, 2008).
Lembrete
Durante os anos de 1990, ocorreu um crescimento muito grande de instrumentos, a fim de mensurar
a qualidade de vida e seus componentes – com destaque para os Estados Unidos da América, com
um interesse em traduzir esses instrumentos para outros países. Porém somente replicá-los em outras
culturas dificilmente refletiria a realidade dessa cultura, pois se correria o risco de que os aspectos
aferidos nos instrumentos não a retratassem adequadamente (FLECK, 1998).
Desta forma, o WHOQOL Group, um grupo de estudos e pesquisa em qualidade de vida da Organização
Mundial de Saúde, em um trabalho colaborativo multicêntrico, ou seja, abordando diversas culturas,
70
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
A construção desse instrumento ocorreu em quatro estágios, que vão desde a tentativa da construção
de um conceito ou um consenso para a qualidade de vida por experts (peritos) da área, passando pela
confecção de um instrumento piloto e a testagem em campo.
71
Unidade II
Mesmo não apresentando um conceito sobre qualidade de vida, três pilares referentes ao constructo
desse termo foram definidos, por meio dos especialistas na temática de diversas culturas. Os três aspectos
fundamentais são (FLECK, 1998):
• Subjetividade.
• Multidimensionalidade.
- Estabelecimento de
- Definição de qualidade um consenso para a
1. Clarificação dos - Revisão por experts de vida. definição de qualidade
conceitos internacionais. de vida e para uma
- Definição de um abordagem internacional
protocolo para o estudo. da avaliação de qualidade
de vida.
- Estrutura comum de
domínios.
- Aplicação em grupos - Conjunto de 100 - Estabelecimento de
4. Teste de campo homogêneos de questões. prioridades psicométricas
pacientes. do WHOQOL.
- Escala de respostas
equivalentes em
diferentes idiomas.
Com a observação do quadro a respeito dos estágios em que foi composto o trabalho de
desenvolvimento do WHOQOL-100, fica evidente a preocupação em se criar um instrumento que
contemplasse qualquer perspectiva cultural.
A construção dos domínios e subdomínios (facetas) foi discutida com os grupos focais, em diferentes
centros, tendo como parâmetros indivíduos normais, portadores de doenças e profissionais da saúde
(FLECK, 1998).
72
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
A função dos grupos focais era questionar os participantes de como cada domínio e subdomínio
interfere em sua qualidade de vida e qual seria a melhor forma de realizar a pergunta para
obter um melhor entendimento. Com o encontro de 15 realidades culturais distintas, formularam
as questões com uma linguagem natural e compreensível, não aos profissionais, mas sim aos
indivíduos leigos.
A ideia de se utilizar uma diversidade cultural na construção desse instrumento mundial é, a partir
dessas realidades diferentes, tentar ao máximo reduzir as interferências culturais, principalmente
pertencentes à perspectiva subjetiva dos sujeitos – diferentes de um instrumento formado em uma
única realidade, como a dos Estados Unidos.
O instrumento utiliza uma escala de respostas do tipo Likert, em três escalas: escala de
intensidade (nada; muito pouco; mais ou menos; bastante; extremamente); escala de frequência
73
Unidade II
(nunca; raramente; às vezes; repetidamente; sempre); escala de avaliação (muito ruim; ruim; nem
ruim/nem bom; bom; muito bom, e muito insatisfeito; insatisfeito nem satisfeito/nem satisfeito;
satisfeito; muito satisfeito).
• Escala de intensidade:
Tabela 2
1 2 3 4 5
• Escala de frequência:
Tabela 3
1 2 3 4 5
• Escala de avaliação:
Tabela 4
1 2 3 4 5
Tabela 5
Muito ruim Ruim Nem ruim, nem boa Boa Muito boa
1 2 3 4 5
74
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Observação
A tradução desse instrumento para o português foi realizada pelo Departamento de Psiquiatria e
Medicina Legal da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, em Porto Alegre, respeitando os parâmetros
e a metodologia propostos pela OMS (FLECK et al., 1999).
IV. Revisão pelo grupo bilíngue para incorporação das sugestões do grupo
monolíngue.
O instrumento WHOQOL-100 pode ser aplicado em diversas situação e realidades, com prática
clínica, aprimoramento da relação médico-paciente, avaliação e comparação de respostas em diferentes
tratamentos médicos e como parâmetros para avaliação de serviços e políticas públicas (FERRO, 2012).
No entanto, esse instrumento que apresenta 100 questões tem a característica de ser longo e sua
aplicação exige um tempo maior por parte do entrevistado e do entrevistador. Portanto, diante dessa
realidade e da necessidade de um questionário mais conciso, o grupo de Qualidade de Vida da OMS
desenvolveu uma versão abreviada do WHOQOL-100, criando o WHOQOL-bref (FLECK, 1998).
Com essa versão, preserva-se a abrangência da qualidade de vida e apresenta-se uma alternativa de
grande utilidade para as situações em que a aplicação da versão original (WHOQOL-100) torna-se difícil,
devido principalmente à restrição de tempo (FERRO, 2012).
75
Unidade II
Quadro 6
Saiba mais
Para conhecer mais sobre o grupo de estudos em qualidade de vida da
UFRGS, bem como os instrumentos WHOQOL-100 e WHOQOL-bref, acesse:
Disponível em: https://www.ufrgs.br/qualidep/qualidade-de-vida.
Acesso em: 23 nov. 2016.
Tanto o IDH como os WHOQOL-100 e WHOQOL-bref têm suas metodologias e validades comprovadas,
permitindo comparações entre os estudos, porém ambos apresentam limitações, uma vez que cada um
pretende avaliar uma esfera e especificações de uma sociedade e do indivíduo em cada contexto.
76
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
No Brasil, a produção de conhecimento é relativamente nova, e a cada ano tem aumentado não
apenas em alguns grupos determinados, mas também em indivíduos com alguma patologia determinada,
levando em consideração o conhecimento de como a enfermidade compromete a vida dos indivíduos,
focalizando na qualidade de vida relacionada à saúde.
O mundo não é aquilo que eu penso, mas aquilo que eu vivo; eu estou aberto
ao mundo, comunico-me indubitavelmente com ele, mas não o possuo, ele
é inesgotável (MERLEAU-PONTY, 1994, p. 14).
Quanto à ideia de qualidade de vida, também tem um caráter abrangente, que pode ser
abordado por diversas áreas de estudo e conhecimento; todavia, para obter um entendimento da
qualidade de vida de uma maneira integral, não se pode ter uma compreensão apenas a partir de
dados estatísticos, os quais podem propiciar uma interpretação reducionista da realidade de certa
população ou de uma sociedade heterogênea, como é possível de acontecer mediante os índices
produzidos pelo IDH.
Lembrete
Esses indicadores refletem uma percepção objetiva da realidade social, sem observar as características
individuais dos sujeitos que compõem o grupo. A percepção do sujeito ou a percepção subjetiva é
caracterizada pela compreensão do indivíduo sobre sua realidade e as possibilidades de desenvolvimento
por meio de suas ações, sendo um autor ativo nas alterações de sua qualidade de vida.
É interessante observar que a corporeidade e a qualidade de vida aludem ao indivíduo para que ele
seja um ser de transformação, mediante o corpo e a cultura em que está inserido, e não apenas um mero
reprodutor de uma cultura, de um poder ou de paradigmas sociais.
77
Unidade II
Santin (2002) tem como convicção que a qualidade de vida e a corporeidade não são uma
única ideia ou concepção abstrata, mas que cada indivíduo as constrói e que essas duas esferas
do ser humano acontecem “aqui e agora”, sendo uma construção existencial, vivencial, e não mera
representação científica.
Moreira et al. (2006) atribuem o conceito de um corpo ativo, sendo isso uma corporeidade vivida,
de um ser que percebe e concebe o mundo, os outros corpos e a si mesmo, na tentativa de reaprender
a viver no mundo ou na sociedade em que ele se insere:
Pela corporeidade, o homem tem de compreender de uma forma significativa os aspectos culturais,
pois a qualidade de vida também está relacionada com uma caracterização, uma delimitação e com o
reflexo cultural da sociedade. O corpo não é “nada mais” que um símbolo da sociedade em que ele vive;
o corpo reproduz em escala menor os perigos e poderes que são atribuídos à estrutura social vigente
(SANTIN, 2002).
Em face disso, a qualidade de vida é um processo que deve ser incorporado pelo sujeito, por meio
da corporeidade, que tenta entender o ser humano em seu sentido mais amplo, relacionado com sua
história e sua cultura. Entretanto, para que isso ocorra, não é possível reduzir o ser humano a uma única
esfera de compreensão ou somente a uma visão/interpretação objetiva.
Essa manutenção da vida acaba levando a uma sobrevivência forçada, em um ambiente com
muita diversidade de padrões sociais, os quais são supostamente aceitos em uma sociedade
globalizada. Nessa sociedade, o corpo está relacionado à estética e ao serviço de produtividade,
traduzido em uma qualidade de vida aparente, negando, muitas vezes, as questões originárias
78
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
A busca por uma qualidade de vida é ter como objetivo uma vida sem sofrimento, com felicidade, sem
dor, um convívio social harmônico e com igualdade de oportunidades às pessoas, bem como condições
que propiciem o desenvolvimento e uma participação ativa nas decisões sociais dos sujeitos.
Diante disso, a qualidade de vida está ligada – vem juntamente – com a corporeidade, o corpo vivo,
o corpo vivido, pois uma pessoa só irá compreender e identificar a sua qualidade de vida sabendo como
é a corporeidade (SANTIN, 2002).
Tal qualidade não é pertencente exclusivamente a uma esfera conceitual e objetiva, pois essa
noção é percebida pelo sujeito por diversos processos, inclusive emocionais, não podendo ser regidos
exclusivamente pelo conhecimento científico, mas por percepções subjetivas também. No entanto,
tendo a consciência de que a busca da qualidade de vida percorre um caminho de desenvolvimento que
tem como objetivo a transcendência, ou seja, superar seus limites, uma vez que é esse o sentido de se
incorporar uma vida de qualidade.
O conceito de corpo ativo, segundo Moreira et al. (2006), é de uma corporeidade vivida, que concebe
um entendimento do sujeito a respeito do mundo, dos outros e de si mesmo, em uma investida de
interpretar as relações, de aprender novamente a observar a vida e o mundo. A vida, que representa o
corpo ativo, tem a pretensão de ver o que os seres que integram o mundo tentam lhe mostrar, pois esses
estão encobertos uns pelos outros e pelo próprio sujeito.
O corpo ativo, em busca de uma qualidade de vida, em sua essência, tenta compreender a sua
realidade, necessitando de uma reflexão para incorporar suas características, aprender sobre as coisas
em diversas perspectivas e, assim, promover um desenvolvimento de suas habilidades.
Para o desenvolvimento desse corpo ativo se faz necessário construir uma educação apropriada,
pois esse desenvolvimento está relacionado com a experiência humana que esse próprio corpo
carrega: a aprendizagem de uma cultura. Dessa forma, o corpo humano não pode ser concebido
com um conjunto de órgãos e sistemas, mas deve ser compreendido como uma estrutura global
em que ocorrem interações (MOREIRA et al., 2006).
Segundo Gonçalves (2012), a qualidade de vida se relaciona a uma aparente dicotomia de pensar e
agir, em que o ambiente e o estilo de vida influenciam a vida, e que essa vida tem que estar centrada em
79
Unidade II
uma seguridade, para a sua manutenção, saúde e desenvolvimento, trazendo um conceito e a prática
de protagonismo social.
Assim, a corporeidade parte de um processo de aprendizagem pelo corpo, que tem como objetivo
compreender o ser humano, pois a relação com o corpo é com outro ser humano, dando sentido a
sua existência, sua história e a sua cultura, trazendo este protagonismo social que a qualidade de
vida proporciona.
Esse trabalho não será realizado de uma maneira passiva, sem a oportunidade para que o
indivíduo possa desenvolver sua forma de interagir com o mundo e com aqueles que o habitam;
esse conhecimento multidimensional tem de se relacionar com um desenvolvimento em uma
realidade do homem com a sociedade, pois essa realidade contém as dimensões individual, social
e biológica (MOREIRA et al., 2006).
Para Morin (2000), o conhecimento tem de ser adequado e refletir o contexto global, multidimensional
e complexo, bem como as informações e o saber devem ser completos, e não isolados. Quando o contexto
é global, abordando as diversas esferas da construção do conhecimento, será revelado um conjunto de
ideias e de contextos organizados, refletindo na sociedade (MOREIRA et al., 2006).
Para se ter uma corporeidade plena, e que isso se reflita na qualidade de vida e vice-versa, é
necessário inserir uma ética com o intuito de transformar a intencionalidade em ações de cidadania para
uma sociedade democrática, com diversidades de interesses e ideias. Assim, se faz necessário conviver
com uma diversidade de espécies dentro do próprio mundo em que o ser humano habita, dando uma
proteção ao meio ambiente (MOREIRA et al., 2008).
80
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Espécie
Sociedade
Indivíduo
Porém, nas últimas décadas, vem ocorrendo uma redução de corpos ativos, principalmente para
a realização de tarefas cotidianas, aumentado as patologias ligadas ao sedentarismo (LAMBERTUCCI
et al., 2006).
Segundo Lambertucci et al. (2006, p. 110), a atividade física “representa parte da preparação do
homem para a atividade profissional ou alguma outra atividade”. Perante isso, a atividade física pode
ser caracterizada como um instrumento em que o indivíduo pode modificar e adaptar seu corpo para,
assim, obter melhoria em sua qualidade de vida.
A prática de exercícios físicos e a qualidade de vida sempre tiveram uma relação bem estreita,
independentemente do conceito adotado, ambos conectam aspectos físicos, emocionais e de
relacionamento, sempre associados ao bem-estar (ALMEIDA et al., 2004).
Nos últimos anos, têm-se observado um aumento expressivo no interesse pela prática de exercícios
físicos, com os mais diversos objetivos, sendo eles estéticos, de promoção ou manutenção da saúde.
Perante esse panorama, a educação física estabeleceram-se relações entre a prática de atividade física e
intervenções fisioterapêuticas com a promoção da saúde e do bem-estar (MODENEZE; VILARTA, 2010).
A cultura de uma sociedade em que o sujeito está inserido determinará como se dá a relação entre a
atividade física e a qualidade de vida, e isso definirá suas ações pessoais e as possibilidades criadas pelo
ambiente, como programas ligados à melhoria da condição de vida da população (ALMEIDA et al., 2004).
Vários fatores vão influenciar a percepção de qualidade de vida de um indivíduo, tanto os componentes
ligados à esfera de percepção objetiva quanto à esfera de percepção subjetiva. O acréscimo em qualquer
81
Unidade II
componente deve considerar uma dinâmica que possibilite o acesso a bens de consumo e as escolhas
disponíveis (MARQUES; GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
Esses valores podem ser exemplificados, como a educação, o mercado, além das diversas possibilidades
de consumo, e o componente que mais compreende ou se relaciona com a qualidade de vida na sociedade
contemporânea é a saúde (MARQUES; GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
A noção de saúde, segundo Minayo (2000), é determinada pela resultante social da construção
coletiva dos padrões de conforto e tolerância que determinada sociedade estabelece, sendo que o estado
de saúde de um indivíduo sofrerá interferência de numerosas variantes, como os domínios funcionais,
até os elementos físicos, sociais, ecológicos e de hábitos pessoais (ALMEIDA et al., 2004).
Com isso, a saúde e a doença de uma pessoa não podem ser relacionadas somente a um único
aspecto, pois se configuram por uma relação contínua, a qual dependerá de ações individuais do
ambiente e das políticas públicas.
A mensuração das condições de saúde irá determinar as possibilidades de acesso aos bens e serviços
relacionados à saúde, os quais são disponibilizados à população. A organização desse acesso pode ser
dividida em duas abordagens: a prevenção em saúde e a promoção da saúde.
Com essas duas abordagens, a saúde apresenta um sentido mais amplo e uma questão social mais
extensa, que vai além da perspectiva individual. Logo, o estilo de vida positivo é determinante para a
promoção da saúde, assim como a prática regular de atividades físicas e a manutenção de posturas
adequadas na escola, no trabalho e no domicílio, fazendo parte de um processo que integra diversos
fatores, não sendo eles, somente, a solução dos problemas de saúde (ALMEIDA et al., 2012).
Os hábitos saudáveis dos indivíduos e os estilos de vida, que compreendem principalmente a esfera
de percepção subjetiva de cuidados à saúde, interferem nas atitudes cotidianas. Para Gonçalves e Vilarta
(2004), os comportamentos saudáveis são:
82
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Percebe-se que os hábitos que interferem no cotidiano englobam ações, como alimentação,
relacionamentos interpessoais e prática de atividade física. Em face disso, é inegável que a incorporação
de hábitos saudáveis advém do comprometimento do indivíduo a uma rotina apropriada, desde que as
suas condições de vida favoreçam essas escolhas.
Na sociedade atual, é atribuída uma colocação privilegiada para a atividade física, a fim de conquistar
uma situação melhor de saúde, denotando uma função ampliada, embora advinda de um único conceito
e, por consequência, resumindo as diversas dimensões que permeiam o ser humano.
Assim como a qualidade de vida, é necessário conceituar o que vem a ser a atividade física. Segundo
Carvalho (2001, p. 69) a atividade:
Com essas definições, é possível observar que a atividade física está relacionada ao movimento humano,
realizado pelo próprio corpo e seus componentes, gerando um gasto energético, independentemente de
ser uma atividade sistematizada ou até mesmo uma atividade da vida cotidiana.
Nesses conceitos explicitados pelos três autores mencionados existe a noção de que atividade física
está associada à saúde e de que são interdependentes – preceito esse explorado principalmente pela
mídia e diversos meios de comunicação.
83
Unidade II
Saiba mais
Em razão disso, é “vendido” um paradigma de que a atividade física está sempre conectada com
a saúde, gerando estereótipos de saúde e boa forma. Em diversos estudos já se comprovou que a
prática de atividade física regular auxilia na manutenção da saúde, porém não se pode descartar
que o processo para se adquirir saúde é complexo e sofre influência de diversos componentes
(ALMEIDA et al., 2004).
A atividade física, assim como a saúde, apresenta um composto de variáveis e opções existentes, e
cada uma dessas opções apresenta certa influência no bem-estar do indivíduo, para uma continuidade
ou manutenção da saúde; contudo, é preciso ter as primícias de que a prática dessa atividade está de
acordo com as características e as expectativas do indivíduo, assim como o local e as metodologias nela
empregadas (ALMEIDA et al., 2004).
O predomínio por atividade “A” ou “B” muda com o passar dos anos. Na década de 1970 havia
predominância pelas atividades da ginástica aeróbica, que conquistou grande parte da população na
época, porém sofreu forte resistência da sociedade médica, em razão da alta incidência de lesões por
desgastes e traumas de seus participantes, chegando ao ponto de a comunidade médica desaconselhar
a prática dessa atividade (MODENEZE; VILARTA, 2010).
Já nos anos de 1980, a atividade predominante era o treinamento de força, principalmente pelo
aumento no número de fabricantes de máquinas e equipamentos para academia. Essa ideia permanece
até hoje, pois se uma academia não tiver os últimos equipamentos e recursos disponíveis no mercado
ela será considerada defasada (MODENEZE; VILARTA, 2010).
Também nessa época, em decorrência desse tipo de atividade e do local onde ela era desenvolvida,
surgia a indústria fitness, com o aparecimento de cursos para o desenvolvimento de técnicos com
qualidade questionável e a venda de mercadorias, como roupas e suplementos alimentares (MODENEZE;
VILARTA, 2010).
Enquanto a fisioterapia já se encontrava sólida como profissão desde 1969, na década de 1990, a
educação física no Brasil se tornava uma profissão regulamentada, recebendo um maior investimento
em qualificação, credibilidade e profissionalismo (MODENEZE; VILARTA, 2010). No entanto, o movimento
fitness ainda conseguia angariar e sensibilizar a sociedade a respeito do combate ao sedentarismo,
principalmente por ações vinculadas nas mídias, com discursos motivacionais redundantes e sem
embasamento científico. Esse movimento também é responsável por instaurar alguns conceitos de que
84
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
para se ter um grande ganho, ou seja, benefícios fisiológicos, é preciso “treinar bastante” – enfatizando
a ideia de “quanto mais, melhor”. Muitas vezes, essa abordagem é acompanhada por um número muito
elevado de dias e horas de treinamento, assim como o uso indiscriminado de agentes anabolizantes e
praticantes lesionados.
Atualmente, em oposição ao estilo fitness, que ainda apresenta grande influência, foi desenvolvida a
abordagem de wellness, a qual tem como fundamento filosófico o conceito de bem-estar, em oposição
à ideia fitness. Assim, passa a ser atribuído um valor maior aos ideais de como o indivíduo se sente
ao fazer uma atividade. A ioga, o tai chi chuan e o pilates, por exemplo, ganharam muito adeptos
(MODENEZE; VILARTA, 2010).
Para a adesão de um estilo de vida saudável, a adoção de exercícios físicos regulares e sistematizados
não deve acontecer baseada em modismo ou por imposição de algum sistema, mas considerar as
características e as condições de vida do indivíduo. Entretanto, a realidade nem sempre reflete o que
deveria ser o ideal, principalmente pela dificuldade de acesso a alguns tipos de atividades físicas e por
condições socioeconômicas desfavoráveis (ALMEIDA et al., 2004).
Mesmo apresentando alto índice de sedentarismo, as camadas sociais com maior poder econômico
nem sempre vão adotar um estilo de vida mais saudável (LOVISOLO, 2002).
Um dos motivos para o aumento do sedentarismo pode estar ligado às facilidades de acesso aos
bens tecnológicos – que de certo modo também promovem um aumento da qualidade de vida por
torná-la mais ágil e dinâmica. Contudo, convém notar que isso provoca a substituição da atividade
motora humana pela atividade de máquinas (ALMEIDA et al., 2004).
Por outro lado, os avanços tecnológicos podem ser benéficos ao desenvolvimento e à adesão a
uma prática de atividade física, uma vez que a tecnologia está incorporada ao cotidiano da sociedade
contemporânea e o seu uso pode ser um aliado ao estilo de vida mais saudável, assim como à manutenção
desse hábito.
85
Unidade II
A aptidão física também é uma variável referente à prática de atividade física, que pode auxiliar no
desempenho físico-motor, contribuindo para uma melhor execução das atividades de vida diárias (ADV)
ou esportivas e de lazer, além de auxiliar na prevenção de doenças e aumentar a disposição para realizar
tarefas cotidianas (ALMEIDA et al., 2004).
Essa ideia pode ser relacionada à criação do treinamento funcional, cujo objetivo é obter melhora
nas aptidões da capacidade física para a execução adequada de atividades rotineiras (MODENEZE;
VILARTA, 2010).
A partir das aptidões físicas que os indivíduos possuem, pode-se identificar que a atividade é
diferenciada, tendo um sentido de acordo com o tipo de prática, à qual o indivíduo atribui significado e
pode se sentir mais motivado a realizar.
De acordo com Almeida et al. (2004, p. 48), é possível enumerar duas categorias que influenciam a
aptidão do indivíduo para essas práticas:
• Atividade física incorporada ao estilo de vida: prática que não tem o objetivo de alcançar os limites
físicos do organismo, focando no antissedentarismo, no prazer pela prática e na socialização. As
atividades podem ou não ser sistematizadas, não excluindo a sensação de cansaço e esforço.
86
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Com essas duas abordagens é possível verificar uma variação muito grande, uma heterogeneidade
de práticas, porém ambas ainda tentam trabalhar o bem-estar dos indivíduos, independentemente do
objetivo específico de prática.
Pelo fato de haver esse panorama, a escolha por uma atividade física que não esteja adequada às
características do indivíduo pode gerar um esforço além do ideal e produzir efeitos negativos para o
praticante, como as lesões.
Figura 40 – Independentemente da atividade física, as características e os limites do corpo devem ser levados em consideração
Diante disso, para relacionar a atividade física com a saúde, deve-se considerar os seguintes aspectos
(ALMEIDA et al., 2004):
• Características do sujeito.
• Aptidão física.
• Patologias.
• Problemas ortopédicos.
• Sentido da prática.
• Objetivo da prática.
87
Unidade II
O profissional que trabalha com a atividade física motiva as práticas e os hábitos saudáveis,
no entanto, é preciso ter a consciência de considerar as características de vida do sujeito e o seu
corpo. Caso isso ocorra, ele proporcionará uma prática adequada à realidade do indivíduo, que
promoverá uma melhoria na qualidade de vida (ALMEIDA et al., 2004).
Trabalhar com alguma esfera da qualidade de vida possibilita desenvolver a autonomia do sujeito,
e a atividade física favorece a melhoria do bem-estar, mas exige a atenção dos profissionais aos
impactos causados por essa prática nos aspectos social, emocional e de saúde (em sentido amplo).
O profissional também tem de ser crítico quanto às exposições que a mídia proporciona a respeito
de práticas saudáveis, pois ela semeia uma possibilidade quase infinita de práticas, com objetivos
aparentemente corretos e saudáveis, contudo, sem considerar as características complexas que compõem
a relação entre atividade física, qualidade de vida e saúde.
Na atividade física, como em qualquer atividade, ocorrem trocas de informações e, com elas,
alterações em preceitos morais e éticos, influenciadores da formação e do desenvolvimento a respeito
da qualidade de vida do sujeito.
A prática regular da atividade física, quando desenvolvida de uma forma que respeite as
características do indivíduo – incluindo-se seus aspectos culturais – acarreta benefícios para os diversos
sistemas que integram o organismo, assim como é importante para o tratamento de algumas patologias
(LAMBERTUCCI et al., 2006).
No tocante ao sistema respiratório, a asma é uma das patologias mais comuns na infância,
diminuindo a capacidade de realizar exercícios, em que o próprio exercício pode desencadear o
processo asmático, principalmente se ocorrer atividades de alta intensidade que necessitem de um
elevado consumo de oxigênio (LAMBERTUCCI et al., 2006). Atividade de intensidade moderada e
prática regular de atividade física aeróbia reduzem a sensação de dispneia (falta de ar) e aumentam
a tolerância ao esforço físico, melhorando a qualidade de vida.
Observação
Na atividade aeróbia com intensidade de baixa a moderada, o oxigênio
está presente na produção de energia.
O sistema ósseo tem como funções a sustentação e a proteção do corpo, e constantemente passa
por processos de remodelamento, por causa da atividade das células ósseas.
A prática de atividade física por crianças, adolescentes e jovens aumenta a densidade óssea,
tornando-os mais resistentes a traumas relacionados a ações mecânicas. Todavia, com o envelhecimento,
principalmente nas mulheres, após a menopausa, ocorre um desequilíbrio entre a produção e a absorção
de massa óssea, aumentando a possibilidade de surgimento da osteoporose; entretanto, a atividade
física desenvolvida de modo regular faz com que os ossos continuem fortes, minimizando os riscos de
doenças (OCARINO; SERAKIDES, 2006).
88
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Quanto ao sistema cardiovascular, a hipertensão arterial é tida como uma das principais patologias.
Essa doença é uma condição na qual a pressão do sangue no interior dos vasos sanguíneos se encontra
mais elevada do que os padrões indicados para os indivíduos de acordo com a sua idade e tamanho,
exigindo um maior trabalho por parte do coração, principalmente para bombear sangue para todo o
corpo, possibilitando o desenvolvimento de outras patologias, como infarto do miocárdio e acidente
vascular encefálico (AVE, também conhecido como AVC) (BARROSO et al., 2008).
A atividade física vem sendo usada como tratamento para a hipertensão arterial, pois durante o
exercício tem-se uma necessidade maior de nutrientes e de oxigênio para os músculos, ocorrendo um
fluxo sanguíneo mais intenso, o que acaba removendo produtos que podem ser tóxicos à estrutura
muscular, como o lactato. Portanto, com a adesão a uma prática regular e com intensidade de esforço
adequada, aumenta-se a capacidade de contração dos vasos sanguíneos, diminuindo a pressão arterial
(BARROSO et al., 2008).
No que se refere ao peso corpóreo, ele é resultado do equilíbrio entre a quantidade de alimentos
consumidos e a energia gasta. Quando se ingere alimentos com grande quantidade de calorias, mas
a energia gasta é menor do que a consumida ocorre aumento de peso (no caso, aumento de massa
gorda), em razão do depósito de gordura nas células adiposas (MENDONÇA; ANJOS, 2004). A obesidade
é o excesso de sobrepeso (de acordo com índices advindos de cálculos referentes a cada indivíduo), e
os riscos que ela proporciona podem ser elencados, como dificuldades no funcionamento do coração,
doenças renais, pulmonares, degeneração articular e distúrbios psicológicos associados principalmente
à autoimagem (LAMBERTUCCI et al., 2006).
Figura 41 – A obesidade é umas das doenças que mais crescem no mundo devido
à diminuição da atividade motora e ao aumento do consumo calórico
89
Unidade II
Observação
Os riscos da diabetes são variados, como hipertensão arterial, doenças coronarianas, retinopatia
(doença nos olhos) e distúrbios renais – distúrbios esses que podem levar à falência renal crônica. O
exercício físico é eficiente no controle da diabetes, ajudando a normalizar a concentração de glicose no
sangue: quando ocorre a contração muscular, aumenta a utilização da glicose (uma vez que ela é fonte
de energia), levando à necessidade de a insulina (um hormônio) ser utilizada para facilitar a entrada de
glicose nas células musculares (COLBERG, 2003).
De acordo com esse breve panorama da importância da prática de atividade física nos vários sistemas
de funcionamento corporal, nota-se que a atividade física irá interferir de um modo muito positivo, se
adequadamente ministrada, os seus efeitos são muito benéficos. Nesse sentido, o desenvolvimento de
programas adequados pode prevenir doenças e melhorar a qualidade de vida de um indivíduo ou de toda
sociedade. Convém destacar que os efeitos são benéficos desde que sejam respeitadas as características
individuais, as quais estão intimamente associadas ao ambiente e à carga cultural que o corpo carrega.
O esporte, uma das atividades físicas que tem muita influência na qualidade de vida do indivíduo e
até de sociedades inteiras, pode favorecer mudanças no modo e condições dos sujeitos (de uma forma
profissional ou não).
Para Almeida e Rose Júnior (2010), o esporte tem função para a vida do homem em sociedade,
principalmente na questão da socialização, em que são transmitidos valores, diversas formas de
sociabilização, educação e saúde. Embora possa ser considerado como expressão de uma arte, ele
também tem sido usado como palco para banalização e violência social.
Logo, o esporte é a manifestação de uma cultura; ele passou por diversas épocas, vocações distintas
e reflexos das características acolhidas e desenvolvidas pelas sociedades em que está introduzido. Dessa
forma, o esporte apresenta uma característica “heterogênea, polissêmica e polimorfa” (MARQUES;
GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
Pela flexibilidade de ser praticado em diversos ambientes, o esporte apresenta uma variedade de
sentidos, que são marcados por normas e valores próprios, ligando-se com a temática de qualidade de vida,
também de uma forma ambígua ou com sentidos variados, gerando muitas vezes a noção de deseducação
para a conquista de desempenhos excelentes ou, em contrapartida, que possa contribuir para a melhoria
da saúde.
Mediante a cultura de uma sociedade, o esporte acaba por incorporar as diversas facetas desses
costumes e, em decorrência disso, torna-se um agente produtor de cultura para essa sociedade.
Por conseguinte, a qualidade de vida promove a possibilidade de obtenção de bens culturais e a
integração de hábitos saudáveis.
Segundo Almeida e Rose Júnior (2010), o esporte possui algumas dimensões, a saber:
• Papel histórico, sua racionalização e a ligação com os capitais simbólicos, artísticos e de poder.
• Dimensão científica.
Como mencionado anteriormente, o esporte pode ser tratado com um fenômeno social, principalmente
após a Segunda Guerra Mundial, pois as circunstâncias políticas mundiais se alteraram e, consequentemente,
o esporte também se transformou, ganhando nova forma, em especial para o ensino de uma educação
voltada ao movimento, agregando aspectos pedagógicos às questões técnicas e táticas de diversas
modalidades esportivas que o compõem (ALMEIDA; ROSE JÚNIOR, 2010).
A relação do esporte com a saúde está estreitamente ligada aos seus conceitos, sendo fundamental
recordar que o esporte reflete a sociedade e a cultura que foi construída, no entanto, o esporte, por si
só, não consegue desenvolver a saúde por completo.
Portanto, esporte e saúde ainda têm “um caminho a percorrer” para se conseguir estabelecer uma
relação entre ambos, pelo fato de diversas modalidades proporcionarem efeitos diferentes no organismo,
o que pode não atender ou se adequar à realidade ou à carência de um indivíduo ou sociedade.
92
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Nesse sentido, os diversos ambientes em que os esportes são realizados e desenvolvidos e também
as suas diversas manifestações podem contribuir para se ter efeitos positivos e negativos na saúde
(MARQUES; GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
A diferença entre a relação esporte-saúde e atividade física-saúde é que o primeiro não apresenta
apenas a característica de se movimentar como o segundo, levando o esporte a outro nível de colaboração
para a saúde, sempre tendo em vista as carências e as perspectivas do indivíduo e mostrando os
princípios da prática que o ambiente proporciona. Entretanto, existem princípios e valores questionáveis
das atividades esportivas que geram a perda de uma boa saúde, como, por exemplo, a ocorrência de
contusões e uso de doping (MARQUES; GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
As ocorrências de contusões no esporte, bem como em qualquer atividade física, podem acontecer
caso o praticante não tenha uma mínima preparação e aptidão física, o que inclui alimentação
adequada, regularidade na prática, local apropriado, entre outros. Porém as pessoas com preparação
física satisfatória não estão isentas de contusões.
Doping é o uso de recursos anabólicos para obter um desempenho maior do que se conseguiria
por meio de treinamento, além de ser resultado de um conjunto de princípios e valores que exige
um desempenho de excelência no nível de denominado esporte de alto rendimento. A busca por uma
constante superação de recordes e marcas, em associação com as premiações, gera uma atmosfera
favorável para essa prática. Por outro lado, esse tipo de situação não se restringe somente ao alto
rendimento; muitos indivíduos não atletas buscam os recursos ergogênicos para fins de superação
estética e autossatisfação (MARQUES; GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
O caso mais recente de doping no esporte de alto rendimento foi o esquema de adulteração
de amostras de sangue e urina que aconteceu na Rússia, principalmente na Federação Russa de
Atletismo (Rusaf), gerando uma suspensão por parte da Federação Internacional de Atletismo
(IAAF), das competições internacionais e também dos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro em 2016
(TERRA, 2016).
E é nesses esportes de alto rendimento que ocorre popularização do esporte, igualdade de acesso,
especialização, racionalização do movimento, burocracia motora e quantificação de rendimento e
recordes, integrando as práticas de movimento em uma escala mundial, já que a competição de uma
modalidade no Brasil é igualmente realizada no Japão, mesmo com diversas diferenças econômicas,
culturais e sociais entre os países (ALMEIDA; ROSE JÚNIOR, 2010; ALMEIDA et al., 2010).
Com isso, o esporte passa a constituir um fenômeno mundial e acarreta uma série de crises éticas,
especialmente quando há outros objetivos, ou seja, deixam de ser uma prática com significados e metas
próprios, mas são incorporados a fins políticos e econômicos.
93
Unidade II
Figura 43 – O Estádio Olímpico de Berlim, sede dos Jogos Olímpicos de Verão de 1936, foi usado para a promoção da ideologia
nazista, principalmente com a tentativa de comprovação da soberania do ideal ariano sobre as outras raças
Figura 44 – O americano Jesse Owens venceu a prova de 200 metros rasos no atletismo, nos Jogos Olímpicos de 1936,
diante de Adolf Hitler, contradizendo os ideais de que a raça ariana era superior aos demais seres humanos
Com o acesso aos grandes eventos esportivos, o esporte passa também por uma transformação no
próprio sentido de sua prática: a busca de um rendimento máximo, independentemente do ambiente
em que ele é desenvolvido, até mesmo no esporte em nível de participação escolar.
Outra transformação refere-se aos investimentos que as nações promoveram e continuam a realizar
nos esportes – não somente no alto rendimento, mas também na incorporação de políticas públicas
e planejamento urbano para a esfera esportiva, além do desenvolvimento científico para a área do
esporte, possibilitando um avanço contínuo no entendimento desse fenômeno.
No tocante à questão da relação entre esporte e saúde, com vistas ao desenvolvimento de uma
qualidade de vida por parte de um sujeito ou até mesmo de uma sociedade, a manifestação do
94
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
“esporte‑participação” tem essa pretensão, porém na cultura brasileira existe uma monocultura esportiva
em que, muitas vezes, acontece uma separação entre os mais capacitados e os menos capacitados para
a atuação em determinada modalidade esportiva.
O esporte-participação apresenta como fundamento o ideal de que o indivíduo tenha aderência a uma
prática esportiva regular, sem a necessidade de uma hipercompeticão, isto é, de atingir resultados máximos em
determinado tempo. Além do mais, sem ter exclusivamente o espelhamento no esporte de alto rendimento
e na espetacularização midiática, isso pode fazer com que a sociedade acabe por adotar uma participação
esportiva incorporada ao seu cotidiano (ALMEIDA; ROSE JÚNIOR, 2010; ALMEIDA et al., 2010).
Com a exposição do esporte pela mídia, valores que normalmente pertencem ao alto rendimento
são incorporados a outras manifestações esportivas, como competição, beleza, originalidade, vitória,
recompensas, alegrias, frustrações e relações sociais, tornando-se uma prática com um número quase
inestimável de valores.
Por causa da constituição desses valores pelo esporte e também outros valores de fácil acesso a
todos, como o estético e a veiculação da violência, a vertente educacional que o esporte proporciona
tem de ser discutida e trabalhada em diversos ambientes, tanto de uma educação formal como não
formal (ALMEIDA; ROSE JÚNIOR, 2010; ALMEIDA et al., 2010).
Pelo fato de o esporte proporcionar um relacionamento interpessoal, acaba por ocorrer uma
transmissão não apenas de valores entre os sujeitos, que são pertencentes a sua formação humana, mas
também os valores que a prática e o ambiente trazem. Por esses motivos, é necessário ter uma educação
para a prática esportiva.
O início da vivência em uma educação com esporte é voltada ao ensino de aspecto tático, gestual
(motor) e de controle emocional para uma competição e, em um segundo momento, para aspectos mais
conceituais, como valores a respeito da competição, da cooperação e da vinculação do alto rendimento
com a exposição midiática (ALMEIDA; ROSE JÚNIOR, 2010).
Além dessas questões tratadas anteriormente, o desenvolvimento dos sistemas fisiológicos na busca
ou na manutenção da saúde pela prática do esporte tem de ser reiterado. Essa busca e essa manutenção
da saúde só serão possíveis caso o esporte seja praticado de forma adequada às características do
indivíduo, como as condições de vida, a idade e o condicionamento físico.
Questões de saúde, relacionamentos pessoais positivos e respeito ao adversário (fair play) são tendências
de valores trabalhados no esporte, principalmente no século XXI, mesmo ainda sofrendo forte influência
da espetacularização do esporte, que leva as pessoas a aderirem a uma prática de esportes por causa de
valores mercadológicos, como o consumo de produtos ligados a esse fenômeno histórico‑social que é o
esporte; porém a prática tem de atender às carências, às possibilidades, às limitações e aos objetivos dos
indivíduos que a ela se submetem (MARQUES; GUTIERREZ; MONTAGNER, 2010).
Com isso, fica claro que o esporte tem como enfoque o movimento do ser humano, um movimento
com intencionalidade, em que não pode ocorrer a separação do corpo em segmentos ou
95
Unidade II
partes. Esse movimento, quando sistematizado, pode levar a desenvolver benefícios à saúde e,
consequentemente, potencializar a adoção de um estilo de vida saudável.
O esporte não está relacionado somente ao rendimento esportivo, ao atingir metas e recordes mundiais,
mas também às modalidades esportivas serem utilizadas como uma possiblidade de movimentos diversos,
com uma intencionalidade e uma relação entre as potencialidades dos corpos dos seres humanos, tendo
assim uma interação social, em que isso faz parte de um processo de desenvolvimento da cidadania.
Figura 45 – Diversos valores são transmitidos pelo esporte, possibilitando uma melhor qualidade de vida
Resumo
96
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
compreensão, uma vez que não existe um único caminho, uma receita
certa como resposta, mas sim uma motivação e um desafio de reflexão,
tendo a ideia de que é preciso adquirir um conhecimento multidimensional,
sabendo que surgirão dificuldades e incertezas.
Logo, ele é uma manifestação de uma cultura que passou por diversas
épocas, vocações distintas e reflexos das características acolhidas pela
sociedade em que está introduzido. Assim, o esporte apresenta uma
característica heterogênea, polissêmica e polimorfa.
100
CORPOREIDADE E MOTRICIDADE HUMANA
Exercícios
Questão 1. (Enade 2010) O mapa a seguir representa as áreas populacionais sem acesso ao
saneamento básico.
mais de 50%
de 31% a 50%
As áreas populacionais sem acesso ao saneamento, em média mundial
porcentagem do total da população em 2004, estão de 5% a 30%
representadas no mapa, conforme a legenda:
menos de 5%
dados não disponíveis
Figura 46
101
Unidade II
A) I e II.
B) I e III.
C) II e V.
D) III e IV.
E) IV e V.
I – Afirmativa incorreta.
Justificativa: infelizmente a globalização acaba por trazer desigualdade entre algumas regiões;
isso fica claro quando se observa o mapa comparando o continente africano e o continente europeu.
Porém, o progresso social está diretamente ligado aos avanços econômicos de uma nação.
II – Afirmativa incorreta.
Justificativa: geralmente, quando ocorre um grande crescimento populacional em uma região,
este não é ordenado, e isso provoca uma escassez de serviços essenciais para a manutenção de uma
qualidade de vida mínima. O acesso ao saneamento básico em países com grande densidade habitacional,
normalmente, não é considerado ideal.
habitacional, possuem um índice menor que a média mundial: mais de 50% da população não têm
acesso ao serviço de saneamento básico.
IV – Afirmativa correta.
Justificativa: está correto, pois os países ditos desenvolvidos possuem um IDH mais elevado, tendo
uma economia mais equilibrada, podendo reverter isso em serviços para a população, incluindo o serviço
de saneamento básico.
V – Afirmativa correta.
Justificativa: os pilares que compõem o cálculo do IDH são renda per capita, saúde e educação.
As aulas de educação física podem seguir um modelo que garanta a participação de todos os alunos,
em ações reflexivas que possibilitem a experiência diversificada de práticas motoras, pois a escola é
um local estratégico para intervenções em saúde, sendo possível atingir grande parcela de crianças,
adolescentes e jovens.
PORQUE
A) As duas asserções são proposições verdadeiras, e a segunda é uma justificativa correta da primeira.
B) As duas asserções são proposições verdadeiras, mas a segunda não é uma justificativa correta da primeira.
103
Unidade II
A) Alternativa correta.
A primeira asserção coloca a educação física escolar como um local para se desenvolver diversos tipos
de experiências motoras, com diferentes enfoques, e utiliza a segunda asserção como uma justificativa
para incluir a temática da saúde nesse espaço educacional.
B) Alternativa incorreta.
A segunda asserção é uma justificativa da primeira, pois a educação física tem de criar a consciência
nas crianças, nos adolescentes e nos jovens sobre a importância da prática de atividade física para a
manutenção e a conquista de uma boa saúde.
C) Alternativa incorreta.
D) Alternativa incorreta.
A primeira asserção está correta, pois a educação física escolar é uma local onde se tem de promover
as práticas motoras, que devem incluir todos aqueles que estão participando.
E) Alternativa incorreta.
As duas asserções contêm informações e afirmações corretas de como se deve trabalhar a temática
saúde nas aulas de educação física para o desenvolvimento de uma percepção da qualidade de vida.
104
FIGURAS E ILUSTRAÇÕES
Figura 3
Figura 6
Figura 7
Figura 10
Figura 11
Figura 12
Figura 13
Figura 14
Figura 15
105
Figura 16
Frame do vídeo TEMPOS modernos. Dir. Charles Chaplin. Estados Unidos: Charles Chaplin Productions,
1936. 89 minutos.
Figura 17
Figura 18
Figura 19
Figura 20
Figura 21
Figura 22
Figura 23
Figura 24
Figura 26
Figura 31
Figura 32
Figura 33
Figura 34
Figura 39
Figura 40
107
Figura 41
Figura 42
Figura 44
Figura 45
REFERÊNCIAS
Audiovisual
TEMPOS modernos. Dir. Charles Chaplin. Estados Unidos: Charles Chaplin Productions, 1936. 89 minutos.
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Exercícios
117
118
119
120
Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000