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ESCOLA DA MAGISTRATURA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

-EMERJ-

CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DIREITO PARA A


CARREIRA DA MAGISTRATURA

PROGRAMA DO CURSO

CPI B 2 2021 – TÉCNICA DE SENTENÇA

As aulas do módulo serão ministradas nas seguintes datas: 2/9, 25/10 e


12/11.

SESSÃO VI: Dia 12/11/2021 - 10h 10min às 12h

Prof. Dr. Alex Quaresma Ravache

TEMA: Direito Civil. Direitos da personalidade. Divulgação de vídeo íntimo e


indenização por danos morais.

CASO CONCRETO:

Trata-se de demanda indenizatória ajuizada por Nair Leide em face de


Franklinberg, na Comarca de Três Rios. Alega a autora que as partes tiveram um
breve relacionamento amoroso e que, em determinada ocasião, aceitou ser
filmada enquanto se relacionava sexualmente com o réu, sem, contudo, imaginar
que as imagens chegariam a outras pessoas.
Narra a autora que, tendo em vista a sua ingenuidade e a confiança
que nutria por Franklinberg, não poderia prever a situação humilhante pela qual
passou, pois o réu não manteve consigo o vídeo, mas procedeu ao envio a um
grupo de amigos, por meio do aplicativo chamado whatsapp. O vídeo circulou em
toda a cidade de Três Rios e adjacências, causando um verdadeiro vexame a si e
a toda a sua família. Ademais, não seria possível estabelecer com precisão os
limites geográficos, haja vista que as imagens podem ter chegado a outros
países.
A autora afirma que sua imagem ficou extremamente desgastada,
principalmente pelo fato de morar em cidade pequena, uma vez que passou a ser
alvo de brincadeiras e deboches de inúmeras pessoas, de modo que atualmente
a autora não pode sair de casa e ficar à vontade nas ruas, porque sempre tem a
sensação de que há alguém a observando e lançando-lhe olhares intimidadores.
Afirma, também, que não há dúvida de que foi o réu quem enviou o vídeo, uma
vez que o fato foi confirmado em sede policial, e o aparelho de celular com o qual
o réu gravou o vídeo não havia sido vendido ou roubado quando aconteceu o
envio do vídeo íntimo.
Por esses motivos, Nair Leide pede que o réu seja condenado a: I -
pagar a quantia de R$ 90.000,00, a título de indenização por dano moral; II -
abster-se de divulgar o vídeo, sob pena de multa de R$ 10.000,00 para cada
descumprimento; III - retratar-se publicamente pelos mesmos meios usados para
a propalação do vídeo.
Em contestação, Franklinberg afirma que, como a própria autora deixa
nítido, a relação sexual e o vídeo tiveram consentimento das partes, portanto, ao
gravar as imagens, o réu em nenhum momento agiu de maneira desrespeitosa.
Ademais, afirma que não há, nos autos, prova acerca da autoria do envio do
vídeo. Dessa maneira, o réu sustenta que atribuir tal fato a si consiste em
tremenda injustiça, porque na realidade ambos foram vítimas do ocorrido. É
possível, outrossim, que a própria autora tenha procedido ao vazamento e se
arrependido depois.
Defende o réu que - por não ser compreensível que a autora tenha
demorado mais de uma semana para ter ciência do ocorrido e ir à delegacia fazer
registro, em que pese a velocidade com que circulam as informações nos dias de
hoje - quiçá estivesse ela em busca de promoção e de proveito econômico
ardiloso.
Salienta o réu que todos o reconheceram no vídeo, o que torna
incontestável que a sua intimidade também ficara exposta, que não havia se
desentendido com a autora e que, por isso, a figura do revenge porn deve ser
completamente afastada do caso ora analisado.
O réu alega que, entretanto, cometeu um erro, quando decidiu ir à
delegacia relatar que havia perdido o telefone, e que agiu dessa forma porque
estava muito nervoso, e os amigos assim o orientaram, tendo em vista que a
autora teria dito a todos que procuraria ser indenizada em juízo. Contudo, o réu é
pessoa de boa índole e, em vista disso, retornou à delegacia para contar que
nãohavia perdido o celular, mas que o havia destruído em momento de
desespero.
Franklinberg, por derradeiro, informa que não tem mais nenhum
arquivo com as imagens e pede a total improcedência dos pedidos; todavia, em
caso de condenação, entende que o valor não pode ultrapassar os R$ 10.000,00,
em observância à proporcionalidade.
Em juízo, a autora disse: que teve um relacionamento de
aproximadamente três meses com o réu; que uns amigos contaram que
Franklinberg estava espalhando o vídeo pela cidade; que terminou o
relacionamento assim que soube do fato; que quando as gravações foram
enviadas ao grupo de amigos, a autora estava com o réu e que as filmagens
haviam acontecido na mesma noite, um pouco antes; que acredita que
Franklinberg tenha divulgado o vídeo em represália pelo fato de ela ter se
recusado a se relacionar em grupo com o réu e mais outros dois amigos; que, em
determinada ocasião, o réu garantiu que daria carona à autora após uma festa,
mas mandou um amigo fazê-lo; que o amigo desviou o caminho e parou o carro
em uma rua deserta, onde insistiu que a autora deveria ir a um motel para ter
relações com ele, com o réu e mais outro amigo, pois já estava tudo ajustado
entre os que participariam; que teve medo de ser estuprada, mas que nada
aconteceu porque, enquanto estava no carro, a autora ligou para Franklinberg,
com quem brigou, deixando claro que não aceitaria aquela situação humilhante;
que, em seguida, foi deixada em casa.
Em juízo, o réu disse: que mentiu em sede policial, seguindo conselho
de amigos, porque estava nervoso, com medo de ser processado e preso; que,
depois de pensar melhor, foi à delegacia e informou a verdade; que o vídeo
realmente partiu de seu telefone celular, mas que não sabe como isso aconteceu;
que também ficou surpreendido com a divulgação das imagens; que, apesar de o
seu rosto não aparecer nas imagens, de certo modo, ele também ficou exposto,
uma vez que na cidade onde moram todos sabem que ele e a autora namoravam.
Em juízo, Bernardo, testemunha da autora, disse: que conhecia os dois
de vista; que faz parte do grupo de whatsapp que recebeu o vídeo; que não sabe
se alguém enviou o vídeo antes de Franklinberg, mas que as imagens partiram
do celular dele; que a autora passou a sofrer com comentários e brincadeiras das
pessoas.
Em alegações finais, Nair Leide ressalta que ficaram configurados o
ato praticado por Franklinberg e os danos morais. Ressalta ainda que o vídeo
partiu do celular de Franklinberg, que não sabe explicar de que modo e em que
situação alguém poderia ter mexido em seu aparelho, encontrado o vídeo e
enviado ao grupo de amigos, o que torna a versão do réu fantasiosa, mormente
quando o próprio reconhece ter mentido em sede policial. Por conseguinte, reitera
todos os pedidos da inicial.
Em alegações finais, Franklinberg afirma que sempre foi pessoa
pública, com participação na política e em cargos de igreja, o que reforça a tese
de que não tinha nenhum motivo para divulgar as imagens com ofensas a sua
própria intimidade, uma vez que toda a situação apenas levou prejuízo a sua
vida.
Elabore a sentença. Não há necessidade de relatório.

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