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Atendimento ao Paciente

vítima de Trauma
Com base no ATLS 10ª edição

ISBN 978-65-89822-68-4

9 786589 822684 >


Autores:

Mariana Fiuza Gonçalves


Marcela de Araújo Moradillo
Thiago Praça Brasil
Daniel de Sabóia Oliveira
Mariana Salles Ballalai
José Edmilton Felix da Silva Junior
Ana Cássia Gonzalez dos Santos Estrela
José Levi Tavares Cavalcante

Co-autores:

Felipe Sathler Cruciol


Wérica Oliveira Matos Pondé
João Pedro Andrade Augusto
Ana Luiza Antony Gomes de Matos da Costa e Silva
Maria Beatriz Sales Lima
Helena Raquel Nogueira de Oliveira
Aissa Siqueira de Morais

Revisores técnicos:

Camilla Getro de Carvalho Aguiar


Rafael Burlacchini de Carvalho Magalhães
Alecianne Braga
Sarah Ferrer Augusto Gonçalves
Lair da Silva Gonçalves
Mucio João Porto
José Antônio Carlos Otaviano David Morano
Gabriel Coelho Brito Dias
Sandra Nívea Dos Reis Saraiva Falcão
Mariana Roberta Santos de Melo
Lara Cardoso
José Roberto Gomes Francilino Filho
Sandra Nivea dos Reis Saraiva Falcão

Revisão Final:

Aissa Siqueira de Morais


Vergilius Jose Furtado de Araujo Neto
Olá futuro(a) residente!

Sabemos que quando o assunto é “Emergência” e “Trauma”


várias Escolas Médicas deixam a desejar, o que deixa vocês um
tanto quanto inseguros para lidar com esse tema na vida prática
ou na prova!

Pensando nisso, fizemos esse e-book para ser seu aliado seja
naquela revisão para prova ou para dar aquela consultada no
plantão sobre o manejo inicial do paciente vítima de trauma!

Cada capítulo foi construído e revisado tomando como base a


última versão do Advanced trauma Life Support, o famoso ATLS!

Aproveite o material feito com carinho em uma parceria da


Sanar com Ligas Acadêmicas!

Bons estudos!
SUMÁRIO

Capítulo 1:
Atendimento Inicial ao Politraumatizado 01

Capítulo 2:
Traumatismo Cranioencefálico 08

Capítulo 3:
Trauma Torácico 11

Capítulo 4:
Trauma Abdominal 32

Capítulo 5:
Queimaduras 37

Caítulo 6:
Trauma de Extremidades 43

Capítulo 7:
Traumas em Grupos Vulneráveis (Pediátrico, 53
Geriátricoe em Gestantes)
CAPÍTULO 1:

Atendimento inicial ao
politraumatizado
Capítulo 1: Atendimento inicial ao politraumatizado

Introdução

O tratamento do doente politraumatizado requer abordagem rápida, com avaliação das


lesões e instituição de medidas terapêuticas de suporte de vida. Deve ser sistematizada e
facilmente revista e aplicada. A avaliação inicial inclui:

- Preparação
- Triagem
- Avaliação primária (ABCDE)
- Reanimação
- Medidas auxiliares à avaliação primária e reanimação
- Considerar a necessidade de transferência do doente
- Avaliação secundária (da cabeça aos pés) e história
- Medidas auxiliares à avaliação secundária
- Reavaliação e monitorização contínuas após reanimação
- Tratamento definitivo

A abordagem primária deve ser repetida com frequência para identificar qualquer alter-
ação do estado clínico do doente que indique a necessidade de intervenção adicional, e
na prática clínica, essa sequência de eventos ocorre em paralelo ou simultaneamente.

Preparação: Ocorre em dois cenários clínicos diferentes.

Fase Pré-Hospitalar: Há necessidade de coordenação com os médicos do hospital que irá


receber o doente. O hospital de destino deve ser notificado antes do transporte, de modo
que todos os recursos necessários ao atendimento devem estar presentes no serviço de
emergência e chegada do doente. Além disso, é necessário ênfase no controle de hemor-
ragia externa, na manutenção das vias aéreas, e choque, imobilização do doente e trans-
porte imediato, de modo que abrevie a permanência na cena. Ressalta-se também a
importância de se obter informações importantes para a triagem: história do doente, além
de hora e eventos relacionados ao trauma.

Fase Hospitalar: É essencial que haja planejamento antecipado à chegada do doente poli-
traumatizado, sendo importante as disponibilidades de: área de reanimação, equipamen-
tos para abordagem de vias aéreas, soluções cristalóides aquecidas e equipamentos de
monitorização. A equipe de atendimento em contato com o doente deve estar protegida
contra doenças transmissíveis utilizando máscaras, proteção de olhos, avental imper-
meável, perneiras e luvas.

Triagem: Envolve a classificação dos doentes de acordo com o tipo de tratamento


necessário e os recursos disponíveis. Também se aplica à classificação dos doentes no local
e à escolha do hospital para o qual o doente deverá ser transportado. Assim, são utilizadas
escalas pré-hospitalares de trauma. Em eventos com múltiplas vítimas, o número de
doentes e a gravidade das lesões não podem exceder a capacidade de atendimento do
hospital, sendo que os doentes com risco iminente de vida e os doentes com traumatis-
mos multissistêmicos são atendidos primeiro. Já em incidentes com vítimas em massa em
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mos multissistêmicos são atendidos primeiro. Já em incidentes com vítimas em massa em
que o número de doentes e a gravidade das lesões excedem a capacidade de atendimen-
to do hospital, são prioritariamente atendidos os doentes com maior possibilidade de
sobrevida, cujo atendimento implique menor gasto de tempo, equipamentos, recursos e
profissionais.

Avaliação Primária com Ressuscitação Simultânea (ABCDE)

A avaliação primária do paciente politraumatizado compreende etapas que ocorrem


simultaneamente e visam, no geral, tratar de forma prioritária as lesões que conferem risco
de vida iminente. Dessa forma, o ATLS traz uma sequência lógica de prioridade de atendi-
mento e tratamento, abordando primeiramente aquilo que pode matar mais rápido o
paciente: o ABCDE do trauma. O ABCDE é considerado a metodologia padrão-ouro para a
avaliação do paciente traumatizado em diferentes instâncias.

A: Airway maintenance with restriction of cervical spine (vias aéreas com proteção da
coluna cervical);

B: Breathing and Ventilation (Respiração e ventilação);

C: Circulation with hemorrhage control (circulação com controle de hemorragia);

D: Disability (disfunção neurológica);

E: Exposure / Environmental control (exposição / controle do ambiente).

A equipe de saúde pode avaliar rapidamente A, B, C e D no paciente traumatizado, através


de uma avaliação rápida de 10 segundos: se identificando, perguntando o paciente o seu
nome e, por fim, perguntando o que aconteceu. Uma resposta adequada a tais perguntas
sugere que não há comprometimento maior de vias aéreas e ventilação, e que o nível de
consciência não está severamente diminuído. O contrário também se faz verdade: dificul-
dades em responder às perguntas supramencionadas sugerem anormalidades em
qualquer um dos parâmetros, advertindo a necessidade do tratamento de urgência.

A: Manutenção Da Via Aérea Com Proteção Da Coluna Cervical

A via aérea deve ser avaliada em primeiro lugar para assegurar sua permeabilidade. Identi-
fica-se sinais de obstrução por meio de aspiração e inspeção para a presença de corpos
estranhos e fraturas; as manobras para estabelecer permeabilidade devem ser feitas com
proteção da coluna cervical, sendo a manobra de elevação do mento (chin lift) ou de
tração da mandíbula (jaw thrust). Se o doente se comunica verbalmente, é pouco provável
que haja obstrução que represente risco imediato, ainda que a via aérea deva ser avaliada
constantemente em curtos intervalos de tempo. Situações que exigem via aérea definitiva
são o trauma cranioencefálico (TCE) grave, rebaixamento do nível de consciência ou escala
de coma de Glasgow (ECG) igual ou menor que 8 e respostas motoras descoordenadas
(não obrigatória, mas sugere fortemente).

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Durante a avaliação deve-se manter durante todo tempo a estabilidade da coluna cervical
(cabeça e pescoço não devem ser hiperestendidos, hiperfletido ou rodados) e deve-se
presumir a perda de estabilidade da coluna cervical (com base na história do trauma). É
importante ressaltar que a proteção da medula deve ser feita e mantida com uso de dis-
positivos apropriados de imobilização e presume-se lesão da coluna em todo paciente
com traumatismos multissistêmicos, especialmente se apresentar nível de consciência
alterado ou traumatismo fechado acima da clavícula. Também é importante considerar a
possibilidade de comprometimento progressivo da permeabilidade da via aérea, requer-
endo reavaliação frequente.

B: Ventilação e Respiração

A permeabilidade da via aérea por si só não garante ventilação adequada, sendo a troca
gasosa adequada necessária para que ocorra oxigenação tecidual e eliminação de gás car-
bônico. Pescoço e tórax devem ser expostos para avaliação distensão de veias jugulares,
posição da traqueia e movimentação da parede torácica. Realiza-se ausculta pulmonar
para confirmar fluxo de ar nos pulmões, inspeção visual e palpação para detectar lesões da
parede do tórax capazes de comprometer a ventilação, percussão visando identificar anor-
malidades (atentar-se para o fato de que o ambiente barulhento pode levar a resultados
não confiáveis).

Algumas notáveis lesões que prejudicam gravemente a ventilação em curto prazo con-
sistem no: pneumotórax hipertensivo, hemotórax maciço, pneumotórax aberto e lesões
traqueobrônquicas. Tais lesões devem ser diagnosticadas clinicamente, sem uso de
exames complementares, ainda na avaliação primária e resolvidas ainda no "B", antes de
passar para o "C". Ressalta-se que o pneumotórax simples pode evoluir para um pneumo-
tórax hipertensivo quando um paciente é entubado e a pressão positiva da ventilação é
provida antes da descompressão do pneumotórax.

Em todo paciente traumatizado, deve-se suplementar oxigênio utilizando máscara (de


Venture ou reinalante) e monitorando a saturação de oxigênio da hemoglobina com
oxímetro de pulso.

Lesões que levam a menor comprometimento da ventilação, como hemotórax ou pneu-


motórax simples, fraturas de arcos costais, tórax instável e a contusão pulmonar podem
habitualmente identificadas na avaliação secundária.

C: Circulação com controle de hemorragia

O comprometimento circulatório em pacientes de trauma pode resultar de uma grande


variedade de lesões, o que leva a necessidade da avaliação de fatores hemodinâmicos
chave: volume sanguíneo, débito cardíaco e sangramento.

A hemorragia é considerada a principal causa prevenível de morte após lesão; portanto,


identificar e controlar rapidamente o foco hemorrágico são etapas fulcrais na avaliação e
posterior gerenciamento desses pacientes. Dessa forma, depois de excluído o pneumo-

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tórax hipertensivo como a causa do choque em curso, há de se considerar que a hipo-
tensão ocorre devido a perda de sangue (até que se prove o contrário). Os elementos
semiológicos que melhor avaliam e oferecem informações clínicas importantes em menor
tempo são: nível de consciência, perfusão cutânea e pulso.

É de suma importância a identificação da fonte do sangramento, se o mesmo é externo


e/ou interno. A hemorragia externa é identificada e controlada durante a busca primária e
pode ser resolvida por pressão manual em cima da lesão. Em casos de hemorragias
maciças em extremidades, pode ser aplicado o torniquete (apenas em situações onde a
pressão direta não é eficiente e a vida do paciente está claramente em risco).

As principais áreas de hemorragia interna são o tórax, abdome, retroperitônio, pelve e


ossos longos. A fonte do sangramento é normalmente identificada através do exame
físico e exames de imagem.

No que tange aos exames de imagem, pode ser utilizado (caso tenha), a Avaliação Ultras-
sonográfica Direcionada ao Trauma (E-FAST), exame este que possui alta sensibilidade
para a detecção de líquido livre em cavidades. Neste exame, devem ser obtidas imagens
do saco pericárdico (para averiguar sangramento torácico), espaço esplenorrenal / hepa-
torrenal (para averiguar sangramento abdominal) e do espaço pélvico (i.e., janela
suprapúbica; para averiguar sangramento pélvico). Este exame está indicado no paciente
com trauma abdominal ou torácico contuso, especialmente se houver instabilidade
hemodinâmica, ainda no "C". Se houver evidência de grande quantidade de líquido livre
em cavidade, com paciente instável, assume-se que a instabilidade hemodinâmica é cau-
sada por sangramento intracavitário, e está indicada cirurgia.

Em situações de hemorragia, o controle adequado do sangramento, junto a reposição do


volume intravascular, é fundamental. A ressuscitação volêmica deve ser agressiva e con-
tínua, de forma que em nenhum momento deve ser considerada como substituta ao con-
trole definitivo da hemorragia. O acesso venoso se dá realizando dois acessos venosos
periféricos, visando a administração de sangue, fluidos e plasma. É importante que nesse
momento também sejam colhidos exames de sangue e gasometria, para avaliar padrões
hematológicos e nível de choque, e se iniciar a infusão de, no máximo, 1 litro de cristalóide
(IV).

Em casos de pacientes instáveis que não forem resolvidos com a infusão de cristalóides, é
recomendada a hemotransfusão, seguindo a dita proporção “1:1:1”, ou seja, 1 bolsa de con-
centrado de hemácias, para 1 bolsa de plaquetas, para 1 bolsa de plasma. É importante
salientar que todos os fluidos deverão ser pré-aquecidos antes de serem administrados,
visando se evitar a tríade letal: hipotermia, coagulopatia e acidose metabólica. A trans-
fusão de mais de 10 concentrados de hemácias nas primeiras 24h, associados à transfusão
de plaquetas e plasma é conhecida como Protocolo de Transfusão Maciça, o qual é condu-
ta de exceção sendo reservado para politraumatizados muito graves com choque hemor-
rágico grau IV.

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D: Disability (disfunção neurológica)

Uma rápida avaliação neurológica estabelece o nível de consciência do paciente, bem


assim a reatividade pupilar e reação, dessa forma identificando a presença de sinais de
lateralização e determinar, por fim, o nível do comprometimento medular (se presente).
Dessa forma, a Escala de Coma de Glasgow (ECG) confere uma rápida e objetiva avaliação
para averiguar o nível de consciência do paciente, de forma que a score motor do ECG é
correlacionada com o prognóstico final do paciente.

É de suma importância salientar que quaisquer alterações no nível de consciência do paci-


ente podem indicar a necessidade de reavaliação imediata da oxigenação, ventilação e
perfusão do paciente; até que se prove o contrário, é necessário assumir que mudanças no
nível de consciência resultam de danos no sistema nervoso central. Com isso, lembre-se
que no trauma, se a ECG for < 8 o paciente deve ser intubado.

Escala de Coma de Glasgow

4 Espontânea

3 Estímulo Verbal
Abertura Ocular
2 À pressão

1 Ausente

5 Orientado

4 Confuso

Melhor resposta 3 Palavras


Verbal
2 Sons

1 Ausente

6 Obedece ao comando

5 Localiza a dor

4 Não localiza a dor (flexão normal)


Melhor resposta
Motora 3 Decorticação (flexão anormal)

2 Descerebração (extensão anormal)

1 Ausente

Melhor escore possível: 15 (O4+V5+M6)


Pior escore possível: 3

Tabela 1. Escala de Coma de Glasgow.

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E: Exposição e Controle do Ambiente

Deve-se despir totalmente o paciente, cortando as roupas para facilitar o exame e aval-
iação adequados. Em seguida, ele deve ser coberto com cobertores aquecidos ou disposi-
tivo de aquecimento externo para prevenção de hipotermia. Ademais, os fluidos intrave-
nosos devem ser aquecidos antes da infusão (uso de aquecedor de fluidos alto fluxo) e o
ambiente deve ser mantido aquecido para evitar perda de calor corporal. Essas medidas
visam evitar a hipotermia, que consiste em complicação letal no paciente politraumatizado
pois desencadeia coagulopatia e vasoconstrição.

Autores, revisores e orientadores:

Autor(a): Mariana Fiuza Gonçalves


Co-autor(a): Felipe Sathler Cruciol
Revisor(a): Camilla Getro de Carvalho Aguiar
Orientador (a): Mucio João Porto

Liga Médico Acadêmica de Cirurgia Plástica do Distrito


Federal – LIMACIP-DF

Referências

COLÉGIO AMERICANO DE CIRURGIÕES; Advanced Trauma Life Support (ATLS), 10ª Ed 2018.

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CAPÍTULO 2:

Trauma Cranioencefálico
(TCE)
Capítulo 2: Trauma Cranioencefálico (TCE)

Introdução

O trauma cranioencefálico (TCE) ocupa uma das primeiras posições no ranking de lesões
mais frequentes nas emergências ao redor do mundo, além de ser uma das principais
causas de morte pré-hospitalar relacionada ao trauma. Sendo assim, o TCE precisa de um
atendimento rápido e eficiente com o objetivo de prevenir uma lesão cerebral secundária.
A depender de como ocorreu o acidente e o tipo de trauma sofrido, existem inúmeros
desfechos possíveis como: hemorragias meníngeas, lesões com perda de funções executi-
vas e/ou motoras, choque hemorrágico, entre outros. O fornecimento de oxigênio ade-
quado e a manutenção da PA são fatores essenciais para garantir uma boa irrigação cere-
bral, evidenciando, desta forma, que o paciente deve ser encaminhado para uma unidade
preparada para realizar intervenções neurocirúrgicas definitivas e estabilização adequada
do paciente, com o objetivo de frear o desenvolvimento da lesão.

Como atender o paciente vítima de TCE?

Existem diferentes classificações e tratamentos do TCE, os quais serão abordados mais


para frente. Assim sendo, e tomando como base todos os casos, independente da gravi-
dade, o atendimento inicial da vítima de TCE consiste em 4 fases: ABCDE, SAMPLA e o
Escore de Coma de Glasgow (ECG). É importante lembrar que o essencial é assegurar a
estabilidade cardiopulmonar, uma vez que a presença de hipóxia + hipotensão aumenta o
risco de morte em 75% dos acidentados.

Ao chegar ao local do acidente, a equipe de atendimento pré-hospitalar deve realizar o


ABCDE do ATLS de forma rápida e eficiente. Se o paciente se encontra em PCR, faz-se a
reanimação. Caso contrário, segue-se com o ABCDE, revisando, regularmente, as etapas
anteriores, sempre pensando em garantir vias aéreas pérvias e uma boa oxigenação,
evitando, assim, hipóxia. O controle de hemorragias também se faz extremamente impor-
tante nesses casos para combater a hipovolemia.

Uma vez estável ventilatória e hemodinamicamente, o exame neurológico é colhido e


avalia-se o Glasgow do paciente, o que auxiliará na classificação do trauma. A realização do
ECG também define, se menor que 8, a necessidade da realização precoce de uma intu-
bação orotraqueal (IOT). A reatividade pupilar também entra no GCS para uma melhor
avaliação do estado do paciente. Em seguida, história SAMPLA é colhida, através de par-
entes ou amigos, no intuito de saber: sinais e sintomas de prováveis traumas específicos,
ambientes e eventos relacionados ao trauma, medicamentos (principalmente sobre o uso
de anticoagulantes), passado médico/prenhez (em casos de vítimas mulheres), líquidos e
alimentos nas últimas horas e alergias que o paciente apresenta.

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Tabela 1. Escala de Coma de Glasgow.

Ao chegar à emergência, o traumatizado deve ser submetido, dependendo do grau de


gravidade e do seu score de Glasgow, à Tomografia Computadorizada (TC) de crânio, para
uma melhor definição de conduta e tratamento. Caso o local não tenha o serviço dis-
ponível, se faz necessária a transferência da vítima para uma unidade que o possua, além
de estar preparada para qualquer intervenção neurocirúrgica. A indicação de TC para paci-
entes com TCE se dá de acordo com o estado do paciente e a pontuação Glasgow do
mesmo. Se ECG = 15 e a vítima estiver assintomática, pode-se abrir mão da tomografia,
desde que haja a possibilidade de manter observação do paciente, e que ele e os famili-
ares estejam devidamente orientados. Além disso, pode-se considerar, mesmo nesses
casos, realizar a tomografia para pacientes idosos e/ou em uso de antiagregantes
plaquetários ou anticoagulantes.

Caso ECG for entre 13 ou 14, o trauma for grave e apresentar alguma limitação neurológica
focal, perda de consciência maior que 5 minutos, amnésia retrógrada > 30 minutos ou
sintomas como cefaleia grave, recomenda-se realizar TC. Em casos de TCE moderado
(ECG entre 9 e 12) e TCE grave (ECG menor ou igual a 8) também se indica a realização.

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Tabela. Indicação de Tomografia de Crânio no TCE Leve

Classificação e Tratamento do Trauma Cranioencefálico

A classificação do traumatismo crânio encefálico (TCE) é realizada através da escala de


coma de Glasgow, que avalia quatro parâmetros: abertura ocular, resposta verbal, resposta
motora e reatividade pupilar. Através desses parâmetros classifica-se o TCE em grave,
moderado e leve. Se a avaliação da Escala de Coma de Glasgow apresentar um valor de 3
a 8, o TCE é classificado como grave; se entre 9 e 12, moderado; e se apresentar escore
entre 13 e 15, classifica como leve.

O tratamento do trauma crânio encefálico divide-se em clínico e cirúrgico. O clínico inclui


fluidos intravenosos, hiperventilação, anticonvulsivantes, manitol, solução salina hipertôni-
ca e barbitúricos. Já o tratamento cirúrgico é indicado quando ocorre lesões em couro
cabeludo, lesões intracranianas de massa, fraturas de afundamento de crânio e ferimentos
cerebrais penetrantes.

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Autores, revisores e orientadores:

Autor(a): Marcela de Araújo Moradillo


Coautor(a): Wérica Oliveira Matos Pondé
Revisor(a): Rafael Burlacchini de Carvalho Magalhães
Orientador(a): Alecianne Braga

Liga Baiana de Emergências - LBE.

Referências

American College of Surgeons. Advanced Trauma Life Support (ATLS). 9a ed. Chicago - IL: 2012.
American College of Surgeons. Advanced Trauma Life Support (ATLS). 10a ed. Chicago - IL: 2018.
SANARFLIX. Super Material Trauma Cranioencefálico. Disponível em: https://aluno.sanarflix.com.br/#/por-
t a l / s a l a - a u -
la/5daab8754340d20011fb2951/5daab78e132ed4001119eabb/documento/5e6fa50a480598001c75176e.
PHTLS – Pre Hospital Life Support – 8a Ed 2016 - Guimarães, Hélio Penna; Borges, Luiz Alexandre Alegretti;
Assunção, Murilo Santucci Cesar; Reis, Hélder Jose Lima. Manual de Medicina de Emergência. 1a Ed, 2016,
Editora Atheneu.

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CAPÍTULO 3:

Trauma Torácico
Capítulo 3: Trauma Torácico

Introdução

O Trauma Torácico é comum em pacientes politraumatizados e podem ser, muitas vezes,


fatais, correspondendo a uma causa significativa de mortalidade devido ao trauma, espe-
cialmente se não forem devidamente identificados e tratados durante a avaliação primária
do paciente, muitas técnicas para melhorar a sobrevida destes pacientes são treinadas no
protocolo ATLS. Ademais, é importante salientar que menos de 10% dos traumas contusos
de tórax e 15 a 30% de lesões penetrantes necessitam de intervenção cirúrgica.

As lesões torácicas podem ser divididas em Condições com Risco Imediato à Vida e
Lesões com Potencial Risco à Vida. As Condições com Risco Imediato à Vida são obser-
vadas durante a avaliação primária e apresentam maior taxa de letalidade e precisam de
um tempo de resposta (identificação e conduta) mais rápido, pois colocam o paciente em
risco iminente de morte. São elas: pneumotórax hipertensivo, pneumotórax aberto,
hemotórax maciço, lesão na árvore traqueobrônquica e tamponamento cardíaco. Já as
Lesões com Potencial Risco à Vida, podem ser tratadas tanto na avaliação primária como
na secundária, são elas: pneumotórax simples, hemotórax simples, contusão cardíaca, rup-
tura traumática de aorta, lesão diafragmática, lesão esofágica e tórax instável com con-
tusão pulmonar.

Como atender o paciente vítima de um Trauma Torácico?

Seguindo o protocolo atual do ATLS (“Advanced Trauma Life Suport”) que, traduzindo
para a língua portuguesa, significa Suporte Avançado de Vida no Trauma. Esse livro pre-
coniza intensamente o chamado Protocolo ABCDE do trauma que será melhor caracteri-
zado mais a frente.

É essencial que o paciente traumatizado seja rapidamente atendido, sabendo-se identifi-


car as lesões apresentadas e, principalmente, quais delas são as de maior urgência. Saben-
do disso, o Protocolo ABCDE do trauma foi criado como forma de identificar todas essas
lesões, abordando-as gradualmente e de forma que priorize as lesões que podem levar a
óbito mais rapidamente.

Esse protocolo é uma sigla para:

A > Airway - Vias aéreas.


B > Breathing - Respiração.
C > Circulation - Circulação.
D > Neurological Disability - Disfunções neurológicas.
E > Exposure - Exposição.

Por mais que o Trauma Torácico tenha uma grande prevalência de disfunções que são
envolvidas pela letra A e B, ele pode ser acometido por todas as áreas do protocolo
ABCDE, sendo cabível a aplicação dele todo na região do tórax.

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Realmente, o trauma torácico costuma causar 3 grandes problemas: hipóxia, hipercapnia e
acidose. Esses são geralmente causados quando há dano pulmonar em que por alterações
de pressão (pneumotórax e trauma penetrante), contusão (hemotórax e tórax instável) e
colabamento alveolar. Geralmente, a hipóxia é um dos principais problemas no trauma
torácico. Já a acidose e a hipercapnia vem como consequência de alguma alteração que
leva à hipóxia.

Os passos iniciais incluídos na letra A do protocolo em questão deverão ser rapidamente


analisados. Os principais itens a serem analisados são: obstrução de vias aéreas + suporte
ventilatório. Esse suporte deverá ser analisado cautelosamente de acordo com a necessi-
dade do paciente.

Por mais que todo o protocolo seja essencialmente seguido durante o trauma torácico, o
grande enfoque deste capítulo será na letra B. A respiração do paciente, como já dito ante-
riormente, terá uma tendência à hipóxia e, na maioria dos casos, isso poderá ser soluciona-
do com um exame físico bem apurado.

A primeira atitude a se fazer ao chegar na letra B do protocolo é, sem dúvidas, a inspeção


estática do tórax. Alguns sinais podem ser observados com essa simples análise, tais como:
penetrações, hematomas, contagem da frequência respiratória, padrão respiratório, san-
gramentos e fraturas expostas.

O próximo passo a ser seguido é a palpação do tórax. Nesse momento, fraturas internas
das costelas e esterno poderão ser identificadas. Outros sinais à palpação são: o enfisema
subcutâneo e a expansibilidade torácica. Nesse momento, poderá ser feita a técnica per-
cussiva, onde se torna fácil identificar sons timpânicos em casos de pneumotórax, por
exemplo. Sons maciços também podem ser achados, indicando a presença de líquidos no
meio intratorácico, tais como derrame pleural, sangramento extrapulmonar e empiemas.

O diagnóstico do tipo de lesão intrapulmonar que é obtido pela palpação pode ser ainda
mais refinado com o auxílio da ausculta pulmonar. Isso dirá com mais precisão se há líqui-
dos acumulados no meio intra-alveolar, extra-alveolar ou se há colabamento dos mesmos.
Para aumentar o ganho de tempo, a ausculta pode ser aproveitada para analisar os focos
cardíacos e iniciar a identificação dos problemas da fase C do protocolo ABCDE.

Classificação e Tratamento do Trauma Torácico

Lesão de Árvore Traqueobrônquica

Esta condição ocorre, na maioria das vezes, 2,5 cm acima da região da carina. Normal-
mente as pessoas que sofrem essa lesão vão a óbito no local do trauma. As que conseg-
uem sobreviver até a chegada ao hospital possuem um mau prognóstico por desenvolvi-
mento de lesões subjacentes.

As formas mais comuns de lesão desta área são por desacelerações seguidas por con-
tusão. Dessa forma, partes fixas, como as vias aéreas, encontram-se com partes intratorá-

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Quadro Clínico

O quadro apresentado pelo paciente é tipicamente a hemoptise, enfisema subcutâneo


na região cervical anterior, pneumotórax e cianose. Uma maneira de identificar a origem
da lesão é quando há a colocação do tubo torácico e, mesmo assim, continua havendo um
grande vazamento de ar, sendo muitas vezes necessário a colocação de mais de um tubo
torácico para retornar a expansão pulmonar adequada.

Diagnóstico

O método diagnóstico mais preciso de identificação real da ruptura da árvore traqueo-


brônquica é pela broncoscopia.

Conduta

Como visto anteriormente, esse tipo de lesão gera um vazamento de ar muito intenso e
prejudica a ventilação do paciente. Se durante a broncoscopia for identificado essa lesão,
o paciente deverá ser encaminhado urgentemente para a cirurgia. Ainda, como medida de
suporte, deverá ser realizada a colocação de uma via aérea definitiva e os tubos torácicos
com selo d’água para drenagem.

Como a intubação é um dos grandes métodos de escolha pode se tornar um fator prejudi-
cial para esse caso, deve-se optar pela guia desse procedimento com o auxílio da fibra
óptica, evitando piora das lesões e seleção dos pulmões.

Pneumotórax Simples

O Pneumotórax Simples consiste no resultado da entrada de ar no espaço potencial entre


a pleura visceral e parietal.

Normalmente, o tórax é completamente preenchido pelos pulmões, que são mantidos na


parede torácica pela tensão superficial entre as superfícies pleurais. O ar no espaço pleural
interrompe as forças coesivas entre as pleuras visceral e parietal, permitindo o colapso do
pulmão. Um defeito de ventilação-perfusão ocorre porque o sangue que perfunde a área
não ventilada não é oxigenado. Traumas penetrantes e não penetrantes podem causar
essa lesão. A laceração pulmonar com vazamento de ar é a causa mais comum de pneu-
motórax por trauma fechado.

É necessário um exame físico abrangente do tórax, incluindo a inspeção de hematomas,


lacerações e contusões. Também se avalia o movimento da parede torácica e compara-se
os sons respiratórios bilateralmente. Quando um pneumotórax está presente, os murmúri-
os vesiculares geralmente diminuem no lado afetado. A percussão pode demonstrar hip-
ertimpanismo, embora este achado seja extremamente difícil de ouvir em um ambiente
barulhento.

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Diagnóstico

A suspeita diagnóstica é clínica, quando forem encontradas as alterações mencionadas no


tópico anterior. Se o paciente não apresentar comprometimento ventilatório ou hemod-
inâmico, é possível aguardar a confirmação radiográfica na avaliação primária do atendi-
mento ao trauma. Entretanto, se na etapa "B", já forem identificados esses comprometi-
mentos, o tratamento, com drenagem do tórax em selo d'água, deve ser instaurado antes
de se passar para a etapa "C".

Conduta

Qualquer pneumotórax é mais bem tratado com um dreno torácico colocado no quinto
espaço intercostal, imediatamente anterior à linha axilar média. A observação e aspiração
de um pequeno pneumotórax assintomático podem ser apropriadas, mas um médico
qualificado deve tomar esta decisão de tratamento. Depois de inserir um dreno torácico e
conectá-lo a um aparelho selador subaquático com ou sem sucção, um exame de
radiografia de tórax é feito para confirmar a colocação adequada e a reexpansão. Lem-
bre-se, ainda, que não deve ser submetido à anestesia geral ou receber ventilação com
pressão positiva sem a inserção de um dreno torácico.

Em circunstâncias selecionadas, como quando um “pneumotórax oculto” for diagnostica-


do (quando o pneumotórax é identificado na tomografia e não na radiografia) a equipe de
trauma pode decidir observar cuidadosamente o paciente em busca de sinais de que o
pneumotórax está se expandindo. Nem sempre é necessário drenar um pneumotórax
oculto, tal procedimento se faz necessário quando há programação de mudança de
pressão no ambiente (intubação, videolaparoscopia ou transporte aéreo). A abordagem
mais segura é colocar um dreno torácico antes que um pneumotórax hipertensivo possa
se desenvolver.

Pneumotórax Aberto

O Pneumotórax Aberto é resultado de lesões extensas na parede torácica que permane-


cem abertas, e é conhecido, também, como ferida torácica aspirativa. Neste tipo de lesão,
o equilíbrio entre a pressão intratorácica e a pressão atmosférica é imediato, pois o ar
tende a seguir caminho de menor resistência, quando a abertura na parede torácica é
aproximadamente dois terços do diâmetro da traqueia ou maior, o ar passa preferencial-
mente pelo defeito da parede torácica a cada respiração. Dessa forma, a ventilação eficaz
é, assim, prejudicada, levando à hipóxia e hipercarbia (elevação da pressão de CO2). O
pneumotórax aberto é comumente encontrado e tratado no local pela equipe de atendi-
mento pré-hospitalar.

Quadro Clínico

Os sinais clínicos e os sintomas são: dor, dispneia, taquipneia, murmúrio vesiculares


diminuídos no lado acometido e barulhos (ruídos) na movimentação de ar através da lesão
torácica.

16
Conduta

Para o manejo inicial de um paciente com um pneumotórax aberto, é necessário que se


feche imediatamente o defeito com um curativo estéril grande o suficiente para sobrepor
as bordas da lesão. Qualquer curativo oclusivo pode ser usado como medida temporária
para permitir uma avaliação rápida para continuar a avaliação. Para isso, é necessário que o
curativo seja fixado com firmeza em apenas três pontos para fornecer um efeito de válvula
unidirecional. Durante a expiração, a extremidade aberta do curativo permite que o ar
escape do espaço pleural.

Este tipo de fixação é feito em três pontos, de forma que um mecanismo de válvula seja
instalado, fazendo com que o ar saia quando o paciente expira, porém não entre nova-
mente na cavidade durante a inspiração. Após a fixação do curativo, colocar um dreno
torácico distante da ferida o mais rápido possível e, por fim, o fechamento cirúrgico defini-
tivo subsequente da ferida é frequentemente necessário.

Pneumotórax Hipertensivo

O Pneumotórax Hipertensivo se desenvolve quando um vazamento de ar de “válvula


unidirecional” ocorre do pulmão ou através da parede torácica. O ar é forçado para o
espaço pleural sem meios de escape, eventualmente causando o colapso do pulmão afe-
tado. O mediastino é deslocado para o lado oposto, diminuindo o retorno venoso e com-
primindo o pulmão oposto. Os pacientes que sofrem Pneumotórax Hipertensivo, muitas
vezes, desenvolvem choque obstrutivo, resultando na diminuição acentuada no retorno
venoso, causando uma redução no débito cardíaco. A causa mais comum de pneumotórax
hipertensivo é a ventilação mecânica com pressão positiva em pacientes com lesão pleural
visceral.

O Pneumotórax Hipertensivo também pode complicar um pneumotórax simples após


trauma torácico penetrante ou contuso no qual uma lesão pulmonar parenquimatosa
falha em selar ou após tentativa de inserção de cateter venoso jugular interno ou sub-
clávio. Ocasionalmente, defeitos traumáticos na parede torácica podem causar pneumo-
tórax hipertensivo quando curativos oclusivos são fixados nos quatro lados ou o defeito
em si constitui um mecanismo de válvula de aba. Raramente, o pneumotórax hipertensivo
ocorre a partir de fraturas da coluna torácica marcadamente deslocadas.

Quadro Clínico

O Pneumotórax Hipertensivo é caracterizado por alguns ou todos os seguintes sinais e


sintomas: dor no peito, dispneia, taquipneia, dificuldade respiratória, taquicardia, hipo-
tensão, desvio traqueal longe do lado da lesão, ausência unilateral de sons respiratóri-
os, hemitórax elevado sem movimento respiratório, turgência jugular e cianose (mani-
festação tardia).

17
Diagnóstico

O diagnóstico de pneumotórax hipertensivo é clínico que, reflete ar sob pressão no


espaço pleural afetado. Não atrase o tratamento para obter confirmação radiológica. Paci-
entes que respiram espontaneamente frequentemente manifestam taquipneia extrema e
falta de ar, enquanto pacientes ventilados mecanicamente manifestam colapso hemod-
inâmico.

No exame físico, o pneumotórax hipertensivo é percebido com uma nota hipertimpânica


na percussão, traqueia desviada, veias do pescoço distendidas e murmúrios vesiculares
ausentes. A saturação arterial deve ser avaliada com um oxímetro de pulso e diminuirá
quando a enfermidade está presente.

Quando a ultrassonografia está disponível, o Pneumotórax Hipertensivo pode ser diag-


nosticado por meio de uma Avaliação Focalizada com Sonografia para Trauma (FAST)
estendido (eFAST).

Conduta

A conduta do pneumotórax hipertensivo é rápida e necessita de descompressão imediata.


Ele pode ser tratado inicialmente com a rápida inserção de um cateter com agulha no
espaço pleural. Devido à espessura variável da parede torácica, torção do cateter e outras
complicações técnicas ou anatômicas, a descompressão da agulha é uma abordagem
alternativa.

A espessura da parede torácica influencia a probabilidade de sucesso com a descom-


pressão com a agulha. Evidências recentes apoiam a colocação do cateter com agulha no
5º espaço intercostal na porção superior (para fugir do sulco costal, contendo vasos san-
guíneos), ligeiramente anterior à linha axilar média (em crianças, a punção ainda deve
ser feita no 2º espaço na linha hemiclavicular média). No entanto, mesmo com um
cateter sobre a agulha de tamanho apropriado, a manobra nem sempre terá sucesso. A
descompressão bem-sucedida com agulha converte o pneumotórax hipertensivo em
pneumotórax simples, o qual deve ser drenado.

Hemotórax

O Hemotórax consiste em um tipo de derrame pleural em que o sangue se acumula na


cavidade pleural (<1500ml). A principal causa do hemotórax é a laceração do pulmão,
grandes vasos, um vaso intercostal ou um trauma penetrante ou contuso de artéria
mamária interna. Fraturas da coluna torácica também podem estar associadas a um
hemotórax. O sangramento é geralmente autolimitado e não requer intervenção cirúrgica.

Diagnóstico

Neste tipo de lesão é necessário expor o tórax e as áreas cervicais e observar o movimento
da parede torácica. Além disso, é preciso procurar por qualquer lesão penetrante da

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da parede torácica, incluindo a porção posterior do tórax. Ademais, é necessário comparar
os sons respiratórios em ambos os hemitórax. Normalmente, macicez à percussão é
observado no lado acometido.

A radiografia de tórax com o paciente em ortostase pode ajudar no diagnóstico, pois uma
pequena quantidade de sangue será identificada como uma opacidade homogênea no
lado afetado. Um hemotórax agudo grande o suficiente para aparecer em uma radiografia
de tórax pode ser tratado com um dreno torácico French 28-32. O dreno torácico evacua o
sangue, reduz o risco de hemotórax coagulado e permite o monitoramento contínuo da
perda de sangue. A evacuação de sangue e fluidos também permite que os médicos ava-
liem mais completamente o paciente quanto a possíveis lesões diafragmáticas.

Conduta

Muitos fatores estão envolvidos na decisão de operar ou não um paciente com


hemotórax. Nesse contexto, o estado fisiológico do paciente e o volume de drenagem de
sangue do dreno torácico são considerações importantes. Mais de 1500 mL de sangue
obtido imediatamente através do dreno torácico indica um hemotórax maciço que pode
exigir intervenção cirúrgica. Também se ocorre drenagem de mais de 200 mL/h por 2 a 4
horas, ou se a transfusão de sangue for necessária, a equipe do trauma deve considerar a
cirurgia exploratória. A decisão final para intervenção cirúrgica é baseada no estado
hemodinâmico do paciente.

Hemotórax Maciço

É mais comumente causada por uma ferida penetrante que rompe os vasos sistêmicos ou
hilares, embora um hemotórax maciço também possa resultar de trauma contuso.

Quadro Clínico

Em pacientes com hemotórax maciço, as veias do pescoço podem estar achatadas devido
à hipovolemia grave ou podem estar distendidas se houver pneumotórax hipertensivo
associado. Raramente, os efeitos mecânicos do sangue intratorácico maciço deslocam o
mediastino o suficiente para causar dilatação das veias do pescoço. Um hemotórax maciço
é sugerido quando o choque está associado à ausência de sons respiratórios ou embota-
mento à percussão em um lado do tórax.

Conduta

O hemotórax maciço é inicialmente controlado restaurando simultaneamente o volume


sanguíneo e descomprimindo a cavidade torácica. Para isso é necessário estabelecer
acesso venoso de grande calibre, e a partir deles infundir cristalóides e começar a trans-
fusão de sangue não cruzado ou do tipo específico do paciente o mais rápido possível.
Quando apropriado, o sangue do dreno torácico pode ser coletado em um dispositivo
adequado para autotransfusão. Um único dreno torácico (28-32 French) é inserido, geral-
mente no quinto espaço intercostal, imediatamente anterior à linha axilar média, e a

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restauração rápida do volume continua conforme a descompressão da cavidade torácica é
concluída. O retorno imediato de 1500 mL ou mais de sangue geralmente indica a necessi-
dade de toracotomia urgente.

Os pacientes que apresentam uma produção inicial de menos de 1.500 mL de fluido, mas
continuam a sangrar, também podem precisar de toracotomia. Esta decisão é baseada na
taxa de perda contínua de sangue (200 mL/h por 2 a 4 horas), bem como no estado
fisiológico do paciente e se o tórax está completamente sem sangue. Novamente, a
necessidade persistente de transfusão de sangue é uma indicação para a toracotomia. Du-
rante a ressuscitação do paciente, o volume de sangue inicialmente drenado do dreno
torácico e a taxa de perda contínua de sangue devem ser considerados na reanimação
necessária. A cor do sangue (indicando uma fonte arterial ou venosa) é um indicador pobre
da necessidade de toracotomia.

As feridas penetrantes torácicas anteriores medialmente à linha do mamilo e feridas pos-


teriores mediais à escápula deve alertar o médico sobre a possível necessidade de toracot-
omia devido ao potencial dano aos grandes vasos, estruturas hilares e coração, com o
potencial associado para tamponamento cardíaco. Não execute toracotomia a menos que
um cirurgião, qualificado por treinamento e experiência, esteja presente.

Tabela 01. Tabela demonstrando a diferença entre as características do hemotórax maciço e o pneumotórax
hipertensivo. FONTE: ATLS (2018), adaptado pelos próprios autores, 2021.

20
Tamponamento Cardíaco

O Tamponamento Cardíaco consiste na compressão do coração por um acúmulo de líqui-


do no saco pericárdico. Desta forma, ocorre a diminuição do débito cardíaco devido a
diminuição do influxo para o coração. O saco pericárdico humano é uma estrutura fibrosa
fixa e uma quantidade relativamente pequena de sangue pode restringir a atividade
cardíaca e interferir no enchimento cardíaco.

O tamponamento cardíaco geralmente resulta de lesões penetrantes. No entanto, lesões


contusas também podem fazer com que o pericárdio se encha com sangue do coração,
dos grandes vasos ou dos vasos epicárdicos. Esta enfermidade pode se desenvolver lenta-
mente, permitindo uma avaliação menos urgente, ou exigindo diagnóstico e tratamento
rápidos.

Quadro Clínico

A tríade clínica clássica desta enfermidade, conhecida como Tríade de Beck, consiste em
abafamento de bulhas cardíacas (sons cardíacos), hipotensão e distensão de veias,
porém estes achados nem sempre são encontrados. O abafamento de bulhas é, muitas
vezes, difícil de se avaliar na sala de reanimação devido aos ruídos do local e a turgência
jugular pode estar ausente devido a hipovolemia do paciente.

O Sinal de Kussmaul (turgência da jugular), aumento na pressão venosa com inspiração


ao respirar espontaneamente, é uma verdadeira anormalidade da pressão venosa para-
doxal que está associada ao tamponamento. A Atividade Elétrica sem Pulso (AEP) é sug-
estiva de tamponamento cardíaco, mas pode ter outras causas.

O Tamponamento Cardíaco apresenta uma grande semelhança de achados com Pneu-


motórax Hipertensivo, principalmente o no lado esquerdo, podendo, frequentemente,
serem confundidos, para isso necessita-se saber a diferença entre eles: hipertimpanismo à
percussão indica pneumotórax hipertensivo, enquanto a presença de sons respiratórios
bilaterais indica tamponamento cardíaco.

Diagnóstico

Um exame interessante de imagem para fazer a análise rápida do coração e do pericárdio


realizando a identificação de um possível tamponamento cardíaco é a Avaliação Focaliza-
da com Sonografia para Trauma (FAST). Todavia, este exame pode gerar alguns falsos
positivos e falsos negativos em casos, como hemotórax. Lembre-se de que o tampona-
mento pode se desenvolver a qualquer momento durante a fase de ressuscitação, e pode
ser necessário repetir os exames FAST. Provedores experientes em ultrassonografia
também podem ser capazes de avaliar disfunção miocárdica e enchimento ventricular.

Outros métodos diagnósticos podem ser utilizados, como ecocardiograma e/ou janela
pericárdica, que pode ser particularmente útil quando FAST é indisponível ou equívoco.

21
Conduta

Esses casos requerem uma conduta imediata. Assim, um ECG e um ecocardiograma


devem ser solicitados o mais rápido possível. A Ressuscitação Cardiopulmonar e o Proto-
colo ABCDE devem ser iniciados o mais cedo possível e realizados de maneira apropriada.
Para isso, realize a intubação orotraqueal sem a indução de sequência rápida e faça a
administração de O2 a 100%. Além disso, faça toracostomias bilaterais para aliviar um pos-
sível pneumotórax hipertensivo. Visto que o paciente se encontra inconsciente, não é
necessário fazer uso de anestesia local.Não esqueça de monitorar constantemente a satu-
ração de O2 e o ECG e de iniciar a ressuscitação volêmica com a infusão rápida de fluidos.
Lembre-se: cada segundo é importante.

Se a RCP for realizada de maneira adequada e não resultar em um retorno da circulação,


deve-se solicitar imediatamente que um cirurgião realize uma toracotomia ressuscitativa.
Nos casos em que há o diagnóstico ou a forte suspeita de tamponamento cardíaco e não
houver uma equipe cirúrgica para realizar a toracotomia, indica-se a realização de uma
pericardiocentese.

Trauma Contuso Cardíaco

O Trauma Contuso Cardíaco pode ser consequência de acidentes automobilísticos, atro-


pelamentos, acidentes envolvendo motos e quedas de alturas acima de 6 metros. Tal
condição pode resultar em contusão miocárdica subepicárpica, subendocárdica ou trans-
mural, rupturas de câmaras cardíacas, lesões valvares e dissecção e/ou trombose de
artérias coronárias.

Quadro Clínico

Em geral, o Trauma Contuso Cardíaco se apresenta com tamponamento cardíaco, o qual


deve ser reconhecido o mais rápido possível. Assim, é importante que você revise toda a
apresentação clínica contida no respectivo tópico deste capítulo. Além disso, vale ressaltar
que o uso do FAST é essencial para o diagnóstico dessa condição, visto que, nesses casos,
os sinais e sintomas podem demorar a surgir. Ademais, o Trauma Contuso Cardíaco
também pode se apresentar como Infarto Agudo do Miocárdio (IAM) ou arritmias.

Diagnóstico

O seu diagnóstico, na verdade, só pode realmente ser feito a partir da inspeção do miocár-
dio lesionado. No entanto, pode-se fazer uso de alguns exames, como o ecocardiograma,
que pode mostrar anormalidades nos movimentos nos movimentos da parede. No que se
refere ao eletrocardiograma, as possíveis alterações são bastante variáveis: contrações
ventriculares prematuras, taquicardia sinusal, fibrilação atrial, bloqueio de ramo e alter-
ações do segmento ST. Além disso, uma outra alteração que aumenta a suspeita dessa
lesão é o aumento da pressão venosa central sem causa aparente, visto que pode indicar
a presença de uma disfunção ventricular direita secundária à contusão.

22
A análise das troponinas cardíacas, apesar de ser útil para o diagnóstico de IAM, não costu-
ma ser feita na suspeita do trauma contuso, pois apenas oferece informações que podem
ser obtidas na análise do eletrocardiograma.

Em relação ao monitoramento nas primeiras 24 horas, deve ser feito nos pacientes que
apresentaram alterações eletrocardiográficas, pois possuem um risco aumentado de apre-
sentarem arritmias súbitas. Assim, tal monitoramento não precisa ser feito naqueles que
não apresentaram alterações nesse exame.

Ruptura Traumática da Aorta

Uma das principais causas de morte súbita após grandes desacelerações como quedas de
grandes alturas e colisões automobilísticas é a Ruptura Traumática da Aorta. No entanto,
se essa condição for rapidamente identificada e tratada nos que sobreviveram a tais
acidentes, há chances consideráveis de ocorrer uma boa recuperação e prognóstico.
Nesse contexto, vale ressaltar que as chances de sobrevivência são ainda maiores se a
laceração ocorrer numa região próxima ao ligamento arterioso da aorta.
Esses sobreviventes compartilham uma característica: todos apresentam um hematoma
mediastinal contido, o qual evita a ocorrência imediata de sangramento. A hipotensão
recorrente ou persistente é geralmente provocada por um outro sítio de sangramento não
identificável.

Achados Radiológicos

Visto que o quadro clínico desta condição é frequentemente inespecífico, é de suma


importância que o profissional esteja atento para os seguintes achados na radiografia de
Tórax: alargamento do mediastino, obliteração do botão aórtico, desvio da traqueia para a
direita, depressão do brônquio esquerdo, elevação do brônquio direito, escurecimento da
janela aortopulmonar (obliteração do espaço entre a aorta e as artérias pulmonares),
desvio do esôfago para a direita (sonda nasogástrica), alargamento da faixa paratraqueal,
alargamento das interfaces paraespinhais, hemotórax esquerdo, presença de capa pleural
ou apical, bem como fratura da escápula ou da 1ª ou 2ª costela.

Além da radiografia de tórax, um outro exame de imagem que pode ser utilizado é a
Tomografia Computadorizada com contraste helicoidal, a qual é considerada uma forma
precisa de rastreamento em pacientes que apresentam suspeita de apresentarem uma
Ruptura Traumática da Aorta, por apresentar uma sensibilidade e especificidade bem
próximas de 100%.Se tal exame der resultado negativo para a presença de um hematoma
mediastinal ou de uma ruptura da aorta, provavelmente não será necessário realizar um
outro exame de imagem. Entretanto, lembre-se que colocar um paciente hemodinamica-
mente instável em um tomógrafo não é recomendado.

Além disso, o uso de um ecocardiograma transesofágico pode ser indicado por ser um
exame menos invasivo. Por fim, ressalta-se que o cirurgião de trauma responsável pelo
paciente é quem determinará quais testes diagnósticos serão utilizados.

23
Conduta

Deve-se fazer uso de analgésicos para o controle da dor. Além disso, visto que a probabili-
dade de ruptura é diminuída com o controle da frequência cardíaca e da pressão arterial,
recomenda-se o uso de betabloqueadores de ação curta se não houver contraindicações.
A meta é obter uma FC menor que 80bpm e uma PAM entre 60 a 70mmHg.

Quando não for possível o uso dos betabloqueadores ou ele não for suficiente, pode-se
utilizar bloqueadores de canais de cálcio, como a nicardipina. Se esse medicamento não
funcionar, indica-se o uso de nitroglicerina ou nitroprussiato se não houver contraindi-
cações.

A conduta do cirurgião inclui a ressecção e o reparo da porção da aorta que foi lesionada.
A opção mais comum é o reparo endovascular, pois apresenta bons resultados em um
prazo curto. Além disso, ressalta-se que, no intuito de evitar complicações a longo prazo,
deve-se continuar a acompanhar o paciente mesmo após a alta hospitalar.

Tórax Instável

Um Tórax Instável (ou Tórax Flácido) é aquele em que uma porção da parede torácica perde
a continuidade óssea com o resto da caixa torácica, prejudicando, assim, a movimentação
dessa região e, consequentemente, a função ventilatória. Na maioria dos casos, tal perda
resulta de múltiplas fraturas de costelas, mas pode ser consequência de uma separação
costocondral de uma única costela.

Além disso, vale ressaltar que essa condição pode provocar uma contusão pulmonar, bem
como um estado grave de hipóxia devido ao acúmulo de sangue e outros fluidos no
pulmão.

Quadro Clínico

Na maioria dos casos, o paciente apresenta dor torácica e dispneia, associadas à crepi-
tação da parede torácica. Além disso, alguns podem apresentar a respiração paradoxal,
que consiste na movimentação do segmento instável em direção contrária ao movimento
da parede torácica, ou seja, afundando à inspiração e abaulando à expiração.

No entanto, saiba que no exame físico, a visualização direta do segmento afetado nem
sempre será possível devido à própria musculatura da região e à limitação da expansibili-
dade da parede.

Diagnóstico

O diagnóstico é feito com base na apresentação clínica do paciente e pode ser auxiliado
com o uso de uma Radiografia de Tórax, que permite a visualização direta das fraturas de
arcos costais, apesar de não mostrar a separação costocondral.

24
Conduta

O tratamento inicial do tórax instável inclui a administração de oxigênio umidificado, ven-


tilação adequada e ressuscitação fluida cautelosa. Na ausência de hipotensão sistêmica,
a administração de soluções intravenosas cristalóides deve ser cuidadosamente controla-
da para evitar sobrecarga de volume, o que pode comprometer ainda mais o estado respi-
ratório do paciente.

Pacientes com hipóxia significativa (PaO2 <60 mmHg [8,6 kPa] ou SaO2 <90%) em ar ambi-
ente podem precisar de intubação e ventilação na primeira hora após a lesão. Condições
médicas associadas, como doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) e insuficiência
renal, aumentam a probabilidade de necessidade de intubação precoce e ventilação
mecânica.

O tratamento definitivo do tórax instável envolve a garantia de oxigenação adequada,


administração de fluidos criteriosa e analgesia para melhorar a ventilação. O plano para
isso pode mudar com o tempo e com a resposta do paciente, garantindo monitoramento
cuidadoso e reavaliação do paciente.

A analgesia pode ser obtida com narcóticos intravenosos ou administração de anestésico


local, evitando, assim, a depressão respiratória potencial comum com o uso de narcóticos
sistêmicos. As opções de administração de anestésicos locais incluem bloqueio de nervo
intercostal intermitente e anestesia transcutânea intrapleural, extrapleural ou epidural.
Quando usados corretamente, os agentes anestésicos locais podem fornecer analgesia
excelente e evitar a necessidade de intubação.

No entanto, a prevenção da hipóxia é de suma importância para pacientes com trauma, e


um curto período de intubação e ventilação pode ser necessário até que os médicos
tenham diagnosticado todo o padrão de lesão. A avaliação cuidadosa da frequência respi-
ratória do paciente, da saturação arterial de oxigênio e do trabalho respiratório indicará o
momento adequado para a intubação e a ventilação, caso sejam necessários.

Lesão Diafragmática

Esta lesão é mais comum no lado esquerdo, uma vez que a presença do fígado no lado
direito tem um efeito protetivo sobre a ruptura desse tecido. Ainda, o tipo de lesão pode
exibir um quadro mais ou menos grave. Traumas contusos tendem a produzir lesões radi-
ais que separam as fibras do músculo radialmente e produzem herniações. Por sua vez, os
traumas penetrantes provocam pequenas perfurações que não provocam herniações
pelo seu tamanho e acabam se tornando assintomáticas em alguns casos.

Exame Radiográfico e Diagnóstico

Frequentemente a ruptura diafragmática é confundida com outras condições ao ser rea-


lizada a radiografia do tórax. Conteúdos como sangue na cavidade torácica, alças intes-
tinais, dilatação gástrica e até fluidos intestinais podem ser encontrados nas radiografias

25
devido a ruptura desse tecido. Devido a essa facilidade de herniação, especialmente de
alças intestinais e do estômago, pode ser feita a passagem de uma sonda nasogástrica
seguida de uma radiografia do tórax. Caso esse tubo seja identificado no tórax, poderá ser
eliminada a necessidade de um exame radiográfico contrastado.

A radiografia não é um exame bom para identificar a integridade do diafragma, entretanto,


poderá ser realizada uma tomografia do tórax, em especial em corte transversal para iden-
tificar a sua integridade.

Feito a radiografia (Rx) e a tomografia (TC) que não identificaram a ruptura diafragmática,
poderá ser feita uma radiografia contrastada de trato gastrointestinal superior para
melhor identificação deste conteúdo, caso seja percebida uma região opacificada pelo
contraste, deverá ter fortes suspeitas desta condição de ruptura.

Em pacientes que passaram por lavagem peritoneal diagnóstica (LPD) e tem esse fluido
saído pela drenagem torácica, pode ser feito o diagnóstico de ruptura do diafragma.
Nos casos em que os exames acima não apresentam resultados conclusivos, exames
endoscópicos como a laparoscopia e a toracoscopia, devem apresentar resultados mais
precisos, devido à observação direta da lesão.

Conduta

A conduta neste caso é o reparo do músculo de forma direta, por meio de cirurgia. Um
cuidado grande deve ser tomado quando for colocado o tubo de drenagem torácica para
que não haja ruptura dos conteúdos intestinais herniados.

Ruptura Esofágica

É uma lesão mais rara, pois está relacionada com traumas perfurantes extensos. Mesmo
assim, podem estar relacionados a traumas contusos em região de abdômen superior e o
consequente extravasamento do suco gástrico, gerando rupturas esofágicas. Em geral,
essa ruptura pode se tornar letal se não for identificada e, na maioria das vezes, a ruptura
ocorre em porções distais do esôfago, sendo um dos únicos achados o vazamento deste
conteúdo no mediastino.

Quadro Clínico

O quadro apresentado pelo paciente com esta condição é dor torácica intensa após
trauma em região distal do osso esterno ou em abdômen superior. Essa dor tem uma car-
acterística desproporcional ao tamanho do trauma e pode evoluir para choque. Ainda, o
extravasamento do fluido de forma assintomática pode provocar uma mediastinite e, con-
sequentemente, empiema nesta área.

Diagnóstico

Após a inserção do tubo torácico e, depois que drenar todo o sangue da cavidade pulmo-

26
nar esquerda (local mais comum de apresentação dos achados desta condição) poderá ser
encontrado resíduos alimentares do esôfago e estômago. Associado a isso, a presença de
ar no mediastino pode sugerir esta condição, sendo confirmada com esofagoscopia ou
exames contrastados.

Conduta

O tratamento consiste na drenagem do conteúdo mediastinal extravasado, identificação e


fechamento do local da lesão que, o quanto antes for identificado, melhor será o prog-
nóstico do paciente.

Enfisema Subcutâneo

Essa lesão é uma condição clínica que é encontrada na fase da palpação do exame físico e
é decorrente de uma lesão subjacente como lesão pulmonar, vias aéreas (brônquios) ou
por explosão. Esse extravasamento incomum de ar é fundamental como alerta para o trat-
amento de sua causa base.

Exame Físico

Como já dito anteriormente, o enfisema é o extravasamento de ar em uma região em que


ele não deveria estar, ou seja, fora de sua área original. Durante a palpação do tórax, pode
ser encontrada bolhas de ar que formam saculações no tecido subdermal, em geral sem
uma localização específica.

Conduta

Nesse caso, o suporte ventilatório ao paciente pode ser necessário, inclusive com venti-
lação de pressão positiva (VPP). Caso isso seja necessário, deve ser considerada a toracot-
omia ao lado do enfisema subcutâneo, se desenvolvido o pneumotórax.

Lesões por Esmagamento do Tórax

Esta condição gera uma asfixia traumática pelo aumento súbito da pressão e, os músculos
que auxiliam na respiração não conseguem superar esta força. Ainda, esse peso excessivo
no tórax gera compressão da veia cava superior causando a presença de petéquias nas
seguintes regiões: torso superior, face e braços. Ainda, como consequência grave e, nor-
malmente por compressão prolongada da veia cava superior, o edema cerebral pode ser
encontrado.

Conduta

O tratamento para esta condição é tratando as consequências deste esmagamento, nor-


malmente oferecendo suporte ventilatório e redução do edema cerebral.

27
Fraturas ósseas das costelas, esterno e escápula

Os componentes ósseos da caixa torácica conferem uma proteção sobre os órgãos conti-
dos neste local. A fratura mais comum durante o trauma é a das costelas, em especial da
4ª até a 9ª, pois estas não são protegidas por grandes ossos como a clavícula e a escápula.

Caso haja lesão desses grandes ossos protetores, as estruturas de grandes vasos, nervos
e cabeça estão em grande risco e deve haver uma busca ativa por lesões destas estruturas.
A mortalidade nesse caso aumenta para 35%.

Traumas do esterno e escápula geralmente são decorrentes de traumas diretos e, na fratu-


ra esternal, deve-se averiguar contusão cardíaca e pulmonar associadas, sendo muitas
vezes indicada a reparação cirúrgica desse osso. Deve haver grande atenção em luxação
da articulação esterno-clavicular devido a compressão da veia cava superior, necessitando
de descompressão urgente.

A maioria dos traumas infere em fraturas das costelas 4ª até a 9ª, devido a compressões
anteroposteriores, fato que predispõe a formação de pneumotórax e hemotórax. Em
jovens, existe uma menor predisposição a fraturas múltiplas das costelas que em idosos,
devido a uma maior densidade óssea natural. Condições como a osteoporose podem
predispor a essas inúmeras fraturas e a formação de pneumonia e aumento da mortali-
dade após os trauma em idosos.

Diagnóstico

Durante a palpação do tórax, poderá ser identificado oscilações na parede torácica e dor.
Deverá ser feito uma radiografia de tórax para visualizar outras lesões associadas, inclusive
lesões hepatoesplênicas por fraturas de 10ª a 12ª costelas. O uso da tomografia é funda-
mental para identificar lesões associadas e as próprias fraturas dos ossos do tórax facilitan-
do inclusive a identificação de lesões subclínicas.

Conduta

A analgesia com opióides pode ser considerada nesses pacientes com fratura óssea, utili-
zando-se ou não anestésicos e analgésicos locais, melhorando inclusive a ventilação do
paciente.

28
Realizar a avaliação Sinais de ruptura
Trauma Torácico inicial e classificar Sinais do RX
do diafragma

Sinais de Obstrução Suspeita de Lesão Broncoscopia - Hemotórax


de Via Aérea Traqueobrônquica disgnóstica - Alção intestinais na cavidade toráxica
- Herniação gástrica

Obstrução Parcial Obstrução Total Se positiva Se negativa


Se presentes,
- SNG para identificação em RX.
- Afonia Busca ativa por - TC de tórax.
- Estridores
- Dispnéia outras lesões - LPD identificada no tórax OU
- Dispnéia
- Ausência de sons torácicas. - Endoscopia contrastada
- Triagem intercostal
- Cianose pulmonares
- Triagem intercostal - Tubos torácios para
drenagem.
- Aspiração do - Intubação por vídeo Se for fechado o diagnóstico,
Conteúdo Se fratura clavicular - Cirurgia de urgência encaminhar para cirurgia do
- Suporte ventilatório reparo do músculo.

- Extensão de ombros FLUXOGRAMA 01 - Fluxograma relacionando sinais de obstrução de vias aéreas, lesão
- Posição supina traqueobrônquica e ruptura do diafragma. FONTE: Elaborado pelos próprios autores, 2021.

Tríade de Beck

Realizar a avaliação Sinais de - Tungência Jugular


Trauma Torácico inicial e classificar Tamponamento Cardíaco - Hipotensão
- Abafamento de bulhas

Sinais de Pneumotórax Sinais de Hemotórax Toracotomia ou Pericardiocentese


esterinotomia de subxifóide
emergência

- Aumento do hemitórax - Aumento do diâmetro hemitórax Toracostomia com Hemotórax Maciço


- Expansibilidade reduzida - Expansibilidade reduzida drenagem pleural (> 1500mL de sangue)
- Hipertimpanismo - Som maciço ou submaciço fechada no 5° EIC
- MV diminuido ou abolido - MV abolido na LAA
Toracotomia
anterior de
Pneumotorax Dreno torácico - Drenagem de mais de 1500ml de sangue, ou emergência no
Simples conectado a - Drenagem de 200mL/h por 2 a 4 5° EIC
um aparelho horas consecutivas
selador

FLUXOGRAMA 02 - Fluxograma
Pneumotorax Punção pleural no 5° EIC Toracotomia com drenagem relacionando sinais de pneumo-
tórax, hemotórax e tamponamento
Hipertensivo na linha axilar anterior pleural após descompressão cardíaco. FONTE: Elaborado pelos
próprios autores, 2021.

Pneumotorax Curativo de 3 pontas Drenagem torácica


Aberto distante da ferida

29
Realizar a avaliação Se suspeita de Ruptura
Trauma Torácico Sinais de Tórax Instável
inicial e classificar Traumática da Aorta

- RX de Tórax Geralmente o quadro - Dor Torácica


Se suspeita de Trauma - Dispnéia
- TC com contraste clínico é inespecífico
Contuso Cardíaco - Creptação
helicoidal
- Ecocardiograma - Respiração Paradoxal
Diferentes formas Transesofágico Realizar
de apresentação
Realixar RX de tórax
- Tamponamento - Analgésicos
para a visualização das
Cardíaco - Controle da FC (<80bpm)
Realizar fraturas de arcos costais
- IAM e da PA (entre 60-70mmHg)
- Arritmias - Ressecção e reparto
da aorta lesionada
Monitoramento - Oxigenoterapia adequado
- FAST - Administração de fluídos
nas primeiras 24
- Ecocardiograma criteriosa
horas se o paciente
- ECG (alterações variáveis) -Analgesia
apresentar alterações
eletrocardiográficas FLUXOGRAMA 03 - Fluxograma relacionando sinais de trauma contuso cardíaco, ruptura traumática da aorta e tórax instável.
FONTE: Elaborado pelos próprios autores, 2021.

Realizar a avaliação Se presença de Sinais de Parada


Trauma Torácico inicial e classificar Pneumotórax Cardíaca Traumática

- Perda de consciência
Se suspeita de Enfisema Fraturas Lesão por - Ausência de pulso
Ruptura Esofágica subcutâneo ósseas esmagamento - FV / Assistólia
torácico
Sugere presença de
- Esofagoscopia ar extrapulmonar Realizar: - Iniciar o protocolo ABCDE
diagnóstica - RX de tórax e ressucitação cardiopulmonar
- Aspiração de conteúdo Não necessita de tra- - TC de tórax - MOV
tamento específico; Tratar
mediastinal com tubo - Solicitar ECG e Ecocardiograma
lesões subjacentes; VPP;
torácico Considerar toracotomia. o mais rápido possível

Suspeitar quando houver:


- Analgesia local e sistêmica Obs: Sempre buscar por lesões em: - Petéquias em MMSS, face e torso
- Considerar anestesia local - Compressão VCS - Edema cerebral
- Se necessário, intervenção - Contusão cardiopulmonar
FLUXOGRAMA 04 - Fluxograma relacionando sinais de
cirúrgica - Ruptura hepatoespiênica ruptura esofágica, pneumotórax e parada cardíaca traumática
FONTE: Elaborado pelos próprios autores, 2021.

Autores, revisores e orientadores:

Autor: Thiago Praça Brasil


Co-autor: João Pedro Andrade Augusto
Revisor: Sarah Ferrer Augusto Gonçalves
Orientador(a): José Antônio Carlos Otaviano David Morano.

Grupo de Estudos de Anatomia Aplicada à Saúde (GEAAS).

Referências
ATLS - Advanced Trauma Life Support Student Course Manual. American College of Surgeons. 10a. Ed, 2018.

30
CAPÍTULO 4:

Trauma Abdominal

04
Capítulo 4: Trauma Abdominal

Introdução

O abdome é considerado uma das regiões mais frequentemente afetadas e uma das
causas mais comuns de morte nos doentes politraumatizados. O trauma abdominal pode
levar à morte imediata por hemorragia e choque ou posteriormente por infecção. Uma
atenção maior na avaliação da circulação é importante, para um possível diagnóstico de
hemorragia intra-abdominal em pacientes que sofreram trauma abdominal fechado. O
mecanismo de lesão, localização da lesão e estado hemodinâmico do paciente determi-
nará a prioridade e o melhor método de abordagem. A avaliação do paciente é frequente-
mente comprometida por intoxicação alcoólica, uso de drogas ilícitas, lesões no cérebro ou
na medula espinhal e lesão de estruturas adjacentes, como as costelas e coluna. Perda sig-
nificativa de sangue pode estar presente na cavidade abdominal sem uma mudança
dramática na aparência externa ou dimensões do abdômen e sem sinais óbvios de
irritação peritoneal. Qualquer paciente que sofreu lesão no dorso por um golpe direto,
desaceleração, explosão ou uma lesão penetrante deve ser considerado como tendo uma
lesão de víscera abdominal, lesão vascular ou pélvica até provar o contrário.

Mecanismos de lesão

Contusão

É um golpe direto, que pode causar compressão e lesões por esmagamento nas vísceras
abdominopélvicas e ossos pélvicos. Em pacientes que sofreram trauma contuso, os
órgãos mais frequentemente lesados são o baço (40% a 55%), o fígado (35% a 45%) e o
intestino delgado (5% a 10%). Embora os dispositivos de restrição reduzam a incidência de
muitas outras lesões graves, eles estão associados a padrões específicos de lesão.

Penetrante

São ferimentos por arma branca, arma de fogo de baixa energia, que dilaceram e rasgam
os tecidos, e ferimentos por arma de fogo de alta energia que transferem mais energia
cinética, causando aumento do dano ao redor da trilha do projétil devido à cavitação tem-
porária. Os ferimentos por arma branca atravessam estruturas abdominais adjacentes e
mais comumente envolvem o fígado (40%), intestino delgado (30%), diafragma (20%) e
cólon (15%). Já os ferimentos por arma de fogo mais comumente causam lesões no intesti-
no delgado (50%), cólon (40%), fígado (30%) e estruturas vasculares abdominais (25%). O
tipo de arma, a velocidade do cano e o tipo de munição são determinantes importantes do
grau de lesão do tecido.

Explosão

A lesão por explosão ocorre por meio de vários mecanismos, incluindo feridas por frag-
mentos penetrantes e lesões contusas devido o paciente ser lançado ou atingido por pro-
jéteis. Pacientes próximos à fonte da explosão podem sofrer lesões adicionais nas mem-
branas timpânicas, pulmões e intestinos relacionados à sobrepressão da explosão, essas
lesões podem ter apresentação tardia.
32
Como atender o paciente vítima de trauma abdominal?

Exame Físico: Inspeção, Auscultação, Percussão e Palpação

O exame abdominal é realizado em uma sequência sistemática: inspeção, ausculta, per-


cussão e palpação. Isso é seguido pelo exame da pelve e das nádegas, bem como; exames
uretral, perineal e, se indicado, retal e vaginal. Na maioria das circunstâncias, o paciente
deve estar totalmente despido para permitir uma inspeção completa. Durante a inspeção,
examinar toda região do abdômen, bem como a parte inferior do tórax e períneo, procu-
rando por escoriações, contusões, lacerações, feridas penetrantes, corpos estranhos em-
palados, inchaços e hematomas. Atenção para sinais de lesões por dispositivos de segu-
rança e as dobras cutâneas em pacientes obesos que podem mascarar lesões penetrantes
e aumentar a dificuldade de avaliação do abdome e da pelve. Embora a ausculta seja
necessária, a presença ou ausência de ruídos intestinais não se correlaciona necessaria-
mente com lesão, e a capacidade de ouvir ruídos intestinais pode ser comprometida em
um pronto-socorro barulhento. A percussão causa leve movimento do peritônio e pode
provocar sinais de irritação peritoneal. Quando a sensibilidade de rebote estiver presente,
não procure evidências adicionais de irritação, pois pode causar ao paciente mais dor
desnecessária. A proteção voluntária pelo paciente pode tornar o exame abdominal não
confiável. Em contraste, a proteção muscular involuntária é um sinal confiável de irritação
peritoneal. A palpação pode provocar e distinguir sensibilidade superficial e sensibilidade
profunda. Na conclusão do exame físico rápido, cubra o paciente com cobertores aqueci-
dos para ajudar a prevenir a hipotermia.

Exames complementares:

Focussed Assessment Sonogra-


phy Trauma (FAST): O FAST
quando realizado por indivídu-
os treinados é um estudo
rápido, confiável e reprodutível,
indicado em pacientes com
trauma fechado instáveis
hemodinamicamente. Identifica
a presença de fluido intraperito-
neal, incluindo quatro regiões: o
saco pericárdico, a fossa hepa-
torrenal, a fossa esplenorrenal e
a pelve ou Fundo de saco de
Douglas. Depois de fazer uma
avaliação inicial, os médicos
podem repetir a avalição várias
vezes para detectar hemo-
peritônio progressivo.

33
Lavagem Peritoneal Diagnóstica (LPD):
Também está indicado em pacientes com
trauma fechado instáveis hemodinamica-
mente. É utilizado para identificar hemor-
ragia, requer a descompressão gástrica e
urinária para prevenção de complicações.
Em ambientes onde o FAST não está dis-
ponível tal recurso está indicado, porém
raramente é usado porque é invasivo e
requer experiência cirúrgica. Vale ressaltar
que, o FAST tem como vantagem permitir
a localização da maior parte do líquido
livre, e permitir ver estruturas da pleura e
do mediastino, além de ser menos inva-
sivo. Já a LPD tem a vantagem de distinguir se o conteúdo líquido é sangue ou outros líqui-
dos, como o entérico. Atualmente, o FAST é mais utilizado, pela sua maior disponibilidade
em hospitais. As contraindicações relativas ao procedimento incluem cirurgias abdominais
anteriores, obesidade mórbida, cirrose avançada e coagulopatia pré-existente. A aspiração
de conteúdo gastrointestinal, fibras vegetais, bile ou de 10 cc ou mais de sangue em paci-
entes hemodinamicamente instáveis requer laparotomia.

Tomografia computadorizada: A TC é um método diagnóstico que requer o transporte do


paciente para o scanner, a administração de contraste intravenoso e a exposição à
radiação. Por ser demorado deve ser usado apenas em pacientes hemodinamicamente
estáveis, nos quais não há indicação aparente para uma laparotomia de emergência. As
tomografias computadorizadas fornecem informações relativas à lesão e extensão de um
órgão específico e podem diagnosticar lesões de órgão retroperitoneal e pélvico que são
difíceis de avaliar com um exame físico, FAST e a lavagem peritoneal diagnóstica.

Outros estudos:

Laparoscopia diagnóstica, toracoscopia e estudos contratados (uretrografia, cistografia,


pielograma intravenoso e estudos de contraste gastrointestinal), podem ser utilizados no
diagnóstico de lesões abdominais.

Manejo do trauma abdominal

Sonda gástrica e cateter urinário.

A sonda gástrica é utilizada com o objetivo de alívio da distensão gástrica aguda e des-
compressão do estômago antes de realizar o lavado peritoneal diagnóstico (se necessário),
podem reduzir a incidência de aspiração, porém podem desencadear vômito em um paci-
ente com reflexo de vômito ativo. A presença de sangue no conteúdo gástrico sugere
lesão do esôfago ou do trato gastrointestinal superior, caso as fontes nasofaríngeas e/ou
orofaríngeas sejam excluídas. Se um paciente tiver fraturas faciais graves ou suspeita de
fratura de base de crânio, a sonda gástrica deve ser inserida pela boca para evitar a pas-
sagem através da lâmina cribiforme para o cérebro. Já o cateter urinário é utilizado para

34
aliviar a retenção urinária, monitorar o débito urinário e descomprimir a bexiga antes de
realizar o lavado peritoneal diagnóstico. Não coloque um cateter urinário em um paciente
com um hematoma perineal ou sangue no meato uretral antes de uma avaliação definiti-
va para lesão uretral.

Fluxograma de atendimento do trauma abdominal

Autores, revisores e orientadores:

Autor(a): José Edmilton Felix da Silva Junior


Autor(a): Ana Cássia Gonzalez dos Santos Estrela
Revisor(a): Mariana Roberta Santos de Melo
Orientador(a): Lara Cardos

Liga Acadêmica de Radiologia da Bahia – LARB


.

Referências

AMERICAN COLLEGE OF SURGIONS COMMITTEE ON TRAUMA. Advanced Trauma Life Suport – ATLS. 10
ed. 2018.

35
CAPÍTULO 5:

Queimaduras

04
Capítulo 5: Queimaduras

Introdução

De acordo com a Sociedade Brasileira de Queimaduras, a cada ano, cerca de um milhão de


casos de queimaduras acontecem. Esses casos têm etiologias diferentes e grande parte
deles estão entre os traumas mais graves não só pelos motivos que podem levar o paci-
ente à morte, mas também, as possíveis sequelas que acompanharão o paciente por toda
a vida.

As queimaduras são lesões causadas por agentes que produzem calor a ponto de danificar
os tecidos corporais e causar morte celular. Vale lembrar que a pele é o maior órgão do
corpo humano, visto que recobre o mesmo por completo protegendo contra o atrito,
perda de água, invasão de microorganismos e da radiação ultravioleta. Sabendo disso,
consegue-se entender e prever a complexidade do atendimento de uma vítima de quei-
madura já que, a depender do grau e extensão da mesma, o paciente ficará suscetível à
desidratação, infecções, dentre outras complicações. Compete, portanto, ao profissional
da saúde saber diagnosticar o tipo, a profundidade, a superfície corporal queimada, o
manejo e seus respectivos tratamentos.

Como atender o paciente vítima de queimaduras?

Tendo em vista que a queimadura é considerada um trauma, o atendimento à vítima de


queimadura seguirá todos os princípios do ATLS. Nesse contexto, vale ressaltar que a via
aérea continua sendo a prioridade devendo atentar-se a:

- Sinais de obstrução da via aérea


superior decorrente do edema
causado pela queimadura que
devem ser avaliados com cautela:
rouquidão/estridor, tosse, dispneia,
eritema e edema de orofaringe.
Além disso, deve-se suspeitar de
queimadura de via aérea quando: o
paciente ficou confinado no local
do incêndio, queimaduras em
face/região cervical, chamusca-
mento dos cílios e vibrissas nasais,
presença de expectoração car-
bonácea, níveis séricos de car-
boxi-hemoglobina >10%. Diante do
risco de insuficiência respiratória
nesses casos, deve-se proceder Figura 1. Queimadura em face (ATLS 10ª ed., 2018).
com intubação orotraqueal pre-
coce.

37
Classificação

Em relação ao tipo das queimaduras, elas podem ser divididas em: térmicas, químicas,
elétricas, por radiação e inalatória. As térmicas apresentam maior incidência: chamas de
fogo, água fervendo, objetos quentes são exemplos de causas que podem levar a este
tipo de queimadura. Já as queimaduras químicas são provocadas por substâncias químicas
que, em excesso e a depender da duração, lesionam não só a superfície, como também
órgãos e tecidos internos. Quanto às elétricas, estas ocorrem quando há corrente elétrica
através do corpo, de modo que se iniciam como térmicas e em seguida apresentam um
local de entrada (ponto de contato com a corrente elétrica) e um local de saída (por onde
a corrente sai). A radiação também pode gerar danos teciduais e um exemplo clássico
dessa queimadura é a radiação solar. Por fim, as queimaduras por inalação se referem a
gases que lesionam tecidos quando inalados.

Para saber como tratar e conduzir o paciente vítima de queimadura é fundamental que
seja realizada a classificação quanto ao tipo desta queimadura:

1º Grau: Limita-se à epiderme, com aparecimento de eritema e dor moderada, sem bolhas
ou comprometimento dos anexos da pele (para ajudar a lembrar, esta é a famosa quei-
madura de sol!).

2º Grau: A principal característica aqui é a presença de bolhas! Além disso, as queimaduras


de 2º grau são divididas em superficiais e profundas. As superficiais comprometem toda a
epiderme até a parte superficial da derme ou derme papilar que corresponde às papilas
dérmicas; são muito dolorosas, têm bolhas e apresentam uma superfície rosada e úmida.
Já as profundas acometem a completude da epiderme e da derme reticular o que faz com
que, associado ao surgimento das bolhas, a pele tenda a ficar mais seca, pálida e
mosqueada, havendo comprometimento vascular na maioria dos casos.

3º Grau: Estas são queimaduras da espessura total da pele, pois atingem a derme, epi-
derme e hipoderme, podendo acometer músculos e ossos. Uma característica relevante é
que geralmente não são dolorosas (devido a lesão direta dos receptores nervosos), além
de serem endurecidas com aparência de couro “branco nacarado”. Vale ressaltar que,
nenhum paciente terá apenas queimaduras de 3º grau havendo queimaduras de 1º e 2º
graus associadas, portanto, o paciente sentirá dor nesses locais de queimaduras, mas não
sentirá dor no local específico da queimadura de 3º grau.
Figura 2. Em A, nota-se quei-
madura de 2º grau superficial
onde é possível perceber a
integridade dos folículos
pilosos. Em B, uma queimad-
ura de 2º grau profundo. E
em C, uma queimadura de 3º
grau (OLIVEIRA & FERREIRA,
2017).

38
Diante de uma queimadura de 2º e 3º grau é fundamental que seja calculada a superfície
corporal queimada (SCQ) para que já seja iniciada a reposição volêmica adequada ao paci-
ente (lembre-se que a perda da pele culmina na perda de água pelo corpo e, consequen-
temente, potencial desidratação do paciente). O principal método para o cálculo da SCQ
é o de Wallace ou “Regra dos 9” conforme apresentada na imagem:

Figura 3. Regra dos 9 (Wallace). No adulto:


cabeça e pescoço 9% (4,5% anterior e 4,5%
posterior); membro superior cada um 9%
(4,5% anterior e 4,5% posterior); tronco 36%
(18% anterior e 18% posterior); membro infe-
rior cada um 18% (9% anterior e 9% posteri-
or); períneo e genitália: 1%(ATLS 10ª ed.,
2018).

Cuidados gerais e tratamento

A depender do tipo de queimadura, um cuidado e tratamento específico deve ser realiza-


do. Se de 1º grau, não é necessário tratamento específico, mas sim analgesia adequada
para manejo do quadro álgico, hidratação tópica e via oral.

Ao se deparar com queimaduras de 2º e 3º grau, primeiramente deve-se avaliar a porcent-


agem de superfície corporal queimada e adequada reposição volêmica; em seguida se há
ou não necessidade de transferência do paciente para um centro especializado em quei-
mados; e, realizar os cuidados específicos para a queimadura.

Após o cálculo da SCQ deve-se utilizar a fórmula de Parkland para verificar o volume ade-
quado para a ressuscitação volêmica e, é importante lembrar que o fluido de escolha para
essa conduta é o ringer lactato aquecido. Abaixo, observe que a fórmula de Parkland usa o
valor de 2ml na 10ªed. do ATLS e não mais 4ml, exceto em casos de queimadura elétrica
que, devido ao risco de rabdomiólise e insuficiência renal aguda recomenda-se calcular
com 4ml. O volume encontrado após o cálculo deve ser infundido em 24h, sendo: metade
do volume total nas primeiras 8h e a outra metade nas próximas 16h, incluindo no valor
que será administrado aquilo que já foi infundido no pré-hospitalar.

39
Tabela 1. Ressucitação volêmica por tipo de queimadura, idade e Fórmula de Parkland.

Os cuidados a serem tomados com as queimaduras de 2 e 3º grau, como dito, são específi-
cos. Primeiramente, realiza-se o desbridamento com retirada de corpo estranho e tecidos
desvitalizados, bem como deve ser feita a limpeza da ferida com água e clorexidina
degermante 2%. Vale ressaltar que, as bolhas e peles desvitalizadas precisam ser removi-
das completamente, pois as bolhas aumentam a probabilidade de infecção e diminuem a
superfície de contato com os antibióticos tópicos. Após essas etapas, deve ser feito um
curativo oclusivo a ser trocado diariamente ou sempre que sujo, o qual visa proteger a área
lesada, reduzir a perda calórica que ocorre por evaporação, bem como reduzir a coloni-
zação bacteriana e fúngica

Cabe aqui ressaltar um ponto importante que é sobre o uso de antibióticos! Lembre-se
que os pacientes vítimas de queimadura perdem sua principal barreira mecânica contra os
estressores do meio, bem como sofrem intensa resposta metabólica e humoral decorrente
do trauma, o que faz com que esse paciente seja considerado um imunossuprimido.
Partindo desse ponto, já se prevê que estes pacientes podem evoluir com infecções
graves que precisarão de uso de antibiótico, logo, por isso não se deve usar antibiótico
profilático via oral ou venoso para esses pacientes para que não seja gerada resistência
antimicrobiana. No caso de queimaduras extensas orienta-se o uso de antibiótico tópico
como sulfadiazina ou mafenide.

Principais complicações

Diante do que foi apresentado até aqui acerca das peculiaridades do paciente vítima de
queimadura, é de se esperar que o mesmo sofra com algumas complicações deste trauma.
A insuficiência respiratória é uma delas e ocorre quando queimaduras de 3º grau atingem
a circunferência torácica e fazendo aquele aspecto de “couro nacarado” restringindo a
expansão torácica e levando à insuficiência respiratória; neste caso, deve-se realizar a
escarotomia da lesão, ou seja, uma incisão da área queimada até o subcutâneo. Com isso,
entramos em uma outra complicação que é a síndrome compartimental que resulta de
queimaduras de 2º e 3º graus circunferenciais que evoluem impedindo a elasticidade da
pele, o que também tem como tratamento a escarotomia.

Outra complicação é a insuficiência renal que, como já citada, pode ocorrer devido a
desidratação dos pacientes com queimaduras extensas, porém, deve-se atentar a esta

40
a esta complicação sobretudo nos pacientes com queimadura elétrica devido à extensa
lesão muscular, progredindo para rabdomiólise. Além de atentar para o cálculo diferencia-
do a partir da fórmula de Parkland, é fundamental manter um débito urinário de 100ml/h
em adultos e observar a coloração da urina, pois caso a mesma esteja escura a reposição
volêmica deve ser ainda mais agressiva.

Fluxograma de Atendimento de Queimaduras

Vítima de ABCDE: Sinais de


queimadura de via aérea? Classificação Tipo
Queimadura
Se sim, IOT precoce.

Térmicas;
Superfície Profundidade Químicas; Elétricas;
Radiação; Inalatória

1º Grau
Regra dos 9 +
2º Grau Tratamento
Fórmula de Parkland
3º Grau

Ressucitação volêmica;
Analgesia; Limpeza;
Debridamento (exceto 1º grau);
Curativo; Avaliar se ATB tópico

Autores, revisores e orientadores:

Autora externa à Liga: Aissa Siqueira de Morais


Autor(a): Daniel de Sabóia Oliveira
Revisor(a): Ana Luiza Antony Gomes de Matos da Costa e Silva
Orientador(a): Lair da Silva Gonçalves

Liga de Psiquiatria do Distrito Federal – LIPSI – DF

Referências

American College of Surgeons; ATLS : Advanced Trauma Life Support. 10ª ed. Chicago, 2018. p. 148-167.
OLIVEIRA, AF; FERREIRA, LM. Procedimentos no atendimento para queimaduras nas mãos na fase aguda.
Revista Brasileira Cirurgia Plástica.2017;32(2):245-251
BRUXEL, C.L. Manejo Clínico do Paciente Queimado. 2018.
LANHAM, J.S. Outpatient Burn Care: Prevention and Treatment.
Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica. Queimaduras: Diagnóstico e Tratamento Inicial. 2008.
VALE, E.C.S. Primeiro atendimento em queimaduras: a abordagem do dermatologista. Minas Gerais, 2005.
Ministério da Saúde. Cartilha para tratamento de emergência das queimaduras

41
CAPÍTULO 6:

Trauma de
Extremidades
Capítulo 6: Trauma de Extremidades

Introdução

Os traumas de extremidades são as lesões mais frequentes em vítimas de traumas e não


costumam representar risco à vida do paciente. No entanto, a sua cinética e o seu me-
canismo podem estar associados com lesões graves e potencialmente fatais, como trau-
mas torácicos e abdominais, hemorragias intensas e síndrome do esmagamento.

Lesões de extremidades acometem o sistema musculoesquelético. Ele é composto pelo


esqueleto ósseo axial e apendicular, pelos músculos esqueléticos de ação voluntária, por
tendões que conectam músculo e osso e por ligamentos entre ossos.

Traumas nos membros inferiores e superiores estão comumente relacionados com


acidentes de trânsito, quedas, desabamentos, acidente de trabalho e agressões.

Por ser um fenômeno frequente na prática clínica, principalmente no atendimento pré-


hospitalar, é de grande importância que o médico conheça a cinética do trauma e a con-
duta adequada diante dessas lesões.

Como atender o paciente vítima de trauma de extremidade?

Os traumas de extremidades, muitas vezes, são os que mais chamam atenção do socorris-
ta, podem ser desafiadores à equipe, não devem ser ignorados e merecem atenção após
a estabilização inicial do paciente. No entanto, eles não costumam apresentar ameaça à
vida do paciente. Dessa forma, como em toda vítima de trauma, o atendimento inicial deve
seguir a ordem ABCDE de prioridade de reanimação. Em contexto pré-hospitalar deve-se
atentar para contenção de hemorragias extremas seguindo o “XABCDE”, mas no contexto
do intra-hospitalar seguimos o ATLS.

Inicialmente, deve ser garantida a segurança da cena, conferindo se o paciente está


exposto a algum risco, seja ele químico, físico ou de qualquer natureza, e assegurando o
uso adequado de equipamentos de proteção individual (EPIs) pela equipe.

Em seguida, deve-se garantir a estabilização inicial do paciente, controlando hemorragias


exsanguinantes, garantindo uma via aérea pérvia, conferindo ventilação adequada e bus-
cando por sinais de choque ou disfunção neurológica.
Depois dessas etapas, é possível dar continuidade ao ate
ndimento com a avaliação secundária. Nesse momento, deve ser coletada a história clínica
do paciente e do trauma e realizado o exame físico mais detalhado, como foco na lesão
apresentada pelo paciente.

Manejo e Classificação do Trauma de Extremidades

Avaliação Primária

Durante a avaliação primária, é necessário reconhecer injúrias de extremidades potencial-

43
mente ameaçadoras à vida do paciente e buscar por uma possível associação desses trau-
mas a lesões torácicas ou abdominais.

Dentre as situações de traumas de extremidade, as que configuram risco à vida do paci-


ente e exigem maior atenção inicialmente são: hemorragias, fratura bilateral de fêmur e
síndrome do esmagamento, também conhecida como rabdomiólise traumática.

É importante ressaltar que em suspeita de choque decorrente de fratura, deve-se faze


zr uso de complementos à avaliação primária, que incluem a imobilização imediata das
fraturas e a radiografia.

Hemorragia

A hemorragia é uma das mais frequentes complicações do trauma de extremidades,


sendo a segunda principal causa de morte em vítimas de trauma, podendo ocorrer através
de um ferimento aberto ou para o interior dos tecidos (em uma situação de trauma contu-
so).

As hemorragias devem ser abordadas ainda no contexto pré-hospitalar, visto que elas re-
presentam um risco à vida do paciente e à viabilidade do membro lesado.

O manejo para o controle das hemorragias se


inicia com a compressão manual do ferimento
utilizando gazes. Se o sangramento persistir, são
aplicadas novas gazes em cima das anteriores
sem retirá-las. Além disso, pode ser usado um
curativo compressivo no local com gazes envol-
tas por uma bandagem elástica. Em hemorragias
persistentes, a compressão da artéria proximal ao
ferimento deve ser realizada. Caso essas medidas
não sejam eficazes para conter o sangramento,
deve ser considerada a aplicação de um torni-
quete.
Figura 1 Uso do torniquete para controle
de hemorragia.

O torniquete deve ser apertado até cessar o fluxo de sangue para o ferimento. É
necessário documentar o horário de aplicação, de modo a garantir uma permanência de
menor tempo possível, não ultrapassando 120 a 150 minutos, visto que os riscos de perda
de viabilidade do membro aumentam com o tempo.

Compressão manual do Sem resolução


Aplicar novas gazes em Sem resolução
Compressão da artéria
ferimento cima das anteriores proximal ao ferimento

Sem resolução

Prosseguir com Sangramento


atendimento interrompido Torriquete
FLUXOGRAMA 1. Manejo da Hemorragia

44
Fratura Bilateral de Fêmur

Pacientes que sofreram fraturas bilaterais de fêmur apresentam risco significativo de com-
plicações e morte. Essas lesões são indicativas de mecanismos de trauma de energia de
grande intensidade, de modo que pode acometer outras regiões e apresentar lesões asso-
ciadas.

Dessa forma, esses indivíduos apresentam maior risco de intensa perda de sangue, lesões
associadas, complicações pulmonares, falência de múltiplos órgãos e morte. Esses pacien-
tes devem ser manejados inicialmente como as vítimas de fratura unilateral e transferidos
de forma precoce para um atendimento cirúrgico especializado.

Síndrome de Esmagamento (Rabdomiólise Traumática)

A síndrome de esmagamento, ou rabdomiólise traumática, é uma condição clínica sistêmi-


ca e potencialmente fatal se não for tratada prontamente. Ela é ocasionada por dano mus-
cular, podendo evoluir para insuficiência renal aguda e choque hipovolêmico. Essa
condição está presente em situações de desabamento, acidentes com objetos pesados ou
colisões automotivas, com vítimas que sofreram lesão por compressão significativa em
grande massa muscular, como coxa e panturrilha.

A tríade clássica da síndrome de esmagamento consiste em compressão prolongada,


lesão de massa muscular e comprometimento circulatório local. A compressão significativa
da massa muscular provoca lesão e isquemia na região, o que leva à necrose tecidual.

Nessa situação, há destruição do sarcolema com liberação principalmente de mioglobina


e potássio. Quando a área é descomprimida e reperfundida, esses componentes entram
na corrente sanguínea. A mioglobina produz uma urina escura cor de âmbar, pela filtração
nos rins, quadro que evolui com lesão renal aguda. Já o potássio liberado pode causar hip-
ercalemia e, junto com a situação de rabdomiólise, pode desencadear acidose metabólica.
O choque hipovolêmico é a causa mais comum de morte nas primeiras 48 horas, seguida
pela insuficiência renal consequente ao baixo fluxo glomerular e à obstrução tubular por
mioglobina.

Em casos de a dosagem de mioglobina na urina não estar disponível, níveis séricos de


creatina quinase (CK) iguais ou superiores a 10.000 U/L indicam rabdomiólise, sendo rele-
vantes na abordagem do paciente com história sugestiva da síndrome.

O manejo dessa condição se dá pela reposição volêmica precoce e agressiva, na intenção


de prevenir insuficiência renal em pacientes com rabdomiólise. Deve ser feita infusão de
líquidos com solução salina a 0,9% em uma velocidade de até 1.500 ml por hora em um
primeiro momento, podendo ser reduzida a 500 ml por hora, alternando com soro glicosa-
do a 5% durante o transporte da vítima. Além disso, são recomendados Manitol (10 g a
cada litro infundido) e Bicarbonato de Sódio (50 mEq por litro infundido) para diminuir a
incidência de dano renal devido à ação da mioglobina. Vale ressaltar que a reposição
volêmica com Ringer Lactato está contraindicada em situações de síndrome de esmaga-
mento, visto que pode agravar o quadro de hipercalemia.

45
Durante o atendimento da vítima, para corrigir os níveis séricos elevados de potássio,
devem ser tomadas medidas como inalação de beta-agonistas de ação rápida, como o
salbutamol, administração intravenosa de glicoinsulina e bicarbonato de sódio.

Complicações da Rabdomiólise Traumática

Hipovolemia

Hipercalemia

Insuficiência Renal Aguda

TAB 1. Principais complicações da síndrome de esmagamento

Tratamento da Rabdomiólise Traumática

Hidratação vigorosa. SF 0,9%, 1.500 mL/h

Bicarbonato de Sódio. 50 mEq a cada litro infundido

Manitol. 10g a cada litro infundido

TAB 2. Princípios do tratamento da síndrome de esmagamento

Avaliação Secundária

Após a estabilização do paciente, com o afastamento de situações ameaçadoras à vida,


durante a avaliação primária, seguindo a ordem de prioridade de reanimação da vítima,
parte-se para avaliação secundária.Durante a avaliação secundária, será dada maior
atenção aos traumas de extremidade, buscando entender o mecanismo de lesão e a gravi-
dade do acometimento do membro lesado, sendo esta avaliação composta principal-
mente por coleta da história “AMPLA” e exame físico.

Nesse momento, devem ser identificadas as injúrias que, apesar de não trazerem risco imi-
nente à vida, ameaçam a viabilidade do membro afetado, como fraturas expostas e am-
putações. Além da anamnese e exame físico, a radiografia é um importante exame com-
plementar que pode ser feito durante esta fase da avaliação, ajudando na diferenciação
das possíveis lesões.

A coleta da história é essencial para o entendimento da cinemática do trauma. Ela deve ser
colhida com a própria vítima, com as testemunhas da cena ou acompanhantes e com a
equipe de atendimento pré-hospitalar. A anamnese deve abordar principalmente o me-
canismo do trauma, o ambiente, os fatores predisponentes da vítima e acontecimentos do
atendimento pré- hospitalar.

- Mecanismo do Trauma: seu conhecimento é importante para a suspeição e identificação


de lesões que não são imediatamente aparentes.

46
- Ambiente: relevante para identificar se a vítima corre risco de infecções, informação
importante para avaliar a necessidade de fornecimento precoce de antibioticoterapia.
Além disso, em um acidente automobilístico deve ser questionada a presença de vidro no
chão e a temperatura do ambiente (por exemplo em situações de explosão).

- Fatores Predisponentes: indicam a condição do paciente antes do trauma. Deve ser colhi-
da uma história “AMPLA”, obtendo informações sobre doenças prévias, problemas emo-
cionais, uso de álcool e drogas, alergias, entre outras.

- Acontecimentos Pré-Hospitalares: devem ser documentadas todas as informações do


pré-hospitalar, como horário do trauma, posição em que o paciente foi encontrado, esti-
mativa de sangramento no local, função neurológica do paciente, horário de aplicação de
torniquete, dentre outras.

O exame físico deve ser executado de modo a fazer uma


revisão sistemática de todo o corpo do paciente, no
intuito de não passar despercebida nenhuma injúria.
Para realizar um bom exame físico, é necessário despir o
paciente por inteiro. A avaliação do trauma muscu-
loesquelético deve incluir a observação e a palpação,
tendo como componentes a pele, a função neuromus-
cular, a perfusão e a integridade de ossos e ligamentos. FIGURA 2 Mecanismo de trauma

Além disso, nessa fase é de extrema relevância a avaliação do membro traumatizado,


devendo sempre fazer comparações com o sadio.

Inspeção: Buscar por deformidades, edemas e lacerações.

Palpação: Avaliar a presença de áreas de dor, hipo/hipestesia ou crepitação (não se deve


buscar ativamente palpar crepitações em membros fraturados, pois pode proporcionar
bastante dor ao paciente e agravo ao dano às partes moles, sem benefícios à conduta
inicial).

Função Neurológica: Testar a motricidade e a sensibilidade das extremidades. Sendo


importante palpar a extremidade e perguntar se o paciente sente o toque em regiões
proximais e distais à lesão.

Perfusão: Avaliar a temperatura e coloração do membro afetado, palpar os pulsos distais


(ulnar, radial, pedioso e tibial posterior) e conferir o tempo de enchimento capilar nas
extremidades.

Traumas de extremidade que ameaçam a funcionalidade do membro

SÍNDROME COMPARTIMENTAL

Ocorre por aumento de pressão de um compartimento anatômico músculo-fascial, evolu-


indo com isquemia e necrose. Um compartimento anatômico é delimitado por fáscias e

47
e ossos, componentes pouco distensíveis, portanto há pouco
espaço para expansão do tecido. A síndrome compartimental
pode ocorrer em situações de sangramento ou edema que
causam elevação na pressão compartimental, podendo atingir
níveis maiores que a pressão capilar, o que leva a diminuição
ou até cessação da perfusão.

As causas mais comuns da síndrome compartimental são:


fraturas (tíbia, em membros inferiores, e ulna e rádio, em
membros superiores), contusões graves ou lesões por esmag-
amento e lesão de reperfusão após dano vascular e reparo. FIGURA 3 Síndrome Compartimental

O quadro clínico é marcado por dor desproporcional ao trauma sofrido que não cessa com
a imobilização, podendo ter caráter pulsátil, e parestesia ou sensibilidade alterada distal à
região afetada.

É importante ressaltar que a ausência de pulso distal palpável no membro afetado é um


achado incomum ou tardio, não sendo necessário para o diagnóstico de síndrome com-
partimental. O tempo de enchimento capilar também não é confiável para o diagnóstico.
É muito comum a associação entre fratura e síndrome compartimental. Dessa forma, é
importante que o socorrista fique atento aos sinais do exame físico da vítima para garantir
o diagnóstico correto e providenciar o tratamento o mais rápido possível. O atraso no
reconhecimento e tratamento pode resultar em déficit neurológico, isquemia, necrose
muscular, infecção e possível amputação.

O tratamento para a síndrome compartimental é cirúrgico e consiste em fasciotomia des-


compressiva, com o intuito de diminuir a pressão no membro e propiciar o retorno da per-
fusão adequada. O atraso em realizar a fasciotomia descompressiva pode ocasionar mio-
globinúria, devido ao infarto muscular, o que pode prejudicar a função renal.

AMPUTAÇÕES TRAUMÁTICAS

A amputação é uma forma severa de fratura exposta que resulta na perda de uma extremi-
dade completa, parte dela ou apenas dos tecidos moles distais (avulsão). É um evento
traumático física e emocionalmente para o paciente.

Diante da gravidade da lesão, é importante que o tratamento seja realizado rapidamente.


O passo inicial no manejo das amputações traumáticas deve ser o controle da hemorragia.
Em muitas situações, os pacientes podem necessitar da aplicação de um torniquete, lem-
brando sempre de documentar o horário de aplicação e solicitar o atendimento imediato
por um cirurgião.
Após a estabilização do paciente, a extremidade amputa-
da deve ser procurada no cenário. A extremidade deve
ser limpa com irrigação de solução isotônica (Ringer
lactato), envolvida em gaze estéril úmida e colocada em
um saco plástico impermeável para ser transportada em
um recipiente com gelo.
FIGURA 4 Amputação completa de perna direita
48
É necessário tomar cuidado para não congelar a extremidade amputada, visto que a
intenção é apenas resfriá-la para aumentar o tempo de viabilidade do reimplante.

Não se deve atrasar o transporte do paciente caso não seja possível encontrar o membro
amputado. Nessas situações, o paciente deve ser encaminhado para o atendimento hos-
pitalar e alguém capacitado deve ficar na cena para buscar a extremidade.

Apesar da importância de se considerar o reimplante do membro amputado, também


devem ser levadas em consideração as outras lesões do paciente. Um paciente com múlti-
plas injúrias que necessita de ressuscitação intensiva e/ou cirurgia de emergência não é
candidato para implante.

O procedimento costuma ser realizado em vítimas de trauma de extremidade isolada.


Além disso, outros fatores que influenciam na chance de sucesso dessa abordagem
incluem: a idade do paciente, seus hábitos de vida (fumantes costumam ter menores índi-
ces de sucesso), o membro que foi amputado (membros inferiores têm menor chance de
reimplante bem-sucedido) e a experiência da equipe de saúde local.

Princípios de imobilização

As imobilizações costumam ser realizadas durante a avaliação secundária da vítima, exceto


em situações de lesões que trazem risco à vida, e devem ser todas realizadas antes do
transporte do paciente. Após a imobilização de uma extremidade, deve-se periodica-
mente checar a função neurológica e a perfusão do membro.

O objetivo principal da imobilização é garantir a diminuição da dor do paciente e impedir


danos a estruturas adjacentes com a redução do movimento do membro afetado. A imo-
bilização tem impacto significativo no atendimento ao trauma de extremidades e pode ser
realizada com alta eficácia de forma simples.

Existem diversos materiais que podem auxiliar o processo de imobilização, dentre eles
pode-se citar talas rígidas (preferíveis para lesões de ossos longos com fraturas alinhadas),
talas moldáveis (são as mais utilizadas, principalmente em traumas desalinhados e lesões
de tornozelo, punho e ossos longos), talas de tração (usadas para estabilizar fraturas de
diáfise de fêmur), ataduras, imobilizadores anatômicos, entre outros.

Para a realização da imobilização, o


membro deve ser exposto e avaliado
em toda a sua extensão e devem ser
conferidas a sensibilidade e a per-
fusão. Em caso de disfunção neuro-
vascular do membro, deve ser con-
siderada a tentativa de reposiciona-
mento do membro na posição
anatômica, com a intenção de
garantir uma melhor perfusão e a
descompressão de nervos e outras FIGURA 8 Talas moldáveis

estruturas adjacentes. Se os pulsos


FIGURA 9 Tala de pressão

49
forem restaurados ou o preenchimento capilar for apropriado, essa é a posição em que o
membro deve ser imobilizado, e tais informações devem ser documentadas.

A imobilização deve abranger os ossos proximal e distal à articulação lesada, em casos de


luxação ou entorse, e as articulações proximais e distais ao osso acometido, em casos de
fratura.

Com o uso de talas, faz-se necessário preencher os espaços resultantes para evitar o movi-
mento do membro no interior do dispositivo, proporcionando maior conforto ao paciente
e prevenindo úlceras de pressão. É importante remover acessórios, para que esses objetos
não impeçam a circulação caso haja formação de edema adicional. As talas devem estar
firmes de modo a garantir uma imobilização eficaz, todavia uma compressão maior que a
necessária poderá ocasionar danos ao membro, como uma síndrome compartimental
iatrogênica.

Situações especiais de imobilização:

Fraturas de Fêmur: imobilizadas temporariamente com talas de tração, com tração linear
crânio-caudal. É contraindicado o uso de talas de tração em situações de suspeita de
fratura na topografia do joelho ou da tíbia, ou em caso de avulsão ou amputação de torno-
zelo ou pé.

Lesões de Joelho: o joelho deve ser imobilizado de forma que mantenha 10 graus de
flexão, na intenção de reduzir a tensão nas estruturas neurovasculares.

Lesões de Ombro: preferível realizar imobilização com uso de tipoias.

Fraturas de Quadril/ Colo Femoral: nessa situação, não há benefício em utilizar uma tala
de tração, visto que a lesão apresenta um padrão oblíquo. O membro deve ser alinhado,
com a utilização de uma tala longa, de modo a imobilizar desde a cintura até o pé do paci-
ente.

50
PÁGINA 71

Fluxograma de Atendimento em Trauma de Extremidades

Verificar segurança]
da cena

observa

Cena segura
Cena não segura
inicia
deve
Avaliação primária
XABCDE
Tornar a cena
identifica segura

Lesões que ameaçam Lesões que NÃO


a vida ameaçam a vida

como

Síndrome de Fratura de Hemorragia


esmagamento fêmur

deve deve deve

Administrar Imobilizar
reposição Aplicar compressão
membro direta. Se não
volêmica
funcionar, usar
torniquete

inicia

Avaliação secundária

realiza
Coleta da história clínica Exame físico
do paciente e do
trauma

identificam
Lesão que ameaça
Lesões que NÃO
funcionalidade do
ameaçam a funcionalidade
membro
do membro
como
como

amputação Síndrome
luxações entorse Fratura comportamental
deve
deve
deve
Limpar e Realizar
proteger o membro fasciotomia
Imobilizar membro

seguido por

Avaliação continua da
função neural e perfusão
do membro
51
PÁGINA 71

Fluxograma de Atendimento em Trauma de Extremidades

Autores, revisores e orientadores:

Autora : Mariana Salles Ballalai


Coautora: Maria Beatriz Sales Lima
Revisor: Gabriel Coelho Brito Dias
Orientadora: Sandra Nívea Dos Reis Saraiva Falcão

Programa de Educação em Reanimação Cardiorrespiratória – PERC

Referências

American College of Surgeons; ATLS : Advanced Trauma Life Support. 10. ed. Chicago, 2018. p. 148-167.
American College of Surgeons; PHTLS: Prehospital Trauma Life Support. 9. ed. Chicago, 2018. p. 395-415.
COURT-BROWN, C. M. et al. Rockwood and Green’s fractures in adults. 8. ed. Philadelphia, PA: Wolters

51
CAPÍTULO 7:

Trauma em
Grupos Vulneráveis
Capítulo 7: Trauma em Grupos Vulneráveis

Trauma Pediátrico

O trauma é a maior causa de morbimortalidade na infância. Segundo o American Academy


of Pediatrics, trauma intencional ou não intencional e homicídio causam mais mortes entre
indivíduos entre 1 e 18 anos do que todas as demais causas juntas. Estima-se que 1 em
cada 4 crianças sofram trauma não intencional precisando de assistência médica todos os
anos, além disso, pacientes que sofreram traumas na infância podem desenvolver
sequelas crônicas, necessitando de assistência especializada por toda a vida. Portanto, é
de fundamental importância que o médico, independente da especialidade, saiba manejar
uma situação como essa em pacientes pediátricos.

O mecanismo de trauma mais comum em crianças é o contuso, representando cerca de


80% dos casos. As causas mais frequentes são acidentes com veículos motorizados (tanto
como passageiro, quanto como pedestre), bicicletas e quedas (ver Tabela 1).

Mecanismo de trauma Padrões de lesão

Costumam apresentar a tríade de Waddell:


Pedestre atingido por veículo motorizado
fratura de fêmur, trauma cranioencefálico (TCE) e
lesões do tronco.

Sem cinto de segurança: Trauma multissistêmico,


TCE e lesão cervical.
Passageiro em colisão de veículo motorizado
Com cinto de segurança: trauma torácico e
abdominal, fratura de coluna inferior.

TCE, fratura de ossos longos e lesões do tronco,


Queda de determinada altura sendo a gravidade proporcional à altura.

Trauma de vísceras intra-abdominal (colisão com


guidão. TCE, fratura em extremidade superior.
Acidente de bicicleta
Uso de capacetes para ciclistas pode prevenir
85% das lesões cranianas

Tabela 1: Mecanismos frequentes de trauma e padrões de trauma associados em pacientes pediátricos. Adaptado de ATLS, 10ª edição

Como atender a criança vítima de trauma

As prioridades para abordagem e manejo de pacientes pediátricos são as mesmas que


nos adultos, mas o tratamento tem suas peculiaridades, por causa da anatomia e fisiologia
única desses pacientes.

Alguns pontos importantes para se atentar durante o manejo de traumas pediátricos são
os que o ATLS traz como principais motivos de falha na sua abordagem: falha ao garantir

53
Peculiaridades dos pacientes pediátricos

Por causa do menor tamanho, que aumenta a força do impacto por unidade de área cor-
poral, e da constituição corporal com menos gordura, menos tecido conjuntivo e maior
proximidade entre os órgãos, traumas multissistêmicos são comuns em crianças, devendo
sempre ser considerados. Nesses casos, deve-se transferir o pacientes o mais rápido pos-
sível para um centro especializado, pois tendem a desenvolver complicações sérias que
aumentam a mortalidade.

Pacientes pediátricos têm pesos e alturas muito variáveis, sendo assim, é fundamental
estimar as medidas antropométricas para uma adequada abordagem, pois isso vai definir
a dose de medicamentos, o tamanho dos equipamentos e volume que deve ser reposto
em crianças hemodinamicamente instáveis. A forma mais segura de se ter conhecimento
dessas medidas é perguntar para algum parente ou cuidador que esteja acompanhando o
paciente, como isso muitas vezes não é possível, pode-se usar instrumentos de auxílio,
como fita de mensuração pediátrica e tabelas. Uma fórmula simples para estimar o peso
da criança em quilogramas é ([2 x idade em anos]+ 10).

Além disso, por serem mais instáveis emocionalmente, crianças tendem a ser menos
cooperativas com pessoas estranhas em situações estressantes, dificultando o trabalho da
equipe médica, assim, quando possível, a presença de pais ou cuidadores na avaliação e
manejo da situação é de suma importância.

Por fim, por serem indivíduos ainda em crescimento e desenvolvimento tanto físico
quanto mental, o trauma pode causar prejuízos a longo prazo na vida dessas crianças,
tanto orgânicos quanto sociais, afetivos e cognitivos. A família do paciente pediátrico
vítima de trauma, por sua vez, também é muito afetada emocionalmente e mesmo finan-
ceiramente, dessa forma, é imprescindível a assistência psicológica para ambos.

Sinais vitais por idade em pacientes pediátricos

Idade Peso (kg) Frequência Pressão Frequência Excreção urinária


Cardíaca (bpm) Arterial (mmHg) respiratória (irpm) (mL/kg/hr)

0 a 12 meses 0-10 ≤ 160 ≥ 60 ≤ 60 2

1 a 2 anos 10-14 ≤ 150 ≥ 70 ≤ 40 1,5

3 a 5 anos 14-18 ≤ 140 ≥ 75 ≤ 35 1

6 a 12 anos 18-36 ≤ 120 ≥ 80 ≤ 30 1

≥ 13 anos 36-70 ≤ 100 ≥ 90 ≤ 20 0,5

Tabela 2: Adaptado de ATLS, 10ª edição

Atendimento no Trauma

A abordagem de crianças vítimas de trauma, assim como nos adultos, deve seguir a
sequência de abordagem primária do ABCDE e tratar as possíveis complicações de cada
fase.

54
A (“Airway”; Via aérea): Nessa etapa procura-se manter a permeabilidade das vias aéreas,
com o objetivo de restauração ou manutenção da oxigenação tecidual adequada, que é a
primeira prioridade no atendimento de pacientes pediátricos vítimas de trauma, uma vez
que a hipóxia é a causa mais comum de parada cardíaca nesses pacientes. A via aérea de
pacientes pediátricos tem características anatômicas que dificultam o seu acesso, com-
parando com a de um adulto, entre elas:

Em crianças, por causa do occipito maior, há uma tendência de flexão passiva da coluna
cervical quando em posição supina, resultando em obstrução da faringe posterior ante-
riormente. Para evitar isso, deve-se manter o pescoço do paciente em uma posição neutra,
com o plano da face paralelo ao do dorso, colocando um coxim de 2 a 3 cm embaixo de
seu tronco

Os tecidos moles (língua e tonsilas palatinas) da orofaringe dos bebês são proporcional-
mente maiores que em adultos, o que prejudica a visualização da laringe. Vias aéreas
pediátricas são estreita, em especial na altura da cartilagem cricóide, assim são obstruídas
por muco, sangue, corpos estranhos e pelos próprios tecidos moles da cavidade oral com
mais facilidade. A laringe é mais anteriorizada e cefálica. A traquéia tem aproximadamente
5 cm de extensão e cresce para 7 cm aos 18 meses, o que aumenta o risco de intubação
seletiva

Se o paciente estiver respirando espontaneamente, mas com uma via aérea parcialmente
obstruída, deve-se mantê-la aberta e estabilizar a coluna cervical (com plano da face para-
lelo ao do dorso (como visto anteriormente), estabilização cervical bimanual e manobra
jaw-thrust), após limpeza e aspiração da boca e orofaringe, administrar oxigênio suple-
mentar.

Já, se o paciente estiver inconsciente, é necessário o manejo mecânico das vias aéreas com
cânula orofaríngea (cânula de Guedel) ou com intubação orotraqueal, antes de realizar
esses procedimentos é essencial pré-oxigenar a criança:

Cânula de Guedel: Apenas pode ser feito em crianças inconscientes, por causa do reflexo
do vômito. É fundamental que se use a cânula de tamanho adequado, ou seja, do mento
ao ângulo da mandíbula. Diferente da técnica do adulto, deve ser inserida diretamente na
orofaringe, com o auxílio de um abaixador de língua, se necessário. Se não for possível
garantir uma oxigenação adequada, deve-se prosseguir para intubação endotraqueal.

Intubação Orotraqueal: Em pacientes pediátricos, a via usada é a orotraqueal, não deve


usar a nasotraqueal por dificuldades de procedimento e risco de danos ao paciente, como
hemorragia nasofaringiana. É o modo mais confiável de ventilação na criança com a via
aérea comprometida. Para escolher o diâmetro adequado do tubo, uma dica simples e
rápida é usar com um diâmetro semelhante ao do dedo mínimo ou da narina do paciente
pediátrico. Outra forma usada para crianças maiores de 2 anos é: tudo endotraqueal (mm):
(idade em anos/4) + 4.

Quanto ao uso de tubos com cuff: ele pode ser usado em crianças a partir do primeiro ano
de vida com o objetivo de melhor ventilação e manejo do CO2. Em mais novos a própria
abertura mais estreita da cartilagem cricóide permite vedação adequada.

55
Muitos centros de trauma usam o protocolo medicamentoso de sequência rápida de intu-
bação para facilitar o processo. Que consiste em uma sequência de pré-oxigenação,
sedação, paralisia e intubação. Quando for feita a intubação, deve-se fixar o tubo e checar
seu adequado posicionamento com ausculta dos dois hemitórax (a qual deve ser feita
periodicamente, por fácil deslocamento do tubo nesses pacientes) e radiografia simples
de tórax para visualizando-o na traqueia. Uma fórmula usada para saber a profundidade
adequada do tubo (em cm) é igualar a 3 vezes o diâmetro (em mm)

Algumas falhas comuns de falha na oxigenação usando o tubo que devem ser levadas em
conta são: deslocamento do tubo, pneumotórax, obstruções e falha no equipamento. Via
aérea de resgate: Usada quando não foi possível garantir uma oxigenação adequada por
meio da intubação endotraqueal. Pode-se lançar mão de cricotireoidostomia ou máscara
laríngea.

Cricotireoidostomia: Pode ser feita por punção, a cirúrgica deve ser evitada em bebês ou
crianças menores, apenas a partir de 12 anos. A cricotireoidostomia por punção é uma via
aérea temporária (30 a 45 min), pois pode causar hipercapnia.

Máscara laríngea: De fácil colocação, mas não provém ventilação adequada e pode dis-
tender o estômago da criança;

B (“Breathing”; Ventilação): Nessa etapa os objetivos são manter uma ventilação adequa-
da do paciente e reconhecer causas que possam interferir na troca gasosa, tratando a
causa base, como pneumotórax hipertensivo, pneumotórax aberto e lesão pulmonar por
aspiração ou contusão.

Uma ventilação inadequada pode resultar em acidose respiratória, que é o distúrbio


ácido-básico mais comum nesses pacientes, e em hipóxia, que é a causa mais comum de
parada cardíaca no paciente pediátrico. O oxímetro de pulso é um equipamento que ajuda
no controle da oxigenação do paciente e deve ser usado continuamente no atendimento
do paciente pediátrico vítima de trauma. Além disso, alguns sinais podem indicar uma
ventilação inadequada, como o batimento das asas do nariz, em especial em menores de
6 meses (que são respiradores nasais primários) ou a não elevação do tórax quando aplica-
do ventilação com pressão positiva (bolsa-válvula-máscara (AMBU) ou ventilador mecâni-
co), visto que o tórax infantil tem grande distensibilidade.

O volume corrente normal em pacientes pediátricos respirando espontaneamente é de 4


a 6 mL/kg, mas, para a ventilação de assistência durante o trauma, volumes maiores
podem ser necessários, como de 6 a 10 mL/kg. É importante manter o volume e a pressão
adequadas na hora de ventilar, usando equipamentos adequados para a idade, como
AMBU pediátrico para crianças com menos de 30 kg e configuração pediátrica no ventila-
dor mecânico, tanto para manter oxigenação adequada quanto para evitar iatrogenias,
como barotrauma, mais suscetível em crianças, por causa da fragilidade da árvore traqueo-
brônquica.

C (“Circulation”; Circulação): Essa etapa visa à estabilização circulatória da criança, que


deve ser feita em 3 etapas: 1) Reconhecimento de um comprometimento circulatório; 2)
Acesso venoso e 3) Reposição volêmica.

56
Reconhecimento de comprometimento circulatório

Muitas vezes, os sinais mais perceptíveis inicialmente de hipovolemia progredindo para


um choque em crianças são taquicardia e sinais de redução da perfusão periférica (palidez
cutânea e elevação do tempo de enchimento capilar para mais de 2 segundos). Isso se
deve ao fato de que crianças têm uma reserva fisiológica maior que em adultos, sendo
capaz de aumentar sua frequência cardíaca para manter uma pressão sistólica adequada,
demorando mais para demonstrarem sinais de hipotensão (pacientes pediátricos necessi-
tam perder em média 30% do volume sanguíneo para diminuição da pressão sanguínea)

Em geral, quando a baixa pressão arterial aparece tardiamente, ela indica estado de
choque descompensado com perda sanguínea grave, aumentando o risco de parada car-
diorrespiratória, se não manejado adequadamente. Para estimar a pressão arterial adequa-
da para a idade de forma rápida e prática no paciente pediátrico, pode-se lançar mão das
fórmulas:

Pressão sistólica normal = 90 mmHg mais 2 vezes a idade do paciente em anos. Limite infe-
rior da normalidade da pressão sistólica = 70 mmHg mais 2 vezes a idade em anos. Pressão
diastólica = 2/3 da pressão sistólica

Outros sinais menos evidentes de perda sanguínea incluem: enfraquecimento de pulsos


periféricos, pressão de pulso menor que 20 mmHg, extremidades frias e diminuição do
nível de consciência. Na suspeita de choque por perda sanguínea, o paciente deve receber
reposição volêmica.

Acesso Venoso

O preferível é o acesso percutâneo periférico, mas se não for possível depois de duas ten-
tativas, deve-se prosseguir para acesso intraósseo.

Acesso periférico (tentar duas vezes Fossa antecubital ou veia safena no tornozelo.
antes de proceder ao próximo)

Tíbia anteromedial (acesso preferível) ou fêmur distal (con-


Acesso intraósseo siderar antes, tíbia contralateral); Não deve ser feita em
caso de fratur a ou suspeita.

Acesso venoso central femoral Veia femoral

Acesso venoso central jugular ou Veia jugular interna ou externa e veia subclávia; Não deve
acesso venoso central subclávia* ser usado em comprometimento de via aérea ou quando
há um colar cervical aplicado.
*Reservado a médicos especializados em
pacientes pediátricos

Veia safena.
Dissecção venosa Em último caso, só por pessoas capacitadas; Geralmente é
a última escolha, pois demora mais que 10 minutos, mesmo
na mão dos mais experientes.

Tabela 3. Locais de punção para acesso venoso


57
Reposição volêmica

Para reposição volêmica em pacientes pediátricos vítimas de trauma em suspeita de


choque, recomenda-se:

- Infusão inicial de 20 mL/kg de cristalóide isotônico aquecido (até 39ºC) em bolus.

- Se não estabilizar (Ver Tabela 4): mais 2 ou 3 doses adicionais de 20 ml/kg de cristalóide
isotônico aquecido em bolus.

- Depois disso, se o paciente ainda estiver mostrando evidências de perda sanguínea, fazer
10 ml/kg de concentrado de hemácia.

Diminuição da frequência cardíaca Aumenta da temperatura das extremidades.


para a adequada para a idade.

Recuperação do sensório. Aumento da pressão arterial sistólica adequado para a idade.

Retorno dos pulsos periféricos. Aumento da pressão de pulso (>20 mmHg).

Retorno da coloração normal da Excreção urinária de 1-2 ml/kg/hr até o primeiro ano de vida,
pele. de 1-1,5 mL/kg/hr para maiores de 1 ano até 10 anos (adoles-
cência) e de 0,5ml/kg/hr em adolescentes.

Tabela 4. Indícios de estabilidade hemodinâmica em pacientes pediátricos após reposição volêmica.

D (“Disability”; Disfunção): Nessa etapa é realizada a avaliação neurológica do paciente


pediátrico e a sua classificação na escala de coma de Glasgow, importante para direcionar
condutas. A escala de coma de Glasgow é igual a do adulto para pacientes maiores que 4
anos, mas deve ter o conjunto de melhor resposta verbal modificado para pacientes mais
novos, uma vez que a fala ainda não é completamente desenvolvida (Ver tabela 5).

E (“Exposure”; Exposição): Essa etapa


tem como objetivo principal em crianças Resposta verbal Escore
o controle da hipotermia. Pacientes
Palavras apropriadas ou sorriso 5
pediátricos tendem a perder energia social, fixa olhar e acompanha
térmica mais fácil que adultos, fazendo a
hipotermia ser um ponto importante a Choro consolável 4
se evitar no contexto do manejo do
Irritabilidade persistente 3
trauma, lançando mão de aquecedores,
luzes térmicas e cobertores térmicos Agitado ou inquieto 2
para controlar a temperatura corporal,
por isso também os líquidos infundidos Nenhuma 1
devem estar aquecidos de preferência
até uma temperatura de 39ºC. Tabela 5. Melhor resposta verbal da escala de coma de Glasgow
modificada para menores de 4 anos. Adaptado de ATLS, 10ª edição

58
Traumas específicos

Trauma torácico: Para entender as diferenças do trauma torácico do adulto para o da


criança, é necessário ter em mente as particularidades da constituição torácica dos pacien-
tes pediátricos e dos mecanismos de trauma mais comuns nesses pacientes.

Como já visto anteriormente, o mecanismo de trauma mais comum em crianças é o contu-


so. No trauma torácico desses indivíduos essa estatística não é diferente, o trauma contuso
é o mais representativo, traumas penetrantes só ganham mais notoriedade a partir dos 10
anos de vida, quando começam a aumentar sua incidência.

Mais de 2/3 dos pacientes pediátricos com trauma torácicos tem também traumas multis-
sistêmicos. Por ser mais flexível e complacente que a do adulto, por causa e uma constitu-
ição mais cartilaginosa e menos ossificação, a caixa torácica das crianças permite uma
maior transferência de energia para o parênquima pulmonar, fazendo a contusão pulmo-
nar uma lesão importante nesses pacientes. Pelo mesmo motivo, em geral, fraturas de
costela são incomuns em crianças, sua presença geralmente indica impactos mais violen-
tos contra o tórax delas.

Outra lesão que ganha notoriedade em pacientes pediátricos é o pneumotórax hiperten-


sivo, por causa, principalmente, da maior mobilidade das estruturas mediastinais desses
indivíduos, sendo a causa mais comum de risco de vida emergencial em trauma torácico
infantil.

A maioria das lesões podem ser identificadas por radiografia simples de tórax e o trata-
mento é, em geral, terapia de suporte acompanhado de drenagem torácica, feita princi-
palmente por toracostomia, uma vez que toracotomias são raramente necessárias nesses
pacientes.

Trauma abdominal: Por terem costelas mais flexíveis e parede abdominal mais fina, as
crianças tem menos proteção dos órgãos abdominais, sendo mais comuns lesões paren-
quimatosas, como pancreáticas (como pseudocientífico traumático) em traumas no
abdome superior.

O mecanismo de trauma abdominal mais comum nesses pacientes é o contuso, desta-


ca-se, nessa categoria, os traumas gastrointestinais, como ruptura direta de víscera ou
avulsão do mesentério, em crianças que se envolveram como passageiras em colisões de
automóveis (lembrar do com o "sinal do cinto de segurança"), em geral também apresen-
tam fraturas na coluna lombar.

Na abordagem de pacientes pediátricos vítimas de traumas abdominais é importante a


cautela na hora do exame físico, perguntando se existem regiões dolorosas, se o paciente
entender e estiver consciente, e realizando palpação abdominal com cuidado. Outro
cuidado importante de se apontar, é a necessidade de realizar uma descompressão do
estômago que, muitas vezes, está cheio de ar, por causa da aerofagia resultante do choro
dessas crianças. Alguns exames complementares úteis na avaliação desses pacientes são:

59
Tomografia computadorizada (TC) de abdome (usualmente com contraste intrave-
noso): por causa da radiação ionizante que incidirá sobre a criança, só deve ser feito se o
resultado for mudar de alguma forma o tratamento, sempre tentando usar a menor dose
de radiação possível. Ela é útil para melhor avaliar lesões intra-abdominais e definir o trata-
mento, mas deve ser feita o mais rápido possível, quando necessária, para não atrasar a
terapia. Muitas vezes é preciso a sedação da criação para ela não se mover dentro da
máquina.

Protocolo FAST: exame de imagem que tem a vantagem de poder ser repetido, pois não
usa radiação ionizante. Útil para avaliar presença de hemorragia intra-abdominal, mas não
é capaz de avaliar lesões intraparenquimatosas isoladas.

Lavagem ou aspiração peritoneal diagnóstica: usada para investigar sangramento intra-


peritoneal, quando o paciente está hemodinamicamente instável e não consegue ser
levado para a TC ou quando CT e FAST não estão disponíveis e se o achado de sangue vá
indicar intervenção. Usa 10 mL/kg de cristaloide aquecido para a lavagem, apenas o cirur-
gião que vai operar a criança deve fazer esse procedimento. Geralmente, sangramento
isolado encontrado em TC ou FAST não indica intervenção cirúrgica (laparotomia) em
crianças hemodinamicamente normais ou que se estabilizaram rapidamente com ressuci-
tação com fluído, uma vez que sangramento por trauma de fígado, baço e rim, que muitas
vezes são as causas, geralmente são autolimitandos, podendo, então ser tratados conser-
vadoramente. Entretanto, traumas abdominais sérios ou crianças que evoluem com hipo-
tensão (choque descompensado) devem ser prontamente abordadas por cirurgião.

- Trauma Cranioencefálico: Os pacientes pediátricos tem características únicas do siste-


ma nervoso central que nos ajudam a entender melhor a fisiopatológico e manifestações
dos traumatismos cranioencefálicos (TCE): Uma cabeça proporcionalmente maior em
relação ao corpo em crianças (dobra de tamanho nos primeiros 6 meses e já é 80% do
tamanho de uma cabeça adulta aos 2 anos) predispõe a TCE; Um espaço subaracnóideo
menor que em adultos garante menos proteção ao cérebro, facilitando lesões no parên-
quima encefálico; Encéfalo com conteúdo mais aquoso e mielinização incompleta, sendo
mais suscetíveis a lesões difusas, como edema e lesão axonal difusa, sendo mais comuns
na criança do que em qualquer outra faixa etária.

Pacientes pediátricos geralmente tem uma recuperação em TCE melhor que em adultos,
mas são particularmente suscetíveis a danos secundários ao encéfalo causado por hipovo-
lemia, que causa redução na perfusão cerebral e hipóxia. Bebês, por terem as fontanelas
ainda não calcificadas e suturas cranianas móveis são mais tolerantes a lesões expansivas
intracranianas ou edema cerebral. Assim, essas lesões não causam sintomatologia até des-
compensação súbita.

Em crianças a hipertensão intracraniana causada por edema cerebral é mais comum que
em adultos, sendo necessário intervenção para manter a pressão de perfusão cerebral.
Para garantir uma perfusão cerebral adequada, segundo o ATLS, é indicado monitorar a
pressão intracraniana sempre que uma TC evidencie sinais de hemorragia intracraniana,
edema cerebral ou herniação cerebelar ou transtentorial; quando a escala de coma de
Glasgow do paciente resultar em escore de 8 ou menos ou escore motor de 1 ou 2; e
quando o paciente pediátrico for vítima de múltiplos traumas associados ao trauma

60
encefálico que exijam uma maior reposição volêmica, cirurgia torácica ou abdominal de
emergência ou quando estabilização e avaliação for prolongada.

A abordagem ao paciente pediátrico com TCE deve ser, idealmente, acompanhada por um
neurocirurgião. A manutenção de uma oxigenação e ventilação adequada são essenciais
para evitar a progressão do dano cerebral por hipóxia e a hipoperfusão cerebral deve ser
tratada prontamente. Alguns fármacos usados na terapia desses pacientes são: manitol e
solução salina hipertônica 3% para redução da pressão intracraniana e fenitoína e levetirac-
etam para tratamento de convulsão que são comuns em criação no pós-trauma, mas que
também muitas vezes são autolimitadas.

- Trauma raquimedular: A coluna cervical é a mais comumente afetada dentre as demais


regiões da coluna vertebral, principalmente, por causa da cabeça relativamente grande
para o pescoço nas crianças, o que aumenta a incidência de lesões cervicais devido a maior
transferência de energia aplicadas sob o pescoço pelas forças na hora do trauma. Feliz-
mente, a lesão da medula cervical não é comum em crianças, segundo o ATLS, representa
apenas 5% do total das faixas etárias.

Nesse trauma o estudo radiográfico (radiografia simples geralmente, pois TC e ressonância


não são indicadas rotineiramente nesses pacientes) é importante para melhor caracteri-
zação da lesão. Porém, por ser uma estrutura óssea ainda em desenvolvimento nas
crianças, alguns achados podem confundir o médico, importante atentar para:

Subluxação fisiológica entre as vértebras C2 e C3 são comuns em pacientes pediátricos,


em especial em crianças menores, mas pode estar presente em até 20% dos pacientes até
os 16 anos. Os centros de crescimento das vértebras podem se assemelhar a fraturas. A
presença de lesão medular sem anormalidades radiológicas é comum nessa faixa etária.
Portanto, se lesão medular, for suspeitada pela clínica e história do paciente, a radiografia
normal não exclui esse diagnóstico.

O manejo desses traumas não difere do trauma raquimedular em adultos. Importante


lembrar que, se houver dúvidas sobre a integridade da coluna cervical nesses pacientes,
deve-se sempre agir como se ela estivesse instável, estabilizando-a e evitando movimen-
tos bruscos.

- Trauma musculoesquelético: Como esses pacientes ainda não têm os ossos completa-
mente calcificados e, portanto, mais flexíveis, a fratura é bem menos comum que em adul-
tos e, em geral, quando presente, indica trauma com maior energia. Essa imaturidade
óssea é a que permite a característica fratura em “galho verde” dessa faixa etária.

A história nesse tipo de trauma tem uma importância fundamental, uma vez que o exame
radiológico se mostra muitas vezes falho, devido a pouca mineralização óssea, assim é
importante uma boa caracterização do trauma, sua temporalidade, sua magnitude e me-
canismo.

Além disso, por serem estruturas ainda em desenvolvimento, lesões que atinjam a placa
de crescimento epifisário podem retardar o crescimento da criança ou causar distúrbios no
crescimento normal. Entre os ossos longos mais acometidos por fraturas nessa faixa etária,

61
A lesão de estruturas vasculares também é considerável no trauma músculo esquelético,
muito comum em fraturas supracondilares no cotovelo e no joelho, e seu reconhecimento
e tratamento evita isquemias.

O manejo desse tipo de trauma pode ser realizado com o uso de talas de contenção, úteis
para a estabilização até uma avaliação ortopédica completa. Entretanto, a terapia cirúrgica
pode ser necessária em alguns casos: fraturas expostas (para desbridamento, lavagem e
fixação), fraturas supracondilares do cotovelo com desvio e fraturas envolvendo a placa de
crescimento.

- Maltrato infantil: A definição de maltrato infantil segundo o ATLS (10ª edição) é: qualquer
criança que tem lesões intencionais causadas por seus cuidadores. Crianças vítimas de
maltrato têm um maior risco de morte que a da sua faixa etária normal, além de sofrerem
sequelas tanto orgânicas, quanto emocionais e psicológicas que as acompanharam pelo
resto da vida.

Algumas características na história ou exame físico do trauma podem levantar a suspeita


de que aquela criança é vitima de maltrato ou abuso infantil, como: Lesões que não con-
dizem com a história, ou história mal contada; Tempo grande entre fratura e procura de
assistência médica; Discordância entre as versões dos pais ou dos cuidadores; Hematomas
com cores diferentes; Evidência de lesões frequentes prévias, evidenciado por cicatrizes
ou fraturas ósseas; Lesões na região perianal, perigenital ou perioral; Fratura de ossos
longos em crianças que ainda não tem idade para andar; Ruptura de víscera interna sem
história de trauma contuso importante; Lesões incomuns, queimadura de cigarro, mordi-
das e marcas de cordas; Hemorragia de retina.

No Brasil, casos suspeitos de maltratos são de notificação compulsória para os órgãos


competentes, como Conselho Tutelar ou ainda Vara da Infância e Juventude.

Trauma Geriátrico

Os pacientes geriátricos vítimas de trauma tendem a ter uma mortalidade maior que a dos
pacientes mais novos, ainda que o mecanismo de lesão seja semelhante, isso se deve ao
fato de pacientes mais velhos apresentarem complicações com maior facilidade, terem
múltiplas comorbidades associadas, haver uma falha na triagem desses pacientes, haver
envelhecimento dos órgãos e diminuição dos mecanismo fisiológicos de compensação,
entre outros.

Etiologias comuns de trauma nessa faixa etária são quedas acidente de veículo motoriza-
do, queimaduras e traumas penetrantes:

Quedas: Causa mais comum de trauma fatal nesses pacientes, aumentando o risco com a
idade. Alguns dos fatores de risco para esse tipo de trauma são idade avançada, mobili-
dade comprometida, histórico de quedas anteriores, demência, uso de medicamentos e
fatores ambientais

Acidentes com veículos motorizados: Alguns fatores do próprio pacientes aumentar o


risco desses acidentes, como capacidade reflexa diminuída, sentidos prejudicados, como

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capacidade reflexa diminuída, sentidos prejudicados, como visão e audição, além de mor-
bidade que podem gerar o acidente, como infarto agudo do miocárdio enquanto dirige.

Queimaduras: Continuam sendo uma causa importante de trauma e mesmo morte nessa
faixa etária. Peculiaridades dos pacientes tanto podem facilitar as situações de queimadu-
ra, como dificuldade de sair de um local incendiando, quanto atrasar a recuperação, por
um metabolismo mais lento.

Traumas penetrantes: O mecanismo de trauma mais comum é o trauma contuso, mas a


partir dos 65 anos esse tipo de trauma ganha notoriedade, sendo a quarta maior causa de
morte por trauma nesses indivíduos

Abordagem

Assim como nos outros tipos de trauma, o recomendado é o uso da metodologia do


ABCDE, segundo cada etapa e resolvendo as complicação que possam surgir. Importante
levar em consideração as peculiaridades desses pacientes.

A (“Airway”): Idosos tem reflexos de proteção da via aérea mais debilitados que pacientes
mais jovens, então o reconhecimento de obstrução da via aérea de forma rápida é essen-
cial para diminuir a mortalidade nestes indivíduos. É importante, quando for ser realizada
protocolo medicamentoso de sequência rápida de intubação em pacientes geriátricos,
diminuir a dose de barbitúricos, benzodiazepínicos e outros sedativos em 20 a 40%, para
evitar depressão cardiovascular.

B (“Breathing”): A ventilação é igual a dos adultos mais jovens, porém é importante notar
que, por causa da baixa reserva fisiológica, muitas vezes, as manifestações de hipóxia se
apresentam de forma insidiosa. Além disso, é relevante notar que comorbidades, como
doença pulmonar obstrutiva crônica, podem predispor esses doentes a uma insuficiência
respiratória mais facilmente.

C (“Circulation”): Diferente das crianças, os idosos não conseguem aumentar considerav-


elmente sua frequência cardíaca frente a hipovolemia, mas respondem com aumento da
resistência vascular periférica podendo causar hipoperfusão tecidual. Além disso, como é
muito comum a hipertensão arterial sistêmica em pacientes idosos, pressões sistólicas de
110 mmHg, que seriam consideradas normais em pacientes mais jovens, pode ser usada
como ponto de corte para investigação de hipotensão em pacientes mais velhos que 65
anos.

D (“Disability”): Alguns pontos devem ser levados em conta nessa etapa da avaliação em
pacientes geriátricos, como maior prevalência de doenças demenciais nessa população,
que prejudica avaliação; frequente uso de anticoagulantes nessa faixa etária que pode
facilitar hemorragias intracranianas; e comum acometimento desses indivíduos por
doença aterosclerótica, que podem contribuir para lesão cerebral primária ou secundária.
A vantagem em relação a pacientes mais jovens é que no momento de avaliar os
benefícios e riscos de indicar um exame tomográfico nessa faixa etária, em geral, vai ser
mais vantajoso a realização do exame, pois o risco da exposição à radiação ionizante perde
força, comparando, por exemplo, com pacientes pediátricos.

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E (“Exposure”): Idosos têm maior propensão a hipotermia que pacientes adultos mais
jovens, uma vez que tem perda de gordura corporal, déficit nutricionais e comorbidades
associadas. Portanto, é importante o controle da temperatura desses pacientes.

Traumas comuns

- Fraturas de costelas: Devido às alterações anatômicas da caixa torácica e à diminuição


da densidade dos ossos com o passar da idade, as costelas são mais vulneráveis a traumas.
A principal causa desses traumas é a queda do idoso e os acidentes automobilísticos.
Essas injúrias levam mais comumente ao quadro de pneumonia, que é 30% mais provável
em um indivíduo idoso. Para amenizar os danos é fundamental o controle da dor e a
higiene pulmonar.

- Traumatismo cranioencefálico: O traumatismo craniano é uma das causas de maior


mortalidade. Esse trauma pode ser difícil de ser identificado por causa de casos de delírio,
demência e depressão mais comuns nessa faixa de idade. É desafiador o manejo desses
pacientes, a terapia anticoagulante e antiplaquetária, usualmente realizada por esses
indivíduos, por causa de comorbidades, acarreta uma mortalidade significativa. A
Tomografia computadorizada é essencial nesse tipo de trauma e o método de escolha,
pois é de rápida realização.

- Traumas pélvicos: O trauma de pelve é resultado, frequentemente, de uma queda. A


fratura decorre da osteoporose muito comum em pessoas com mais de 60 anos. A mortali-
dade por esse tipo de fratura é quatro vezes maior em pacientes idosos, sendo evitada
pela prevenção a quedas.

Situações especiais

- Uso de medicamentos: Deve-se ter cautela ao administrar fármacos em pacientes


idosos, já que essas pessoas, normalmente, possuem outras doenças associadas. Beta blo-
queadores são indicados para 20% dos pacientes com doença coronariana e para 10% com
hipertensão. O uso de terapia anticoagulante e antiplaquetária e de inibidores da trombina
não é indicado para pacientes com sangramentos.

- Abuso nos idosos: É de extrema importância avaliar o estado do paciente em geral para
identificar possíveis abusos. O abuso é definido como qualquer lesão, intimidação, castigo
cruel provocado ao idoso, que pode desencadear angústia, dano físico ou dor. O abuso
nos idosos pode ser classificado de 6 formas: Abuso Físico; Abuso Sexual; Negligência;
Abuso Psicológico; Exploração financeira e material; Violação de Direitos.

Esses abusos podem ocorrer de forma simultânea. Abuso físico em idosos é relatado em
14% das admissões. É necessário que o profissional da saúde ao identificar tais abusos
comunique às autoridades competentes.

Estabelecimento de metas de cuidado

Trauma é a quinta maior causa de morte entre pacientes com mais de 65 anos de idade.
Deve-se suspender o suporte à vida e fornecer cuidados paliativos para aqueles pacientes

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em que os benefícios das ações adotadas pela equipe sejam menores do que os danos
causados. Por isso é sempre importante uma abordagem centrada na pessoa, em que haja
diálogo do paciente com a família, visando às melhores decisões quanto ao tratamento.

Trauma em Gestantes

É inerente à gestação mudanças fisiológicas e anatômicas, as quais devem ser consid-


eradas na avaliação da mulher grávida. Além disso, é importante o médico lembrar que
está atendendo dois pacientes, o feto e a mãe, e que as medidas de cuidado à mãe devem
ser priorizadas. A avaliação de uma gestante traumatizada deve ser feita por um médico
cirurgião e um obstetra, caso não seja viável, a paciente deve ser transferida o mais rápido
possível para um centro especializado em trauma.

Diferenças Anatômicas e Fisiológicas

Dentre as diferenças anatômicas podemos destacar:

Posição do útero: Este muda de uma localização intrapélvica por causa do seu crescimento
em direção ao abdome superior, empurrando o intestino. Essa diferença protege o intesti-
no do trauma abdominal contuso, mas o útero se apresenta mais vulnerável. O crescimen-
to do útero vai deixando as paredes cada vez mais finas, deixando-o vulnerável. No
terceiro semestre o feto costuma ter sua cabeça dentro da pelve, esse aspecto é relevante
pois traumas de pelve são associados a traumas cranianos fetais. Dentre as diferenças
fisiológicas podemos exemplificar por sistema (ver Tabela 6)

Sistemas Peculiaridades da gravidez

Sistema O volume de plasma aumenta mais consideravelmente que o de hemácias,


Hematopoiético reduzindo o hematócrito, o que desencadeia uma anemia fisiológica. Os glób-
ulos brancos e alguns fatores da coagulação, como o fibrinogênio, também
aumentam.

O Débito Cardíaco (DC) é aumentado por causa do aumento do volume de


Sistema plasma circulante. A diminuição da resistência vascular da placenta e do útero
Cardiovascular no terceiro semestre contribui para o aumento desse parâmetro. A posição
supina, por comprimir a veia cava, diminui o DC por redução do retorno venoso
dos membros inferiores. A frequência cardíaca é aumentada pelo mecanismo
compensatório da diminuição da volemia. A pressão arterial é diminuída e a
pressão venosa de repouso é variável, sendo aumentada nos membros infe-
riores no último trimestre.

Sistema Respiratório O consumo de oxigênio é aumentado, tendo que ser mantido na reanimação
da mulher grávida. A elevação do diafragma diminui o volume residual. É
importante lembrar que níveis de PaCO2 devem ser avaliados, pois podem
indicar iminência de insuficiência respiratória quando estão entre 35-40
mmHg.

Sistema Como já explicado, o intestino é deslocado superiormente. O esvaziamento


Gastrointestinal gástrico é mais lento, sendo a descompressão gástrica urgente para evitar
aspirações.

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Sistema Urinário Filtração glomerular e fluxo plasmático renal são aumentados. Ureia e creat-
inina são diminuídas.

Sistema A sínfise púbica é alargada e o espaço entre as articulações sacroilíacas


Musculoesquelético também aumenta.

Sistema Neurológico A avaliação neurológica é relevante no diagnóstico diferencial de eclâmpsia


e de um quadro de convulsão.

Tabela 6. Diferenças fisiológicas na gestação

Mecanismos de trauma e gravidade do trauma

- Trauma contuso: Representa 91% dos traumas em gestante, sendo causado quando a
gestante vai de encontro a um objeto rígido, como o volante de carro em caso de acidente
automobilístico. Apesar dos mecanismos de defesa do feto, como o líquido amniótico,
pode ocorrer injúria ou morte fetal. É mais comum ocorrer ruptura uterina ou descolamen-
to da placenta. Para minimizar os impactos de uma colisão, é necessário o uso do cinto de
segurança de três pontos, pois esse tipo aumenta a área de contato, diminuindo, assim, a
pressão aplicada.

- Trauma penetrante: Por causa das relações anatômicas já elucidadas, as vísceras ficam
protegidas pelo útero gravídico. Essa relação é um fator protetor para a mãe, que tem seus
órgãos resguardados, mas constitui um risco maior para o feto. A gravidade do trauma
deve ser avaliada sob a óptica da mãe, como já mencionado. É relevante cuidar de todos
os tipos de trauma, mesmo que leves, pois podem complicar caso não sejam bem maneja-
dos.

Avaliação e tratamento

Para realização da avaliação primária e reanimação, devemos atender tanto a mãe quanto
o feto, mas lembrar de garantir a avaliação da mãe primeiramente também é um cuidado
com feto.

Avaliação primária e reanimação da gestante: Deve-se garantir a via aérea, a ventilação e a


oxigenação. É relevante lembrar da compressão da veia cava pelo útero, o que pode
diminuir o débito cardíaco, sendo necessário o deslocamento da gestante para o lado
esquerdo. Caso esteja imobilizada em posição supina, inclina-se a paciente com a prancha
cerca de 15-30 graus à esquerda. Como já elucidado, o volume plasmático na gestante é
superior, intitulado hipervolemia fisiológica da gravidez, o que pode atrasar os sintomas de
hipovolemia, mesmo quando já há sofrimento para o feto. Dessa forma, vasopressores
devem ser evitados, sendo indicado o uso de cristaloides e a reposição precoce de sangue.
A quantificação do fibrinogênio deve ser feita, já que esse se encontra aumentado na
gravidez, evitando episódios de coagulação intravascular disseminada.

Avaliação primária e reanimação do feto: A principal causa de morte do feto é relacionada


à mãe, seja pelo choque ou pela morte materna. A segunda maior causa é o deslocamento
da placenta. Mais raramente ocorre a ruptura uterina. A avaliação dos batimentos cardía-

66
cos fetais pode ser feita por um equipamento Doppler. A monitoração por cardiotocografia
é indicada após 20 a 24 semanas de gestação.

Medidas auxiliares na avaliação primária e na reanimação: A monitoração da mãe é feita


em decúbito lateral esquerdo. O monitoramento da oximetria e da gasometria arterial são
vitais. Deve ser realizada uma consulta obstétrica, a frequência do feto de 120-160 bati-
mentos por minuto é um parâmetro do estado volêmico da mãe. Caso não seja possível
um atendimento obstétrico, encaminhar para um centro de trauma que possua esse
serviço.

Avaliação secundária: Há algumas particularidades, como a posição do cateter no Lavado


Peritoneal Diagnóstico (LPD) que deve ficar acima da cicatriz umbilical. Sempre dar
atenção às contrações uterinas, que indicam parto prematuro, e às tetânicas, que sugerem
um deslocamento prematuro de placenta. Ressaltam-se os exames perineal e vaginal,
lembrando que um pH vaginal acima de 4.5 sugere ruptura de bolsa. Deve-se avaliar a
dilatação do colo e a apresentação fetal em relação às espinhas isquiáticas. A Tomografia
Computadorizada é utilizada quando há preocupação com lesões intra-abdominais. Ade-
mais, a hospitalização é obrigatória quando há sangramento, dor, irritação, sensibilidade
ou cólicas.

Tratamento

Em caso de embolia por líquido amniótico e coagulação intravascular disseminada, a evac-


uação uterina e a reposição de plaquetas e fibrinogênio devem ser feitas imediatamente.
Além disso, todas as mulheres grávidas que são Rh negativas devem receber imunoglobu-
lina Rh, evitando a isoimunização, salvo casos em que o trauma seja longe do útero, como
traumas de extremidade.

Cesárea perimortem: A cesárea perimortem pode ser bem sucedida quando a causa da
parada cardiorrespiratória não é hipovolemia. Essa constatação advém do fato de que, em
casos de hipovolemia da mãe, o feto já sofreu por um grande período de hipóxia. Mesmo
nessas outras causas, deve ser realizada rapidamente dentro de 4 a 5 minutos após a
parada cardiorrespiratória.

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Autores, revisores e orientadores:

Autor(a): José Levi Tavares Cavalcante


Co-autor(a): Helena Raquel Nogueira de Oliveira
Revisor(a): José Roberto Gomes Francilino Filho
Orientador(a): Sandra Nivea dos Reis Saraiva Falcão

Programa de Educação em Reanimação Cardiorrespiratória - PERC

Referências

American College of Surgeons on Trauma. Advanced Trauma Life Support (ATLS) student course manual. 10.
ed. Chicago: American College of Surgeons; 2018.
COMMITTEE ON PEDIATRIC EMERGENCY MEDICINE et al. Management of pediatric trauma. Pediatrics, v.
138, n. 2, 2016.
PEREIRA JR., G. A.; ANDREGHETTO, A. C.; BASILE-FILHO, A.; ANDRADE, J. I. de. Trauma no paciente pediátri-
co. Medicina (Ribeirão Preto), [S. l.], v. 32, n. 3, p. 262-281, 1999. DOI: 10.11606/issn.2176-7262.v32i3p262-281.
Disponível em: https://www.revistas.usp.br/rmrp/article/view/12701. Acesso em: 11 fev. 2021

68
ISBN 978-65-89822-68-4

9 786589 822684 >


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