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A VONTADE DE DEUS

Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

A
VONTADE
DE DEUS
Aula 4

OS QUATRO SENTIDOS DA VONTADE DE DEUS


“Portanto, sejam cuidadosos em seu modo de vida.
Não vivam como insensatos, mas como sábios. Apro-
veitem ao máximo todas as oportunidades nestes dias
maus. Não ajam de forma impensada, mas procurem
entender a vontade do Senhor.” (Ef 5.15-17 – NVT)

1. ESCLARECENDO A EXPRESSÃO “VONTADE DE DEUS”

Como vimos anteriormente, existe no meio cristão uma grande


confusão em torno do que é a vontade de Deus e do que é ser ra-
dical em relação a essa vontade. Vimos também que essa confusão
foi sendo gerada ao longo dos anos pela forma descuidada como
muitos (teólogos, pastores e mestres) faziam aplicações a essa ex-
pressão. Porém, essa confusão é, até certo ponto, compreensível,
pois a Bíblia nem sempre usa a expressão “vontade de Deus” no
mesmo sentido.

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Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

a. A diversidade terminológica

Nas línguas originais em que a Bíblia foi escrita, tanto hebraico


quanto grego, existem diferentes palavras para expressar os diver-
sos sentidos da vontade de Deus.
No hebraico do Antigo Testamento temos as palavras “râtsôn”,
“chêphets” e “‘êtsâh”:

• râtsôn (‫ )ָרֹצןן‬- Se refere à vontade de Deus no sentido de ser


aquilo que é o seu prazer:

“Faze o bem a Sião, segundo tua boa vontade; edifica


os muros de Jerusalém.” (Sl 51.18 – A21)

“A balança desonesta é abominação para o SENHOR,


mas o peso justo é o seu prazer.” (Pv 11.1 – A21)

• chêphets (ֵֶ‫ )חפץ‬- Se refere à vontade de Deus tanto no sen-


tido de ser aquilo que é o seu prazer, como no sentido de ser
aquilo que é o seu interesse:

“Sou eu que anuncio o fim desde o princípio, e desde a


antiguidade, as coisas que ainda não sucederam; sou
eu que digo: O meu conselho subsistirá, e realizarei
toda a minha vontade” (Is 46.10 – A21)

“Mas Samuel disse: Por acaso o SENHOR tem tanto


prazer em holocaustos e sacrifícios quanto em que se
obedeça à sua voz? Obedecer é melhor que oferecer
sacrifícios, e o atender, melhor que a gordura de car-
neiros.” (1 Sm 15.22 – A21)

“Ou tem o Todo-Poderoso interesse em que sejas justo


ou algum lucro em que faças perfeitos os teus cami-
nhos?” (Jó 22.3 – JFAA)

• ‘êtsâh (‫ – )ֵעצה‬é a vontade de Deus no sentido de conselho,


propósito e plano.

“O plano do SENHOR permanece para sempre, e os


intuitos do seu coração, por todas as gerações.”
(Sl 33.11 – A21)

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“Há muitos planos no coração do homem, mas o pro-


pósito do SENHOR prevalecerá.” (Pv 19.21 – A21)

“Ó SENHOR, tu és o meu Deus; eu te exaltarei e lou-


varei o teu nome, porque fizeste maravilhas; os teus
conselhos antigos são fidelidade perene.”
(Is 25.1 – A21)

Já no grego do Novo testamento temos as palavras “thelēma” e


“boulēma” para designar vontade e “eudokia” para referir-se à boa
vontade.

• thelēma (θέλημα) - Esse é um termo bem abrangente para


designar a vontade de Deus, pois tem sentidos variados.
Pode tanto ter o sentido de regras de vida (vontade moral)
como também de planos soberanos de Deus.

“venha o teu reino, seja feita a tua vontade, assim na


terra como no céu.” (Mt 6.10 – A21)

“O Deus de paz (...) vos aperfeiçoe em toda boa obra,


para fazerdes a sua vontade, realizando em nós o
que perante ele é agradável, por meio de Jesus Cris-
to, a quem seja a glória para todo o sempre. Amém.”
(Hb 13.20,21 – A21)

“Pois a vontade de Deus é que, fazendo o bem, caleis


a ignorância dos insensatos.” (1 Pe 2.15 – A21)

• boulēma (βούλημα) - Esse termo para designar a vontade


de Deus é mais específico. Ele se refere à vontade de Deus
no sentido de desígnio, propósito, conselho, ou seja, no sen-
tido de resolução e determinação.

“ele, que foi entregue pelo conselho determinado e


pela presciência de Deus, vós o matastes, crucifican-
do-o pelas mãos de ímpios” (At 2.23 – A21)

“Então me dirás: Por que Deus ainda se queixa? Pois,


quem pode resistir à sua vontade?” (Rm 9.19 – A21)

• eudokia (εὐδοκία) - Esse termo é traduzido como “agrado”


ou “boa vontade”. Ele está relacionado, de forma subjetiva, à
satisfação e ao prazer de Deus; e de forma objetiva, ao bom

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desejo e ao bom propósito de Deus. Refere-se aos propósi-


tos soberanos de Deus, mas também àquilo que traz honra
e prazer para Deus.

“e nos predestinou para si mesmo, segundo a boa de-


terminação de sua vontade, para sermos filhos adoti-
vos por meio de Jesus Cristo.” (Ef 1.5 – A21)

“E fez com que conhecêssemos o mistério da sua von-


tade, segundo a sua boa determinação, que nele
propôs.” (Ef 1.9 – A21)

“porque é Deus quem produz em vós tanto o querer


como o realizar, segundo a sua boa vontade.”
(Fl 2.13 – A21)

b. A insuficiência do estudo terminológico

Conhecer os diversos termos bíblicos é apenas o primeiro passo


para alcançarmos a compreensão do que é a vontade de Deus.
Vimos que há diversos termos para referir-se a ela, e é por isso que
não podemos descrevê-la com uma simples definição, mas, sim,
com uma série de distinções.
O simples estudo dos termos é insuficiente para a nossa compreen-
são, visto que a própria Bíblia aplica sentidos diferentes para uma
mesma palavra. Por isso, é necessário fazer um trabalho sistemático
das ocorrências dos diferentes sinônimos da palavra “vontade” para,
assim, tirarmos algumas conclusões teológicas importantes.

c. A vontade de Deus sistematizada em quatro sentidos

Ao sistematizar os diversos termos bíblicos podemos encontrar qua-


tro sentidos distintos para a vontade Deus:

• Vontade Eterna de Deus;


• Vontade Soberana de Deus;
• Vontade Moral de Deus;
• Vontade de Deus na distribuição dos dons e chamamentos.

2. A VONTADE ETERNA DE DEUS

A vontade eterna de Deus é também chamada nas Escrituras de

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“O Propósito Eterno de Deus”. Esse propósito eterno é a vontade


central e governante de Deus, ou seja, todo decreto de Deus e
todas as suas realizações na história estão fundamentadas, centrali-
zadas e convergidas nesse propósito eterno. Ele é tanto a sua moti-
vação primária como também o seu alvo final. Portanto, o propósito
eterno de Deus é aquilo que é central em seu coração, é o seu
desejo mais profundo, é o que o motiva.

a. A importância de se conhecer a vontade eterna de Deus

Tudo no universo está alinhado a essa vontade central de Deus,


pois este propósito eterno é o que define e dá significado a tudo
que existe. Deus governa e administra a história da humanidade,
rumo à consumação do seu propósito eterno. Por isso, conhecer
esse propósito é fundamental para todo cristão, pois, sem compre-
ender a vontade central de Deus nada em nossa vida terá sentido.

b. A vontade eterna de Deus revelada nas Escrituras

Essa vontade central de Deus não está oculta a nós, Deus a reve-
lou nas Escrituras. O apóstolo Paulo, ao despedir-se dos irmãos em
Éfeso, disse que não deixou de anunciar-lhes todo o propósito de
Deus:

“Porque não deixei de vos anunciar todo o propósito


de Deus.” (At 20.27 – A21)

Em sua carta aos efésios, ele deixa clara a revelação deste propó-
sito eterno:

Bendito seja o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo,


que nos abençoou com todas as bênçãos espirituais
nas regiões celestiais em Cristo. 

Porquanto, Deus nos escolheu nele antes da criação


do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em
sua presença. E, em seu amor, nos predestinou para
sermos adotados como filhos, por intermédio de Jesus
Cristo, segundo a benevolência da sua vontade, para
o louvor da sua gloriosa graça, a qual nos outorgou
gratuitamente no Amado. 

Nele, temos a redenção, o perdão dos nossos peca-


dos pelo seu sangue, segundo as riquezas da graça

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de Deus, e que Ele fez derramar sobre nós com toda


a sabedoria e entendimento. 

E nos revelou o mistério da sua vontade, de acordo


com o seu bom propósito que Ele estabeleceu em
Cristo, isto é, de fazer convergir em Cristo tudo quan-
to existe, todos os elementos que estão no céu como
os que estão na terra, na dispensação da plenitude
dos tempos.

Nele, fomos também escolhidos, tendo sido predes-


tinados conforme o plano daquele que cria abso-
lutamente tudo de acordo com o propósito da sua
própria vontade, com o objetivo de que nós, os que
primeiro esperamos em Cristo, sejamos para o louvor
da sua glória. 

Nele, igualmente vós, tendo ouvido a Palavra da ver-


dade, o Evangelho da vossa salvação, e nele também
crido, fostes selados com o Espírito Santo da Promes-
sa, que é a garantia da nossa herança, para a reden-
ção da propriedade de Deus, para o louvor da sua
glória. (Ef 1.3-14 – KJA)

Paulo estava inspirado por Deus ao escrever para a Igreja em Éfe-


so acerca da revelação do propósito eterno de Deus. Ele começa
bendizendo a Deus como a fonte de toda benção, e logo segue
descrevendo as várias ações abençoadoras de Deus. Ele faz ques-
tão de enfatizar o envolvimento específico de cada uma das três
pessoas da trindade divina nesse trabalho abençoador: O Pai elege,
o Filho redime e o Espírito Santo sela. Isso mostra que Deus está
inteiramente comprometido; envolvido e engajado nesse trabalho
gracioso.

c. A vontade eterna de Deus é a revelação e a exaltação da


sua própria glória

O mais interessante é que ao concluir cada uma dessas ações aben-


çoadoras de Deus, o apóstolo Paulo esclarece a sua finalidade, ou
seja, o propósito dessas ações de Deus: “para o louvor da sua glória”.
Por três vezes, nos versos 6, 12 e 14 do mesmo capítulo, é dito que
a finalidade de todas as coisas que Deus realiza é para louvor de
sua própria glória.

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“... E, em seu amor, nos predestinou para sermos ado-


tados como filhos, por intermédio de Jesus Cristo, se-
gundo a benevolência da sua vontade, para o louvor
da sua gloriosa graça,...” (v. 6)

“... tendo sido predestinados conforme o plano daque-


le que cria absolutamente tudo de acordo com o pro-
pósito da sua própria vontade, com o objetivo de que
nós, os que primeiro esperamos em Cristo, sejamos
para o louvor da sua glória…” (v.12)

“... nele também crido, fostes selados com o Espírito


Santo da Promessa, que é a garantia da nossa heran-
ça, para a redenção da propriedade de Deus, para o
louvor da sua glória”. (v.14)

Diante disso podemos dizer que a mais importante motivação do


universo é a glória de Deus. Toda ação de Deus está centralizada na
revelação e na exaltação da sua própria glória, essa é a sua vontade
central, esse é o seu propósito eterno.

d. A vontade eterna de Deus e a centralidade do Filho

Essa motivação de Deus em ser glorificado acontece dentro de


uma relação dinâmica de amor existente na trindade divina. O Pai
ama o Filho e a sua vontade é manifestar e glorificar o Filho, por isso,
em certo momento na eternidade passada, o Pai decidiu presentear
o Filho como uma expressão do seu perfeito amor. Esse presente
consiste em duas coisas: um Reino e uma Noiva:

• Um Reino: O Pai criou todas as coisas para o Filho a fim de


torná-lo Senhor sobre todas elas:

“E nos revelou o mistério da sua vontade, de acor-


do com o seu bom propósito que Ele estabeleceu em
Cristo, isto é, de fazer convergir em Cristo tudo quan-
to existe, todos os elementos que estão no céu como
os que estão na terra, na dispensação da plenitude
dos tempos.” (v. 10)

“Ele nos tirou do domínio das trevas e nos transpor-


tou para o reino do seu Filho amado, em quem te-
mos a redenção, isto é, o perdão dos pecados. Ele é a

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imagem do Deus invisível, o primogênito sobre toda a


criação; porque nele foram criadas todas as coisas nos
céus e na terra, as visíveis e as invisíveis, sejam tronos,
sejam dominações, sejam principados, sejam poderes;
tudo foi criado por ele e para ele. Ele existe antes de
todas as coisas, e nele tudo subsiste; ele também é a
cabeça do corpo, que é a igreja; é o princípio, o pri-
mogênito dentre os mortos, para que em tudo tenha
o primeiro lugar. Porque foi da vontade de Deus que
nele habitasse toda a plenitude.” (Cl 1.13-19 – A21)

“Eu estava olhando nas minhas visões noturnas e vi


que alguém parecido com filho de homem vinha nas
nuvens do céu. Ele se dirigiu ao ancião bem idoso e
a ele foi levado. E foi-lhe dado domínio, e glória, e
um reino, para que todos os povos, nações e línguas
o servissem; o seu domínio é um domínio eterno, que
não passará, e o seu reino é tal que não será destruí-
do.” (Dn 7.13,14 – A21)

“Então, vi no céu aberto um cavalo branco, e seu ca-


valeiro chama-se Fiel e Verdadeiro. Ele julga e luta
com justiça. Os seus olhos eram como chama de fogo;
sobre a cabeça trazia muitas coroas. E tinha um nome
escrito, que ninguém conhece, senão ele mesmo. Es-
tava vestido com um manto salpicado de sangue, e
seu nome é o Verbo de Deus. Os exércitos do céu o
seguiam montados em cavalos brancos e vestidos de
linho fino, branco e puro. Uma espada afiada saía-lhe
da boca, para ferir com ela as nações. Ele as regerá
com cetro de ferro; e ele mesmo é o que pisa o lagar
do vinho do furor da ira do Deus todo-poderoso. No
manto, sobre a coxa, traz escrito o nome: Rei dos reis
e Senhor dos senhores.” (Ap 19.11-16 – A21)

• Uma Noiva: O Pai criou a humanidade à semelhança do Filho


para que esta fosse participante de sua natureza e glória.
A humanidade foi criada para ser fascinada pela glória do
Filho de Deus, conhecer o seu perfeito amor e amá-lo com
esse mesmo amor. Dentre a humanidade Deus escolheu um
povo para pertencer e glorificar ao seu Filho por meio de
amá-lo acima de todas as coisas. Esse povo eleito pelo Pai
para pertencer ao Filho é chamado de ‘Noiva’, e ela estará

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para sempre unida a ele por meio de uma aliança eterna e


indestrutível.

“Porquanto, Deus nos escolheu nele antes da criação


do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis em
sua presença.” (v. 4)

“Nele, fomos também escolhidos, tendo sido predes-


tinados conforme o plano daquele que cria absoluta-
mente tudo de acordo com o propósito da sua própria
vontade, com o objetivo de que nós, os que primeiro
esperamos em Cristo, sejamos para o louvor da sua
glória.” (vs. 11,12)

“Todo o que o Pai me der virá a mim, e quem vier a


mim eu jamais rejeitarei.” (Jo 6.37 – NVI)

“Pai, quero que os que me deste estejam comigo


onde eu estou e vejam a minha glória, a glória que
me deste porque me amaste antes da criação do
mundo.” (Jo 17.24 – NVI)

“Assim como a igreja está sujeita a Cristo, também as


mulheres estejam em tudo sujeitas a seus maridos.
Maridos, amem suas mulheres, assim como Cristo
amou a igreja e entregou-se a si mesmo por ela
para santificá-la, tendo-a purificado pelo lavar da
água mediante a palavra, e apresentá-la a si mesmo
como igreja gloriosa, sem mancha nem ruga ou coisa
semelhante, mas santa e inculpável. Da mesma for-
ma, os maridos devem amar as suas mulheres como
a seus próprios corpos. Quem ama sua mulher, ama a
si mesmo. Além do mais, ninguém jamais odiou o seu
próprio corpo, antes o alimenta e dele cuida, como
também Cristo faz com a igreja, pois somos membros
do seu corpo. Por essa razão, o homem deixará pai
e mãe e se unirá à sua mulher, e os dois se tornarão
uma só carne. Este é um mistério profundo; refiro-me,
porém, a Cristo e à igreja. Portanto, cada um de vocês
também ame a sua mulher como a si mesmo, e a mu-
lher trate o marido com todo o respeito.
(Ef 5.24-33 – NVI)

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“Os vinte e quatro anciãos e os quatro seres viven-


tes prostraram-se e adoraram a Deus, que estava
assentado no trono, e exclamaram: Amém, Aleluia!
Então veio do trono uma voz, conclamando: Louvem
o nosso Deus, todos vocês, seus servos, vocês que o
temem, tanto pequenos como grandes! Então ouvi
algo semelhante ao som de uma grande multidão,
como o estrondo de muitas águas e fortes trovões,
que bradava: Aleluia! pois reina o Senhor, o nosso
Deus, o Todo-poderoso. Regozijemo-nos! Vamos nos
alegrar e dar-lhe glória! Pois chegou a hora do ca-
samento do Cordeiro, e a sua noiva já se aprontou.
Foi-lhe dado para vestir-se linho fino, brilhante e puro.
O linho fino são os atos justos dos santos. E o anjo me
disse: Escreva: Felizes os convidados para o banquete
do casamento do Cordeiro! E acrescentou: Estas são
as palavras verdadeiras de Deus.” (Ap 19.4-9 – NVI)

e. Deus é glorificado por meio de conquistar o amor do seu


povo

Conquistar o amor do seu povo é o desejo de Deus que arde em


seu coração, pois é a sua vontade suprema. Toda ação de Deus
está centralizada nesse objetivo: criar e redimir um povo para si
mesmo, para o louvor e exaltação da sua glória.
Deus está empenhado em forjar para si um povo que não terá
outros deuses nem outros amores. Um povo que tem o SENHOR
como o seu único Deus, ou seja, que tem o SENHOR como o único
sentido de suas vidas, como a sua única fonte de segurança, paz,
alegria e satisfação. Costumamos dizer que se a Bíblia fosse uma
canção, o seu refrão seria: “eles serão o meu povo, e eu serei o seu
Deus”. Pois essa é a frase que Deus mais repete em toda a Bíblia.
Deus revelou o seu desejo ao patriarca Abraão:

“Estabelecerei a minha aliança como aliança eterna


entre mim e você e os seus futuros descendentes,
para ser o seu Deus e o Deus dos seus descenden-
tes.” (Gn 17.7 – NVI)

Deus reafirmou o seu desejo aos descendentes de Abraão por meio


de Moisés:

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“Apareci a Abraão, a Isaque e a Jacó como o Deus


Todo-poderoso; mas não me conheceram pelo meu
nome, o SENHOR. Estabeleci a minha aliança com
eles para dar-lhes a terra de Canaã, a terra de suas
peregrinações, onde foram peregrinos. Ouvi o gemi-
do dos israelitas, que os egípcios vêm escravizando, e
lembrei-me da minha aliança. Por isso, dize aos israe-
litas: Eu sou o SENHOR. Eu vos tirarei do trabalho for-
çado sob os egípcios, vos livrarei da escravidão e vos
resgatarei com braço estendido e com grandes feitos
de juízo. Eu vos tomarei por meu povo e serei vosso
Deus; e sabereis que eu sou o SENHOR vosso Deus,
que vos tiro do trabalho forçado sob os egípcios.”
(Ex 6.3-7 – A21)

“Virei aos israelitas ali, e a tenda será santificada pela


minha glória. Santificarei a tenda da revelação e o al-
tar. Também consagrarei Arão e seus filhos, para que
me sirvam como sacerdotes. Habitarei no meio dos
israelitas e serei o seu Deus; e eles saberão que eu
sou o SENHOR seu Deus, que os tirou da terra do Egi-
to para habitar no meio deles. Eu sou o SENHOR seu
Deus.” (Ex 29.43-46 – A21)

“Habitarei no meio de vocês e não os desprezarei. An-


darei em seu meio; serei o seu Deus, e vocês serão o
meu povo.” (Lv 26.11-12 – NVT)

Deus continuou firme em seu desejo, mesmo em meio à infidelida-


de do seu povo:

“Dias virão, diz o SENHOR, em que farei uma nova


aliança com a casa de Israel e com a casa de Judá.
Ela não será como a aliança que fiz com seus pais,
quando os peguei pela mão para tirá-los da terra do
Egito, pois eles quebraram a minha aliança, mesmo
sendo eu o senhor deles, diz o SENHOR. Mas esta é
a aliança que farei com a casa de Israel depois da-
queles dias, diz o SENHOR: Porei a minha lei na sua
mente e a escreverei no seu coração. Eu serei o seu
Deus, e eles serão o meu povo. E não ensinarão mais
cada um a seu próximo, nem cada um a seu irmão,

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dizendo: Conhecei o SENHOR; porque todos me co-


nhecerão, do mais pobre ao mais rico, diz o SENHOR.
Porque perdoarei a sua maldade e não me lembrarei
mais dos seus pecados.” (Jr 31.31-34 – A21)

“Os pecados de Israel e de Judá - os pecados do povo


de Jerusalém, dos reis, dos oficiais, dos sacerdotes e
dos profetas - provocaram minha ira. Meu povo deu
as costas para mim e se recusou a voltar. Embora
eu os tenha ensinado repetidamente, não quiseram
receber instrução nem obedecer. Colocaram seus
ídolos detestáveis em meu templo e o profanaram.
Construíram lugares de adoração a Baal no vale de
Ben-Hinom e ali sacrificaram seus filhos e filhas a Mo-
loque. Jamais ordenei tamanha maldade; nunca me
passou pela mente! Esse terrível mal fez Israel pecar.
Agora, quero dizer algo mais a respeito desta cidade.
Vocês afirmam: ‘Ela será entregue ao rei da Babilônia
por meio de guerra, fome e doença’. Mas assim diz o
Senhor, o Deus de Israel: Certamente trarei meu povo
de volta de todas as nações entre as quais o espalhei
em minha fúria. Eu os trarei de volta para este lugar
e farei que vivam em segurança. Eles serão o meu
povo, e eu serei o seu Deus. Eu lhes darei um só cora-
ção e um só propósito: adorar-me para sempre, para
o seu próprio bem e para o bem de seus descenden-
tes. Estabelecerei com eles uma aliança permanente:
jamais deixarei de lhes fazer o bem. Porei em seu co-
ração o desejo de me adorar, e eles nunca se afas-
tarão de mim. Terei alegria em lhes fazer o bem e os
plantarei nesta terra firmemente, de todo o coração.”
(Jr 32.32-41 – NVT)

Deus persiste em seu desejo não porque o povo merece o se favor,


mas por causa da honra do seu nome:

Eu os espalhei entre as nações para castigá-los por


sua conduta. Quando, porém, foram espalhados en-
tre as nações, desonraram meu santo nome. Pois as
nações diziam: ‘Este é o povo do Senhor, mas ele não
foi capaz de mantê-lo a salvo em sua própria terra!’.
Tive consideração por meu santo nome, que meu

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povo desonrou entre as nações. Portanto, transmita


ao povo de Israel esta mensagem do Senhor Sobe-
rano: Eu os trarei de volta, ó povo de Israel, mas não
porque merecem. Farei isso por causa do meu santo
nome, que vocês desonraram entre as nações. Eu lhes
mostrarei a santidade de meu grande nome, o nome
que vocês desonraram entre as nações. E, quando eu
mostrar minha santidade por meio de vocês diante
das nações, diz o Senhor, elas saberão que eu sou
o Senhor. Pois eu os reunirei dentre as nações e os
trarei de volta para sua terra. Então aspergirei sobre
vocês água pura, e ficarão limpos. Eu os purificarei de
sua impureza e sua adoração a ídolos. Eu lhes darei
um novo coração e colocarei em vocês um novo es-
pírito. Removerei seu coração de pedra e lhes darei
coração de carne. Porei dentro de vocês meu Espírito,
para que sigam meus decretos e tenham o cuidado
de obedecer a meus estatutos. Vocês habitarão em
Israel, a terra que dei a seus antepassados. Vocês se-
rão o meu povo, e eu serei o seu Deus.”
(Ez 36.19-28 – NVT)

Esse desejo de Deus é uma promessa irrevogável:

“Nunca mais se contaminarão com ídolos, nem com


imagens detestáveis, nem com qualquer de suas re-
beliões, pois eu os salvarei de sua apostasia pecami-
nosa. Sim, eu os purificarei; então eles serão o meu
povo, e eu serei o seu Deus. Meu servo Davi será seu
rei, e eles terão um só pastor. Seguirão meus estatutos
e terão o cuidado de guardar meus decretos. Viverão
na terra que dei a meu servo Jacó, a terra onde seus
antepassados viveram. Eles, seus filhos e seus netos
viverão ali para sempre, de geração em geração, e
meu servo Davi será seu príncipe para sempre. Farei
com eles uma aliança de paz, uma aliança perma-
nente. Eu lhes darei sua terra e os multiplicarei e es-
tabelecerei meu templo no meio deles para sempre.
Sim, eu habitarei no meio deles. Serei o seu Deus, e
eles serão o meu povo. E, quando meu templo estiver
entre eles para sempre, as nações saberão que eu sou
o Senhor, que santifico Israel.” (Ez 37.23-28 – NVT)

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A consumação de todas as coisas é Deus alcançando o seu desejo:

“Então vi um novo céu e uma nova terra. Pois o primei-


ro céu e a primeira terra já se foram, e o mar já não
existe. Vi a cidade santa, a nova Jerusalém, que descia
do céu, da parte de Deus, enfeitada como uma noiva
preparada para seu noivo. E ouvi uma forte voz, que
vinha do trono e dizia: O tabernáculo de Deus está
entre os homens, pois habitará com eles. Eles serão
o seu povo, e Deus mesmo estará com eles. Ele lhes
enxugará dos olhos toda lágrima; e não haverá mais
morte, nem pranto, nem lamento, nem dor, porque as
primeiras coisas já passaram. O que estava assentado
sobre o trono disse: Eu faço novas todas as coisas! E
acrescentou: Escreve, pois estas palavras são fiéis e
verdadeiras. Disse-me ainda: Está cumprido: Eu sou o
Alfa e o Ômega, o princípio e o fim. A quem tiver sede,
darei de beber de graça da fonte da água da vida.
Aquele que vencer herdará essas coisas; e eu serei
seu Deus, e ele será meu filho.” (Ap 21.1-7 – A21)

f. Como devemos nos relacionar com a vontade eterna de


Deus?

Não tem como se relacionar com Deus e não ser contagiado pelo
mesmo anseio do seu coração. Como pessoas que foram alcança-
das pelo infinito amor de Deus devemos moldar toda nossa vida,
desejos e decisões em torno dessa mesma paixão obsessiva e fun-
damental de Deus, que se resume em ter um povo totalmente con-
sagrado a ele. Se isso é o que consome o coração de Deus, é isso
também que deve consumir o nosso coração. Se nisso é que Deus
está empenhado, é nisso também que devemos gastar nosso tem-
po, nossos pensamentos, nossas forças e energia.
Não tem como afirmar que amamos a Deus se nós não sabemos
qual é a sua paixão e o que comove o seu coração. Nós não temos
desculpas em relação a isso! A vontade eterna de Deus não está es-
condida nem oculta a nós, pelo contrário, ele a revelou nas Escritu-
ras, do início ao fim. Precisamos mergulhar mais profundamente no
conhecimento dessa vontade para que sejamos pessoas segundo o
coração de Deus, que têm no âmago de seu ser o mesmo desejo e
anseio que ele tem dentro de si.

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Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

3. A VONTADE SOBERANA DE DEUS

A vontade soberana de Deus refere-se aos decretos pelos quais


Deus realiza a história, isto é, refere-se ao plano traçado por Deus
para tudo o que acontece no mundo. Enquanto a vontade eterna
de Deus está relacionada ao seu propósito eterno (alvo ou objetivo
no qual ele quer chegar), a sua vontade soberana está relacionada
aos meios e processos pelos quais ele alcança esse propósito.

a. Definição dos decretos divinos

A vontade soberana de Deus é também chamada de “vontade de-


cretiva de Deus”, pois é por meio dos seus decretos que ele realiza
e administra todos os acontecimentos da história. De acordo com o
Catecismo de Westminster os decretos de Deus podem ser defini-
dos da seguinte maneira:

“Os decretos de Deus são os atos sábios, livres e san-


tos do conselho da sua vontade, pelos quais, desde
toda a eternidade, Ele, para a sua própria glória, imu-
tavelmente predestinou tudo o que acontece.”
(Catecismo Maior de Westminster, pergunta 12, pag. 3).1

Os decretos de Deus estão relacionados ao fato de ele ser sobe-


rano sobre todas as coisas. Não há nada que aconteça no mundo
criado por Deus que não seja decretado por ele. Tudo o que acon-
tece está debaixo da sua divina providência. Parafraseando o Cate-
cismo de Heidelberg de 1.563, podemos dizer que:

“A providência divina é a força totalmente poderosa


e presente, com que Deus, pela sua mão, sustenta
e governa o céu, a terra e todas as criaturas. Assim
como ervas e plantas, chuva e seca, anos frutíferos e
infrutíferos, comida e bebida, saúde e doença, rique-
za e pobreza. Todas as coisas não nos sobrevêm por
acaso, mas da mão paternal de Deus.”

b. Três considerações importantes a respeito da vontade so-


berana de Deus:

1
Fonte: dhttp://www.monergismo.com/textos/catecismos/catecismo_
heidelberg.htm)

55
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

1ª Consideração: A vontade soberana de Deus é sempre


cumprida

Deus, Todo Poderoso, cumpre toda a sua vontade sem que qual-
quer um de seus planos seja impedido. Foi ele mesmo que o disse
ao seu povo por intermédio do profeta Isaías:

“Lembrai-vos disso e considerai; trazei-o à memória, ó


transgressores. Lembrai-vos das coisas passadas des-
de a antiguidade: Que eu sou Deus, e não há outro;
eu sou Deus, e não há outro semelhante a mim. Sou
eu que anuncio o fim desde o princípio, e desde a an-
tiguidade, as coisas que ainda não sucederam; sou eu
que digo: O meu conselho subsistirá, e realizarei toda
a minha vontade, chamando do oriente uma ave de
rapina, e de uma nação distante, o homem do meu
conselho; sim, eu disse e cumprirei essas coisas. Esta-
beleci esse propósito e também o executarei.”
(Is 46.8-11 – A21)

Foi essa a sabedoria alcançada por Jó:

“Bem sei que tudo podes e que nenhum dos teus pla-
nos pode ser impedido.” (Jó 42.2 – A21)

E essa é a sabedoria ensinada pelo rei Salomão:

“Muitos são os planos no coração do homem, mas o


que prevalece é o propósito do Senhor.”
(Pv 19.21 – NVI)

A vontade soberana de Deus é incondicional e absoluta, significan-


do que faz parte do decreto de Deus todos os atos do passado,
presente e futuro, como também todas as circunstâncias antece-
dentes e subsequentes a eles. Deus decretou tanto os fins quan-
to os meios. Um exemplo disso é a salvação de pecadores: Deus
não decretou apenas que salvaria pecadores (o fim), mas também
como eles seriam salvos (o meio). Decretou até mesmo os detalhes
de como isso aconteceria, ou seja, em quais circunstâncias eles se-
riam salvos (quem, como, quando e onde).
A vontade soberana de Deus também é universal e abrangente,
significando que a sua vontade decretiva não se limita apenas ao

56
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

plano de redenção, mas também inclui tudo o que se passa no


mundo, quer seja grande ou pequeno, bom ou mau. Significa tam-
bém que apesar dos decretos referirem-se primeiramente às obras
de Deus (atos realizados pessoalmente por ele), abrange também
as ações de suas criaturas livres (anjos e homens). Isso não significa
que as pessoas são “marionetes” nas mãos de Deus, agindo contra
as suas próprias vontades. Não há na Bíblia nenhum fundamento
para esse tipo de pensamento; quando o homem age, ele o faz
segundo a sua própria vontade e determinação, pois Deus decre-
tou que o homem fosse um agente livre. Contudo, mesmo agindo
segundo a sua própria vontade o ser humano realiza o decreto de
Deus. A vontade soberana de Deus não é uma possibilidade, mas
uma certeza, por isso, tanto cristãos como não cristãos certamente
cumprirão o seu decreto.
Sobre isso, Heber escreve:

“o controle que Deus tem da história independe de


nosso desejo de submeter-nos a ele. Tanto ímpios
quanto justos cumprem essa vontade. Até quando fa-
zem o mal, cumprem os seus decretos. Pelo fato dessa
vontade estar relacionada aos infalíveis decretos de
Deus, ela sempre é cumprida. Não há quem possa
deter ou impedir o Senhor.”2

A Bíblia deixa claro que até mesmo as más ações dos homens fa-
zem parte do decreto soberano de Deus:

“O SENHOR fez tudo com um propósito; sim, até o ím-


pio para o dia do mal.” (Pv 16.4 – A21)

Um exemplo disso está na vida de José e seus irmãos. José, ao olhar


para o passado de sua história, percebeu que tudo o que lhe acon-
tecera fazia parte dos planos santos, sábios e soberanos de Deus,
até mesmo as ações livres e perversas de seus irmãos contra ele.

“Deus me enviou adiante para salvar a vida de vocês


e de suas famílias, e para salvar muitas vidas. Portanto,
foi Deus quem me mandou para cá, e não vocês! E foi
ele quem me fez conselheiro do faraó, administrador

2
Heber Campos Jr, Tomando Decisões Segundo a vontade de Deus, Pag. 51.

57
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

de todo o seu palácio e governador de todo o Egito.”


(Gn 45.7, 8 – NVT)

“Vocês pretendiam me fazer o mal, mas Deus plane-


jou tudo para o bem. Colocou-me neste cargo para
que eu pudesse salvar a vida de muitos.”
(Gn 50.20 – NVT)

Até mesmo o maior ato de crueldade de toda a história, o maior de


todos os crimes, o pior de todos os pecados – a morte do Filho de
Deus – fazia parte do decreto divino:

“Ele foi entregue conforme o plano preestabelecido


por Deus e seu conhecimento prévio daquilo que
aconteceria. Com a ajuda de gentios que desconhe-
ciam a lei, vocês o pregaram na cruz e o mataram.”
(At 2.23 – NVT)

“De fato, isso aconteceu aqui, nesta cidade, pois He-


rodes Antipas, o governador Pôncio Pilatos, os gentios
e o povo de Israel se uniram contra Jesus, teu santo
Servo, a quem ungiste. Tudo que fizeram, porém, ha-
via sido decidido de antemão pela tua vontade.”
(At 4.27,28 – NVT)

A execução do decreto de Deus não depende de qualquer condi-


ção que se pode ou não cumprir, pois ele certamente será cumpri-
do. Com isso não estamos querendo dizer que Deus é o autor do
mal da mesma forma que é o autor do bem, visto que a maldade
está sempre presente no mundo.
Com respeito a isso Louis Berkhof escreve:

“É costume dizer que o decreto de Deus, no respei-


tante ao mal moral, é permissivo. Por Seu decreto,
Deus tornou as ações pecaminosas do homem infa-
livelmente certas de acontecerem, sem decidir efe-
tuá-las agindo imediatamente sobre a vontade finita
e nela. Quer dizer que Deus não opera positivamente
no homem “tanto o querer como o realizar”, quando
o homem vai contra a Sua vontade revelada. Deve-
-se observar cuidadosamente, porém, que este decre-
to permissivo não implica uma permissão passiva de

58
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

algo que não está sob o controle da vontade divina.


É um decreto que garante com absoluta certeza a
realização do ato pecaminoso futuro, em que Deus
determina (a) não impedir a autodeterminação pe-
caminosa da vontade finita; e (b) regular e controlar
o resultado dessa autodeterminação pecaminosa. Sl
78.29; 106.15; At 14.16; 17.30.”3

O homem é responsável por seus atos, pois tudo o que realiza ele o
faz porque quer. A soberania de Deus e a responsabilidade humana
é um mistério profundo, como bem escreve o autor A. W. Pink:

“Lado a lado com a imutabilidade e invencibilidade


dos decretos de Deus, as Escrituras ensinam clara-
mente que o homem é uma criatura responsável e
que tem que responder por suas ações. E se as nossas
ideias se formam com base na Palavra de Deus a de-
fesa de um daqueles ensinos não levará à negação
do outro (Reconhecemos sem reservas que há real
dificuldade em definir onde um termina e o outro co-
meça). Sempre acontece isto quando há uma conjun-
ção do divino e do humano. A verdadeira oração é di-
tada pelo Espírito e, não obstante, é também o clamor
do coração humano. As Escrituras são a Palavra de
Deus inspirada, mas foram escritas por homens que
eram algo mais que máquinas nas mãos do Espírito.
Cristo é Deus e homem. Ele é onisciente, mas crescia
em sabedoria (Lucas 2:52). É todo-poderoso porém “...
foi crucificado por fraqueza...” (2 Coríntios 13:4). É o
Príncipe da vida e, contudo, morreu. Mistérios profun-
dos são estes, mas a fé os recebe sem contestação.

Tem-se assinalado muitas vezes no passado que toda


objeção contra os decretos eternos de Deus aplica-se
com igual intensidade contra a Sua eterna presciên-
cia. “Se Deus decretou ou não todas as coisas que
acontecem, aqueles que admitem a existência de
Deus reconhecem que Ele sabe de antemão todas
as coisas. Pois bem é evidente que se Ele conhece

3
Louis Berkhof, Teologia Sistemática, Pag. 97

59
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

de antemão todas as coisas, Ele as aprova ou não as


aprova, isto é, ou quer que se realizem, ou não quer.
‘Mas, querer que se realizem é decretá-las”
(Jonathan Edwards).4
2ª consideração: A vontade soberana de Deus é secreta

A Bíblia proíbe procurarmos saber os decretos de Deus relaciona-


dos ao futuro através de meios pagãos:

“Não vos voltareis para os que consultam os espíritos


dos mortos nem para os que adivinham o futuro, por-
quanto eles vos contaminariam. Eu Sou Yahweh, vosso
Deus.” (Lv 19.31 – KJA)

Mas ele também não nos promete revelar a sua vontade soberana
através de meios cristãos:

“O Senhor, nosso Deus, tem segredos que ninguém


conhece. Não seremos responsabilizados por eles,
mas nós e nossos filhos somos responsáveis para sem-
pre por tudo que ele nos revelou, para que obedeça-
mos a todos os termos desta lei.” (Dt 29.29 – NVT)

Os decretos de Deus não são dirigidos ao homem, não são da mes-


ma natureza de uma lei moral revelada e ordenada por Deus a
nós para que a obedeçamos. Eles estão ocultos em Deus que não
nos promete revelá-los, embora, por algum motivo, possa ocasio-
nalmente fazê-lo por meio de profecia.
Sobre isso Heber escreve:

“Enquanto os preceitos são todos revelados, apenas


uma pequena fração dos decretos nos é revelada.
Deus revelou certos decretos no AT que já se cum-
priram e revelou outros no NT, acerca da vinda de
Jesus, que estão por se cumprir, mas a maior par-
te dos decretos está escondida de nós. Como bem
disse o teólogo holandês Wihelmus à Brakel (1635-
1711), essa “vontade pode, frequentemente, ser

4
A. W. Pink, Os Atributos de Deus, Pag. 10.

60
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

percebida somente em retrospecto”. Isto é, só quando


ela acontece é que sabemos que um determinado
acontecimento estava nos planos de Deus. Quando
essa vontade é revelada, é para que reconheçamos
a soberania do Senhor no momento em que o evento
ocorrer (ex: profecias escatológicas na Bíblia).”5

Portanto, não devemos nos preocupar nem gastar nossa energia


com coisas que Deus não intentou nos revelar. Se ele nos priva
desse conhecimento, com certeza, é para que possamos aprender
a viver um dia de cada vez e para que cresçamos na dependência
e confiança nele. Precisamos aprender a crer que a nossa vida está
nas poderosas mãos de Deus e o nosso futuro guardado e escon-
dido nele.

3ª consideração: A vontade soberana de Deus revela


muito acerca do nosso guia.

Enquanto a vontade moral do Senhor revela o seu caráter santo (o


que vamos ver na próxima aula), a sua vontade soberana revela a
sua sabedoria, poder, justiça e bondade.
Somente um Deus infinitamente sábio seria capaz de idealizar um
plano tão grandioso, abrangente, perfeito, cheio de detalhes e por-
menores; e somente um Deus tão poderoso seria capaz de levar
esse plano à sua realização. Geralmente quando nossos planos não
se realizam é porque não tínhamos a sabedoria suficiente para pla-
nejá-los corretamente, ou porque nos faltou poder para executá-
-los. Mas com Deus isso não ocorre, pois ele tem toda sabedoria e
poder para levar adiante o seu grandioso plano.
A vontade soberana de Deus, além de revelar a sua infinita sabe-
doria e poder, revela a sua justiça e bondade. Ele faz, por exemplo,
com que todos os dias o sol nasça sobre justos e injustos, porque
não julga segundo a aparência, mas segundo a sua justiça. Deus é
longânimo, paciente, misericordioso, e retarda a sua ira todos os
dias, porém, estabeleceu um dia em que julgará cada pecado ou
ato de maldade cometido no mundo. Deus é tão justo e bom que
quando a humanidade pecou, se rebelando atrevidamente contra

5
Heber Campos Jr, Tomando Decisões Segundo a Vontade de Deus, Pag. 52.

61
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

a sua autoridade, ele não a destruiu nem a abandonou em sua mi-


séria; ele não a tratou segundo a sua maldade (usou de bondade),
mas também não a ignorou (usou de justiça).
A fim de revelar em um único ato a sua justiça e bondade, desceu
de sua glória e se introduziu em nosso meio como um mero mortal,
sujeito às mesmas fraquezas e tentações. Ele fez isso, mesmo sa-
bendo que seria rejeitado e crucificado, para que por meio de sua
morte e ressurreição nós (os que ele amou antes da fundação do
mundo) pudéssemos nascer de novo para uma vida incorruptível.
Por meio de sua humilhação e sofrimento ele nos tornou participan-
tes de sua natureza e glória.
Tudo isso faz parte da beleza gloriosa do decreto soberano de
Deus. Agora ele aguarda o dia que foi preestabelecido para o seu
retorno glorioso, quando definitivamente acabará com todos os
que pervertem o mundo. Quando esse dia chegar, não haverá mais
dor, pecado nem sofrimento, pois ele é justo e justificador daqueles
que nele confiam. Portanto, os seus decretos são justos e bons, e
todos eles fazem com que a história chegue à consumação gloriosa.

c. Como devemos nos relacionar com a vontade soberana


de Deus?

Precisamos aprender a confiar no nosso bom Pastor, pois os seus


olhos estão constantemente sobre nós. Ele está envolvido em cada
detalhe de nossas vidas e nos conhece profundamente, mais do
que nos conhecemos a nós mesmos. Isso é escandaloso, mas tam-
bém maravilhoso, e deve nos encher de espanto e gratidão como
bem expressa o salmista:

Ó Senhor, tu examinas meu coração e conheces tudo


a meu respeito. Sabes quando me sento e quando
me levanto; mesmo de longe, conheces meus pensa-
mentos. Tu me vês quando viajo e quando descanso;
sabes tudo que faço. Antes mesmo de eu falar, Se-
nhor, sabes o que vou dizer. Vais adiante de mim e me
segues; pões sobre mim a tua mão. Esse conhecimen-
to é maravilhoso demais para mim; é grande demais
para eu compreender!

É impossível escapar do teu Espírito; não há como


fugir da tua presença. Se subo aos céus, lá estás; se
desço ao mundo dos mortos, lá estás também. Se eu

62
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

tomar as asas do amanhecer, se habitar do outro lado


do oceano, mesmo ali tua mão me guiará, e tua força
me sustentará. Eu poderia pedir à escuridão que me
escondesse, e à luz ao meu redor que se tornasse noi-
te, mas nem mesmo na escuridão posso me esconder
de ti. Para ti, a noite é tão clara como o dia; escuridão
e luz são a mesma coisa.

Tu formaste o meu interior e me teceste no ventre


de minha mãe. Eu te agradeço por me teres feito de
modo tão extraordinário; tuas obras são maravilhosas,
e disso eu sei muito bem. Tu me observavas quando
eu estava sendo formado em segredo, enquanto eu
era tecido na escuridão. Tu me viste quando eu ainda
estava no ventre; cada dia de minha vida estava re-
gistrado em teu livro, cada momento foi estabelecido
quando ainda nenhum deles existia.

Como são preciosos os teus pensamentos a meu res-


peito, ó Deus; é impossível enumerá-los! Não sou ca-
paz de contá-los; são mais numerosos que os grãos de
areia. E, quando acordo, tu ainda estás comigo.
(Sl 139.1-18 – NVT)

Precisamos aprender a descansar com humildade na vontade sobe-


rana de Deus, pois ele está cuidando de nós. Ele não está distante
e nem alheio a nós, mas envolvido em todos os detalhes da nossa
vida, seja em grande ou pequena escala, e usa todas as circunstân-
cias para o bem. Creia! Existe um Deus no controle da história e ele
é bom, portanto, não somos vítimas de ninguém, nem mesmo das
circunstâncias, pois estamos em suas mãos.
Não há ansiedade nem desespero na mente daquele que confia na
soberania de Deus, pois ele descansa no fato de que todas as coisas
estão cooperando para o bem daqueles que o amam.

“E sabemos que Deus faz todas as coisas cooperarem


para o bem daqueles que o amam e que são chama-
dos de acordo com seu propósito.” (Rm 8.28 – NVT)

Os que confiam na soberania de Deus não se frustram diante do


mal que lhes sobrevêm, pois sabem que nada os pode separar do
amor de Deus.

63
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

O que nos separará do amor de Cristo? Serão aflições


ou calamidades, perseguições ou fome, miséria, peri-
go ou ameaças de morte? Como dizem as Escrituras:
“Por causa de ti, enfrentamos a morte todos os dias;
somos como ovelhas levadas para o matadouro”. Mas,
apesar de tudo isso, somos mais que vencedores por
meio daquele que nos amou. E estou convencido de
que nem morte nem vida, nem anjos nem demônios,
nem o que existe hoje nem o que virá no futuro, nem
poderes, nem altura nem profundidade, nada, em
toda a criação, jamais poderá nos separar do amor de
Deus revelado em Cristo Jesus, nosso Senhor.
(Rm 8.35-39 – NVT)

d. Leitura complementar: A vontade soberana de Deus e a


oração

Muitos cristãos ao se depararem com o conhecimento da imutabili-


dade dos decretos de Deus, por não o compreender corretamente,
caem no erro de uma vida passiva, deixando até mesmo de orar.
Por isso, questionam: “Se em sua providência Deus ordena de ante-
mão todas as coisas que estão para acontecer, qual é a finalidade
da oração?” ou “Por que orar se todas as coisas já estão previamente
determinadas?”
Para ajudar no entendimento correto desta questão, selecionamos
um texto complementar retirado do livro O Ser de Deus e as suas
obras: A PROVIDÊNCIA e sua realização histórica do Dr. Heber Car-
los de Campos, páginas 27 a 29. Ele traz vários argumentos para
fundamentar a prática da oração, mesmo o decreto de Deus sendo
imutável:

Devemos orar porque é uma ordem do Senhor

1. A primeira resposta que vem à mente daqueles que


são mais esclarecidos, mas simplistas, é esta: “Deve-
mos orar simplesmente porque Deus mandou que
orássemos pedindo as coisas de que necessitamos.
É uma simples questão de obediência a uma ordem
de Deus.” Embora essa resposta seja verdadeira, não
fugindo dos parâmetros estabelecidos pela Escritura,

64
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

ela não responde todas as ânsias de quem faz a per-


gunta acima honesta e sinceramente, nem exaure as
possibilidades de respostas mais elaboradas e justas,
que também estão de acordo com o ensino geral das
Santas Escrituras, que é o padrão único de fé e prática
para os crentes da ortodoxia cristã.*

Devemos orar porque somos dependentes de Deus

3. Uma terceira resposta tem a ver com o senso de de-


pendência que possuímos. Oramos não simplesmente
porque reconhecemos nossa necessidade, mas tam-
bém porque reconhecemos que somente Deus tem
o poder para dar resposta às nossas necessidades. A
oração nos coloca em nosso verdadeiro lugar, no de
criaturas dependentes do Deus criador e providente.

Muitos não gostam de orar porque isso implica em


humilhação, em sujeição a alguém mais poderoso ou
ainda, em confissão de impotência para resolver os
problemas. Todavia, é exatamente assim que Deus
quer que nos sintamos: dependentes totalmente de
sua providência.

Devemos orar para ver os propósitos de Deus cumpridos

4. Uma quarta resposta tem a ver com o cumprimen-


to dos planos de Deus. Deus não somente determina
os fins, mas também os meios para conseguir os fins.
Assim como Deus resolveu salvar algumas pessoas
pela loucura da pregação, assim também ele resolver
providenciar para as necessidades de suas criaturas
usando as orações como um meio para isso.

Há uma ótima ilustração deste ponto. Deus havia


dado alguns anos de estio à terra de Samaria e veio
uma fome extrema sobre ela (1 Rs 18.2). Elias era o
profeta naquela época. Deus havia determinado dar
chuva para regar a terra, pois ele anunciara de an-
temão a Elias o seu propósito. Veja o que ele diz a
Elias: “Vai, apresenta-te a Acabe, porque darei chuva

65
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

sobre a terra” (1 Rs 18.1), mas o fato de saber de an-


temão que Deus haveria de mandar chuva, Elias orou
para que chovesse (Tg 5.17-18) e, então, Deus ouviu
a oração de Elias. A providência é soberana de Deus
e, no entanto, ele usa as orações do seu povo para
Ter as suas providências tomadas. Os planos são de
Deus e na sua realização ele usa os instrumentos ou
as causas secundárias.

Devemos orar para glorificar o nome de Deus

5. Uma quinta resposta tem a ver com a glorificação do


nome de Deus. Quando oramos reconhecemos que
não só o poder pertence a Deus, mas que ele tem do-
mínio sobre todas as coisas. Quando reconhecemos
isto, nós o glorificamos. Quando Elias orou pedindo
chuva, ele reconheceu o controle que Deus possuía
sobre todos os elementos da natureza. Quando su-
plicamos a Deus pelas suas compaixões para com os
nossos queridos que ainda não são cristãos, estamos
reconhecendo o seu domínio sobre os corações deles
e a sua soberana administração da sua bondade. Por-
tanto, as providências de Deus são efetuadas sobe-
ranamente por ele, mas ele não dispensa as orações
dos seus filhos, porque estas o glorificam sobremanei-
ra. Ore, então, para que Deus seja glorificado mercê
de suas providências.

Devemos orar porque é parte do nosso culto a Deus

6. Uma sexta resposta tem a ver com o culto que presta-


mos a Deus na combinação das orações com a provi-
dência divina. Como já foi dito acima, as orações são o
instrumento de Deus para a consecução de muitas de
suas obras providenciais. Quando isso acontece, nós o
cultuamos. Aliás, o que geralmente fazemos quando
vamos aos cultos gratulatórios? Vamos agradecer-lhe
as bênçãos da sua bondade em nossa vida de famí-
lia, nossa vida pessoal, nossa vida profissional, e coisas
dessa natureza. As respostas às orações geralmente

66
A VONTADE DE DEUS
Os Quatro Sentidos da Vontade de Deus

provocam em nós o senso de culto ao Senhor provi-


dente. Essa é uma outra razão porque devemos orar.

Providência e oração não são excludentes entre si. Ao


contrário, elas se completam maravilhosamente no
sentido em que Deus se utiliza delas para ensinar-nos
sobre as nossas necessidades, sobre o poder que ele
tem para resolver nossas necessidades, sobre o nosso
dever de glorificar o seu nome e prestar-lhe culto por
suas providências e, finalmente, para ensinar-nos que
a oração foi estabelecida por ele para ser instrumento
da consecução dos seus planos.

* No original, do ítem 1 passa para o ítem 3 - mantivemos.

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