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Larissa Esposto
Tainá Araújo
Turma C; 2021.1
1. Introdução
O presente trabalho tem como objetivo fazer uma análise da obra de restauro do Solar
do Unhão na Bahia em 1958 por Lina Bo Bardi, utilizando os escritos da própria arquiteta sobre
sua obra a fim de entender seu pensamento crítico em relação à arquitetura de sua época nos
períodos de 1950-1970 e como suas críticas se explicitavam em sua maneira de projetar. Dessa
forma, será discutido, com o auxílio de textos produzidos por Bo Bardi, o discurso glamuroso e
progressista sob o qual era pautada a produção arquitetônica do Brasil que trazia consigo a
promessa de tirar o país do subdesenvolvimento, porém com custos que eram ignorados por
grande parte das academias elitistas, e que muitas das vezes não levavam em conta as
especificidades do país.
A partir disso, o trabalho irá tratar do Solar do Unhão, mais especificamente os registros
de Lina sobre sua própria obra, a fim de entender sua visão sobre o modo de fazer arquitetura
no contexto brasileiro daquela época.
Achilina di Enrico Bo, conhecida mundialmente como Lina Bo Bardi, foi uma arquiteta
Italiana de origem humilde, mas de ideais grandiosos. Formada na Faculdade de Arquitetura de
Roma, em 1939; sempre a par dos assuntos que tangiam as culturas arquitetônicas marginais
italianas, Achilina sai de uma Roma com um cenário político instável e vai para Milão em 1940,
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Disponível em: <http://centrocultural.sp.gov.br/2021/03/10/lina-bo-bardi-recebe-homenagem-da-
bienal-de-veneza/>. Acesso em 17 out. 21
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onde começa a dar seus primeiros passos como arquiteta. Chegando a Milão, Bo Bardi é
chamada por Pietro Pagani para participar de seu estúdio – Bo e Pagani – e colabora em diversas
revistas, como a revista Lo Stile – nella casa e nell’arredamento, com Gio Ponti.
“[...] para quem chega pelo mar, [na baía da Guanabara] via o Ministério da
Educação e Saúde avançava como um grande navio branco e azul contra o céu. A
primeira imagem de paz após o dilúvio da Segunda Guerra Mundial. Me senti num país
inimaginável, onde tudo era possível. Me senti felizmente e no Rio de Janeiro não tinha
ruínas.” (Lina Bo Bardi e Marcelo Carvalho Ferraz (coord.). Lina Bo Bardi. São Paulo:
Fundação Lina Bo e P. M. Bardi, 1993, 12.)
No Brasil, Lina encontra uma nova potência para suas ideias. Existe, para a arquiteta, uma
possibilidade de concretização das ideias propostas pela arquitetura moderna num país com uma
cultura recente, em formação, diferente do pensamento europeu.
“[...] nas ruínas das casas destruídas durante a guerra enxergava-se toda a falsidade de
hipocrisia com que eram construídas, os estilos falsos, o gesso, as cortinas, os móveis
como cenários de um mundo decadente.” (Lina Bo Bardi. “Na Europa a casa do homem
ruiu”. Rio, Rio de Janeiro, n. 42, fev. 1947. Citação retirada de: André Augusto de Almeida
Alves. Arquitetura e sociedade em São Paulo 1956 – 1968: projetos de Brasil moderno.
2003. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade de
São Paulo, São Paulo, 2003, 176)
A citação acima revela muito os ideais da arquiteta a partir da sua saída da Europa, pois trata
da simplicidade e foco às necessidades do povo, e assim se mostrando oposta aos desejos e
frivolidades de uma burguesia.
“Tenho horror em projetar casas para madames, onde entra aquela conversa
insípida em torno da discussão de como vai ser a piscina, as cortinas (...)” (BARDI, Lina
Bo, 1976)
Em 1950, Lina Bo Bardi e seu marido criaram a Revista Habitat, que servirá como
divulgador das ações do Museu de Arte de São Paulo - MASP. Além disso, a revista se tornará
um dos principais veículos de publicação de suas opiniões e críticas sobre o que está à sua volta:
a cultura e arte brasileira, revelando a visão mais otimista da arquiteta em comparação ao que
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Como já citado, Lina se encanta com as terras brasileiras e com as possibilidades de uma
nação que estava em meio a um processo de construção de identidade do país e de seu povo,
enxergando nisso um preciosismo imperdível. No entanto, se depara com um discurso que vai,
em grande parte, contra os seus ideais; um discurso que segue padrões elitistas, com valores
importados da Europa, que por sua vez, naquele momento, vivia um contexto distinto daquele
vivido no Brasil.
Lina Bo Bardi sai da Europa no contexto do pós-guerra e o discurso feito por lá era a
produção de uma arquitetura rápida e funcional, que atendesse as necessidades de um país
arrasado. Quando Lina chega ao Brasil, percebe que aqui também era necessária uma produção
arquitetônica que abraçasse as necessidades do povo e que não fosse baseada em estilos; uma
arquitetura para o povo, e segundo ela, não era isso que vinha sendo discutido entre a
comunidade de arquitetura brasileira de sua época. O que ela via era uma produção
arquitetônica elitista embarcada em premissas de rapidez e modernidade que estava pautada
em discurso importado da Europa. Entretanto, aqui no Brasil o contexto era outro. Nosso
território não tinha passado pela Grande Guerra, logo o discurso arquitetônico e a forma de
produção de arquitetura que estava em pauta no Brasil nesse período não condizia e não
respeitava as particularidades e as necessidades do povo brasileiro. Portanto, as críticas de Lina
ocorrem em torno desse tipo de arquitetura produzida aqui no contexto moderno.
“Faltam casas, falta tudo, é preciso ser rápido, construir, e depois veremos
como ficou. As cidades brasileiras se ressentem dessa febre de improvisação, revelam
uma humanidade que quer organizar-se rapidamente, ganhar tempo: uma humanidade
que trabalha e merece um momento de meditação e não a anulação esnobe de uma
pseudo-cultura.” (Lina Bo Bardi e Marcelo Carvalho Ferraz (coord.). Lina Bo Bardi. São
Paulo: Fundação Lina Bo e P. M. Bardi, 1993, 95.)
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Segundo a própria arquiteta, um dos momentos mais importantes de sua carreira foi o
tempo que passou lecionando no Nordeste do país, quando em 1958 foi convidada para lecionar
Teoria da Arquitetura na Bahia. É nessa época que Lina recebe a proposta de restaurar o Solar
do Unhão.
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Disponível em: <https://arquitecturaviva.com/works/rehabilitacion-del-solar-do-unhao-0>. Acesso em
17 out. 21
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A partir disso, fica fácil entender o que norteia sua vontade de restaurar o Conjunto do
Unhão arruinado.
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Fonte: ArchDaily3
Nas edições seguintes do editorial “Olho Sobre a Bahia” Lina segue discorrendo sobre o
que acredita ao tratar de edifícios históricos, restauração e, sobretudo, “a alma de uma cidade”
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Disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/778186/classicos-da-arquitetura-solar-do-unhao-
lina-bo-bardi>. Acesso em 17. out 21
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Um dos elementos presentes no projeto de restauro do Solar que solidifica muito bem
a união entre o tradicional popular e o “novo” é a ilustre escada de pau d’arco e ipê amarelo na
“belíssima estrutura de madeira de lei” da casa, como ela afirmava. Escada e estrutura passavam
a ser indissociáveis, sobretudo porque a escada estava construída com o sistema de encaixes
dos antigos carros de boi, com suas peças amarradas. Assim, essa união de encaixe tradicional,
oriunda das rodas dos carros de boi, com um elemento estrutural arquitetônico que, por sua
vez, se tornaria o centro do edifício, revelam a conexão entre o moderno e o tradicional.
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Disponível em <http://docomomo.org.br/wp-content/uploads/2016/01/012.pdf>. Acesso em 17. out
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Percebe-se então, que a arquiteta revela em seus textos as vivências que teve para
chegar ao projeto e que para ela teoria e prática não se distanciam. No Solar, em específico, Lina
mergulha de cabeça na cultura local Nordestina para sentir o que é a vivência do povo para que
só assim, seja que capaz de perceber suas necessidades e como eles se apropriam do espaço,
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Disponível em <
http://acervo.institutobardi.org/collections/drawings/result?project=Solar%20do%20Unh%C3%A3o>.
Acesso em 17. out 21
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sem a ótica utópica do modernismo acadêmico de criar um ser humano ideal, que de ideal não
tinha nem a altura.
5. Conclusão
Tratar sobre Lina Bo Bardi é, de certa forma, um desafio, mas sempre engrandecedor.
Seria impossível abordar neste trabalho todo o valor que as obras de Lina, tanto teóricas quanto
construídas, possuem para a arquitetura brasileira. Sendo assim, este ensaio teve como
proposta olhar para o que uma mulher arquiteta estrangeira apaixonada pelo Brasil escreveu e
produziu inserida no contexto brasileiro entre os períodos de 1950-1970. A partir dos escritos
sobre o Solar do Unhão e sobre conservação de patrimônio de uma forma geral, é possível
enxergar com clareza o que era de fato importante para Lina. Fica evidente, também, como a
maneira de projetar da arquiteta explicita suas críticas ao movimento moderno de sua época.
Ao final deste ensaio é importante ter a compreensão de que quando Bo Bardi fala sobre uma
arquitetura boa ela não fala somente do programa ou da usabilidade de um edifício. Lina com
suas críticas ao moderno, não contradiz só a arquitetura em si, mas sim o que há de humano no
modelo de produzir a arquitetura moderna brasileira.
Com o que escreveu sobre o Solar do Unhão vemos como Lina Bo Bardi dava valor à
cultura local e a defesa de manter viva a “alma da cidade”, indo de frente com o apagamento
dessas culturas marginais promovido pelo modelo moderno elitista e excludente; cultura essa
que era invisibilizada pela elite acadêmica, mas que era presente em cada esquina do país. Por
fim, Lina advoga não só sobre a arquitetura, mas sobre a humanidade presente nela.
6. Bibliografia
ANELLI, Renato. Ponderações sobre os relatos da trajetória de Lina Bo Bardi na Itália. revista
do programa de pós-graduação em arquitetura e urbanismo da FAUUSP, v.17, n.27. p.086-101.
2010.
BARDI, Lina Bo; FERRAZ, Marcelo Carvalho (coord.). Lina Bo Bardi. São Paulo: Fundação Lina Bo
e P. M. Bardi, 1993.
BO BARDI, Lina. Cinco Anos entre os Brancos, Mirante das Artes, São Paulo,
novembro/dezembro de 1967.
BO BARDI, Lina. Museu de Arte Moderna da Bahia, Diário de Notícias, Salvador, 06 de janeiro
de 1960.
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KAMIMURA, Rodrigo. Arquitetura do povo, com o povo para o povo: teoria e critica – J.B,
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ZOLLINGER, Carla Brandão. O Trapiche à beira da baía: a restauração do Unhão por Lina Bo
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