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Francisco Beltrão – PR
2019
BRUNA CAROLINE OTTOBELLI
Francisco Beltrão – PR
2019
BRUNA CAROLINE OTTOBELLI
Prof. M Ia C. S. P. Batista.
Aos meus amados pais. Vocês são a razão de tudo.
O término e entrega do trabalho de conclusão de curso é a ocasião em que
nós, acadêmicos, nos damos conta que o curso está acabando e refletimos sobre tudo
o que passamos para chegar até aqui: todos os medos, as angústias, as esperanças.
Agradeço a Deus: pela vida e por todos que foram colocados no meu
caminho e que me apoiaram ou me ensinaram algo.
Agradeço aos meus pais, Ivécio e Silvani, por toda a confiança depositada
em mim, por toda a compreensão que sempre tiveram, e, principalmente, pelo amor
incondicional.
Aos meus tios, Silmara e Néris, por todo carinho e pelo auxílio prestado
para que a minha formação acadêmica fosse possível.
Aos meus amigos Winicius, João, Isabela, Helena, Anaíse, Pietro, Thais,
Gustavo: sou grata pelas conversas diárias, pela amizade de longa data. Minha vida
é mais alegre e fácil por ter vocês.
INTRODUÇÃO....................................................................................... 08
1 DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS....................................................... 10
1.1 Características e Estrutura dos Direitos Fundamentais......................... 13
1.2 Classificação dos Direitos Fundamentais e Sua Dupla Função............ 16
1.3 Da Eficácia Horizontal dos Direitos Fundamentais................................ 19
1.4 Dos Direitos do Acusado no Processo Penal........................................ 24
a) Da Dignidade da Pessoa Humana......................................................... 24
b) Do Devido Processo Legal.................................................................... 25
c) Do Direito à Integridade Moral............................................................... 26
d) Do Princípio da Presunção de Inocência............................................... 25
2 DA ATUAÇÃO DA MÍDIA NO PROCESSO PENAL............................ 33
2.1 Desenvolvimento dos Meios de Comunicação no Brasil....................... 33
2.2 Da Informação, Mídia e dos Meios de Comunicação............................ 36
2.3 Da Atuação da Mídia Diante do Princípio da Presunção de 40
Inocência................................................................................................
2.4 Análise de Casos................................................................................... 45
a) Caso Escola Base.................................................................................. 46
b) Caso “Bar Bodega”................................................................................ 48
c) Caso Nardoni......................................................................................... 52
3 PONDERAÇÃO ENTRE LIBERDADE DE EXPRESSÃO E 56
PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.............................................................
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................. 71
REFERÊNCIAS..................................................................................... 73
8
INTRODUÇÃO
DESENVOLVIMENTO
Ressalta-se ainda que foi nesse período da história - que restou marcado
pelas atrocidades cometidas contra a humanidade -, que surgiram os movimentos
neoconstitucionalistas, tendo em vista a necessidade de atribuir força jurídica às
normas constitucionais, concedendo efetividade aos direitos inerentes à pessoa
humana.
No Brasil, esse movimento criou força após um longo período de governo
militar, tendo sido instalada no país uma ditadura militar entre 1964 e 1985 – período
marcado por forte censura e mitigação dos direitos fundamentais.
Após a redemocratização, fora promulgada nova Constituição, seguindo as
tendências mundiais de proteção aos direitos do homem, estabelecendo amplo rol de
direitos fundamentais, fruto de uma opção política pela limitação do poder estatal e
pela intangibilidade da dignidade humana.
para concluir qual seria aplicável no caso concreto – ou deve existir uma exceção à
regra que elimine o conflito ou então uma das regras deve ser declarada invalida.
Uma colisão entre princípios, entretanto, é solucionada de forma
completamente distinta, sendo possível a flexibilização de um dos princípios – após
analisar-se qual deve prevalecer no caso concreto -, sem que isso resulte na
invalidade de tal princípio. Nas palavras de Robert Alexy:
Conflitos entre regras ocorrem na dimensão da validade, enquanto as
colisões entre princípios – visto que só princípios válidos podem colidir –
ocorrem para além dessa dimensão, na dimensão do peso. (ALEXY, 1986, p.
94)
interferir na esfera individual, é preciso que crie órgãos e instituições que viabilizem o
exercício do direito.
Podemos citar, nesse sentido, o direito do acusado à ampla defesa, que
exige do Estado a criação de medidas para assegurar que todos os cidadãos tenham,
efetivamente, o direito de defesa, como por exemplo a criação de defensorias
públicas.
Assim se manifesta o caráter duplo dos direitos fundamentais, bem
explicada pelo Mestre Paulo Mário Canabarro Trois Neto:
A expansão dos direitos fundamentais para além do abstencionismo estatal
exige do Estado uma atuação ativa. Como detentor do monopólio da força,
ele tem a função não apenas de respeitar os direitos fundamentais,
(perspectiva negativa), mas também de protege-los (perspectiva positiva)
contra ataques e ameaças de terceiros. Essa dupla missão acometida ao
Estado é em decorrência da dupla função que assumiram os direitos
fundamentais. Com isso, o Estado deixa de ser visto como o único “inimigo”
dos direitos fundamentais e passa a ser, também, “o caminho por meio do
qual sua realização pode se maximizar”. (TROIS NETO, 2011, p. 42)
poder, de tal sorte que a liberdade individual não apenas carece de proteção
contra os Poder públicos, mas também contra os mais fortes no âmbito a
sociedade, isto é, os detentores de poder social e econômico, já que é nessa
esfera que as liberdades se encontram particularmente ameaçadas, como
dão conta, entre tantos outros, os exemplos dos deveres de proteção na
esfera das relações de trabalho e a proteção dos consumidores. (SARLET,
2010, p. 378)
1
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Quinta Turma). Habeas Corpus nº 97336 RJ 2007/0305250-1.
Relator: Ministro Arnaldo Esteves Lima. Brasília: 15 de junho de 2010. Disponível em:
https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/19136035/habeas-corpus-hc-93874-df-2007-0259735-
5/inteiro-teor-19136036?ref=serp
2
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça (Terceira Turma). Embargos de Declaração no Recurso
Especial 1630889 DF 2016/0263665-1. Relator: Ministra Nancy Andrighi. Brasília: 27 de novembro
de 2018. Disponível em: https://stj.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/661802846/embargos-de-
23
declaracao-no-recurso-especial-edcl-no-resp-1630889-df-2016-0263665-1/inteiro-teor-
661802856?ref=juris-tabs
24
Tal princípio, que visa assegurar aos cidadãos um mínimo de direitos que
devem ser respeitados não só pelo Estado, mas pela sociedade em geral, é um
alicerce de todo o ordenamento jurídico pátrio, não podendo ser relativizado ou
mitigado, sob pena de abalar todo o sistema jurídico e Estado Democrático de Direito.
Entretanto, o tratamento degradante perpetrado pela mídia ao expor a
imagem e o detalhes da vida íntima do suspeito de um crime, ignorando ser este
presumidamente inocente, viola a dignidade da pessoa humana, pois esses indivíduos
usados como produto da mídia acabam tendo que conviver eternamente com as
consequências dessa exposição.
Assim mesmo, todos tem direito a um juiz predeterminado por lei, a defesa e
a assistência de advogado, a ser informados da acusação formulada contra
si, a um processo público sem dilações indevidas e com todas as garantias,
a utilizar os meios de prova pertinentes para sua defesa, a não testemunhar
contra si mesmo, a não se confessar culpado e à presunção de inocência.
Do artigo 19, 3, resta claro que, embora seja um direito fundamental, não é
absoluto, podendo sofrer limitações quando em confronto com outros direitos
fundamentais.
A proibição de censura está intimamente ligada ao ideal da liberdade de
expressão, traduzido na impossibilidade de intervenção estatal na veiculação de
informações.
Tais garantias são os pilares da liberdade de imprensa, que nada mais é
do que a liberdade de dizer, escrever, documentar e veicular notícias de interesse
público, sendo vedadas interdições ao livre exercício da atividade midiática.
Trata-se de uma atuação preponderantemente negativa do Estado, ou seja,
cabe-lhe não interferir de modo desproporcional sobre o pensamento e a expressão
dos cidadãos.
Entretanto, apesar da importância das disposições sobre a mídia na
Constituição, não há no Brasil uma legislação especifica que regulamente a atuação
dos meios de comunicação. O mais próximo que o Brasil chegou disso foi por
intermédio da Lei nº 5.250 de 9 de fevereiro de 1967 – chamada Lei de Imprensa, que
regulamentava a liberdade de manifestação do pensamento e de informação. (STF,
2009)
A referida lei, entretanto, fora derrubada pelo Supremo Tribunal Federal em
20 de abril de 2009, quando 7 dos 11 ministros declararam sua inconstitucionalidade,
por entender ser ela incompatível com a democracia e com a Constituição Federal de
1988.
Atualmente, a principal referência legal para a mídia é a Lei 4.117 de 27 de
agosto de 1962, que instituiu o Código Brasileiro de Telecomunicações, que objetiva
estabelecer normas gerais de funcionamento para os serviços de rádio e televisão no
país. Tal legislação, ainda, foi atualizada pela Lei nº 9.472 de 16 de julho de 1997 -
Lei Geral de Telecomunicações. (BRASIL, 1962)
38
Tal artigo, porém, nunca fora regulamentado, sendo que até os dias atuais
a produção e programação das emissoras é realizada de forma arbitrária, sem a
observância de tais dispositivos, visando interesses de grupos empresariais privados.
39
(G1, 28/06/2019)
(G1, 06/03/2019)
vírus HIV. O Jornal escrito Notícias Populares veiculou como manchete em sua capa
“Kombi era motel na escolinha do sexo”. (BAYER; AQUINO, 2014)
Ta tudo guardadinho aqui", falou apontando a testa. "Eu sei que o meu pai
não queria ser bandido." (DORNELES, 2007, p. 190)
Quanto à Cléverson, não há futuro a ser relatado: foi assassinado dois anos
depois, antes de completar vinte anos. Não se sabe quem são os autores do crime.
Ao contrário do assassinato dos jovens de classe média no Bar Bodega, a morte de
Cléverson nunca foi investigada.
c) Caso Nardoni
foram acusados de arremessar pela janela do sexto andar do edifício residencial onde
moravam a menina Isabella Nardoni, com então 05 (cinco) anos de idade. (LIMA,
2016)
O casal fora acusado pelo Ministério Público do Estado de São Paulo pela
prática do delito de homicídio qualificado por meio cruel, com a impossibilidade de
defesa da vítima e com objetivo de ocultar o crime. (LIMA, 2016)
A cobertura dos meios de comunicação em cima do fatos foi monstruosa.
A atividade midiática deixou de ter como interesse a disseminação de informação, e
tornou-se um verdadeiro duelo de audiências, deixando-se de lado a ética e o respeito
as garantias fundamentais das partes envolvidas.
A morte de uma criança tornou-se um espetáculo público. Na reconstituição
do crime, apartamentos vizinhos do edifício onde ocorrera o trágico evento foram
alugados para que fosse possível, em tempo real, registrar e transmitir.
E, dessa forma, os meios de comunicação, tanto televisivos quanto
escritos, tornaram o crime um show, divulgando todos os detalhes, desde os mais
relevantes até os mais irrisórios - como as roupas que os acusados usavam no dia -,
resultando em uma condenação popular antes da condenação pelo Poder Judiciário,
razão pela qual os réus tiveram que permaneceram encarcerados durante toda a
instrução processual.
A revista VEJA, em sua edição 2057 de 23 de abril de 2008, de forma
maliciosa, utilizando de sensacionalismo gráfico e verbal, estampa em sua capa a
fotografia dos acusados e, em letras grandes e facilmente visíveis a expressão
“FORAM ELES”, levando aqueles que vissem a capa a crerem que já havia uma
condenação, que não pairava mais quaisquer dúvidas acerca da autoria do delito:
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Não se pode negar que tal exposição irresponsável realizada pelos entes
midiáticos, visando unicamente ganhar audiência, deve ser coibida. Entretanto, não
sendo possível evitar a violação do direito, deve ao menos haver uma reparação
pecuniária, que vise compensar a vítima das violações.
Nesse sentido, por fim, a fixação do quantum indenizatório pelo I.
Desembargador Relator do processo:
Quanto ao valor da indenização, sabe que a intensidade do dano moral se
observa pela “magnitude da lesão”, devendo ser levados em conta “os
sofrimentos psíquicos e afetivos padecidos pela vítima” (ANTONIO JEOVÁ
SANTOS, Dano moral indenizável, 4ª ed., SP: RT, 2003, p. 188). No caso, o
dano causado ao apelante foi de extrema gravidade, porquanto atingiu sua
dignidade (art. 1º III CF) e imagem (art. 5º X CF), direitos fundamentais
garantidos pela Carta Maior. Sua honra e imagem foram maculadas perante
amigos, parentes, vizinhos e conhecidos. Assim, com vistas a atender a dupla
função da indenização, a saber: reparar o prejuízo, buscando minimizar os
danos sofridos e, punir o ofensor, para que não volte a incidir na conduta, é
necessário assegurar uma justa compensação, sem, entretanto, incorrer em
enriquecimento ilícito por parte de quem a recebe, e, paralelamente,
determinar a ruína daquele responsável pelo seu pagamento. Nesse rumo,
entendemos que o valor de R$ 300.000,00 (trezentos mil reais) é adequado,
conquanto inferior ao pretendido pelo apelante. Correção monetária a partir
do arbitramento (súm. 362 STJ), considerada a publicação deste acórdão, e
juros desde a data do evento danoso (15.10.03; súm. 54 STJ.)
CONSIDERAÇÕES FINAIS
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