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A Bíblia e a pena de morte, vista pelo filme “Milagre na Cela 7”

Jefferson Augusto Ribeiro

INTRODUÇÃO

A pena de morte faz parte da sociedade humana há milênios. Ela é entendida como a
punição definitiva para os crimes mais graves. Mas o que diz a Bíblia sobre este tema? Qual
deve ser a posição do servo de Deus, perante assunto tão controvertido?

À medida em que aumenta a incidência dos crimes violentos vemos alguns setores
movimentando-se para que a pena capital seja instaurada em nosso sistema judiciário. O filme
“Milagre na Cela 7” pode nos ajudar a refletir a respeito da validade de uso da pena de morte
nos dias atuais.

O ENREDO DO FILME

Toda a história do filme se passa com Memo, um homem com deficiência intelectual
que cria sua filha, Ova, com a ajuda de sua mãe. Tudo corria bem na vida do homem, até que
um dia, se envolveu em um acidente, e mesmo sem ter culpa, foi acusado de ser o assassino
da filha de um comandante do exército. A partir daí, a vida de Memo muda completamente,
pois ele acaba sendo preso. Devido à sua deficiência, o homem não consegue provar sua
inocência e permanece encarcerado.

Quando Memo chega à prisão, os outros homens ainda não sabiam que ele não tinha
ligação com o crime, mas mesmo assim o retaliaram. Com o passar do tempo, perceberam que
na verdade ele não tinha culpa, e começaram a pensar em formas de tirá-lo de lá. Para se
redimir, sentiam que precisavam ajudar Memo a sair da prisão, considerando que ele não era
culpado pelo crime, então, trouxeram a filha para que o visitasse. A criança, porém, acabou
tocando o coração de vários homens, e a partir de sua visita vários presos começaram a
repensar seus atos. Vários presos então começaram a se arrepender de seus crimes e pecados.
No desfecho do filme ocorre uma reviravolta, fazendo com que Memo seja liberto e um
companheiro de cela enforcado em seu lugar.
VISÃO BÍBLICA SOBRE A PENA DE MORTE

Segundo Albert Mohler1, o pensamento cristão a respeito da pena de morte deve


começar pelo fato de que a Bíblia prevê uma sociedade na qual a pena capital pelo assassinato
é às vezes necessária, porém deve ser extremamente rara. Mohler defende que:

 A pena de morte é explicitamente fundamentada no fato de que Deus criou cada ser
humano individualmente à sua própria imagem e, portanto, um ato de assassinato
intencional é um ataque à dignidade humana e à própria imagem de Deus. Aquele que
intencionalmente tira a vida por meio do assassinato, perde o direito à sua própria
vida.
 A Bíblia estabelece que deve haver um alto nível de evidências para se impor a pena
de morte. O ato de homicídio deve ser confirmado e corroborado pelo testemunho
ocular dos acusadores, e a sociedade deve tomar todas as precauções razoáveis para
garantir que ninguém seja punido injustamente.
 A Bíblia também afirma que a pena de morte, correta e justamente aplicada, terá um
poderoso efeito dissuasivo, sendo considerada um “firewall” necessário contra o
crescimento de mais violência letal.
 Há uma probabilidade muito maior de que um assassino pobre enfrente a execução do
que um rico, pois os ricos têm condições de pagar equipes de advogados de defesa
massivamente caras que podem exaurir a capacidade da promotoria de obter uma
sentença de pena de morte mesmo quando o réu é claramente culpado. A Bíblia
adverte, as pessoas não devem poder comprar a justiça por seus próprios termos.
 Os cristãos deveriam esperar, orar e lutar por uma sociedade na qual a pena de morte,
correta e raramente aplicada, faça sentido moral. Essa seria uma sociedade na qual
todos os direitos do acusado seriam protegidos e com toda garantia de que não seria o
status social do assassino que determinaria a sentença pelo crime.

Marcelo Andrade2 enumera, segundo ele, as 15 objeções mais comuns daquelas que
são contrários à pena capital rebatendo-as uma a uma bíblica e juridicamente. Vamos ver
algumas delas:

1
“Motivos para apoiar a pena de morte” MINISTÉRIO FIEL https://ministeriofiel.com.br/artigos/motivos-para-
apoiar-a-pena-de-morte/ Online, 22/01/ 2022
2
"Pela pena de morte" MONTFORT Associação Cultural
http://www.montfort.org.br/bra/veritas/politica/pelapena/ Online, 22/01/2022
 1ª objeção: Não pode haver pena de morte porque podem acontecer erros e acabar-
se matando inocentes.
Resposta: Segundo esse argumento, tudo o que contém algum risco de erro é ilegítimo.
Se esse argumento procedesse, deveriam ser proibidos o avião e o automóvel, porque
acontecem vários acidentes por ano e muitos inocentes morrem. "Abusus non tollit
usum" (o abuso não tolhe o uso), é uma máxima do Direito absolutamente verdadeira.
Caso contrário, a vida em sociedade seria impossível.

 2ª objeção: Um erro não justifica outro.


Resposta: a objeção normalmente parte do pressuposto de que a pena de morte é um
erro, sem se dar ao trabalho de provar isso. Se assim fosse, a mãe não poderia bater no
filho quando ele faz alguma travessura, já que bater é errado e não poderia ser usado
para corrigir outro erro. Dever-se-iam extinguir as cadeias, porque os erros dos
criminosos não justificariam outro erro que é o cárcere forçado. E assim por diante...

 3ª objeção: Só Deus pode tirar a vida. E Ele ordenou: "Não matarás".


Resposta: Na verdade, a ordem divina "Não matarás" significa que ninguém pode
matar sem motivo, sem razão. Não impede o assassinato em legítima defesa. Ora, a
pena de morte nada mais é do que a legítima defesa da sociedade contra o criminoso.
Se a objeção procedesse, não haveria previsão da pena de morte na Bíblia.

 4ª objeção: A Igreja Católica é contra a pena de morte.


Resposta: A Igreja sempre ensinou que a pena de morte é legítima. Ela não poderia ir
contra o que a Bíblia ensina de modo tão explícito. Quem se opõe à pena de morte não
é a Igreja, mas alguns padres e bispos. Paulo ensinou que a pena de morte é legítima
(Atos 25.10-11) e afirmou que existem ações que são dignas de morte (Romanos
1.32).

 5ª objeção: Não se pode punir os criminosos com a morte. Ninguém tem esse direito.
Resposta: É necessário punir os faltosos. A justiça manda "dar a cada um o que é seu".
Quando um ladrão rouba uma pessoa, cometeu uma injustiça e a vítima, além da
sociedade, é "credora" desse ladrão. Então, para se fazer justiça, o ladrão deve pagar.
Restituir o que subtraiu à vítima e pagar uma pena. A punição é necessária, e os
governantes têm o direito de punir (1Pd 2,13-14). A pena deve ser proporcional ao
agravo. Desse modo, para uma infração leve devemos ter uma pena leve, para uma
infração média, uma pena média, e para uma infração grave, por exemplo, um
assassinato, devemos ter uma pena forte, que é justamente a pena de morte. Por isso a
Bíblia elenca vários crimes que são dignos de morte.

 6ª objeção: A pena de morte não resolverá nada. Os EUA são a prova disso.
Resposta: Resolve sim. Primeiro porque um apenado com a pena capital não cometerá
crimes novamente. Segundo, porque nos países onde ela existiu, no decorrer da
história, sempre houve baixa criminalidade. Por exemplo, na França. Em Paris, entre
1749 e 1789 - quarenta anos - aconteceram apenas DOIS assassinatos. E hoje em dia,
nos países que aplicam a pena máxima - como é o caso dos países árabes e de
Cingapura - há baixíssima criminalidade. Nos EUA, se não houvesse pena de morte
haveria ainda mais crimes. Além disso, o sistema americano é imperfeito; há poucas
condenações e os processos são demorados demais. Em New York a criminalidade
está despencando e um dos motivos é a aprovação da pena de morte.

 13ª objeção: As penas devem ser educativas, para recuperar o criminoso, e não para
vingar.
Resposta: Toda a pena é vindicativa. A recuperação do criminoso está em segundo
plano. O primeiro dever do Estado é proteger a sociedade, e não recuperar o indivíduo.
O todo vale mais que a parte. Ademais, a pena de morte é extremamente educativa
para todo mundo.

 14ª objeção: A maioria das pessoas é contra a pena de morte.


Resposta: Não é verdade. A maioria das pessoas é a favor da pena capital. Nos EUA
em torno de 75%, no Brasil deve ser também. Bastaria um plebiscito para confirmar
esse dado.

CONCLUSÃO

Podemos concluir que pena de morte é defendida e praticada na Bíblia em várias


situações, com as ressalvas de que esse tipo de punição extrema deve ser aplicada somente:

 Em sociedades extremamente violentas;


 Em casos extremamente pontuais, respeitando a proporcionalidade ao agravo;
 Quando o crime for confirmado e corroborado pelo testemunho ocular dos acusadores,
para garantir que ninguém seja punido injustamente.

No contexto do filme “Milagre na Cela 7”, houve o cerceamento do direito de defesa


do acusado e um cenário de abuso de autoridade por parte do acusador, onde ele se aproveitou
de sua posição social privilegiada para fazer justiça com suas próprias mãos. Também não
houve investigação e procura por testemunhas do suposto crime, fazendo com que o acusado
pudesse ser condenado injustamente.

Este seria um exemplo de cenário em que uma pena injusta seria aplicada a um
inocente. Isso já acontece com alguma frequência em nossa sociedade, fazendo com que
pessoas injustamente acusadas fiquem presas por longo tempo mesmo sendo inocentes.

O que cabe defendermos como cristãos é que a justiça seja feita de forma transparente,
dando ao acusado todo o direito de defesa e, quando comprovado o crime, aplicando uma
pena proporcional a dívida que ele causou com o indivíduo prejudicado e visando proteger a
sociedade.

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