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7.out.2021 às 10h00
Atualizado: 11.out.2021 às 12h11
SÃO PAULO Mesmo dizendo ter memória ruim, a escritora russa Liudmila
Ulítskaia, de 78 anos, lembra bem o dia de março de 1953 quando o rádio
anunciou a doença de Josef Stálin (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2020/09/polemica-fez-stalin-
voltar-a-moda-conheca-fatos-sobre-o-ditador.shtml), que morreria pouco depois. "Eu, uma menina
frívola de dez anos, soltei em voz alta 'deve ser uma gripe ou um resfriado, e
eles saem divulgando para o país inteiro'. Mamãe deu um puxão tão forte na
minha trança que eu rangi os dentes. 'Calada!'”, conta, em entrevista por email,
a mulher que há anos frequenta o topo das listas de apostas para o Nobel de
Literatura (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/10/cinco-mulheres-lideram-apostas-para-nobel-de-literatura-
veja-quem-sao.shtml).
por Irineu Franco Perpetuo. A obra costura seis breves narrativas sobre a
infância na Moscou de fins dos anos 1940 e início dos 1950. “Eu tinha dez anos
de idade e, para mim, a época stalinista se resume aos sussurros dos adultos e à
relutância deles em conversar sobre coisas importantes na frente de nós,
crianças”, diz Ulítskaia, que nasceu em 1943.
Isso significa que ela não tem recordações do pior da Segunda Guerra Mundial,
a Grande Guerra Patriótica para os soviéticos
(https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/06/visoes-da-batalha-na-russia-e-no-ocidente-sao-inconciliaveis-ate-hoje.shtml).
“A infância tem suas alegrias, a amizade dos nossos pares, as brigas, os jogos e
segredos compartilhados. Na vida em família havia zonas de silêncio, não se
falava de certas coisas na frente das crianças. Mas as crianças são muito
sensíveis ao estado de ânimo dos adultos, e o sentimento de medo que os
nossos pais experimentaram foi transferido para nós.”
no Brasil “Era uma Vez uma Mulher que Tentou Matar o Bebê da Vizinha” e “A
Menininha do Hotel Metropol” (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2020/01/escritora-russa-volta-ao-
pais-para-desfilar-sua-esquisitice-com-show-e-livro-novo.shtml).
A escritora russa Liudmila Ulítskaia durante encontro com leitores em Moscou
- Divulgação
Na cabeça da autora, segundo a própria, não está “de modo algum o desejo de
contar alguma coisa para quem quer que seja”. “É antes o desejo de guardar
para mim. Minha memória é ruim, desde cedo tenho o hábito de escrever todo
tipo de acontecimento marcante. Muitos anos tiveram de se passar até que eu
percebesse que os meus textos tinham o direito de ser publicados. Foi só aos 50
anos de idade que o meu primeiro livro, uma coletânea de contos, veio a
público. Até então, não tinha coragem de publicar nada.”
Algo parecido ocorre com um dos protagonistas de "A Grande Tenda Verde",
romance que também lida com a juventude —um pouco mais crescida— logo
após a morte de Stálin e se espraia até os anos 1970. A tradução brasileira está
prevista para o ano que vem, também pela 34.
“Para minha grande tristeza, eu nunca vivi sob um governo que me agradasse.
Mesmo Gorbatchov só pôde ser avaliado positivamente nos tempos atuais,
depois de completado um longo percurso", ressalta ela.
Isso, é claro, evoca a Rússia de hoje, que tem como face do poder a mesma
figura desde 1999 –o rosto de Vladimir Putin (https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2019/08/czar-
do-seculo-21-putin-encara-abismo-apos-2-decadas-de-poder.shtml) .
“Me parece que na Rússia nunca se viveu tão bem como nos últimos anos.
Muitos vão discordar de mim. Essa melhoria da vida na Rússia, segundo me
parece, resulta de uma tendência universal à humanização da vida” diz
Ulítskaia.
“Na Rússia stalinista havia milhões de pessoas na prisão. Nos nossos tempos,
são cerca de 600 mil, aproximadamente o mesmo número que nos Estados
Unidos. E os prisioneiros políticos, de acordo com relatórios da Associação
Memorial, de Moscou, são cerca de 500 pessoas. Isso nem se compara aos
milhões que Stálin enviou aos campos de trabalho
(https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2019/12/nova-edicao-de-arquipelago-gulag-reapresenta-marco-da-literatura-de-
O que não significa que ela concorde com o tratamento dado a Alexei Navalni,
principal opositor de Putin que está preso desde janeiro, quando retornou ao
país após ser envenenado na Sibéria e levado para tratamento na Alemanha.
Ele acusa o líder russo de mandar assassinar o opositor, algo que o Kremlin
nega.
Ulítskaia também enxerga uma mão mais leve no trato com os escritores e uma
literatura russa que já não exibe a potência dos dias de Tolstói, Dostoiévski e
Tchekhov (https://www1.folha.uol.com.br/ilustrada/2021/04/entenda-por-que-a-russia-gerou-tantos-escritores-
fundamentais-no-seculo-19.shtml). “Tenho a impressão de que o governo se interessa muito
pouco pela literatura, a censura das obras de ficção é muito leve, débil, nem se
compara à censura dos tempos de Brejnev e Khruschov. Talvez porque a
literatura já não tem a importância cultural que tradicionalmente teve na
Rússia, desde o século 19 até o final do 20.”
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