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Motrivivência v. 26, n. 43, p.

183-197, dezembro/2014

http://dx.doi.org/10.5007/2175-8042.2014v26n43p183

RELAÇÕES ENTRE BELEZA E SAÚDE FEMININA:


um olhar a partir da perspectiva de
professoras de Educação Física

Angélica Teixeira da Silva Leitzke1


Tadeu João Ribeiro Baptista2
Ana Márcia Silva3

RESUMO

Pesquisa qualitativa do tipo descritiva objetivou discutir possíveis influências da


Indústria Cultural bem como da atual lógica de consumo nas relações entre beleza e
saúde feminina a partir de pesquisa realizada com 20 professoras de Educação Física
da rede pública de ensino de Goiânia/GO. Os dados indicam uma aproximação entre
os conceitos de beleza e saúde e marcas de um processo histórico de fetichização e
reificação do corpo feminino. É possível perceber, porém, movimentos de contradição
e resistência aos padrões impostos.

Palavra-chave: Corpo; Beleza; Saúde; Mulher; Indústria Cultural

1 Mestranda em Educação Física. UFPEL, Pelotas/Rio Grande do Sul, Brasil.


E-mail: angel.lilica@hotmail.com
2 Doutor em Educação. Docente da Faculdade de Educação Física/UFG. Goiânia/Goiás, Brasil.
E-mail: tadeujrbaptista@yahoo.com.br
3 Doutora em Ciências Humanas. Docente da Faculdade de Educação Física/UFG. Goiânia/Goiás, Brasil.
E-mail: amarciasi@gmail.com
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INTRODUÇÃO masculina –, como mencionado acima


(ALMEIDA, 2006; LOVISOLO, 2006;
O corpo tem se tornado, concomi- DAMICO; MEYER, 2006; SILVA; SILVA;
tantemente, palco e vitrine de intervenções BAPTISTA, 2012).
diversas com vistas a sua aceitação social, Este artigo discute âmbitos da in-
sobretudo desde a segunda metade do sécu- fluência da Indústria Cultural e da lógica de
lo XX (DUBY, 1991). Coerente com sua con- consumo nas relações entre beleza e saúde
dição de produto histórico, constantemente feminina a partir de uma análise das falas
se modifica a forma como o corpo é visto, de mulheres de diferentes faixas etárias,
percebido, concretizado ou mesmo consti- professoras de Educação Física da rede
tuído (MEYER, 2003), com uma gradativa pública de educação de Goiânia/GO. Neste
aproximação entre as percepções de saúde sentido, primeiramente discutiremos acerca
e beleza trazendo implicações que não têm da Indústria Cultural e suas ramificações,
sido problematizadas suficientemente pela bem como a respeito da lógica de consumo
literatura acadêmica.
e dos mecanismos para a criação do “dese-
Instâncias como a escola, a mídia,
jo” pelo “corpo perfeito”. Apresentaremos
as relações familiares, religiosas, trabalhistas
posteriormente os meandros metodológicos
são importantes influências a constituição
da pesquisa e destacaremos algumas carac-
do sujeito. Segundo Goellner (2003, p. 29):
terísticas de nossas pesquisadas. Por fim,
[...] diferentes marcas se incorporam realizaremos a análise dos dados a partir
ao corpo a partir de distintos processos do referencial teórico.
educativos presentes na escola, mas As relações entre beleza e saúde
não apenas nela, visto que há sempre aqui discutidas, influenciadas pela lógica
várias pedagogias em circulação. Fil-
mes, músicas, revistas e livros, imagens de consumo e pela Indústria Cultural, são
propagandas são também locais peda- temáticas muito exploradas no âmbito aca-
gógicos que estão o tempo todo a dizer dêmico. Discute-se a grande veiculação e
de nós, sejam pelo que exibem ou pelo
exposição de imagens de corpos magros,
que ocultam. Dizem também de nossos
corpos e, por vezes, de forma tão sutil jovens, belos, felizes e “saudáveis”, em
que nem mesmo percebemos o quanto prol da criação de ideais de beleza e venda
somos capturadas/os e produzidas/os da “melhor receita” para promoção e/ou
pelo que lá se diz.
manutenção da saúde (ARAÚJO, 2008;
BEZERRA, 2008; ALMEIDA et al, 2006;
Na mesma lógica de múltiplas deter-
DAMICO; MEYER, 2006; LOVISOLO,
minações caminha a percepção de beleza
2006; VIGARELLO, 2006; ROSA, 2005).
feminina. Uma percepção que tem se
Percebe-se que, de alguma forma,
apresentando mutável a partir de inúmeros
estes ideais de beleza largamente veicu-
processos e relações histórico-sociais, tais
lados são reforçados também nas práticas
como as influências da Indústria Cultural
vinculadas a Educação Física:
(ADORNO; HORKHEIMER, 1985) e da
lógica de consumo. Observa-se também [...] Esse ideal de beleza é facilmente
um gradual estreitamento entre as relações identificado nas práticas da Educação
de beleza e saúde feminina – e também Física, que também tem se empenhado
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ao longo da história em treinar o corpo nos torna veículos de disseminação destes


para se encaixar em uma determinada preceitos e sua lógica consumista. Fala-se
métrica. [...] A educação física, nesse
contexto, canonizou modelos de be-
da Indústria Cultural:
leza, excluindo tudo o que fugisse a
esse tipo de controle, sempre em prol A “indústria cultural” pode ser entendi-
da construção de corpo forte, ágil, belo da como um instrumento de pressão da
no sentido clássico [...]. (BEZERRA, sociedade sobre o indivíduo através da
2008, p. 109). utilização de elementos culturais que
se tornam acessíveis pelo cinema, pela
televisão e por outros meios de comu-
É tarefa acadêmica compreender os nicação de massa. Esses são utilizados
processos históricos de formação das con- como formas de cooptarem os indiví-
cepções de corpo atuais, bem como estes duos para uma atuação de acordo com
os interesses e as necessidades do modo
se vinculam com concepções de saúde e de produção, fazendo a lógica industrial
perspectivas de beleza, a fim de não nos prevalecer [...]. (BAPTISTA, 2001, p. 75).
tornarmos mais um agente “naturalizador”
de preceitos contraditórios incutidos pela A indústria cultural, na compreen-
Indústria Cultural a favor da criação de são de Adorno e Horkheimer (1985), é
necessidades de consumo. responsável pela disseminação de certa
Nessa direção, concordamos com lógica social e pela perda do esclarecimento
Goellner (2003, p. 28) sobre a necessidade da população:
de se (re)pensar o corpo:
O segmento sobre a “indústria cultural”
mostra a regressão do esclarecimento à
Pensar o corpo como algo produzido
ideologia, que encontra no cinema e no
na e pela cultura é, um desafio e uma
rádio sua expressão mais influente. O
necessidade. Um desafio porque rom-
esclarecimento consiste aí, sobretudo,
pe, de certa forma, com o olhar natura-
no cálculo da eficácia e na técnica de
lista sobre o qual muitas vezes o corpo
produção e difusão. Em conformidade
é observado, explicado, classificado e
com seu verdadeiro conteúdo, a ideo-
tratado. Uma necessidade porque ao
logia se esgota na idolatria daquilo que
desnaturalizá-lo revela, sobretudo que
existe e do poder pelo qual a técnica é
o corpo é histórico. [...] o corpo é uma
controlada. No tratamento desta contra-
construção sobre a qual são conferidas
dição, a indústria cultural é levada mais
diferentes marcas em diferentes tem-
a sério do que gostaria. (ADORNO;
pos, espaços, conjunturas econômica,
HORKHEIMER, 1985, p. 16)
grupos sociais, étnicos, etc.

A Indústria Cultural tem assim uma


O corpo-modelo: influências da Indústria função importante no desenvolvimento de
Cultural na criação do desejo um modelo de corpo com características
específicas. Para facilitar este controle ela
Atualmente, mecanismos sociais de se ramifica em outros mecanismos deno-
grande influência na vida cotidiana diluem minados Indústria da Beleza e Indústria
as possibilidades de questionamentos das do Emagrecimento (ALMEIDA et al, 2006)
necessidades impostas pela ordem econô- promovendo um intenso movimento de
mico-social Capitalista, e em certa medida, criação de desejos – fetiche – pelo corpo
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mais belo, encontrando na mídia e na uma evasiva com a qual ela tenta se fur-
publicidade instrumentos propícios para tar à responsabilidade pela mentira que
difunde, nossa análise atém-se à preten-
incuti-los e difundi-los: são, objetivamente inerente aos produ-
tos, de serem obras estéticas e, por isso
Quando se discute a publicidade, al- mesmo, uma configuração da verdade.
gumas idéias logo surgem, e entre elas Ela revela, na nulidade dessa pretensão,
a de sedução, e a de manipulação, ou o caráter maligno do social. O segmento
seja, a publicidade como um eficiente sobre a indústria cultural é ainda mais
recurso para, após a identificação de fragmentário que os outros. (ADORNO;
prováveis necessidades, ou desejos dos HORKHEIMER, 1985, p. 16)
indivíduos, servir como uma ferramen-
ta para influenciar seus receptores a ad-
quirirem produtos, necessitando ou não Para a mulher, talvez este ideal de
deles. (ARAÚJO, 2008, p. 1). beleza seja mais fortemente veiculado e
difundido, haja vista a grande exposição
A larga veiculação de imagens dos corpos femininos atualmente. Essa
“agradáveis” de corpos magros, jovens e padronização do corpo da mulher é refor-
sorridentes, incute o desejo pelo que não se çada nestes meios que corroboram para
tem e a não aceitação pelo que se é. Desta a construção da identidade – inclusive
forma, o “consumidor” necessita comprar e corporal – feminina:
possuir o mesmo corpo de sua referência:
[...] vivemos um tempo em que meios de
[...] o grande padrão de referência são as comunicação de massa como revistas,
pessoas que aparecem na mídia, como jornais e programas de televisão produ-
os artistas, [...] porque todos eles, ao zem e veiculam toda uma discursividade
menos os que são considerados belos, sobre e para o corpo, contemplando, en-
são magros, cria-se uma certa tendência tre outras coisas, modos de vestir, comer,
para considerá-los os modelos ideais. exercitar-se, maquiar-se ou divertir-se
Assim, não é difícil encontrar-se pesso- (DAMICO; MEYER, 2006, p. 104).
as pelas ruas que sigam as orientações
de dieta, de exercícios e outras dicas de
seus artistas de preferência (ALMEIDA Parece haver efetivamente uma
et al, 2006, p. 795). “ditadura” do que se deve fazer, vestir ou
ser. As mulheres são incessantemente bom-
O corpo exposto e “vendido” como bardeadas e educadas para adequação aos
um objeto é ilusório na medida em que padrões de beleza impostos. A Indústria
“[...] o [corpo] ideal que ele [consumidor] Cultural cuida de camuflar suas intenções
almeja dificilmente será alcançado, em com mensagens de promessas de maior
virtude dos truques utilizados em anúncios auto-estima, saúde e realização pessoal
publicitários (photoshop, dublês, maquia- (ROSA, 2005).
gem...)” (ARAÚJO, 2008, p. 1). Adorno Com a liberação feminina, novos
e Horkheimer (1985) comentam que a horizontes foram abertos ao cotidiano de
Indústria Cultural: mulheres em diferentes realidades sociais.
Elas passaram a ocupar espaços mais rele-
[...] como invocação de seu próprio ca-
ráter comercial, de sua profissão de uma vantes no mercado de trabalho. Seu poder
verdade atenuada, há muito se tornou aquisitivo aumentou proporcionalmente a
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sua exposição social. Para Rosa (2005), as Resultados deste “emagrecimento”


“fórmulas” de beleza apresentam-se como do corpo tido como ideal também são
uma terceira jornada de trabalho às mu- percebidos por Silva (2001). Estudos acer-
lheres que, além do trabalho remunerado, ca de concursos de beleza femininos do
submetem-se também ao trabalho de casa século XX explicitam que no decorrer de
e as estratégias de embelezamento. 80 anos houve uma diminuição de 2,5 cm
Obviamente, é necessário pensar na silhueta feminina “ideal”, evidenciando
em um processo dialético de criação/ o processo de “generalização” de uma “es-
apropriação destes processos. As influên- tética da magreza”.
cias da Indústria Cultural na formação de Todas estas influências, amplamente
concepções femininas de corpo e beleza divulgadas no contexto atual, a mulheres
não anulam a subjetividade de cada mulher: de diversas classes e idades, podem ser
identificadas ao analisarmos os discursos
Isso não quer dizer que quaisquer des- de nossas pesquisadas, ainda que possamos
ses discursos [veiculados pela Indústria
perceber também movimentos de superação
Cultural] sejam causas em si do culto
contemporâneo ao corpo, mas que é dos paradigmas impostos.
neles que se constituem condições de
possibilidades para que as jovens se-
jam posicionadas – e se posicionem As mulheres que olhamos: De onde vem?
– como mais próximas ou mais dis- Quem são?
tantes das normas de beleza e saúde
socialmente sancionadas. (DAMICO;
MEYER, 2006, p. 106). Este artigo resulta de pesquisa
anteriormente realizada em Programa de
Cabe ressaltar que o modelo de Iniciação Científica do Conselho Nacional
corpo disseminado não atinge a todos. de Pesquisa (PIBIC/CNPq), junto a Univer-
Ainda existem focos de resistência, mesmo sidade Federal de Goiás, entre os anos de
que alguns sejam não intencionais. Para 2009 a 2011, financiado pela Fundação
Baptista (2013) este é o caso de pessoas de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás
consideradas com sobrepeso ou obesidade. (FAPEG) e aprovado pelo comitê de Ética em
Porém, é indiscutível a implicação deste Pesquisa com Seres Humanos da Universi-
padrão imposto, vez que a busca ou a fuga dade Federal de Goiás, nº 158/08.
destes traz angústias a mulheres de diversas De metodologia qualitativa, desen-
classes sociais. volvido com apoio de questionário com
No início do século XX o excesso de perguntas abertas e fechadas, teve como
gordura corporal já começa a ser tomado sujeitos da pesquisa inicial 34 professo-
enquanto anomalia, relacionada a doenças res de Educação Física (20 mulheres e
múltiplas. Segundo Vigarello (2006), qua- 14 homens) atuantes em 21 escolas públi-
dros associativos são divulgados em revistas cas selecionadas a partir das doze regiões
femininas de moda, o que incentiva o surgi- administrativas da cidade de Goiânia/
mento de um ideal de magreza, justificada GO. Para os fins desta análise específica,
pela busca da saúde, não possível por um realizou-se um recorte da amostra, manten-
corpo avantajado. do apenas os 20 questionários respondidos
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pelas mulheres. Todos os pesquisados foram: “obeso(a); acima do peso; esbelto(a);


assinaram Termo de Compromisso Livre e magro(a); muito magro(a)”. Respondendo a
Esclarecido (TCLE). este questionamento, 8 mulheres declara-
Para preservar a identidade dos parti- ram se enxergar acima do peso; igualmente
cipantes, convencionou-se chamá-los apenas 8 se enxergam como esbeltas; 3 professoras
por “P.N4” onde “P” significa professor(a) e dizem se ver como pessoas magras e apenas
“N” um número de 1 a 34, estipulado alea- uma pesquisada diz se ver como obesa.
toriamente a cada questionário, incluindo os Estar acima do peso tido como
14 questionários respondidos por homens “ideal” parece ser uma preocupação consi-
na primeira fase desta pesquisa, os quais derável de mulheres de todas as faixas etá-
foram analisados em outro momento (SILVA; rias. Estas mulheres, acima do peso “ideal”,
SILVA; BAPTISTA, 2012). têm sido tomadas pela Indústria Cultural
As pesquisadas são mulheres de enquanto um rico e crescente mercado.
uma extensa faixa etária (dos 21 aos 50 Cada vez mais produtos e discursos são
anos) e de rendas familiares diversas criados para abarcar suas “necessidades”:
(7 mulheres recebem de 3 a 5 salários míni-
mos; 6 recebem de 5 a 7 salários mínimos [...] a Indústria Cultural vai se ocupar
com estas pessoas. Se, por um lado, ela
e 5 obtêm entre 8 a 10 salários mínimos. tem que combatê-las, de acordo com os
Duas não informaram sua renda). A maioria interesses na saúde dos sistemas, por
possui imóvel próprio (14 pesquisadas) e outro, este é um público que, como
automóvel (13 mulheres), também a maioria consumidor, deve ser bem tratado e
ter à sua disposição diferentes produtos
possui acesso à internet (19 professoras). que o atendam, como roupas, dietas,
Dentre as pesquisadas, 16 relataram pos- spas, sapatos, móveis especiais e que
suir pós-graduação em uma das seguintes possam suportar o seu peso. (ALMEIDA
áreas: Educação Física Escolar, Fisiologia, et al, 2006, p. 797).
Atividade Física, Saúde, Métodos de Ensino,
Educação Física Adaptada, Direitos Huma- Paradoxalmente ao combate pelo
nos e Educação. extermínio da gordura, nociva a vida
“saudável”, há também o movimento de
criação de especialidades “adaptadas”, que
O corpo do qual se fala, o corpo que se propiciem conforto a mulheres “gordinhas”,
deseja: relações percebidas entre saúde afinal, elas merecem, desde que possam
e beleza pagar por isso. Indiscutivelmente há um
padrão imposto nas duas situações, já que
Indagamos acerca da auto-per- um é o ideal, e o outro é o adaptável ao
cepção corporal de nossas pesquisadas, padrão da “estética da magreza”.
questionando: “Quando você se olha no Incute-se a necessidade de consumir
espelho se vê:” As alternativas propostas a academia, a dieta, o emagrecedor que seja

4 Destacaremos aqui todas as “P.Ns” utilizadas para os fins desta análise: P.4, P.5, P.6, P.7, P.8, P.11, P.12, P.13,
P.14, P.16, P.17, P.22, P.23, P.26, P.27, P.28, P.30, P.31, P.33, P.34.
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considerado melhor, para o resultado em O corpo belo, esbelto, referência


busca da “estética da magreza”. Enquanto dos padrões atuais, não é almejado desin-
não se atinge o objetivo, há a necessidade teressadamente. É preciso expor este corpo.
de se vestir bem, calçar sapatos confortáveis O corpo, como ressalta Nóbrega (2001,
para sua estrutura corporal, se consumir o p. 01-02) é agora tomado por uma
que há de mais “adequado”.
Desta forma a ordem do consumo [...] nova cultura do consumo [que] se
estabelece a partir da imagem do cor-
impera nesta relação, não havendo a mesma
po bonito, sexualmente disponível e
oportunidade para todos: associado ao hedonismo, ao lazer e à
exibição, enfatizando a importância da
[...] os bens e benefícios prometidos aparência e do visual. Essas imagens de
pela indústria da beleza (e evidente- corpo são divulgadas pelos meios de
mente da indústria cultural) não estão comunicação de massa e mídia eletrô-
acessíveis a todas as pessoas, mas ape- nica, exigindo toda uma rotina de exer-
nas para aquelas que podem pagar por cícios, dietas, cosméticos, terapias, en-
isso, visto que os diferentes produtos tre outras preocupações com a imagem
elaborados são apropriados para con- e a auto-expressão, uma exposição sem
sumos específicos. (ALMEIDA et al, limites do corpo (corpo-outdoor).
2006, p. 794).
Na atualidade parece não haver
Portanto, a Indústria Cultural nos como desvincular beleza de magreza. Estas
enreda em um ciclo que parte da imagem duas categorias imbricam-se nos discursos
sedutora do corpo esbelto, criando a neces- que dão subsídios à lógica de consumo do
sidade de consumo. Mesmo às mulheres “corpo-modelo/objeto”. Na busca por esta
que se apresentam como magras e esbeltas beleza, a responsabilidade individual parece
em nossa pesquisa, pode-se dizer, haveria
imperar. Instaura-se uma perspectiva de que
a necessidade da manutenção da aparência,
cada indivíduo pode ter acesso ao melhor,
alcançada através do consumo de produtos
desde que busque isto (LOVISOLO, 2006).
para esta finalidade.
Há vinculação da imagem do in-
Sobre estas questões referentes
divíduo gordinho à figura de uma pessoa
aos cuidados com o corpo e suas relações
desleixada, que não se propõe a realizar
com a lógica de consumo, Nóbrega (2001,
exercícios nem a cuidar de sua alimentação
p. 2) destaca:
com mais zelo (ALMEIDA et al, 2006). Esta
Featherstone et alii (1996) analisam desvalorização da imagem das pessoas
essa emergência da cultura do consumo obesas, pode se relacionar com mais um
a partir de dois pilares básicos, a saber: processo de inculcação do consumo de prá-
a manutenção e a aparência. A apa-
ticas para a magreza, oferecidas largamente
rência relaciona-se com as imagens de
corpo, a preocupação com o “visual”. na atualidade, impregnando o discurso da
A manutenção relaciona-se com as roti- necessidade do consumo de itens adequa-
nas de adequação aos valores e padrões dos ao alcance de um peso “aceitável”.
de consumo divulgados pelas próprias
Questionamos às nossas pesquisa-
imagens. Aparência e manutenção são
categorias que se retroalimentam, na das: “Você tem algum ideal de beleza”?
lógica fantasiosa do consumo. 9 professoras assumiram possuir um modelo
190

de corpo perfeito, enquanto 10 relataram Baptista, Araújo e Brito (2009, p. 1079)


não se importar com os padrões pré-esta- destacam:
belecidos, ainda que em outro momento,
A beleza passa a ser aspirada de forma
algumas destas tenham descrito estratégias
tão intensa, que só é valorizada a mu-
variadas para atingir algum ideal de beleza, lher que se parece com as estrelas da
e também apontem personalidades públicas televisão. Aquelas mulheres altas, ma-
gras, com lindos cabelos e sempre bem
como referenciais desse padrão. vestidas. A mídia dita a moda e gera
As várias representações sociais di- lucros para o mercado da beleza, onde
fundidas pela Indústria Cultural são primor- todas terão que consumir para se inte-
grarem numa sociedade em que a apa-
diais neste processo de inculcação/invenção rência importa mais do que o ser [...].
de ideais de beleza feminina, instituem um
desejo, uma energia fetichizante sedutora Neste sentido, ter um corpo de atriz
acerca do corpo/objeto almejado. é um objetivo eventualmente almejado
Esta influência midiática na criação por mulheres de qualquer classe social e
de modelos aparece, podemos dizer, quan- não são poucos os métodos para atingir
do questionamos quais personalidades são tais objetivos. A Indústria da Beleza e do
identificadas por nossas pesquisadas como Emagrecimento oferecem vários “planos”
modelos de beleza através da pergunta: de “reeducação” alimentar e de exercícios
“Você identifica alguma pessoa pública físicos, remédios e intervenções cirúrgicas,
(atleta, atriz/ator, cantor/a, modelo, etc.) tudo em busca do “corpo ideal” que apre-
que corresponda ao seu ideal de beleza? senta um perfil magro e jovem (ALMEIDA
Quem?”. As personalidades destacadas fo- et al, 2006).
ram Jennifer Lopez, Malu Mader, Fernanda A similaridade corporal com perso-
Lima, Daniele Sousa e Maurren Maggi. nalidades públicas carrega em si um status
As personalidades destacadas por positivo, um prazer, o qual é tomado como
nossas pesquisadas tem projeção na so- o referido “bem-estar” tão destacado nas
ciedade atual, são estrelas de televisão, e propagandas de venda deste corpo/objeto,
como tal possuem determinado prestígio mesmo que para isso haja a necessidade de
(NEPOMUCENO, 2010). Têm, via de regra, outros sacrifícios:
corpos adequados ao padrão da “estética
da magreza”, oferecidos nos outdoors da [...] O prazer do JUBESA5, no reconhe-
Indústria da Beleza e do Emagrecimento cimento dos outros, do espelho e da
auto-percepção, implica na abstenção
(ALMEIDA et al, 2006).
de outros prazeres, e disso decorre a in-
Figuras públicas são ótimos meios sistência dos interventores da atividade
de difusão do ideário de corpo vigente. física, dos educadores físicos, para que

5 O modelo JUBESA é um conceito trabalhado por Lovisolo (2006) a partir de um jogo com as palavras Juventude,
Beleza e Saúde.
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as práticas estejam associadas ao prazer Se há o discurso, embasado em


ou a ele conduzam. (LOVISOLO, 2006, comprovações científicas de que a atividade
p. 161-162).
física faz bem a saúde por que a necessidade
incessante da criação de cada vez mais de-
A necessidade criada às mulheres de
sejo sobre as práticas de exercícios físicos?
todas as classes sociais de encontrar o “cor-
“[...] se acreditamos que a atividade física
po perfeito” perpassa a disciplina do corpo e
faz bem à saúde, e se desejamos conservá-la
das vontades. Neste sentido, a mulher deve
(a saúde), então, deveríamos nos dedicar a
se ater a “uma vida saudável” limitando
sua prática. O “dever ser” da prática preci-
suas práticas corporais, sua alimentação e
saria resultar, quase que “naturalmente” da
seu estilo de vida ao modelo proposto. Em
junção da crença e do desejo” (LOVISOLO,
casos extremos há um vício, uma depen-
2006, p. 159).
dência vinculada à busca da perfeição; um
Tem-se o desejo pelo bem-estar tra-
paradoxo que Lovisolo (2006, p. 168-169)
go pelo corpo perfeito, e sua aceitação na
destaca ao tecer algumas críticas acerca do
sociedade atual. É esta uma das configura-
padrão JUBESA:
ções estabelecidas para o fetiche do corpo,
[...] à dedicação exclusiva ou obsessiva
pois, o fetiche é o valor fantasmagórico e
ao modelo que provocaria efeitos co- arbitrário dado a uma mercadoria (MARX,
laterais negativos: abandono de outras 2011). Neste caso, o corpo é a mercadoria
orientações valiosas e a criação de com- que deve expressar o seu valor por meio da
pulsão, anorexia, culpa, auto-centra-
mento, entre outros. [...] A pessoa pode
dimensão da saúde e da estética, mesmo
ficar viciada no modelo, concentrando que estes sejam falsos. Afinal, o fetiche não
nele toda a sua libido. Viciado, então, se dá obrigatoriamente pelo cumprimento
em ‘procurar saúde’ ou o padrão de be- das promessas realizadas.
leza ou à juventude.
No contexto atual, parece difícil à
mulher resistir às propagandas de produtos
Este é um paradoxo considerável
que prometem a beleza que almeja. Para
ao se analisar a desenfreada busca pela
além de um simples “bem–estar” adquirido,
beleza, disfarçada pelo discurso da saúde. existem vários sentidos simbólicos. Não por
Os excessos, o vício e a concentração acaso, a beleza comercializada é expressão
da libido são marcadores de processos das classes sociais dominantes. Na cultura
de não-saúde imbricados na busca pelo contemporânea, “[...] os diferentes grupos
corpo/objeto perfeito. Ainda para Lovisolo sociais se distinguem uns dos outros não só
(2006, p. 169), a busca parece incessante, pela posse de bens materiais, mas pelas suas
afinal, o mercado sempre reformula seus formas corporais, pela sua conduta e modo de
métodos para não perder seus “clientes”: expressar-se.” (LUPTON, 2000, p. 22, apud
“[...] sempre é possível fazer um novo DAMICO; MEYER, 2006, p. 106).
exame, ingerir mais uma droga protetora, Mas afinal, o que é tido como belo
usar mais um creme, ficar mais tempo na por nossas pesquisadas? Questionou-se a
academia, tornar o regime mais vigoroso, elas: “Em sua opinião, quais as características
perder mais uns gramas de peso corporal de uma pessoa bonita?” Percebe-se nas falas
ou de gordurinhas localizadas [...]”. resistências conscientes ou inconscientes
192

a lógica da aparência, sendo valorizadas Os discursos, em certa medida,


e enfatizadas algumas características exprimem uma percepção de beleza imbri-
subjetivas enquanto sinalizadores de uma cada à de saúde quando uma terminologia
beleza. Segundo a professora P.7: “As ca- parece se equiparar a outra. Sobre estes
racterísticas são: amor próprio, auto-estima aspectos de correlações entre beleza e saú-
positiva; que não transfere seus problemas de, Lovisolo (2006, p. 163) destaca: “[...] O
p/ os outros, etc.”, características que recurso ao estético, à beleza e juventude,
figuram claramente em um âmbito mais continua sendo relevante, ainda quando se
subjetivo. Outra professora (P.30) destaca trata de atingir resultados em termos de saú-
que bela é: “Uma pessoa arrumada, edu- de. Sobretudo, se considerarmos que cuidar
cada, humilde”, mais uma afirma que bela de si, adornar-se, embelezar-se, parece ser
é: “Uma pessoa que se sente bem com a uma tendência muito antiga. [...]”.
sua imagem reflete um ‘brilho’ no olhar.” A saúde parece-nos estar intrinse-
(P.16). Mais uma relata: camente ligada a um processo de “embe-
lezamento” que viria para legitimar ideais
Seria hipocrisia não ressaltar elementos veiculados na atualidade pela mídia e
exteriores, pois qualquer grupo estabe-
pelas relações pessoais como um todo, que
lece um pré-julgamento, aquilo que se
mostra inicialmente diferente da minha permeiam e são permeados pela lógica de
realidade ‘sairia’ do padrão de beleza consumo; processos relacionados com a rei-
mas diante de um diálogo a beleza inte- ficação do corpo feminino, que abarcariam
rior pode ser evidenciada. Cada grupo grande parte da população como nossas
estabelece seu padrão. (P.6).
pesquisadas, professoras de Educação Físi-
ca formadas há pouco tempo, muitas com
Destacamos ainda o discurso das
estudos de pós-graduação. Neste caso, a
professoras P.25 e P.11 respectivamente:
reificação é a expressão da coisificação do
“Carismática, sociável, educada e que se
ser humano e de sua consciência. De acordo
cuide em todos os aspectos, tanto psico- com Lukács (2003):
logicamente quanto fisicamente” e; “Uma
pessoa saudável, tranqüila, sem exagero na [...] quando a atividade do homem se
preocupação com a aparência mas que se objetiva em relação a ele, torna-se uma
mercadoria que é submetida à objetivi-
cuida, com sorriso”.
dade estranha aos homens, de leis so-
Ainda que as declarações exprimam ciais naturais, e deve executar seus mo-
marcas de uma concepção de beleza subje- vimentos de maneira tão independentes
tiva que claramente procura uma superação dos homens como qualquer bem desti-
nado à satisfação de necessidades que
dos ideais pré-dispostos, não podemos se tornou artigo de consumo. (LUKÁCS,
deixar de considerar ainda haver traços do 2003, p. 199-200)
modelo de beleza veiculado pela Indústria
Cultural. Existe uma tensão entre a resistên- Nesta perspectiva, podemos identi-
cia demonstrada pelos aspectos subjetivos ficar a ideia da reificação atrelada à lógica
e a submissão à lógica da Indústria Cultural do fetiche do corpo. Desse modo, a busca
por meio das referências adotadas para o pelo fetiche do corpo acaba por converter o
belo e a saúde. próprio corpo em uma coisa, para a qual, a
V. 26, n° 43, dezembro/2014 193

consciência do próprio corpo não identifica Estratégias de exercitação corporal


como humano. e de cuidado com a alimentação são muito
Destacamos outros relatos. Carac- destacadas pelas pesquisadas para manter
terísticas de beleza seriam: “Apresentar-se ou atingir seu ideal de beleza. Elas relatam:
bem com saúde” (P.14), ou ainda: “Corpo “Caminhada” (P.12); “Nem sempre, mas
em forma, saúde” (P. 34). Uma professora pratico esporte, principalmente voleibol”
afirma: “A beleza física é quase insignifican- (P.30); “Sempre fiz, porém no momento
te mas nem obesa e nem magrela” (P.23). estou com dificuldades para organizar meus
Cabe destacar que recorre em al-
horários.” (P.5); “Procuro me alimentar
gumas falas os cuidados com o cabelo e a
corretamente, pratico exercício físico regu-
pele enquanto marcadores de uma beleza:
larmente, cuido da minha pele e cabelo,
“Fisicamente: Estar com peso normal, cabelo
cuido da minha vida espiritual e mantenho
e pele bem cuidados, saúde boa. Emocional-
o equilíbrio” (P.33). A professora P.11
mente: equilibrada e de bem com a vida”
(P.33), “[...] as características raciais, os relata: “[...] Faço atividade física regular
traços, o corpo esbelto, cabelos cuidados, me preocupo com minha alimentação.”.
na verdade depende da simpatia da pessoa. Outra pesquisada: “Não. Faço o que penso
Na verdade não tenho um ideal de beleza que todos deviam fazer que é comer bem
[...]” (P.26). Outra descreve: “A beleza vem (envolvendo os nutrientes necessários),
de dentro para fora. Com certeza a paz de faço caminhada, não fumo e tenho lazer.”
espírito faz com que tudo em seu organismo (P.4). Por fim mais uma afirma: “Tento me
fique bem (pele, cabelos, etc.)” (P.4). manter em peso saudável com aparência
Para Baptista, Araújo e Brito (2009) a agradável a mim sem ficar preso a um ideal
apresentação dos cabelos é igualmente uma fechado” (P.14).
marca de uma beleza elitizada, exibida por Estas estratégias são largamente vei-
atrizes e outras personalidades públicas, de culadas pela Indústria da Beleza e do Ema-
determinada forma, e não de outra. Via de grecimento como eficientes na busca de um
regra, os cabelos exibidos – e vendidos – resultado materializado em um corpo/objeto
devem ser lisos e esvoaçantes para serem perfeito, desejado e “saudável” (ALMEIDA
bonitos. A pele bem cuidada sempre jovem
et al, 2006). O processo de interposição e
e livre de manchas, também é marca de um
controle do corpo colabora para a reificação
padrão de beleza firmado na juventude e na
humana, tanto no sentido de sua transforma-
saúde (LOVISOLO, 2006).
ção em objeto vendido e consumido, quanto
Diversas estratégias podem ser tra-
no sentido de sua desnaturalização:
çadas para se atingir e/ou manter o corpo
idealizado. Para verificar quais seriam estas
[...] é sem dúvida interessante o pro-
estratégias por parte de nossas pesquisadas, cesso de desnaturalização que o corpo
fizemos uma última pergunta: “Você faz vem sofrendo em busca da imortalida-
algo para manter-se ou atingir este ideal de, da eterna juventude, da beleza per-
feita, e nesse percurso são inúmeras as
de beleza?”. As respostas, pode-se dizer,
técnicas [...]: são os regimes alimentares
ecoam também em direção de uma assimi- (que têm levado à morte até mesmo
lação entre beleza e saúde. crianças que já sofreram com o poder
194

dos discursos sociais), as indústrias da CONSIDERAÇÕES FINAIS


cirurgia estética (a garantia da beleza
com rapidez e comodidade). Aqui abri-
mos um paralelo para os modismos:
O processo de aproximação entre
é inacreditável a quantidade [...] de os conceitos de beleza e saúde parecem
óbitos de jovens que morrem de fome frequentes no imaginário e discurso de mu-
[...] por não quererem comer para não lheres na realidade atual, fruto de um pro-
engordar (SOARES; FRAGA, 2003 apud
BEZERRA, 2008, p. 109-110). cesso histórico de inculcação de preceitos
acerca de ideais de corpo e beleza advindos
O Mercado abarca todas as situa- das classes dominantes e seus interesses.
ções com alternativas pertinentes. Mulheres Não por acaso, as personalidades citadas
com dia cheio por sua rotina de trabalho por nossas pesquisadas enquanto modelo
têm opções entre dietas e exercícios adap- corpo almejado são pessoas jovens, de
tados ao tempo livre. A vida ativa se impõe pele clara, magras, representantes de uma
quase como obrigatoriedade para atingir beleza elitizada, apenas encontrada quando
a beleza ideal: “[...] Temos que sublimar, o “consumidor” possui meios financeiros
para adquiri-la. Porém, não apenas as con-
mediante a atividade, o instinto do seden-
dições financeiras influenciam na obtenção
tarismo!” (LOVISOLO, 2006, p. 161).
do chamado “corpo ideal”. É necessário
Podemos dizer que as estratégias
disciplina para manter as estafantes rotinas
para se atingir e/ou manter um ideal de
de exercícios e embelezamentos, que para
beleza, expressas pelas professoras parecem
a mulher, se traduzem quase como uma
ir ao encontro da adequação às propostas
terceira rotina de trabalho.
da lógica de consumo:
Nos relatos dessas professoras po-
Para a cultura de consumo, o corpo é demos perceber inúmeros discursos que
veículo de prazer, estando associado caminham claramente para a superação
a imagens idealizadas de juventude, de ideais impostos pela Indústria Cultural,
saúde, aptidão e beleza, que favore- resultado esperado, já que as mulheres as
cem a expansão da indústria da moda,
quais tratamos nesta pesquisa possuem
cosméticos, academias de ginástica e
afins. A manutenção, terminologia que uma formação que as aproximaria de uma
indica a popularização da metáfora do discussão crítica de corpo. Ainda assim,
corpo-máquina, demanda a monitora- percebem-se marcas de um processo de
gem do atual estado da performance reificação do corpo feminino, bem como
corporal, envolvendo a medicina pre-
algumas assimilações entre os conceitos
ventiva, a educação para a saúde e o
fitness. (NOBREGA, 2001, p. 2). de beleza e saúde, possíveis influências da
Indústria Cultural e sua lógica de consumo
Desta forma, a hipervalorização do e “venda do corpo”. É neste sentido que
corpo é aspecto precioso a Indústria Cultural o modelo de estetização da saúde se faz
e revestir este processo pelo discurso da complexo e permeado de contradições, re-
saúde é extremamente interessante. Uma vestido por ideais de consumo, culminando
última pesquisada ressalta: “Cuido da saú- em mais um processo desencadeador de
de” (P.26). realidades reificantes.
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A busca pelo corpo perfeito, a expo- ou Beleza Pura: Novela e modelo de


sição do corpo feminino, a desvalorização Beleza feminina. Estudos, Goiânia,
humana, não pode ser vista como algo v. 36, n. 9/10, p. 1073-1089, 2009.
natural em nossa sociedade. Para nós, pro- BEZERRA, Laise Tavares Padilha. A dança
fessores de Educação Física, esses conheci- dos monstros corpo e estética na arte
mentos se fazem extremamente necessários e na Educação Física. Dissertação
para que não nos tornemos mais um agente (Mestrado em Educação), Universidade
“naturalizador” das relações contraditórias Federal do Rio Grande do Norte, Rio
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eterna e “ditadura” do corpo perfeito Renascimento aos dias de hoje. Rio de
os discursos da mídia e as práticas Janeiro, RJ: Ediouro, 2006.

RELATIONSHIPS BETWEEN WOMEN BEAUTY AND HEALTH: a look from female


teachers of Physical Education perspective

ABSTRACT

This descriptive qualitative research aimed to discuss possible Culture Industry Influences,
as well as the actual consumption logic into the relationships between woman beauty and
health from a study realized with 20 female physical education teachers of Goiania/GO
public schools. Their information indicate the approach between beauty and health concepts
and marks of a fetishization and reification historic process of women body. However, it is
perceived movements of contradiction and resistance to the imposed standards.

Keywords: Body; Beatuy; Healt; Woman; Culture Industry


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RELACIONES ENTRE BELLEZA Y SALUD FEMENINA: una mirada a partir de la perspectiva


de profesoras de Educación Física

RESUMEN

Investigación cualitativa del tipo descriptiva objetivó discutir posibles influencias de la


Industria Cultural, así como de la actual lógica de consumo en las relaciones entre belleza
y salud femenina a partir de investigación realizada con 20 profesoras de Educación Física
de la red pública de enseñanza de Goiânia/GO. Los datos indican una aproximación
entre los conceptos de belleza y salud y marcas de un proceso histórico del fetiche
y reificación del cuerpo femenino. Es posible percibir, sin embargo, movimientos de
contradicción y resistencia a los patrones impuestos.

Palabras clave: Cuerpo; Belleza; Salud; Mujer; Industria Cultural

Recebido em: abril/2014


Aprovado em: junho/2014

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