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Projeto Gráfico
Jéssica Macedo
Revisão
Ana Roen
Diagramação
Mylene Ferreira
Copydesck
Patricia Trigo
Capa
KNSDESIGN
1ª Edição
Livro Digital
Naah Souza
Segredo
Link=> https://amzn.to/33F7GyT
Prólogo
Um
Se lembra quando a gente
Chegou um dia a acreditar
Que tudo era pra sempre
Sem saber que o pra sempre
Sempre acaba
Por Enquanto - Legião Urbana
Dois
Eu estava imaginando se após todos esses anos
Você gostaria que nos encontrássemos
Para superarmos tudo
Dizem que o tempo supostamente lhe cura
Mas eu ainda não fui completamente curada
Hello – Adele
Três
Saiba que há muitas amizades,
Mas o laço da família é mais forte
Oh, se o céu estiver desmoronando, por você
Não há nada neste mundo que eu não faria
Hey Brother - Avicii
Quatro
Os nossos horizontes se encontrando
E todas as luzes irão te guiar
Pela noite, comigo
E eu sei que esses céus irão sangrar
Mas os nossos corações acreditam
Que todas as estrelas irão nos guiar para casa.
All of the Stars - Ed Sheeran
Andrew
"Se alguma coisa pode dar errado, dará. E mais, dará errado da
pior maneira, no pior momento e de modo que cause o maior dano
possível.” O ser humano que disse essa frase pela primeira vez merece
um Prêmio Nobel, pois desconheço alguém na história da humanidade
que tenha dito algo mais inteligente e verídico. Nem mesmo Newton e
Einstein, com suas descobertas e fórmulas que complicaram minha
vida no ensino médio, foram capazes de fazer uma afirmação tão
verdadeira.
Prova disso é o momento atual de minha vida.
A última semana tinha sido uma correria enorme devido ao meu
casamento. Sophia e eu estivemos noivos por três anos e nossos
súditos mereciam uma cerimônia a altura para compensar o longo
tempo de espera. Entretanto, quando o grande dia chegou, houve um
acidente com o veículo que levava o meu pai à igreja. Três guardas
morreram e o rei está entre a vida e a morte. Meu casamento teve que
ser adiado.
Mas como dizia o ditado "o maior dano possível". Então, para
fechar com chave de ouro a série de desventuras, eis que um fantasma
já esquecido do passado, também conhecida como Hannah Price,
reaparece em Mirabelle.
Encontrei-a no dia anterior e, segundo ela, havia voltado apenas
para o enterro do Carl, o que me leva a crer que, a esse momento, já
deveria ter deixado o país.
Ou não.
— Sua Alteza Real, o Sr. Morris chegou. — Ergui meu olhar para
ver Henry na porta do meu escritório. Fiz apenas um sinal mandando-o
chamar nosso convidado. Fiquei olhando um ponto qualquer pela janela
repensando algumas coisas do passado enquanto o esperava.
Cinco
Palavras não bastam, não dá pra entender
E esse medo que cresce não para
É uma história que se complicou
Eu sei bem o porquê
Qual é o peso da culpa que eu carrego nos braços
Me entorta as costas e dá um cansaço
A maldade do tempo fez eu me afastar de você
A noite - Tiê
— Você acha que sou burro, Hannah? Acha mesmo que vou
acreditar que temos uma filha depois de você ir embora e só voltar
anos depois? E se fosse verdade, por que esconderia ela de mim? —
pronunciou com rispidez enquanto me encarava friamente.
— Fiquei com medo que você quisesse tirar ela de mim. — Fui
sincera e em troca recebi uma risada sarcástica.
— Não me faça rir, Hannah. Você deveria saber que eu te
receberia de braços abertos se você voltasse para mim na época em
que eu te amava. — O verbo no passado foi como atirar uma flecha
diretamente no meu peito. Engoli o nó na garganta e a vontade de
chorar, não iria demonstrar fraqueza enquanto ele só demonstrava
indiferença.
— Eu não podia fazer isso, Andrew. Se pudéssemos ficar juntos,
eu nunca teria ido embora.
— E por que não podíamos ficar juntos? Você tinha outro? Não
me amava? Ou será que estava comigo só por interesse? — Ergui
minha mão pronta para dar um tapa na sua cara por insinuar que eu
era uma interesseira. Entretanto, ele segurou minha mão no ar. — Não
precisa responder. Esse é um assunto que não me interessa mais. —
Soltou minha mão virando as costas pronto para ir embora.
— Andrew... Por tudo que já vivemos, acredite em mim. —
Implorei com a voz fraca devido ao choro que tanto segurava.
— Por tudo que você já me fez sofrer, não tenho como acreditar.
— disse baixo. Respirei fundo antes de concluir:
— Tudo bem. Fiz minha parte porque achei que você deveria
saber sobre ela. Renegar sua própria filha só mostra o quanto você
mudou... Para pior. Passar bem, Alteza. — Saí dali o deixando só.
Coloquei meus óculos escuros para disfarçar as lágrimas que agora
caiam livremente.
Andando com a cabeça baixa, acidentalmente esbarrei em
alguém. Levantei o olhar para pedir desculpas. Dei um passo para trás
quando vi as duas loiras, uma jovem e outra que mais parecia uma
múmia.
— Ora, ora... Se não é minha querida sobrinha. Voltou para ver o
casamento do príncipe? Se quiser posso conseguir um convite pra
você.
— Ela será minha convidada especial, afinal foi graças a ela que o
Andrew e eu vamos nos casar — disse a Sophia e as duas riram juntas.
— Por que voltou, Hannah? Está querendo extorquir o Andrew
novamente? Qual a desculpa da vez? Deixe-me pensar, você tem uma
filha do príncipe? — Elas riram novamente e involuntariamente minha
mão foi parar no seu rosto de porcelana, deixando uma marca
vermelha dos meus cinco dedos.
No segundo seguinte, dois guardas que as acompanhavam
seguraram meus braços.
— Ela agrediu a princesa. Prendam-na! — gritou tia Satan e os
guardas obedeceram. — Seu lugar é na prisão, Hannah. Você nunca
deveria ter saído daquele porão, mas agora você vai voltar pra lá e
nunca mais sairá.
Ambas gargalharam, destilando seus venenos. Enquanto os
guardas me afastavam, vi o Andrew se aproximar delas e beijar
apaixonadamente a Sophia.
Sobressaltada, abri os olhos encarando a escuridão do quarto.
Lágrimas desciam, molhando toda a minha face. Fazia um bom tempo
que não tinha pesadelos, mas pelo visto, voltar à Mirabelle trouxe todos
os fantasmas do passado de volta a minha cabeça. Me revirei na cama
inúmeras vezes e não consegui dormir novamente. Acabei levantando
e fui tomar um copo com água para tentar me acalmar. O relógio na
parede marcava 2:08 da madrugada. Bebi a água calmamente
observando os ponteiros do relógio se moverem em um tic-tac
constante.
Sozinha ali, senti um vazio no peito. Não era como a dor que senti
ao perder meus pais, ou ao ir embora do país, ou ainda, a dor quando
tomei a decisão de esconder a Hailey, era uma dor seca, sufocante,
como se houvesse um buraco ali dentro implorando para ser
preenchido.
Sem aguentar mais aquela horrível sensação, fui para o quarto da
Hailey. Ela era meu porto seguro, em quem eu me segurava quando
tudo parecia desabar ou quando não sabia o que fazer, como agora. Eu
nunca me cansaria de agradecer a Deus por tê-la colocado na minha
vida.
Abri a porta do seu quarto com cuidado, evitando fazer qualquer
barulho para não a acordar. Levando em conta seu dia com o Ed,
Hailey estava morta de cansada. Os dois simplesmente não pararam
um minuto sequer. Quando cheguei em casa, encontrei minha filha de
cabelo rosa pintando os cabelos das suas bonecas. A princesa Pipoca,
eu acho, estava com o cabelo azul e o rei alguma-comida estava com o
cabelo rosa. Segundo o Ed, era para ensiná-la que rosa não é cor só
para meninas e azul cor só para meninos. Por sorte a tinta era lavável e
agora só restam poucas mechas coloridas no seu cabelo.
Entrei no quarto parcialmente escuro, a única iluminação no local
vinha de um pequeno abajur próximo a sua cama. Só bastou ver aquele
corpinho esparramado na cama que todo o sentimento de tristeza
passou. Ela dormia abraçada com o Sr. Cenoura. Esse era o único
nome que eu lembrava por ser o seu bichinho de pelúcia preferido. Um
coelhinho branco com orelhas enormes que Jake comprou para ela
antes mesmo dela nascer.
Ainda estava observando-a quando vi seu corpo se remexer na
cama parecendo desconfortável. Me aproximei mais, percebendo-a
repetir o movimento, o que fez seu bichinho parar longe. Esperei mais
alguns minutos e ela continuou inquieta. Cheguei mais perto e toquei
sua testa. Estava quente. Muito quente. Acendi a luz e notei que
algumas partes do seu corpo estavam vermelhas. Certamente alguma
alergia.
Corri para o quarto do Ed, que ficava em frente ao dela, e
encontrei-o dormindo serenamente. Pensei em não acordá-lo, mas eu
precisava de um carro e não seria nada fácil encontrar um táxi aquela
hora.
— Ed... Acorda... — Sacudi seu corpo.
— Hmmm... Vem, Jakícia. Me usa. Sou todo seu, gostoso.
Se não fosse a preocupação com a Hailey, eu estaria dando
gargalhadas nesse momento. Revirei os olhos sacudindo-o com mais
força.
— Isso... Mais forte.
Desisti de sacudi-lo e empurrei seu corpo da cama. Eu que não
iria ficar presenciando seu sonho erótico com o Jake enquanto a Hailey
estava mal. Seu corpo caiu no chão fazendo-o, finalmente, acordar.
— Ui, adoro um sexo selvagem! — Só então ele percebeu que
não tinha Jake, tampouco safadeza. — O que foi isso, Hannah? Eu já
recebo foras do Jake diariamente, agora não posso nem mais sonhar
em paz? — perguntou se levantando e esfregando os olhos.
— Preciso de você pra ir ao hospital comigo. Hailey está ardendo
em febre.
— E você tá esperando o quê, mulher? Corre! Vai vestir uma
roupa. — Ed me empurrou para fora do seu quarto, mas antes de ir
para o meu passei no quarto da Hailey, ela ainda se remexia na cama,
porém dormia. Vesti a primeira roupa que encontrei, peguei minha
bolsa com meus documentos e os da Hailey, então voltei para o quarto
dela. Ed já estava trocado e com ela nos braços.
— Liga pro Jake. — Ed saiu praticamente correndo com minha
filha nos braços e eu fui atrás.
— Jake deve estar dormindo, ele já passou o dia com a gente,
merece um descanso. Quando o dia amanhecer, falo com ele. — Eu
sabia que levaria uma bronca dele depois, mas não era certo acordá-lo
a essa hora sendo que o Ed estava conosco.
— Ok. Vamos!
Cerca de dez minutos depois já estávamos em frente ao hospital.
O lado de fora parecia bem movimentado para o horário, então
lembrei que esse era o maior hospital da cidade e deveria ser onde o
rei estava internado, logo jornalistas ficavam à espreita de alguma
notícia. Peguei a Hailey, que ainda dormia, e fui para a recepção do
prédio enquanto Ed foi estacionar o carro.
Diferente do exterior, ali dentro estava mais tranquilo. As únicas
pessoas presentes eram a recepcionista, dois seguranças e quatro
guardas reais. Quando estava me aproximando do balcão, um médico
e três enfermeiras passaram apressados indo em direção ao elevador.
Ouvi uma delas dizer algo sobre o estado do rei Dominic ter se
agravado. Por favor, não morra. Supliquei.
Preenchi a ficha com os dados da Hailey, então seguimos para a
triagem onde um enfermeiro verificou seus sinais vitais. Ela acordou
durante o processo, porém ficou sonolenta. Logo depois foi
encaminhada para a médica de plantão. Se havia algo que os
mirabelienses não podiam reclamar era da saúde pública, porque todos
os hospitais do país eram bem estruturados, tanto que o próprio rei
estava em um deles.
Ed apareceu na recepção a tempo de nos acompanhar enquanto
o enfermeiro nos levava até o terceiro andar onde ficava a pediatria.
Nem preciso dizer que o coitado recebeu olhares nada discretos do
meu amigo.
— Entrem aqui. — O homem de quase dois metros de altura,
roupas brancas contrastando com a pele negra e uma ótima aparência
abriu a porta para nós. A médica era uma senhora simpática. Fez
algumas perguntas e diagnosticou uma alergia. No entanto, devido a
febre alta, ela precisaria passar o restante da noite em observação.
— Mamãe está aqui. — Apertei sua mãozinha enquanto o
enfermeiro tentava furar sua veia para aplicar o soro, ela chorava e Ed
estava quase chorando junto.
— Prontinho, princesa. Agora não vai doer mais. — disse o
enfermeiro, sorrindo para a Hailey quando já estávamos na ala da
observação. Após ele sair, ficamos apenas nós três ali, e em pouco
tempo a Hailey pegou no sono.
— Eu até gosto de hospitais, mas não gostei nada de vir com
Hailey pra cá — informou Ed, olhando triste para a garotinha na cama.
— Ainda bem que não é nada grave. — Ele assentiu e ficamos em
silêncio para não atrapalhar o sono da Hailey.
Se passaram algumas horas e eu simplesmente não consegui
fechar os olhos. Olhei para a Hailey dormindo na cama, Ed apagado na
poltrona, então decidi dar uma volta pelo hospital, quem sabe até eu
não encontraria um jeito de ver o rei.
Seis
Pois nada nunca poderá substituir você
Nada pode me fazer sentir como você faz
Você sabe que não há ninguém que eu possa me relacionar
E sabe que nós não vamos encontrar um amor tão verdadeiro
Nothing Like Us - Justin Bieber
Sete
Mas você não tinha que me excluir
Fingir como se isso nunca tivesse acontecido e que não éramos nada
E eu nem sequer preciso do seu amor
Mas você me trata como um estranho e isso é tão rude
Somebody That I Used To Know - Gotye (feat. Kimbra)
Oito
Eu estava sufocando no meio da multidão
Andrew
Há pessoas que entram em sua vida para fazer o bem e outras
para fazer o mal. Porém, também existem aquelas que só entram para
fazer bagunça e causar o maior estrago possível. Hannah se encaixa
neste terceiro grupo, e não me refiro ao jeito desastroso de esbarrar em
tudo e todos.
Ela fazia uma verdadeira bagunça em minha cabeça.
Durante a madrugada, devido ao álcool e a situação delicada do
meu pai, eu me permiti baixar a guarda perto dela, deixando-a me
consolar. Lógico que a "ajuda" não foi de graça, afinal todos esperam
receber algo em troca quando me fazem favores. No caso, Hannah quis
marcar um encontro comigo, o qual recusei sem hesitação. Eu não
queria saber algo que tenha ficado pendente sobre o nosso passado,
foi um longo caminho para superá-la e não seria agora que meu
psicológico voltaria àquele estágio.
Contudo, Hannah parecia disposta a não me deixar em paz,
aparecendo sempre nos momentos e lugares que eu menos esperava:
primeiro no cemitério, depois no hospital e por fim, embaixo de uma
mesa. Neste último encontro, ela conseguiu atiçar minha curiosidade ao
acusar o rei Eros de saber o motivo pelo qual ela me deixou.
Não acreditei em suas palavras, é claro, mas desejei saber qual
história ela tinha inventado, qual plano por trás de tudo. Não duvidava
que tivesse planejado algo bem minuciosamente para me enganar
outra vez, vindo com uma desculpa esfarrapada dizendo estar
arrependida.
E, por Deus, uma parte de mim realmente desejava que ela
tivesse tido uma boa razão para ter me abandonado!
Assim sendo, decidi aceitar seu pedido e marcar aquela reunião
para o dia seguinte. O modo como Hannah sorriu logo depois me
alertou que eu tinha tomado uma das piores decisões de toda a minha
vida. Constatei que ela me deixava confuso ao agir como fazia no
passado, e sabe-se lá o que poderá fazer caso descubra essa
fraqueza. Enquanto a observava ir embora, toquei o canto da boca
onde ela me beijou, seria difícil de esquecer a maldita textura dos seus
lábios.
Neste momento, Jake apareceu e os vi se abraçarem. Ele foi
outro em quem confiei, considerei ser meu amigo de verdade, e sumiu
da minha vida sem sequer se despedir. Os dois bem que se mereciam.
— Você precisa evitar este tipo de cena em público — advertiu
Eros, esgotando o restante da minha paciência.
— Vamos embora.
Retirei uma nota da carteira entregando a garçonete, mandando-a
ficar com o troco. Queria ir logo embora dali e ocupar minha mente com
qualquer outra coisa que fosse. Estava a caminho da saída quando
algo esbarrou em minhas pernas.
Se eu não tivesse visto Hannah sair, afirmaria que tinha sido ela,
porque nenhuma outra criatura no mundo tinha a capacidade de ser um
desastre ambulante nas mesmas proporções. Porém, quando virei não
vi ninguém. Um choro infantil cortou o ar, me fazendo olhar para baixo
encontrando uma criança no chão.
Uma criança chorona era tudo o que faltava!
Ainda assim, não deixei o cavalheirismo e a gentileza de lado.
Abaixei-me, oferecendo minha mão.
— Você se machucou, pequena? — A garotinha ergueu a cabeça
para me olhar, seus olhos verdes estavam inundados de lágrimas e ela
assentiu, continuando a chorar.
Como ela não segurou minha mão nem se levantou sozinha, a
peguei nos braços para tentar consolá-la. Verdade seja dita, eu adoro
crianças e levo jeito com elas, tanto que sonhava em ter um número
elevado de filhos. E sempre que possível, estava criando projetos em
prol dos pequeninos.
— Andrew, não temos tempo para isso. Vamos. — Ignorei o
chamado de Eros focando toda minha atenção na criança em meus
braços.
— Onde está a sua mamãe? — Afastei os fios castanhos do seu
cabelo que estavam colados nas bochechas gorduchas. Ela apontou
para a saída, então arregalou os olhos me empurrando.
— Mamãe não dexa fala com estlanos. — Tive que sorrir diante
de tanta fofura.
— Mas eu não sou um estranho, sua mãe me conhece. —
Qualquer pessoa em Mirabelle me conhece. — Eu posso te contar um
segredo? — ela acenou com a cabeça e falei baixinho: — Eu sou um
príncipe.
Sua boca se abriu em surpresa e o choro cessou. Crianças,
sobretudo meninas, tinham essa mesma reação quando eu dizia isso.
No entanto, ela me encarou parecendo desconfiar.
— Cadê sua coloa?
— Está na minha casa.
— No catelo?
— Sim, pequena.
— Tio Edi disse que sou uma plicesa. — falou orgulhosa, me
deixando ainda mais encantado com sua esperteza.
— Claro que é, uma linda princesinha. — Não resisti a vontade de
apertar sua bochecha quando ela sorriu. — E princesas não devem
ficar sozinhas, com quem você está?
— Comigo, Alteza. — Olhei na direção da voz que me respondeu.
Uma senhora de cabelos grisalhos fazia uma reverência. Devia ser avó
da menina. — Estávamos no banheiro e ela saiu correndo, perdão pelo
inoportuno.
Acenei para a senhora olhando carrancudo para a garotinha.
— Você não deve sair correndo por aí, poderia ter se machucado.
Prometa-me que não fará de novo.
Após ela prometer e eu alertar que princesas não quebram suas
promessas, coloquei-a no chão me despedindo.
— Eu preciso ir. Foi um prazer conhecê-la, princesa. — Peguei
sua mão pequeninha e beijei. Ainda demorei alguns segundos para me
afastar, devido a meiguice naqueles olhinhos verdes me encarando.
Quando levantei, ela acenou um tchauzinho e devolvi o gesto.
— Consolar a criança foi uma boa jogada para abafar a discussão
com aquela mulher. — Eros comentou, minutos depois, ao entrarmos
no automóvel que nos levaria para o castelo.
Assenti pegando o celular para ler as notícias do dia em Mirabelle,
e também para evitar ouvir a voz do meu futuro sogro.
Capítulo Nove
Nove
Estou caindo
Em todos os bons momentos, me vejo ansiando por mudança
E nos maus momentos, sinto medo de mim mesma
Shallow – Lady Gaga
Andrew
Quando acordei, notei que meus olhos estavam roxos como se
tivesse sido golpeado. As olheiras eram consequência das últimas
noites mal dormidas. Eram tantos problemas para pensar que quando
conseguia fechar os olhos e adormecer, o despertador tocava avisando
que eu deveria levantar. Minha aparência física estava deplorável, só
não tanto como meu emocional.
O dia no castelo começou em uma correria. Antes de tomar o café
da manhã, tive que assinar documentos e analisar projetos. Aproveitei
os serviços do secretário do meu pai para organizar uma agenda para o
restante da semana, mas deixando um espaço livre nas próximas horas
para que pudesse ir ao encontro com a Hannah.
Ao terminar as primeiras atividades do dia, fui informado que o Sr.
Morris estava a minha espera. Chamei-o no meu escritório tentando
disfarçar a ansiedade que sentia para ver os resultados do seu
trabalho.
— Bom dia, Oliver! — o cumprimentei quando se sentou na
cadeira a minha frente.
Prontamente, ele apontou para um envelope em cima da mesa.
Uma batida falhou no meu peito ao ver do que se tratava.
— Foi o máximo de informações que eu consegui, Alteza. Espero
que lhe sejam úteis.
— Obrigado, procure o Henry para acertar seu pagamento. — Ele
saiu me deixando sozinho com aqueles papéis.
Relutei inúmeras vezes antes de abrir aquele envelope. Eu queria
mesmo saber como foi sua vida nos últimos anos? Eu não me
importava mais com ela, por que então precisaria investigar sua vida?
Diabos, a quem eu queria enganar? Eu tinha medo do que poderia
encontrar ali.
Respirando fundo, tomei coragem e abri o envelope.
Hannah Price
Data de nascimento: 12/12/1999
Filiação: Jonathan Price e Elizabeth Price
Na primeira folha não havia nenhuma informação relevante,
apenas coisas das quais já tinha conhecimento, como sua avó que
trabalhou como criada no castelo e seu pai como guarda, entre outras
coisas. A única informação que chamou minha atenção ali foram os
dados da sua conta bancária. Passei a página e logo desisti da leitura
ao ver uma informação que não me agradou. Guardei os papéis de
volta no envelope colocando dentro da gaveta.
Saí caminhando pelos corredores do castelo sem rumo algum,
pensando no que acabara de ler. Neste momento, senti uma falta
absurda do meu pai. Gostaria de conversar com ele, poder desabafar,
ouvir sua opinião e seus sábios conselhos.
Ainda estava perdido em pensamentos quando encontrei Sophia
no salão principal do palácio. Ela usava um comportado vestido branco
e o cabelo estava preso em uma trança lateral. Sua aparência estava
perfeita como sempre. No entanto, as feições em seu rosto indicavam
tristeza.
— Bom dia, Sophia!
Ela fingiu não me escutar. Sophia ainda estava chateada por
trocar seu nome quando estávamos juntos, desde então vinha me
ignorando.
— Gostaria de tomar café comigo no jardim? — sugeri, pegando
sua mão delicada e levando-a aos lábios. — Creio que precisamos
conversar.
— Eu preciso fazer minhas malas para voltar ao meu país,
podemos deixar para outra oportunidade. Desculpe. — respondeu com
gentileza forçando um sorriso.
Senti-me o mais canalha dos homens. Eu realmente tinha
magoado minha noiva por causa de alguém sem importância. Ela
estava pronta para desistir de tudo que construímos por causa de um
momento nostálgico meu. Hannah fazia parte do meu passado, Sophia
era o meu presente e futuro. Não podia permitir que uma ex-namorada
interferisse na minha vida desse modo, fazendo-me perder a única
pessoa que eu tinha no momento.
Com isso em mente, segurei o rosto da Sophia a fazendo me
encarar.
— Eu sei que nada justifica o erro que cometi com você e não
estou pedindo para me perdoar tão facilmente, mas não podemos nos
separar por algo tão bobo. Hannah fez parte do meu passado e você
sabe disso. Naquela noite eu estava com a cabeça cheia, bebi mais do
que devia, o que me fez perder a lucidez. Eu estou com você, iremos
nos casar em breve e garanto passar o resto dos nossos dias provando
que você é a única mulher em minha vida. — Seus olhos azuis
brilharam de emoção e ela me abraçou. Rodeei-a com meus braços
buscando oferecer algum tipo de conforto no abraço.
— Preciso de você aqui comigo, não sou capaz de suportar toda
esta pressão que jogam em meus ombros se estiver sozinho. Prometa-
me que ficará até tudo melhorar?
— Sim, eu prometo — ela disse. Toquei seus lábios com os meus,
beijando-a com carinho.
Ordenei que servissem nosso café da manhã no jardim. Enquanto
aguardávamos, Sophia me contou a repercussão que o cancelamento
do nosso casamento teve no mundo todo.
Nosso sossego não demorou muito, pois seu pai se juntou a nós
no jardim. O homem não calava a boca nem para beber seu chá, ora
falando dos problemas do reino, ora sobre o meu casamento e o
quanto ajudaria ter alguém ao meu lado. Sophia quem o deu atenção e
os dois passaram a discutir sobre uma nova cerimônia. Só entrei na
conversa ao me dirigirem uma pergunta:
— Andrew, alguma ideia de para quando será remarcada a
cerimônia? Seria vantajoso para Mirabelle selar de uma vez a união de
vocês.
Desviei meu olhar da xícara de café alternando entre minha noiva
e seu pai. Meu primeiro pensamento foi dizer que o casamento só
aconteceria quando meu pai acordasse, afinal eu gostaria de tê-lo ao
meu lado em um momento tão marcante. Contudo, os médicos não
tinham previsão de quando ele poderia despertar, talvez em dez dias ou
dez anos, era impossível saber. Obriguei-me a pensar mais
racionalmente e percebi como Sophia poderia me ajudar estando na
posição de rainha e que a cerimônia alegraria os cidadãos de Mirabelle.
— Por mim, pode ser no próximo domingo, mas a decisão cabe a
Sophia. — Dei de ombros. Casamento para mim deixou de ter
importância quando Hannah negou meu pedido.
— No domingo? É impossível. Precisamos de no mínimo um ano
para organizar outro evento, apenas o vestido demora meses para ser
confeccionado. Sem mencionar nos convidados que vieram na semana
passada...
— Andrew precisa de você ao lado dele, Sophia. — Eros interferiu
com rispidez. — Seu dever é ajudá-lo, não organizar a maior festa do
mundo.
— Tem razão, papai. — respondeu Sophia com a cabeça baixa.
— Podemos fazer uma cerimônia mais simples, apenas para os
familiares e nossos aliados.
— No domingo, então? — Eros indagou sorrindo, parecendo mais
ansioso que a própria noiva.
— No domingo — confirmei.
— Apresse-se, Sophia. Temos que agilizar os preparativos, avisar
a imprensa... — Eros começou e eu o interrompi.
— Sophia, eu terei o restante da manhã livre, o que me diz de
passarmos um tempo juntos?
— É claro que ela aceita — o rei respondeu. Me irritava o modo
como ele tratava a filha como uma marionete.
— Você aceita, Sophia? — repeti a pergunta olhando diretamente
para ela.
— Será um prazer, Andrew. — disse sorrindo.
— Ótimo. Enquanto, isso irei contatar a assessoria de imprensa
para divulgar a notícia. Tenham um bom dia — avisou Eros, finalmente
se afastando.
— Eu deveria cuidar do nosso casamento, mas não posso negar
um pedido seu. Para onde iremos?
— Pensei em irmos ao hospital infantil, já faz um tempo que visitei
as crianças. — Vi o sorriso no seu rosto morrer com minhas palavras.
— Algum problema?
— Não, é que pensei que passaríamos o tempo sozinhos, mas
tudo bem. Irei me arrumar, encontro você em meia hora. — Levantou-
se. Fiz o mesmo, segurando seu braço.
— Não temos muito tempo e você está perfeita assim. — Ela
sorriu com o elogio e só entrou no castelo para pegar a bolsa.
Em menos de uma hora estávamos no hospital. Visitamos todas
as crianças em seus leitos, as meninas sempre ficavam encantadas
conosco por parecermos um casal dos seus filmes favoritos; passamos
na sala de jogos, porém não nos juntamos a brincadeira; conversei com
o diretor me informando sobre questões administrativas, e por fim fui
ver a pessoinha que eu considerava uma das mais especiais ali.
Lily era a criança que estava há mais tempo no hospital. Lutava
contra a doença há mais de três anos e nunca perdeu o sorriso nem o
brilho no olhar. Eu gostava de me espelhar em sua força quando estava
enfrentando um problema e me sentia fraco demais.
— Olá, minha princesa! — Ao ouvir minha voz, ela virou o rosto
para o lado sorrindo quando me viu.
— Tio... Cof... Cof... Andrew! — conseguiu dizer depois de tossir
repetidas vezes.
— Estava com saudades de mim, mocinha? — Me aproximei
fazendo cócegas levemente em sua barriga. Ela gargalhou, mas logo
começou a tossir muito.
Uma enfermeira se aproximou e nos explicou que ela havia feito
uma sessão de quimioterapia ontem, e devido a isso seu corpo estava
ainda mais fraco.
— Sim, muita! Cof... Cof... Você nem acredita quem veio me
visitar — falou super empolgada. Fiz cara de pensativo sentando na
sua cama.
— Deixa eu tentar adivinhar... Um príncipe encantado quase tão
lindo quanto eu? — Ela balançou a cabeça negando sorrindo ainda
mais. — Hmmm... O Papai Noel?
— Não é Natal! — replicou rindo, voltando a tossir.
— Já sei! A fada do dente! —afirmei com convicção e ela me
olhou séria.
— Você é muito lerdo, tio. — Ela me chamou para mais perto se
esticando para cochichar no meu ouvido. — Vou dar uma dica: ela é
minha amiga, é linda e é o amor da sua vida! — Senti meu corpo travar
imediatamente. Eu sabia que ela não se referia à Sophia.
Capítulo Dez
Dez
Me ajude
É como se as paredes estivessem desmoronando
Às vezes, sinto vontade de desistir
Mas eu não posso
Não está no meu sangue
In My Blood - Shawn Mendes
Tive mais uma péssima noite de sono. Andrew não saiu dos meus
pensamentos um segundo sequer. Eu tinha cogitado levar a Hailey
comigo, Andrew não teria como negar a semelhança entre os dois
quando a visse, contudo temia sua reação e não queria a Hailey no
meio de uma cena desagradável. Além do mais, iríamos nos encontrar
em um lugar público, outras pessoas poderiam perceber os traços
semelhantes entre eles.
Levantei bem cedo, tomei banho e precisei rebocar o rosto com
maquiagem para disfarçar as olheiras. Como Ed ainda dormia, preparei
o café da manhã e fiquei na cozinha esperando o tempo passar. Neste
período, recebi uma ligação do Jake.
— Hannah, minha mãe passou mal. Estou com ela no hospital.
Não poderei ficar com a Hailey hoje, desculpe — comunicou assim que
atendi a ligação.
— Não precisa se preocupar conosco, Jake. Sua mãe precisa
mais de você do que nós. Como ela está?
— Ela não vem se alimentando nem dormindo direito desde a
morte do meu pai. Hoje cedo, eu e minha irmã a encontramos
desmaiada na cozinha. Os médicos disseram que o corpo dela está
fraco e exausto.
— Espero que ela se recupere logo. Ainda a devo uma visita.
— Esteja preparada, pois ela já está preparando nosso
casamento e agradecendo aos céus por eu "ter tomado jeito de gente"
— imitou uma voz feminina na fala da mãe, o que me fez sorrir. Daisy
acreditava que éramos um casal desde o dia que Jake contou a ela que
morávamos juntos, e continuava insistindo nisso apesar do filho sempre
negar.
— Não quero nem imaginar o que ela irá pensar quando conhecer
a Hailey.
— "Jake Thomas Reynolds, você teve a insensatez de esconder
minha netinha de mim? Está merecendo umas chineladas, rapaz." —
imitou mais uma vez a voz da mãe e gargalhei alto ao lembrar de
quando éramos crianças e ela dizia coisas desse jeito.
Após as risadas, seu tom de voz ficou sério.
— E você? Está preparada?
— Não. Estou tão confusa! Andrew me trata com frieza, mas as
vezes eu vejo nele o garoto que eu conhecia. Quando ele age dessa
forma, penso que nada mudou entre a gente. Aí ele volta a ser um
babaca, e eu não consigo conversar com ele sem sentir vontade de
bater em sua cara e mandá-lo para o inferno.
— Só tente não o espancar em público para não aumentar nossos
problemas. — Tentou fazer piada, porém eu não sorri e ele percebeu.
— Seja sincera, Hannah. Você se livrará desta culpa que carrega há
anos dentro de si. Caso Andrew não acredite, voltaremos às nossas
vidas e você seguirá em frente com a consciência limpa, sabendo que
fez a sua parte. — Jake fez uma pequena pausa. — Eu sempre estarei
com vocês.
Eu chorava silenciosamente quando ele terminou de falar. Ao
longo dos últimos anos, nós cultivamos uma relação única. Era
diferente da relação que tinha com o Andrew. Existia a confiança, o
respeito, a cumplicidade, o amor. Devido a isso, muita gente nos
confundia com um casal. No entanto, faltava atração carnal entre nós.
Jake era o irmão que eu nunca tive, meu gostoso anjo da guarda.
— Obrigada, Jakezinho — chamei-o da forma que ele odiava. —
Eu amo você!
— Eu também, minha Rapunzel — zombou de volta. — Se cuida!
Encerramos a ligação e minutos depois Ed apareceu na cozinha,
trajando seu pijama cor de rosa, pantufas da mesma cor e com cara de
quem caiu da cama.
— Vestida desse jeito você vai se encontrar com o homem da sua
vida ou com o rei? — Ed resmungou. — Não, pera... Eu sou lerdo como
você quando acordo. — Esfregou os olhos bocejando.
— Bom dia, Ed! Como foi sua noite?
— Melhor que a sua, pelo visto. — respondeu, dirigindo-se à
mesa, e encheu uma xícara de café dando um longo gole em seguida.
— Por tudo que é mais sagrado, Hannah, vai se vestir de forma
decente. Coloca um decote profundo que eu duvido que o príncipe não
vá lhe dar total atenção. — Ele saiu me empurrando em direção ao
quarto.
— Você deve começar falando com ele sobre o dia que se
conheceram, lembre-o de tudo que vocês viveram, das loucuras que
vocês faziam na cama, então você conta em detalhes do dia em que
esqueceram a camisinha e puff... a Andrewconda lançou o veneno na
sua caverninha.
— Sem dúvidas, seguirei seu conselho — ironizei.— Agradeço
sua ajuda, mas estou bem assim. — reclamei baixo para não acordar a
Hailey que dormia em minha cama.
É claro que Ed não me ouviu. Ele abriu o guarda-roupa e, minutos
depois, estava trocando meu vestido longo e folgado por um vestido
azul colado, com um decote generoso, mas vesti um sobretudo fechado
por cima. Eu só usaria as artimanhas do Ed no último caso. Depois de
me trocar no banheiro, voltei ao quarto para beijar a testa da minha
bebê que ainda dormia.
— Ed, por todo o tesão que você sente pelo Jake, cuide bem da
minha filha — supliquei.
— Pode deixar. E espero que você volte mais tarde com o pai
dela. — Ed beijou minha testa e me abraçou forte. — Boa sorte!
Onze
Eu sei que não posso dar nem mais um passo até você
Porque tudo que me espera é arrependimento
Você não sabe que não sou mais o seu fantasma?
Você perdeu o amor que mais amei
Jar of Hearts - Christina Perri
Doze
Eu sei que você está pensando que eu não tenho coração
Eu sei que você está pensando que eu sou frio
Eu estou apenas protegendo minha inocência
Estou apenas protegendo minha alma
Too Good at Goodbyes - Sam Smith
Andrew
Hannah Price
12/12/1999 (20 anos)
Filiação: Jonathan Price e Elizabeth Price
Estado Civil: Casada
Saldo em conta corrente: £ 2.700,00
Hannah nasceu em Florence, Mirabelle. Filha única do Sr. e
Sra. Price, nada se sabe sobre sua família materna, pois sua mãe
foi criada por parentes distantes. Sua avó paterna trabalhou como
criada no castelo por mais de cinquenta anos até chegar ao leito de
morte, o avô morreu em 1981 servindo a guarda real do país. Há
seis anos, seus pais morreram em um acidente de carro, em que ela
foi a única sobrevivente. A órfã foi morar com sua tia Samantha
Mitchell, viúva do Sr. Mitchell, um grande empresário. Seus únicos
parentes vivos são a tia e duas primas. (...)
Três anos atrás, deixou Mirabelle indo morar em Londres,
Inglaterra. Casou-se com Jake Reynolds, dois meses depois e se
mudaram para Paris, França. O casal leva uma vida luxuosa,
possuem uma casa em um bairro nobre da cidade e nada se sabe
sobre terem trabalhado durante os últimos três anos.
No fim de 2018, tiveram a primeira filha. (...)
Reli o relatório, novamente incapaz de continuar depois da
palavra filha. Minha mente queria acreditar que não passava de uma
ilusão, mas a frase continuava ali. Jake e Hannah estavam juntos e
tinham uma filha. Perceber que a mulher que amei estava vivendo
meu sonho com outro homem era doloroso demais.
Capítulo Treze
Treze
Você se sentiria melhor
Se assistisse enquanto eu sangro?
Todas as minhas janelas ainda estão quebradas
Mas estou de pé
Skyscraper - Demi Lovato
Quatorze
Quando o silêncio não é quieto
E parece que está ficando difícil de respirar
E eu sei que você sente como se estivesse morrendo
Mas eu prometo que vou levar o mundo a seus pés
Rise up – Andra Day
Quinze
Ninguém disse que seria fácil
É uma pena nos separarmos
Ninguém disse que seria fácil
Mas também não disseram que seria tão difícil
Oh, me leve de volta ao começo
The Scientist - Coldplay
Andrew
Quase 24 horas depois da conversa com Jake, eu ainda não tinha
feito muitos avanços na investigação sobre o tal sequestro. Sr. Morris
estava trabalhando no caso, porém não me passara nenhuma
informação até o momento, pois ainda estava averiguando as causas
do acidente do meu pai, e o rei era prioridade.
Apesar da falta de informações concretas, fui juntando os pontos
e as coisas começaram a fazer um certo sentido em minha cabeça.
Meu pai sofreu um acidente no dia do meu casamento, evento
que iria fortificar os laços de Mirabelle com Lorena. O rei quase morreu
e a cerimônia foi cancelada. Dias depois, surgiu uma suposta filha
minha, que havia uma mínima - e quase impossível - esperança de vir a
ser minha sucessora, e a criança aparentemente foi sequestrada.
Se tudo isso fizesse parte de um plano contra a monarquia, eu
tinha cometido um erro terrível ao acusar Hannah e Jake de terem
inventado o sequestro e, pior ainda, uma criança inocente estaria
correndo perigo por minha causa.
Por Deus, se de algum modo inconcebível ela fosse mesmo
minha filha, eu nunca me perdoaria.
Com isso em mente, passei por cima de todo o meu orgulho e
decidi buscar informações por conta própria.
Não foi difícil encontrar em qual lugar da cidade Hannah estava,
afinal eu tinha um relatório sobre sua vida. Era por volta das sete da
noite quando cheguei ao endereço indicado. Ao chegar no prédio, o
porteiro me reconheceu de imediato e facilitou minha entrada. A
recepcionista também fora gentil - e um tanto assanhada - me
informando com facilidade o número do apartamento do Sr. Edgar
Lewis. Ordenei aos dois guardas que me acompanhavam que me
esperassem na recepção, e entrei no elevador seguindo rumo ao nono
andar.
Ao chegar ao meu destino, toquei a campainha do apartamento
905 esperando impacientemente alguém vir abrir a porta. Repeti o
gesto diversas vezes, chegando a pensar que não havia ninguém em
casa. Já estava quase indo embora quando ouvi um barulho do outro
lado, como se algo tivesse caído, e logo em seguida a porta foi aberta.
Hannah apareceu em meu campo de visão usando um pijama
folgado que cobria quase todo o seu corpo, o cabelo estava uma
bagunça com uma parte solta e o restante preso. Meu primeiro
pensamento ao vê-la naquele estado foi o quanto ela ficava adorável ao
acordar.
— Que merda você veio fazer aqui, Alteza? — Ela adotou uma
postura desafiadora, que fez meu coração errar uma batida. Inferno!
Assumi minha postura fria para não demonstrar que tinha sido
afetado.
— Minha paciência para sua falta de educação está esgotando,
Hannah. É bom passar a me tratar com respeito, se não quiser
conhecer o ótimo sistema carcerário de Mirabelle.
Ela revirou os olhos, marcados por olheiras que indicavam
péssimas noites de sono.
— Perdão, Sua Alteza Real. — Fez uma reverência exagerada. —
Pode me informar por que uma mera mortal, desprezível como eu, está
tendo a honra de sua visita? — suas palavras escorriam sarcasmo.
— Nós precisamos conversar. — Dei um passo à frente para
entrar e ela se colocou no meio da porta, me impedindo de passar.
— Não, não precisamos. Vossa Alteza deixou bem claro que não
queria mais me ver ou conversar comigo. Estou cumprindo suas
ordens.
— Me poupe desse sarcasmo, Hannah. Nossa conversa naquele
dia não chegou ao fim. A culpa foi minha por deixar a raiva atrapalhar
meu julgamento. Quer que eu admita que eu errei? Está bem, eu
admito. Mas vim aqui tentar consertar as coisas e você vai me dizer
tudo o que tem para falar, não importa o que seja mentira ou verdade.
De repente, seu rosto empalideceu e os olhos perderam o foco.
Aproximei-me, em alerta, achando que ela iria desmaiar. Embora ela
não merecesse minha gentileza, eu ainda era um cavalheiro e não
negaria ajuda.
— Você está bem?
— Eu... eu...
Percebi que seu corpo ia fraquejar e minhas mãos rapidamente
seguraram sua cintura para ampará-la. Maldita ideia! Hannah tinha
mudado nos últimos anos. Seu corpo ganhou mais curvas e minhas
mãos formigavam, querendo explorá-las. Meu corpo todo incendiava e
algo em mim pareceu voltar a vida.
Ela também reagiu ao contato, voltando a realidade. Seus olhos
encontraram os meus e, por um rápido instante, esqueci todas as
mágoas que havia entre nós. Éramos apenas duas pessoas com uma
história inacabada, se reencontrando depois de muito tempo.
Mas então, para acabar com o momento, ela me empurrou
lançando um olhar que congelou qualquer chama de desejo existente.
Olhar esse que ela usou, anos atrás, quando disse não me amar.
— O que você quer saber, Andrew? Se a criança é sua filha? Não,
ela não é. De onde eu tirei a história do sequestro? Eu vi em um filme.
Por que eu achei que você acreditaria? Sei lá, pensei que você
continuasse sendo um bobo. O que eu queria conseguir? Dinheiro, é
óbvio. Mais alguma pergunta?
— Sim, há mais uma. — Adotando a mesma postura que ela,
olhei no fundo dos seus olhos e perguntei: — Onde está a garota? Eu
quero vê-la.
— Está dormindo. — respondeu rapidamente.
— Eu quero vê-la.
— Ser um príncipe não lhe dá autoridade de perturbar o sono dos
outros.
— Mas me dá autoridade para entrar onde quiser sem precisar ser
convidado. — Hannah abriu os braços, colocando as mãos no batente
da porta. Ela queria esconder a garota, e eu tinha que descobrir por
qual motivo.
— Desculpe, Alteza, mas eu sei o que é melhor para minha filha.
E, no momento, é descansar.
Dei um passo à frente, diminuindo quase toda a distância entre
nós.
— Você pode me deixar entrar por bem ou posso chamar meus
guardas.
Ela não cedeu.
— Por que esse interesse repentino em uma
suposta bastardinha?
— Porque eu... — me interrompi antes que falasse a primeira
resposta que veio a minha mente. — Deixe-me entrar, Hannah.
— Não.
— Você já está bem grandinha para continuar com essa teimosia.
— Dei mais um passo e meu corpo ficou colado ao seu. Ela não
recuou. — Eu não vou pedir permissão novamente, Hannah.
— Não peça, me poupa o esforço de ne... — Ela se calou quando
passei o braço em volta da sua cintura.
Por instinto suas mãos soltaram o batente segurando meus
ombros. Sem nenhuma dificuldade, girei nossos corpos, invertendo
nossos lugares e fiquei dentro do apartamento.
Teria sido um bom plano se meu corpo não tivesse recusado a se
afastar. A sensação de tê-la em meus braços era tão reconfortante em
meio a todo o caos que estava vivendo e o calor que emanava dela
aquecia mais de uma parte da minha anatomia.
Dessa vez, Hannah não me empurrou. Pelo contrário, suas mãos
agarraram meus ombros com força, como se pedisse para eu não me
afastar. Sentia as batidas aceleradas do seu coração se misturando as
minhas. Sem conseguir resistir, toquei seu rosto e ela olhou para
mim. Diabos! Hannah fingia tão bem que se naquele momento ela
dissesse que tudo não passou de um mal-entendido e pedisse para
voltar para mim, eu a aceitaria de braços abertos.
— Hannah, aconteceu algum problema? — A voz do Jake nos fez
nos separarmos imediatamente.
Virei o corpo a tempo de vê-lo chegando na sala. Ao menos ele
não viu que eu estava prestes a agarrar sua mulher.
— Você estava demorando, eu vim ver... — Ele se interrompeu ao
notar minha presença. — Boa noite, Alteza. — Fez uma reverência
direcionando o olhar para Hannah.
— Oi, amor. Está tudo bem, o príncipe já está de saída. — Meu
cérebro não processou nenhuma palavra após o "amor".
Fiquei como um espectador vendo Hannah caminhar até Jake, se
erguer na ponta dos pés e dar um beijo rápido em seus lábios. Ele
demorou cerca de três segundos para reagir, e quando o fez, passou o
braço pela cintura dela, como eu fiz minutos atrás, e a puxou para um
beijo de verdade.
Não permaneci ali para continuar vendo a cena. Há um limite de
decepção que um coração consegue suportar.
Hannah
Dezesseis
Tem uma tempestade se formando
E estou preso no meio disso tudo
E isso toma o controle
Da pessoa que eu pensei que eu era
Do garoto que eu costumava conhecer
Waves – Dean Lewis
Andrew
Hannah deveria entrar para o livro dos recordes como a maior
mentirosa do universo, e eu como o maior tolo por acreditar em suas
mentiras. Estava arrependido de ter procurá-la na noite anterior. O que
eu esperava, afinal?
A verdade é que nós nunca teríamos uma conversa madura e
sincera. Hannah era dissimulada demais para isso e eu perdia meu
controle emocional quando estava perto dela. E, além de tudo, houve
aquele maldito beijo...
— Andrew, está me ouvindo? — agradeci a voz que desviou o
foco dos meus pensamentos.
— É claro, Sebastian — respondi por educação. Não fazia ideia
do que ele disse nos cinco minutos que passamos ali.
Estávamos tomando café no jardim, afastados do castelo e da
movimentação com os preparativos do casamento. Benjamin, o filho
dele, estava conosco, porém muitíssimo ocupado se lambuzando com
um pedaço de torta, havia chocolate até em seu cabelo loiro.
— Então, você concorda comigo?
— É claro. — Forcei um sorriso tomando um longo gole de café.
— Eu sabia que você não me negaria um título de duque no seu
país. Fico muito honrado.
— Perdão, o que disse? — quase cuspi o líquido que acabara de
beber.
Sebastian gargalhou.
— Vai contra as regras de etiqueta não prestar atenção na
conversa — recriminou com ironia. — Mas vou ignorar sua falta de
educação porque sua cabeça está cheia no momento.
Ele nem tinha ideia do quanto.
— Você tem razão, me desculpe. Sobre o que realmente estava
falando?
O sorriso dele ampliou e um brilho suspeito surgiu nos seus olhos
azuis.
— Uma despedida de solteiro!
Minha reação não foi tão diferente de quando ele citou o título de
duque.
— Você não pode estar falando sério.
— É claro que estou! Já tenho tudo planejado. Vamos contratar
algumas strippers e você vai beber como se não houvesse amanhã! —
sua animação poderia contagiar qualquer pessoa, menos eu.
— Papai, o que é estipi?
Ben arrancou um sorriso meu com sua pergunta.
— Ele só tem três anos, cuidado com a resposta.
Sebastian pensou por um instante e olhou para o filho, que era
uma cópia idêntica sua.
— É algo que vai lhe divertir bastante quando você estiver
grandinho. Mas a mamãe não pode ouvir essa palavra, certo? — Ben
assentiu voltando sua atenção à torta.
— O que Rachel pensa dessa despedida? — perguntei.
— Ela não vai se importar, afinal a festa será um presente meu
para você, um gesto de gratidão por me livrar da minha irmã. — Ri de
nervoso.
Amanhã eu estaria casado com Sophia.
Para sempre.
— Acho que eu preciso mesmo beber como se não houvesse
amanhã — resmunguei.
Apesar de já ser a segunda véspera do nosso casamento, desta
vez estava tudo diferente.
— Esse é o clima, garoto! Vou convidar os outros príncipes. —
Sem dizer mais nada ele pegou o celular passando minutos focado no
aparelho.
Sebastian estava ocupado e não viu Rachel se aproximar. Ela
estava grávida outra vez, seu vestido verde marcava a barriga de
quatro meses, o sorriso radiante que ela trazia no rosto desapareceu à
medida que olhava seu primogênito com o rosto e o cabelo sujos de
chocolate.
— Olá, Rachel. — Levantei-me para cumprimentá-la e só então
Sebastian notou sua presença.
Foi impossível não notar a devoção com o qual ele a olhou.
Apesar de terem sido obrigados a se casarem, por causa do Ben, eles
desenvolveram um amor invejável depois do matrimônio.
— Oi, docinho. — Sebastian ia ao seu encontro, mas desistiu
quando percebeu o olhar dela.
— Eu deixo o Ben 10 minutos com você e ele fica assim? —
apontou para a criança, que ao ouvir a voz da mãe, desceu da cadeira
e abraçou-a, sujando seu vestido. Rachel pareceu não se importar.
— Mamãe, o papai disse que quando eu crescer posso ter uma
estipi. — Precisei segurar a risada.
— Seu traíra — resmungou Sebastian.
Rachel pegou o filho no colo, enquanto fuzilava o marido com o
olhar.
— Eu posso saber como o Ben aprendeu essa palavra?
— Andrew estava falando da despedida de solteiro dele e deixou
escapar.
— Não me metam na discussão.
Ela desviou o olhar para o filho, suavizando a expressão.
— Ben, quando você crescer vai conquistar o coração de uma
princesa ou de uma moça qualquer e não vai precisar disso que o papai
falou.
— A mamãe está certa, como sempre. — Sebastian foi até eles,
abraçou-os e sussurrou algo no ouvido do Ben, que o fez rir. — Venha
me ajudar a limpar esse moleque, docinho.
— Você pode limpar enquanto me fala mais sobre essa tal
despedida. Estou pensando em fazer uma para a Sophia também.
Eles saíram, discutindo algo sobre direitos iguais e gogo boys.
Reprimi a pontada de inveja que senti da felicidade deles. Eu
jamais teria aquele tipo de relação com Sophia. Por mais que nos
déssemos bem, não existia aquela intimidade entre a gente, e eu
duvidava que depois de 3 anos de namoro isso fosse mudar.
Dezessete
Ninguém nunca te machucou como eu te machuquei
Mas ninguém precisa de você como eu
Eu sei que existem outros que te merecem
Mas querida, ainda estou apaixonado por você
Happier – Ed Sheeran
O destino parecia ter voltado a sorrir para mim, pois tarde da noite
naquele mesmo dia, alguém bateu desesperadamente na porta do
apartamento do Ed.
Estávamos apenas eu e Ed em casa, mas este dormia como um
anjo. Andei cuidadosamente até a cozinha para pegar uma faca antes
de ir para a sala e espiar pelo olho mágico. Já eram mais de duas
horas da manhã. Minhas mãos tremiam de medo. Imaginava ser algum
capanga ou a própria Tia Satan me esperando do outro lado.
Meu choque não poderia ter sido maior quando vi ninguém mais
ninguém menos que o príncipe parado ali.
A faca caiu da minha mão, faltando pouco para acertar meu pé, e
se acertou eu não senti, pois só sentia meu peito batendo forte,
muitíssimo forte. Ele continuou a bater com cada vez mais força. Fui
obrigada a sair do estado de transe e reagir, senão os vizinhos
acabariam acordando.
Foi um pouco difícil girar a chave com as mãos trêmulas, mas
depois de algumas tentativas eu consegui.
— Que merda você tá faze… — não pude terminar a frase, pois
ele me puxou para um beijo.
A primeira coisa que senti foi a maciez dos seus lábios, depois
sua língua invadindo minha boca, suas mãos rodeando meu corpo em
um abraço tão apertado que seria impossível me soltar mesmo se eu
quisesse.
Eu não deveria retribuir o beijo. No entanto, meu corpo não queria
obedecer a minha mente e passou a ter controle próprio. Quando me
dei conta minha mão já estava no seu cabelo, que agora já não era
mais tão volumoso para eu poder bagunçar. Meus lábios se moveram,
acompanhando o ritmo dos lábios dele. Meu coração então nem se
fala, batia mais que tambor em escola de samba.
— Eu senti tanta falta disso, Hannah…. — sussurrou entre o beijo.
Uma das suas mãos subiu para minha nuca, puxando levemente
meu cabelo, mas o suficiente para enviar arrepios por todo meu corpo.
Andrew tentou diminuir a distância entre nós, mas acabou perdendo o
equilíbrio jogando seu corpo em cima do meu.
Em menos de um segundo estávamos os dois no chão, ele por
cima de mim.
— Você se machucou?
Após eu negar, ele deu um chute na porta e, não sei como,
conseguiu fechá-la. Em seguida voltou a me beijar e sussurrar coisas
que eu não conseguia ouvir direito porque estava sentindo algo duro,
muito duro, pressionar minha coxa.
— Andrew… — Ia pedir para ele parar, mas as palavras não
chegaram a se formar, pois ele desceu os lábios para meu pescoço e
suas mãos começaram a passear pelo meu corpo.
Socorro, Senhor! Estou na seca a um bom tempo, não me deixeis
cair em tentação.
— Estou com vontade de fazer isso desde aquele maldito dia que
te encontrei no cemitério.
Soltei um grito — porque me recuso a acreditar que tenha sido
outra coisa —, quando suas mãos alcançaram minha bunda e ele se
ajeitou de modo com que aquele maldito volume, agora um volume
pulsante, pressionasse bem na minha virilha.
Não me deixeis cair em tentação, Senhor!
Não me deixeis cair em tentação, Senhor!
Então parei para analisar a situação e me toquei que tudo aquilo
não deveria passar de um sonho, como tantos outros que tivera com
ele. Afinal, depois de me ver beijando o Jake, Andrew jamais desejaria
me beijar, sobretudo na véspera do seu casamento.
Porém, o sonho parecia tão real… seria um grande desperdício
não deixar minha imaginação brincar. Foi pensando assim que cruzei
as pernas ao redor da sua cintura e mexi meu quadril em direção ao
seu.
— Ah, Hannah… por que não te agarrei antes? — sussurrou com
a voz rouca no meu ouvido.
— Porque você é um grande idiota.
Soltei mais um gemido ao sentir suas mãos entrarem na camisa
do meu pijama e tocar minha pele.
— Você não deveria se referir ao príncipe assim. — Suas mãos
levantaram a camisa, expondo minha barriga e logo depois meus seios.
Andrew baixou o olhar para eles e os encarou por um bom tempo.
Meus seios tinham aumentado de tamanho depois da gravidez, mas
como era só um sonho, ele não deveria estar comparando.
Senhor, não me deixeis acordar desse sonho!
— Mas você tem razão, eu sou um grande idiota.
Sua boca encontrou meu seio direito e o chupou com uma fome
absurda enquanto sua mão apertava o outro seio, e depois de um
tempo inverteu os lados. Eu só sabia gemer, arranhar seus ombros e
fazer uma prece mental para o sonho não acabar.
— Acho que está na hora de consertar as coisas com você —
sussurrou, voltando a beijar meus lábios. — Eu preciso de você,
Hannah.
Andrew me olhou com desejo, mas transparecia um pouco de
afeto também.
Em todos os sonhos tinha essa parte, agora ele pediria para eu
voltar e diria que acredita em qualquer coisa que eu disser.
Entretanto, suas palavras foram totalmente diferentes.
— Você aceita ser minha amante?
Meus olhos se arregalaram, eu tinha escutado certo? O empurrei
e ele, meio desengonçado, sentou no chão.
— O que você disse? — perguntei e comecei a me beliscar até
começar a sentir dor no braço, percebendo que não tinha nada de
sonho naquele pesadelo. Merda!
— Você tem o Jake e eu tenho a Sophia. Mas ainda existe essa
química entre nós, que eu nunca vou ter com minha esposa. E você
mostrou que sente o mesmo por mim.
Andrew tentou se aproximar. Senti o cheiro de álcool exalando
dele. Merda, merda, merda!
— Você está bêbado, Alteza! E deve estar imaginando coisas,
porque não aconteceu absolutamente nada aqui!
— Tem certeza? — Ele olhou para um lugar específico das calças
dele e foi impossível não ser atraída para olhar também.
— Hannah, não consigo parar de pensar em você. Eu sonho com
você. Algumas horas atrás, eu estava na minha despedida de solteiro e
o único corpo nu que desejava era o seu. Por que não podemos ser
amantes?
Só não chorei naquele instante, porque o ódio que estava
sentindo era mil vezes maior. Dominada por esse sentimento, acertei
um tapa na cara dele.
— Vossa Alteza tem uma noiva e é nela que deve pensar!
— Ela não é como você. — Seu tom de voz baixou abruptamente
e uma tristeza tomou conta do seu olhar.
— Então por que diabos vai se casar com ela?
Ele me encarou com uma intensidade tão grande no olhar que
precisei desviar para não o beijar de novo.
— Por que eu vou me casar com a Sophia? A resposta é bem
simples. Porque você me deixou, Hannah! Sou tão idiota que ainda
insisto em correr atrás de você. E ainda te quero nem que seja pela
metade. — O vi secar uma lágrima.
Senti meu coração quebrar mais uma vez, detestava ouvir ele
sendo sincero e não poder retribuir.
Bendito álcool que entra e faz a verdade sair.
E maldita eu que iria me aproveitar disso.
— O que você ainda sente por mim?
— Eu a odeio — disse sem nem pensar e prosseguiu — Eu tinha
planos para nós dois, tinha visto toda a nossa vida juntos, como marido
e mulher, como governantes, como pais, avós… — Fez uma pausa,
pois sua voz estava falhando devido ao choro. — Mas estava disposto
a mudar esses planos também, caso você não se visse neles. Eu
poderia abdicar da minha coroa, desejar apenas 3 e não 9 filhos, morar
em uma casa de 5 cômodos ao invés do Castelo. Não importaria qual
fosse meu futuro, desde que você estivesse nele. — Andrew sorriu
tristemente. — Mas você viu seu futuro sem mim e eu a odeio por não
ser capaz de seguir minha vida sem você.
Eu não tinha resposta para seu desabafo. O silêncio se instaurou
na sala. Andrew deixou claro que não era feliz, tampouco via felicidade
sem mim, em outras palavras ,ele não deixou de me amar.
— E você, o que sente por mim? — perguntou depois de minutos.
Eu já estava com a resposta automática na ponta da língua. Iria
negar tudo o que sentia. Porém, ele estava muito bêbado e certamente
não se lembraria de nada na manhã seguinte. E como ele tinha sido
sincero comigo, ele merecia o mesmo.
— Eu também tinha planos para nós dois, quase iguais aos seus,
exceto os 9 filhos. — Ele riu. — Mas tive que fazer uma escolha difícil,
Andrew. Não o deixei para ficar com o Jake, tampouco por não amar
você. Não teve um dia nesses três anos que não tenha pensado em
você, lembrado do seu sorriso, do seu abraço ou do seu beijo. Mas eu
tive uma filha e ela me ajudou a ser feliz, porque é uma parte de você
também. Quando você tiver filhos com a Sophia vai entender o que
estou dizendo, eles vão se tornar seu mundo, e nada mais vai importar
além da felicidade e o bem-estar deles. — Parei para respirar fundo e
meus lábios se abriram em um sorriso forçado.
— Que merda eu tô falando? Eu não quero que você tenha filhos
com ela, eu não quero que você se case com ela ou que tenha
qualquer contato com ela, porque ainda tenho esperança que tudo vai
se ajeitar e você vai voltar para mim, e então nós poderemos viver
todos os planos que tivemos, além de dar irmãozinhos pra Hailey e
viver aquele clássico clichê de "felizes para sempre".
Ao terminar de falar, olhei para ele e o desgraçado estava
dormindo. Eu não tinha noção do quanto ele tinha ouvido ou se
lembraria de qualquer coisa pela manhã, mas mesmo assim me senti
mais leve em "contar" meus sentimentos para ele.
— Eu ainda te amo, seu idiota — sussurrei.
Aproveitei os minutos seguintes, com ele desacordado, para
admirar seus traços. Andrew estava ainda mais lindo do que na época
em que estudávamos juntos. A barba por fazer combinava bem com
seu maxilar forte. Hailey possuía muitos traços dele, como o formato
dos lábios e o sorriso.
Em poucos segundos minha mente imaginou a cena dos dois
brincando juntos e me vi chorando porque não havia possibilidade de
isso acontecer.
Após me recompor secando todas as lágrimas, me aproximei do
Andrew e comecei a sacudi-lo.
— Andrew, acorda! Você precisa ir para o castelo. — Repeti isso
umas três vezes e ele sequer mexeu a pálpebra.
Quando ia falar pela quarta vez, lembrei do plano para atrasar o
casamento… Eu não precisaria ir ao castelo, se o mantivesse por aqui!
E graças ao Michael, Tia Satan não podia ouvir nossas conversas aqui
dentro.
Eu iria sequestrar o príncipe!
Ou não, já que foi ele que veio até o cativeiro. Eu só o manteria
trancado.
— Andrew, levanta! — O sacudi com mais força e acho que foi um
pouco demais, porque ele não só acordou como colocou para fora
metade do que deve ter ingerido durante o dia.
— Merda! Fica aí.
Tranquei a porta para evitar que ele fugisse. Peguei um pano e
um balde para limpar o maldito vômito. Eu já tinha limpado muito vômito
e cocô da Hailey, então não seria tão ruim.
Quinze minutos e muitas ânsias de vômito depois, eu tinha
terminado. Andrew ainda estava deitado no chão, parecendo sonhar
com os anjos. Para acordá-lo dessa vez fui menos gentil, simplesmente
peguei sua perna e sai arrastando em direção ao meu quarto.
Funcionou. Em dez segundos ele estava acordado.
— Vem, você vai tomar um banho e dormir.
— Você vai tomar banho e dormir comigo?
— Claro que não!
— Então acho melhor ir para casa.
Andrew se levantou virando em direção a porta, e rapidamente
apoiei seus braços em meus ombros fazendo-o mudar de rumo.
— Vou cuidar de você, querido — resmunguei.
— Sabia que você aceitaria minha proposta.
Eu apenas o ignorei levando-o até o banheiro. Deixei-o sentado
embaixo do chuveiro ligando o jato d'água fria. Andrew resolveu tirar a
camisa e tentei evitar ao máximo reparar em seu corpo mais definido.
Após uns dez minutos desliguei o chuveiro. O coitado estava
tremendo de frio, mas ele merecia.
— Vem! — o ajudei a se levantar entregando a toalha.
— Sabia que eu tomava banho de água fria para diminuir meu
desejo por você?
Senti minhas bochechas queimarem, porém o ignorei.
— Vá se secar e depois vá para a cama.
— Você fica sexy toda mandona assim.
Andrew abriu um maldito sorriso safado e começou secando os
cabelos, e isso sim era a verdadeira definição de sexy.
Sai correndo do banheiro indo ajeitar a cama para ele dormir. Eu o
deixaria trancado ali e iria para o quarto da Hailey. Amanhã pensaria
em um jeito de mantê-lo lá dentro.
Tinha terminado de colocar os cobertores na cama quando senti
um corpo se encaixar atrás do meu e lábios beijarem meus ombros.
— Você disse que dormiria comigo.
— Eu não disse isso.
— Mas eu não tô me sentindo bem, Hannah. E você disse que
cuidaria de mim.
Eu ganharia mais tempo se não discutisse.
— Certo. Me solte agora e vá deitar. Eu vou pegar um cobertor
para mim.
— Nós podemos dividir, como antes.
— Vá deitar ou lhe deixarei sozinho.
Ele me obedeceu prontamente e quando passava por mim para
chegar até a cama, eu notei como ele estava.
— Cadê a merda da sua roupa?
— Você me deu banho com ela, não quero ficar resfriado. — Abriu
um sorriso safado. — E não tem nada aqui que você já não tenha visto.
— Apontou para a toalha, que era a única peça que cobria seu corpo.
Eu odiava o Andrew versão bêbado.
— Vá deitar logo!
Finalmente ele me obedeceu e se enfiou dentro das cobertas,
atirando a toalha no chão.
— Eu só vou dormir quando você deitar aqui.
— Estou indo — resmunguei e deitei o mais longe possível dele.
Não valeria a pena insistir no contrário quando claramente ele
pensava que eu tinha aceitado ser sua amante. Minha melhor escolha
era esperar até ele dormir e logo em seguida sair do quarto. Tudo daria
certo.
Ou ao menos quis acreditar nisso.
Capítulo Dezoito
Dezoito
O que eu devo fazer sem você?
É tarde demais para catar os pedaços?
Muito cedo para se desfazer deles?
Você se sente abatida assim como eu?
Always – Gavin James
Andrew
Eu não lembrava quando tinha sido a última vez que senti uma
dor de cabeça tão grande acompanhada de um mal-estar na barriga.
Odeio ressaca!
Tentei me remexer na cama, porém um corpo colado de
conchinha ao meu impediu que me movesse muito, também percebi
que meu membro estava mais acordado que eu sendo pressionado por
uma bunda. Apesar da ótima sensação, abri os olhos para tentar me
mover devagar e não acordar a Sophia.
— Porra! — xinguei quando vi longos cabelos castanhos
espalhados pelo colchão. Sophia é loira!
Assustado, busquei na memória os acontecimentos da noite
anterior. Eu lembrava de ter ido para uma casa de show com os outros
príncipes, ter bebido bastante e de uma dançarina morena. E agora eu
estava em um quarto desconhecido, sem roupa e com uma mulher ao
meu lado.
Diabos! Eu traí Sophia nas vésperas do nosso casamento!
Afastei-me da mulher, que nem lembrava o nome, com o mínimo
de delicadeza possível. No entanto, não notei que ela estava na ponta
da cama e minha brutalidade empurrou a coitada para o chão.
— Aiiii!
— Me desculpe. — Eu ia estender a mão para ela, mas me detive
quando lembrei que estava sem roupa. Procurei o cobertor para cobrir
minha virilidade e quando voltei o olhar ela já tinha se levantado e
estava sentada de costas para mim, com as mãos cobrindo o rosto.
Aproveitei para olhá-la por alguns segundos. Diferente de mim,
ela estava vestida. Seu pijama cinza pouco lembrava a roupa sexy que
ela estava ontem, porém meu corpo sentiu coisas que não sentira
durante seu show na noite anterior.
— Er... — Limpei a garganta, pois não fazia ideia do que falar.
Nunca tinha ficado com ninguém só por uma noite e não parecia certo ir
embora sem falar coisa alguma, sobretudo porque eu precisava garantir
que ela não espalhasse absolutamente nada do que aconteceu entre
nós.
— Então... Eu quero me desculpar por ter ficado com você e
gostaria de saber quanto você aceita para assinar um termo que não
falará nada do que aconteceu entre nós.
— Você acha que tudo se resolve com dinheiro? — retrucou com
rispidez. Sua voz soava muito, mais muito familiar. Talvez eu ainda
estivesse bêbado, se não juraria que era a Hannah.
— Bem, para a maioria das pessoas, sim. — Eu teria que ser
gentil para negociar com ela. — Mas se você tiver interesse em alguma
outra coisa que esteja ao meu alcance, posso providenciar.
Ela passou algum tempo em silêncio. Decidi tentar outra
abordagem.
— Hmmm, como é mesmo seu nome?
Seu corpo ficou ereto e ela abaixou o rosto.
— Você não lembra? — Sua voz mudou, ficando mais fina que
antes.
— Infelizmente, não. Bebi mais do que devia ontem e creio que
tivemos uma ótima noite. — Meu membro era prova viva disso. — Mas
eu não consigo me lembrar. Desculpe.
— Não achei que o príncipe fosse esse tipo de homem. — Sua
entonação demonstrava uma certa raiva.
— E eu não sou. Foi um deslize e eu peço perdão.
— Entendo. Eu só prometo ficar calada se puder ser sua amante.
Eu não poderia ficar mais chocado com seu pedido. Se ela
pedisse uma pedra da lua, eu conseguiria, porém jamais teria uma
amante, apesar dessa ideia ter passado algumas vezes pela minha
cabeça, mas só se a mulher em questão fosse Hannah, não uma
pessoa qualquer.
Então, um flash de memória surgiu em minha mente.
Eu estava deitado no chão, com o corpo da Hannah embaixo do
meu. Eu a beijava com todo o desejo que guardei nos últimos anos e
toda a paixão que ainda sentia por ela. Durante o fogo da paixão,
perguntei se ela aceitaria ser minha amante.
Aquela memória poderia ter sido só um sonho. Entretanto, quando
reparei melhor na mulher a minha frente, outros flashes de memória
surgiram e vi o tamanho da burrada que tinha feito.
Eu tinha saído da festa com vontade de ir atrás da minha mulher.
Tinha beijado a Hannah.
E lembrava também de ter vomitado na frente dela, apesar dessa
parte não ser tão atraente.
— Hannah? — perguntei retoricamente.
Ela se virou e meu coração — e outro órgão — pulsaram mais
forte. Havia esquecido como ela ficava tão linda ao acordar.
— Então agora você se lembra?
— De algumas coisas.
— De quê? — Hannah parecia ansiosa pela resposta e eu não
resisti a vontade de provocá-la, mesmo que precisasse inventar.
— Você retribuiu meu beijo, dormimos na mesma cama e eu estou
sem roupa. O que Jake acharia disso?
— E sua noiva, que deve estar se preparando para o casamento
agora, como ela se sentiria?
Ela conseguiu me deixar na defensiva. Realmente, tinha bem
mais a perder do que ela.
— Eu sei que você não vai contar nada a ninguém.
— Sabe? Dias atrás você disse que sou uma golpista.
Mulher rancorosa dos infernos!
— Então o que você quer em troca do seu silêncio? Realmente
quer ser minha amante?
— Claro que não! Mas tenho uma proposta para você — ela fez
uma pequena pausa, parecendo incerta. Ergui uma sobrancelha para
encorajá-la a negociar seus termos. — Quero que você se atrase para
o casamento.
Fitei-a desconfiado, sua exigência não fazia sentido para mim.
— O que você está tramando?
— Garanto que não tem nada a ver com você, porque se eu
quisesse acabar com o seu casamento já teria enviado nossas fotos
para algum site de fofoca.
Fotos? Inferno!
— Você não tem escrúpulos, Hannah.
— Eu não lhe obriguei a vir aqui e ficar comigo. O errado da
história é você, querido.
Hannah era uma boa negociadora, porém foi burra ao dizer que
tinha fotos e deixar seu celular perto da cama.
— Certo. Se você me explicar detalhadamente por que devo me
atrasar para o meu próprio casamento, tem a minha palavra que
cumprirei.
— Você não vai acreditar.
Segurando o cobertor, sentei na beira da cama bem ao seu lado e
muito próximo do celular.
— Hannah, vamos ser maduros ao menos uma vez e conversar
sem os ressentimentos do passado. Prometo que não a julgarei. —
Coloquei a mão na sua coxa e o gesto a deixou desnorteada.
Ela olhou para onde minha mão a acariciava e eu usei esses
segundos de distração para esticar o braço e pegar seu celular.
Contudo, não fui rápido o suficiente, pois ela notou meu
movimento.
— Largue!
— Desculpe-me, mas não vou me meter nos seus planos. —
Apertei o celular na mão calculando o tempo que levaria para chegar
até a janela e arremessar o aparelho.
Ia levantar para correr, quando Hannah se jogou em cima de mim
tentando tirar o celular da minha mão.
— Me devolva!
Ela começou a me arranhar e me bater. Eu só precisei de um
mínimo esforço para empurrá-la para a cama. Só não esperava que ela
fosse chutar minhas joias reais.
— Diabos! — Cai na cama, me contorcendo de dor, mas mantive
o celular em minhas mãos.
Hannah não desistiu e usou o segundo pior golpe de tortura — o
primeiro já tinha feito. A desgraçada começou a fazer cócegas em mim.
A dor se misturou as risadas e tive que largar o aparelho para
detê-la. Segurei seus braços com força, mas ela não desistiu, usando
as pernas para me chutar, o que pouco surtiu efeito.
— Desista, Hannah!
— Nunca! — Ela mordeu meu braço com força, me fazendo soltar
o seu.
Usei o feitiço contra o feiticeiro e passei a fazer cócegas nelas.
Hannah gargalhava entre os xingamentos que proferia contra mim e eu
fui arrebatado pelo lindo som estranho da sua risada. Parei com as
cócegas admirando por um segundo aquela cena. Os cabelos dela
caiam sobre o rosto e ela não parecia se importar com a aparência, na
verdade ela nem precisava, pois o sorriso radiante que emoldurava
seus lábios trazia a maior beleza possível a sua face.
Iludi-me, imaginando uma vida em que acordasse com essa
imagem todos os dias.
— Você é um idiota, Andrew! — Ela não desfez o sorriso ao dizer
isso e suas palavras me transportaram para o passado.
Ignorando qualquer bom senso que restava em mim, eu a puxei
para perto e a beijei. Hannah não hesitou um segundo sequer antes de
retribuir com a mesma louca intensidade.
Era por isso que eu não a entendia. Em um momento, beijava o
Jake na minha frente e dizia me odiar, mas correspondia
fervorosamente a meus beijos. Talvez seu objetivo fosse só me deixar
doido, e ela obtinha muito sucesso.
Até esqueci porque estávamos brigando um minuto atrás. A beijei
como se fosse a última vez, e provavelmente seria mesmo.
Não me sentia culpado por estar traindo minha noiva no dia do
nosso casamento. Não me culpava por estar beijando uma mulher que
tinha outro. A carícia entre nós não parecia errada, pelo contrário, nós
dois juntos parecíamos tão certo quanto a soma do quadrado dos
catetos era igual ao quadrado da hipotenusa.
Apertei-a forte em meus braços, como se jamais fosse soltá-la,
aprofundando o beijo.
— HANNAH!!! — Alguém gritou do outro lado da porta e ela saiu
de cima de mim.
— Que merda aconteceu, Ed? — Ela parecia tão feliz quanto eu
pela interrupção.
— Levanta, mulher! Temos que começar com nosso plano. —
Hannah me olhou fazendo um gesto para eu ficar calado. Quem era eu
para desobedecer?
— Estou cuidando disso nesse exato momento, Ed. Em 10
minutos te conto.
— Espero que esteja se depilando para atrasar o príncipe.
Hannah ficou com as bochechas vermelhas.
— 10 minutos, Ed! — ela resmungou e ouvimos passos se
afastando da porta.
— Então seu plano para me atrasar para o casamento é me
seduzindo?
— Esse é o plano do Ed. O meu é deixá-lo aqui trancado.
— Prefiro o do Ed.
— Você é um cafajeste, Alteza!
— Você está traindo o Jake, não é tão diferente de mim.
— Eu não tenho nada com o Jake!
Como eu queria acreditar naquela mentira.
— Eu vi vocês se beijando.
Hannah deu um suspiro, como se estivesse cansada, e me
encarou.
— Pega meu celular.
Não entendi seu pedido, mas ela repetiu e a curiosidade me fez
obedecer. Procurei o aparelho em cima da cama e apesar de toda a
briga por ele, eu estendi a ela.
Hannah sentou na cama e imitei-a, esperando ansioso para o que
me mostraria.
— No dia que eu beijei o Jake, você queria entrar no apartamento
e ver minha filha. Eu não podia deixar, pois ela não está aqui, então eu
beijei o Jake para obrigar você a ir embora.
— Por que... — ela me mandou continuar calado.
Observei, em silêncio, ela desbloquear o celular e ir para as
mensagens. Em seguida me entregou o aparelho pedindo para eu ler a
mensagem.
Minha querida sobrinha, que garotinha mais adorável essa sua!
Se quiser que ela continue ilesa, recomendo seguir algumas regrinhas:
1. Afaste-se do príncipe;
2. Tire a polícia do caso, afinal eu sou apenas uma tia cuidando
da sua sobrinha-neta;
3. E se o príncipe lhe procurar, o convença que a filha não é dele.
Entregarei sua filha após o casamento real e no mesmo dia vocês
duas sumirão do país. Caso o casamento não aconteça, sua filhinha
quem sofrerá as consequências.
Tentei absorver o conteúdo da mensagem. Aquilo poderia ser
mais uma grande mentira, porém explicaria muita coisa sobre o
comportamento estranho dela e suas variações de humor.
Hannah tomou o celular da minha mão e antes que eu pudesse
reclamar, me devolveu. Dessa vez não estava no aplicativo de
mensagens e sim na galeria, mais especificamente na foto de uma
menininha.
— Isso, di-digo e-ela é... — Não consegui formular palavras vendo
aquela imagem.
A criança da foto usava um vestidinho azul, sua pele era clara e
seus cabelos castanhos como o da Hannah, o sorriso faltando alguns
dentes também eram familiares, as bochechas rechonchudas davam
um toque de fofura a sua face. Porém o que mais me chamou atenção
foi o seu olhar. Seus olhos possuíam um tom de verde absurdamente
brilhantes, idênticos aos meus e aos do meu pai.
Hannah passou o dedo na tela e outra foto apareceu. Nesta, a
criança estava de pijama, toda descabelada e fazendo o bico mais fofo
que já vi na vida. A cada foto que Hannah passava, sentia meu peito
bater mais forte e ser preenchido de amor.
— Essa é nossa filha — Hannah disse, confirmando o que eu já
sentia.
Capítulo Dezenove
Dezenove
Achei que poderia te afastar com a noite fria
Deixar alguns anos diminuírem o que eu sinto por você
E toda vez que conversamos
Cada palavra nos traz para esse momento
E tenho que me convencer de que não quero isso
Back to you – Selena Gomez
Vinte
Me dê amor como nunca antes
Porque ultimamente eu tenho desejado mais
E faz algum tempo, mas ainda sinto o mesmo
Talvez eu deveria deixar você ir
Give me love – Ed Sheeran
Sophia
— Nada dará errado hoje! — falei para meu reflexo no espelho
repetidas vezes.
Tinha acordado com um pressentimento ruim, mas tentava ignorá-
lo, pois devia ser por causa do nervosismo e da cerimônia anterior que
não chegou a acontecer. No entanto, dessa vez tudo daria certo.
Apesar de ter tido pouco tempo para organizar a festa e não poder
ser um evento tão alegre, devido ao rei estar internado, eu iria casar
com o homem que amo. Esperei a vida toda por ele, e nenhum detalhe
podia estragar isso, nem mesmo meu vestido confeccionado em
apenas três dias.
Reparei no meu reflexo no espelho. Eu estava horrível! A noite
com as garotas ontem tinha sido intensa, ao menos até o momento em
que os maridos/namorados das outras mulheres chegaram e acabaram
com a festa.
Como meu Andy não era um imbecil como meus irmãos e os
outros, ele não apareceu. Eu sabia que ele confiava em mim.
Sorri ao lembrar dele. Em poucas horas nós seríamos um do outro
para sempre. Eu me tornaria Sophia Leah Bachmann Leining, princesa
de Mirabelle. E em breve, Andrew e eu estaríamos cuidando dos
nossos herdeiros.
Era um sonho de anos se tornando realidade.
Batidas na porta interromperam meu devaneio. Após minha
ordem, as camareiras entraram no quarto.
— Vossa Alteza! — disseram as duas mulheres se curvando. —
Está na hora de começar seu dia de noiva.
Segurei a vontade de dar pulinhos de emoção. Nada irá dar
errado! Pensei mais uma vez. No evento anterior, eu estava prestes a ir
para a igreja quando recebi a notícia do acidente do Rei Dominic e que
o Andrew tinha cancelado o casamento. Chorei por horas naquele dia.
Para mim tudo estava perdido. Contudo, Andrew também estava
ansioso para se casar comigo e remarcou a data apressadamente.
As duas mulheres me ajudaram a me trocar e a disfarçar as
olheiras em minha face. Deixei o quarto seguindo o caminho até onde
meu motorista aguardava. Porém, interrompi minha caminhada ao
encontrar meu irmão Sebastian e a princesa Katherine discutindo. Eles
não viram minha aproximação.
— Como assim você não sabe onde ele se meteu?
— Eu não sou babá dele, ora. E eu tinha que salvar minha mulher
de você!
— Ao menos ninguém sumiu da minha festa!
— Ele vai aparecer. E sabemos que ele não saiu com a dançarina.
— Vocês estão falando sobre quem? — invadi a conversa, pois
estava ficando curiosa.
Os dois viraram a cabeça na minha direção abrindo sorrisos falsos
para parecerem relaxados.
— O Theo. — disse Katherine.
— O Eric. — falou meu irmão simultaneamente.
Olhei para os dois desconfiada.
— O Theo e o Eric não voltaram da festa ontem e não sabemos
onde estão. — Katherine respondeu calmamente.
— Devem estar se divertindo com outras mulheres por aí. Vocês
viram o Andy?
— Você não pode vê-lo no dia do casamento! Dá azar. —
Sebastian falou.
— Você nunca foi supersticioso, Sebastian.
— Mas nós não queremos outra cerimônia cancelada, não é
irmãzinha? Preciso me livrar logo de você.
Não dei atenção a sua provocação.
— Preciso ir para o meu dia de noiva. Se virem o Andy, digam-lhe
que estou com saudades.
— Vou até começar a procurá-lo para dar seu recado, irmãzinha.
— Sebastian disse, beijando minha mão e em seguida saindo pelo
corredor.
— E eu vou procurar algo divertido para fazer nesse país. Nos
vemos no casamento, Sophia. — Katherine se despediu indo para o
lado contrário ao que meu irmão seguiu.
Eles pareciam estranhos, mas optei por não me preocupar.
Aquele era meu dia e nada poderia me tirar a paz.
Passei horas no salão, cuidando da pele, unhas, cabelo e tudo
que eu tinha direito no dia do meu casamento.
Por volta do meio-dia, minhas queridas madrinhas se juntaram a
mim. Passamos grande parte da tarde conversando amenidades e
histórias de casamento. Rachel contou como tinha detestado o seu dia
de noiva, pois estava casando por obrigação e não queria nada daquilo.
— Meu pai deixou guardas vigiando cada janela e porta do SPA
onde eu estava para garantir que eu não fugisse. — disse às risadas.
Rachel e meu irmão tinham uma história de amor engraçada. Eles
gostavam um do outro, mas não se amavam a ponto de pensar em
casamento, porém o pequeno Benjamin fez as coisas se apressarem e
eles tiveram que se casar para não ter um bastardo nas duas famílias
reais. É claro que ambas as famílias se beneficiavam muito com esse
casamento. Porém, após o nascimento do filho, Rachel e Sebastian se
aproximaram mais aprendendo a se amar. Eu sabia que o Andy ainda
não me amava como meu irmão amava a sua mulher, mas acreditava
fielmente que tudo iria mudar após o nosso casamento.
Casamento esse que seria às 16 horas. Dessa vez, a cerimônia
não seria na principal igreja de Mirabelle, pois tinha que ser em um
ambiente mais reservado, e Andrew optou pelo jardim do castelo. Outro
ponto negativo é que não teríamos lua de mel, porque o rei estava no
hospital e Andrew precisava representá-lo nos assuntos da corte. Me
entristecia nada estar saindo como planejei durante todos nossos anos
de namoro. Contudo já planejava uma viagem para fazermos quando
os ânimos se acalmassem na realeza.
— Soph, está na hora de colocar o vestido! — disse Rachel
animada.
Meus olhos se encheram de lágrimas, mas me esforcei para não
chorar e destruir a maquiagem. Meu coração batia acelerado. E
vislumbrava a imagem do Andy me esperando no altar.
Ele estaria com aquele sorriso tímido me olhando como se fosse a
mulher mais linda do mundo e prestes a me tornar sua.
As minhas quatro madrinhas já estavam deslumbrantes com seus
vestidos em tom de rosé, assim como as duas daminhas que entrariam
comigo e a menina do hospital que o Andy tinha convidado.
Minhas camareiras me ajudaram a colocar o vestido. A peça era
mil vezes mais simples que a outra, não havia tantas camadas, sendo
este mais justo ao corpo abrindo-se mais abaixo do joelho, o grande
destaque estava no decote que deixava os ombros expostos e as
mangas eram transparentes com alguns detalhes em branco.
Terminaram de fazer os últimos ajustes no vestido e eu admirei
minha imagem no espelho. O vestido combinava com o penteado
delicado do meu cabelo, um coque com alguns fios soltos, adornado
por uma coroa delicada de topázios imperiais cor de rosa que
contrastavam harmonicamente com as tulipas rosas do meu buquê.
A maquiadora estava fazendo os últimos retoques na minha
maquiagem quando percebi minhas madrinhas cochichando entre si.
Antes que eu pudesse perguntar o que era, Rachel se virou vindo na
minha direção com um sorriso enorme.
— Estou tão feliz por você, Soph! Você está linda. — Ela me olhou
emocionada. — Mas uma noiva que se preze deve atrasar para o
casamento, então vamos esperar mais um pouco.
— Não, Rachel. Eu já esperei o Andrew por tempo demais!
— Mas… — A interrompi.
— Mas nada, vamos.
— Tudo bem, vou ser sincera com você. — Ela segurou minhas
mãos apertando-as com força. — Andrew não voltou para o castelo
ontem depois da festa.
— Como assim?
— Ninguém sabe para onde ele foi, mas Sebastian me garantiu
que ele não saiu com a stripper.
— E onde ele estava?
— Não sabemos.
— Onde ele está agora?
— No castelo.
Rachel estava dando respostas curtas demais.
— E qual o problema?
— Ele está bêbado, a ponto de não conseguir ficar de pé, e o
bispo disse que não vai casar alguém nesse estado.
— Isso não é verdade! Andrew raramente bebe.
— Sebastian já chamou um médico e estão cuidando dele, em
uns 30 minutos ele deve ficar bem.
Olhei para o teto para não deixar as lágrimas caírem. Andrew não
tinha o direito de fazer isso comigo! Ele tinha sumido na noite anterior e
aparecia bêbado no castelo? Onde ele estava com a cabeça?
— Soph, se acalma.
— Eu estou calma, Rachel. Mas preciso de um minuto sozinha.
Levantei sob os protestos das camareiras, pegando meu celular
para tentar falar com o Andrew. Afastei-me da multidão, indo para a
sala de massagem que estava vazia e disquei seu número. Chamou
diversas vezes e ninguém atendeu. Iria tentar pela sexta vez, quando
meu pai decidiu me ligar.
— Você está com o Andrew? — foi a primeira coisa que falei.
— Não, mas ele logo ficará bem. Como você está?
— Odiando-o, papai! Ele não podia estragar nosso dia.
— Não tem nada estragado, minha princesa. Seu noivo logo, logo
ficará bem.
— Mas eu não quero casar com ele estando bêbado.
— Nem pense em fazer nada imprudente, Sophia. Lembre-se que
você espera por esse dia há anos, não invente de ficar brava com seu
noivo, ele apenas quis curtir o último dia de solteiro, mas a partir de
hoje ele será somente seu. Se quiser discutir com ele, guarde a raiva
para amanhã, mas não permita que nada estrague seu grande dia.
— Obrigada pelo conselho, papai.
— Estou lhe esperando para levá-la ao altar.
Sorri encerrando a ligação. Papai sempre desejou minha
felicidade e incentivou o meu amor pelo Andrew, e até mesmo quando
aquela plebeia tentou se meter no meu caminho, ele me ajudou a
separá-la do Andrew. Embora isso tenha custado algumas joias e
dinheiro dos nossos cofres, valeu muitíssimo a pena.
— Você não vai ser feliz. — Ouvi uma voz infantil dizer e virei-me
em direção ao som.
Era a garotinha do hospital, Lola, Luana, Lara… não lembrava seu
nome.
— O que disse? — sorri gentilmente para ela me aproximando
para ouvi-la melhor, sua voz era baixinha devido a sua enfermidade.
— Você não vai ser feliz. Você não ama o tio Andrew de verdade.
— É claro que eu o amo, nós vamos nos casar.
— Você só está fazendo isso para agradar sua família. No fundo,
bem no fundo, o seu sonho é outro.
Quem era ela para achar que me conhecia?
— Eu nasci para casar com um príncipe e governar um país, fui
criada e educada para essa vida.
— Mas é o que você realmente quer?
Demorei para responder. Ora, todo mundo na vida tinha desejos
impossíveis, algumas pessoas eram loucas o suficiente para largar tudo
e ir em busca do que desejavam e a maioria dessas pessoas
fracassava. Eu estava bem com a minha vida e tinha certeza que seria
feliz com o Andrew.
— Eu quero me casar com o Andrew, governar Mirabelle e criar o
próximo rei do país.
— Se Andrew não fosse um príncipe, você se casaria com ele?
— Soph, vamos tirar algumas fotos. — Ashley entrou na sala.
— Vem, princesinha. — Peguei a mão da garotinha e voltei para
onde estavam minhas madrinhas.
Apesar de não ter respondido à pergunta, aquilo ficou martelando
em minha mente e alguns minutos depois cheguei à conclusão que
não, pois se Andrew não fosse um príncipe eu jamais o teria conhecido
para poder amá-lo.
Quase uma hora de atraso depois, avisaram que o príncipe já
estava bem e eu podia ir para o castelo. Por sorte, a cerimônia tinha
poucos convidados e a notícia da bebedeira do Andrew não chegaria
aos jornais e revistas.
Fizemos os últimos retoques na maquiagem e cabelo, então
partimos para a limusine. As madrinhas foram em um carro e eu no
outro com as três daminhas de honra e a enfermeira que acompanhava
a garotinha, que não parou de me olhar um segundo sequer durante
todo o percurso.
Em menos de quinze minutos chegamos ao castelo. Meu pai me
esperava um pouco antes do local em que o evento aconteceria
fazendo questão de abrir a porta do veículo para mim.
— Você está uma verdadeira rainha! — Sorri aceitando o braço
que ele estendia para me ajudar a sair da limusine.
Esperamos as madrinhas entrarem e logo em seguida ouvi o som
da marcha nupcial tocar. As daminhas foram na minha frente. Meu pai
me guiou até o corredor que tinha sido feito no jardim que levava ao
altar.
Foi quando eu o vi. Andrew estava impecável no seu traje azul
marinho, sua coroa demonstrava todo seu poder e sua seriedade era
digna de um rei.
Inspirei fundo dando o primeiro passo. Meu coração estava
aceleradíssimo. Finalmente o grande momento havia chegado!
Capítulo Vinte e um
Vinte e um
Não consigo encontrar outro caminho
E eu não quero ouvir aquele som
de perder o que eu nunca encontrei
Down – Jason Walker
Andrew
Por que diabos eu tinha marcado o casamento para aquele dia?
Era a pergunta que estava remoendo em minha cabeça desde
que saí do apartamento do Ed. É claro que a razão principal da dúvida
era o sequestro da garota, que podia ser minha filha. Mas além disso,
outro assunto martelava em minha mente: se eu tivesse mais tempo
poderia entender melhor a história da Hannah com o Jake.
Essa mulher foi enviada das profundezas do inferno para
atormentar minha vida. Ela tinha dito que não estava com o Jake, mas
eu tinha visto os dois se beijando e tinha um dossiê da vida dela, que
alegava que os dois eram casados. Então, do nada, ela dizia que tinha
fingido estar com ele para me afastar e, como o trouxa que era, eu
queria acreditar nisso.
Sendo sincero, gostaria de saber a real história sobre ela e seguir
minha vida sem esse grande ponto de interrogação.
Contudo, eu tinha que esquecê-la e pensar na garotinha
sequestrada. Sentira fortes palpitadas no peito quando vi a foto e
lembrei do nosso encontro dias atrás. Sendo ou não minha filha, ela era
uma menina adorável e inocente, não merecia estar correndo perigo.
Meu maior desejo era mover Mirabelle inteira até encontrá-la,
porém Hannah mostrou que não era uma ideia tão boa e eu estava me
sentindo impotente por não saber o que fazer, e pior por ter remarcado
o casamento para uma data tão próxima e ter pouquíssimo tempo para
resgatá-la.
— Grant, eu preciso de um grande favor seu. — disse ao meu
guarda no caminho de volta para o castelo.
— Às suas ordens, Alteza.
Eu o tinha encontrado no hall do prédio da Hannah. Grant
informara que ele tinha me levado até o local após a despedida de
solteiro e se manteve disfarçado lá, trocando o uniforme azul da guarda
real por roupas normais, que não fazia ideia de como as conseguiu.
Certamente, ser invisível quando necessário era uma lição do seu
treinamento para ser um guarda. Além disso, ele conseguiu apagar as
imagens das câmeras de segurança do prédio e tinha evitado um
grande escândalo.
— Você tem algum amigo na guarda real a quem confiaria sua
vida?
Eu não possuía proximidade com os guardas para saber em quais
poderia confiar, o único ao qual me sentia próximo era Carl, que faleceu
no acidente do meu pai. Não tinha tempo para conhecer os guardas e
escolher alguns para ajudar no plano da Hannah, mas estranhamente
eu confiava no Grant, e ele conhecia os seus companheiros melhor do
que eu.
Portanto, contei a história sobre a Hailey e seu sequestro, o plano
de resgate e como ele e os outros guardas iriam ajudar. Só alterei
alguns detalhes do que tinha sido acordado com Hannah.
— Eu tenho uma filha pequena e posso imaginar o quanto está
sofrendo, Alteza. Prometo que farei o que estiver ao meu alcance. —
disse Grant ao ouvir todas as minhas instruções.
Ao chegar ao castelo, nós entramos pela entrada dos funcionários
ao invés da principal. O caminho percorrido para chegar até o meu
quarto também foi evitando os corredores mais frequentados, para não
me deparar com algum dos meus convidados e ser interrogado de onde
eu passara a noite anterior.
Meu próximo problema era encontrar um jeito de atrasar a
cerimônia por alguns minutos para dar mais tempo aos guardas que
iriam ajudar no resgate. Ainda era por volta de meio dia, e a cerimônia
seria às 16h.
De início, fui pelo mais óbvio que era me esconder. Decidi ir para
os aposentos ao lado do meu, que anos atrás pertencera a Hannah.
Desde que ela se foi, nunca deixei ninguém entrar, nem mesmo as
criadas entravam para limpar. Sujeira e teias de aranha cobriam o
ambiente, mas mesmo assim me tranquei lá dentro permanecendo ali
por algumas horas.
Meu celular estava descarregado desde a noite anterior. Ninguém
me perturbava, nem havia meios de passar o tempo e distrair minha
mente, então começaram a surgir cenas na minha cabeça de anos
atrás, naquele mesmo lugar.
Lugar onde passei ótimos momentos, mas também onde meu
coração foi quebrado.
Engoli minha autopiedade e resolvi fuçar os armários e gavetas
presentes ali para o tempo passar mais rápido. A maioria das roupas
que ela deixou para trás foram doadas, porém havia umas peças que
não permiti que fossem entregues a outras pessoas. Na terceira gaveta
do closet as encontrei, o vestido que usou no dia que voltou do hospital,
a lingerie usada em nossa primeira vez e a touca cinza que costumava
usar na escola. Eu tinha lhe dado aquela peça no seu aniversário, mas
ela deixou para trás.
Não vi o tempo passar perdido ali com minhas memórias.
Quando resolvi olhar meu relógio vi que eram 15:20. Decidi que
era uma boa hora para voltar. Sai do quarto abandonado indo para o
meu, pronto para despertar o ator que existia em mim.
— Pensei que não fosse aparecer! — disse uma voz assim que
abri a porta dos meus aposentos.
— Hannah lhe atualizou sobre as mudanças no plano? — Mantive
a maior frieza possível, segurando-me para não socar sua cara.
Jake apontou para o próprio corpo. Ele trajava o uniforme dos
meus guardas, o que respondia a minha pergunta.
— Peguei no guarda-roupa do meu pai. — Deu de ombros. —
Michael pediu para te entregar isso. Você precisa usar, mas ninguém
pode ver — Jake parecia tão amigável quanto eu.
Ele estendeu a mão com um minúsculo objeto. Olhei desconfiado.
— Quem é Michael e que diabos é isso?
Jake revirou os olhos.
— Michael é alguém que está nos ajudando e isso é para você
colocar na orelha se quiser saber o que está acontecendo.
Peguei o minúsculo ponto eletrônico, mas não coloquei no ouvido.
Meu olhar encontrou o dele, que era tão frio quanto o meu.
Por um instante analisei suas características. Jake tinha olhos
castanhos escuros, o nariz era longo e fino e os traços do seu rosto
eram muito diferentes do da Hailey. Acho que eles só tinham o branco
dos olhos parecido.
Não havia uma semelhança sequer entre eles e a garota não se
parecia tanto com Hannah para só ter herdado as características dela.
Meu Deus, o que estava pensando?
— Obrigado, pode seguir para o seu posto, os convidados já vão
começar a chegar. — O expulsei, pois não queria mais ser atormentado
com tais pensamentos.
— Eu preciso lhe pedir mais uma coisa. — Fiz apenas um gesto
para ele prosseguir e tirá-lo rápido dali. — Coloque soldados em todas
as saídas de Mirabelle, caso o plano dê errado.
Ao menos ele era mais sensato do que Hannah.
— Eu já fiz isso.
— E mais uma coisa, pode deixar algum guarda protegendo a
Hannah também, já que eu não estarei com ela?
A insinuação que ele tinha o dever de protegê-la despertou uma
absurda onda de ciúmes em mim. Tentei me convencer que era o ego
de governante, que tinha a obrigação de proteger os cidadãos de
Mirabelle.
— Farei isso. — Não admiti que já tinha dado ordens a Grant para
ele próprio ficar ao lado dela.
Jake assentiu e se movimentou em direção a saída. Me segurei
para não perguntar qualquer coisa sobre Hannah ou Hailey.
Entretanto, Jake estava caminhando devagar demais até a porta e
a cada segundo que passava uma pergunta sobre elas surgia. Meu
orgulho dizia que eu não deveria remoer o passado. Meu coração, por
sua vez, queria que ele confirmasse a história da Hannah.
— Andrew.
— Jake — dissemos simultaneamente.
— Você primeiro — completei.
Nunca tinha visto insegurança no Jake até aquele momento, seus
olhos expressavam angústia. Ele abriu a boca duas vezes ensaiando o
que dizer, por fim limpou a garganta e falou:
— Eu fui embora com a Hannah a pedido do seu pai, para não
deixá-la sozinha.
Não era uma novidade, meu pai tinha me contado quando decidi ir
atrás dela.
— Só que Hannah é uma mulher incrível e foi inevitável não me
apaixonar, por isso permaneci com ela.
Uma declaração de amor era absolutamente tudo o que eu
precisava ouvir nesse momento. Agora eu podia seguir em frente com
minha vida e meu casamento.
— Mas nunca tentei nada porque o coração dela pertencia a outro
homem.
Ótimo, mais um na história!
Usando toda minha inteligência emocional, encarei seus olhos
respirando fundo antes de falar.
— Jake, não sei por que está me contando isso, eu realmente não
tenho nada a ver com a vida amorosa da Hannah.
— Ela nunca lhe esqueceu, seu idiota.
Aquilo atingiu em cheio o meu peito. A sensação de não ter sido o
único a não ter superado fez meu coração bater três vezes mais
rápido…. Até eu lembrar que poderia ser apenas mais uma mentira do
joguinho deles.
— A história de vocês ficou mal resolvida e ela nunca conseguiu
seguir em frente, mas depois do seu casamento não haverá mais
chance para vocês, e não vou medir esforços para conquistá-la.
E eu não vou medir esforços para quebrar a sua cara.
— Não entendo por que está me fazendo perder tempo com esse
desabafo.
— Porque nós éramos amigos, Andrew. Não quero que você
passe o resto da vida pensando que traí sua confiança. Me arrependo
por ter sumido e por não ter convencido Hannah a voltar para Mirabelle
quando descobriu a gravidez, ou de ter avisado a você sobre a criança.
Talvez eu tenha sido egoísta e quisesse ficar com elas para mim, mas
você não merecia. Espero que um dia me perdoe.
Seu pedido de desculpas soou sincero, mas como eu poderia
perdoá-lo?
Jake ficou em silêncio, na espera de uma resposta que não veio.
Eu precisava juntar todas as peças do quebra-cabeça antes de tomar
qualquer decisão a respeito dele e de Hannah. Se os dois estivessem
falando a verdade, o Sr. Morris, meu investigador, tinha me passado
uma informação falsa.
Eu ia fazer uma pergunta ao Jake, porém barulhos vindos do
outro lado da porta do meu quarto me impediram. Segundos depois,
dois homens entraram no quarto.
— Isso é hora de aparecer, Andrew? — gritou Sebastian.
Seu irmão, Príncipe Samuel, o acompanhava.
Tive que improvisar incorporando o bêbado que havia em mim.
— Xebastian, meu amigo do peito! — Andei até ele o abraçando,
dando alguns tapas nas suas costas. — Voxê me deu a melhor fexxta
da minha vida toda!
Pelo canto do olho vi Jake segurar uma risada, mantendo seu
disfarce de guarda.
— Onde diabos você estava? — Ele me empurrou em direção a
parede. Senti a batida nas minhas costas e, mantendo o papel de
bêbado, perdi o equilíbrio e caí no chão.
— Comemorando meu último dia xoltero como voxê mandou.
— Eu só não o mato agora porque a cerimônia começa em 20
minutos e você precisa se arrumar!
Tentei levantar, mas meu corpo mole devido a suposta
embriaguez não permitiu e voltei a cair no chão.
— Pode me axudar? — Estendi a mão para o Sebastian e ele me
ignorou, lançando um olhar de nojo.
— Você desaparece por horas e volta bêbado na hora do seu
casamento, seu imbecil! — gritou Sebastian irritado.
Se alguém fizesse o mesmo com a minha irmã, eu também
estaria odiando-o.
Ele controlou a raiva e seu olhar desviou para Jake.
— Você sabe onde ele estava?
— Os guardas o encontraram em um bar próximo ao local da
festa — mentiu Jake.
— Vou chamar seus empregados para lhe darem um banho.
Eles saíram e levantei rapidamente.
— Você precisa ir, os convidados já devem estar chegando.
Manterei o papel de bêbado pelo máximo de tempo que conseguir.
Jake assentiu indo embora. Aproveitando que estava sozinho,
coloquei o ponto eletrônico no ouvido. De início escutei alguns ruídos
seguidos da voz do Ed dizendo algo sobre sequestrar o bispo.
— Vocês conseguem me ouvir? — testei.
— Sim — responderam diversas vozes.
Haveria várias pessoas me ouvindo falar besteira de bêbado.
Lamentável.
Me deitei no chão e fiquei jogado até alguém aparecer.
Não demorou para alguns dos empregados do castelo chegarem
e me levarem para o banheiro. Foi ridículo eles tentando me levantar, e
depois de muito esforço e reclamações da minha parte, conseguiram.
— Eu xei tomar banho xoxinho!
— Ontem não sabia. — Ouvi Hannah resmungar e sorri.
Os empregados não queriam me deixar sozinho e eu tive que
ameaçar demiti-los. Após saírem, conversei alguns segundos com os
envolvidos no plano. Hannah, Ed e Grant estavam fora do castelo, Jake
e outros guardas estavam espalhados entre a garagem e o jardim do
castelo, onde aconteceria a cerimônia, e o tal de Michael estava em
casa monitorando as câmeras da cidade, o que era ilegal, mas decidi
não reclamar sobre aquilo no momento.
Tirei o ponto eletrônico e entrei na banheira. Permaneci lá por um
longo momento, ignorando todas as batidas na porta e gritos que eu
estava atrasado para o casamento.
Só acabei meu banho quando ouvi o grito do Sebastian dizendo
que iria arrombar a porta e eu não duvidava dele. Coloquei o dispositivo
de volta na orelha, era tão pequeno que dificilmente seria visto, vesti o
roupão e sai cambaleando do banheiro.
— Os convidados já chegaram, menos tia Satan. E se ela não
vier? — Hannah perguntou.
— Eu consigo atrasar mais alguns minutos até ela chegar —
respondi antes de sair do banheiro e voltar a ser um bêbado.
Os minutos seguintes foram de pura loucura. Tentaram me vestir a
força. Esperneei como uma criança de 5 anos pedindo minha coroa,
também fingi que iria vomitar, mas a melhor parte foi quando a notícia
chegou aos ouvidos do bispo e ele se recusou a casar um homem
alcoolizado.
Então, o castelo enlouqueceu. Queriam adiar o casamento, porém
o pai da Sophia não permitiu que outra cerimônia fosse cancelada. Até
que chamaram um médico, que aplicou um soro com glicose e depois
disso eu não pude mais fingir.
A tia da Hannah ainda não tinha aparecido quando desci para o
jardim e o desespero começou a surgir, tanto pelo plano estar dando
errado, como por em poucos minutos eu estar me casando com outra
mulher que não Hannah.
Capítulo Vinte e dois
Vinte e dois
Tão longe, mas ainda assim tão perto
As luzes se acendem, a música morre
Mas você não me vê, aqui de pé
Eu só vim aqui para dizer adeus
Dancing on my own - Calum Scott
Andrew
Sempre me considerei um cara romântico. Sonhava em casar e
ter uma grande família com a mulher que amava.
No entanto, o dia do meu casamento havia chegado e felicidade
não combinava com aquele momento. Minhas mãos suavam frio, mas
não era pela ansiedade em ver minha noiva entrar. Havia um nó em
minha garganta, mas não era por segurar o choro de felicidade. Todas
as emoções pareciam erradas e eu tinha a sensação de estar
cometendo um terrível erro.
É engraçado como as coisas mudam rapidamente em uma
semana. No sábado passado, em que aconteceria o casamento, eu não
senti nada parecido com aquele aperto no peito. É claro que eu não
estava explodindo de felicidade, porém o casamento parecia a escolha
certa a se fazer.
Agora tudo mudara.
Olhei ao meu redor e o pensamento de cancelar tudo aquilo
passou por minha mente, porém o peso da responsabilidade com meu
reino e meu povo não permitiu que eu movesse um músculo sequer.
A cerimônia acontecia no jardim em frente ao castelo e tinham
poucas pessoas presentes, na verdade, apenas os membros da
realeza e os guardas. A família da Sophia estava toda ali: pais, irmãos,
cunhada e sobrinho; enquanto do meu lado sequer havia um parente,
somente o príncipe Matthew e sua esposa, Natalie, porque o bispo
exigiu padrinhos.
Mais um detalhe que parecia errado: eu estava ali sozinho.
E o fato de estar prestes a ter uma esposa não amenizava esse
sentimento de solidão.
Enquanto eu dramatizava minha vida, três menininhas entraram
pelo corredor, delimitado por rosas em diversos tons, jogando pétalas.
Foi impossível minha atenção não se voltar para elas, pois uma era a
Lily. Ela estava radiante em um vestido rosa e usava um turbante na
mesma cor do vestido. Seu olhar encontrou o meu e ela abriu um
sorriso, passando-me a mensagem de que eu não estava tão sozinho
assim.
Ao chegarem próximo ao altar, elas saíram de cena dando início a
marcha nupcial.
Minha expressão facial fechou novamente. Não consegui ser falso
a ponto de tentar esboçar um sorriso, enquanto sentia meu peito ser
destroçado por dentro.
Sophia entrou sorrindo, ao lado do seu pai. Ela estava
maravilhosa e espelhava felicidade, como qualquer noiva em seu
grande dia. Me senti culpado por não retribuir seus sentimentos.
Cada passo que ela dava em minha direção causava um aumento
na minha angústia.
— A cerimônia começou e a tia da Hannah não apareceu, duvido
muito que ela ainda venha. — Ouvi a voz do Jake no meu ouvido e eu
nunca fiquei tão feliz em escutá-lo, pois isso desviou totalmente meus
pensamentos. No entanto, ao entender o que ele disse, meu corpo
congelou.
— Mas é a nossa única opção, ela tem que vir! — Ed respondeu,
com certo desespero na voz.
— Michael, me diga que você conseguiu uma nova informação! —
Foi a vez da Hannah falar, compartilhando do mesmo sentimento do
Ed.
— Infelizmente nada ainda. — respondeu uma voz desconhecida,
que deveria ser o Michael.
Enquanto isso, Sophia estava a um metro de distância de mim.
Seu pai beijou sua testa. Dei um passo à frente para segurar e beijar
sua mão. Involuntariamente, abri um sorriso. Não por ter tocado a mão
da Sophia, mas por ouvir uma voz feminina resmungando "ridículos"
pelo ponto eletrônico.
Minha quase-esposa deve ter achado que o sorriso foi para ela,
pois o seu se alargou e seus olhos marejaram, com uma felicidade
pura.
— Cuide bem dela, garoto — disse rei Eros.
De mãos dadas, viramos para o bispo e nos ajoelhamos. O bispo
olhava de cara feia para mim, e certamente só estava realizando a
cerimônia porque era a de um príncipe, caso contrário teria isso embora
ao descobrir que eu estava bêbado.
— Sejam todos bem-vindos para esta celebração do testemunho
e da confirmação do amor… — o bispo iniciou o matrimônio com um
discurso sobre o significado de amar.
— Ela mandou mensagem! — Hannah gritou lendo em seguida.
— “Não esperava que você fosse se comportar, querida sobrinha.
Estragou todos os planos que eu tinha feito para sua filhinha.”
Hannah respondeu a mensagem falando em voz alta o texto para
todos: “Agora é sua vez de cumprir o acordo. Onde eu posso buscá-
la?”
— “Para que tanta pressa? O casamento ainda não terminou,
muita coisa pode acontecer” — Hannah leu com uma voz fina e disse
por fim: — Eu a odeio!
— Não tem como rastrear essas mensagens? — Grant, que
estava com Ed e Hannah, perguntou.
— Não, as mensagens são criptografadas e impossíveis de
rastrear — respondeu Michael fazendo todos ficarem extremamente
calados.
Exceto o bispo.
— Hoje celebramos o amor em forma de entrega, doação, ternura
e graça. Celebramos, na fé, o amor de Andrew Henrich Walker Leining-
Steinfield-Dalgliesh e Sophia Leah Bachmann Gleeson.
Amor… agora estava fazendo o bispo mentir.
— Temos um plano B? — Grant indagou.
— Confiar que ela vá entregar a Hailey após o casamento. —
Hannah disse e pelo tom de voz estava chorando.
O peso do remorso me consumiu.
Eu poderia ter evitado tudo isso se tivesse acreditado na Hannah
desde o início. No entanto, tinha deixado minha mágoa ser maior que o
bom senso e agora uma criança inocente estava sofrendo as
consequências da minha idiotice.
Se meu pai estivesse ali, sentiria vergonha de mim.
— Cof.. cof… desculpem. — Tossi, enviando a mensagem que
tinha combinado com Grant.
— Certo, Alteza! — respondeu e poucos segundos depois falou —
Está feito.
— O que está feito? — Hannah perguntou, com um tom de voz
ameaçador. Não gostaria de estar no lugar do Grant.
— O plano B — meu pobre guarda respondeu, sem tanta
confiança.
Pude sentir o olhar ameaçador da Hannah sobre ele.
— Andrew, você estava conspirando por nossas costas? Eu vou
te matar!
Ouvi algum barulho, seguido pelo grito de Grant.
— Calma, calma, Hannah! Eu vou explicar.
— Escuta ele, Hanninha. — Ed interveio e pelo visto funcionou,
pois o que ouvi a seguir foi minha própria voz.
“Hannah, se você está ouvindo este áudio é porque o seu plano
não deu certo. Tenho uma parcela de culpa muito grande por nos… por
sua filha estar em perigo. Não podia ficar de braços cruzados se o
plano A desse errado, então deixei a ordem com Grant para fechar
todas as fronteiras da cidade e do país e enviar a foto da sua tia para o
nosso serviço de inteligência e os de países vizinhos, caso ela já tenha
fugido. Sei que há o risco dela descobrir, mas não temos outra escolha
agora. Perdão por ter escondido de você, e se não der certo você pode
me matar.”
— INFERNO! — gritou Michael assim que a gravação terminou.
— Como eu não pensei nisso antes?
— Em enviar a foto de Satan para outros países? — Ed
perguntou, confuso.
— Não, na gravação!
— Por que você gravaria um recado pra Hannah? — Jake entrou
na conversa.
— Vocês têm o raciocínio muito lento. Não estou falando de
gravação para Hannah, mas sim de outras gravações.
— Pode explicar melhor, Sr. Gênio? — Ed ironizou.
— Lembram dos gravadores que ela colocou no apartamento? As
gravações eram enviadas para ela, certo? E para um arquivo ser
enviado é necessário um endereço de destino, então com esses
dispositivos eu posso tentar rastrear para qual dispositivo foi mandado
o sinal e buscar a localização dele.
Tive que concordar que ele era um gênio.
— Por que diabos você não pensou nisso antes? — Jake gritou.
— Porque eu trabalho descobrindo senhas, não resgatando
crianças. Mas podemos ficar aqui perdendo tempo discutindo ou
podemos ir ao apartamento agora mesmo.
— Eu vou com você, não vou deixar outro criminoso entrar em
minha casa. — Ed alertou.
Criminoso? A palavra quase saiu da minha boca.
Ouvi a movimentação deles dois. Ed estava se despedindo de
Hannah e oferecendo palavras de conforto a ela. Jake comentou que
ficaria atento e iria com meus guardas até o local que eles indicassem.
E eu fiquei responsável pela única coisa que estava ao meu
alcance: fazer aquela cerimônia demorar o máximo possível.
Primeiro tive que agradecer ao ritual da Igreja Católica e suas
leituras que demoraram quase 30 minutos. Foi o tempo de Ed e
Michael chegarem ao apartamento e iniciarem as buscas pelo gravador.
A seguir, teria início os votos do matrimônio em si, porém o
Andrew de Hollywood entrou em cena.
— Com sua licença, Vossa Eminência. — Levantei-me sobre o
olhar julgador do bispo.
Sophia me olhou sem entender o que estava acontecendo e um
semblante de medo dominou sua face. Ignorei-a, virando-me para os
convidados.
— Antes de irmos para os votos matrimoniais, temos um ritual
aqui em Mirabelle...
Os convidados olharam-me com interesse, exceto o pai da Sophia
que parecia querer minha cabeça naquele instante.
— Todos devem saber que Mirabelle surgiu após uma guerra
entre os dois irmãos Reagan e Archibald. — Várias cabeças
assentiram. — Algumas lendas locais dizem que eles disputavam o
coração de uma mulher e o vencedor teria o seu amor para sempre.
Então, ao longo dos séculos, a família real tem mantido a tradição de
que o noivo precisa disputar o coração da noiva e ser merecedor do
seu amor para sempre.
Algumas mulheres suspiraram.
— Como eu nunca soube dessa tradição? — questionou o rei
Eros saindo do seu lugar.
Porque nunca existiu. Foi o que eu pensei, mas disse:
— O casamento do meu pai foi meio caótico e não seguiu bem os
padrões, alguns devem se lembrar. E o casamento dos meus avós foi
há mais de sessenta anos, acredito que nenhum de vocês esteve
presente.
— E como é essa disputa? — perguntou o príncipe Theodore.
— ACHEIIIII — um grito do Ed no meu ponto eletrônico me
assustou, mas ao entender o que ele quis dizer, um sentimento de
esperança me atingiu.
— Vai demorar para rastrear? — Jake indagou.
— Não… em 10, 9, 8… — Enquanto Michael fazia sua contagem
regressiva, voltei meu foco ao casamento.
— O noivo e o pai da noiva devem ter uma luta de espadas! —
anunciei e torci para que o rei Eros nunca tivesse usado uma espada
na vida.
— VOCÊ QUER SE MATAR? — Hannah gritou.
— Encontrei! — Michael gritou também.
Minha cabeça estava começando a ficar confusa com tanta
informação.
— Eu me recuso a participar de uma luta idiota, vamos direto aos
votos. — Eros revidou impaciente me dando tudo que eu precisava: um
motivo de confusão!
— Essa luta idiota faz parte dos costumes do meu país, não
aceitarei que ofenda a cultura do meu povo. E se a tradição não for
cumprida, não haverá mais casamento.
Houve um murmurinho, com algumas pessoas concordando que
era um costume medieval e outras adorando a tradição.
— Por favor, papai. Como serei rainha de Mirabelle um dia,
preciso honrar a cultura e as tradições daqui — suplicou Sophia.
Diante do pedido da filha, a postura de Eros mudou totalmente.
— Tragam as espadas! — disse o rei.
Enquanto isso, Jake se reunia com os guardas para irem até o
local que Michael rastreou. Grant estava levando Hannah para um local
seguro, sem ela saber. Sentia um frio na barriga e não sabia dizer se
pelo plano ou por estar prestes a ter uma luta de espadas.
Dois guardas foram até o castelo buscar espadas no nosso
arsenal de armas e em poucos minutos retornaram. Nesse período,
fiquei escutando o que Hannah sussurrava baixinho: “mamãe está indo
te salvar, princesa”, “tudo vai dar certo”. Desejei estar ao seu lado,
segurando sua mão, indo resgatar nos… a filha dela.
E desejei ainda mais que encontrassem a criança antes do
casamento terminar.
As armas chegaram e precisei esquecê-las por alguns minutos se
não quisesse morrer. Quando criança eu tive aulas de esgrima, no
entanto tinha deixado de praticar há um bom tempo. Minha esperança
estava em Eros não saber manusear a espada e nas oito temporadas
de Game of Thrones que assisti.
Tirei minha coroa, o paletó do traje real e arregacei as mangas da
camisa antes de pegar a arma, rei Eros fez o mesmo. Um círculo se
formou ao nosso redor. Meus guardas lançavam olhares incrédulos e
pareciam prestes a me tirar dali pela minha segurança, sobretudo por
saberem que tal tradição nunca houve em Mirabelle.
Estava fazendo aquela loucura pela Hailey.
Só precisava de alguns minutos até Jake e os guardas chegarem
ao local para organizarem o resgate.
Ajeitei minha postura, olhando fundo nos olhos de Eros e a luta
teve início. Ele fez o primeiro ataque meio desengonçado e eu defendi.
Como queria ganhar tempo, fiquei apenas defendendo as investidas
que ele fazia. Aos poucos fui percebendo a pouca habilidade de rei
Eros com uma espada, decidindo partir para o ataque.
Poucos minutos depois eu já estava cansado, gotas de suor
caiam no meu rosto e o peito batia acelerado. O único som que se
ouvia no ambiente era o tintilar das espadas.
Até que ouvi outro som. A voz do Jake.
— Chegamos. Dois guardas comigo, o restante deve cercar o
prédio, não deixem ninguém sair — ordenou. Ele parecia ser tão bom
quanto o pai para liderar os guardas.
— Grant, já estamos perto? — Hannah perguntou, ainda não
percebendo que eu jamais a deixaria chegar perto da sua tia maluca, e
que meu guarda estava apenas rodando pela cidade. Quando ela
descobrisse, a criança já estaria a salvo e nem se lembraria desse
minúsculo detalhe.
Distraído, demorei para perceber o ataque de Eros e sua espada
quase atingiu meu rosto, só não o fez porque ele parou o ataque antes
de me machucar. Obviamente, não queria cancelar o casamento e ter
que me levar ao hospital.
Resolvi encerrar a luta, acertando um golpe que o fez derrubar
sua espada. É claro que ele encenou, mas para os convidados eu tinha
vencido a disputa.
As pessoas presentes aplaudiram e voltaram a seus respectivos
lugares. Um guarda me deu um lenço para secar meu suor e outro
entregou meu paletó e a coroa. Dois minutos depois a cerimônia
recomeçou.
— Andrew e Sophia, viestes aqui hoje para unir-vos em
matrimônio. Por isso, eu vos pergunto perante a Igreja: é de livre e
espontânea vontade que o fazeis? — perguntou o bispo.
— Sim — eu respondi.
Sophia demorou para responder e eu virei o rosto para olhá-la.
Sua boca parecia tremer, como se ela quisesse dizer algo, mas não
conseguia. Vi insegurança em seu semblante. Ela estaria pensando em
dizer não? Isso destruiria meu orgulho, porém me deixaria
extremamente feliz.
— Você é livre para responder o que desejar, Soph — cochichei.
Ela ergueu o olhar para mim, em seguida olhou para o lado, onde
estavam os pais e depois olhou para a Lily. Seus olhos marejaram
antes dela voltar sua atenção para o bispo e responder:
— Sim.
— Abraçando o matrimônio, prometeis amor e fidelidade um ao
outro. É por toda a vida que o prometeis?
Eu tinha proposto a Hannah ser minha amante na noite anterior...
— Sim — respondemos juntos.
— Estais dispostos a receber com amor os filhos que Deus vos
confiar?
— Sim.
Acho que em meus 21 anos de vida eu nunca tinha mentido tanto
quanto menti naquele dia.
— Se alguém tem algo contra esse casamento, fale agora ou
cale-se para sempre.
Esperei alguém levantar e dizer ser contra. Esperei Hannah entrar
no jardim e fazer um escândalo. Esperei até Sophia desistir do
casamento. No entanto, só houve silêncio até que…
— Pessoal! — Jake falou e senti um alívio. — Invadimos o
apartamento, encontramos várias roupas e itens infantis, ou seja, Satan
esteve aqui recentemente com a Hailey, mas parece que houve alguma
confusão — ele fez uma pausa e sua voz enfraqueceu antes de
prosseguir — Há sangue no suposto quarto em que Hailey estaria.
Meu mundo desabou.
Ouvi Hannah chorar, Grant tentava confortá-la dizendo que o
sangue podia não ser da criança. Jake disse que continuaria
vasculhando o lugar a procura de alguma pista, mas ele também
chorava.
— Agora, convido vocês, caros noivos Andrew e Sophia, a se
darem as mãos e manifestar publicamente o seu consentimento.
— Príncipe Andrew, repita comigo — o bispo falou as palavras,
mas sua voz parecia tão distante. Eu não conseguia falar.
Hailey podia estar machucada ou morta nesse momento e a culpa
era toda minha. Eu deveria protegê-la, ainda assim tinha sido a causa
dela ter sido sequestrada. É espantoso como todas as pessoas da
minha família corriam perigo, primeiro foi minha mãe que não resistiu
ao acidente, meu pai que estava lutando contra a morte e agora minha
possível filha. Eu seria o próximo?
Hannah teve sorte ao sair da minha vida, ao menos ela estava
segura vivendo com o Jake. Diabos, será que ela me deixou por ter
sido ameaçada?
— Andrew, para termos ainda alguma chance de resgatá-la, você
precisa concluir o casamento. — Hannah disse, mas eu estava
atordoado para falar qualquer coisa.
— Andy, você está bem? — Sophia cochichou ao meu lado e olhei
para ela.
Sophia era uma mulher linda, mas não era o rosto que eu queria
ver todos os dias ao acordar.
— Drew, você não pode parar o casamento enquanto não
estivermos com a Hailey. — Jake implorou.
— Andrew, eu concordo em ser sua amante ou o que você quiser,
mas termina a merda desse casamento! — Hannah choramingou,
desesperada, e eu voltei a realidade. Não por ela ter aceitado minha
proposta, até porque eu jamais aceitaria sua resposta em um momento
de angústia como aquele, porém mostrava que ela faria qualquer coisa
pela filha e eu estava ali fraquejando, por medo de ser infeliz ao lado da
Sophia. Que péssimo rei eu seria!
— Eu, Andrew, te recebo, Ha… Sophia, por minha esposa, e te
prometo ser fiel, amar-te e respeitar-te na alegria…
Enquanto eu falava, as lembranças rompiam em minha mente.
Seguíamos o caminho de mãos dadas, no percurso eu mostrava
os principais cômodos do castelo, porém ela não estava me dando
atenção e parecia perdida em pensamentos.
— Um beijo por seus pensamentos — pronunciei chamando sua
atenção, ela parou de andar me olhando, em seguida desviou o olhar
para a janela próxima a nós admirando o céu estrelado lá fora.
— Fazia tempo que eu não terminava o dia com um sorriso no
rosto — respondeu e meu peito se encheu de uma felicidade sem
tamanho por saber que eu era o principal motivo para isso.
— E na tristeza…
Hannah chorava com medo de eu acreditar no que sua tia a
acusou, mas nada daquilo importava para mim, e daí se todos achavam
que ela era uma interesseira? Eu não me importava, a única coisa que
estava me incomodando era a tristeza no seu olhar. Acabei agindo
como um bobo e idiota para conseguir fazê-la voltar a sorrir.
— Na saúde e na doença…
Ela estava no hospital, Jake e Ed a encontraram trancada em um
porão na casa de sua tia passando dias sem comer. Além de estar
doente, estava magoada comigo e com ciúmes de uma matéria que viu
sobre a Sophia e eu formarmos um lindo casal. Aquilo acabou comigo
dando comida na sua boca e a arrastando para ir morar comigo.
— Todos os dias da minha vida. — Finalizei, segurando as
lágrimas.
— Eu, Sophia, te recebo, Andrew, por meu esposo, e te prometo
ser fiel, amar-te e respeitar-te, na alegria e na tristeza, na saúde e na
doença, todos os dias de minha vida.
— As alianças que agora serão abençoadas traduzem e
expressam para Andrew e Sophia o compromisso recíproco de
fidelidade e ajuda mútua — continuou o bispo.
O pequeno Benjamin trouxe as alianças. Ele tinha quase a mesma
idade da Hailey e estava ali, seguro, sendo protegido por seus pais.
Minhas mãos tremiam quando peguei o anel, não conseguia
respirar e um sentimento de angústia estava mais forte em meu peito.
Sophia estendeu sua mão e eu coloquei a aliança no seu dedo
anelar esquerdo.
— Sophia, recebe esta aliança em sinal do meu amor e da minha
fidelidade.
Uma lágrima caiu quando terminei de colocar a aliança.
— Andrew, recebe esta aliança em sinal do meu amor e da minha
fidelidade.
— O noivo pode beijar a noiva! — anunciou o bispo.
Inclinei meu corpo para me aproximar da Sophia e beijar seus
lábios, selando assim a nossa união para o resto da vida.
— PAREM ESSE CASAMENTO! — todos se viraram na direção
da voz masculina e meus olhos quase não acreditaram no que eu
estava vendo.
Capítulo Vinte e três
Vinte e Três
Mas eu fiquei mais esperta
Fiquei mais dura
Com o passar do tempo
Querido, eu me levantei dos mortos
Look what you make me do - Taylor Swift
Vinte e Quatro
E nem tudo é o mesmo agora
Parece que todas as nossas vidas mudaram
Talvez, quando eu for mais velho, tudo se acalme
Mas isso está me matando agora
Lonely – Justin Bieber
Andrew
Parem esse casamento. Foram as três palavras que eu mais
gostei de ouvir em toda minha vida. Supera até mesmo quando Hannah
me disse “eu te amo” pela primeira vez.
Todos os convidados, além dos guardas presentes se viraram na
direção do homem que chegou exasperado no jardim, trazendo alguns
papéis nas mãos. A realeza ama um escândalo quando não é sua
família envolvida.
— Qual a loucura agora? — resmungou o bispo baixinho, porém
como estava perto, escutei e não pude evitar abrir um sorriso.
— Os votos já foram feitos, o casamento não pode parar! — Eros
ordenou.
Os guardas estavam indo a caminho do intruso. O olhar dele
estava fixado em mim e a curiosidade foi maior que qualquer outro
pensamento, isso e o fato que eu queria prorrogar o término do
casamento.
— Esperem! — Levantei uma mão e os guardas pararam onde
estavam. — Acredito que o Sr. Morris não iria interromper a cerimônia
se não fosse algo de extrema urgência.
— Qualquer assunto que seja pode ser tratado depois do
casamento, Alteza — interveio Eros.
— Na verdade não, rei Eros. Este casamento deve ser anulado
agora mesmo! — vociferou o Sr. Morris.
Ele ergueu um papel e veio em minha direção no altar. Os
guardas me olharam esperando a ordem para prendê-lo, mas balancei
a cabeça negativamente. Morris estava responsável por investigar a
vida das três pessoas que mais me importavam, se ele tinha algo a
dizer então eu gostaria de ouvir.
— Andrew, não para o casamento. A Hailey… — Hannah implorou
me fazendo voltar atrás na minha decisão.
— Morris, me aguarde no escritório do rei, assim que acabarmos
aqui eu o encontrarei.
— Alteza, descobri que o carro do seu pai foi sabotado!
Um grande coro de “oh” foi ouvido no jardim, até os guardas
ficaram chocados com a revelação. Eu não sabia o que dizer.
— Ora, este não é o momento de discutirmos isso — Eros falou.
— As provas apontam o senhor como o culpado! — o detetive
gritou.
O “oh” dessa vez foi ainda maior, ouvi o som de surpresa até pelo
ponto eletrônico.
— Melhor que novela mexicana — Ed comentou.
— Você será preso por esta calúnia. Guardas! — Meus guardas
não obedeceram a ordem do rei Eros.
— Eu não seria tolo de vir aqui se não tivesse total certeza disso.
Rei Eros está envolvido no acidente do Rei Dominic e este casamento
deve ser anulado!
Morris trabalhava para a família real antes mesmo de eu nascer.
Ele não era um garoto idiota para fazer aquela acusação se não tivesse
provas. Estendi a mão e o detetive me entregou os papéis que trazia, e
li rapidamente as informações contidas ali.
Uma peça minúscula do carro tinha sido danificada e foram
encontradas digitais nela. As digitais eram de um sujeito chamado
Aidan Thompson, cidadão de Lorena. Sua ficha criminal registra vários
casos de roubo, porém nunca tinha sido julgado.
Na página seguinte tinha fotos de mensagens trocadas por Aidan
e Eros.
“Eros: Que merda você fez? O acidente deveria ser depois da
cerimônia!!!
Aidan: Eu fiz exatamente como foi ordenado.”
Continuei folheando o arquivo. Vi fotos do corpo de Aidan
encontrado já em estado de decomposição. Encontraram também outra
amostra de DNA pertencente a Louis Hughs, provável assassino do
compassa, e em sua ficha contava que ele era guarda real de Lorena.
Ainda precisava averiguar aquelas informações. Se fossem
verídicas Eros tinha planejado um golpe contra o rei e contra Mirabelle.
Eu jamais poderia me casar com a filha de um traidor.
No entanto, tinha a Hailey e a vida dela dependia do casamento
acontecer.
O acidente já tinha acontecido e salvar meu pai não era uma
tarefa que estava ao meu alcance, porém eu ainda podia salvá-la.
Podia garantir que ela ficasse segura.
— Guardas, prendam o Sr. Morris! — ordenei, pensando na
segurança da Hailey.
— Também tenho informações sobre a garota — o detetive disse
e vi uma nova chance de resgatá-la, sem ficar à mercê da tia da
Hannah.
— E prendam o rei Eros também. O casamento está suspenso até
termos certeza de todos os fatos.
— Você não pode fazer isso, esse imbecil está mentindo — Eros
vociferou.
— É uma acusação muito grave, Eros. Todos aqui devem
concordar que não tenho outra escolha.
Cabeças assentiram.
— Andrew! — o chamado veio de Hannah e Sophia
simultaneamente.
— Desculpe-me — o pedido também serviu para as duas antes
que eu saísse do jardim, ouvindo as fofocas dos convidados.
Eu precisava interrogar Morris com urgência e buscar outro meio
de confirmar as informações trazidas por ele, sobretudo as a respeito
da Hailey.
Hannah Price
Data de nascimento: 12/12/1999 (20 anos)
Filiação: Jonathan Price e Elizabeth Price
Estado Civil: Solteira
Mãe de Hailey Price, nascida dia 13 de setembro de 2018
Vinte e cinco
Porque ela era uma garota com boas intenções
Sim, ela tomou algumas decisões ruins
E ela aprendeu algumas lições
She -Selena Gomez
Vinte e seis
Eu estava tão assustado de encarar meus medos
Pois ninguém me disse que você estaria aqui
Eu podia jurar que você havia se mudado para o exterior
Foi isso o que você me disse, quando me deixou
When we were young - Adele
Andrew
Certa vez alguém me falou sobre a lei da atração, e em uma
definição simples você atrai aquilo que pensa. Mentalize coisas boas e
atrairá coisas boas, mentalize coisas ruins e atrairá coisas ruins,
mentalize confusão e atrairá Hannah Price.
Desde o momento em que ela soltou um gritinho, soube que não
era uma empregada do castelo. Todos os funcionários ali eram
treinados e seguiam as normas como se sua vida dependesse disso, e
uma das normas mais claras era: seja invisível. Sabendo que tinha algo
errado, passei a observá-la, até o instante em que nossos olhares se
cruzaram e pude confirmar minhas suspeitas.
Minha cabeça parou de funcionar daquele momento em diante.
Pouco me importava as besteiras que os conselheiros falavam, que não
levariam a lugar algum. Eu queria expulsá-los e ficar a sós com Hannah
para ela me contar toda a verdade.
Pouco me surpreendi quando ela ergueu a voz criticando os
homens mais poderosos de Mirabelle. Esse detalhe deveria ter me
deixado furioso, mas ela tinha feito aquilo para defender a Hailey. Eu só
conseguia sentir admiração pelo modo como protegeu nossa filha.
Usei suas palavras como pretexto para pausar a reunião e termos
um momento de privacidade. Entretanto, quando ficamos sozinhos na
sala, não sabia como iniciar o assunto.
Felizmente, Hannah não era tão boa em ficar calada e logo
começou a falar:
— Não precisa me passar um sermão por ter invadido o castelo e
participado de uma reunião confidencial. Sei que é crime e você pode
mandar me prender daqui a pouco. Mas antes preciso falar com você.
Eu tinha me apoiado na mesa e ela estava a uns dois metros de
distância de mim, me olhando de queixo erguido e braços cruzados.
Sua postura que devia ser intimidadora tornava-a sedutora demais para
a sanidade de qualquer homem.
— Andrew, digo, Alteza, pode segurar sua fúria por alguns
minutos e conversar comigo? — ela deu alguns passos, encurtando a
distância entre nós. Mais uma vez a lei da atração fez sua mágica, pois
agora meu corpo sentia-se atraído querendo acabar com qualquer
distância entre nós.
— Olha, perdão por ter insultado seus conselheiros, apesar de
terem merecido. Juro que minha intenção não era aparecer nessa
reunião, só queria encontrá-lo, mas o universo adora zombar com a
minha cara e me jogou aqui…
— Hannah… — ela ignorou meu chamado.
— Prometo que não falarei nada sobre o que ouvi para…
— Hannah, eu não estou com raiva de você.
— E por que não fala nada?
— Você, por acaso, me deixou dizer alguma coisa?
Ela se calou, sem ter uma resposta pronta. Passei a mão no
cabelo enquanto pensava como abordar aquela conversa de modo a
parecer sem muita importância. Três anos esperando pelo momento em
que descobriria toda a verdade sobre ela ter me deixado e agora que
conseguiria, estava aterrorizado.
Por Deus! Naquele dia tinha me fingido de bêbado, mentido para
o bispo, organizado um resgate, participado de uma luta de espadas,
quase casado com uma mulher que não amava, ordenado prender um
rei e ouvido inúmeras broncas dos conselheiros, mas nem todos esses
acontecimentos somados não me deixaram tão assustado quanto a
conversa que teríamos.
— Sente-se, precisamos conversar — puxei a cadeira para
Hannah. Ela me encarou por alguns segundos sem dizer nada, e por
fim se sentou. Eu deveria ter ido para o assento da cabeceira, que era
o lugar do rei, porém sentei-me na cadeira mais próxima a ela.
Perdi-me por um instante observando o seu rosto. Hannah é uma
mulher indiscutivelmente linda, mesmo com os olhos vermelhos e
inchados por ter chorado recentemente ou com a roupa sem graça das
empregadas do castelo, ela conseguia chamar atenção de qualquer
pessoa com sua postura elegante, seu olhar determinado e sua boca…
me recusei a concluir o pensamento.
— Tenho informações sobre a Hailey — comecei pelo assunto
mais importante e menos desconfortável para mim.
— Ela está bem? — perguntou instantaneamente.
— Até o momento acredito que sim, mas antes de lhe explicar
preciso lhe confessar algumas coisas.
— Pelo seu tom de voz não é algo que eu vá gostar — Hannah
cruzou as pernas, o movimento levantou um pouco do seu vestido
atraindo minha atenção para sua coxa descoberta.
Resolvi desviar o olhar para seus olhos, a fim de evitar qualquer
pensamento capaz de me distrair.
— Creio que não, mas já houve mentiras demais entre nós dois e
está na hora de sermos sinceros um com o outro.
Seus olhos piscaram repetidas vezes. Notei sua postura tornar-se
mais rígida, demonstrando nervosismo. Ao menos eu não era o único.
— Quando você voltou a Mirabelle, pedi para investigarem sua
vida nos últimos anos…
— VOCÊ O QUÊ? — gritou, batendo uma mão na mesa. —
Invasão de privacidade é crime, sabia?
Eu poderia dizer a ela que como regente tinha o direito de saber
informações sobre qualquer cidadão do meu país caso ele
representasse alguma ameaça, e ela era uma grande ameaça para
minha sanidade mental, no entanto optei por evitar essa discussão.
— Hannah, guarde seus julgamentos para depois e vamos focar
no mais importante — disse calmamente tocando sua mão que estava
sobre a mesa.
Confesso que o ato foi involuntário, porém como ela relaxou,
decidi deixar minha mão sobre a dela, e também porque o calor da sua
pele me passou uma sensação de conforto em meio a todo o caos que
estava sendo aquele dia.
— Não me orgulho de ter feito isso, mas não posso voltar atrás.
Quando solicitei a investigação, estava atordoado com a sua volta e
queria descobrir qualquer coisa que fosse relacionada a você —
confessei, me sentindo um bobo.
— Se você sabia da minha vida, como achou que eu tinha algo
com o Jake? Ou que Hailey era filha dele? Ela sequer tem o pai
registrado na certidão de nascimento.
Um erro que eu iria consertar em breve.
— Recebi um dossiê adulterado. Nele dizia que você e Jake eram
casados e tinham uma filha. Por isso não acreditei em você quando me
contou sobre a Hailey.
Ela arregalou os olhos, assimilando minhas atitudes baseadas
nessas mentiras.
— Bem, isso explica muita coisa — comentou. — Primeiro que
você é um idiota, mas isso todo mundo sabe. Segundo, você tem um
péssimo investigador. Como descobriu a falsificação?
— O detetive Morris trabalha para a família real há décadas e o
encarreguei desta tarefa, mas comecei a desconfiar quando você me
mostrou a foto — parei de falar, pois fui tomado pela emoção.
Quando reconheci na foto a menininha que conversei na cafeteria,
soube que tínhamos uma ligação. Meu coração sentiu um amor tão
forte como nunca antes. Um instinto primitivo de protegê-la foi
despertado em mim, e todas as loucuras que fiz desde então foi
pensando em garantir o seu bem-estar.
Sentia como se ninguém no mundo importasse mais que ela, na
verdade quase ninguém. Por mais que negasse a mim mesmo, a
mulher a minha frente, que mexia os dedos levemente acariciando
minha mão, também me importava.
— Eu sabia que não devia confiar nesse detetive! — relatou.
— Aí está a surpresa, na cerimônia do casamento ele me
entregou um novo dossiê. Todas as informações condizem com o que
você me disse — a boca dela se abriu em surpresa. — Morris contou
que esteve ocupado com as investigações do acidente do meu pai e
delegou a tarefa para outro detetive da sua equipe, e que esse homem
estava trabalhando para o rei Eros e alterou o documento sobre você.
Morris descobriu todos os planos do rei e por isso parou a celebração.
— Você não acha suspeito que alguém da equipe dele estivesse
trabalhando para o inimigo e ele não percebesse? Afinal, ele é um
detetive.
— Sim, pensei nesta possibilidade e vou procurar o homem em
questão assim que tiver tempo. Agora voltando ao ponto central que é a
Hailey, Morris trouxe outras informações.
Repeti para ela tudo o que Morris falou sobre o sequestro e a
negociação com sua tia. Hannah se animou com a nova chance de
salvarmos nossa filha e senti-me exultante por trazer a esperança de
volta ao seu olhar. Se eu estava desesperado para encontrar a garota,
nem sabia medir como ela se sentia.
— Mas não podemos deixar Tia Satan ser inocentada, ela precisa
pagar por cada segundo que Hailey ficou em perigo. Precisamos de um
plano para resgatá-la e prender minha tia — disse com determinação.
— Morris aconselhou que cumpríssemos o acordo com sua tia,
pois ela deve ser apenas uma marionete do rei Eros.
Hannah gargalhou alto.
— Minha tia uma marionete? É mais fácil rei Eros ser manipulado
por ela do que o contrário, posso lhe garantir. E eu ainda não confio
nesse seu detetive, você não acha muito estranho que ele tenha
aparecido com uma acusação contra o rei Eros e um acordo com tia
Satan na mesma hora?
— Na verdade, a história que ele me contou foi bem convincente,
mas gostaria de saber o que pensa sobre ele.
Se adquiri algum aprendizado na última semana foi que Hannah
falou mais a verdade para mim do que qualquer outra pessoa.
— Não sei, sinto que ele tem algum envolvimento nesse
sequestro. Sexto sentido de mãe talvez, mas se eu pudesse não
contaria a ele sobre os planos de resgate.
— Bem, lhe devo um voto de confiança, então faremos como você
acredita ser o melhor — não resisti mais e a mão que apenas tocava a
dela, segurou-a totalmente e a trouxe até meus lábios.
Um beijo que deveria ser singelo acendeu uma chama em meu
corpo, despertando um desejo inconveniente de subir meus lábios por
seu braço, chegar aos ombros, ao pescoço e a sua boca...
— Andrew, já que estamos abrindo o jogo e conversando como
adultos pela primeira vez desde nosso reencontro, preciso te contar
algo também.
Um balde de água fria seria melhor para refrear meus
pensamentos.
Hannah deve ter percebido que minhas mãos gelaram e minha
respiração parou por alguns segundos, evidenciando meu desespero.
Ela iria contar? Diabos, eu ainda estava me preparando
emocionalmente para essa conversa.
Olhei na direção da porta na espera de alguém aparecer, afinal
sempre quando algo grande está prestes a ser revelado alguém
interrompe. Os conselheiros poderiam estar voltando para a reunião,
Sebastian poderia aparecer para negociar a prisão do pai, uma
empregada chegaria com mais chá, Sophia apareceria querendo me
matar por abandoná-la no altar ou até mesmo o bispo vindo me
convidar para confessar todos os pecados que cometi naquele dia.
Contudo, absolutamente nada aconteceu.
— Quando você me pediu em casamento eu tive que fazer uma
difícil escolha…
— Sua liberdade ou eu — a interrompi. Eu conseguia falar
seriamente com ela sobre a segurança da Hailey, porém não conseguia
agir racionalmente ouvindo-a contar sobre a maior decepção que já
senti.
Ainda doía.
— Está sendo difícil para mim falar sobre isso, não interrompa por
favor — eu não tinha como negar um pedido com aqueles olhos
castanhos suplicantes, sendo assim me calei. — Na noite anterior a
meu aniversário, estava caminhando pelo castelo e sem querer ouvi
uma conversa do rei Dominic com esses conselheiros idiotas...
Ela realmente estava abrindo o jogo. Meu corpo começou a reagir
a ansiedade que o dominou, as mãos começaram a tremer e tentei
soltar a que segurava a mão da Hannah, mas a maldita entrelaçou os
dedos nos meus, segurando-a mais firme.
— Rei Eros estava ameaçando acabar a aliança com Mirabelle,
caso você não casasse com a filha dele. Os conselheiros comentavam
que seria a ruína do nosso reino, porque já tínhamos perdido a aliança
com aquele ditador. As pessoas mais humildes passariam fome, não
haveria recursos para garantir saúde e segurança para todos, talvez as
crianças do hospital não pudessem ter o tratamento que precisam —
uma lágrima solitária desceu por seu rosto e ela fez uma pausa para
segurar o choro.
— Se isso tivesse acontecido eu saberia — apontei com o tom de
voz mais gentil possível. Não estava desacreditando totalmente na
história dela. Depois do rei Eros tentar matar meu pai, não duvidaria de
nada vindo dele, porém era estranho eu não ser comunicado sobre algo
tão importante.
— Seu pai devia ter seus motivos para não lhe contar e eu não os
conheço — respondeu. — A questão é que a única razão para você
não se casar com a princesa Sophia e salvar a economia de Mirabelle
era eu.
— Salvar a economia de Mirabelle é um assunto que diz respeito
ao rei e aos conselheiros, não era problema seu.
— Como não? Se eu ficasse, iria aceitar seu pedido de
casamento e me tornaria rainha algum dia — meu peito se apertou ao
visualizar essa imagem. — Mas que tipo de governante seria se
colocasse meus interesses e minha felicidade acima do povo?
— Admiro o seu altruísmo, Hannah, mas uma boa governante tem
força o suficiente para não fugir quando um problema aparece — minha
voz soou mais fria do que eu pretendia. — Você poderia ter ficado e
enfrentaríamos isso juntos.
— Foi a escolha que me pareceu mais certa no momento. Você
uma vez me disse que se o país entrasse em crise, o povo poderia
exigir o fim da monarquia. Eu não podia deixar sua família perder o
trono e o povo não podia perder você e seu pai como governantes.
— Hannah, olhe onde estamos — soltei sua mão abrindo os
braços, indicando o nosso redor. — Depois de três anos corremos o
mesmo risco. Do que adiantou você ter ido embora? Serviu apenas
para piorar nossa situação, já que o nosso rei está entre a vida e a
morte e uma filha bastarda apareceu.
— Não a ofenda — me cortou.
— Você acha que gosto de chamá-la assim? Ela é uma bastarda
por sua causa e você sabe as consequências que isso pode trazer para
o reino? — não esperei uma resposta e continuei — Aqueles que são
contra minha família vão usá-la como pretexto para se rebelar contra a
monarquia e isso pode causar uma guerra civil dentro do país. Você
pensou nisso quando a escondeu de mim?
Levantei-me furioso, evitando olhar em seus olhos. De todas as
hipóteses que tinha levantado sobre ela ter ido embora, jamais pensei
que o motivo seria a falta de confiança em me contar a verdade.
Juntos, poderíamos ter resolvido tudo!
— Fiz o que acreditava ser certo, Andrew. Você pode pensar que
eu estava fugindo de problemas, mas fiz o que estava ao meu alcance
para salvar o reino — Hannah entrou em meu campo de visão e não
tive coragem de encará-la, então mantive meu olhar na pintura do rei
Reaghan. — Todos os dias chorei desejando voltar para você e
construirmos nossa família com a Hailey. Mas ao mesmo tempo
pensava em outra família passando fome ou uma pessoa doente sem
assistência enquanto nós estaríamos aqui vivendo um conto de fadas.
Se você já tivesse passado por alguma necessidade na vida saberia
que a dor de um coração quebrado não é nada perto do que sente um
pai ou uma mãe sem ter como alimentar ou garantir a segurança dos
seus filhos. Você como o futuro rei de Mirabelle deveria entender isso
melhor do que ninguém.
Suas palavras me abalaram e fiquei sem argumentos.
Reconsiderei o julgamento que eu tive sobre sua decisão. Hannah tinha
feito algo que até eu mesmo, como príncipe herdeiro, jamais faria. Sua
intenção tinha sido louvável, digna de uma rainha. Entretanto, saber a
verdade não diminuiu a mágoa em meu peito.
— Por que você não me contou a verdade antes de ir embora? —
voltei a encará-la, seu rosto estava coberto por lágrimas.
— Você não me deixaria ir — realmente não, era mais provável eu
ter ido junto com ela.
— Quem ama não deixa ir, Hannah.
— Exceto quando é melhor para o outro.
— Não foi o melhor para mim.
— Mas foi para o reino. Um bom líder coloca as necessidades do
povo acima das suas.
Senti-me acuado com sua afirmação. Meu pai sempre repetia
aquela frase para mim. Eu não conseguia colocá-la em prática tão bem
quanto ele ou Hannah fizeram. Ainda tinha muito a aprender até me
tornar um rei digno como meu povo merecia.
Hannah, por outro lado, nasceu para ser rainha.
— Te devo um agradecimento por ter salvado meu reino, mas
nada disso importa agora — voltei a sentar-me, mas desta vez, na
cadeira do rei.
Precisava manter distância da Hannah até meus sentimentos se
reorganizarem. Eu sentia um misto de emoções por ela que envolviam
raiva, admiração, mágoa, saudades, decepção e desejo. Se qualquer
um deles me dominasse, não conseguiríamos terminar aquela
conversa.
Hannah sentou-se na cadeira mais próxima do meu lado direito e
retornou a falar, como se não tivesse acabado de me revelar algo que
esperei durante três longos anos.
— Andrew, sei que não sou a melhor pessoa para discutir política,
mas, ao longo desses anos, fiquei pensando no que eu poderia ter feito
de diferente para ajudar Mirabelle. Estudei um pouco de relações
internacionais e comércio exterior — Hannah era muito inteligente não
tinha como negar, então fiquei curioso para conhecer suas sugestões e
pedi que contasse suas ideias.
— Há outros países no mundo que importam e exportam os
produtos que Mirabelle negocia com Lorena, por exemplo, o Brasil é um
grande exportador de grãos e poderia suprir a demanda que nós temos
desse produto. Talvez esteja na hora de abrirmos as negociações
internacionais com países que não tenham monarquias.
Fascinado. Encantado. Deslumbrado. Não conseguia encontrar a
melhor palavra para descrever como me sentia vendo-a discutir
assuntos tão importantes para o reino. Também não passou
despercebido o pronome "nós" em suas frases. Em todo o tempo de
noivado com Sophia, ela nunca tinha se incluído como parte de
Mirabelle.
Além do coração de rainha, Hannah possuía a mente de uma
também.
— Fico contente por ter se preocupado com Mirabelle mais uma
vez, mesmo não morando mais aqui. Sua sugestão é uma ótima
alternativa. Contudo, correríamos o risco de perder o apoio de outros
reinos por estarmos negociando com países democráticos, pois eles
veriam essa decisão como um primeiro passo extinguirmos a
monarquia — Hannah assentiu, entendendo os problemas que
criaríamos. — Ainda assim, passarei sua ideia aos conselheiros para
discutirmos.
Eu não queria conversar com eles, queria passar horas ali
ouvindo Hannah com suas ideias e sugestões, vendo como poderíamos
adaptá-las à realidade do país e sair dali com soluções e planos de
ação para resolver os problemas que surgiriam em breve.
Entretanto, não demoraria muito para que os conselheiros das
cidades mais distantes chegassem ao castelo e o tempo que tínhamos
estava acabando.
— Obrigado pela sinceridade, Hannah. Apesar de não concordar
com sua decisão, compreendo seus motivos — ela me olhou, surpresa
com o agradecimento. Minha voz, no entanto, não demostrava
nenhuma emoção.
— Eu pensei que seria bem mais difícil, confesso. Achei que você
não acreditaria em mim.
— Se não fossem as provas do envolvimento de Eros no acidente
do meu pai, certamente não acreditaria. Contudo, não ache que perdoei
seus outros erros como esconder a Hailey de mim.
— O que vamos fazer? — ela trocou de assunto.
— Vou marcar um encontro com sua tia para negociarmos e
garantir que ela não revele a identidade da Hailey. Precisamos evitar
este problema por enquanto.
— Vou com você.
— Não, você vai juntar sua equipe de resgate e descobrir como
conseguiremos prender sua tia.
— Posso fazer isso, mas também irei com você. Afinal vocês
estarão "negociando" a minha filha.
— A nossa filha — corrigi-a e vi seus olhos brilharem.
— Andrew, preciso disso. Preciso me certificar de algum modo
que ela não foi machucada e que está bem — Hannah suplicou. A
maldita sabia como me manipular. Eu sequer era capaz de cogitar um
"não" para um pedido como aquele.
— Tudo bem.
— Vou reunir meus amigos para pensarmos em um plano.
Obrigada por me ouvir e acreditar em mim.
Hannah se levantou estendendo a mão para mim. Qualquer outra
pessoa fazendo aquele gesto de despedida seria uma falta de respeito,
afinal ela deveria se curvar em uma reverência. Todavia, Hannah não
me enxergava como um príncipe a ponto de manter formalidades
quando estávamos sozinhos. Eu gostava disso, por isso levantei e
apertei sua mão de volta.
Também gostava da eletricidade que percorria pelo meu corpo
quando nos tocávamos.
— Grant ficará com você pelos próximos dias — me ouvi dizendo.
— Não preciso de uma babá.
— É para a sua segurança, não sabemos o que sua tia pode
fazer.
— Não preciso de proteção, e se eu precisar de uma parede de
músculos, tenho o Jake — ela só podia ter dito aquilo para me provocar
e conseguiu.
— Mas eu quero protegê-la, Hannah — falei mais do que devia. —
Por tudo que fez pelo meu país e por ser mãe da minha filha, é mais
que meu dever garantir a sua segurança — péssima desculpa, Andrew.
Hannah sorriu pela primeira vez desde que entrou naquela sala.
Um sorriso capaz de iluminar o dia mais sombrio e capaz de aquecer
meu coração que há tempos se sentia frio.
Era difícil controlar minhas emoções, o desejo para ser mais
específico, vendo seus lábios emoldurarem um sorriso tão bonito. Eu
queria colar meu corpo no seu e beijá-la por horas, para saber se ela
ainda tinha o costume de dar um sorriso durante o beijo.
— Certo. Ficarei com Grant, mas só porque ele é uma ótima
companhia.
Hannah puxou sua mão que ainda segurava a minha, mas não
permiti que ela se soltasse. Ainda tinha tanta coisa para ser dita.
—Quando eu resolver tudo por aqui vou procurá-la para
salvarmos a Hailey — dei um passo à frente beijando sua mão, mas
sem deixar de olhar em seus olhos.
— Preciso ir — ela disse. Sem dúvidas tinha notado a tensão que
se instalou entre nós.
Liberei sua mão, sabendo que era a melhor escolha a se fazer.
Nossa conversa tinha fluído bem quando colocamos as mágoas do
passado de lado, deveríamos continuar assim enquanto estivéssemos
trabalhando juntos para resgatar a Hailey.
Depois disso eu poderia voltar a odiá-la e desejá-la.
Capítulo Bônus
Bônus
Todo mundo se machuca às vezes
Todo mundo se machuca algum dia
Mas vai ficar tudo bem
Memories – Maroon 5
Jake
Os guardas e eu reviramos todo o apartamento em busca de
alguma pista sobre o paradeiro da tia da Hannah. A mulher estava de
posse do bem mais precioso que eu tinha e cada segundo para mim
era uma tortura. Apesar de não termos laços de sangue, eu amava a
Hailey mais do que qualquer outra pessoa no mundo e daria minha vida
por ela sem pensar duas vezes.
Eu não descansaria até pegá-la em meus braços garantido que
estava segura, por isso vasculhava o local com minuciosidade. Até o
momento, já tinha reparado algumas coisas: o apartamento tinha três
quartos, e todos estiveram ocupados recentemente, pois estavam bem
bagunçados, e os ocupantes tinham deixado o lugar às pressas; na
porta que dava acesso ao aposento que provavelmente Hailey estaria,
havia cacos de porcelana espalhados sobre o chão além da mancha de
sangue. Tínhamos coletado uma amostra para descobrir a quem o
sangue pertencia e meu maior medo era que fosse da Hailey.
Caso não fosse, e eu rezava muito por isso, podia deduzir que
houve uma grande confusão no local e Samantha resolveu fugir, depois
de atingir alguém.
— Reynald, encontramos mais uma coisa — um dos guardas me
chamou.
Senti-me estranho por terem se referido a mim como chamavam
meu pai. Foi inevitável não sentir saudades do homem que mais
admirava. Ele tinha me ensinado a valiosa lição de cuidar das pessoas
que amo. Infelizmente, eu não tinha conseguido fazer isso com ele.
Ao chegar na suíte do local, o guarda segurava um notebook
branco, porém a tela estava bloqueada.
— Não podemos levar nada para não levantar suspeitas que
estivemos aqui.
O aparelho devia ter informações para nos ajudar na investigação
e por sorte tínhamos um hacker trabalhando conosco. Michael sem
dúvidas conseguiria um acesso remoto.
Entrei em contato com ele pelo ponto eletrônico esperando uma
eternidade pela resposta. Todos pareciam ter desligado o dispositivo
depois do casamento ser interrompido e a falta de comunicação entre
nós me aborreceu.
Ao que pareceu cinco minutos depois, Michael me respondeu.
— Alguma novidade? — perguntou, sua voz estava meio ofegante
como se tivesse corrido uma maratona.
Ele se animou com a descoberta do notebook e me passou as
instruções para que conseguisse acessá-lo. Não demorou mais que
dez minutos para o homem destravar a senha e começar a copiar os
arquivos.
— Espero que tenha algo de interessante aqui — o hacker
comentou e ouvi a voz do Ed no fundo concordando.
Enquanto a transferência dos arquivos carregava, os guardas e eu
organizamos a bagunça no apartamento, deixando tudo como estava
ao chegarmos.
— Feito, assim que encontrar alguma informação importante lhe
passo — disse Michael e coloquei o notebook onde o guarda tinha
achado.
Vinte e sete
Ninguém vai vencer desta vez
Eu só quero você de volta
Estou correndo para o seu lado
Surrender - Natalie Taylor
Hannah
Uma montanha russa de emoções, era o termo mais adequado
para descrever aquele dia. Houve tantos acontecimentos, momentos de
altos e baixos, porém mesmo assim não tínhamos avançado em nada
no resgate da Hailey, algo que eu estava esperançosa para mudar em
breve
— Então, ela quer trocar a Hailey por sua liberdade? Essa menina
deveria se chamar habeas corpus — comentou Michael após eu contar
sobre o acordo que Tia Satan queria fazer com o Andrew.
— Por que você não encontra algo de útil se quer sua liberdade
também? — Jake rebateu a piadinha do hacker.
Já tinha anoitecido quando o nosso pequeno grupo de resgate
formado por Jake, Ed, Michael, Grant e eu nos reunimos todos na sala
do apartamento do meu amigo, prontos para criar um novo plano, um
que funcionasse dessa vez.
Jake tinha encontrado um computador no esconderijo da minha tia
e Michael analisava os arquivos em busca de informações que
pudessem nos ajudar, porém até o momento não teve sucesso.
— Tem algo nessa história que não se encaixa — Jake continuou
a falar. — O pai da Sophia queria o casamento, não faz sentido ele ter
planejado o acidente para aquele dia. Mesmo que fosse premeditado
acontecer após a cerimônia, ainda assim seria um grande escândalo
para manchar um dia de comemorações.
— Também achei estranho o detetive Morris aparecer do nada
com um relatório sobre mim, uma acusação contra o rei Eros e um
acordo com minha tia. Parece que foi fácil demais — concordei.
— Ele pode estar envolvido com sua tia e estar contra o rei —
Michael voltou a opinar.
— Impossível! Aquela bruxa quer manter Hannah e Andrew
separados. Não iria interromper o casamento — Ed entrou na conversa.
— Ela sequestrou a Hailey justamente para garantir que eu não
me envolvesse com o príncipe — complementei.
— E se ela brigou com o rei Eros e decidiu acusá-lo? — Grant
indagou, o único que estava calado até então.
— Eu gosto dessa teoria! — afirmou o hacker. — Ela quer se
inocentar de seus crimes e jogou toda a culpa do acidente para o rei, e
aquele detetive nojento, que me caça há anos, ajudou-a a levantar
provas falsas!
— Faz sentido, mas ao fazer isso ela deixaria o caminho livre pra
Hanninha fisgar o príncipe de novo — Ed contestou.
— Eu não vou fisgá-lo!
— Minha futura rainha, agora que você contou a verdade sobre ter
ido embora, Andrew vai rastejar aos seus pés e pedir para ensiná-lo a
governar um país. — Senhor, Ed tinha voltado a bancar o cupido!
— Você contou ao Andrew? — Jake perguntou.
Ed, que estava sentado ao seu lado, tocou seu ombro e suspirou.
— Jakícia, o caminho da Hannah se fechou para você e lamento
que o meu também. — O olhar do meu amigo se voltou na direção de
Michael e o hacker ajeitou os óculos antes de desviar o olhar para o
computador. Ah, não… Os dois?
— Creio que estamos desviando do assunto que nos importa —
pronunciei, a fim de acabar com o constrangimento de todos os
envolvidos. —Vamos deixar essa discussão para depois, a prioridade
do momento é salvar a Hailey.
Todos assentiram, exceto Grant, que observava tudo com um
misto de confusão e espanto. Coitado.
— Andrew e eu vamos nos encontrar com tia Satan ainda hoje
para negociar o resgate. Precisamos de um plano para prendê-la após
estarmos com a Hailey — expliquei. — Por isso todos estão aqui,
temos poucas horas para decidir o que fazer.
Iniciamos um debate que durou cerca de uma hora. Entre pontos
de concordância e discordância, ao final, tínhamos algumas ideias:
1) a mais óbvia, montar uma operação para prender tia Satan
após ela entregar a Hailey;
2) deixá-la acreditar que estava livre e prendê-la só quando Hailey
estivesse em um lugar seguro;
3) exilá-la de Mirabelle e eu fugir com Hailey para outro país,
depois prendê-la. Algo me dizia que Andrew não gostaria dessa;
4) encontrar o novo esconderijo dela e resgatar Hailey por nossa
conta, ideia de Michael.
— Isso já deu errado uma vez — Jake alertou.
— Então já sabemos onde erramos: não podemos confiar em
motoristas ou outras pessoas — argumentou o hacker. — Hannah vai
se encontrar com ela, certo? Então pode colocar um mini GPS para
rastrear sua localização e saberemos seus passos.
— Se ela descobrir pode machucar a Hailey — contrariei.
— As circunstâncias mudaram, Hannah. A criança agora é a
moeda de troca dela com o príncipe, a mulher não é louca de perder
essa arma. E claro, teremos o cuidado para ela não descobrir.
— É arriscado, mas é uma boa ideia — Grant concordou.
— E se não der certo, ainda temos a alternativa de prendê-la após
salvar a Hailey — argumentou Michael.
Ele explicou mais sobre o dispositivo e como eu colocaria na
roupa de Tia Satan, sugerindo que fosse nas costas onde ela não
poderia ver tão bem. O hacker garantiu que conseguiria um GPS quase
invisível, porém deixou claro que iria cometer mais dois crimes para ter
e usar o objeto.
Andrew sofreria um infarto quando soubesse que precisaria
inocentar os crimes de Michael, contudo esse era um assunto para
pensar depois.
— Tudo bem, eu tentarei — aceitei, após pensar em todas as
possibilidades.
Michael saiu para conseguir o tal dispositivo e aproveitei para
tomar um banho. Ao voltar para a sala, Jake, Ed e Grant estavam
assistindo TV e não me viram chegar. A televisão exibia um programa
de fofocas, que falava sobre o casamento do príncipe.
O casamento foi cancelado! Ainda não sabemos por fontes oficiais
qual foi o motivo, mas há murmúrios que o príncipe Andrew estava
bêbado durante a cerimônia.
— Vai gerar uma grande repercussão quando for revelado o
verdadeiro motivo — Grant enunciou. — Faz um certo tempo que
estudei história, mas lembro que não temos um rei assassinado há
mais de um século, e a monarquia vai ser fortemente abalada se
confirmada a acusação.
— Há quase um século também não há filhos fora do casamento,
e se a história da Hailey vir à tona vai ser bem pior — completou Jake.
— Sempre torci por um escândalo na realeza, mas não com
minha princesinha envolvida — Ed lamentou. — Rei Dominic deveria
acordar e colocar tudo em ordem de novo.
Abri a boca para dizer que Andrew era capaz de minimizar todo o
caos que viria, porém no momento em que Ed terminou de falar, a
campainha tocou. Me apressei em abrir a porta, com o coração
espancando meu peito por saber quem era do outro lado.
Andrew tinha avisado que viria após o término da reunião com o
conselho, ainda assim não estava preparada para vê-lo. Não do jeito
que ele estava.
O príncipe não parecia o príncipe. Ele vestia uma calça jeans escura,
camisa azul de mangas curtas, óculos escuros, mas um item em
especial chamou minha atenção, a touca cinza que cobria seus
cabelos. Andrew conseguia estar ainda mais gato que horas atrás,
quando usava um dos seus trajes da realeza. Não que ele não ficasse
lindo usando terno ou roupas formais, mas aquilo era absurdamente
sexy.
Além disso, me lembrava nossa época de escola.
— Lamento ter demorado tanto. Os conselheiros são pessoas
difíceis de lidar e estenderam a reunião por mais tempo do que eu
esperava — desculpou-se, mas eu não me importei, pois ainda estava
tentando não babar diante da visão do Andrew pelo qual me apaixonei.
Abri espaço para ele entrar, sem saber direito o que falar e com
medo de abrir a boca para dizer algo como "você fica tão sexy com
essa touca".
O príncipe cumprimentou as outras pessoas no local. Eles se
levantaram imediatamente para fazer uma reverência, então percebi
que não tinha o saudado como se espera então copiei meus amigos. O
príncipe me olhou sorrindo apenas com o canto da boca, insinuando
alguma provocação.
Então, sua atenção desviou para a televisão, onde ainda falavam
sobre o casamento dele.
Já foram duas cerimônias canceladas e achamos que esse
casamento não vai mais acontecer, o que deixa o caminho livre
novamente para as jovens solteiras de Mirabelle. Será que depois de
anos teremos outro baile para o príncipe encontrar uma esposa?
— Mal sai de um casamento e todos querem me jogar em outro —
grunhiu baixinho, mas consegui ouvir e não pude evitar sorrir.
Ed percebeu que era um bom momento para desligar a televisão.
Aproveitei para contar ao Andrew o que tínhamos decidido acerca de
Tia Satan, e ele contou sobre o encontro que teríamos com ela. Morris
tinha marcado para às 22h em um restaurante em uma cidade vizinha,
e tinha deixado bem claro que Andrew não poderia levar guardas. Não
tinha falado nada sobre me levar.
Claro que Andrew não iria sem escolta, então ficou combinado
que Jake, Grant e mais alguns guardas ficariam estrategicamente
escondidos para o caso da conversa não sair como esperávamos e tia
Satan ter outros planos para o resgaste.
Enquanto conversávamos, Michael chegou com o dispositivo e
tínhamos tudo o que precisávamos para nosso encontro.
Andrew e eu estávamos no carro, indo ao local de encontro com
tia Satan. Grant, usando roupas do Ed como disfarce, estava à frente
como nosso motorista, mas havia uma divisória entre o assento que ele
estava e o nosso, o que nos dava alguma privacidade. Mais uma vez
lembranças do passado vieram a mente, trazendo memórias do tempo
que ele me dava carona para casa.
Ficamos em silêncio por um longo tempo. Havia tantos assuntos
mal resolvidos entre nós que eu mesma não sabia o que conversar.
Andrew observava as ruas iluminadas por postes, distraído com os
próprios pensamentos, provavelmente fingindo que eu não estava ao
seu lado.
Chegou um momento em que não aguentei mais o silêncio e
puxei um assunto qualquer.
— Já sabe o que fazer com Diaberos, digo, com o rei Eros?
Ele demorou alguns segundos para responder e quando o fez não
olhou para mim.
— O julgamento será em sigilo, o povo só saberá quando tivermos
certeza de todos os fatos. Se ele realmente for o culpado pelo atentado,
será condenado a prisão perpétua, como manda a nossa lei — fez uma
pausa, provavelmente pensando se deveria me contar informações tão
importantes, até que prosseguiu — O rei acusado de assassinato
causará mais problemas em Lorena do que para nós. Outros
governantes podem desfazer alianças. Então fortalecerei as
negociações com esses países, para suprir a demanda que Mirabelle
possui.
— Você vai precisar casar-se com alguém para fortalecer as
negociações? — questionei antes de pensar direito.
— É provável que eu receba algumas propostas, contudo não
desejo viver mais uma farsa de casamento — seu olhar encontrou o
meu rapidamente, ainda assim foi possível ver um pequeno brilho nas
suas íris verdes. — Já mapeamos alguns reinos com governantes
pacíficos que possivelmente vão preferir estar ao nosso lado ao invés
de apoiar um assassino. Temos três ou quatro países em mente.
— E você não deveria estar negociando com eles nesse
momento?
Andrew poderia ser considerado um péssimo governante por não
colocar o reino como sua prioridade, no entanto encheu meu peito de
orgulho saber que ele estava mais preocupado com a Hailey.
— Precisamos salvar nossa filha, pela segurança dela e por
questões políticas também. De nada adiantará salvarmos a economia
se ela pode causar uma revolta nos cidadãos daqui.
Aproveitei que ele tinha comentado sobre ela para questionar
seus planos futuros.
— O que faremos depois de resgatá-la? Imagino que não será
seguro vivermos em Mirabelle.
— O povo não pode saber sobre ela e precisamos que continue
assim. Os conselheiros acreditam fortemente que preciso mandá-la
para um internato a fim de garantir que ela nunca saiba sua verdadeira
origem.
Senti-me enfurecer ao entender em que aquilo acarretaria.
— Eu não vou me afastar dela!
Andrew passou a mão pelos cabelos respirando profundamente,
antes de me olhar e responder:
— Eu sei, Hannah, também não quero que ela cresça sem a
presença de nenhum dos pais. A outra opção é que você vá embora do
país e nunca fale sobre mim para ela — pude sentir a dor dele ao
pronunciar aquilo. — Eu vou sofrer por não estar presente na sua vida,
porém é o necessário a se fazer para que ela e o reino fiquem seguros.
— Deve haver outra opção — tentei argumentar, mas nada me
veio à cabeça.
— Na verdade, há. Mas creio que não seja viável.
— Nada pode ser pior do que mandá-la para um orfanato e de
não termos contato!
— Bem, eu poderia legitimar a criança me casando com a mãe
dela. — Ele abriu um sorriso tímido no final da frase.
Ainda bem que estava sentada, caso contrário minhas pernas
teriam fraquejado e eu cairia no chão por tamanha surpresa. Menos de
vinte e quatro horas atrás, ele tinha me pedido para ser sua amante, e
agora estava mencionando casamento? Na verdade, ele não pediu
minha mão, mas Andrew tinha cogitado a possibilidade de nos
casarmos e criar a Hailey juntos. Então, isso significava alguma coisa.
Meu coração ia sair pela boca a qualquer instante.
— Vejo que essa opção lhe chocou mais que as outras. — Tinha
algo na sua voz, algo que eu não era capaz de decifrar. Mágoa?
Desapontamento?
Não tive tempo para lhe dar alguma resposta racional. Meu
coração queria gritar que aquilo era tudo que tinha sonhado, que formar
uma família ao lado dos dois me tornaria a pessoa mais feliz do mundo.
Entretanto, a voz de Grant me impediu de expressar qualquer
sentimento.
— Alteza, chegamos.
Após ouvir essa frase, tudo em que pensei foi em como não
estrangular minha tia até ela me entregar a Hailey.
Capítulo Vinte e oito
Vinte e oito
Estou pronta para te perdoar
Mas esquecer é uma batalha mais árdua
Você mal sabe que preciso de mais tempo
Little do You Know – Alex & Sierra
Vinte e nove
Eu preciso de alguém para curar
Alguém para conhecer
Alguém para ter
Alguém para abraçar
Someone you loved - Lewis Capaldi
Andrew
Nas minhas aulas de negociação, aprendi a conhecer meu
oponente e a usar isso a meu favor. Não foi difícil perceber que
Samantha possuía uma visão de que príncipes são mentirosos e
grandes canalhas com as mulheres, então precisei agir como ela
acreditava para conseguir enganá-la.
Para fechar minha atuação com chave de ouro, deixei Hannah lá
e fui para o local onde Grant nos esperava, mas como ela estava
demorando a voltar para o carro, o mandei para o restaurante para
causar alguma distração para tirá-la de lá.
Enquanto estava sozinho, liguei para Morris contando a ele sobre
o encontro e os termos acordados. Deixei-o responsável por redigir o
documento de presunção de inocência de Samantha, além de buscar
um internato seguro para deixar a Hailey.
Se ele tivesse qualquer envolvimento nos crimes, como Hannah
suspeitava, isso ajudaria a fazer com que eles acreditassem na história
que contei.
Alguns minutos após encerrar a ligação com o detetive, Hannah
apareceu. Conforme ela se aproximava do veículo, a luz incidia sobre
seu rosto e notei que estava chorando. Diabos, ela tinha confundido as
coisas!
Abri a porta e ela logo se sentou ao meu lado. Seus ombros
estavam rígidos, o olhar não buscou o meu em nenhum momento e
aparentava que ela mal conseguia respirar. Toquei seu braço na
tentativa de ajudá-la a relaxar e no instante em que ia explicar a
mentira, Hannah revelou:
— Ela matou meus pais.
Desconcertado, aguardei alguns segundos para ela dizer algo
mais, porém não houve explicação.
— Como você descobriu?
— Não posso deixar que ela vá embora sem pagar por seus
crimes — disse, ignorando minha pergunta. — Coloquei o GPS nela,
vamos segui-la e prendê-la.
— Nós vamos prendê-la quando estivermos com a Hailey —
acrescentei com cautela.
— Não posso deixar minha filha por mais nenhum segundo nas
mãos dela.
Hannah finalmente voltou o olhar para mim, e vê-la tão triste foi
como sentir uma espada entrando no meu peito.
— Ela matou meus pais, Andrew, e vai fazer o mesmo com minha
filha. Com ou sem o seu apoio, vou segui-la. — Sua determinação era
invejável, mas ela não pensava racionalmente.
— Hannah, não sabemos se ela está indo para o local onde está a
Hailey e não podemos arriscar que ela descubra nossos planos. Se
Samantha confessou mais um crime a você, ela mais do que nunca vai
querer ter liberdade. Temos que deixá-la acreditar que está ganhando.
Peguei suas duas mãos, para ver se eu conseguia passar um
pouco de calma para ela.
— Entendo como você deve estar se sentindo ao saber que
alguém tirou a vida dos seus pais, mas não há nada que você possa
fazer para trazê-los de volta. Ao contrário da Hailey, que temos a
chance de salvá-la.
Seus ombros relaxaram e ela deixou o corpo se encostar no
assento do carro, entendendo meu ponto de vista.
— Eu estava naquele carro, poderia ter morrido também...
— Espera, foi um acidente de carro? — a interrompi, as peças
começando a se juntar em minha cabeça.
— Sim, acho que lhe contei em algum momento.
— Eu sei, porém agora que comentou fiz uma associação. Não foi
Eros que orquestrou o acidente do meu pai, foi sua tia. — Eu estava me
sentindo o próprio Sherlock Holmes.
Trinta
Se eu pedir cê volta pro meu coração?
Pelo amor de Deus, não me diga não
Vem que tá na hora, tá aberta a porta pra você entrar
Se Eu Pedir Cê Volta – Jorge e Matheus
Andrew
Passei a noite acordado, mas não pelo fato de ter trocado minha
cama no castelo por um sofá. O motivo principal da minha insônia era
porque estava assustado.
Em poucas horas eu iria resgatar a Hailey e não sabia quase nada
sobre ela, tampouco ela sobre mim. Tinha medo de pegá-la em meus
braços e ela não se sentir segura. O que eu diria a criança? “Oi, eu sou
seu pai. Você está salva agora”?
Esse não era o único motivo para a minha insegurança. Pior do
que Hailey não me ver como seu pai, era ela ficar feliz em me conhecer
e eu precisasse tirá-la do país logo em seguida, nunca mais podendo
vê-la.
Casar com Hannah cada vez mais parecia a ideia certa, isso se
eu ignorasse mais um escândalo na minha família, é claro. Contudo, a
polêmica de arrumar uma noiva em tão pouco tempo seria menor que a
de uma filha bastarda. Eu poderia usar esse argumento quando os
conselheiros viessem me criticar. A parte mais difícil do plano seria
engolir meu orgulho e fazer Hannah aceitar meu pedido dessa vez.
Uma solução bem prática para o problema seria usar a Hailey e
ameaçar ficar com sua guarda.
Entretanto, nós nunca seríamos felizes dessa maneira, e desejo a
felicidade da Hannah mais que tudo. Por isso peguei-me refletindo nos
conselhos do Ed e lembrando do cara romântico que outrora fui. Não
era uma missão impossível voltar a ser aquele Andrew, afinal era
apenas eu mesmo sem nenhuma máscara.
Quando os primeiros raios de sol entraram no apartamento pela
janela de vidro, tinha decidido que iria reconquistá-la. Ainda faltava o
planejamento de como iria acontecer, porém já tinha avançado bastante
ao superar meu orgulho e minhas mágoas.
Sendo bem sincero, houve outro motivo para eu chegar a essa
decisão. Jake tinha ligado no meio da noite para informar que
Samantha estava em um quarto de hotel na mesma cidade em que nos
encontramos e que não houve movimentações suspeitas por lá. O
conteúdo da ligação não foi relevante para minha escolha, mas sim o
fato de que ele vinha fazendo de tudo pela Hannah e, se eu não
tomasse alguma atitude, iria perdê-la para sempre.
Além de Jake, Michael também ligou para contar que encontrou
alguns documentos no computador clonado. Havia dois passaportes
falsos: um em nome de Andrea Smith e outro para sua neta, Grace,
uma criança de dois anos; e passagens de avião para um voo com
destino ao Canadá.
Samantha pretendia fugir com Hailey, então já adiantamos alguns
planos:
1) seria montada uma força armada no momento do encontro para
não deixá-la escapar;
2) ninguém com os nomes verdadeiros e falsos delas poderia
deixar o país;
3) eu precisaria enganar Morris.
Como precisava voltar ao castelo para conversar com o detetive,
logo cedo liguei para Grant vir me buscar. Enquanto o aguardava,
Hannah apareceu na sala usando as mesmas roupas de ontem, mas
com o cabelo completamente desalinhado. Meu coração errou umas
batidas, e me arrependi de não ter ido para o seu quarto durante a noite
e ter o prazer de vê-la acordar.
Ao notar minha presença, Hannah tentou arrumar os fios para
parecerem menos revoltos.
— O que você está fazendo aqui? — perguntou, com a voz rouca
de sono.
Segurei a resposta irônica que estava na ponta da língua
percebendo que o primeiro passo para a tornar minha futura esposa
seria deixar de lado minha arrogância.
— Estava esperando você acordar para admirá-la. — Forçado
demais, Andrew. Eu podia ouvir a voz do Ed na minha cabeça dizendo
isso.
Graças aos céus, Hannah me ignorou.
— Você está bem? — Ela se aproximou, sentando-se na outra
extremidade do sofá.
Será que chamá-la para sentar em meu colo seria muito
precipitado?
— Não consegui dormir — respondi, contendo meus desejos, e
inclinei meu corpo para o lado, de modo que pudesse encará-la melhor.
— Estou surpresa por ter conseguido, na verdade nem lembro
como adormeci.
— Você dormiu no carro. Tive receio de acordá-la quando
chegamos então a trouxe para cá. Sabia que você não conseguiria
dormir de novo se a acordasse.
— Ah, obrigada. — Ela aparentou estar surpresa e envergonhada,
já que suas bochechas adquiriram um lindo tom vermelho. Ponto para
você, Andrew.
— Fiquei porque tinha alguns assuntos pendentes aqui. —
Hannah encarou-me com interesse, esperando-me prosseguir, e tive
que pensar rápido em um assunto.
— Não sei nada sobre a Hailey, gostaria de conhecê-la melhor.
Qual foi sua primeira palavra, quando deu o primeiro passo, o
brinquedo ou a comida preferida, se ela é alérgica a cachorros… — me
interrompi antes de perguntar qual cor de joias ela gostaria em sua
coroa.
Hannah abriu um sorriso triste.
— Perdoe-me por ter tirado seu direito de estar presente na vida
dela, espero que possamos encontrar um jeito de não precisar criá-la
longe de você.
— Nós acharemos — eu já tinha achado. — Agora me fale sobre
nossa filha.
Seu sorriso transformou-se em algo mais alegre e, conforme
falava, podia sentir seu amor pela criança em cada palavra. Foi a
conversa mais leve que tivemos desde sua volta. Passamos cerca de
meia hora envolvidos em histórias. Ao final, já sabia que Hailey amava
brócolis e bolo de chocolate — equilíbrio é tudo, afinal — , dava nomes
de comida a seus brinquedos, sua primeira palavra foi “mama”, o
primeiro passo foi aos nove meses, não era alérgica a cachorros,
amava filmes de princesas e suas cores preferidas são rosa e azul.
Enquanto conversávamos, Hannah me levou ao quarto que Ed
tinha preparado para a criança. Seus brinquedos ainda estavam
espalhados pela cama e pelo chão, como se ela estivesse ali brincando
quando a levaram.
Fiquei horrorizado ao ver a coitada da princesa pipoca sendo
torturada em uma mesa de chá.
— Acho bom você começar a gostar de chá se quiser participar
das brincadeiras — Hannah comentou, rindo.
— Vou ensiná-la que existem bebidas muito melhores que essa
água suja — resmunguei. — Esse é um dos piores costumes que a
realeza inventou. Onde já se viu tomar chá enquanto conversa com
outras pessoas? É a mesma bebida que se dá a alguém que está
doente, não faz sentido que as pessoas tomem por vontade própria.
Hannah gargalhou, e o som irrompendo na manhã silenciosa me
fez sorrir também. Eu tentava conquistá-la, mas era ela quem estava
fazendo isso comigo, sem o menor esforço. Meu coração traíra estava
quase se oferecendo em uma bandeja a ela.
— Senti saudades das suas piadas.
— Não foi uma piada, Hannah. Quando for rei, vou acabar com a
comercialização dessas folhas e deixar só para fins medicinais.
— E se sua rainha for apaixonada por chá? — indagou, em tom
de brincadeira, e eu não resisti a chance de provocá-la.
— Bem, ela terá que me oferecer algo em troca para eu mudar de
opinião.
Meus olhos encontraram os seus e eu tenho certeza que minha
expressão não era a de alguém que falava de chá. O clima divertido
que estávamos deu lugar a uma tensão muito maior, principalmente
quando ela entrou no meu joguinho, perguntando:
— Tipo o quê?
— Não serei um rei tão exigente, poderia contentar-me facilmente
com alguns beijos…
Minhas pernas se moveram, diminuindo a distância que havia
entre nós. Tinha um sorriso de lado fixado em meus lábios enquanto
observava-a morder suavemente o lábio inferior.
— Só isso? Escolha bem sua rainha para ela não lhe manipular e
destruir seu reinado.
— Não me preocupo com isso. A pessoa que tenho em mente
cuidaria do meu país bem melhor que eu.
Um brilho malicioso surgiu em seu olhar.
— Vai reatar com a Sophia?
— Pretendo reatar com uma ex, mas não é ela. — Quando
terminei a frase, a distância entre meu corpo e o dela era quase
inexistente. Percebi que ela prendeu o ar quando toquei seu rosto.
— Andrew, eu não…
— Shhh… — toquei seus lábios para silenciá-la. — Três anos já
foi tempo demais sem beijá-la.
Nossos narizes se encostaram e eu estava prestes a tomar seus
lábios, quando suas mãos tocaram meu peito me empurrando
levemente.
— Eu ia dizer que ainda não escovei os dentes, seu nojento!
— Depois você me compensa com outro beijo. — Não esperei sua
resposta, colando meus lábios nos seus.
Hannah demorou cerca de dois segundos para corresponder ao
beijo. Quando se rendeu ao desejo, uma das suas mãos foi parar em
meu cabelo enquanto a outra permaneceu no meu peitoral,
arranhando-me por cima da camisa de malha. Também foi ela quem
tomou a iniciativa de deixar sua língua invadir a minha boca. Segurei-
me para não pegá-la em meus braços e a jogar naquela cama de
criança. Tive que me contentar em agarrar forte a sua cintura
eliminando qualquer distância entre nós para que ela pudesse sentir a
rigidez do meu corpo.
Beijá-la era como uma amostra do paraíso e do inferno ao mesmo
tempo, sendo cativado por um afeto puro e inebriado por um desejo
ardente.
Minhas mãos passeavam por seu corpo, apertando seus seios e
descendo até sua bunda. Entrelacei meus dedos levemente em seu
cabelo para inclinar seu pescoço para beijar sua pele ali. Hannah
cravou as unhas em minhas costas arfando de desejo, enviando uma
corrente de excitação a um ponto muito específico do meu corpo.
— Como eu sobrevivi três anos sem você? — As palavras foram
sussurradas no seu ouvido e vi sua pele se arrepiar.
— Estou me perguntando a mesma coisa. — Diabos! Sua frase
levou embora o restante de autocontrole que havia em mim. Voltei a
beijá-la, erguendo seu corpo. Ela cruzou suas pernas em minha cintura,
tendo o atrevimento de se esfregar em meu membro.
— Espero que essa cama suporte nós dois.
— Andrew, não… — ela interrompeu o beijo.
— Vamos para o seu quarto então. — Caminhei na direção da
porta, com ela ainda agarrada em mim.
— Não, nós não podemos fazer isso. — Coloquei-a no chão ao
ouvir a rejeição.
Não seja covarde, Andrew. Estava sendo estranho ouvir a voz do
Ed em minha mente, porém ouvi seu conselho.
— Andrew, não vamos confundir as coisas. — Sua voz estava
baixa, quase sussurrada.
— Eu a desejo e você me deseja, o que há de errado? — Minha
mão saiu do seu corpo, pois a conversa começou a ficar mais séria.
— Como você pergunta isso? Dois dias atrás você me odiava…
— Dois dias atrás eu estava noivo. As coisas mudaram
rapidamente, Hannah — disse, interrompendo-a.
— E tem a Hailey, precisamos decidir o futuro dela…
— Estou fazendo isso neste momento — cortei-a de novo.
— Querendo transar comigo?
— Te seduzindo para você reconsiderar a ideia de casar comigo.
Eu teria a chocado menos se dissesse que era um ET vindo do
futuro. Hannah tinha os olhos arregalados e a boca formando um
perfeito “o”.
— Se você analisar bem, vai ver que é a melhor alternativa para
salvar a Hailey e Mirabelle de um escândalo.
— Você casaria comigo depois de tudo que lhe fiz? Ir embora sem
te contar o motivo, esconder nossa filha…
— Considerando seus erros, você será uma péssima esposa, mas
dará uma ótima rainha.
— E você acha que eu aceitaria me casar com você depois de ter
me acusado de ser golpista, interesseira e de dizer que eu sou um lixo?
— Mulher rancorosa.
— Bem, terei uma vida para fazê-la me perdoar. — Abri um
sorriso meio constrangido ao lembrar de como a vinha tratando desde
que ela voltou. É claro que tive meus motivos, porém até meu pouco
conhecimento sobre mulheres me dizia que até 2050 ela ainda
remoeria aquele assunto.
— Hannah, não estou pedindo-a em casamento agora, mas o
farei em breve. Então tudo o que peço no momento é que me prometa
não sair de Mirabelle depois de resgatarmos a Hailey.
— Eu não farei isso.
— Você faria de tudo para salvá-la, e ir embora vai parecer a
melhor solução quando as coisas aqui ficarem difíceis. E vão ficar muito
difíceis, eu garanto. — Toquei seu queixo, erguendo seu rosto para ela
me encarar mostrando que eu falava de peito aberto, sem nenhum
julgamento. — Reflita no que você fez: pode ter resolvido o problema
naquele momento, mas o tornou uma bola de neve e está mil vezes
maior agora.
— Eu fiz exatamente o que minha tia queria — confessou.
Eu deveria estar comemorando por ela finalmente admitir que
esteve errada o tempo todo, contudo não foi isso que senti vendo seus
olhos marejados.
— Nós dois erramos, eu deveria ter lhe confrontado quando fui
atrás de você em Lon...
— Você foi atrás de mim? — questionou, quase gritando.
— Não exatamente, fui a Londres e… — me calei, pensando se
deveria contar a fase humilhante que passei depois que ela se foi. Não
seja um covarde, Andrew. A voz do Ed apareceu de novo.
— Para ser sincero, fui. Tinham se passado dois meses da sua
ida. Nesse tempo não fiz nada além de me trancar no quarto e beber
sem parar, então meu pai contou onde você estava e fui procurá-la.
— O que aconteceu?
— Sair de Mirabelle sempre foi seu sonho e você estava tão feliz
quando a vi, não quis estragar tudo…
— Você entendeu a pergunta errada, o que aconteceu para rei
Dominic mandar você me procurar?
— Provavelmente ele não queria um príncipe alcóolatra como
herdeiro.
— Seu pai sabia da ameaça do Rei Eros e não me impediu
quando eu fui embora, pois sabia que era o melhor a se fazer. Mas se
ele mandou você ir atrás de mim…
— Foi porque tinha encontrado outra solução! — dissemos em
uníssono.
— Meu pai devia ter um plano para a retomada da economia.
Assim que eu tiver um tempo, vou procurar nos seus arquivos e
conversar com o secretário dele, talvez nos ajude agora. Você é um
gênio, Hannah! — Beijei sua testa, ela sorriu.
— Eu sei, já fui até professora de um príncipe.
— Não sabia que você era tão convencida, Srta. Price.
Hannah não pôde sair com a última resposta, pois a campainha
tocou, atrapalhando o momento.
— Grant veio me buscar, preciso encontrar Morris antes de ir. —
Dei um último selinho em seus lábios antes de voltar para o castelo
com o guarda.
Em menos de uma hora eu estava em frente a Morris. Precisei ser
frio o suficiente para não o acusar de estar envolvido no sequestro da
Hailey e no acidente do rei. Ele me entregou o documento para
inocentar Samantha, o qual não assinei naquele momento. Também me
apresentou um internato no Canadá e, para completar, trouxe uma
identidade falsa para Hailey. O nome na identidade era Grace Smith, o
mesmo encontrado no computador de Samantha. Desgraçado!
Continuei seguindo o plano, apesar do ódio que sentia pela sua
traição. Deixei-o responsável por levar uma equipe de guardas ao local
caso algo não saísse como planejado, para fazê-lo crer que não
desconfiava de nada. Ainda enfatizei o ódio por Hannah e que ela seria
exilada muito em breve.
Enquanto isso, Grant também montava outra equipe para ir até o
local, essa pronta para prender Morris e Samantha.
Trinta e um
Houve um tempo em que eu olhava nos olhos do meu pai
Em um lar feliz, eu era um rei, eu tinha um trono dourado
Aqueles dias se foram, agora as memórias estão na parede
Don't You Worry Child - Swedish House Mafia
Andrew
— Você acha que eu vou acreditar nisso? — questionei, tentando
recompor-me do abalo que senti. A mulher devia ter tomado um chá
muito estragado naquela manhã para insinuar tal atrocidade.
— Eu o chamaria de burro se acreditasse vendo apenas um teste.
Sente-se, eu tenho uma história para contar. — A obedeci, porque meu
cérebro tinha sido danificado com a revelação e não raciocinava tão
bem. Antes de sentar, mexi na orelha retirando o ponto eletrônico.
— Minha mãe era uma das criadas principais da rainha Antonella,
sua avó — iniciou. — Desde cedo, frequentava o castelo com ela, para
ajudá-la em algumas tarefas simples, e um dia conheci o príncipe
Dominic, na época tínhamos uns dez anos.
Seus olhos estavam marejados enquanto falava, transparecendo
as emoções que sentia. Eu, por outro lado, tentava imaginar meu pai,
mais jovem, se envolvendo com ela e a imagem parecia ser impossível.
Na minha cabeça sempre existiu apenas minha mãe.
Apesar disso, as cartas que Hannah encontrou confirmavam a
ligação entre eles.
— Cerca de dois anos depois, começamos a namorar escondido,
mas com pouco tempo ele precisou ir para um colégio interno em
Londres. Dom prometeu que me tornaria sua rainha quando retornasse
e eu prometi esperá-lo, sonhando com um conto de fadas. Eu era tão
tola e apaixonada — resmungou mais para si mesma. — O príncipe só
voltou depois de cinco anos, quando o pai estava doente. Ele precisava
se inteirar do reino caso precisasse assumir. Não demorou muito para
retomarmos nosso namoro e ele refazer as mil e uma promessas de
que nos casaríamos.
Samantha empurrou alguns papéis velhos sobre a mesa.
Espantado, logo tratei de ler as cartas em busca de alguma mentira,
contudo a letra era indiscutivelmente a do meu pai.
Querida Sam,
Eu estou de partida, mas meu coração ficará aqui, em suas mãos.
Prometo não demorar, tampouco esquecer de você. Em breve
estarei de volta, e peço que espere por mim, pois eu estarei esperando
por você.
Com amor, Dom.
A carta seguinte era de cinco anos depois, conforme ela contou.
Querida Sam,
Papai está cada vez mais doente e precisará passar alguns dias
no hospital. Teremos mais tempo juntos esta semana e não vejo a hora
de beijá-la. Encontre-me às 20h, no mesmo lugar de sempre.
Com amor, Dom.
Peguei outra carta, datada de dois dias após a primeira.
Querida Sam,
Tivemos uma noite esplêndida! Quero senti-la mais e mais,
podemos nos ver hoje?
Com amor e muito desejo, Dom.
Precisei ler mais uma para realmente acreditar que aquilo tinha
sido real.
Querida Sam,
John informou-me que os funcionários do castelo estão
comentando sobre nós e temo que o rei descubra. Não poderei vê-la
esta semana.
O terceiro bilhete pareceu mais frio e sem emoção, sequer havia
assinatura. Em nada se assimilava com o jovem apaixonado dos
outros. Fiz as contas rapidamente, naquela época meu pai deveria ter
uns 20 anos, como ele se casou aos 21, dava para concluir que
Samantha foi trocada por minha mãe.
Ora, um chifre não justificava todos os seus atos.
— Depois disso, quase não nos víamos — prosseguiu. — Um
belo dia descobri que estava grávida. Estava desesperada porque
sabia que não podia ter um filho bastardo do príncipe e esperançosa ao
mesmo tempo, achando que Dom enfrentaria o pai de uma vez por
todas e poderíamos nos casar — ela se interrompeu secando a única
lágrima que desceu por seu rosto.
Certa vez, meu pai comentou que o meu avô não era tão
compreensivo. Não imaginava ele com tanto medo do próprio pai.
Talvez tenha sido por isso que ele nunca me impediu de escolher a
minha esposa.
— Pedi a minha melhor amiga, Cristal, para entregar uma carta a
Dom. No entanto, quem recebeu a carta foi o rei. Ele me procurou na
mesma tarde, quando eu estava sozinha no quarto de descanso da
minha mãe. Chamou-me de prostituta, me acusando de estar dando o
golpe da barriga no príncipe. Naquele dia, ele me violentou.
Não consegui disfarçar o espanto.
— Suas palavras nunca deixaram de me atormentar: "Por que ser
a puta de um príncipe quando pode ser a de um rei?". — A expressão
de horror e dor em sua face era o suficiente para acreditar no relato.
Mais lágrimas desceram por suas bochechas. Estendi o
guardanapo que estava na mesa, ela aceitou usando-o para secar o
rosto. Alguns minutos depois, se recompôs voltando a falar:
— Depois do estupro, vivi um verdadeiro inferno nos meses
seguintes. Tentaram realizar um aborto contra a minha vontade e eu
consegui fugir na hora. Depois tive que lutar para sobreviver e me
esconder do rei. Acabei me relacionando com pessoas erradas. Não
me orgulho das coisas que fiz nessa época, mas foi o necessário para
manter a mim e o bebê vivos.
Eu começava a sentir um pouco de empatia por ela. Um nó se
formou em minha garganta ao imaginar todo aquele tormento.
A imagem de Hannah passando por algo semelhante surgiu em
minha mente e senti uma enorme gratidão por Jake não tê-la deixado
sozinha durante todo esse tempo.
— Graças aos céus, em menos de três meses o desgraçado
morreu e pude voltar. Sabe o que eu encontrei quando voltei? — Não
respondi, mesmo tendo certeza da resposta. Ela deu continuidade. —
Minha querida melhor amiga e meu namorado juntos.
— Você contou a meu pai?
— Sim, narrei tudo o que aquele cretino fez comigo. Ele até
acreditou no sofrimento que passei, mas não quis assumir a criança. O
novo rei de Mirabelle já estava enfeitiçado pela sua bela Cristal,
desonrando todas as promessas que um dia me fez.
— Mas ele não deixaria nada acontecer a criança — o defendi.
— Oh, não, Dom não era tão cruel e me deixou ficar em Mirabelle
para ter a criança por perto. Garantiu que ela cresceria no castelo e eu
receberia ajuda para criá-la. Em troca, eu precisava contar a todos que
fui embora com outro homem e ele me abandonou grávida. Minha
família achou que eu era amante do antigo rei e não me apoiaram.
Aceitei tudo de bom grado, pois na época não passava de uma jovem
tola e apaixonada, que acreditava ser possível reconquistá-lo quando
nosso filho nascesse. Até mesmo quando ele se casou, tinha
esperança que ele voltaria, nem que fosse para sermos amantes.
A mulher parecia tão vulnerável enquanto falava! Eu estava cada
vez mais envolvido com a sua história.
Meu pai tinha devoção absurda por sua esposa, e mesmo depois
de anos da morte dela, nunca soube do seu envolvimento com outra
mulher. Era difícil aceitar, mas havia uma grande possibilidade de ele
ter escolhido ficar com ela ao invés da mãe de seu filho.
Um calafrio percorreu meu corpo ao me imaginar crescer como
um bastardo do rei, vivendo à margem da família real.
— Então, Cristal engravidou e mais uma vez estragou tudo. Dom
sequer foi ver o bebê quando ele nasceu, pois estava muito ocupado
com sua esposa grávida e sua vida feliz no castelo, também não o viu
quando completou o primeiro mês, o segundo, terceiro... Até que veio o
acidente da rainha e eis a novidade que a família real sempre tentou
esconder: o jovem príncipe também estava naquele carro.
— Impossível, não houve sobreviventes.
— Exatamente! A rainha e o príncipe herdeiro de Mirabelle
estavam mortos, mas não foi essa a história que a realeza contou. —
Compreendi o que ela insinuava.
— Pegaram o seu filho?
Ela assentiu me estendendo mais um documento. A certidão de
nascimento de Gregory Price, nascido em 13 de fevereiro de
1999. Price. Diabos, se ela estivesse dizendo a verdade, Hannah e eu
éramos primos!
— Como o bebê era oito meses mais velho que o da rainha,
decidiram escondê-lo até os dezoito anos, quando ninguém notaria a
diferença de idade.
Meu Deus, toda a minha vida podia ter sido uma grande mentira!
— No início eu o entreguei voluntariamente, você já deve imaginar
o porquê. Quando percebi que Dom não voltaria para mim, quis contar
a verdade, mas ameaçaram matar a criança e eu não deixaria meu filho
morrer depois de tudo que passamos. Pode achar que não, mas como
mãe quero sempre o melhor para os meus filhos. Principalmente, você.
— O melhor para mim? Você se envolveu com Eros para destruir
toda a minha vida e deseja o melhor para mim? — ironizei.
— Eros queria matar a Hailey horas antes do casamento —
revelou, esquivando-se da minha pergunta. — Eu entreguei as provas
contra ele, mesmo que me acusassem também, para salvar minha
neta. Jamais deixaria algo acontecer com a criança.
Ela tinha sentimentos?
— Se minha vida está ameaçada e você se importa comigo, por
que está ameaçando revelar isso agora?
— Dom está à beira da morte e certamente não terá outro filho.
Acabou a manipulação. Eles não podem matar você, pois assim o trono
ficaria sem herdeiro legítimo. Agora cabe a você decidir se o povo
saberá dessa história ou não.
Sua história até que tinha sentido, mas me recusava acreditar que
meu pai tivesse roubado a criança da mãe e, pior, que eu desejava
minha prima. O bispo odiaria ter que nos casar.
Analisei mais uma vez a certidão de nascimento memorizando o
nome do hospital, onde supostamente nasci. Assim que pudesse,
mandaria Michael investigar a veracidade daquilo.
— Alteza, não estou pedindo para você me aceitar como mãe e
recuperarmos o tempo perdido. — Ela fez uma careta de nojo, e eu a
imitei. — Tudo que peço é uma última chance de ver Dom antes de ir
embora. — Sua voz não tinha o tom sarcástico de costume. Ou a
mulher atuava muito bem ou realmente o passado a deixava vulnerável.
Samantha era a suspeita de ter causado o acidente do rei, além
de ter revelado ser culpada pela morte do próprio irmão, nem um louco
a deixaria chegar perto dele.
Entretanto, sua história comovente e suas evidências, mesmo que
falsas, seriam o suficiente para causar mais um escândalo na família
real.
O rei em coma, entre a vida e a morte.
O casamento do príncipe cancelado.
Uma aliança entre países desfeita.
Uma filha bastarda do príncipe.
E o príncipe acusado de ser um bastardo também.
Seria o suficiente para o povo exigir o fim da monarquia em
Mirabelle. Não tinha outra escolha a não ser aceitar seus termos.
— Você me entrega a criança primeiro e a deixo ver meu pai. É
minha última oferta. — Ela abriu a boca para tentar rebater e
acrescentei: — Caso contrário você será presa agora e pouco me
importa o que fará com essas informações. Já estou cansado desse
trono e das mentiras que o cercam. Perdê-lo será um favor que você
estará fazendo a mim.
— Não acredito em suas palavras. Você gosta do poder como
qualquer homem da sua família, posso ver isso em suas falas. — A
maldita era boa em ler as pessoas. — Tenho diversas pessoas de
confiança com estes documentos. Se não cumprir qualquer parte que
seja do nosso acordo, não serei a única a perder algo.
— Você tem a minha palavra — assegurei. — Em uma hora esteja
no hospital com a criança.
Uma hora seria tempo o suficiente para Michael confirmar o
nascimento do bebê. Infelizmente um teste de DNA levaria mais tempo
que isso, e precisávamos salvar a Hailey antes que ela aparecesse
com outra história descabida e mais uma ameaça.
De toda forma, eu daria um jeito de conseguir uma amostra do
DNA dela para realizar o teste em breve. Enquanto meu pai não
acordasse para confirmar a história, eu teria que buscar outras
maneiras de descobrir a verdade. Se Samantha fosse mesmo a minha
mãe, eu já tinha garantido minha passagem para o inferno por ter uma
filha com a minha prima.
A caminho do hospital, conversei com Michael. Ele confirmou o
nascimento de Gregory Price naquele dia, mas informou que seria
muito fácil para Morris plantar uma certidão falsa e não devíamos
confiar apenas nisso para garantir que Samantha podia ser minha mãe.
Também levantamos uma discussão sobre como conseguir um
teste de DNA e o melhor plano foi o do Ed: Hannah arrumar uma briga
com a tia, quando ela estivesse saindo do hospital, e arrancar alguns
fios de cabelo dela, para que pudéssemos fazer o teste sem ela saber.
— Vou adorar ver Hannah dando uns tapas na cara daquela
megera! — comentou Ed, em seu tom animado.
Chegando no hospital, avisei aos guardas em frente a porta do
meu pai que receberíamos uma visita e eles precisavam chamar uma
policial para revistar Samantha. Enquanto isso, alguns guardas a
seguiam. Ela não fez nenhum desvio no seu percurso até o novo local
de encontro.
Aproveitando que estava sozinho com meu pai, segurei sua mão.
Comecei a conversar com ele, na esperança de obter alguma resposta
sobre o seu passado.
— O senhor nunca me falou muito sobre a mamãe, então não sei
bem no que acreditar. Caso Samantha esteja falando a verdade,
gostaria de compreender seus motivos para tomar um filho da própria
mãe. Sei que não foi apenas para ter um príncipe herdeiro, já que era
jovem e poderia se casar de novo. Talvez você nunca tenha se casado
para garantir que não houvesse um herdeiro legítimo... faria sentido.
Ele não reagiu em nenhum momento enquanto eu falava.
— Este seria um bom momento para acordar e resolver essa
história maluca, e ainda conheceria sua neta. — Abri um sorriso,
lembrando da cena que imaginei na noite passada. — Eu também não
a conheço direito, mas ela parece ser uma criança incrível e trará um
pouco de alegria para o castelo, se ainda restar monarquia quando tudo
isso acabar.
Seus dedos apertaram levemente a minha mão. O gesto foi tão
suave como da outra vez, passando a certeza que ele ainda estava ali,
lutando pela vida.
No mesmo instante, ouvi um barulho do outro lado da porta.
Presumi que a convidada tinha chegado.
— Permiti que Samantha viesse visitá-lo, estarei aqui do seu lado
para garantir que ela não o perturbe. — Beijei sua mão saindo do
quarto para ver se ela tinha cumprido sua parte do acordo e estava com
a Hailey.
Não sei como ainda me surpreendi ao vê-la sozinha.
— Ela já foi revistada, Alteza — comunicou a segurança. Com um
gesto de mão, dispensei todos para que nos dessem privacidade.
— Minha filha, Charlotte, está a caminho daqui com a criança —
Samantha informou antes que eu perguntasse.
— Não foi esse o acordo.
— Precisava garantir que teria tempo o suficiente para conversar
com o rei, a criança será entregue quando eu decidir que a conversa
acabou. — A megera, como dizia Ed, era uma ótima manipuladora. —
Ordene aos guardas para liberarem a entrada de Charlotte quando ela
chegar.
— O hospital está cercado de guardas, você só conseguirá sair
daqui quando me entregá-la.
— Você tem a minha palavra, filho.
— Não me chame assim — resmunguei entre dentes. — Você não
tocará no meu pai, mantendo no mínimo um metro de distância dele,
entendeu?
— Sim, sim. Como prova da minha lealdade ao nosso rei, trouxe
algumas provas contra o rei Eros e seu plano de dominar Mirabelle.
Está na minha bolsa que a segurança confiscou. — Ela apontou para a
mulher e pedi que pegasse a pasta lá dentro.
Folheei o documento, que continha diversos prints de conversas
entre ela e rei Eros. Falavam sobre o início do sequestro, se o plano de
manter Hannah calada estava dando certo e as últimas mensagens
eram ele ameaçando matar a criança. Desgraçados!
— Posso ver o Dom agora? — questionou Samantha.
— Eu entrarei com você. — Abri a porta do quarto a deixando
adentrar.
Notei uma leve fraquejada na postura de Samantha quando viu o
corpo imóvel do meu pai sobre a cama. A mulher era uma das
responsáveis por ele estar ali, não acreditaria em sua falsa tristeza.
Em alerta, posicionei-me entre Samantha e o leito garantido que
ela não se aproximasse dele.
— Eu não podia ir embora de Mirabelle desta vez sem lhe dizer
adeus. Espero que esteja consciente para ouvir tudo o que tenho para
falar, Dom — disse com a voz embargada. — Nunca esqueci as
promessas que me fez décadas atrás e também nunca compreendi
como você foi capaz de quebrá-las com tanta facilidade. Vivi todos
esses anos carregando a dor de ser abandonada no momento em que
eu mais precisei de alguém ao meu lado. E desde então passei a odiar
você, Cristal e todos os que me viraram as costas. Odiei vocês com
tanta força que cheguei a acreditar que esse sentimento nunca
passaria.
Samantha calou-se por um instante e só se ouvia o bip do monitor
cardíaco.
— Surpreendentemente, não sinto mais nada por você. Nem um
amor doentio, tampouco ódio. Percebi que tenho a chance de
recomeçar minha vida e deixar para trás todas as mágoas que
carregava. Você não teve culpa pelo o que seu pai fez comigo ou por
ter se apaixonado pela Cristal. Eu estava cega pela rejeição e só
recentemente consegui enxergar esse fato. Por isso vim aqui dizer que
lhe perdoo por tudo.
De todas as coisas que pensei que ela teria a dizer, um perdão
não passou pela minha mente.
O monitor indicava uma alteração na frequência cardíaca do meu
pai. Não era o suficiente para causar preocupação, mas dava para
deduzir que ele reagiu de alguma forma a fala dela.
Neste momento, alguém bateu na porta do quarto. O guarda
avisou a chegada de outra visitante trazendo uma criança. Hailey. Se
meus batimentos estivessem sendo monitorados, estaria indicando uns
250 por minuto, no mínimo.
Em poucos segundos, uma jovem loira que me despertava uma
vaga lembrança entrou no aposento. Era a própria cópia da mãe, até na
postura de quem se acha superior aos outros. Baixei o olhar para ver
uma criança pequenininha, cabelos castanhos escuros, como os da
Hannah, e olhos verdes segurando sua mão.
Ainda bem que estávamos no hospital, se eu tivesse algum
ataque cardíaco seria atendido rápido.
Engoli em seco diversas vezes, buscando alguma coisa para falar.
Tinha passado a noite ensaiando diversas frases, mas nenhuma
parecia se encaixar com o momento. Felizmente, Samantha quebrou o
silêncio por mim.
— Aqui está a criança como prometido, agora cumpra sua parte
do acordo, Alteza.
A filha dela soltou a mão da criança e me aproximei devagar,
emocionado demais até para conseguir respirar. Ao chegar mais perto
dela, reparei em algumas diferenças desde o nosso último encontro.
Hailey parecia mais magra e suas bochechas não estavam tão
rechonchudas como eu lembrava das fotos que Hannah me mostrou.
Ela não deveria ter se alimentado bem durante o sequestro.
— Você está segura agora, minha princesa. — Segurei sua
mãozinha e a beijei, sentindo lágrimas brotarem em meus olhos.
— E você está livre, Samantha. — Tirei o documento, já assinado,
do bolso e o entreguei a ela. Só desejava que ela fosse viver do outro
lado do mundo e nunca mais fizesse nenhum mal as pessoas que amo.
— Em outra vida, esta seria a nossa família, Dom. Eu, você,
nossos filhos, os netos e talvez alguns animais de estimação.
Poderíamos ter sido felizes se Cristal não tivesse roubado a vida que
era minha. Nada mais justo do que eu ter roubado a dela também, não
é?
Minha cabeça girou para encará-la. Samantha tinha acabado de
confessar ter matado a minha mãe? Ou Cristal, sei lá como deveria
chamá-la.
O choque de ver a Hailey não foi quase nada comparado àquilo.
Infelizmente, não fui o único a não reagir bem a sua revelação. Os
batimentos cardíacos do meu pai se alteraram e o som do bip ficou
muito mais alto, alertando que aquilo era um grande problema.
Gritei desesperado, chamando um médico. Se meu pai piorasse,
a culpa teria sido toda minha ao deixar aquela mulher conversar com
ele. Eu sabia que ele não podia sofrer fortes emoções e o coitado
descobrir que seu grande amor foi assassinado era a pior emoção que
alguém poderia sentir.
Ainda segurando a mão da Hailey, para garantir que não a
levassem de novo, fui até a porta ordenando que um médico viesse
logo.
Os segundos que se passaram foram como um borrão, pois
diversas coisas aconteceram ao mesmo tempo e não consegui
acompanhar tudo. Vi uma equipe de médicos e enfermeiros entrando
correndo no quarto. Os guardas falaram alguma coisa comigo, no
entanto pareciam estar falando um idioma desconhecido, pois as
palavras não faziam nenhum sentido.
Minha mente estava zonza, os olhos não focavam em um ponto, e
eu só estava consciente de duas coisas:
1) meu pai estava morrendo;
2) eu não podia soltar a mão de Hailey por nada.
Senti meu corpo sendo arrastado e fechei minha mão com mais
força, sobretudo quando pediram para eu soltá-la. Eu não a perderia.
— Alteza, solte a criança. — A voz era um tanto familiar, porém
não confiaria em ninguém.
— Você não vai tirá-la de mim. Guardas, prendam esse traidor!
— Alteza, o senhor está machucando a menina. Solte-a ou vou
precisar machucá-lo.
— Vai tentar me matar, como fizeram com meus pais?
Percebi que não tinha sido uma boa pergunta, quando ele apertou
meu braço tão forte que minha mão começou a se afrouxar. Eu não
podia soltá-la.
Com a mão livre consegui acertar um soco no borrão com
manchas pretas que deveria ser seu rosto. Isso fez ele me soltar.
— O que deu no senhor? Estou tentando lhe ajudar! A menina
está chorando, não está ouvindo?
Tentei me concentrar no som do choro infantil e meu aperto
relaxou um pouco. Meu Deus, eu a tinha machucado. Em menos de
dez minutos com ela já estava sendo um péssimo pai.
Esfreguei meus olhos, tentando ajustar o foco da minha visão, e
consegui enxergar os olhos esverdeados banhados em lágrimas.
— Desculpe-me, estou tentando salvá-la. — Ela continuou
chorando.
— Alteza, estão seguros aqui comigo. Pode soltá-la. —
Finalmente reconheci a voz de Grant e meu corpo saiu do estado de
alerta.
— Minha cabeça está zonza. — Larguei a Hailey segurando a
cabeça, para ver se meu cérebro voltava ao lugar. — Cadê meu pai?
Olhei ao redor, estávamos em um quarto desocupado. Ele deveria
ter me arrastado no meio do tumulto.
— Pelo que entendi, ele sofreu uma taquicardia, os médicos estão
tentando acalmar os batimentos.
— Aquela desgraçada revelou ter causado a morte de minha mãe
e o deixou assim. Onde ela está?
— Tem uma criança aqui, por favor, fale direito — Grant me
recriminou, deixando-me surpreso. Ele devia ser pai provavelmente, um
ótimo pai. — Samantha é um grande problema. Devido a confusão de
médicos entrando no quarto, ninguém a viu sair. Nem mesmo Michael
que está monitorando as câmeras a viu deixar o aposento.
— A mal... — Me interrompi antes de xingá-la. — A mulher
planejou tudo, eu não podia tê-la deixado me manipular com aquela
história de ser trocada. Péssima ideia trazê-la até aqui.
— Vamos dar continuidade ao plano de prendê-la? — mudou de
assunto, sem julgar minha atitude.
— Me dê um momento, preciso pensar. — Fechei os olhos, em
busca de alguma resposta. Se eu fosse tomar uma decisão pela
emoção do momento, mandaria prendê-la, contudo eu precisava
pensar nas consequências.
Ela tinha evidências de um relacionamento amoroso com meu pai
e um teste de DNA, sendo falso ou não. Levaria dias até eu conseguir
um teste novo e esse tempo seria o suficiente para causar um
escândalo no país.
Mesmo se fosse comprovada a mentira, ela ainda detinha
informações sobre a Hailey.
O pensamento de que nada disso estaria acontecendo se não
houvesse relações sexuais antes do casamento surgiu em minha
mente ainda confusa.
Olhei para a criança ao meu lado e ao pensar nela com seus
namoradinhos no futuro, seria uma ótima ideia proibir o sexo até o
matrimônio. Uma decisão para depois.
Mas tendo a beleza da mãe e com o título de princesa herdeira,
os homens do país entrariam em guerra por ela. Santo Deus!
Como se fosse atraída por meus pensamentos, a mãe em
questão apareceu no quarto. Linda como sempre e um pouco
exasperada.
— Tia Satan não passou pela recepção, algo deu errado? Onde
está a Hailey? — Ela falou tão rápido que precisei de um certo esforço
para entender.
— O quadro do meu pai piorou, ela fugiu em meio à confusão de
médicos e enfermeiros, mas nossa filha está salva.
Apontei para a menininha, que tinha parado de chorar e estava
em silêncio. Os olhos de Hannah se arregalaram demostrando que
havia algo de errado, porém não estava preparado para ouvi-la dizer:
— Está não é a Hailey.
Capitulo Trinta e dois
Trinta e dois
É um conto de fadas que não consigo explicar
Cheio de palavras que não sei dizer
E sem uma pequena virada do destino
Eu sei que ainda estaria procurando, amor
Always Been You – Shawn Mendes
Hannah
— Como não? — Andrew questionou, olhando assombrado para a
criança.
— Sua lerdeza agora foi longe demais. Como você não a
reconheceu, seu imbecil? — gritei, a aflição me dominando de novo.
— Talvez pelo fato de você a ter escondido de mim todos esses
anos — rebateu.
— Vão começar outra vez — ouvi Grant resmungar.
— Não tente pôr a culpa em mim, Andrew! As fotos que lhe
mostrei eram suficientes para você reconhecê-la. Você a pegou no colo
no café, oras.
— Peço perdão pelo meu engano, mas olhe para a garota! — Meu
olhar se voltou na direção que ele apontava. — Ela se parece com a
Hailey, acreditei que sua tia não estava alimentando-a bem, como fez
com você, e por isso ela estava mais magra.
Encarei a criança, que parecia assustada. Realmente algumas
características eram semelhantes como a altura, o cabelo e a cor dos
olhos. Contudo, suas bochechas não eram tão gordinhas como as da
Hailey, o nariz era mais fino e eu não precisava vê-la sorrir para saber
que seria diferente também. Além do mais, se fosse Hailey ela estaria
tagarelando coisas incompreensíveis e não em silêncio como a
menininha estava.
Infelizmente, eram detalhes que Andrew não conhecia. O
pensamento me fez baixar a guarda.
— Esqueci que você não a conhece tão bem quanto eu, me
desculpe. — Meu pedido pareceu tirar um peso das suas costas, devia
estar sendo difícil para ele também. — Nós temos outro plano, não é?
Não posso aceitar que nunca mais verei minha filha!
Trinta e três
Eu não estava lá no momento
Em que você aprendeu a respirar
Mas eu estou a caminho, a caminho
On my way - Boyce Avenue
Andrew
No instante em que Hannah contou que Hailey estava no castelo
desde o casamento, me senti o mais burro dos homens. Como eu não
enxerguei embaixo do meu próprio nariz?
Precisava confessar que Samantha era uma mulher ardilosa e
inteligente, pois eu reviraria Mirabelle inteira e jamais pensaria na
possibilidade de Hailey estar dentro da minha própria casa.
O único lado bom disso é que ela já ficaria por lá mesmo.
O lado ruim era que tínhamos alguns problemas para realizar o
resgate. A grande maioria dos guardas estava cercando o hospital e
não conseguiriam chegar ao palácio antes de Samantha, e os guardas
que restaram no palácio não podiam deixar seus postos para revistar o
local. A solução que encontrei foi colocar todos os empregados do
castelo para procurar uma criança lá dentro e convocar os guardas que
estavam de folga e moravam por perto para irem até lá. Também
ordenei que ninguém, absolutamente ninguém, poderia sair do castelo
até encontrarmos a garotinha.
A esse ponto, Samantha ainda não devia ter chegado lá e
poderíamos encontrar a Hailey antes dela.
— Um helicóptero está a caminho para levá-lo ao castelo, Alteza
— Grant informou pelo ponto eletrônico. Ele tinha prendido Morris e
continuava coordenando a força tarefa em volta do hospital, pois havia
a possibilidade de Samantha ainda não ter deixado o prédio. Não
podíamos perder a chance de prendê-la.
— Ainda tem medo de altura, Hannah? — perguntei, voltando
minha atenção para ela, que se juntou a nós logo que descobriu a
informação.
Além de nós, Ed e a criança sósia da Hailey também estavam no
quarto, ele distraindo a menina com uma história de uma garota
apaixonada por um príncipe, e também tinha algo sobre uma bruxa e
uma fada.
— Você ainda lembra... — Ela abriu um pequeno sorriso e sua
expressão tornou-se nostálgica por alguns segundos.
— Eu não esqueci nem um detalhe seu — confessei.
— Muito fofo da sua parte, mas não me convenceu a andar de
helicóptero — ela respondeu.
— Teoricamente você vai voar, não andar.
— Andrew! — me repreendeu dando um tapa do meu peito, e
abrindo um sorriso.
— Precisamos chegar rápido ao castelo e Hailey vai precisar de
um rosto conhecido quando a encontrarmos. Vamos! Prometo segurar
sua mão no caminho.
— Só vou fazer esse sacrifício pela Hailey — avisou.
Subimos para a cobertura do hospital, onde o veículo acabara de
pousar. O vento causado pelas hélices bagunçava o cabelo de Hannah,
levando os fios para o rosto que esboçava uma reação de total pavor.
— Andrew, acho que não é uma boa ideia. Se nós morrermos,
quem vai cuidar da Hailey? — tentou argumentar.
Peguei sua mão, disfarçando o riso.
— Relaxe, meu amor. Você ainda terá muitos anos para me
aguentar.
O piloto, que se apresentou como Coronel Kennedy, nos entregou
os fones de ouvido. Em segundos estávamos levantando voo. Não
soltei a mão da Hannah por nenhum minuto enquanto sobrevoávamos
a cidade. Ela murmurava algumas palavras incompreensíveis, já que o
microfone do fone estava fora de alcance, mas apostaria minha coroa
que devia ser uma oração.
O Coronel Kennedy atendeu minha ordem de ir o mais rápido
possível, e em poucos minutos o helicóptero pousava no jardim do
castelo. Praticamente pulei para fora do veículo puxando Hannah
comigo. Alguns empregados espiaram pelas janelas a chegada
repentina da aeronave quando deviam estar procurando pela Hailey, e
isso me revoltou.
— Alteza — saudou um guarda com uma reverência. O homem
era um dos guardas mais antigos e um dos homens de confiança do
meu pai. — Já revistamos todos os quartos dos empregados e os
quartos de hóspedes vazios, nenhum sinal da garota.
— Ainda temos hóspedes no castelo?
Ele informou que alguns membros da realeza que vieram ao
casamento ainda estavam lá, pois queriam conversar comigo e eu não
tinha aparecido até então.
— Revistem os quartos deles também.
— Quem revistou a ala dos empregados? — Hannah perguntou.
O guarda me olhou hesitante se deveria responder, e concordei com
um aceno de cabeça.
— As próprias funcionárias, senhorita.
Ela se voltou para mim.
— Andrew, minha tia disse que vivia no castelo quando era mais
jovem. Ela ainda deve ter contato com alguma das empregadas e essa
pessoa pode estar a ajudando. Poderíamos interrogar as funcionárias
que trabalham aqui há mais de vinte anos e os guardas revistariam a
ala novamente.
Desviei o olhar para o guarda, antes que a beijasse com toda a
admiração que sentia.
— Você a ouviu. Reúna esse grupo e coordene uma nova busca
— dei a ordem.
— Entendido, Alteza. Antes de ir, sinto-me no dever de informar
que estão circulando fofocas sobre a menina ser sua filha com a sua
antiga namorada que morou aqui no castelo. — Ele não disfarçou
quando olhou para minha mão segurando à da Hannah.
— As fofocas são verdadeiras. Estamos procurando pela princesa
e temos que encontrá-la o quanto antes.
O guarda assentiu, sem dizer uma palavra de julgamento.
Hannah e eu entramos no castelo ainda de mãos dadas. Ela até
tentou se soltar, alegando que eu tinha acabado um casamento no dia
anterior e não podia simplesmente aparecer com outra. Eu não lhe dei
ouvidos, me arrependendo no instante em que pisamos no primeiro
degrau da escada do salão principal e vi uma mulher loira vindo em
nossa direção.
Sophia estava abatida, como nunca tinha visto. Olhos vermelhos,
a pele mais pálida que o normal e olheiras indicavam que ela não tinha
descansado bem. Seu olhar encontrou o meu e logo desviou para a
pessoa ao meu lado.
— Agora está explicado o seu sumiço depois de me abandonar no
altar — disse com desdém. Até o momento não tinha parado para
pensar na Sophia ou nos seus sentimentos, mas só de olhar sua
aparência dava para imaginar que ela estava sofrendo.
— Sophia, preciso lhe explicar algumas coisas. Poderíamos
conversar em duas horas?
— Explicar-me o quê? Que você nem teve a consideração de
terminar comigo antes de correr para esta interesseira?
— Cuidado em como se refere a mim, sua princesinha egoísta —
Hannah rebateu.
Ainda bem que havia uns vinte degraus separando as duas ou
elas podiam se atacar a qualquer momento. Tentei intervir na conversa
nada diplomática das mulheres, pois tínhamos assuntos mais
importantes, porém Sophia me cortou.
— Andrew sabe que você aceitou dinheiro para terminar com ele?
— questionou, olhando para mim.
Minha atenção automaticamente se voltou para Hannah. A frase
dela atingindo em cheio o meu peito, seria verdade?
O pensamento logo desapareceu quando Hannah me olhou, seus
olhos mostrando o receio de eu acreditar na princesa. Certamente,
alguns dias atrás eu teria acreditado e meu ego seria altamente
machucado, contudo já tinha perdoado Hannah por ter ido embora e a
mágoa ficou no passado, assim como qualquer envolvimento com a
Sophia.
— Nós iríamos nos casar por causa de títulos, Sophia — respondi.
— Isso também nos faz interesseiros.
— Eu ia me casar por amor! — ela quase gritou, amargurada.
— Sophia, você só me conhece pelos olhos da minha tia —
Hannah voltou a falar e sua voz estava mais suave, como se falasse
com uma criança. — Não sei qual história ela inventou para você, mas
eu me apaixonei por esse idiota antes de saber que ele era um
príncipe, e precisei terminar com ele por acreditar que seria o certo,
mesmo que implicasse ele se casar com outra. E sabe por que fiz isso?
Porque o amo e sempre vou desejar o melhor para ele. Se você
amasse o Andrew como diz, não tentaria atrapalhar sua felicidade,
mesmo que seja com outra pessoa.
Suas palavras foram direcionadas para a Sophia, porém as
absorvi como uma declaração dita a mim. Hannah tinha conjugado o
verbo amar no presente e ela era inteligente demais para errar algo
assim. Quis ajoelhar-me e pedi-la em casamento ali mesmo, torná-la
minha para sempre e apagar os três anos que passamos separados.
— Você é a segunda pessoa que me diz isso. — comentou
Sophia, pensativa. As palavras de Hannah surtiram algum efeito.
— Um conselho de inimiga: se ele não te quer, supera! Tem tantos
homens no mundo que podem te fazer feliz, você não precisa se
rebaixar por um que não te valoriza.
Elas deviam ter se esquecido que eu estava ouvindo a conversa.
— Eu continuo não gostando de você, mas agradeço o conselho.
Realmente Andrew não merece que eu passe a noite disputando com
uma criança para ver quem chora mais. Adeus! — Sophia se virou para
ir embora.
— Espere, o que você disse?
— Que não derramarei mais lágrimas por você!
— Não isso. Você falou sobre disputar com uma criança para ver
quem chora mais.
— Por que isso importa?
— Onde diabos você ouviu uma criança chorar? — Hannah
perguntou, a voz ameaçadora, e que em outra ocasião eu acharia
extremamente sexy, porém não era adequado ter pensamentos
pervertidos naquele momento.
— Há uma criança desaparecida no castelo e você pode nos
ajudar — supliquei.
— Depois do casamento, eu queria ficar sozinha, primeiro fui para
a biblioteca e me encontraram lá, então tive que buscar outro
esconderijo e... — Ela se interrompeu. — Eu estava desesperada, não
queria que ninguém me visse cho...
— Fale logo! — Hannah gritou, subindo os degraus na sua
direção, parecendo uma leoa atrás da sua presa. Eu fui atrás para
evitar um homicídio.
— Fui para os aposentos do rei.
— Como conseguiu entrar lá? Dane-se, isso não importa. A
criança estava lá?
— Não sei exatamente, mas eu conseguia ouvir um choro por
alguns minutos e logo parava como se alguém cuidasse dela, então
não estra... — Não esperei ela terminar sua explicação correndo
escada acima.
Eu tinha uma ideia de onde ela podia estar.
Hannah me seguiu, fazendo algumas perguntas que não consegui
responder. A adrenalina dominava meu corpo, me fazendo subir três
degraus por vez em cada lance de escadas que passávamos. Cheguei
à torre, onde fica o quarto do rei, alguns segundos antes dela. Havia
dois guardas protegendo a escada que dava acesso aos aposentos.
Dispensei os homens e logo Hannah apareceu, arfando de
cansaço.
— Esse castelo precisa de elevadores urgentemente —
resmungou.
— Quando casar comigo, pode fazer a reforma que quiser.
Vamos!
Segurei sua mão e praticamente a arrastei pelo resto do caminho.
Meu coração saltitava no peito, ansioso porque finalmente seguraria
minha filha nos braços e a protegeria de tudo e todos. Hannah apertou
minha mão, notando a ansiedade me dominando.
Entramos no aposento que eu visitara poucas vezes. O quarto se
destacava pelo tom dourado, desde a pintura, adornos na parede,
móveis, roupa de cama e cortina; o tapete que cobria todo o piso era
vermelho e alguns detalhes em dourado também, e um lustre enorme
de cristal pendia do teto. Na parede ao lado da cama, havia um quadro
enorme da rainha Cristal vestida de noiva e na parede oposta tinha um
quadro com o rei e a rainha segurando seu filho. Eu não gostava de ver
essa imagem, pois me remetia à família perfeita que nunca tive.
— Pode me dizer em qual lugar ela está? — Hannah perguntou,
seu olhar vagando pelo quarto. — Não há nenhuma outra porta aqui.
— Quando o castelo foi construído, fizeram essa torre para
proteger a família real em caso de algum ataque. Neste quarto tem uma
passagem que dá acesso ao ponto mais alto, e ninguém além da
família real sabia como entrar lá. Se Sophia disse que ouviu o choro
daqui, só pode ser dessa sala secreta.
— E como entramos?
— Não faço ideia. O castelo não sofre ataques há uns cem anos,
e essa sala não tem mais serventia.
— E como tia Satan sabe da existência dela?
— Meu pai pode tê-la trazido aqui quando eles namoravam, não
sei. Sem mais perguntas agora, precisamos encontrar a passagem.
— Está atrás do quadro. — Hannah apontou para a fotografia da
minha família, encarei-a em um misto de surpresa e confusão. Ela
explicou:
— Você disse que só a família real sabia a passagem, logo a
passagem está atrás da família real. É pura lógica. — Deu de ombros.
— Me ajude a tirar esse quadro.
A obedeci sem dizer nada.
O objeto era mais pesado do que imaginávamos e levou alguns
minutos para conseguir tirá-lo. Cuidadosamente, o colocamos no chão
e apertei a parede em busca da passagem.
— Mirabelle e a câmara secreta — Hannah sussurrou quando
uma porta se abriu em nossa frente.
Ela me empurrou entrando no cômodo parcialmente iluminado
pela luz que penetrava através das janelas do quarto, eu a segui. Tinha
uma escada a dois metros da porta que entramos. Conforme subíamos
os degraus, a luz diminuía e logo estava tudo escuro.
— Tem uma porta aqui — informou. — Está trancada.
Tateei as paredes em busca de outra passagem secreta. Ao
entender o que eu fazia, Hannah começou a procurar também. O
universo decidiu nos ajudar dessa vez e em pouco tempo a porta se
abriu.
Os raios de sol adentravam pelas pequenas janelas da torre,
clareando o ambiente. A sala era minúscula, se comparada aos
cômodos do castelo, e também não havia luxo, somente um tapete
empoeirado no chão e um sofá de descanso. No sofá havia uma
criança sentada, de costas para nós.
— Hailey? — Hannah chamou.
A menininha virou a cabeça e senti o mundo parar de girar.
Hannah correu até ela abraçando-a. Sussurrou algumas palavras de
conforto que eu não entendia. Estava maravilhado demais em ver as
duas juntas. Meu cérebro não enviava estímulos para qualquer lugar do
meu corpo além do coração, que batia descompassado no peito. Meus
olhos começaram a marejar de lágrimas observando Hannah pegar
nossa filha no colo e trazê-la em minha direção, ainda na entrada da
porta.
— Você precisa conhecer alguém — ela disse, parando a minha
frente.
Em meio às lágrimas, conseguia ver Hailey abraçada forte ao
pescoço da mãe captando o exato momento em que ela moveu a
cabeça e um par de olhinhos verdes me fitaram. Não lutei contra a
emoção que me dominou, levando ainda mais lágrimas a meus olhos.
O sentimento que brotou em meu peito era o mais singelo e puro que
senti até aquele dia, me arrebatando de uma maneira tão forte que me
impossibilitava de falar algo.
Contudo o silêncio foi quebrado por outra voz.
— Entregue-me a garota e ninguém se machuca. — Senti o cano
frio de uma arma tocar minha cabeça e a voz ameaçadora de
Samantha.
Meu corpo reagiu ao alerta de perigo, lembrando-me que
precisava proteger minha família. Hannah escondeu o rosto da nossa
filha na curva do seu pescoço para ela não precisar ver nada daquilo.
— Samantha... — Ergui os braços e virei-me lentamente para ficar
de frente a ela. O revólver foi apontado na minha testa. A mulher me
encarava com indiferença. Esforcei-me para manter a compostura e
negociar. — Mesmo que eu entregue a garota, você não conseguirá
fugir do castelo. Vamos criar um novo acordo, a deixarei sair livre daqui.
— O único acordo que estou disposta a fazer é que me entreguem
a garota e eu não acerto um tiro em vocês.
— Por que essa obsessão por minha filha? — Hannah se exaltou,
atrapalhando a negociação. — Você não ganha nada levando-a. Leve a
mim, que você sempre odiou.
— Hannah... — repreendi com severidade. Ela não podia dar
ideias a essa louca psicopata.— Samantha, posso lhe dar uma
passagem para qualquer lugar do mundo e dinheiro o suficiente para
ter uma vida de luxo. Abaixe essa arma e vamos conversar.
— O que eu quero seu dinheiro não pode comprar — protestou.
— Você quer a garota. Por que ela é mais importante para você
do que dinheiro e luxo?
— Ela me traz algo que não sinto há décadas: felicidade. Um
sentimento que já foi roubado de mim muitas vezes, e não vou aceitar
perdê-lo de novo.
Por um instante identifiquei aflição no seu rosto, ela também notou
sua fraqueza e reagiu apontando a arma para Hannah.
— Chega de conversa. Entregue-me a garota ou irei atirar na sua
querida Cris... Hannah.
A mulher estava fora de si. Coloquei-me na mira da arma, no
intuito de ser um escudo para as duas atrás de mim. Eu morreria antes
de deixar algo acontecer com elas.
— Pense um pouco, Samantha. Se atirar, os guardas vão correr
para cá e você será presa antes de deixar os aposentos do rei. Mas se
abaixar a arma, tem a minha palavra que sairá livre daqui.
— Não teremos acordo. — Ela engatilhou o revólver, apontando-o
para minha cabeça. Fechei os olhos, aguardando o meu fim.
— Espere! — Hannah gritou. — Não machuque o príncipe, eu a
entrego para você.
— Não faça isso — grunhi.
A teimosa não me ouviu e caminhou na direção da tia,
estendendo nossa filha para aquela louca. Chorando, Hannah implorou
para que cuidasse bem da Hailey. Meus olhos não conseguiam
acreditar que ela estava dando a menina como se fosse um objeto.
Samantha usou o braço livre para pegá-la e neste instante,
enquanto estava distraída com a criança, vi um homem aparecer na
porta ainda aberta e agarrar o braço com a arma, desarmando-a em um
milésimo de segundo.
Hannah tomou nossa filha dos braços da tia, enquanto Jake
segurava as mãos de Samantha para trás do corpo, prendendo-a.
— Cheguei no castelo e Sophia me contou onde vocês estavam
— informou. — Ela está bem?
— Agora sim — Hannah respondeu e finalmente voltei a respirar,
correndo para abraçá-las.
Capítulo Trinta e quatro
Trinta e quatro
Parece que conseguimos
Veja quão longe chegamos, meu querido
Podemos ter escolhido o caminho mais longo
Mas sabíamos que chegaríamos até aqui algum dia
You're still the one - Shania Twain
Hannah
— Isso ainda não acabou — rosnou Tia Satan, em mais uma
ameaça.
— Vou levar essa doida para um calabouço — Jake disse.
— Você é um trouxa, garoto. Eu sei que ama a Hannah e mesmo
assim ajuda-a a ficar com outro. Me solte e eu cuidarei para deixar o
caminho livre para você.
Os braços de Andrew, que me envolviam num abraço, se
tensionaram com a menção de Jake sentir algo por mim e minha tia
usar isso contra nós. A megera sabia reconhecer as fraquezas de cada
pessoa para usar em manipulação. Foi assim comigo, com Andrew e
agora tentava o mesmo com Jake.
— Nem todo mundo é egoísta como você — rebateu meu amigo,
não caindo nas artimanhas dela. — Agora, fique calada ou colocarei um
pedaço deste tapete sujo na sua boca.
Tia Satan tinha conseguido irritá-lo e sem nenhuma delicadeza,
ele a arrastou para fora da sala sob resmungos e ameaças.
Andrew soltou-nos do seu abraço, acariciando os cabelos da
Hailey, que estava sonolenta agora que estava segura em meus
braços.
— Você acha que Samantha pode manipulá-lo? — perguntou o
príncipe.
— Ele é a pessoa mais leal que conheço, confio de olhos
fechados. Esteve comigo todos esses anos e nunca nos deixou na mão
— defendi. — Vocês deveriam voltar a ser amigos.
— Não tenho maturidade para ser amigo de alguém que deseja
minha mulher.
A frase enviou arrepios por meu corpo inteiro.
— Só de lembrar dele te beijando, tenho vontade de colocá-lo na
mesma cela que sua tia.
— Não culpe o Jake, fui eu quem o beijei. — Não resisti a
provocá-lo com um pouco de ciúmes. Eu o tinha visto quase se casar
com outra, ele merecia sofrer um pouco também.
— Você está estragando nosso momento família com esses
detalhes desnecessários — comentou carrancudo.
— É divertido vê-lo com ciúmes, mas você está certo, temos que
cuidar da Hailey agora.
— Vamos levá-la para o meu quarto?
Concordei sem hesitar. Não sabíamos nem um terço do que
Hailey tinha passado durante o sequestro e precisávamos cuidar dela.
Andrew segurou minha mão livre me fazendo algumas perguntas sobre
quais comidas pedir para os empregados levarem ao quarto e qualquer
outra coisa que nós duas precisássemos. Sua preocupação era fofa.
— Só precisamos de uma boa refeição e, se for possível, uma
roupa limpa — respondi.
Ele deu a ordem a primeira funcionária que encontramos,
assustando a coitada quando mandou ela se apressar, pois era uma
urgência. Eu apenas sorri quando vi a mulher saindo correndo, toda
desconcertada. Em outra ocasião teria reclamado dos seus modos,
porém sentia-me feliz demais por finalmente estar com a Hailey que
deixei passar.
Não conversamos muito no caminho até seu quarto para não
despertar nossa filha. Quando chegamos no corredor dos seus
aposentos, meu coração se agitou, relembrando memórias de um
passado que já não parecia tão distante, e a maioria das lembranças
daquele lugar eram alguns amassos nas paredes. Pensar nisso fez
meu rosto esquentar.
Como se pensasse o mesmo que eu, Andrew sussurrou:
— E foi aqui que começamos a fazer nossa linda princesa.
Ignorar seu comentário foi a escolha mais sensata a tomar.
Andrew abriu a porta do seu quarto e foi como voltar três anos no
tempo. Nada parecia ter mudado ali. As paredes tinham os mesmos
tons de marrom, as cortinas eram brancas, os móveis eram os mesmos
e a cama enorme, que dividimos por várias noites, ainda estava no
mesmo lugar.
Com cuidado para não despertar minha pequena, soltei seus
bracinhos que rodeavam meu pescoço, a colocando sobre a cama.
Hailey se mexeu, ajeitando sua posição e se deitou de lado abraçando
um travesseiro, como fazia com seu ursinho preferido. Antes de cobri-la
com um cobertor, chequei seu corpo em busca de algum sinal de maus
tratos, porém não havia um arranhão ou machucado sequer.
Surpreendentemente, tia Satan cuidara bem dela.
— Ela é tão perfeita — Andrew sussurrou, se pondo ao meu lado.
Sua mão pousou nas minhas costas. Quando o olhei,
identifiquei um certo medo em sua expressão. Logo deduzi o que se
passava em sua mente.
— Só precisa ser você mesmo e ela vai amá-lo — garanti, afinal
sou a prova viva que é impossível não amar aquele príncipe idiota.
— Confesso que estou um pouco inseguro.
Andrew me puxou para longe da cama, nos deixando de frente a
janela que tinha uma vista perfeita dos jardins do castelo. Ele ficou
atrás de mim, seus braços me envolvendo em um abraço forte. Senti o
tempo congelar durante os minutos que ficamos ali em silêncio,
aconchegados no corpo um do outro.
— Todos esses anos sonhei em voltar para você, mas nunca tive
coragem — comentei, sem aguentar todo aquele sentimento preso em
mim há tanto tempo.
Andrew me apertou ainda mais beijando meus cabelos.
— Chega de arrependimentos, vamos recomeçar nossa história a
partir de hoje. — Ele afastou meu cabelo para o lado, deixando o
pescoço livre e não teve um pelo do meu corpo que não se arrepiou
quando seus lábios tocaram minha pele ali. Malditos anos de seca, que
me faziam querer tirar a roupa para sentir seus beijos em mim toda.
Apesar do desejo, lembrei que tinha uma criança no mesmo
ambiente que nós.
— Teremos muitos problemas daqui para frente — mudei o
assunto, sabendo que a frase interromperia sua tentativa de me
seduzir. Estava enganada.
— Eu considero um grande problema Hailey não ter um
irmãozinho, podemos começar resolvendo esse. — Andrew apertou
seu quadril contra minha bunda e senti sua rigidez.
— Pode parar de tentar me levar para cama! Antes de querer
outro filho, nós precisamos resolver o escândalo que teremos com a
Hailey — lembrei-o.
— Vou ter que me acostumar com banhos frios outra vez —
resmungou baixinho. — Mas você tem razão. Convocarei os
conselheiros para avisar-lhes que pretendo revelar tudo e tentar
conseguir o apoio deles, será mais fácil se estiverem ao meu lado.
Enquanto Andrew falava, vimos uns sete carros pretos chegando
ao castelo e vários homens fardados saindo de dentro deles.
— Os guardas chegaram do hospital — declarou. — E já que você
insiste tanto em resolver problemas, preciso falar com Grant para
investigarmos quem deixou Samantha entrar no castelo. — Fez uma
pausa e pensou mais um pouco, antes de prosseguir. — E avisar aos
empregados para não levarem nenhuma fofoca sobre a Hailey para
além dos nossos muros.
Ele girou meu corpo e sua boca alcançou a minha antes que eu
pudesse protestar. O beijo foi rápido, apenas nossos lábios se tocaram
e ainda assim quase derreti em seus braços. Senhor, dai-me forças
para não agarrá-lo.
— Prometo voltar o mais rápido possível — garantiu. — Sinta-se
em casa.
Segurou meu rosto entre as mãos dando um último beijo rápido.
Quando Andrew se foi, voltei minha atenção para Hailey, ela ainda
dormia tranquilamente.
Enquanto a observava, a preocupação voltou mais forte. Apesar
de estar segura conosco agora, as experiências pelas quais passou
poderiam provocar algum trauma. Talvez ela precisasse de anos de
terapia para se recuperar e voltar a ser a mesma de sempre.
Sentei-me ao seu lado e rapidamente o cheiro do Andrew nos
lençóis invadiu minhas narinas. Como uma adolescente boba e
apaixonada, peguei um travesseiro inspirando o perfume amadeirado
do seu dono cravado ali. Como não resistir àquele homem se até o
cheiro dele me trazia uma sensação de paz e desejo ao mesmo tempo?
— Mamãe... — Hailey despertou, me pegando no flagra.
— Oi, minha princesa. — Larguei o travesseiro abrindo meus
braços quando ela se aproximou para me abraçar.
— Senti sadade — disse, agarrando forte o meu pescoço.
Lágrimas brotaram nos meus olhos, um misto de felicidade por tê-
la comigo e culpa por ela ter passado por tanto sofrimento.
— Eu também senti muitas saudades, mamãe nunca mais vai
deixar você. — Acariciei seus cabelos bagunçados, para convencer
meu cérebro que a tinha comigo de novo. — Você está bem?
— Fominha.
Ela se soltou do meu abraço, ficando em pé na cama, passando a
mão na barriga.
— Já, já sua comida vai chegar, enquanto isso vamos tomar um
banho cheio de espuma e bolhas? — Andrew tinha mandado eu me
sentir em casa, sem dúvidas o obedeceria.
Hailey concordou com o banho e se animou muito, pulando sobre
a cama. Felizmente, seu espírito não tinha mudado nada, ela
continuava sendo uma garotinha alegre.
De repente, ela parou de pular e olhou ao redor do quarto, se
dando conta do lugar desconhecido.
— Onde é aqui?
— Estamos em um castelo.
Seus olhinhos verdes se arregalaram em surpresa.
— Tem plicipe?
— Tem sim, você gostaria de conhecê-lo?
Ela gritou sim repetidas vezes e voltou a pular na cama. Não a
repreendi, Andrew que aguentasse seu colchão virando pula-pula.
— Ele vai chegar daqui a pouco e você precisa estar limpa para
conhecê-lo, vamos para o banho? — Levantei da cama e ela pulou em
meus braços.
Enquanto a levava para o banheiro, Hailey me encheu de
perguntas.
— Cadê tio Jeika?
— Ele está louco de saudades e logo estará aqui.
— E tio Edi?
— Também virá.
— E tia Sam? — Me surpreendi com sua pergunta.
— Você gosta dela? — Hailey assentiu.
— Ela me savou do home mau — respondeu.
— Você estava com ela esse tempo todo? — Assentiu
novamente.
— Despos do home mau me pega, ela me condeu.
Precisei de um esforço extra para entender sua frase.
— Quem estava com você nesse esconderijo?
— Evie, num gosto dela.
— Você lembra como ela é?
Como Hailey gostava de falar, descreveu a mulher com inúmeros
detalhes. Segundo sua descrição, a mulher era velha, tinha o cabelo
"blanco e pleto", usava um vestido preto e um avental branco, e a
característica mais importante: um pontinho pleto peto da boca.
— Só um minuto. — Coloquei-a de volta na cama, peguei o
celular e liguei para Michael. Em meio a toda confusão, não sabia onde
tinha colocado o ponto eletrônico minúsculo, e o hacker era a única
pessoa que podia ligar sem medo da chamada ser rastreada.
Quando atendeu, contei que estávamos com Hailey e passei a
descrição da empregada que estava com ela. Michael garantiu que
informaria a Grant e avisou que ele e Ed estavam chegando ao castelo.
Os dois viviam muito grudados recentemente.
Após encerrar a chamada, voltei minha atenção para Hailey e a
levei para o banheiro.
Ela se divertiu muito, brincando com a espuma formada dentro da
banheira. Em um dado momento, cansou de brincar sozinha e começou
a jogar espuma em mim.
Eu não teria forças para reclamar com ela nem tão cedo e por isso
decidi entrar na sua brincadeira, jogando espuma no seu rosto. Ela,
nada vingativa, não parou até eu estar coberta de espuma dos pés à
cabeça.
Acabei entrando na banheira também, pois já estava toda
ensopada e precisava de um banho. A guerra de espuma continuou.
Minha pequena gargalhava sem parar, fazendo-me perceber como
meus últimos dias tinham sido tristes sem sua presença.
— Hannah... — A porta do banheiro se abriu e a voz preocupada
de Andrew invadiu o ambiente. Seu olhar recaiu sobre nós e um lindo
sorriso brotou em seus lábios ao ver apenas as nossas cabeças cheias
de espuma para fora da banheira.
— Eu não as vi no quarto e pensei que alguém as tinha levado,
mas vejo que estão bem. Perdão por entrar assim e atrapalhá-las. —
Saiu fechando a porta atrás de si, gritando logo em seguida:
— A comida chegou, tentem se apressar.
— Vamos terminar o banho e conhecer seu pa... o príncipe?
Hailey respondeu jogando espuma para cima. Terminamos o
banho e procurei toalhas no armário embaixo da pia. Além delas,
encontrei um roupão azul marinho e o vesti, já que minha roupa tinha
molhado. A peça era um pouco maior que eu e o tecido quase
arrastava no chão, mas a pior parte era o perfume do Andrew mais uma
vez inebriando minha mente.
Ajudei Hailey a se secar, penteei seus cabelos e depois o meu.
Deixei-a enrolada na toalha enquanto fui para o quarto ver se a
empregada tinha conseguido alguma roupinha para ela.
— Eu mandei buscar uma roupa para você também, mas creio
que vou cancelar o pedido. Você está perfeita assim!
O príncipe estava sentado na cama, seus olhos fixados em mim.
Meu rosto esquentou e desviei o olhar pelo quarto, procurando a roupa
da Hailey. Encontrei o pacote sobre uma mesinha, onde estava servida
uma refeição suficiente para matar a fome de cinco pessoas, peguei-o
e corri de volta ao banheiro.
Voltamos ao aposento após tê-la vestido. O vestidinho branco
cheio de babados serviu quase perfeitamente nela, só ficara um pouco
folgado.
Andrew continuava sentado na cama e se levantou ao nos ver. A
postura dele tinha mudado totalmente nestes poucos minutos, agora
ele parecia nervoso.
— Olá, Hailey — disse, se aproximando. — Sou o príncipe
Andrew. — Estendeu a mão para cumprimentá-la.
— Vouxe é mesmo um plicipe? — questionou Hailey, observando-
o com curiosidade e colocou sua mãozinha sobre a dele.
Andrew se curvou para beijá-la ali.
— Sou sim, depois eu posso mostrar minha coroa se quiser.
— Eu tabem tenho uma coloa, ficou lá na casa ates do aviaum.
— Ela quis dizer que ficou na nossa casa da França — expliquei,
diante do semblante confuso de Andrew.
— Você não precisa mais dessa coroa, podemos conseguir uma
nova aqui e ainda mais bonita!
Hailey me fitou, seus olhinhos brilhando de empolgação.
— Pode, mamãe?
— Pode sim, mas antes de pegar coroas, mamãe tem uma
história para lhe contar. — Segurei-a nos braços e a levei até a cama.
O príncipe me olhou em pânico e perguntou "Agora?" só movendo os
lábios.
— Hitolia de que? — Diferente dele, nossa filha se animou.
Hailey e eu sentamos na cama, enquanto Andrew permaneceu de
pé ao meu lado.
— De uma princesinha que não conheceu seu papai — informei.
Ao invés de jogar a bomba e dizer "ele é seu pai", narrei uma
versão adaptada da minha história com Andrew, envolvendo elementos
dos contos de fada que ela assistia para ajudá-la a entender.
Em resumo, contei que namorava um príncipe e uma bruxa
malvada tinha lançado um feitiço e nos separado por anos, nesse
tempo eu tive uma bebê e ela não pôde conhecer o pai, pois a bruxa
não deixava eles se aproximarem, mas uma fada madrinha tinha
quebrado o feitiço e agora nós três podíamos ficar juntos.
— Vouxe é meu papai?
O príncipe sentou na cama ao seu lado e assentiu, segurando as
lágrimas. Hailey, por outro lado, estava interessadíssima com a história.
Eu só os observava, com o coração quase saindo do peito de tanta
emoção por finalmente vê-los juntos.
— Vouxe e mamãe vaom casá? — Ela tinha herdado o lado direto
do pai, sem dúvidas.
— É meu maior desejo e você pode me ajudar a convencê-la se
casar comigo.
— Tio Edi diz que ela plesissa de um namoado pla tila a teia de
alanha — fofocou e Andrew caiu na risada.
Eu memorizei que precisava matar o Ed lentamente por ter dito
isso na frente da menina.
— O tio Ed estava falando das teias que tem na casa dele e não
conseguimos alcançar para limpar — expliquei.
— Creio que eu sou grande o suficiente para tirá-las — respondeu
o príncipe me encarando. O idiota só era lerdo para assuntos
importantes, duplo sentido ele entendia.
— Se vouxe casá com minha mamãe, vai mola com nós?
— Vou sim, se vocês quiserem podem vir morar aqui no castelo.
— Andrew voltou sua atenção para Hailey.
— E tio Jeika?
— Ele pode morar conosco também, temos muitos quartos. —
Quase gargalhei da cara dele se esforçando a dizer aquelas palavras.
— Tio Edi também? Ele faz boulo de colate.
— Você pode convidá-lo, mas temos cozinheiras aqui no castelo
que podem fazer quantos bolos você quiser.
O príncipe tentava impressionar a criança e estava conseguindo.
Ela continuava suas perguntas querendo saber se teria um quarto
próprio, se poderia trazer seus brinquedos, se teria uma mesa de chá, e
nunca recebia um "não". Não duvidava que se ela pedisse um foguete,
ele diria que ia conseguir.
Resolvi me meter na conversa quando ouvi o pai coruja prometer
criar uma piscina no jardim.
— Tem alguém com fome?
— EU! — Hailey se levantou e pulou mais sobre a cama. Andrew
sorria feito criança olhando-a com devoção.
— Posso ajudá-la, minha princesa? — Se ofereceu para pegá-la
no colo.
Ela aceitou prontamente e só percebi que chorava com a cena,
quando nossa filha perguntou se eu estava triste.
— Não, não. Nunca estive mais feliz na vida — respondi.
Capítulo Trinta e cinco
Trinta e cinco
Prometo que ficarei aqui até de manhã
E te pegarei quando você estiver caindo
Quando a chuva ficar forte
Quando você já estiver cansada
Eu te levantarei do chão e te consertarei com o meu amor
My only one – Sebastian Yatra Feat. Isabela Moner
Andrew
Embora meu desejo fosse permanecer o resto do dia ao lado de
Hannah e Hailey, não demorou muito para as responsabilidades do
reino me chamarem e eu precisar deixá-las. As duas ficaram na
companhia do Ed, que tinha chegado ao castelo poucos minutos antes
e tinha se juntado a mim para babar a criança.
— Vocês têm que aprender a dizer não! Se ela crescer uma
garota mimada, eu matarei os dois — Hannah tinha ameaçado em um
certo momento quando estávamos todos sentados no chão, planejando
uma viagem à Disney.
— Inclua meu nome na sua lista negra também.
— Tio Jeika! — Hailey gritou ao ouvir a voz de Jake e correu em
direção à porta.
Ele se abaixou para pegá-la e girou com ela em seus braços. O
som da risada infantil invadiu o ambiente.
Um sentimento desagradável surgiu em mim, era um pouco de
ciúmes por ele ter estado presente nos momentos importantes da vida
dela, e algo além disso. Um receio de não ser capaz de substituir a
figura paterna que ela tinha do Jake.
—Vejo que já conheceu o príncipe, gostou dele? — ele perguntou,
notando meu desconforto.
— Siiiiiiiim! — respondeu animada, fazendo meu peito derreter.
— Mamãe vai casa có ele.
— Andrew conquistou mais uma aliada para seus planos —
comentou Ed.
— Então você será oficialmente uma princesa! — Se Jake não
gostou da notícia, não demonstrou. — Eu posso ser seu guarda para
protegê-la das bruxas e de príncipes babacas?
Hailey assentiu e o abraçou.
Apesar do ciúme ainda estar ali, senti mais afeição por Jake. Ele
não tentaria pegar meu lugar como pai da Hailey ou marido da Hannah.
Sua lealdade que eu conhecia anos atrás continuava a mesma e talvez
eu reconsiderasse nossa aproximação, para a felicidade das duas que
o amavam e para a minha também.
Cerca de cinco minutos após a chegada de Jake, nós dois
precisamos sair. Eu para uma reunião com os conselheiros e ele para
ajudar Grant com o interrogatório da empregada que prendemos, a fim
de encontrar outros cúmplices de Samantha dentro do castelo.
Ganhei um abraço tão apertado da minha filha, que quase desisti
da reunião para ficar ali. Acabei demorando mais um minutinho
abraçando-a e Jake saiu antes de mim.
Quando saí, Hannah me acompanhou até o corredor, fechando a
porta atrás de si. Entendendo que ela queria um momento a sós
comigo, dispensei os dois guardas que vigiavam o quarto.
— Eu sabia que você não resistiria mais tempo sem me beijar —
provoquei, passando um braço em volta da sua cintura.
— O quê? Não! É um assunto sério, Andrew. — Me empurrou. —
Se tia Satan estiver dizendo a verdade, nós somos primos.
Não fazia questão de gastar meus neurônios para lembrar do
detalhe abominável de ser filho de Samantha.
— Você realmente acredita nela?
— Não sei, a história dela faz um certo sentido. Sabemos que ela
causou o acidente da rainha Cristal, e se o príncipe realmente estivesse
lá? Minha tia pode ter arquitetado tudo para o filho dela chegar ao
trono. — Seus olhos estavam marejados quando me encarou. —
Precisamos saber a verdade.
Hannah não precisou dizer em palavras para eu compreender que
se fôssemos primos, não poderíamos ficar juntos. Quis argumentar
sobre a realeza ter se casado com parentes por séculos e que o
estrago já havia sido feito por termos uma filha, porém desisti, qualquer
argumento seria o mesmo que aceitar ter algum parentesco com aquela
louca assassina. Eu me recusava a acreditar.
— Vou providenciar um teste de DNA com urgência para nós dois
e ver o que consigo extrair dos conselheiros mais antigos. Algum deles
deve saber se sou um bastardo.
— Espero que seja só mais uma mentira dela — Hannah disse
antes de me abraçar forte.
Apertei-a em meus braços, deixando a paz que ela trazia acalmar
minha mente. Meus sentimentos por aquela mulher eram complexos
demais para buscar entender. Passamos três anos separados e o amor
que eu sentia não diminuiu. Era como uma lâmpada apagada durante
um tempo que quando alguém aperta o interruptor ela volta a brilhar
como antes.
— Independente do que venhamos a descobrir, saiba que sempre
amarei você. — Beijei seus cabelos e logo em seguida Hannah me
encarou, com um pequeno sorriso nos lábios.
— Também já aceitei que nunca vou deixar de te amar — disse
timidamente.
— Você não pode dizer isso e esperar que eu não te beije. —
Toquei seu queixo, erguendo-o para beijar seus lábios.
Meu coração saltitava no peito mais que Hailey pulando no meu
colchão.
— Vá para a reunião e me traga boas notícias, que prometo te dar
mais que beijos.
Praticamente corri para a sala de reuniões, disposto a ter a
reunião mais rápida da história da humanidade. Hannah sabia como me
deixar louco. Com apenas poucas palavras me transformou em um
devasso ansioso para tê-la outra vez.
Para dissipar meus pensamentos do corpo dela suando embaixo
do meu, comecei a enumerar os problemas do reino, e eram tantos que
foi o suficiente para acabar com a ereção que tive.
O resgate da Hailey tinha exigido minha total atenção e
negligenciei por completo as outras adversidades. Ainda tínhamos que
resolver a questão do rei Eros e a aliança com seu país. Se
comprovado que ele não teve envolvimento no acidente e o acusamos
falsamente, perderíamos forças entre os demais reinos, e também seria
motivo para Lorena declarar guerra à Mirabelle. Como se não fosse
desgraça o bastante, ainda tinha as acusações da tia de Hannah que
poderiam causar outra guerra, só que dentro de Mirabelle.
Ao chegar na sala, os 18 conselheiros estavam reunidos e todos
se levantaram para me cumprimentar. Sentei-me no assento destinado
ao rei e os encarei, um por um.
— O que sabem sobre Samantha Price?
As reações foram as mais diversas possíveis. Olhares de
curiosidade, desinteresse e surpresa foram lançados para mim. Alguns
dos homens eram velhos o bastante para estarem no cargo desde a
época do meu avô, e foram nesses que eu concentrei minha atenção.
— Aguardo uma resposta — comentei diante do silêncio.
— Eu não faço ideia, mas sinto que teremos grandes revelações
aqui — respondeu Logan, o conselheiro mais jovem. Ele era poucos
anos mais velho que eu e tinha herdado o título de duque há dois anos,
após a morte do pai.
— Samantha teve um relacionamento amoroso com meu pai, na
época que ele ainda era um príncipe — expliquei. — A jovem era filha
de uma empregada e parece que meu avô não era a favor do namoro
dos dois. Algum de vocês se recorda?
— Por que estamos falando sobre isso quando temos problemas
maiores? — indagou o general com a frieza de um militar.
— Creio que Samantha é responsável por 80% dos nossos
problemas atuais. — Surgiram vários questionamentos e dúvidas, uma
voz por cima da outra, e era impossível ouvir alguém. Levantei-me do
assento e imediatamente todos se calaram para me observar. — Eu
descobri que Samantha causou o acidente da rainha Cristal.
— Impossível, não foram encontrados vestígios de sabotagem —
rebateu o general Dudley.
— Oliver Morris, detetive da família real, estava envolvido com ela
todo esse tempo e creio que ele também incriminou o rei Eros no
acidente do meu pai.
— Ele é inocente? Diabos! — praguejou o duque Lansdale, um
homem de quarenta anos. — Dudley, prepare suas armas para a
guerra.
— Eros pode ser inocente desse crime, mas fez parte do
sequestro da princesa. — Diante dos olhares confusos, acrescentei: —
Minha filha.
— Ela não é uma princesa.
— Eu quem decido isso, conde Rathbone — contestei. — Porém
este não é o assunto do momento, preciso que me digam tudo o que
sabem sobre Samantha Price.
Aguardei pacientemente dois minutos de silêncio, até a primeira
pessoa se manifestar.
— Nossa honra nos proíbe de revelar os segredos da realeza,
mas abrirei uma exceção somente porque ela tentou assassinar o
nosso rei. Saiba que permaneço leal a minha palavra, Alteza.
Assenti para Rathbone. Ele era o mais velho entre os conselheiros
e tinha a mente muito fechada para diversos assuntos, apesar disso era
um homem totalmente fiel à coroa.
— Samantha Price engravidou do rei, na época apenas príncipe
Dominic. Seu avô descobriu e não aceitou que ele casasse com alguém
de classe inferior, principalmente quando ficou doente. O príncipe
precisaria de uma esposa para ajudá-lo a governar, e o rei acreditava
que a filha de uma empregada nunca poderia ser uma rainha. Então
tomou a decisão para evitar um bastardo, fazendo a moça abortar o
bebê.
— O aborto foi realizado? — perguntei. A história de Samantha
até agora se confirmava.
— Não, ela conseguiu escapar da clínica.
— Onde está a criança? — indagou Logan, pois eu não tive
coragem de fazer a pergunta.
— O rei tinha deixado suas ordens bem claras: a criança não
podia viver. Vejam bem, não sou a favor de bastardos na família real,
porém jamais aceitaria o assassinato de alguém, sobretudo de um
bebê.
— Vá direto ao ponto: a criança sobreviveu ou não? — indaguei,
impaciente.
— Samantha voltou ao país depois que o rei morreu, mas ele
tinha deixado pessoas responsáveis para caçá-la e mataram a
menininha no dia que ela nasceu.
O silêncio voltou a reinar na sala. Esqueci-me das histórias por
um momento e pensei na criança, minha irmã, sendo assassinada logo
ao nascer, talvez nem tenha chegado a abrir os olhos e ver o mundo
pela primeira vez. Fiquei imaginando se ela tinha olhos verdes iguais
aos meus e se seu sorriso seria igual ao do meu pai.
Nesse momento me passou pela cabeça que Samantha devia ter
visto em Hailey sua filha assassinada. Explicaria sua obsessão doentia
por ela.
— Espero que essa história nunca saia daqui, nem o próprio rei
Dominic sabe disso — acrescentou o conde e todos assentiram.
— Recapitulando a história: mataram a filha dessa Samantha e
ela resolveu se vingar matando a rainha Cristal e tentou matar o rei
também? Que mulher vingativa — comentou Logan, trazendo-me de
volta ao momento.
— Ela também se envolveu com rei Eros para me casar com a
Sophia e sequestraram minha filha para garantir isso. Eles deviam ter
um plano para tomar o poder de Mirabelle, mas ela se revoltou contra
Eros e o acusou durante meu casamento.
— Onde está essa desgraçada? Vamos prendê-la e arrancar
informações sobre esse rei maldito — vociferou o general Dudley.
— Ela, Morris e outros cúmplices já foram presos. No entanto, ela
tem informações sobre a minha filha e ameaçou... — Minha fala foi
cortada pela porta da sala se abrindo abruptamente.
— Hailey está em todos os jornais — Hannah esbravejou,
entrando no local.
Levantei-me e caminhei rapidamente em sua direção, com os
nervos à flor da pele, ela estendeu o celular e li a manchete do site:
Princesa escondida: Príncipe Andrew esconde filha por dois
anos!
— Como eu ia lhes dizendo, senhores, ela ameaçou revelar que
tenho uma filha fora do casamento.
Capítulo Trinta e seis
Trinta e seis
Eu preciso de você, querido
E se estiver tudo bem
Eu preciso de você, querido
Para aquecer as noites solitárias
Can't Take My Eyes Off You - Frankie Valli
Hannah
Diversos palavrões foram exaltados quando Andrew lhes deu a
notícia. Ver a reação dos homens deixou-me insegura com o que
estava por vir. De todo modo, tia Satan cumpriu sua ameaça de falar
sobre Hailey. Eu não podia mais fugir de Mirabelle e escondê-la pelo
resto da vida. Só restava-me encarar a realidade e aqueles lordes
enfurecidos.
— Agradecemos a notícia, agora pode se retirar. Temos assuntos
importantes a discutir — disse um dos conselheiros mais idosos.
— Eu ficarei! — Meu tom soou um pouco mais afrontador do que
eu gostaria. Não queria briga com eles, porém se a discussão era sobre
a minha filha, nem o rei me tiraria dali.
Andrew me olhou com a testa franzida, refletindo se permitiria
uma intrusa na reunião do conselho. Antes que ele pudesse protestar
me mandando embora, me apressei em dizer apenas para ele ouvir:
— Se você quer mesmo que eu seja sua esposa, precisa me
deixar estar presente nas decisões do reino, sobretudo às que se
referem a nossa família.
— Você está tentando me manipular, querida? — indagou, com
uma falsa expressão de ultraje. — Temo que eu vá enfrentar grandes
apuros futuramente se não aprender a lhe dizer não.
Andrew se voltou para os conselheiros e anunciou:
— Senhores, esta é Hannah Price, mãe da minha filha, e estará
conosco na reunião.
— Na última reunião ela não era uma empregada? — indagou o
homem mais jovem.
Ninguém lhe respondeu, pois todos me encaravam como uma
aberração, um ser de outro planeta. Podia sentir os olhares de
julgamento sobre mim, certamente pensavam que eu era uma
interesseira ou golpista.
Percebendo meu desconforto, Andrew pousou a mão em minhas
costas me guiando até uma cadeira no assento oposto ao do rei.
Hesitei por um segundo, entendendo a posição na qual ele estava de
colocando.
— Se não sentar, vou colocá-la no meu colo — sussurrou o
príncipe próximo a meu ouvido, provocando um arrepio em meu corpo.
Com toda a atenção que os conselheiros destinavam a mim,
certamente viram meu rosto ficar vermelho. Inspirei fundo para me
recompor. Péssima decisão, pensei assim que minha bunda alcançou o
assento e inúmeros questionamentos se voltaram para mim.
"Por que diabos você escondeu a criança até agora?", "Onde está
o teste de DNA para comprovar que o príncipe é o pai?", "Qual sua
relação com Samantha Price?". Foram algumas das perguntas que
consegui entender.
— Silêncio — pediu o príncipe e todos obedeceram. — Ouçam
nossa história antes de qualquer julgamento.
Andrew, que estava de pé ao meu lado, contou sobre o momento
que nos conhecemos na escola, o baile, minha relação com Tia Satan e
os motivos pelos quais me trouxe para morar no castelo anos atrás.
Tive vontade de criar um buraco na mesa para enfiar minha cabeça
quando ele disse que me apaixonei por ele antes mesmo de saber
sobre o seu título e que nunca tinha me importado com ele ser um
príncipe ou não.
A fim de acabar com o constrangimento de ouvi-lo falar sobre mim
como se eu não estivesse ali, decidi continuar a narração falando sobre
a conversa que ouvi de alguns deles com rei Dominic, o que me levou a
ir embora de Mirabelle, sobre a descoberta da gravidez e porque decidi
esconder a Hailey.
Ao final da história, a maioria dos olhares eram mais
compreensivos, e arriscava dizer até que dois ou três me olhavam
admirados.
— Lembro de ter tentado convencer rei Dominic a lhe mandar
embora para salvar o reino e ele se recusou, dizendo ser escolha do
príncipe — comentou um homem bonitão. Ele tinha a pele morena, a
cabeça quase careca e músculos que deveriam ser assustadoramente
rígidos sob o terno.
— Na verdade, a decisão cabia a mim também. Andrew não se
casaria com a princesa Sophia enquanto eu estivesse aqui, então fui
embora para ele fazer o certo e salvar o reino.
— Hannah tomou a decisão que achou certa naquele momento
para ajudar Mirabelle, mesmo sacrificando nossa felicidade — o
príncipe acrescentou. — Meu pai sempre diz que um bom governante é
aquele que coloca as necessidades do povo acima das suas, Hannah
já fez isso pelo nosso país e confio plenamente que faria de novo se
necessário. Como ela é a mãe da minha filha e enxergo nela força e
inteligência suficiente para ser rainha algum dia, além de ser a mulher
que sempre amei, gostaria de saber se algum de vocês se opõe ao
nosso casamento.
Quis levantar e gritar "EU". Ora, ele nem tinha me feito um pedido
decente! Guardei meu protesto para um momento em que
estivéssemos a sós.
— Tenho mil e um motivos para ser contra isso — contestou o
senhor mais velho, que tinha o sobrenome parecido com rato-alguma-
coisa. — Entretanto, como esta é a única maneira de legitimar a criança
e evitar mais bastardos, o casamento tem minha benção.
— Acredito que o príncipe irá se casar independente das nossas
opiniões, então não vejo o porquê ser contra ou a favor — disse o
moreno gato. — Contudo, o matrimônio não será suficiente para
apaziguar o escândalo.
— Por isso contarei a verdade ao nosso povo — Andrew declarou,
com confiança. — Deixarei-os cientes das ameaças que minha família
vinha sofrendo e que os culpados já foram presos, além de contar
sobre Hannah e eu. — Sua mão tocou meu ombro, indicando que não
voltaria atrás em sua decisão.
— Os mirabellienses adoram uma boa história de amor, podemos
conseguir um grande apoio com o romance de vocês — sugeriu o
conselheiro jovem, o mais falante entre todos. — Eu mesmo já quero
chamá-la de minha rainha.
— Ainda me preocupo com o futuro da garota — interveio outro
homem. — Podem não aceitá-la como herdeira do trono.
— Teremos um longo tempo para fazermos o povo aceitá-la. No
momento, temos que nos preocupar em não deixar que a mídia crie
diversas histórias falsas sobre ela e o povo odeie-a antes de conhecê-
la — Com essa fala Andrew encerrou a discussão e delegou algumas
atividades aos homens.
O duque bonitão se voluntariou para chamar a assessoria de
imprensa para planejarem o anúncio da filha do príncipe e o
rompimento do casamento com Sophia, enquanto outros tomariam as
medidas para as notícias falsas serem excluídas.
Os demais conselheiros deixaram a sala, alguns espiando os
celulares para lerem as fofocas e praguejando ao verem as matérias
sensacionalistas. A esse ponto já deviam ter publicado inúmeras
atrocidades sobre nós.
— Temo que o mundo inteiro saberá que nos casaremos e eu
ainda não lhe fiz um pedido oficial — comentou ao estarmos sozinhos
no ambiente. Ele estendeu a mão para me ajudar a levantar e eu
aceitei.
— Se eu disser "não", você será humilhado mundialmente.
— Sua tia está presa, descobri que não somos primos, os
conselheiros a aprovaram como minha futura rainha e você confessou
que ainda me ama. Não tenho dúvidas que me dirá um "sim". —
Enquanto falava, Andrew guiou-me para o corredor e seguimos em
direção ao seu quarto.
— Brincadeiras à parte, a escolha é sua. — Seu tom ficou sério de
repente e um par de olhos verdes me encarou. — Acabamos de nos
reencontrar e não quero que se sinta pressionada a aceitar agora.
— Andrew — o interrompi, sem paciência para seu discurso. —
Você quer casar comigo?
— O quê? — Olhou-me confuso.
— Estou lhe pedindo em casamento, você responde sim ou não.
— Esse é meu papel, Hannah — resmungou. — Não tente
estragar o romantismo.
— Eu não quero um pedido de casamento enorme como você
deve estar planejando. Nesses três anos que passei longe, tudo que
sempre desejei foi construir uma vida ao seu lado e cuidarmos da
Hailey. Agora que nada mais nos impede de ficarmos juntos, para que
esperar?
A sua resposta foi passar o braço em volta da minha cintura e me
puxar para os seus braços ali mesmo, no meio do corredor.
— Eu só não chamo o bispo para realizar nosso casamento agora
porque temos outros assuntos a resolver, mas saiba que assim que as
coisas se acertarem, você se tornará minha esposa. — Sem dizer mais
nada, seus lábios tomaram os meus em um beijo lento e cheio de
sentimentos.
Eu jamais deixaria de amar a forma como nossos corpos se
encaixavam e como o mundo parecia parar de girar enquanto nos
beijávamos.
Infelizmente, nosso beijo não durou mais que dez segundos, pois
alguém limpou a garganta perto de nós. Um déjà vú dessa cena passou
por minha cabeça, recordando as vezes que rei Dominic nos flagrou em
momentos de pegação pelo castelo.
Virei o rosto na direção do som, ansiando em encontrar o rosto
daquele homem que tinha minha eterna gratidão.
— Havia repórteres em volta do castelo e os convidei para o
pronunciamento. Aguardam Vossa Alteza em cinco minutos na sala do
trono — informou o conselheiro. Não disfarcei minha expressão de
decepção.
— Fique com Hailey no quarto, logo, logo estarei com as duas. —
Andrew beijou minha mão e saiu junto com o homem na direção oposta
à qual eu segui.
Bônus
Promete cuidar bem dos seus cachinhos
E sempre me abraçar quando eu chegar
Promete sorrir sempre com os olhinhos
E cantar cantigas na sala de estar
Promete – Ana Vilela
Andrew
— Socorro, Hannah.
— Eu lhe disse para aprender a dizer "não" pra ela, agora sofra as
consequências — respondeu, sem um pingo de misericórdia de mim.
— Você não tem coração — resmunguei e me voltei para a
criança que me encarava esperando uma resposta. Diabos, como eu
negaria um pedido a ela?
— Minha princesa, que tal tomarmos sorvete ou um milkshake?
Podemos pedir de chocolate, morango e todos os sabores que
quisermos. — Tentei negociar e Hailey balançou a cabeça negando.
— É hola do chá.
— E que tal um chocolate quente bem delicioso?
— Naum é hola de colate.
— Péssimos hábitos que você ensinou para essa menina, Hannah
— reclamei baixinho e a maldita gargalhou.
— Você que lute, Alteza — retrucou e se abaixou, ficando da
altura de Hailey. — Mamãe precisa ir na casa do tio Ed buscar algumas
coisas suas, você quer ficar aqui com o papai?
— Siiiiim!
— Vai me deixar sozinho para enfrentar essa tortura? —
murmurei, porém estava enternecido por ela estar confortável a passar
um tempo comigo.
— Você vai sobreviver. — Hannah beijou a bochecha
rechonchuda da nossa filha e se levantou. — Aproveitem o chá, vou
pedir a alguém para levar uns três bules para vocês — disse saindo do
quarto rindo.
Desde que resgatamos nossa filha, três dias atrás, as duas viviam
no castelo. Eu queria mantê-las perto de mim e aqui elas estavam
seguras das pessoas que ainda não tinham aceitado Hailey como
princesa. Apesar de estarmos sob o mesmo teto, tive pouco tempo
disponível para passar com elas, pois vivia indo de uma reunião para
outra, oferecendo entrevistas e esclarecendo rumores sobre nós três.
Hannah me acompanhou em algumas reuniões do conselho e sempre
podia agarrá-la depois que todos iam embora.
Já com Hailey o meu contato era menor, pois quando eu acabava
as atividades do dia já era tarde da noite e ela estava dormindo. Hoje
arrumei um tempo livre e decidi me aproximar mais dela, infelizmente o
horário disponível era justo a pior hora do dia: o momento do chá da
tarde.
— Vamo? — Ela estendeu sua mãozinha para mim e em um
segundo esqueci todo o ódio que tinha por aquela bebida horrível.
Ingerir alguns goles de água suja era um preço baixo a se pagar para
me divertir com ela.
— Não quer ir escolher uma linda coroa para você? — tentei
argumentar uma última vez, pegando sua mão.
— Despôs do chá — respondeu, dando a batalha como
encerrada.
Minha princesinha não parou de falar um segundo enquanto
caminhávamos para o jardim. Certas frases eu não entendia e
concordava sem saber ao menos o que estava concedendo. Ela fazia
várias perguntas sobre tudo o que via no castelo e eu respondia
contando histórias inventadas, como a armadura de uma guerreira que
salvou a vida do rei ou a espada de um gigante que matou um dragão.
Em um certo momento, Hailey se cansou de andar e como o pai
nada babão que sou, coloquei-a sobre meus ombros. Ela se agarrou no
meu pescoço e, assim como eu, não parou de gargalhar um segundo
sequer.
Lamentavelmente, minha risada foi embora quando chegamos ao
jardim e uma mesinha já estava posta com um bule e duas xícaras,
além de biscoitos e um bolo de chocolate.
— Hola do chaaaaaaa! — gritou animada e eu respondi um
"ééééééé" sem nem um terço da sua empolgação.
Desci-a dos meus ombros e como um perfeito cavalheiro, puxei a
cadeira para ela se sentar. A altura da mesa nem chegava a meus
joelhos, as cadeiras então eram minúsculas como as do jardim de
infância. Não sei como eu, com 1,85m de altura, caberia em um
assento tão pequeno.
— Posso lhe servir, princesa?
— Sim, sim, sim!
Segurei o bule e despejei aquela água amarelada na sua xícara e
em seguida na minha. Apertei-me para sentar na cadeira a sua frente e
observei-a tomar aquilo como se fosse uma bebida saborosa.
— Vouxe naum tá bebedo — constatou.
— Estou esperando esfriar um pouco. — Assoprei o chá e minhas
narinas foram invadidas por aquele cheiro horrível
Hailey propôs um brinde e ficou me observando para averiguar se
eu beberia. A menina era esperta. Levei a xícara aos lábios e quase
vomitei ao sentir o gosto desagradável em minha boca.
— Olha uma borboleta! — Apontei em qualquer direção e quando
ela desviou o olhar, joguei o líquido na grama.
— Ah, ela voou. — Pousei a xícara na mesa para ela ver que
estava vazia. — Já bebi tudinho, estava uma delícia.
— Vo coloca mais! — Antes que eu pudesse recusar, ela já
segurava o bule e me servia.
Consegui derramar a segunda vez, no entanto não tive como fugir
da terceira, quarta, quinta e sexta... Aquele bule parecia ter 5 litros de
chá, pelo amor!
Trinta minutos depois de estarmos ali, me sentia nauseado e
prestes a vomitar.
— O que acha de irmos brincar de outra coisa agora? — sugeri,
antes que precisassem me levar ao hospital.
— Colida!
Só entendi o que ela disse quando a vi se levantar e começar a
correr pelo jardim. Provavelmente não era saudável correr após
bebermos tanto chá, ainda assim não resisti indo atrás dela.
— Eu vou pegar você!
Não demorei muito para alcançá-la. Hailey gritou quando a peguei
e começou a gargalhar.
— Mia vez, mia vez! — pediu. Coloquei-a no chão e corri
devagarinho, e em poucos segundos ela agarrou minha perna,
fazendo-me perder o equilíbrio e cair no chão.
— Peguei vouxe! — afirmou com entusiasmo, se jogando em cima
do meu peito e agarrando meu pescoço em um abraço.
Desejei ter o poder de parar o tempo para não sair daquele
momento. Aquela menininha trazia alegria para todos a sua volta e não
era diferente comigo. Mesmo que não tivesse visto-a nascer e
acompanhado seus primeiros anos de vida, o amor que sentia por ela
era intenso e verdadeiro da mesma forma, e me certificaria de não
passar mais um dia longe dela pelo resto da vida.
Capítulo Trinta e sete
Trinta e sete
E se você soltar eu flutuarei ao redor do sol
Eu sou forte porque você me preenche
Mas quando o medo vem e lentamente caio no chão
Eu sou sortuda porque você está por perto
Helium - Sia
Andrew
A semana que se passou foi um verdadeiro caos em Mirabelle.
Como imaginávamos, muitos cidadãos não aceitaram bem a história
sobre a Hailey e houve protestos por todo o país. Tivemos que pintar os
muros do castelo três vezes em sete dias, pois a palavra "bastarda" era
pichada constantemente nas paredes.
Por outro lado, surgiu um movimento progressista que lutava
contra as normas rígidas e arcaicas da realeza, acreditando que
devíamos deixar de ser um país conservador e começar excluindo a
palavra bastarda do nosso vocabulário. Hannah era uma forte
apoiadora desse grupo em questão.
Além destes, havia um terceiro grupo que causava mais dor de
cabeça que os outros dois juntos. Eram os cidadãos revoltados com os
crimes do rei Eros. Depois do anúncio da Sophia em rede nacional, não
tivemos como levar o julgamento dele em segredo e as provas que
tínhamos foram divulgadas. Desde então o povo pedia justiça e até
pena de morte, além de exigir o fim da nossa aliança com Lorena.
O ponto da aliança ainda era um assunto que causava
desavenças até mesmo entre os conselheiros. Uma parte acreditava
que devíamos mantê-la e exigir mais benefícios, a outra parte pregava
que não podíamos ter qualquer relação amigável com o reino deles.
Por esse motivo, no dia anterior tinha me reunido com Sebastian,
atual rei regente de lá, para debatermos assuntos envolvendo nossos
reinos. O príncipe me surpreendeu ao se desculpar por não ter
enxergado os planos de Eros desde cedo e pediu que fizéssemos
justiça.
— Me coloco no seu lugar e penso no que faria se alguém
sequestrasse o Ben, provavelmente não seria misericordioso. Meu pai
deve ser julgado e condenado segundo as leis de Mirabelle — dissera
em algum momento da reunião.
Depois dessa fala nosso debate seguiu para o lado político. Ele
compreendia que os mirabellienses estavam revoltados com nossa
parceria e argumentou sobre nossos países serem altamente
dependentes um do outro. Lorena estava em uma situação complicada
perante as relações exteriores. Diversos reinos queriam pôr fim às
alianças e por essa razão ele tinha me procurado, afinal se Mirabelle, o
país mais afetado por Eros, mantivesse os acordos comerciais, os
demais não teriam por que fazer diferente. Ainda assim, expus todas as
ressalvas que tínhamos e, após duas horas de reunião, chegamos a
um acordo.
— Sebastian, em nome da família real e do povo de Lorena, fará
um pedido de desculpas formal ao nosso povo, e não deixará de
importar nossas mercadorias, mesmo que paremos de comprar as do
seu país. Desse modo, ficamos livres para negociar com quem
desejarmos — informei aos conselheiros no encontro que estava no
momento.
— Lorena é o maior produtor de grãos entre os reinos, de quem
importaremos senão deles? — questionou o marquês de Arken, um
senhor de 60 anos.
— Abrindo o comércio para países que não são monárquicos —
Hannah respondeu. Ela tinha prazer em anunciar as ideias que fariam
os homens discutirem por horas. Apesar disso, durante a semana ela
participou de quase todas as reuniões do conselho e conquistou o
respeito de metade deles, a outra metade ainda não concordava com a
sua presença, porém aceitou depois dela ter dito "se o problema for eu
não ser da realeza, chamem um padre, Andrew e eu nos casamos
agora e depois vamos para a reunião".
— E daqui um ano iremos proclamar república — ironizou o
general Dudley. — Não podemos enfraquecer a monarquia desse jeito.
— Na verdade, meu pai vinha planejando a abertura da nossa
economia para o resto do mundo há alguns anos — prossegui. —
Encontrei nos seus arquivos diversos documentos com informações
sobre países que poderíamos comercializar nossos bens, como China,
Estados Unidos, Alemanha, entre outros. Creio que ele desejava
acabar com essa dependência que temos de Lorena para não deixar
ninguém nos ameaçar outra vez.
Antes que um novo debate fosse iniciado, apresentei os planos
que encontrei no escritório do meu pai e as alterações que tinha feito
com Hannah. Em resumo, era um mapeamento dos países que
podíamos importar e exportar bens, quantidades, valores e contatos de
governantes de cada país com quem podíamos negociar.
Hannah mostrou quais eram os outros benefícios dessa decisão.
O primeiro impacto seria sobre as empresas locais, que teriam a
oportunidade de adquirir insumos mais baratos e de qualidade, além de
avanços tecnológicos já existentes em países mais desenvolvidos que
aumentariam a eficiência na produção. Com o aumento da produção,
surgiriam novas oportunidades de emprego para os cidadãos, além de
um crescimento no nosso PIB, que implicaria em maiores arrecadações
de impostos para serem investidos em mais desenvolvimento.
Nas projeções feitas por meu pai, o aumento do nosso PIB
cresceria em média de 4 a 5% nos próximos três anos, valor duas
vezes maior que o crescimento atual.
Em contrapartida a esse avanço, não colocaríamos fim às
negociações com os outros reinos, sobretudo porque foi graças ao
apoio entre os países que conseguimos manter as monarquias até
hoje, e ainda precisaremos uns dos outros para não perder força no
futuro. Portanto, em breve eu me reuniria com todos os reis e rainhas
que tínhamos relação econômica para explicar meus pontos.
Apesar de todos os benefícios apresentados, quatro conselheiros
continuavam contra à abertura da nossa economia, e quando
expunham seus argumentos sempre eram voltados para o medo da
monarquia acabar.
— Algo que aprendi nas últimas semanas é que nosso papel aqui
é tomar decisões que favoreçam o povo, não os nossos interesses —
pronunciei. — Se continuarmos com o modelo econômico atual,
amanhã um reino pode se revoltar e ameaçar nos deixar sem alimentos
ou insumos, e não permitirei que isso aconteça outra vez. Minha
prioridade é o povo, não a monarquia.
Depois das minhas palavras, a reunião se voltou para os planos
de abertura do comércio e seguiu assim por mais uma hora.
— A cada dia me orgulho mais de você, sabia? — Hannah
comentou após todos os outros deixarem a sala. — Vejo o modo como
está sendo confiante nas suas decisões e o quanto se dedica a buscar
o melhor para o nosso povo. Me lembra muito o seu pai em alguns
momentos.
— Ainda tenho um longo caminho a percorrer para ser como ele,
mas percebo que venho evoluindo e grande parte disso devo a você.
Cruzei a sala para me aproximar dela. Hannah sempre recusava
os convites para sentar no meu colo e preferia ficar na cadeira que era
minha antes de assumir a posição de rei regente. Posicionando-me
atrás dela, toquei seus ombros e sua postura foi relaxando conforme eu
massageava a região ali.
— Achou que eu só sabia ensinar matemática, querido? —
brincou e decidi aproveitar sua descontração para mudar de assunto.
— Quais são seus planos para hoje?
— Marquei de ver Cinderela com a Hailey.
— De novo?
— Ela não se cansa — deu de ombros.
Alguns dias atrás, eu tirei parte do dia de folga e nós três tivemos
nosso primeiro momento família juntos, assistindo Cinderela. Ao final
eu tinha prometido um baile, sapatos de cristal e um rato para ela. Ao
ver o filme novamente, sabe-se lá o que ela podia me pedir dessa vez.
— E depois do filme?
— Vou colocá-la para dormir e descansar também.
— Ed perguntou se poderia dormir aqui hoje. Podíamos deixar a
Hailey com ele e jantarmos juntos, o que acha?
— Que você e Ed estão tramando algo, e se eu puder arriscar
diria que envolve você me levar para a cama — respondeu, direta.
— Já que descobriu meu plano, posso confessar que planejei
absolutamente tudo para ninguém nos atrapalhar hoje. Ed e a babá vão
ficar com a Hailey, iremos para um quarto de hóspedes onde não há
ninguém por perto, e Grant está responsável por resolver qualquer
problema que surja esta noite sem me procurar.
Eu estava ficando louco. Hannah morava no castelo há uma
semana e ainda não tínhamos conseguido um instante a sós para que
pudéssemos matar a saudade dos corpos um do outro. Sempre que
estávamos em um momento mais íntimo, alguém aparecia para
interromper.
Foi assim nas quatro vezes que a sentei na mesa de reunião onde
estamos agora, encaixando-me entre suas pernas e beijando seu
pescoço, porém antes mesmo que meus lábios pudessem chegar a
seus seios, algum maldito batia na porta.
Além dessas ocasiões, tivemos outras no meu quarto em que a
pessoa a atrapalhar foi uma linda princesinha com menos de um metro
e um péssimo horário para sentir fome. Hailey e Hannah estavam
hospedadas no quarto ao lado do meu, que passou por uma grande
faxina e repaginação. O intuito era mantê-las perto de mim, porém em
certos momentos eu detestava aquela proximidade. Nossa pequena
tinha um senso perfeito para escolher justo o instante em que eu estava
tirando a roupa da sua mãe para chorar. Mesmo com uma babá no
quarto dela, sempre que Hannah ouvia seu choro pela babá eletrônica
que carregava, corria para o quarto ao lado e eu para uma banheira de
água fria.
Entretanto, desta vez eu tinha pensado em tudo, e nenhum ser
vivente no castelo iria nos atrapalhar.
— Todo esse trabalho pra me levar pra cama, Alteza? — Riu.
— Eu conseguiria passagens para a lua se esse fosse o único
modo de ficarmos a sós, meu amor. — Ela gargalhou, sem perceber
que eu falava sério, e se levantou, ficando de frente para mim.
— Supondo que eu aceite seu convite, qual será a programação?
— Encarou-me com um brilho de desejo no olhar.
— Primeiro vamos assistir ao filme com nossa princesa — disse,
aproximando-me até prender seu corpo entre o meu e a mesa, minha
voz estava mais baixa quando voltei a falar. — Depois vamos jantar a
sós, e pretendo acabar a noite com meu nome saindo dos seus lábios
enquanto lhe proporciono o mais intenso prazer.
Eu não era o único louco para fazermos amor novamente. Hannah
também me desejava e logo passou os braços em volta do meu
pescoço me puxando para mais perto.
— E se invertermos a ordem? — Só bastou ela terminar a
pergunta e minhas mãos agarraram sua cintura erguendo seu corpo
para colocá-la sentada na mesa. Me encaixei entre suas pernas e o
movimento fez seu vestido subir, expondo suas coxas.
— Você sempre tem as melhores ideias, meu amor.
Meus lábios tocaram os seus em um beijo lento. Provoquei-a
mordendo seu lábio inferior e fiquei beijando-os sem deixar minha
língua invadir sua boca. Hannah não aguentou a lenta provocação por
mais de dez segundos. Sua mão segurou minha nuca e ela tomou a
iniciativa de aprofundar o beijo. Sorri, apreciando o modo faminto como
sua língua buscava a minha e sua mão atrevida arranhava minhas
costas sobre o tecido da camisa social.
Após um beijo de tirar o fôlego, seus beijos desceram para o meu
pescoço e eu rezei para que ninguém aparecesse quando ela começou
a desabotoar minha camisa. Enquanto Hannah se ocupava com os
botões, minhas mãos acariciavam suas coxas, aproveitando para subir
mais o seu vestido e roçar meu membro, extremamente duro a esse
ponto, na sua virilha.
Toc, toc.
— Estava demorando — resmunguei ao ouvir alguém bater na
porta. — Só um momento — gritei para a pessoa do outro lado,
enquanto ajudava Hannah a descer da mesa e abotoava minha camisa.
— Hoje à noite eu juro que ninguém irá nos atrapalhar — prometi.
O intruso em questão era um dos conselheiros, que havia
esquecido seu chapéu na sala. Depois que ele saiu, Hannah disse que
ia tomar banho e se arrumar com Hailey para o nosso cinema. Eu
acompanhei-a até o quarto aproveitando para ver nossa filha, porém
me escondi ao ver que ela estava torturando a babá, seus brinquedos e
sua nova amiguinha Louise, filha de Grant.
Retirei-me do quarto antes que ela me visse, pois ainda não tinha
superado a última hola do chá e não queria ser convidado nem tão
cedo para outra.
Trinta e oito
Porque eu quero te abraçar
Quero beijar seus lábios
Quero fazer você se sentir desejada
Quero chamar você de minha
Quero segurar sua mão para sempre
Wanted - Hunter Hayes
Andrew
— Você realmente não estava exagerando quando disse ter
arrumado um quarto distante de todos — Hannah comentou depois de
uns oito minutos caminhando pelo castelo.
— Já estou arrependido de não ter começado a noite naquele
maldito sofá.
Sua resposta a meu sofrimento foi uma gargalhada estrondosa.
Às vezes tentar ser romântico pode não ser uma das escolhas
mais sábias. Com a ajuda do Ed, tinha planejado a noite para ser
inesquecível. Afinal, depois de tanto tempo, eu queria que o momento
fosse mais que especial para nós dois e também para fazê-la esquecer
de qualquer outro homem que tenha existido em sua vida durante esse
tempo.
Entretanto, não tinha calculado que teria que cruzar o castelo
quase inteiro para sair da sala onde vimos o filme para o quarto.
Aqueles minutos foram uma verdadeira tortura. Depois de Hannah ter
dito "sim" ao meu pedido de casamento, eu só queria estar dentro dela
e torná-la minha de todas as formas possíveis.
— Chegamos! — anunciei em um tom mais alto do que o
esperado.
Apesar de estar mais que ansioso para nossa noite, quando
paramos em frente a porta branca que dava acesso ao quarto, senti um
leve nervosismo. Eu tive relações sexuais com a Sophia mais de uma
vez, no entanto com Hannah sempre foi e será diferente. Com ela, não
seria um ato puramente carnal, pois tem cuidado e amor envolvidos. Há
tanto tempo eu não sabia como era isso, que me sentia quase um
virgem outra vez.
— Estou sentindo como se fosse nossa primeira vez de novo —
ela comentou, como se lesse meus pensamentos.
Virei o rosto para encará-la.
— Confesso que me sinto assim também. — Ergui minha mão
que segurava a sua e levei até meus lábios, o anel de ouro branco com
uma pedra de diamante cintilava em seu dedo anelar. — É nossa
primeira vez como noivos, então vamos considerar como a primeira vez
do resto de nossas vidas.
— Você às vezes exagera demais, sabia? — riu.
— Exagerar? Espere até ver isso, meu amor. — Abri a porta a
guiando para dentro do quarto.
Hannah observou o ambiente quase de queixo caído. O quarto
estava iluminado por velas — tive o cuidado de usar velas de led para
não correr o risco dela tropeçar e nossa noite acabar com um incêndio.
Pétalas de rosas vermelhas formavam uma trilha até a cama, onde
tinham mais pétalas sobre o lençol branco. Além disso, a alguns metros
da cama, estava posta uma mesa de jantar com um buquê de rosas do
mesmo tom, uma garrafa de vinho com duas taças, morangos e o prato
principal, gnocchi, disposto em um réchaud para manter a comida
aquecida.
— Tem dedo do Ed nisso, não é? — Abracei seu corpo por trás,
para ela não ver meu sorriso ao lembrar de toda a armação para aquele
momento.
— Não gostou?
— Não, não, está lindo. Mas estou notando o esqueminha de
vocês — murmurou. — Logo, tem dedo seu na lingerie que ele me
obrigou a usar, não é?
Meu membro voltou a acordar só de imaginá-la usando o conjunto
vermelho.
— Prometi um título a ele em troca disso, diga-me que ele
conseguiu.
— Terá que descobrir por conta própria, Alteza.
— Será uma honra, meu amor. — Em um segundo, virei seu
corpo de frente para o meu e minha boca possuiu a sua.
Hannah tem o poder de me deixar louco com poucas palavras, só
basta uma provocação para me deixar duro feito pedra.
Enquanto minha língua explorava sua boca, minhas mãos não
perderam tempo em deslizar por seu corpo, alcançando a barra da sua
camisa para despi-la e contemplar suas curvas. Todavia, quando
estava subindo a peça de roupa, ela me empurrou.
— Primeiro vamos jantar, seria um desperdício perder essa
comida.
— Podemos jantar depois — contestei. — Você mesma me
ensinou que a ordem dos fatores não altera o produto.
O som da sua gargalhada só me excitou ainda mais. Ela não tinha
noção de como fazia um homem se sentir com a visão do seu sorriso.
Digo isso porque ela sabia como tinha me deixado, já que minha
ereção era nada discreta sob a calça e ela sentiu-a durante o beijo,
mas, ainda assim, a maldita não teve um pingo de misericórdia pelo
estado que me deixou indo se sentar frente a mesinha de jantar, como
se nada estivesse acontecendo.
— Maldito seja quem teve a ideia desse jantar — resmunguei
frustrado, sentando-me no assento a sua frente.
— Quer vinho, Alteza? — ofereceu, com um tom de voz doce.
Enquanto ela servia as taças com uma expressão inocente no rosto,
entendi seu joguinho: ela realmente queria me enlouquecer.
E seria um grande prazer retribuir.
— Se eu disser o que quero, Hannah, você ficaria mais vermelha
que essas rosas.
No mesmo instante ela parou de servir. Observei-a umedecer os
lábios — movimento que me deixou mais louco —, inspirar o ar
profundamente e suas bochechas adquirirem um tom de vermelho.
Degustando o doce sabor da vitória, prossegui:
— Poderia jogar tudo que está nessa mesa no chão e possuí-la
aqui mesmo.
Hannah ergueu o olhar para mim e meu membro pulsou quando vi
seus olhos ardendo de desejo, deixando transparecer que ela também
imaginava a cena.
— Está esperando o quê?
Como resistir a essa provocação? Eu não tinha estruturas para
competir contra ela, não com ela me olhando daquela forma tão lasciva
e mordendo seu lábio inferior. Diabos, ela tinha que ser tão sexy?
— Pelo modo como me sinto agora, temo que eu não resistiria a
mais de um minuto se pegá-la nessa mesa — confessei. — Mas
prometo que depois de tê-la feito sentir prazer, o nosso segundo round
será aqui.
Levantei-me e vi a expectativa surgir no seu olhar. Hannah
esperava que a levasse para a cama, porém como ela mesma tinha
sugerido jantar primeiro, não seria eu a desobedecê-la. Peguei seu
prato para servi-la e vi a mesma frustração que senti minutos atrás
surgir em sua face.
O jantar se seguiu com mais provocações de ambos os lados.
Minha ereção não diminuiu um segundo sequer durante esse tempo,
principalmente porque Hannah ia se soltando ainda mais a cada taça
de vinho e suas provocações tornavam-se mais diretas.
— Creio que já podemos partir para a sobremesa — anunciei,
tirando a garrafa de vinho de cima da mesa e colocando-a no chão para
evitar que Hannah ficasse bêbada e nossa noite tivesse que ser adiada.
— Finalmente. — Provando meu ponto que o álcool tinha deixado-
a mais desinibida, ela se levantou parando a poucos centímetros de
mim.
— Eu estava me referindo a sobremesa de verdade, porém gostei
muito mais da sua interpretação.
Afastando minha cadeira da mesa, segurei sua mão e a puxei
para meu colo. Sem nenhum pudor, ela sentou com uma perna de cada
lado do meu corpo e seus lábios buscaram os meus.
Eu tinha esquecido o quanto ela ficava majestosa quando tomava
a iniciativa, me dominando como queria.
Hannah começou a rebolar lentamente, se esfregando na minha
ereção. Agarrei forte sua cintura para que ela não ousasse parar o
movimento. Como se já não fosse o suficiente para me torturar, suas
mãos foram desabotoando minha camisa avidamente, e interrompeu o
beijo apenas para tirar a peça do meu corpo.
— Temos que ser justos, não é? — disse, já erguendo sua blusa
para despi-la também.
Senti falta dos vestidos que ela tinha que usar durante as reuniões
com os conselheiros. A espera para ver seu corpo teria sido menor do
que com a camisa e calça que ela vestia. Qualquer pensamento
racional desapareceu da minha mente ao ver o sutiã que ela usava.
A peça era de renda vermelha e isso por si só já era atordoante,
mas a pior — ou melhor — parte era que seus seios estavam
completamente expostos, pois o tecido que os cobria era transparente.
Quase babei enquanto contemplava seus seios, maiores do que antes,
e seu mamilo enrijecido, doido para se ver livre do tecido.
— Ainda lembra como se abre? — provocou com a voz rouca.
— Veremos.
Hannah soltou um gritinho de surpresa quando levantei com ela
em meu colo e rapidamente suas pernas se cruzaram em volta do meu
corpo. Voltei a beijá-la enquanto caminhava em direção a cama. Ela já
tivera seu momento e agora seria a minha vez de comandar.
A rapidez com a qual cheguei até a cama foi impressionante e
logo seu corpo estava deitado sob o meu.
— Mesmo que eu morra de desejo, vou venerar cada parte do seu
corpo — sussurrei em seu ouvido. — Quero conhecer todas as
mudanças que teve nesse tempo e admirar cada detalhe que encontrar.
Vou lembrar-lhe como é se sentir a mulher mais amada e desejada de
todo o universo. Quero ouvir seus gemidos quando estiver lhe dando
prazer.
Senti seu corpo se contorcer e sua respiração se tornar mais
ofegante. Sem aguentar mais um segundo sem tocá-la, segurei sua
mão com o anel de noivado e comecei a beijar sua pele ali. Sem
nenhuma pressa, fui subindo meus beijos por seu pulso, braço,
ombro...
— Andrew, você já pode pular essa parte — ofegou, agarrando
meus ombros com as unhas.
Ignorei-a repetindo todo o processo com o outro braço. Ao chegar
no ombro, desci os beijos pelo vale entre seus seios resistindo a
tentação de beijar seus mamilos que praticamente imploravam atenção.
Primeiro queria apreciar o conjunto da obra daquela lingerie. Sim, eu
mesmo estava me torturando e amando a sensação.
Beijei sua barriga e minhas mãos foram baixando sua calça
lentamente. Interrompi as carícias por um instante ao notar uma cicatriz
que não estava ali antes.
— O parto da Hailey foi meio complicado — explicou baixinho.
— Prometo estar ao seu lado nos próximos. — Que se
dependesse de mim seriam muitos.
Não pude evitar de beijar toda a linha que marcava o lugar que
trouxe nossa filha ao mundo. Antes que eu perdesse minha postura de
safado para assumir a do pai coruja, ocupei-me em terminar de tirar a
calça e os sapatos de Hannah, e fui atingido mais uma vez com a
perfeição daquela mulher.
O conjunto da lingerie era ainda mais tentador do que apenas o
sutiã. A calcinha seguia o mesmo modelo, sendo transparente no ponto
onde eu não via a hora de tocá-la. Fiquei de joelhos na cama,
extasiado, observando cada detalhe e salvando aquela imagem em
minha memória. A luz das velas deixava sua pele com um tom mais
sensual. A cor da lingerie combinava com as pétalas de rosa sobre a
cama, seu cabelo castanho esparramado lembrava o de uma deusa,
mas nada, absolutamente nada, se comparava a expressão em seu
rosto.
Por um segundo, desejei ser um pintor para ser capaz de
eternizar aquela imagem sobre uma tela.
— Vai ficar só olhando? — A voz dela me tirou dos devaneios, me
fazendo sorrir. Menina exigente.
— Você é linda demais, não posso evitar. — Hannah sorriu e não
lutei contra a vontade de voltar a beijá-la.
Dessa vez, meu beijo foi diferente. Mais exigente, mais faminto.
Minhas mãos tocavam seus seios, sua cintura, suas coxas. Ela
arquejava quando eu alcançava pontos sensíveis do seu corpo. Alguns
sons deliciosos deixavam seus lábios e para ouvi-la gemer desci meus
beijos para seu pescoço. Hannah respondia minhas carícias
arranhando minhas costas e braços.
Minhas mãos foram para trás do seu corpo e sem nenhuma
dificuldade abri o fecho do seu sutiã. Praticamente arranquei a peça,
me deliciando com a visão dos seus seios.
— Você me deixa doido, mulher! — Foram minhas últimas
palavras antes de beijar seu mamilo e deixar minha mão brincar com o
outro seio.
Hannah murmurava meu nome junto a outras coisas
incompreensíveis. Em dado momento, troquei os beijos para o outro
mamilo e seus gemidos não pararam. Diabolicamente, minha mão
desceu para tocar seu ponto sensível ainda por cima da calcinha. Por
sorte estávamos afastados de todos no castelo ou teriam ouvido o grito
que escapou da sua garganta.
Parei de beijá-la para tirar sua calcinha e finalmente tê-la
totalmente nua. Apesar da vontade de querer admirá-la, optei por abrir
suas pernas e, diante do seu olhar de surpresa, aproximar minha
cabeça de sua feminilidade.
— Andrew, você não... Ah! — Ela não terminou a frase, pois
minha língua tocou-a — e espero que tenha parado de raciocinar.
Concentrei toda minha atenção em chupá-la, lhe dando o máximo
de prazer. Seus gemidos eram um indicativo de que meu objetivo
estava sendo alcançado e não demorou muito para ela agarrar meu
cabelo, apertar as coxas em volta da minha cabeça e deixar o orgasmo
lhe atingir por inteira.
Aproveitei o instante em que ela tentava controlar a respiração
para tirar o restante das minhas roupas. Não tinha como aguentar mais
um segundo longe dela, meu membro estava dolorido de tão rígido.
Hannah percebeu isso no instante em que terminei de me despir, pois
seus olhos logo focaram na minha ereção.
— Eu... er... você... — disse, sem conseguir formar uma frase. Ela
limpou a garganta e voltou a falar: — Camisinha!
— Para que? Podemos começar os oito irmãozinhos da Hailey
hoj...
— Camisinha, Andrew! — Ela não conseguia falar, porém sabia
dar ordens.
Rindo, abri o criado mudo perto da cama pegando um pacote. Ao
colocar o preservativo, voltei para a cama e fiquei em cima dela,
apoiado nos meus cotovelos.
— Onde paramos? — Minha querida noiva respondeu agarrando
minha nuca e me puxando para um intenso beijo.
Enquanto nos beijávamos, posicionei meu membro em sua
entrada e fui preenchendo-a devagar. Nós dois arfamos quando eu
estava totalmente dentro dela. Meu Deus, a sensação era mil vezes
melhor do que minhas memórias.
— Senti tanta falta disso — murmurei, começando a me
movimentar dentro dela.
— Eu também — gemeu.
Minhas investidas foram aumentando a intensidade conforme seu
corpo se acostumava com o meu. Logo meu quadril se movimentava
num ritmo frenético, acariciando aquela sua região tão íntima até ela
incendiar completamente.
Hannah arqueava o corpo em direção ao meu, pedindo e
implorando por mais. Troquei de posição e ergui suas pernas,
apoiando-as nos meus ombros afundando ainda mais nela, investindo
cada vez mais rápido. Tive que me controlar muito para não chegar ao
clímax ouvindo seus gemidos deliciosos, e quase não consegui quando
seu corpo ficou rígido e ela gritou chegando a mais um orgasmo.
Abaixei suas pernas beijando-a delicadamente, no intuito de me
recuperar para aguentar mais tempo. Hannah, no entanto, não
compartilhava dos mesmos pensamentos que eu e, aproveitando minha
distração, conseguiu inverter nossas posições ficando por cima de mim.
— Minha vez — sussurrou, encaixando-se no meu membro e
deixando-o deslizar para dentro de si.
Estou perdido, pensei em dizer, porém não tive forças para
pronunciar qualquer outra coisa que não seu nome. Hannah cavalgava
em cima de mim, seus seios balançavam conforme ela se movimentava
e minhas mãos não aguentaram ficar sem tocá-los. Senti que
começava a me aproximar do clímax e dessa vez não teria como parar,
já que ela estava no comando. Sendo assim, minha mão deslizou para
o seu íntimo estimulando seu clítoris enquanto explodia dentro dela,
dando a ela um novo orgasmo. Seu corpo trêmulo caiu sobre o meu.
Perdi a noção do tempo. Hannah tinha se aninhado em meu peito
e eu acariciava seus cabelos enquanto a mantinha em meu abraço. O
silêncio entre nós era agradável e eu jurava que ela tinha adormecido
até ouvir sua voz baixinha:
— Estou com medo de dormir e descobrir que tudo não passou de
um sonho.
— Eu sei um ótimo jeito de nos mantermos acordados.
Minha mão tocou sua bunda e ao invés de me reprimir como eu
esperava, ela virou o rosto para me encarar.
— E a promessa sobre a mesa?
Nem pensei quando levantei da cama com seu corpo ainda
grudado ao meu indo em direção ao móvel. Afastei alguns objetos e
sentei Hannah sobre a ponta da mesa, me encaixando entre suas
pernas. Meu membro já estava ereto e quando a toquei senti que
estava pronta para me receber também.
— Eu te amo demais, mulher — sussurrei contra seu pescoço
antes de penetrá-la.
— Eu também te a...
Toc, toc.
— Ah, não! — choraminguei e parei qualquer movimento.
— Você não disse que ninguém iria nos perturbar? — minha noiva
zombou.
— Eu disse que só poderiam bater nessa porta se algo
acontecesse com nossa filha ou o castelo pegasse fogo.
— Se fosse com a Hailey, o Ed chegaria gritando — comentou. —
Será que é fogo?
— Espero que seja, senão matarei a pessoa do outro lado. —
Contra minha vontade e todo o meu desejo, afastei-me de Hannah.
Não me preocupei com as vestimentas quando caminhei até o
intruso, pois eu só iria abrir a porta o suficiente para mandá-lo ir dormir.
— Vossa Alteza — Grant cumprimentou.
— Foi algo com a Hailey? Incêndio? Alguém invadiu o castelo? —
Ele negou todas as alternativas. O rosto do homem era inexpressivo. —
Que diabos aconteceu então?
— Ligaram do hospital...
— O que aconteceu com meu pai? — Um arrepio percorreu meu
corpo, e não como os que Hannah provocou durante a noite. Para
Grant aparecer depois de todas as instruções que lhe dei, a informação
devia ser muito importante.
— O rei acordou — anunciou.
Capítulo Trinta e nove
Trinta e nove
Porque dizem que lar é onde o coração se grava em pedra
É onde você vai quando está sozinho
É onde você vai para descansar seus ossos
Não é só onde você encosta sua cabeça
Não é só onde você faz a sua cama
Home - Gabrielle Aplin
Hannah
Quarenta
Mostre-me como é
Ser o último a ficar de pé
E ensine-me a diferença entre o certo e o errado
E eu te mostrarei o que posso ser
Saving’me - Nickelback
Andrew
É incrível como a vida passa mais rápido quando você está cheio
de felicidade. Os dias que Hailey passou sequestrada pareceram durar
uma eternidade, ao contrário do último mês em que tantas coisas boas
aconteceram que nem vi o tempo passar.
As negociações com países republicanos vinham sendo um
sucesso e as projeções para nossa economia eram esperançosas.
Hannah se mudou oficialmente para o meu quarto e tinha iniciado
os preparativos para o casamento. Além disso criou um projeto social
voltado para o tráfico de crianças, pois, com o sequestro da princesa, o
assunto ganhou repercussão na mídia e muitas mães ganharam voz
para expor casos contra suas filhas ou parentes. Então, minha noiva se
juntou a elas nessa luta, que ganhou grande foco sendo discutido em
Mirabelle e também em outros países. Hannah se orgulhava muito em
estar fazendo alguma diferença no mundo e não parava de planejar
projetos futuros.
Cada dia eu tinha mais certeza que não poderia haver rainha
melhor para meu povo.
Meu pai concordava comigo. Ele saiu do hospital uma semana
após acordar do coma e vinha evoluindo gradualmente na recuperação.
Já conseguia se alimentar sem precisar de sonda e sua visão do olho
esquerdo se recuperou em poucos dias. Com a ajuda da fisioterapeuta,
ele restaurou o movimento dos membros superiores, mas suas pernas
ainda não demonstraram avanços. Portanto, uma cadeira de rodas
automática o ajudava a se locomover e seu quarto bem como a sala do
trono foram transferidos para a parte do térreo do castelo. Elevadores
já vinham sendo instalados para tornar nossa casa mais acessível e
três empregados o ajudavam com todo o resto das suas necessidades.
De certa forma era estranho vê-lo tão dependente de outras
pessoas.
— Algum tempo atrás, eu certamente preferiria morrer a ter que
ficar preso a uma cadeira. Contudo, se tivesse falecido, não teria
conhecido minha neta, e coitada dela se não tivesse um avô como eu
para mimá-la — dissera no jantar de duas noites atrás, quando
questionado por Hannah sobre como ele se sentia.
Hailey e meu pai se tornaram os maiores companheiros um do
outro nesse período. Por recomendação dos médicos, ele ainda não
estava em condições de exercer as atividades de rei, logo continuei a
frente de suas responsabilidades. Tirando as horas da fisioterapia, seu
dia era todo vago. Assim, ele passava a maior parte do tempo com a
neta.
A melhor parte disso tudo era que eu raramente precisava
comparecer a hola do chá, pois o rei é um grande degustador da
bebida e os dois juntos tomavam um bule ou mais todos os dias.
Rei Dominic tornou-se outra pessoa desde que acordou. Minha
suspeita era que sua mudança se devia total e exclusivamente à Hailey.
Ela trouxe alegria à vida dele. Meu pai sorria mais e vivia de bom
humor. Certa vez, me atrasei para uma reunião porque passei pelo
salão principal do castelo e vi os dois brincando, e nada no mundo me
faria perder aquela cena.
Eles apostavam corrida, o rei na sua cadeira e ela no carro
elétrico, que misteriosamente surgiu ali e era controlado pela babá. Não
sei quanto tempo ficaram na brincadeira, mas nos dez minutos que
assisti, quando um ganhava o outro pedia revanche e recomeçavam a
corrida.
O despertar do rei também contribuiu para desviar o foco da
imprensa sobre os demais problemas de Mirabelle. Quase não se
falava sobre a "bastarda", sobretudo depois dele ter levado a neta em
sua aparição ao povo e apresentado-a formalmente como Hailey Price
Walker Leining-Steinfield-Dalghiesh pela primeira vez.
Hannah tinha reclamado que nossa filha nem conseguiria
pronunciar seu nome até os dez anos de idade.
Apesar da imprensa ter tirado o foco dos problemas, eles ainda
existiam. Ao menos um ainda não tinha sido resolvido: o julgamento de
Samantha e Eros.
Michael, agora um cidadão que cumpria serviços voluntários para
pagar as penas de seus crimes, isso quando não estava se agarrando
com o Ed, entrou no serviço de inteligência para ajudar nas
investigações sobre Morris e Samantha.
O hacker fez um ótimo trabalho desenterrando provas de crimes
do antigo detetive e acabou sendo contratado oficialmente. Nas suas
descobertas, ele encontrou documentos alterados por Morris das
perícias dos acidentes envolvendo meus pais e os pais de Hannah.
— Eu acredito que os pais da Hannah estavam investigando a
morte da rainha e por isso Samantha os matou — Michael expôs sua
teoria quando nos apresentou as provas contra Morris.
Apesar de todas as hipóteses que tínhamos, só descobriríamos
toda a verdade ao interrogá-la. O que aconteceria naquela manhã.
Esperamos tanto tempo pelo julgamento devido ao estado de
saúde do meu pai. Tinha receio dele não suportar que a morte de
minha mãe não foi um acidente e estava certo em esperar.
Na noite anterior ao julgamento, contei a ele todas as suspeitas de
crimes e nunca o vi tão furioso. Até aquele momento, ele só sabia do
envolvimento de Samantha no seu acidente e no sequestro da Hailey, e
isso já era motivo o bastante para ele estar odiando-a. Contudo, ao
mostrar a perícia alterada do acidente de minha mãe, o homem perdeu
a cabeça.
Dominado pela raiva, o rei atirou na parede vários objetos que
estavam ao alcance dos seus braços, gritou, ameaçou fazer justiça com
as próprias mãos e, por fim, ele chorou.
Chorou com uma criança, os soluços expressando toda a dor
dilacerando seu peito. Sua angústia era tanta que lágrimas brotaram
em meus olhos também.
— Eu jurei protegê-la e não cumpri minha palavra — dissera em
algum momento do seu pranto.
Quando ele se acalmou, abaixei-me para abraçá-lo e dizer
palavras de conforto. Acho que ficamos horas nessa posição, pois os
primeiros raios de sol já surgiam quando voltei para o meu quarto.
Ao nos encontrarmos para ir ao tribunal, ninguém acusaria que ele
teve uma noite ruim. O rei, mesmo na cadeira de rodas, exalava todo o
seu poder só por sua postura e olhar gélido. Ele seguiu até o local em
um veículo e Hannah me acompanhou no outro.
O rei não perdeu o controle quando Samantha chegou até a sala
onde estávamos na companhia do juiz e advogados. Observei ele
encará-la friamente enquanto ela, algemada, cruzava a mesa para se
sentar no lugar de réu.
— Uma pena que sobreviveu — resmungou ela, devolvendo o
olhar gélido do meu pai.
— Por que, Samantha? — foi a pergunta do meu pai em todo o
seu autocontrole, a frase expressando bem mais que um simples
questionamento.
Os dois se fitaram, sem ao menos piscar os olhos. A tensão
instaurada no local mostrava que aquele era um momento deles para
desenterrarem todas as mágoas do passado, e nós éramos apenas
espectadores intrusos. Sentindo isso, o juiz pediu a todos para se
retirarem. Silenciosamente, os outros deixaram a sala, e somente
Samantha, meu pai e eu permanecemos. Eu jamais confiaria em deixá-
lo sozinho com aquela megera manipuladora.
— Você era uma garota tão doce, o que aconteceu? — continuou
o rei, quando não recebeu uma resposta.
— A culpa é sua, Dominic — rebateu, em tom amargurado. —
Você brincou com meus sentimentos, estragou a minha vida, meus
sonhos, toda e qualquer chance de felicidade que eu pudesse ter. Eu
apenas devolvi o que você me fez sentir.
— Você foi embora, não pode me culpar por ter me apaixonado
pela Cristal.
— Não se faça de bobo, você já é velho demais para isso —
disse. — Sei que você e Cristal tinham um envolvimento bem antes da
minha ida.
Meu pai não negou.
— Me arrependo de não ter percebido na época, teria evitado de
cair no seu papinho de conquistador barato.
— Cristal e eu éramos amigos, nunca aconteceu nada entre nós
quando eu estava com você — o rei se defendeu.
— Aquela sonsa sempre quis tudo que era meu. Ela roubou o
carinho da minha mãe, as brincadeiras com meu irmão e como se não
bastasse ainda roubou você.
— Ela não era assim. Mesmo depois que você foi embora, Cristal
não queria ficar comigo por lealdade a você, para não machucá-la.
— Você acredita mesmo nisso? Eu fui machucada de todas as
formas possíveis por culpa dela. — Samantha perdeu a compostura e
lágrimas desciam por seu rosto.
— Pare de acusá-la sem ela poder se defender.
— Pare de defendê-la sem saber de tudo! — gritou. — Pedi a ela
para te entregar uma carta contando que eu estava grávida e sabe o
que ela fez? Entregou para seu pai.
— Impossível... — murmurou, mas Samantha nem ouviu.
— Seu pai descobriu nosso romance. Me violou, me tirou do país
e me forçou a realizar um aborto contra a minha vontade — gritou,
chorando sem parar.
— Perdão, eu não sabia. Eu teria a protegido se soub... — ele não
terminou a frase.
— É claro que não tinha como saber. Você acreditou na história
que contaram, caso se importasse comigo teria buscado a verdade!
Meu pai ficou sem respostas. Ele realmente não conhecia aquela
parte da história, como eu suspeitava. O silêncio invadiu o local por
alguns minutos, até Samantha voltar a expressar suas mágoas.
— Eu consegui fugir, voltei para Mirabelle depois que aquele
desgraçado morreu, estava louca para lhe contar sobre nosso bebê e
acreditava que poderíamos ficar juntos. Mas quando cheguei, você
estava vivendo um conto de fadas com sua amada Cristal.
— O que aconteceu com o bebê? — ele indagou.
— Nem tive a chance de conhecê-la, pois a mataram assim que
nasceu.
A surpresa dominou a expressão do meu pai. Eu tinha omitido
aquela parte da história, pois não tinha provas a respeito.
— Você deveria ter me procurado, eu a teria ajudado e protegido
você e a criança.
— Eu não queria sua pena — vociferou, voltando a chorar. —
Queria que você cumprisse todas as promessas que um dia me fez!
— Eu entendo parte da sua dor. Gostaria de voltar no tempo e ter
evitado as atrocidades que meu pai cometeu com você e o bebê.
Desculpe-me.
— Não preciso de desculpas. Eu cuidei para que você sentisse a
dor de perder alguém que ama, da mesma forma que senti.
O rei desviou o olhar pela primeira vez, ainda abalado pela
revelação. Ele sofria pela perda da esposa desde o acidente, e saber
que alguém armou para matá-la era ainda mais doloroso.
— Isso lhe trouxe alguma felicidade? Diminuiu sua amargura? —
questionou depois de alguns minutos.
Samantha não respondeu.
— Pensou que eu voltaria para você sem ela no caminho? —
continuou. — Você pode ter tentado tirá-la de mim, contudo Cristal
nunca saiu dos meus pensamentos ou do meu coração. Sabe
Samantha, a única coisa que lembro quando estava em coma são os
sonhos que tive com ela, sempre me pedindo para eu ser feliz, pois
assim ficaria feliz de onde está. Isso é amor, lamento muito por você
nunca ter sentido.
Meu pai fez um gesto para mim, e entendi que a conversa tinha
chegado ao fim e ele queria ir embora. Chamei os enfermeiros para
levá-lo para o castelo, pedindo para avaliá-lo, pois as revelações
deviam tê-lo destruído por dentro e isso poderia afetar sua saúde.
Todos voltaram à sala e demos continuidade ao interrogatório, e a
tia de Hannah não hesitou em confessar todos os crimes. Ela já sabia
que nunca sairia da prisão, então desatou a falar.
Confirmou a teoria de Michael sobre o seu irmão estar
investigando sobre o acidente da rainha e por isso o matou junto com a
esposa. Também confessou que esse foi o motivo pelo qual tentou
afastar Hannah de mim, pois ela poderia saber algo a respeito da
investigação do pai e contar a suspeita ao rei.
Quando questionada sobre o envolvimento com a Sophia e sua
família, ela contou que enxergou uma oportunidade de se aliar a Eros
para ter sua vingança final contra meu pai.
— Nunca compactuei com aquele rei imbecil, o ajudava para
atingir meus objetivos — declarou.
O assunto seguinte foi o sequestro da Hailey. Samantha revelou
que inicialmente planejavam matar a criança logo após meu casamento
com a Sophia, porém ela se apegou a garota e quando Eros ameaçou
matá-la, resolveu acabar com seus planos de conquistar Mirabelle e,
com a ajuda de Morris, interromperam o casamento.
Depois de uma hora de confissão, ela foi condenada à prisão
perpétua por todos os crimes cometidos contra à realeza. E como não
era do tipo que ia para o buraco sozinha, nos deu um endereço onde
tinha um pen drive com mais provas contra o rei Eros. Um guarda se
deslocou para o local no mesmo instante para termos as informações
em mãos na hora do próximo julgamento.
Quando estávamos com as provas em mãos, Eros foi trazido para
a sala. Arrancar sua confissão foi bem mais difícil do que com
Samantha.
Pelas mensagens e gravações, o antigo rei teve envolvimento
direto com o sequestro da Hailey e ameaçou a princesa de morte várias
vezes. As provas foram suficientes para condená-lo à prisão perpétua,
embora uma pequena parte de mim tenha desejado ainda haver pena
de morte para ele e sua cúmplice.
O último julgamento do dia foi das filhas de Samantha, que eram
suspeitas de ajudar no sequestro. Uma delas se provou inocente e a
outra foi condenada a 16 anos de detenção por ter ajudado a mãe no
sequestro.
Quatro horas depois de chegarmos ali, fomos liberados pelo juiz e
voltei com Hannah para o castelo.
— Finalmente os problemas acabaram — ela falou, fechando os
olhos e deixando o corpo descansar no banco do carro.
— Na verdade, ainda falta um grave problema a ser resolvido.
Seus olhos se abriram arregalados e eu ri, perdendo a postura
séria. Toquei seu queixo sussurrando próximo aos seus lábios antes de
beijá-la:
— Considero um grave problema a senhorita ainda não ser minha
esposa.
Capítulo Quarenta e um
Quarenta e um
Porque éramos apenas crianças quando nos apaixonamos
Não sabíamos o que era
Eu não vou desistir de você dessa vez
Perfect - Ed Sheeran
Hannah
2 meses depois...
Oito horas. Esse era o tempo de duração do casamento, que
contava com uma cerimônia na igreja, um passeio de carruagem até o
castelo e depois um baile.
O culpado disso tudo era o rei Dominic.
Dois meses atrás, durante o jantar, comentei como estava a
organização para o casamento e o excelentíssimo rei não gostou das
minhas ideias. Segundo ele, fazia décadas que Mirabelle não via um
casamento real e precisávamos usar esse evento para mostrar ao povo
"os encantos da realeza" e também para atrair turistas ao país.
Eu poderia ter me oposto naquela hora, porém conheci o lado
chantagista do rei.
— É o casamento do meu único filho e, depois de duas tentativas,
ele está casando com a pessoa certa. Permita-me realizar o sonho
desse velho pai? — fora seu pedido e eu não tive forças para dizer não.
Agora, depois de três horas no salão, me arrependia de ter caído
naquela chantagem emocional.
— Mamãe, mamãe.! — Hailey apareceu gritando.
Rapidamente meus pensamentos de matar rei Dom sumiram e
admirei a coisa mais fofinha do mundo parada a minha frente. Ela já
estava toda arrumada. O corpete e as mangas curtas do seu vestido
eram de renda branca e tinha uma abertura em forma de coração nas
costas, uma faixa de cetim azul ao redor da sua cintura formava um
laço na parte de trás e marcava a saia super armada. Uma tiara com
pedras azuis combinava perfeitamente com a faixa e enfeitava o coque
do seu penteado.
— Você está linda, minha princesa! — Quis me abaixar e apertar
suas bochechas, mas algo me dizia que ser a noiva do príncipe não me
dava permissão para me mover enquanto alguém trabalhava no meu
penteado.
— Obligadu! — Ela deu uma voltinha, fazendo a saia do vestido
rodar em volta dela. — Falei com papai, papai disse tá loco.
— Louco? — Hailey assentiu sem completar a informação.
— Louco para ver você, tia Hannah. Ele pediu para se apressar —
Lily completou.
Cumprindo a missão de dar o recado do pai, Hailey voltou a correr
e se juntou a outra daminha, Louise. A babá correu atrás, gritando que
ela iria sujar o vestido.
— Você também está linda — falei para Lily que não negou meu
pedido para ser nossa daminha.
Seu quadro estava estável nas últimas semanas e conseguimos
permissão do hospital para ela participar do casamento. Lily foi uma
das pessoas que sempre torceu por nós e merecia participar de tudo.
Ela usava um vestido parecido com o de Hailey, porém seu cabelo
castanho recém conquistado estava solto e com uma tiara de enfeite.
Quando fui ao hospital fazer o convite, minha filha comentou que
poderiam usar coloas e Lily, tristemente, informou que não conseguiria
usar porque não tinha cabelo. No dia seguinte, apareci com sua peruca
e meu cabelo na altura dos ombros. Um gesto que para mim pareceu
tão simples, mas segundo ela foi um sonho que realizei.
— Obrigada, tia Hannah — Lily agradeceu.
— Só falei a verdade, você está uma verdadeira princesa.
— Obrigada pelo elogio também, mas principalmente obrigada por
não ter desistido do tio Andrew. Fico muito contente em vê-los juntos e
felizes.
— Não diria que ele está feliz nesse momento. O homem surtou e
ameaçou me condenar à forca se eu não levar a noiva agora mesmo —
Jake apareceu, antes que eu pudesse refletir nas palavras da Lily.
— Mas ainda falta meia hora para a cerimônia — constatei,
olhando o relógio na parede. Jake deu de ombros e se voltou para a
criança.
— A senhorita está encantadora, espero que reserve uma dança
para mim no baile.
Ele e Lily engataram uma conversa sobre ela não saber dançar e
ele prometeu ensiná-la. Jake era um conquistador nato, nenhuma
pessoa resistia a sua simpatia, e rapidamente ele conquistou a amizade
da criança.
Meu amigo vestia smoking preto elegantíssimo, a criatura estava
tão linda que até a cabeleireira esqueceu meu penteado olhando para
ele. Enquanto o observava se despedir de Lily, notei uma caixa de
veludo preta em suas mãos e antes que minha curiosidade desse as
caras, ele voltou a atenção para mim.
— O rei mandou um presente para você. — Estendeu-me o
objeto.
Leila, a cabelereira, se afastou para nos dar alguma privacidade.
Abri a embalagem e tenho certeza que meu queixo caiu. O
presente em questão era uma tiara de ouro com inúmeras pedras de
pequenos diamantes, e outras pedras azuis distribuídas em alguns
pontos davam um destaque a joia. Era uma peça simples comparada
às da coleção que Andrew tinha mostrado a mim e a Hailey, no entanto
eu tinha gostado bem mais dela do que das outras que vi.
Junto à tiara também havia um pedaço de papel com a letra do
rei.
Mandei fazê-la para Cristal quando nos casamos, pois ela preferia
itens mais simples e vejo que você também. Peço que aceite o
presente como algo dela para a mulher que mostrou ao nosso filho o
significado de amar e ser amado. Ela ficará bem decepcionada se você
não aceitar.
Com amor e um pouco de chantagem, Dom
O homem era capaz de convencer uma pessoa com um simples
bilhete. Deus me livre de decepcionar Cristal e ela vir puxar meu pé
durante a noite.
— Obrigada — falei para ninguém em específico.
Jake me ajudou a colocar a tiara. Quase chorei de emoção vendo
meu reflexo no espelho. A maquiagem delicada destacava os traços do
meu rosto, meu cabelo — agora mais curto — estava meio preso meio
solto, apenas uma parte estava presa formando um volume no alto da
cabeça e a tiara combinou perfeitamente para realçar o penteado.
— Drew é um sortudo do caralho por ter conquistado você —Jake
comentou, me fazendo sorrir.
Ele entraria na igreja comigo. A sugestão fora de rei Dominic, que
não conhecia os detalhes da história. Contudo, ao invés de ficar
desconfortável, Jake se sentiu extremamente honrado em
desempenhar o papel de irmão mais velho e entregar-me ao noivo.
Além dele, Ed e Michael seriam meus padrinhos. Era uma grande
quebra nos protocolos da realeza ter um casal homoafetivo, porém era
um detalhe do qual eu não abriria mão e ninguém ousou negar o único
pedido da noiva.
Como não teria meus pais presentes em um dos momentos mais
importantes da minha vida, não abriria mão dos amigos que se
tornaram minha família nos últimos anos.
Como se lesse meus pensamentos, Ed apareceu.
— Está na hora do vestido, Hanninha — anunciou, me puxando
para outro cômodo.
Foram necessárias três mulheres para me ajudar a colocar o
vestido. Fiquei imaginando no trabalho que Andrew teria para tirá-lo
depois. Uma quarta mulher prendeu o véu nos meus cabelos e
somente quando elas acabaram, pude ir para outro cômodo me olhar
no espelho.
— Uau! — disse Jake, parando de flertar com Leila e me olhando.
— Eu sonhei com esse momento por anos — comentou Ed, já
chorando.
— Vouxe palece uma lainha, mamãe! —
— Está perfeita, tia Hannah — elogiou Lily.
Olhei meu reflexo e tive que concordar com eles. O vestido que
escolhi com Ed era um modelo sem mangas e com um pequeno decote
V desenhado por apliques e pedras na cor azul. O corpete era em um
tom de azul mais claro em uma mistura harmonizada de apliques em
formatos de flores. Já a saia armada do vestido era toda branca,
contando com alguns detalhes de renda na barra. Na parte de trás,
uma cauda com três metros de comprimento estaria arrastando pelo
chão se não fosse pela camareira segurando-a. O véu era em um
tecido branco quase transparente com alguns detalhes semelhantes ao
do vestido em suas bordas e, quando solto, unia-se à causa.
A tiara da rainha Cristal criou o contraste perfeito com o vestido.
Com a noiva pronta, todos se ajeitaram para ir à igreja. Ed saiu
primeiro, pois os padrinhos entravam antes.
Pude assistir o início da cerimônia enquanto estava na limusine
com Jake e as daminhas, pois o querido rei decidiu que a celebração
seria transmitida ao vivo pela televisão. Assim, vi Ed e Michael
entrando de braços dados na igreja, seguidos por Grant e Beth —
padrinhos do Andrew. O noivo entrou logo em seguida, ao lado do pai
na cadeira de rodas.
Três minutos após a entrada deles, a limusine estacionou em
frente a catedral. Jake ajudou primeiro as daminhas a descerem do
veículo e depois veio em meu auxílio, pois era quase impossível me
mover com aquela cauda gigante.
Organizamo-nos nas posições, com as daminhas a frente. Jake
segurou meu braço e a camareira, que veio em outro carro, me
entregou um buquê de gardênias brancas e foi segurar a cauda do
vestido. Olhei para as flores em minhas mãos, lembrando que eram as
preferidas de mamãe e pude senti-la comigo naquele momento.
Estava pensando nela quando a porta da igreja se abriu e a
orquestra — ideia do rei — começou a tocar uma melodia instrumental
da música Perfect, do Ed Sheeran.
As daminhas caminharam na frente e, quando entrei, diversos
olhares se voltaram para mim. Havia muita gente ali. Famílias reais de
outros países, inclusive Sophia e seus parentes, os conselheiros e suas
famílias, alguns amigos de rei Dominic, mas entre os meus convidados
tinham apenas a família do Jake e a de Ed. Senti um nervosismo ao ver
tanta atenção sobre mim e Jake teve que me puxar para eu notar que
precisava caminhar até o altar.
Foi quando desviei minha atenção dos convidados e vi o homem
em pé ao final do corredor. Ele usava seu traje real azul marinho e
esboçava o mais lindo dos sorrisos. Esqueci as pessoas ao meu redor
e qualquer traço de nervosismo, pois aqueles olhos verdes me
hipnotizavam. Fui recordando de todos os momentos que nos levaram
até ali.
Desde a primeira conversa na porta da aula de geografia, as
nossas aulas de matemática, o encontro na sorveteria, o baile, o
primeiro beijo, os anos que passamos distante um do outro, nosso
reencontro... E agora firmaríamos o compromisso de não deixar nada
nos separar novamente.
Chegando próximo ao altar, Andrew saiu do seu lugar,
caminhando na nossa direção.
— Não aguentava mais um segundo longe de você — explicou-
se, estendendo a mão.
— Eu deveria ter caminhado mais devagar — Jake zombou antes
de soltar meu braço se afastando para seu lugar ao lado dos meus
padrinhos.
Segurei a mão gelada do meu noivo e ele levou-a até os lábios,
sem desviar os olhos dos meus.
— Você não faz ideia do quanto sonhei em vê-la assim, porém
meus sonhos não se aproximaram da perfeição que você está hoje.
— Três horas em um salão tinham que servir para algo, não é?!
Ele sorriu com a piada, enviando espasmos diretamente a meu
coração.
— Você é linda, amor. Só não a beijo agora porque o bispo já me
odeia e pode parar a cerimônia — cochichou me fazendo sorrir
também.
Entrelacei meu braço ao seu e nos voltamos para o bispo que já
começava a cerimônia.
— Sejam todos bem-vindos para esta celebração do testemunho
e confirmação do amor...
Ele fez um discurso sobre a importância do amor e de escolher a
pessoa certa para casar, direcionando olhares reprovadores para
Andrew.
Quase uma hora depois, a orquestra começou uma nova melodia
e Hailey entrou novamente trazendo as alianças. O príncipe pegou-as e
beijou a testa da nossa filha, em seguida entregou os anéis para o
bispo abençoá-los. O presbítero teceu algumas palavras sobre a
aliança que fazíamos naquele instante e em seguida abriu o momento
para os votos.
Meu noivo segurou minhas mãos e iniciou sua fala, fitando-me
com aqueles olhos verdes brilhando com lágrimas.
— Já lhe confessei que a melhor escolha da minha vida foi ir à
escola, pois foi lá que conheci uma garota incrível que pôde me
conhecer sem o peso do meu título. Desde ali soube que você era a
mulher da minha vida, Hannah Price, e nem mesmo três anos
separados foram capazes de me fazer esquecê-la. Nosso amor é para
a vida toda e tivemos a prova que, apesar dos obstáculos, sempre
encontraremos o caminho de volta um para o outro. Hoje te recebo
como minha esposa e, diante de todos, prometo te amar e te respeitar
ainda mais a cada dia, prometo continuar sendo um bobo para arrancar
seu sorriso e juro que sempre colocarei a felicidade da nossa família
em primeiro lugar.
Eu estava chorando de tanta emoção quando ele terminou seus
votos. Apesar de ter ensaiado os meus, o nervosismo fez todas as
palavras desapareceram da minha mente e deixei meu coração
responsável por expressar tudo que sentia por aquele príncipe idiota.
— Eu acreditava que nossa história tinha chegado ao fim quando
fui embora de Mirabelle. Na minha cabeça, você seguiria sua vida e eu
a minha, encontraríamos outras pessoas e seríamos apenas uma
paixão adolescente que acabou. Eu não podia estar mais enganada.
Quando alguém aparecia na minha vida, ele não tinha o mesmo sorriso,
o mesmo abraço ou a mesma segurança que eu tinha em seus braços.
E quando reencontrei você, mesmo agindo como um ogro grosseiro,
meu coração bateu mais forte outra vez. E eu sinto isso toda vez que
lhe vejo, inclusive estou sentindo agora. — Ele abriu um sorriso em
meio às lágrimas que desciam por seu rosto.
— Eu lhe prometo, Andrew Walker, sempre ser sincera com você
para não deixar que mentiras nos separem e também prometo puxar
sua orelha quando for necessário. Vou te amar e ser sua melhor amiga
para o resto da vida.
Trocamos olhares cheios de significados, olhares que deixavam
meu peito palpitando. O bispo nos entregou as alianças abençoadas e
perguntou:
— Andrew Henrich Walker Leining-Steinfleid-Dalgliesh você aceita
Hannah Price como sua...
— Sim, eu aceito! — Andrew cortou a pergunta do bispo e colocou
a aliança delicadamente em meu dedo.
O cardeal se voltou para mim de cara feia.
— Hannah Price, você aceita Andrew Henrich Walker Leining-
Steinfeld-Dalgliesh como seu legítimo esposo?
— Sim!
Meu esposo abriu o sorriso mais largo que vi na vida.
— Se alguém tem algo contra esse casamento, fale agora ou
cale-se para sempre — pediu o bispo com zero empolgação.
— Eu tenho!
Olhei confusa para Andrew, esperando uma explicação, enquanto
o bispo o fuzilava com o olhar.
— Sou contra não poder beijar a noiva agora.
O pobre homem de Deus soltou um suspiro de frustração e
anunciou:
— O noivo pode beijar a noiva!
Contudo, Andrew já estava com os lábios grudados aos meus
quando ele terminou a frase.
Capítulo Quarenta e dois
Quarenta e dois
Bem, eu encontrei uma mulher
Mais forte que qualquer pessoa que conheço
Ela compartilha dos meus sonhos
Eu espero que um dia eu compartilhe seu lar
Perfect - Ed Sheeran
Andrew
Nunca odiei ter um nome longo, afinal meus sobrenomes
representavam gerações e gerações das famílias reais de Mirabelle.
Até mesmo quando eu estava aprendendo a escrever, sentia orgulho
de ter herdado nomes tão importantes da história do meu país.
Contudo, enquanto assinava aquela certidão de casamento, meu nome
pareceu interminável.
A verdade é que não via a hora de oficializar meu relacionamento
com Hannah, e cada segundo de demora era uma verdadeira tortura.
Posso parecer um tanto ansioso, mas depois de dois casamentos que
deram errado, creio que alguns surtos sejam normais.
Ao terminar de escrever a última letra do meu sobrenome,
aguardei cinco segundos para ver se algo fora do comum aconteceria.
E aconteceu.
— Finalmente — sussurrou o bispo, aliviado por não precisar
realizar outro matrimônio, pois dali em diante eu era um homem
oficialmente casado.
A orquestra tocou a mesma música da entrada da noiva, dessa
vez acompanhada pela voz de um cantor. A letra da canção
evidenciava tudo que eu sentia.
“Eu encontrei um amor para mim.”
Segurei a mão da minha esposa e guiei-a para a saída da igreja.
Todos se levantaram enquanto percorríamos o corredor. Tentei sorrir
para os convidados, mas vez ou outra meu olhar desviava para a
mulher ao meu lado e meus sorrisos eram todos dela.
“Bem, eu encontrei uma mulher
Mais forte que qualquer pessoa que conheço”
Nesse trecho da música, Hannah me olhou com uma expressão
tão sincera de felicidade que precisei me controlar para não quebrar
mais um protocolo e beijá-la de novo.
— Agora que já saímos da casa de Deus, posso lhe contar meu
plano de pularmos direto para a noite de núpcias — cochichei assim
que passamos da porta da igreja e apreciei suas bochechas ficando
vermelhas.
Hannah estava abrindo a boca para alguma resposta afiada, mas
se deteve ao ver a cena a nossa frente.
Cerca de trinta guardas reais montados em cavalos, vestiam seu
uniforme de casacas azul marinho e calças brancas. No meio deles,
uma carruagem presa a quatro cavalos nos aguardava. O veículo era
na cor branca, com detalhes em dourado e azul, e o teto era aberto
para que os cidadãos nos vissem.
— Cavalos? Lembre-me de proibir seu pai de assistir filmes com a
Hailey.
— Vamos nos apressar antes que a carruagem vire uma abóbora,
minha Cinderela.
— E vou proibir você também — contestou.
Disfarçando o riso, abaixei-me e segurei a cauda do seu vestido
para que ela pudesse subir no veículo. O pensamento de livrá-la
daquele tecido todo aqueceu meu corpo. Sem dúvidas, a melhor parte
do casamento seria a noite de núpcias.
Entrei na carruagem e em segundos o cocheiro deu partida. O
trajeto até o castelo demorou pouco mais de uma hora. Cidadãos
mirabellienses e turistas se amontoavam em volta das ruas para nos
ver passar, e minha esposa não deixava de sorrir e acenar para eles.
Até mesmo resmungando que mataria o rei por ter inventado tudo
aquilo, ela mantinha o sorriso.
Nossos parentes e convidados estavam no salão principal do
palácio quando chegamos, já que eles tinham ido em veículos
motorizados e mais rápidos. Aos poucos eles começaram a nos
cumprimentar e desejar felicidades. Após a recepção, teríamos o
pronunciamento do rei, em que nos concederia algum título de ducado,
e por fim haveria o baile. Depois disso eu estava liberado para raptar
minha noiva e comemorarmos à sós.
Lamentavelmente, não teríamos nossa lua de mel tão cedo. Eu
não podia ficar longe do castelo pois continuava exercendo as
atividades de rei regente enquanto meu pai cuidava da sua saúde.
Contudo, não ter lua de mel não significava que eu não tinha preparado
uma noite especial para nós.
— Sophia está vindo — Hannah avisou, tirando-me dos
devaneios com seu corpo.
— Altezas! — A princesa fez uma reverência.
Eu não a via desde o pronunciamento que fez em rede nacional
contra o pai e também não soube nada sobre ela nesse período. O
olhar de Sophia focou em minha esposa e, por precaução, toquei a
mão de Hannah entrelaçada em meu braço direito.
— Creio que não tive a oportunidade de desculpar-me
diretamente com você, Hannah — disse, deixando-me surpreso. —
Perdão por ter procurado sua tia. Eu realmente acreditei que você era
apenas uma interesseira e quis afastá-la do Andrew. Hoje, na igreja , vi
o jeito que vocês se olham e percebi o quanto fui tola em tentar separá-
los.
Surpreendendo-me ainda mais, Hannah tirou a mão do meu braço
e tocou o braço da minha antiga noiva em um gesto carinhoso.
— Aprendi que as vezes cometemos erros pensando que
estamos fazendo a coisa certa, não duvido que esse foi o seu caso. Eu
te perdoo e torço para que um dia você encontre alguém que te faça
feliz.
— Obrigada — respondeu Sophia, com os olhos marejados. —
Espero que vocês sejam felizes também.
— Ela não é má pessoa — Hannah comentou em voz alta quando
Sophia deu as costas. — Desde que ela não o chame de "Andy", posso
suportá-la.
Reprimi o comentário que iria fazer para ela me dar um apelido
carinhoso porque o príncipe Theo se aproximou.
— Três tentativas! Você deve ser o homem com mais vontade de
se casar em todo o universo.
Os convidados continuaram a vir falar conosco por quase
quarenta minutos, até o momento em que o rei chamou a atenção de
todos com um caloroso "boa noite".
Nos aproximamos dele e, ouvindo a voz do avô, Hailey correu na
mesma direção. Peguei minha pequena nos braços antes que ela
tropeçasse no vestido e se machucasse. A esse ponto seu penteado já
não existia mais e ela se justificou dizendo algo sobre o chato do Ben
puxar seu cabelo e ela ter pisado no pé dele.
Anotei mentalmente ter uma conversa séria com Sebastian sobre
manter seu filho longe da Hailey, pois príncipes parecem gostar de
mulheres que os maltratam, e tudo que menos preciso é um
pretendente para minha filha. Tudo bem que eles só têm três anos,
mas era melhor precaver desde cedo.
— Obrigado a todos que vieram participar deste dia tão
importante para a história de Mirabelle — o rei iniciou seu discurso
quando todos no salão se levantaram olhando para ele.
— Quando Andrew nasceu, sua mãe e eu prometemos ensiná-lo
a ser um homem honrado para um dia ser o melhor governante que
Mirabelle já possuiu. Infelizmente Cristal não pôde acompanhar seu
crescimento, e creio que fui um pai ausente em muitos momentos.
Apesar disso, eu olho para esse rapaz e vejo que ele se tornou um
homem bem melhor do que imaginávamos. — O rei desviou o olhar
para mim. — Sua mãe estaria orgulhosa, filho, assim como eu estou.
Um nó se formou em minha garganta e esforcei-me para conter a
vontade de ir abraçá-lo. Ele abriu um pequeno sorriso e trocou o olhar
para a pessoa ao meu lado.
— Andrew também soube escolher a mulher para ajudá-lo daqui
para frente. Hannah lembra muito minha esposa, é visionária e não
teme em sacrificar sua felicidade pelo nosso reino. Bem, e eles não
terão problemas com herdeiros já que se adiantaram.
Algumas pessoas riram e meu pai lançou um olhar carinhoso para
a neta, que estava alheia ao momento enquanto brincava com os
adornos do meu traje.
O rei se voltou para os convidados.
— Como todos sabem, não sou mais um homem tão saudável e
já não consigo cumprir as responsabilidades do meu cargo. Desde meu
acidente, Andrew vem governando o país e estamos prosperando em
diversos aspectos, tanto econômicos como sociais. Vejo potencial para,
em poucos anos, ele se tornar o melhor governante que já tivemos.
Diabos! Meu pai não faria o que eu estava pensando que ele
faria...
— Diante disso, renuncio meu direito ao trono e como último
pedido, peço que saúdem o novo rei e a rainha de Mirabelle!
— O quê? — Hannah sussurrou ao meu lado, porém eu estava
tão chocado quanto ela e não emiti resposta.
O som de aplausos dominou o salão e todos, de reis a
empregados, se curvaram perante nós. Olhei para o rei em busca de
alguma explicação e ele apenas sorriu. Aquilo tudo era muito estranho,
primeiro porque meu pai só tinha 44 anos e uma vida de reinado inteira
ainda pela frente, segundo, ele poderia ter me comunicado antes para
eu me preparar emocionalmente para a notícia, e terceiro, eu não
estava pronto para assumir tanta responsabilidade. Ou estava?
— Seu pai não está bem da cabeça.
— Também acho, pedirei para chamar os médicos.
— Vovô tá dodói? — Hailey questionou, ouvindo nossos
cochichos.
Ele enlouqueceu! Pensei em responder, mas o que saiu da minha
boca foi:
— Não, minha querida, mas o papai precisa ir falar com ele.
Coloquei Hailey no chão e nem precisei me afastar, pois o homem
em questão já vinha em nossa direção na cadeira de rodas,
estampando um enorme sorriso no rosto.
— A coroação está agendada para depois de amanhã —
informou.
— O senhor enlouqueceu? — Hannah perguntou, a voz baixa
apenas para nós ouvirmos.
— Na minha ausência, vocês descobriram e solucionaram um
golpe contra nosso país, a tentativa do meu assassinato, fizeram o
povo aceitar uma filha fora do casamento e convenceram aqueles
conselheiros a abrir nossa economia. São mais feitos do que em todos
meus anos de reinado.
— Pai, nós podemos continuar ajudando-o sem precisar tomar o
seu lugar — argumentei.
— Minhas motivações são egoístas também, filho. Percebi que
meus últimos anos tinham se limitado somente a trabalho e, no meu
estado atual, teria que dedicar ainda mais tempo para as atividades de
um rei. Como tive uma nova chance de viver, quero aproveitar meus
dias e ter tempo para brincar com minha netinha e com os próximos
que virão. Confio plenamente que vocês juntos dividirão o peso da
responsabilidade e cuidarão bem do reino.
— E se o povo não aceitar? — Hannah indagou.
— Esse casamento gigante foi uma estratégia para ganhar a
aceitação, eles estão encantados pela história de vocês e os receberão
de braços abertos.
— Você é um grande chantagista, rei Dominic.
— Apenas Dominic, por favor.
Eu tinha um milhão de indagações para fazer ao meu pai, porém
tínhamos que seguir a programação do evento e logo a orquestra
iniciou a melodia da valsa dos noivos. Deixei o assunto de coroação
como encerrado por enquanto.
— Concede-me a honra desta dança, rainha Hannah?
— Eu não poderia negar o pedido de Vossa Majestade —
respondeu fazendo uma leve reverência.
Ela aceitou a mão que estendi e juntos caminhamos para o meio
do salão. Foi inevitável não ser inundado por lembranças enquanto a
conduzia pela valsa.
Anos atrás, naquele mesmo lugar, ela foi a primeira garota com
quem dancei no meu baile. Na ocasião, Hannah tinha acabado de
descobrir minha identidade e eu me preparava para revelar meus
sentimentos a ela. Agora, dançávamos como marido e mulher, mas o
coração acelerado e o frio na barriga ainda eram os mesmos de antes.
Fitei seus olhos castanhos deixando a imaginação fluir para o
futuro feliz que nos esperava dali para frente.
— Certa vez uma garota me perguntou por que eu dançava com
ela enquanto havia centenas de outras esperando por mim.
Quebrei o contato visual para girá-la conforme o ritmo da
música. Péssima ideia. Hannah pisou no meu pé com a ponta do salto.
— E você respondeu que ela era a única que não tinha vindo pelo
príncipe — Hannah apontou com um sorriso nos lábios, o que me fez
ignorar a dor no pé.
— Eu estava errado. — Nossos olhares voltaram a se encontrar,
ela franziu a testa. — Eu dancei com ela porque já sabia que outra
pessoa não faria meu coração bater tão forte como batia perto dela. —
Girei-a novamente e meu pé foi salvo dessa vez.
— Se hoje ela me perguntasse por que a escolhi como minha
esposa entre centenas de outras, minha resposta seria que somente
ela ainda faz meu coração bater como no primeiro dia.
— Para sua sorte, desta vez ela não precisa ir embora a meia
noite, já que ficará com você para o resto da vida.
A música encerrou junto com a sua fala. Eu deveria soltá-la para
dançarmos com os convidados, entretanto, agora como rei de
Mirabelle, me dei o poder de dançar novamente com minha rainha. E
assim, puxei-a para mais perto e voltamos a valsar quando uma nova
música iniciou. Valia a pena ter os pés massacrados para tê-la em
meus braços.
Os casais a nossa volta também começaram a se formar. Ed
puxou Michael para o salão, Sebastian dançava com Rachel, Matthew
com Natalie e um dos filhos gêmeos deles tirou a Lily para dançar
enquanto o outro teve a audácia chamar a Hailey.
— Você está vendo aquilo? — Hannah perguntou.
— Sim, espero que Hailey dance tão bem como você e arranque
o pé dele. — O comentário fez eu ganhar mais uma pisada no pé e
dessa vez tenho certeza que foi proposital.
— Não estou falando da nossa filha, mas daquilo.
Olhei na mesma direção que ela, buscando algo de diferente. Só
vi casais valsando.
— O que exatamente eu deveria estar vendo?
— Jake e Sophia — relatou como se fosse óbvio. Olhei para o
casal que dançava como os outros e não vi nada de anormal.
— Você não acha estranho que ela seja a primeira pessoa que
ele convide para dançar?
— Creio que seria um casal bem inusitado — comentei por não
saber ao certo o que ela esperava de resposta.
— Como você vai ser rei com tanta lerdeza? — Revirou os olhos.
— Tenho a melhor rainha ao meu lado. — A frase reconquistou a
atenção dela para mim.
Continuamos a valsa, desviando nossa atenção um do outro
somente quando vimos Jake e Sophia deixarem o salão. Realmente,
eles formariam um casal bem inusitado, porém eu conversaria com
meu amigo para não brincar com os sentimentos dela como eu fiz.
A música acabou e não tive como prosseguir para uma terceira
dança, pois Ed se aproximou para dançar com Hannah, mas eu podia
garantir que ele queria fofocar sobre o casal saindo escondido do baile.
Deixei os dois e fui conversar com meu pai, que estava apenas
observando os casais no salão com um olhar melancólico.
— Está tudo bem, pai?
— Sim — respondeu rapidamente, depois pensou melhor e
prosseguiu: — Estava pensando em sua mãe, ela amava dançar.
— Sorte a sua não ter sofrido com pisões no pé. — Ele sorriu. —
Agora que pretende recomeçar a vida, o senhor não acha que está na
hora de seguir em frente?
A pergunta era meio invasiva, falar da minha mãe era sempre um
assunto delicado e que mexia muito com ele. Tanto que me surpreendi
quando ele respondeu:
— Quando estava em coma sonhei com ela e no sonho ela pedia
exatamente isso. É o que pretendo fazer de agora em diante.
Ficamos em um silêncio confortável, admirando o baile a nossa
volta. A música trocou e Hannah veio em nossa direção, mas antes que
ela pudesse chegar até nós, o príncipe Theo a interceptou e ela não
negou a dança. Tive que controlar os ciúmes para não agir como um
homem das cavernas e tirá-la dos braços deles. Consegui evitar a
cena, mas não evitei ouvir a risada do meu pai.
Desviei o olhar para uma das janelas a fim de dissipar os ciúmes
bobo, e foi quando vi uma mulher loira perto das cortinas segurando
um revólver na mão. Ela apontava para a direção onde estavam as
crianças, mais especificamente apontava para a Hailey.
— Guardas!
Meu grito foi ouvido no mesmo instante em que a bala cruzou o
salão atingindo o alvo. Meu cérebro processou a cena em câmera
lenta, enquanto meu coração se partia na velocidade da luz ao ver o
corpo caindo no chão e o sangue formando uma poça ao seu redor.
Capítulo Quarenta e três
Quarenta e três
Existe um herói, se você olhar dentro de seu coração
Não precisa ter medo do que você é
Existe uma resposta, se você procurar dentro da sua alma
Hero – Mariah Carey
Hannah
Mesmo sabendo que todos um dia partiremos desta vida, nunca
estamos prontos para lidar com a perda de alguém que amamos. O
pensamento de que não veremos mais aquela pessoa ou não
poderemos mais abraçá-la e ver seu sorriso é difícil de ser enfrentado.
Quando acontece com uma criança é ainda mais doloroso, porque é
uma vida inteira de sonhos sendo interrompidos.
Andrew, Jake, rei Dom e eu estávamos no cemitério dando o
último adeus à criança que perdera a vida na noite anterior. Todos os
presentes choravam, embora alguns fossem mais contidos. O príncipe
era o que controlava melhor suas lágrimas enquanto fazia um discurso
em homenagem a garotinha, ressaltando o quanto ela foi e sempre
será importante para nós.
Ao finalizar, foi minha vez de falar. A parte mais difícil foi engolir o
nó em minha garganta, pois falar sobre minha gratidão a ela era a coisa
mais natural do mundo.
— Desde que conheci Lily, ela lutava contra o câncer e mesmo
assim nunca deixou de buscar motivos para sorrir. Com ela eu aprendi
a correr atrás da minha felicidade antes de ser tarde demais e a ser
grata por cada minuto da vida. — Enquanto falava lembrei da nossa
conversa logo após eu voltar para Mirabelle e o quanto me surpreendi
com sua forma de ver o mundo.
— Lily era uma garota especial. De certa forma, me conforta saber
que ela foi feliz no seu último dia, quando pôde usar um vestido lindo e
se divertir no baile como uma princesa, ao invés de estar sozinha no
hospital. Além disso, garanto que ela será lembrada como uma heroína
e jamais esqueceremos o que ela fez por Hailey e por todos nós.
Um flashback da noite anterior invadiu minha mente.
Estava sendo o dia mais feliz da minha vida até ouvir o maldito
barulho de um tiro. Talvez tenha sido o instinto de mãe que me fez olhar
para a Hailey no momento em que ouvi o som, sabendo que a ameaça
era contra ela. Infelizmente não tive tempo para correr e protegê-la,
pois quando dei o primeiro passo, a bala tinha encontrado um alvo e
um corpo desacordado caía no chão.
Lily, que estava ao lado da minha filha, se jogou na frente de
Hailey e tomou o tiro em seu lugar.
Tudo aconteceu muito rápido para que eu pudesse acompanhar.
Gritos eram ecoados por todo o salão, pessoas corriam em busca de
um lugar seguro, alguns guardas se posicionaram ao nosso lado e
outros para proteger os convidados. Minhas pernas se moveram na
direção das duas, sem se preocupar que poderia estar na mira do
atirador.
Andrew logo apareceu ao meu lado e se apressou em pegar
nossa filha nos braços, que chorava aterrorizada. Por Deus, quando
teríamos paz?
Abaixei-me perto de Lily, com os olhos inebriados por lágrimas. O
vestido branco foi colorido pelo vermelho do sangue que jorrava do seu
peito atingido pela bala e seus olhos azuis perderam o brilho.
— Você aguentou até agora, não desista — disse, mas já
sabendo que sua alma não estava mais presente naquele corpo.
Conforme as pessoas tentavam sair do local, pude ouvir meu
nome soando do outro lado do salão, mais especificamente na direção
de onde veio o tiro. Tamanho foi meu choque ao ver a pessoa que
segurava a arma na mão.
— Hannah, me perdoe! Mamãe me obrigou. — Era Scarlett.
— Abaixe a arma agora e ninguém vai se machucar — Grant
apareceu apontando uma arma para ela, além dele outros 5 guardas
faziam o mesmo.
— Por que a Hailey? — perguntei, avançando furiosa em sua
direção.
— Mamãe acha que se não pode ter algo que deseja, então
ninguém merece ter — respondeu chorando. —Um cúmplice dela
sequestrou minha namorada hoje e não tive tempo nem escolha para
salvá-la a não ser fazendo o que ela pediu, mas eu falhei e agora ela e
uma criança morreram por minha causa. Não saberei viver com isso. —
Ela apontou o revólver para sua cabeça e disparou o gatilho, e meu
grito ecoou junto com o barulho do tiro.
À noite, que era para ser de núpcias, foi um verdadeiro
sofrimento.
Todo o castelo se fechou. Apenas a equipe médica estava
liberada para entrar e levar os corpos. Todos os convidados e
funcionários seriam investigados para saber se alguém tinha ajudado
Scarlett a entrar na festa. Apenas Andrew, Hailey, Rei Dominic e eu
estávamos liberados para deixar o salão e fomos para o quarto do rei,
que era o mais próximo, a fim de cuidar e proteger a princesa.
Somente após 4 horas de investigação, Michael apareceu para
nos informar que 3 funcionárias foram presas por suspeita de
envolvimento no crime. Elas alegaram que não sabiam do plano de
assassinar a princesa, pois a história que Scarlett contou era sobre
encontrar um príncipe no baile. Ainda assim, Rei Dominic ficou furioso e
elas seriam acusadas por facilitarem a tentativa de assassinato da
princesa.
Junto com Michael, Ed surgiu trazendo uma muda de roupa para
mim e me ajudaria a trocar o vestido de noiva, para que eu pudesse
ficar mais confortável. Deixamos o quarto onde Hailey tinha
adormecido, deixando-a com o avô e o pai.
Ao menos ela conseguiu dormir depois do trauma, enquanto nós
adultos não conseguiríamos descansar tão cedo.
O rei Dominic se culpou pelo castelo não estar seguro. Durante a
noite, conseguiu a transferência de Tia Satan para um presídio de
segurança máxima fora de Mirabelle, onde ela não conseguiria ter
nenhum contato com pessoas externas. Além disso, iniciou a busca
pela namorada da Scarlett e o tal cúmplice de Samantha.
Voltei meus pensamentos para o momento presente ao sentir uma
brisa de vento, que me trouxe a sensação de que era um sinal da Lily
dizendo que está bem.
— Sei que você está em um bom lugar e que sempre estará
torcendo por nós. Descanse em paz, princesa. — Joguei uma rosa para
ela sorrindo ao sentir a brisa novamente.
Queria poder colocar o nome que cada pessoa que esteve ao meu
lado durante o longo processo que foi terminar esse livro, desde amigos
próximos à leitores que me motivavam com mensagens e comentários.
Infelizmente, não é possível colocar o nome de todos ou levaria muitas
páginas, então caso você seja uma das pessoas que me mandou uma
mensagem fofa e de apoio, mando aqui um forte abraço e um obrigado.
Também não poderia deixar de agradecer às minhas leitoras betas,
Ythamara Andrade e Isabelly Sousa, ou simplesmente Ytha e Belly, por
não me abandonarem mesmo quando passei mais de um ano sem falar
em nosso grupo. Valeu por não terem desistido de mim!
Obrigada também a todos meus amigos que me perdoaram por só
contá-los que escrevia após anos e anos de amizade. E obrigada ainda
mais aqueles que apoiam meus sonhos, por mais loucos que sejam, e
que agora me apresentam como “esta é minha amiga escritora!”.
E por fim, meu agradecimento ao Grupo Editorial Portal por
proporcionar a realização de segurar esse sonho nas mãos. Muitíssimo
obrigada!
Leia também!
Outros títulos do selo segredo
Valentine
Sinopse:
O Doutor Brian Powell, ou Doc como era conhecido pelos
amigos, acompanhava de perto o sofrimento do presidente do
Selvagem Moto Clube devido a uma grave doença. A morte se
aproximava e a sucessão do seu legado estava gerando uma
grande disputa. ⠀
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⠀
John Savage nunca quis que a família se envolvesse com seus
negócios, mas sua filha Valentine estava disposta a lutar pelo cargo
que lhe era de direito. Ninguém a conhecia o suficiente para dar
apoio, no entanto isso não a desmotivaria a alcançar seu objetivo.
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O primeiro contato que Valentine teve com um dos membros
do Moto Clube foi explosivo, mas Doc estava determinado a ser um
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Entre atentados e preconceito, Doc e Valentine terão que lutar
para preservar a paz do Selvagem e não se perderem entre as
armadilhas causadas pela superproteção.
Leon e Pietra: Ao resgate do amor
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Ele, um médico dedicado ao trabalho humanitário; Ela, uma
advogada que luta pela justiça em favor das mulheres que sofrem
com violência doméstica; ambos solteiros e dedicados as suas
profissões. Em uma festa de casamento decidem que um
relacionamento casual seria uma ótima forma para lidar com a
química visível. Cinco anos depois eles se reencontram, o momento
não podia ser pior, mas descobrem que aquela química ainda ardia
como fogo em palha seca. Entre encontros e desencontros, esse
casal vai enfrentar os dramas da vida em busca do resgaste ao
amor.
A secretária do CEO
solução...