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Amaral
editora 34
Aracy A. Amaral
TEXTOS DO
TRÓPICO DE
CAPRICÓRNIO
Artigos e ensaios (1980-2005)
Vol. 2
Circuitos de arte na América Latina e no Brasil
editoraH34
EDITORA 34
Editora 34 Ltda.
Rua Hungria, 592 Jardim Europa CEP 01455-000
São Paulo-SP Brasil Tel/Fax (11) 3 8 16-6777 www.editora34.com.br
Assistência editorial:
Glória Kok
Pesquisa:
Regina Teixeira de Barros
Assistência de pesquisa e digitação dos textos:
Valéria Piccoli, Renata Basile da Silva, Ana M aria M irio
Capa, projeto gráfico e editoração eletrônica:
Bracher dr Malta Produção Gráfica
Revisão:
Beatriz de Freitas Moreira, Fabrício Corsaletti, Camila Boldrini
Ia Edição - 2006
Amaral, Aracy A.
A52t Textos do Trópico de Capricórnio: artigos e
ensaios (1980-2005) - Vol. 2: Circuitos de arte na
América Latina e no Brasil / Aracy A. Amaral —
São Paulo: Ed. 34, 2006.
424 p .
ISBN 85-7326-365-2
CDD - 709.81
Textos do Trópico de Capricórnio
Vol. 2: Circuitos de arte na América Latina e no Brasil
A presentação ........................................................................................... 11
Parte 1
Arte na América Latina
1. Indagações, extensão e limites do regionalismo............................ 15
2. Marta Traba e o pensamento latino-americano............................ 23
3. O popular como m atriz...................................................................... 30
4. Arte da América Latina:
questionamentos sobre a discriminação.................................... 35
5. “Fantástico” são os outros.................................................................. 43
6. Intercâmbio Brasil-EUA: os parcos exemplos............................... 49
7. M ade in England-, uma visão da América Latina.......................... 55
8. O Memorial da América Latina:
entrevista de Juan Acha a Aracy Amaral.................................... 59
9. Brasil na América Latina: uma pluralidade de culturas............... 65
10. Modernidade e identidade: as duas Américas Latinas,
ou três, fora do tempo................................................................... 72
11. Cêntricos e ex-cêntricos: que centro? onde está o centro?.......... 83
12. O México e n ó s.................................................................................... 93
13. Chile: a volta do Museu da Solidariedade..................................... 97
14. Abstração geométrica na América do Sul:
a Argentina como precursora....................................................... 102
15. Multiculturalismo, nomadismo,
desterritorialização: novo para quem ?........................................ 112
16. Aqui, neste m om ento......................................................................... 116
17. Plistória da arte moderna na América Latina (1780-1990)....... 128
18. Um olhar sobre a América: Damián Bayón................................... 138
19. Alteridade e identidade na América Latina.................................... 148
20. Colômbia: um contexto peculiar...................................................... 158
21. Artes visuais sob a ótica de José Neistein........................................ 164
22. Artes visuais: contatos com a Argentina......................................... 170
Parte 2
Museus e circuitos de arte
23. A Pinacoteca do Estado..................................................................... .......175
24. Dona Yolanda e o M AC .................................................................... .......195
25- Qual é o lugar da arte?...............................................................................198
26. Agora, escolares aos museus......................................................................203
27. MAC: da estruturação necessária
à pesquisa no museu..............................................................................207
28. Artistas japoneses na coleção do M A C ...................................................213
29. Situação dos museus de arte no Brasil:
uma avaliação.................................................................................. .......216
30. Os salões beneficiam a formação
dos acervos dos museus?.......................................................................222
31. A Lei Sarney, o colecionador, os museus...............................................225
32. Arquivo e documentação na área das artes.................................... .......228
33. A polêmica do Museu d’Orsay:
a continuidade como visão da arte do século XIX.................. ...... 232
34. Do MAM ao MAC: a história de uma coleção................................... 238
35. Conversação com Pontus Hulten:
o território da arte................................................................................ 280
36. Curadoria de exposições: a situação brasileira............................... ...... 286
37. Museu de Monterrey no M éxico........................................................... 291
38. Arte e instituições...................................................................................... 294
39. A Pinacoteca do Estado: problemas em torno
à formação e desenvolvimento de um acervo................................. 300
40. Museus em crise?....................................................................................... 306
41. A exposição Rodin.............................................................................. ...... 309
42. O desmanche da cultura no Estado de São Paulo........................ ...... 313
43. A exposição M onet............................................................................. ...... 316
44. Curadoria, museologia e arte construtiva...................................... ...... 319
45. 500 anos de carência.................................................................................321
46. Mário Pedrosa: um homem sem preço........................................... ......328
47. Mário Pedrosa e a Cidade Universitária da U S P ......................... ......333
48. Henry Moore no Brasil...................................................................... ......337
■
Parte 3
Arte e cidade
49. Arquitetura, Jaguaré e Barra Funda................................................. ...... 345
50. A decadência da Paulista.................................................................... .......350
51. Imagem da cidade moderna: o cenário e seu avesso.................... .......353
52. Criação: arquitetura e a r te ........................................................................360
53. Um olhar sobre a cidade.................................................................... .......365
54. Modernidade e nacionalismo no Brasil.................................................375
55- Brasil: perfil de um meio artístico marcado pela violência........ .......382
56. “Arte-Cidade”: intestinos expostos.................................................. .......395
li
tem, como ponto de partida, o Trópico de Capricórnio, conforme assinalam
sempre as placas nas principais vias que cortam o perímetro de São Paulo:
“Aqui passa o Trópico de Capricórnio”.
Dentro de cada volume, os textos foram reunidos por ordem de reali
zação, trazendo a data de sua primeira redação entre parênteses, logo abaixo
do título, o que permite ao leitor acompanhar o desenvolvimento de nossos
interesses ao longo dos anos.
Este volume reúne, em sua primeira parte, escritos referentes à realida
de cultural latino-americana, suas matrizes e seus impasses —• debate que se
iniciou, de maneira mais incisiva, a partir de minha participação no Simpó
sio de Austin, no Texas, em 1975. Data desse momento o encontro com ar
tistas, críticos e historiadores dos demais países latino-americanos, em dis
cussões que se prolongaram pelas décadas de 80 e 90.
O conhecimento de suas realidades artísticas desmanchou para mim por
completo a idéia preconcebida de uma “arte latino-americana” e me levou a
perceber o meio artístico do continente americano não como um bloco úni
co, mas como uma formação bastante peculiar de países ou regiões. Isso, po
rém, não apaga o fato de que — em contraste com culturas econômica e po
liticamente hegemônicas — permanecem visíveis nossas singularidades e afi
nidades, as quais devemos preservar em nome de problemas comuns, de uma
história similar e de um destino ainda indefinido do ponto de vista de sua
afirmação global.
A segunda parte deste volume é resultado, sobretudo, de nossa expe
riência à frente da Pinacoteca do Estado de São Paulo e do Museu de Arte
Contemporânea da Universidade de São Paulo (MAC-USP), período de
vivência no interior dessas entidades museológicas, assim como de nosso
inconformismo diante do descaso governamental. Fica aqui o registro de par
te da história dessas instituições, de seus desafios, e a discussão dos rumos
necessários para uma projeto cultural conseqüente.
A terceira parte reúne artigos sobre a relação entre a arte pública, os cir
cuitos de arte e o meio urbano, tema que, parece-nos, adquire um contorno
próprio numa “metrópole desvairada do Terceiro Mundo”, como é o caso de
São Paulo.
12
Parte 1
A rte na Am érica Latina
1.
Indagações, extensão e limites do regionalismo
[1983]
15
ARTE NA AMÉRICA LATINA
16
INDAGAÇÕES, EXTENSÃO E LIMITES DO REGIONALISMO
17
ARTE NA AMÉRICA LATINA
18
INDAGAÇÕES, EXTENSÃO E LIMITES DO REGIONALISMO
19
ARTE NA AMÉRICA LATINA
20
INDAGAÇÕES, EXTENSÃO E LIMITES DO REGIONALISMO
21
ARTE NA AMÉRICA LATINA
22
2.
Marta Traba
e o pensamento latino-americano
[1983]
23
ARTE NA AMÉRICA LATINA
soai a levaram a outros cantos. A Colômbia seria sua segunda pátria: casada
com o escritor colombiano Alberto Zalamea, ali teve filhos e realizou parte
fundamental de sua contribuição.
24
MARTA TRABA E O PENSAMENTO LATINO-AMERICANO
25
ARTE NA AMÉRICA LATINA
26
MARTA TRABA E O PENSAMENTO LATINO-AMERICANO
Mesmo uma doença grave não foi suficiente para fazê-la “pendurar as
chuteiras” da crítica de arte, apesar de todas suas intenções, publicamente
manifestas, na ocasião de sua saída da Venezuela. Assim, há dois anos, em
Medellín, por ocasião da Bienal de 1981, vimos, com surpresa, diante de suas
reiteradas declarações de Caracas, uma Marta Traba superativa, em demons
tração cabal de superação de seus problemas de saúde através de uma ener
gia incrível, dando entrevistas, publicando artigos sobre a Bienal nos jornais
de Bogotá e Medellín, debatendo no Simpósio de que participava (eu estava
na mesma cidade, onde participávamos do encontro de “Arte Não-Objetual”,
convocado por Juan Acha).
Medellín não fora um mero acaso de “retorno à crítica”. Na verdade,
Marta nunca deixaria de escrever sobre arte, moléstia incurável para sua per
sonalidade agitada. Assim, ao longo dos números às. Arte en Colombia, escreve
permanentemente sobre arte, museus e suas idéias.
Aliás, nem ela poderia negar-se à Colômbia, que tão generosamente ofe-
receu-lhe a cidadania — e esse gesto tocou-a vivamente no ano passado — ,
a que ela respondeu com funda emoção, enquanto os Estados Unidos recusa
ram o visto de permanência a ela e a Angel Rama, que fixaram residência em
Paris, ambos com bolsa da Guggenheim.
Porque, em minha segunda estada na Colômbia, percebi que a vida ar
tística da Colômbia se divide em “antes” da vinda de Marta Traba e “depois”
de sua passagem e vivência pelo país. Diretora do Museu de Arte Moderna
de Bogotá, escrevendo a História abierta dei arte colombiano (que me ofere
ceu em nosso primeiro encontro em Austin, em troca dos livros que lhe pre
senteei), monografias sobre artistas (como a de Beatriz González, à qual era
muito ligada), crítica em jornais e periódicos, coube a essa aparentemente
frágil argentina dinamizar o meio artístico colombiano, caracterizando-o
como uma das mais autênticas “áreas fechadas” da América Latina, de difícil
27
ARTE NA AMÉRICA LATINA
28
MARTA TRABA E O PENSAMENTO LATINO-AMERICANO
29
3.
O popular como matriz
[1985]
31
ARTE NA AMÉRICA LATINA
32
O POPULAR COMO MATRIZ
Romero, o deslocamento dos planos dos objetos bem evidente em suas com
posições a refletir a criatividade intuitiva do pintor anônimo. Em seu gesto
de registro respeitoso da estética popular está implícito o reconhecimento pelo
olho do artista de uma sensibilidade afim, que lhe fornece a possibilidade de
produção de um outro objeto artístico autônomo, a sua fotografia.
Partindo do mesmo tema (barracas e banquinhos de festas), Montez
Magno recria, com um rigor não pretendido pelo artista popular, porém a
partir de sua inspiração, quadros a óleo sobre tela ou sobre madeira, um
Construtivismo que nos remete também a certos resultados formais, embo
ra cromaticamente diferenciado, de um Volpi dos anos 50. As cores cálidas,
intensas (os verdes e amarelos-bandeira combinados com vermelho intenso
ou azul-cobalto) a comunicar uma liberdade total da cor sem a preocupação
do bom gosto “civilizado”, mas atento ao rigor compositivo como diretriz
maior deste grande pintor do Nordeste contemporâneo.
Emanuel Nassar, um dos expoentes da jovem geração paraense, alia às
pinturas em acrílico sobre tela de cor saborosa a preocupação construtiva,
porém se baseia nitidamente na comunicação visual suburbana que ele ab
sorve e devolve em composições redutoras, uma imagética rica em seus pos
síveis desdobramentos.
É bem evidente que, ao tentar refletir sobre a matriz apontada, seja a
comunicação visual suburbana, seja o ornamento em pintura de objetos e
arquitetura, o geométrico comparece como elemento decorativo, intuitiva
mente determinado como solução plástica, característica de sua presença tanto
na arte africana em incisões na cerâmica e madeira quanto na própria arqui
tetura, ou na multifacetada produção visual indígena. Ou seja, percebemos
que o dado geométrico se adequa mais harmoniosamente a uma superfície
bi ou tridimensional enquanto decoração. Sem qualquer conotação racio-
nalista ou intelectualizada, como é o caso da emergência em nosso tempo na
Suíça e na Alemanha, em que o geométrico-abstrato se funda não raro na Ma
temática e não no suporte — a arquitetura, a parede, ou a trama do objeto
—, que solicita a imagem colorida que o adorna.
No caso das obras desta exposição, é como se a criatividade popular fa
lasse ao meio cultural de nosso país através da mão de nossos artistas dos cen
tros urbanos das diversas capitais, como se atuassem como tradutores da densa
carga criativa que permeia os artífices e artesãos populares dos meios rurais,
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
34
4.
Arte da América Latina:
questionamentos sobre a discriminação
[1987]
Pela primeira vez, depois de 21 anos, realizou-se, neste ano, uma cole
tiva antológica de arte da América Latina, nos Estados Unidos, mais preci
samente no Museu de Arte de Indianápolis e intitulou-se “América Latina:
arte do fantástico”. Evento de grande porte, a despeito de veicular, de ma
neira bastante sintomática, uma projeção da magia que emana da arte deste
continente e que, de certa forma, vem ao encontro da expectativa que os paí
ses do Primeiro Mundo têm em relação à nossa produção artística. As duas
últimas exposições latino-americanas dessa dimensão se realizaram nos Es
tados Unidos em 1966: uma sobre arte contemporânea no Museu Guggen-
heim, intitulada “The Emergent Decade”, e outra, com um enfoque histó
rico, “Art of Latin America since Independence”, organizada a quatro mãos
pela Universidade do Texas, em Austin, e pela Universidade de Yale.
Esse longo espaço de tempo é significativo do desinteresse dos Estados
Unidos em focalizar aspectos, movimentos ou individualidades marcantes da
arte de elevado nível qualitativo que emerge no Peru, Argentina, Uruguai,
Chile, Brasil, Colômbia, México, Venezuela, Bolívia, Paraguai, Salvador,
Nicarágua, Guatemala, Costa Rica, Panamá, Cuba, República Dominicana,
Porto Rico, Haiti. Como não existe uma “escola” de artes visuais que se pos
sa denominar de “latino-americana”, sempre nos surpreendem os enfoques
procedentes tanto da Europa quanto dos Estados Unidos que desejam pro
jetar uma exposição de “arte latino-americana”, o que coloca, a nosso ver, o
artificialismo do enfoque e o pouco conhecimento de nossa realidade artís
tica. Por outro lado, seria lícito supor que as contribuições dos grandes ar
tistas do continente tivessem sido alvo de exposições em museus e não em
galerias nos Estados Unidos e na Europa, no caso de artistas antológicos como
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
Diego Rivera, Tarsila do Amaral, Frida Kahlo, Wifredo Lam, Joaquín Tor-
res-García, Jesus Rafael Soto, Rufino Tamayo, Mathias Goeritz, apenas para
citar alguns. No entanto, sabemos bem que nos Estados Unidos a atividade
dos museus segue a iniciativa das galerias, ou seja, os museus de arte só pas
sam a se interessar por determinado artista após sua consagração pelo mer
cado de arte. É o caso do conhecido artista colombiano Fernando Botero,
após sua ligação com a poderosa Marlborough, por exemplo.
Ao visitar a instigante exposição “A mulher nas artes”, no Brooklyn
Museum, em Nova York, foi com surpresa que constatamos ser Frida Kahlo
a única latino-americana presente, em total desconhecimento ou indiferen
ça perante as contribuições de artistas como Anita Malfatti, Tarsila do Ama
ral e Lygia Clark, do Brasil, ou Raquel Forner, da Argentina, ou Amélia
Peláez, de Cuba, apenas para citar algumas personalidades.
A irritação por nós experimentada — que é muito distinta da amargu
ra da constatação dessa omissão — diante da ausência de artistas latino-ame-
ricanos de uma Documenta como a de Kassel causou-nos algumas reflexões.
Uma ponderável parcela do espaço dessa grande exposição européia foi cen
tralizada na responsabilidade total do artista, e adivinha-se, nessa opção, a
presença do respeito pela herança espiritual de Joseph Beuys e na densidade
de sua imagem junto ao meio artístico alemão. Afinal, a Documenta não é,
na Europa, tão rodeada de expectativa no ambiente cultural europeu quanto
se imagina aqui, pois se constitui um evento entre dezenas de outros. Por ou
tra parte, não se constitui num evento exclusivamente europeu, mas reúne
artistas de todo o mundo. Aliás, apenas um nome da América do Sul esteve
presente à exposição, o de Jaar, do Chile, artista que vive em Nova York. Se
ria discriminação em relação à produção latino-americana ou mero desco
nhecimento? Lemos, pouco depois de nossa visita a Kassel em 1987, que o
curador da Documenta 8, Schneckenburger, já se referiu ao aborrecido da
problemática da identidade, visível, segundo ele, na arte latino-americana
(Que arte latino-americana? — perguntamos). Embora seja muito fácil esse
comentário por parte de um europeu, procedente de um contexto sociocul-
tural harmonioso e homogêneo, até etnicamente, quando comparado com
nossa realidade. O que nos espanta é, de fato, a ausência de obras de artistas
como Leopoldo Mahler, da Argentina, ou Enio Iommi, ou do nível de Guto
Lacaz, ou José Resende, do Brasil, só para citar alguns. E por que não Carlos
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ARTE DA AMÉRICA LATINA: QUESTIONAMENTOS SOBRE A DISCRIMINAÇÃO
1 Ver o histórico desse menosprezo, que data do século XIX, no antológico livro do brasi
leiro Eduardo Prado, intitulado A ilusão am ericana , de 1893, apreendido pela polícia no dia de
sua publicação, de gritante atualidade e que traça um retrato amargo da ilusória fraternidade ame
ricana a partir das relações dos Estados Unidos com as repúblicas latino-americanas.
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
meio desenvolvido quando vive no exterior, por vezes à custa de uma perda
de raízes.
E se o problema não estivesse exclusivamente na expectativa que euro
peus e norte-americanos têm diante da arte que deve ser produzida na Amé
rica Latina — esperando de nossa parte o exotismo, a magia, uma visão do
popular, sem cogitar do meio artístico erudito, ou culto, que na América La
tina procede dos grandes meios urbanos — , não estaria a razão dessa indife
rença também apoiada na inexistência de uma política cultural mais agres
siva por parte de nossos países?
É para nós inegável que hoje o europeu ou o norte-americano não se
interessam por nossa arte ou pela arte que é criada em cada um de nossos paí
ses, por não constituirmos ainda um bloco economicamente poderoso. O
exemplo do Japão é bem cristalino. Parceiro insubstituível nas mesas de ne
gociações econômicas, os artistas japoneses — mesmo se não brilhantes ou
pouco singulares — são constantemente solicitados para todo evento con
temporâneo, assim como a Alemanha, a Itália, entre outros. Se, há quinze
anos, inexistiam artistas contemporâneos europeus nas coleções de museus de
arte moderna dos Estados Unidos, atualmente, com o florescimento da pros
peridade européia, qual o museu americano que se deseja ver como atuante
não possui os seus Baselitz, Kiefer, Sandro Chia, Clemente? É um fenôme
no novo, ao qual não podemos deixar de nos referir, nessa ligação do poder
econômico e sua articulação com a projeção artística dos diversos países do
mundo. Aliás, o artista que, embora talentoso, não observar essas regras do
jogo na arena internacional, é de uma inocência dificilmente aceitável nos
dias que correm.
Dessas reflexões, pode-se tirar como ilação que as artes visuais são mais
manipuláveis pelo sistema, se atrelam mais à política e dependem mais das
oscilações econômicas que a literatura. Ou podem servir mais como ilustra
ção aos eventos político-sociais, ou aos altos extratos da burguesia, do que a
literatura. Ou, ainda, que o cinema e a música popular, artes que, por sua
inserção na indústria cultural, escapam, por seu público mais amplo, ao eli-
tismo que envolve o meio artístico, das artes visuais.
Por outro lado, surge o problema da obsessão dos artistas latino-ameri
canos com os modelos emanados dos grandes centros mundiais de arte. Preo
cupação com sua proximidade ou, quem sabe, inexorabilidade de afinidade,
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ARTE DA AMÉRICA LATINA: QUESTIONAMENTOS SOBRE A DISCRIMINAÇÃO
39
ARTE NA AMÉRICA LATINA
40
r ARTE DA AMÉRICA LATINA: QUESTIONAMENTOS SOBRE A DISCRIMINAÇÃO
41
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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5.
“Fantástico” são os outros
[1987]
1 Aurélio Buarque de Holanda, Novo dicionário, 2 a ed., Rio de Janeiro, Nova Fronteira, s.d.
2 José Ferrater Mora, D iccionario d e filosofia abreviado , Buenos Aires, Editorial Sudame-
ricana, 1975.
43
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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■'FANTÁSTICO” SÃO OS OUTROS
45
ARTE NA AMÉRICA LATINA
6 Cristina Grillo, “O escritor Carlos Fuentes dispensa etiquetas literárias”, Folha de S. Pau
lo, mai. 1987.
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“FANTÁSTICO" SÃO OS OUTROS
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
para uma exposição internacional, para a qual seus organizadores não econo
mizaram esforços para sua realização plena. Embora não possamos comen
tar as obras dos demais artistas, porque nem todos são de nós conhecidos, e
tenhamos visto uma instalação na I Bienal de Havana de José Bedia, de Cuba,
sabemos que estão atentos, com maior ou menor intensidade, à informação
internacionalista. Neste aspecto, torna-se mais difícil o encontro da singula
ridade continental nos grandes centros urbanos.
O que talvez nos perturbe é a preocupação em rotular estes artistas —
cuja obra reunida em Indianápolis possibilita levantar um pouco a cortina
sobre certa feição da arte da América Latina, divulgando sua rica criatividade
no meio das artes visuais.
48
r
6.
Intercâmbio Brasil-EUA:
os parcos exemplos
[1988]
Há dois anos o Bronx Museum of the Arts, de Nova York, prepara uma
exposição que se intitula “A presença latino-americana nos Estados Unidos”,
a ser aberta em setembro de 1988, projeto sob a direção do diretor do mu
seu, Luis R. Cancel. Vale a pena fazer algumas reflexões sobre essa grande
exposição, já que há diversas outras em vias de organização sobre a arte da
América Latina — tão variada em sua diversificação e que os norte-america
nos e europeus insistem em catalogar como um núcleo regional. O primeiro
equívoco expresso na apresentação do projeto de Cancel é a referência a esta
exposição como a primeira pesquisa erudita “destes artistas como grupo”, pois
a relação dos incluídos nunca se constituiu como “um grupo”.
Na verdade, o intuito é mostrar os artistas latino-americanos que vive
ram ou expuseram nos Estados Unidos no período de 1920-1970 (para o
período mais recente, entre 1970 e 1980, Jacqueline Barnitz já realizou ex
posição em 1987). Cancel enfatiza que o determinante será mostrar os “Es
tados Unidos como um estímulo, fonte, refugio, receptor e lugar” aos artis
tas que por aí passaram com “experiências significativas que influíram no
desenvolvimento de seus estilos individuais”, ou abordando “as influências
interculturais ativas”, ocorridas nesse período. Nessa conceituação surgem
vários problemas. É claro que se formos esmiuçar os artistas de outros países
a problemática pode ser menos similar do que aquela aplicada ao Brasil, pois
os muralistas mexicanos viveram e foram, de fato, influentes no politizado
meio artístico norte-americano dos anos 30; nos anos 40, Roberto Matta vi
veria em Nova York integrando-se ao grupo de artistas nova-iorquinos sem
qualquer discriminação; nos anos 60, se bem me lembro, Edgar Negret e
Eduardo Villamizar, da Colômbia, circularam pelos Estados Unidos; nos anos
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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INTERCÂMBIO BRASIL-EUA: OS PARCOS EXEMPLOS
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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INTERCÂMBIO BRASIL-EUA: OS PARCOS EXEMPLOS
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
cidade como Nova York. Mas este é um caso singular. Como o seria igual
mente a personalidade de Wesley Duke Lee, o primeiro realizador de um
happening entre nós, em inícios de 60, com indubitável influência norte-ame
ricana. Mas a indagação curiosa que deveria surgir desta exposição seria: qual
o resultado, em sua produção criativa, das estadas em Nova York, de Por
tinari, Oiticica, Antonio Henrique Amaral e Regina Vater? Em que medida
se isolaram, concentrando-se em sua obra, ou, ao contrário, a vivência ame
ricana resultou em alteração de caminhos e de índole, para sua eventual pro
dução posterior?
Na verdade, o Brasil talvez seja um dos países da América Latina mais
recessivos a uma articulação cultural com os Estados Unidos, na área de ar
tes visuais, entre 1920 e 1970. Porque, até os anos 60, nossos olhos estavam
em Paris, e, após os anos 50, também na Suíça, com as lições do Concretis-
mo, por um breve período, antes da chegada do Tachismo, eloqüente nas re
presentações espanholas às Bienais de fins dessa mesma década.
54
7.
M ade in England:
uma visão da América Latina
[1988]
1 Sobre o tema ver o livro de Dawn Ades, Arte na América Latina: a era m oderna (1820-
1980), São Paulo, Cosac & Naify, 1997.
ARTE NA AMÉRICA LATINA
idéia seria uma seleção nostálgica, de certa maneira, focalizando obras dos
anos 50 e 60, no período da emergência dessas tendências, e baseada na mi
nha escolha, no caso dos brasileiros — Oiticica, Clark e Camargo -—, a par
tir de meu contato com eles à época.”
Na realidade, conta-nos Guy Brett que foi através do inglês David Me-
dalla que, em 1965, pela primeira vez, ouviu referências às obras de Sérgio
Camargo, então residente em Paris.
Travou contato com a obra de Lygia Clark, que expôs em Londres por
essa época, e veio ao Brasil nesse mesmo ano de 1965 para ver a Bienal de
São Paulo (uma das “estrelas” dessa Bienal era Donald Judd). No Rio de Ja
neiro conheceu os trabalhos de Hélio Oiticica. Guy Brett não perderia mais
contato com Oiticica, com quem passou a se corresponder regularmente e,
em 1967, convidou-o a expor em Londres. Como a Signals não existia mais,
conseguiu realizar a exposição de Oiticica, que se seguia a sua apresentação
“Tropicália”, do Rio de Janeiro, na Galeria Whitechapel. Cuidadoso catálo
go acompanhou essa exposição, talvez a mais bem preparada de toda a traje
tória profissional de Oiticica.
“Como foi a receptividade em Londres para a obra de Lygia Clark e
Hélio Oiticica?” Brett responde: “Lygia Clark não teve uma boa cobertura
por parte da imprensa e, assim, sua apresentação talvez tenha sido muito dis
creta. Já com Oiticica foi diferente, pelo sensacionalismo da exposição. Não
houve, em seu caso, possibilidade de indiferença. Houve quem criticasse
acirradamente a mostra e os que se fascinaram com ela, com o grande espa
ço e a animação por ele montada com suas criações”.
“Como se vê hoje, já com a perspectiva do tempo, a obra de Oiticica?
Uma parte de suas perform ances não pode ter ficado datada?” Responde ele:
“Datada, não creio. Mas acho que Parangolés e Capas só podem ser apresen
tados devidamente, isto é, com fidelidade ao espírito de sua concepção, caso
se apresentem animados, como foram mostrados pela primeira vez”.
A Signals também se interessou por apresentar uma exposição de Mira
Schendel, por quem Guy Brett nutre grande admiração e cujo trabalho acom
panha. Porém, à época, a existência efêmera daquela galeria (1964-1966) fez
com que essa exposição fosse encerrada prematuramente. Daí porque em sua
estada de dois dias em São Paulo (e uma semana no Rio de Janeiro) Guy Brett
visitou coleções particulares, tendo a oportunidade de ver uma rara obra de
56
MA DE IN ENGLAND: UMA VISÃO DA AMÉRICA LATINA
Mira Schendel da década de 50, além de várias dos anos 60 e 70, e seus tra
balhos mais recentes. Além do mais, visitou o ateliê de José Resende, bem
como as exposições de Hermelindo Fiaminghi e Luiz Sacilotto, dando-nos a
impressão de que viera para observar e ouvir. Esteve também com os poetas
concretistas Décio Pignatari, Haroldo e Augusto de Campos, visitou galerias
e a coleção de peças concretas e neoconcretas de Adolpho Leirner.
Da Venezuela, declarou-nos, limitou-se à escolha de obras dos três gran
des artistas cinéticos, Jesus Rafael Soto, Carlos Cruz-Diez e Alejandro Ote-
ro, embora não saibamos a razão da ausência dos artistas argentinos de preo
cupações cinéticas e ópticas (como Le Pare e Gyula Kosice, por exemplo, tam
bém da época focalizada por Guy Brett).
Interessado há algum tempo nas relações entre arte e política, Guy Brett
publicou recentemente um livro, Through Our Own Eyes (Londres, 1986),
sobre artistas populares socialmente comprometidos, focalizando a criativi
dade e o artesanato do Chile pós-Pinochet, trabalhos manuais de denúncia e
conscientização, bem como pinturas da África e da China.
Dawn Ades ainda considera passível de revisão o projeto de sua expo
sição latino-americana. Porém, até o momento, ela trabalha, segundo nos
comunica, dividindo a mostra nos seguintes segmentos: 1) Retratos de Inde
pendência, incluindo retratos de heróis e líderes dos movimentos de liberta
ção da América Latina; 2) A Academia e a pintura histórica; 3) O pitoresco
e a vida cotidiana; 4) Arte nativa americana; 5) Paisagem; 6) A tradição grá
fica popular: sátira social e política; 7) A busca de raízes (em que seriam fo
calizados artistas modernistas como Tarsila, Di Cavalcanti, Figari, Torres-
García); 8) Os muralistas mexicanos; 9) Arte gráfica revolucionária (abordan
do México e Cuba); 10) Pintura de paisagem do século XX; 11) Construti
vismo (que cobrirá da vanguarda do grupo Madí, argentino, ao projeto da
construção de Brasília); 12) Surrealismo; 13) Arte óptica e cinética (segmen
to a cargo de Guy Brett. Embora o crítico não tivesse conhecido o trabalho
de Palatnik, o contato com um dos aparelhos do precursor da arte cinética
entre nós foi possível através da coleção de Adolpho Leirner); e 14) História
e identidade. Neste segmento, o projeto pretende focalizar “um número limi
tado de grandes artistas contemporâneos que tratam de maneira nova alguns
dos temas críticos e itens já articulados na exibição com relação à questão
central de identidade nacional”.
57
ARTE NA AMÉRICA LATINA
1 O peruano Juan Acha foi crítico de história da arte da América Latina, desde os anos 50,
e coordenador do Instituto de Investigações Estéticas da Universidade Nacional Autônoma do
México, país onde faleceu em 1995. Destacam-se, entre as suas principais publicações: Artey
sociedad: Latinoamerica — el sistema deprodu cción (1971); Artey sociedad in Latinoamerica — el
produeto artísticoy su estructura (1979); El consumo artísticoy sus efectos (1988); E nsayosyponencias
Latinoamericanistas (1984) e Introducción a la teoria de los disenos (1988).
ARTE NA AMÉRICA LATINA
60
O MEMORIAL DA AMÉRICA LATINA: ENTREVISTA DE JUAN ACHA A ARACY AMARAL
JUAN ACHA — Claro, elas existem em alguns países, se bem que muitas
foram convertidas em espetáculos, como o Carnaval.
61
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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O MEMORIAL DA AMÉRICA LATINA: ENTREVISTA DE JUAN ACHA A ARACY AMARAL
vemos nao é uma arte que objetiva o horrível, mas que propõe esquema-
tizações mais intelectuais, uma maior simplificação. A arte medieval é a pri
meira estética ocidental que vai subsistir: os cristãos das catacumbas preci
savam rejeitar a beleza e o naturalismo romanos e desenvolvem uma arte
baseada nas mitologias e no Pantocrator e em todos os horrores românicos.
Então a cultura ocidental dá uma marcha à ré, e retoma a beleza greco-ro-
mana (que os primeiros cristãos tinham rejeitado), em função do desenvol
vimento do capitalismo. E essa arte chega a seu ápice no artesanato medie
val, nas corporações.
ARACY AMARAL -— Voltando à exposição de arte popular, você não acha que
uma exposição que parta desses critérios que você propõe seria também muito in
telectual na focalização da arte popular e, portanto, não tão inocente ou espon
tânea como a própria manifestação popular?
JUAN ACHA — Sempre ocorreria uma certa manipulação, mas parece-me
a única maneira de propor um estudo da oralidade e das canções como a fonte
principal para explicar esses fenômenos, e não do ponto de vista da estética
ocidental.
63
ARTE NA AMÉRICA LATINA
tas da América Latina. Isso é terrível. E poucas esculturas, para de alguma ma
neira equilibrar a solidão do cimento nesses espaços abertos. Essa é a impres
são que se tem. Celebro a iniciativa de se concentrar na arte popular, mas isso
justifica a negação da “arte culta”? O Memorial parece querer apoiar-se no
popular com completo descuido de outros tipos de manifestações. Até que
ponto isso é válido, quando a realidade é conformada por ambas? Então é
demagógico, e vê-se que essa postura vem do ponto de vista antropológico
de seu principal assessor, Darcy Ribeiro, que deveria revisar seus conceitos bá
sicos estéticos. O ensaio em que aborda a arte indígena (na obra História g e
ral da arte no Brasil, organizada por Walter Zanini) está centralizado na be
leza. Hoje em dia, quando se levantam outras teorias, como na Alemanha
Oriental, baseadas em Peter Weiss, a estética da resistência, e quando se afir
ma que depois dos campos de concentração não se pode mais escrever poe
sia, vivemos num tempo em que predomina a violência, o terrorismo etc., e
ninguém parece ter mais nenhuma razão válida para falar de beleza... Então
o que predomina é o “horror”, a que se contrapõe a resistência a tudo isso,
com o “sublime”. A postura de Darcy Ribeiro, privilegiando a riqueza for
mal e não a motivação religiosa, é a de pesquisadores que colecionam coisas.
Ao mesmo tempo, temos como preocupação conhecer, na América Latina, a
nossa realidade, o que pode nos enriquecer muitíssimo com novas perspecti
vas. Na estética popular há também a estética rural, e a provincial, vinculada
ao catolicismo, porque, se vamos nos meter em outra estética, podemos che
gar à estética dos cinturões de miséria...
64
■
9.
Brasil na América Latina:
uma pluralidade de culturas
[1990]
1 Carlos Fuentes, “Jacobo Borges”, in Jacobo Borges , Berlim, Staatliche Kunsthalle, dez.
1987, p. 31.
65
ARTE NA AMÉRICA LATINA
66
BRASIL NA AMÉRICA LATINA: UMA PLURALIDADE DE CULTURAS
67
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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BRASIL NA AMÉRICA LATINA: UMA PLURALIDADE DE CULTURAS
69
ARTE NA AMÉRICA LATINA
a partir dos anos 70, apesar de ser denominada ainda por muitos saudosistas
de “provinciana”, como o maior centro impulsionador de atividades artísti
cas do país, ao mesmo tempo em que se assiste ao crescimento de energéticos
pólos regionais que marcam nossa vida cultural (Cuiabá, Porto Alegre, Curi
tiba, Recife, Belo Horizonte, Fortaleza, Belém, entre outros).
Com mercado de arte próprio, sistema de produção e distribuição ar
tística, o Brasil na década de 80 se apresenta como uma arena vital de cria
tividade, embora de frágil sustentação no que diz respeito a entidades mu-
seológicas. A Bienal de São Paulo, existente desde 1951 com regularidade
impecável, se tem sido irregular, do ponto de vista qualitativo ou de concei-
tuação, foi um fator preponderante no impulso à internacionalização da arte
nos dois maiores centros do país, São Paulo e Rio de Janeiro.
Se o marcante Modernismo brasileiro nos anos 20 significou, simulta
neamente, um anseio de afirmação de brasilidade e, ao mesmo tempo, a ne
cessidade de atualização de nossa linguagem plástica, Hélio Oiticica e Anto
nio Dias representam um marco para a nossa arte nos anos 60, por suas con
tribuições; o primeiro em salto do Concretismo para um “clima” local em
suas criações da fase Tropicália, baseadas na vivência da escola de samba
Mangueira e num meio urbano marcado pela violência e pela contradição.
Por outro lado, tanto Cildo Meireles como Tunga expressam bem, nos anos
70, a “magia” brasileira e o espírito de uma visível cultura ainda em gesta
ção. A pintura de Antonio Henrique Amaral e João Câmara Filho projetam
esse período autoritário, com ambigüidade perceptível, óbvia, um aspecto da
realidade projetada conceitualmente, através da arte brasileira.
Fenômeno poderoso em sua vitalidade criadora é, no Brasil, a jovem
geração de artistas que começou a surgir nos primeiros anos da década de 80,
com a retomada da pintura na Europa e nos Estados Unidos. De início, fo
ram marcados pelo neo-expressionismo alemão ou pelas transvanguardas de
Bonito Oliva, após a Bienal de 1985, os caminhos de cada artista se altera
ram de tal forma e em função do choque da receptividade rápida, a partir de
suas individualidades, que o panorama dessa fornada é de grande diversida
de. Nunca uma geração brasileira foi tão festejada por museus e bienais.
Nunca uma geração de artistas brasileiros foi tão observada e convidada para
eventos fora do país, sobretudo pela Europa. Do ponto de vista formal, o es
tágio atual desses artistas é caracterizado pela poética, muito mais que pela
70
BRASIL NA AMÉRICA LATINA; UMA PLURALIDADE DE CULTURAS
72
MODERNIDADE E IDENTIDADE
73
ARTE NA AMÉRICA LATINA
ser interessante ter em mente essas suas reflexões ao desejarmos fazer algumas
considerações em torno à Modernidade e identidade no processo latino-ame
ricano. A inteligência teórica excepcional de um artista como Luís Felipe Noé
já se referiu, há algum tempo, à “nostalgia da história”, em função, como diz
ele, da “carência de passado próprio (não ser filho de uma tradição)” nos
meios artísticos da América Latina.2 Ao mesmo tempo, essa não-vinculação
com a História traria como resultado, num momento de revisão de nossos
valores e de desejo de renovação artística, como ocorreu a partir do Moder
nismo, a busca de raízes, fossem elas nossas próprias, da terra entendida como
natureza, ou de povos ancestrais da América Latina antes da descoberta pe
los europeus.
Na América Latina, Modernidade tem a conotação de novo, como em
toda parte. Só que o novo, para nós, chegou impregnado de um sentido de
auto-afirmação. O “moderno”, na Europa de fim de século, trazia implícito
um comportamento urbano que exaltava a cidade, o fenômeno da multidão,
de solidão, por tudo isso muito vinculado também a um sentido romântico
dos novos tempos. Já entre nós, no meio das artes plásticas, essa postura ocor
re num momento em que se repensa o nacional em termos de valorização do
popular, simultaneamente à descoberta do internacionalismo da Escola de
Paris, ponto de encontro da intelectualidade e meio artístico da época. É o
tempo do nascer da industrialização em nossos países, e o adensamento de
mográfico das cidades traz, em especial em São Paulo, no Brasil, uma altera
ção de comportamento em função da chegada de uma massa de imigrantes,
cujas tradições são diversas daquelas do português que nos colonizara ou da
cultura do africano que fora elemento de mestiçagem fundamental e a mão-
de-obra na mineração e na agricultura dos primeiros séculos de ocupação
européia. Ou seja: em reação ao desvairo dos ecletismos do fim do Oitocen-
tos, o desejo do auto-reencontro. Claro está ser essa uma postura romântica:
o novo é sermos nós mesmos, proposição difícil de encarar teoricamente, mais
difícil ainda de ser posta em prática. Afirmação de valor, que começa no
74
MODERNIDADE E IDENTIDADE
75
ARTE NA AMÉRICA LATINA
Gilberto Freyre; todos estes dados se somam à arte colonial revisitada a par
tir das viagens dos modernistas paulistas ao Rio de Janeiro e Minas Gerais
em 1924.
Isso poderia assinalar a presença do exotismo em nossos Modernismos.
Mas que o exotismo faz parte do ideário do Modernismo também não é no
vidade. A própria Dore Ashton o enfatiza, colocando-o paralelamente ao
cosmopolitismo como característica do moderno. Refere-se ela ao exotismo
como “uma das autênticas forças motivadoras do Modernismo. Ou, talvez,
na alma de quase todos os artistas. O desejo pelo que é de fora, distante, di
ferente, e, se possível, misteriosamente inacessível em termos de sua signifi
cação, está constantemente expresso através da era moderna”.3
Nos anos 20, pensa contudo Juan Acha, a preocupação com o popular
ou com o índio não ocorre por amor “às maiorias demográficas ou ao índio,
mas pelo nacionalismo de Estado que precisava olhar a arte de nosso passa
do e do povo através dos conceitos ocidentais de arte culta, com o propósito
de prestigiá-lo e suscitar o conseqüente orgulho nacional”.4 Ele coloca, assim,
a ideologia do Estado junto à modernização da arte para fins de prestigiar uma
determinada sociedade. Isso não é novo no Brasil, quando no período Vargas
se desejou projetar a imagem de um país progressista, cujo principal e mais
destacado monumento foi, sem dúvida, o edifício do Ministério da Educa
ção, construído no Rio de Janeiro, entrada do Brasil, por equipe inspirada
em Le Corbusier. Em São Paulo, entretanto, núcleo da Modernidade no Bra
sil, a arquitetura já apareceu em 1907 com Victor Dubugras, e nos anos 20
com Gregori Warchavchik e Flávio de Carvalho, estes últimos em iniciati
vas particulares, que marcam o estado de São Paulo desde sempre.
Essa ideologia do moderno, contudo, não é inerente ao Modernismo
brasileiro, no qual o popular decorre de uma redescoberta dos valores nati
vos, quem sabe até mesmo pelo interesse que desperta fora do país. E o que
ocorreu com Tarsila, por exemplo. E é mais ou menos o que diz Marta Traba
quando escreve: “pode-se afirmar, recordando os vários tipos de hibridismo
76
MODERNIDADE E IDENTIDADE
5 Marta Traba, Duas décadas vulneráveis nas artes plásticas latino-americanas: 1950-1970, Rio
de Janeiro, Paz e Terra, 1978, p. 16.
6 Antonio Berni, comunicação apresentada no Primeiro Encontro Ibero-Americano de Crí
ticos de Arte e Artistas Plásticos, Caracas, 1978, pp. 10-1.
77
ARTE NA AMÉRICA LATINA
78
MODERNIDADE E IDENTIDADE
79
ARTE NA AMÉRICA LATINA
so
MODERNIDADE E IDENTIDADE
10 Hélio Oiticica, Aspiro ao grande labirinto, Rio de Janeiro, Rocco, 1986, p. 104.
81
ARTE NA AMÉRICA LATINA
82
11.
Cêntricos e ex-cêntricos:
que centro? onde está o centro?
[1990]
1 José Saramago, “Duas verdades sobre a Europa”, Atlante, n° 3, ano 1, São Paulo, 1990.
83
ARTE NA AMÉRICA LATINA
2 Arturo Uslar Pietri, “El mestizaje creador”, in La otra América , Madri, Alianza Editorial,
1974, p. 27.
3 Idem, ibidem, p. 26.
4 T. S. Eliot, Notas para la definición de la cultura, Barcelona, Bruguera, 1984, p. 81.
5 Idem, ibidetn, p. 84.
84
CÊNTRICOS E EX-CÊNTRICOS: QUE CENTRO? ONDE ESTÁ O CENTRO?
É a este dado em particular que faz referência Dore Asthon quando re
gistra que os Estados Unidos, ao chegar à culminância da pop art, reconhecida
mundialmente, depois que passam a se considerar “os maiores”, perderam seu
“intercâmbio com a Europa e puseram em risco sua própria cultura que não
se achava mais aberta ao influxo de outros valores”.6 Daí seu gradativo em
pobrecimento do ponto de vista de efervescência cultural, apesar do movi
mento de eventos e mercado que caracterizam a cena americana. Como con
seqüência desses dados, Dore Asthon assinala que virá do Terceiro ou Quar
to Mundo uma mestiçagem benéfica para romper uma espécie de rarefação
da cultura que se isola. A autora menciona que, hoje, Estados Unidos e Eu
ropa não possuem mais a competitividade que caracterizou suas relações cul
turais durante décadas e agora tendem a se unificar sob este aspecto. Como
fugir ao “padrão”?
Do ponto de vista de enriquecimento cultural não é suficiente, claro
está, observar apenas o fenômeno Estados Unidos-Europa. E preciso ir mais
além, observar a contribuição de outras culturas como ocorreu na relação
Egito-Grécia, ou, no século passado, na relação tão conhecida arte japonesa-
impressionismo, ou arte africana-cubismo etc. A razão pela qual o Terceiro
Mundo começa a despertar interesse não é apenas, portanto, por seu valor
em si, porém por uma questão de sobrevivência dessas culturas do Primeiro
Mundo. Sintomático, nessa direção, o conceito da exposição “Magiciens de
la Terre”, de Jean-Hubert Martin, no Centro Georges Pompidou, evento
ecumênico que reuniu manifestações visuais de países desenvolvidos e sub
desenvolvidos, sob um mesmo teto, gerando polêmicas.
Dore Asthon, nesse iluminado artigo (“Round Trip”),7 analisa a rela
ção Estados Unidos-Europa como relação centro-periferia e depois centro-
centro em seu desenvolvimento, e lembra que, se antecipando ao seu meio
como centro hegemônico na década de 60, muito antes, em 1934, “um im
portante administrador do WPA Arts Project escreveu: A arte americana está
declarando moratória de suas dívidas à Europa e voltando para cultivar seu
6 Dore Ashton, “Round Trip”, Colóquio Artes, n° 84, Lisboa, mar. 1990, p. 12.
7 Idem, ibidem.
ARTE NA AMÉRICA LATINA
8 Idem, ibidem, p. 9.
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CÊNTRICOS E EX-CÊNTRICOS: QUE CENTRO? ONDE ESTÂ O CENTRO?
87
ARTE NA AMÉRICA LATINA
sos largos para a industrialização. Não é, portanto, por acaso que a Semana
de Arte Moderna ocorreria em São Paulo em 1922, ou que nesta cidade se
realizariam os Salões de Maio da década de 30, que foram, como iniciativa e
internacionalismo, uma antecipação das Bienais de São Paulo. A abertura do
Museu de Arte de São Paulo e do Museu de Arte Moderna (1947 e 1948,
respectivamente) traria como resultado uma intensificação das atividades ar
tísticas e iniciativas culturais na capital paulista. O Brasil viveria até os anos
60 de tradicional ausência de comunicação interna, e esse isolacionismo fa
vorece tanto o regionalismo quanto a existência dos dois centros considera
dos “arejados” (Rio de Janeiro e São Paulo). Mário de Andrade registrou em
1942, contudo, que foram os modernistas dos anos 20 que operaram em ter
ritório nacional “essa conquista de descentralização intelectual, hoje em con
traste berrante com outras manifestações sociais do país”. Refere-se ele à in
tenção de sistematizar uma “cultura” nacional, o que solicitou da Inteligên
cia acompanhar o que se passava, a partir dos anos 20, em várias partes do
país, pelo menos na área da literatura. Assim, diz ele explicitamente, que se
as cidades “de primeira grandeza fornecem facilitações publicitárias sempre
especialmente estatísticas, é impossível ao brasileiro nacionalmente culto ig
norar um Erico Veríssimo, um Ciro dos Anjos, um Camargo Guarnieri, na
cionalmente gloriosos do canto das suas províncias”.9
Elemento novo viria alterar esse panorama do mundo cultural do Bra
sil: a construção de Brasília, utopia realizada, e com sua inauguração (1960),
logo os regimes militaristas objetivam a unificação do país por meio da co
municação (rodovias, telecomunicação, telefonia etc.), controle único a ema
nar da nova capital no centro geográfico do território. É a partir dos anos 60,
igualmente, que começa a se elevar como poder a cadeia Globo de televisão,
a comunicação por satélite fazendo chegar a todas as cidades do país imagens
e informações que representaram uma tentativa de “pasteurização” da men
talidade do brasileiro. Se bem que, como diz Herbert Read: “Não se pode
impor uma cultura de cima — ela deve vir de baixo. Cresce do solo, das pes
soas, de sua vida diária e trabalho. É uma expressão espontânea de sua ale
9 Mário de Andrade, O m ovim ento modernista , Rio de Janeiro, Casa do Estudante do Bra
sil, 1942, pp. 60-1.
89
ARTE NA AMÉRICA LATINA
gria de viver, de sua alegria no trabalho, e se esta alegria não existe, a cultura
não existe”.10 Mas, na verdade, mesmo que não se possa impor uma cultura
desde cima, a tentativa de alterar um comportamento pode também se con
figurar como uma turbulência cultural atingindo as várias regiões do país.
A criação de Brasília teve conseqüências mais substantivas que a ocupa
ção e valorização das vastas regiões do Brasil Central e Oeste, a partir dos anos
60, ligadas por rodovias e transporte aéreo. Do ponto de vista cultural, ocorre
uma pulverização de centros culturais por todo o país e este é um dado posi
tivo, se considerarmos a extensão territorial do país, enquanto ocorre um
deslocamento de centro do Rio de Janeiro para São Paulo, tendo lugar nesta
capital a ativação cultural mais intensa a partir de inícios dos anos 70. M u
seus deficientes e pouco assistidos são regra geral no Brasil, porém, após a
fundação de Brasília, o Rio de Janeiro se ressente a cada dia mais dessa falta
de visão, de nossos homens públicos. Assim, suas instituições culturais, esta
tais federais, decaem, em triste abandono, comprometendo o desenvolvimen
to intelectual e universitário. Em São Paulo, onde é forte a iniciativa priva
da, não se sentiu a passagem do poder para Brasília, pois, nesta capital, ou
essas instituições são de iniciativa privada patrocinadas pela municipalidade
ou pelo estado de São Paulo, ou são subvencionadas pelo meio empresarial,
como é hoje o caso da Bienal de São Paulo. Mesmo quando o estado de São
Paulo não protege devidamente seus museus já existentes e afetos ao gover
no estadual, outros espaços se abrem, em dinâmica inexistente no Rio. Po
dem ser fruto de atuação política local aventureira ou eleitoreira, porém tra
zem frutos inevitáveis de animação, como é o caso do Centro Cultural São
Paulo ou do Memorial da América Latina, este último de discutível arquite
tura, obra tardia de Oscar Niemeyer, e que surgiu em seu primeiro momen
to desprovido de projeto cultural explícito.
A diferenciação mais marcante entre esses dois fortes pólos produtores
de arte, Rio de Janeiro e São Paulo, reside no fato de que o segundo possui
um mercado de arte mais dinâmico, com maior número de galerias e de pu
blicações sobre arte, assim como superior em quantidade de espaços alterna
tivos, ao passo que o Rio de Janeiro atuou, até inícios deste ano de 1990, com
10 Herbert Read, To Hell with Culture , Nova York, Schoken Books, 1976, p. 78.
90
CÊNTR1COS E EX-CÊNTRICOS: QUE CENTRO? ONDE ESTA O CENTRO?
91
ARTE NA AMÉRICA LATINA
92
12.
O México e nós
[1991]
93
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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O MÉXICO E NÓS
95
ARTE NA AMÉRICA LATINA
96
13 -
Chile: a volta do Museu da Solidariedade
[1992]
97
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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CHILE: A VOLTA DO MUSEU DA SOLIDARIEDADE
Bridget Riley, Kenneth Armitage, e deveriam seguir para o Chile após sua
exibição. Ocorrendo o golpe em setembro de 1973, entretanto, o envio foi
sustado. Caberá agora ao Museu da Solidariedade Salvador Allende localizar
a coleção inglesa a fim de juntá-la às demais já reunidas no Chile.
Na primeira etapa do projeto, quando as obras chegaram a ser enviadas
ao Chile, chegaram a Santiago obras de artistas italianos, venezuelanos, ar
gentinos etc. Hoje há obras da coleção do Museu da Solidariedade esparsas
ainda por diversos países: algumas em Cuba, que guarda também obras da
Colômbia, Polônia e México. Já Canogar, artista espanhol, enviou obras para
o Chile e, posteriormente, para a entidade, na Espanha.
Em maio se inaugurou em Valência a exposição da parte espanhola,
posto que esta cidade se encarregou de garantir as perfeitas condições da re
presentação desse país, assim como ofereceu meios para o início da constru
ção do novo museu.
Uma das coleções mais vastas e tocantes pela generosidade de seus ar
tistas é a da Suécia, incluindo nada menos que 110 obras de 59 artistas co
nhecidos, entre os quais Oyvind Fahlstrom e Olle Baertling. Uma exposição
circulante, como na Espanha, também itinerou por cidades suecas entre 1978
e 1981. Iniciado o processo de redemocratização no Chile, a Suécia provi
denciou o envio das obras para Santiago. Fazendo alusão ao nome do mu
seu, Soren Engblom, do Museu de Arte Moderna de Estocolmo, menciona
o fato de que “a solidariedade se dirige à principal manifestação da demo
cracia: uma liberdade de expressão em sentido profundo...”.
Em seu conjunto, a coleção hoje reúne cerca de quinhentas obras, com
grande heterogeneidade qualitativa, embora na segunda etapa do Museu da
Solidariedade a participação dos artistas fosse feita por convite. Na primeira
etapa, antes da queda de Allende, foi importante o papel desempenhado por
Mário Pedrosa em Santiago, sua presença à frente da iniciativa. Assim, até
hoje, Pedrosa tem um mito rodeando sua presença no Chile naqueles anos
pela geração que o conheceu. Miguel Rojas Mix era o diretor do Instituto de
Arte Latinoamericano, junto a quem trabalhou Pedrosa. Todavia, o Institu
to dependia da Faculdade de Belas Artes da Universidade do Chile, de que
era então diretor José Balmes. E não houve tempo nem meios suficientes para
maiores atividades embora se tenham realizado encontros e simpósios com
argentinos e mexicanos.
99
Mlll ARTE NA AMÉRICA LATINA
100
CHILE: A VOLTA DO MUSEU DA SOLIDARIEDADE
países. Mas servirá de exemplo de que, quando convocados para uma toma
da de posição, possuem a generosidade de doar o produto de seu trabalho pa
ra uma causa que reputam como digna.
101
14.
Abstração geométrica na América do Sul:
a Argentina como precursora
[1 9 9 2 ]1
1 Versão condensada deste texto foi publicada no catálogo da exposição “Latin American
Artists o f the Twentieth Century”, como primeira parte do ensaio “Abstract Constructivist Trends
in Argentina, Brazil, Venezuela and Colombia”, MoMA, Nova York, 1993.
102
ABSTRAÇÃO GEOMÉTRICA NA AMÉRICA DO SUL: A ARGENTINA COMO PRECURSORA
2 “Parece ser o destino dos artistas latino-americanos e sul-americanos que, ao mesmo tem
po em que seü trabalho tem sido freqüentemente mostrado e respeitosamente recebido nos Esta
dos Unidos, eles raramente conquistaram o tipo de reputações espetaculares que caracterizaram a
cena artística norte-americana — pelo menos durante os anos 6 0 ”, James R. Mellow, “Edgar
Negret: Sculpture for the Space Age”. Tradução da Autora.
103
ARTE NA AMÉRICA LATINA
um Guy Brett, desde os anos 60, sensível diante destes criadores (nos casos de
Clark, Oiticica e Schendel). É indubitável que os convencionais meios artísti
cos norte-americano ou europeu só começaram a atentar para artistas abaixo
do Equador quando as circunstâncias atuais do meio internacional plus a res
peitabilidade de Guy Brett começaram a assinalar sua validade. Pelo menos
no caso brasileiro parece ter ocorrido dessa forma. Depois de sua intervenção,
os convites e o reconhecimento internacionais têm se sucedido, encadeados.
O próprio Romero Brest, crítico argentino, teria estado ele tão atento
ao movimento Madí ou aos concretos argentinos? Em fim dos anos 40 e iní
cio dos 50 o que se observa em sua revista Very Estimar, antológica na for
mação de toda uma geração de críticos e até de marchands argentinos, era um
eurocentrismo bem à moda da época. Ou seja, Romero Brest discutia o
abstracionismo e o concretismo à luz do que se passava na Europa. Só em
outra etapa se valorizaria a criação ou a invenção doméstica.
No caso argentino, apesar da atenção excepcional de uma galeria pres
tigiosa como a de Denise René, em Paris, já em fins dos anos 50, somente
agora, após a compra de lote ponderável de peças do concretismo e artistas
Madí argentinos por galeria de Basiléia, Suíça, há cerca de dois ou três anos,
é que se começa a considerar com cuidado a importância de que permaneçam
no país de origem obras que se esvaem para o Exterior, a dificultar a presen
ça em museus sul-americanos de criações antológicas desse período-chave.
Já nos anos 1910, Emilio Pettoruti realiza obras abstratas depois de sua
militância pelas lições do cubismo, de que é um precursor na América do Sul.
Se vamos nos referir ao cosmopolitismo na Argentina é forçosa uma menção
ao original Xul Solar, assim como a Del Prete quem, de volta de Paris, em
1933, realiza exposição com colagens abstratas. Os escultores Antonio Sibel-
lino e Pablo Curatella Manes seriam igualmente antecipadores da abstração
nas duas décadas seguintes.
Há já publicações antológicas sobre a arte desse período na Argentina,
seja por Córdova Iturburu, como por Romero Brest, Aldo Pellegrini, Nelly
Perazzo, Jorge Glusberg e Salvador Presta. Perazzo confirma que o país, em
meados dos anos 40, desfruta elevado nível de qualidade de vida e é um dos
mais promissores países do mundo. Em 1944 aparece a revista Arturo, com
um grupo novo, liderado por Tomás Maldonado, a resultar em desdobramen
tos vários na arte de novas tendências abstrato-geométricas na Argentina.
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ABSTRAÇÃO GEOMÉTRICA NA AMÉRICA DO SUL: A ARGENTINA COMO PRECURSORA
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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ABSTRAÇÃO GEOMÉTRICA NA AMÉRICA DO SUL: A ARGENTINA COMO PRECURSORA
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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ABSTRAÇÃO GEOMÉTRICA NA AMÉRICA DO SUL: A ARGENTINA COMO PRECURSORA
design, posto que houve uma articulação entre a arquitetura e a arte concreta
no Brasil? Ao contrário da Argentina, onde se vê que o interesse pela arqui
tetura e o design é posterior, em alguns anos, ao surgimento da arte concreta.
Por convite de Del Marie, desde Paris, Kosice é convidado em 1947 a
participar do Salon Réalités Nouvelles com seu grupo. Na verdade, a sala
dedicada a Madí em Paris em 1948, com relevos transformáveis, obras arti
culadas e pinturas sem quadro, chama a atenção da crítica francesa: Ragon
menciona como “notre étonnem ent et notre amusement lorsque nous vümes cette
prem iere exposition M adi à Paris”. Kosice reivindica para a mesma época suas
primeiras esculturas com néon, coisa que os americanos fariam somente 20
anos depois. E realizaria em 1957 sua primeira escultura hidráulica. Somen
te por essa época Kosice irá a Paris, e em 1958 a Galerie Denise René expõe
os artistas Madí; em 1960 Kosice se apresenta individualmente na mesma
galeria, prefaciado por Michel Seuphor.
Húngaro como Moholy Nagy, como Vasarely e como Laszlo Péri, e o pri
meiro artista, talvez, a realizar, em 1922, a abolição da moldura da obra, co
locada diretamente sobre a parede — se não tomarmos em conta as compo
sições em relevo de Picasso, por exemplo, de 1914 — , Kosice é tempera
mental em sua vitalidade, que chega a aparentar agressividade em suas pro
posições que pregam a fundação de uma “arte de espírito matemático, frio,
dinâmico, cerebral, dialético”, no manifesto de junho de 1946.
Inquietações permanentes fazem de Kosice um personagem que man
tém a intensidade de suas buscas. Para ele, arte, ciência e tecnologia são uma
tríade de ouro. “Viveremos um dia na Cidade Hidroespacial?”, pergunta-se
Pierre Cabanne diante das elocubrações de Kosice que, atento a Leonardo da
Vinci, sonha alto. O artista húngaro-argentino imaginou, segundo Cabanne,
“cidades aéreas, em um mundo em que espaço e tempo, a luz e a água se con
jugam com o fantástico e o poético”. E lembra Rafael Squirru que, quando
o manifesto Madí de 1946 falava de “arquitetura móvel e deslocável no es
paço”, todos sorriram com ceticismo. Hoje, porém, pensamos nós, a tecno
logia levou a tal ponto sua influência sobre a cidade e o fazer do homem que
as realizações arquitetônicas do grupo “Site”, por exemplo, são uma decor
rência natural de nosso tempo. Percebe-se, assim, a postura de Kosice como
uma das utopias válidas da modernidade de nosso século, pois, como escre
veu Vasarely, é “pela água e o movimento, do qual Kosice faz parte, que o
109
ARTE NA AMÉRICA LATINA
novo pensamento plástico está presente nas extensões físicas do mundo, nas
prolongações infinitas da consciência universal”.
Raul Lozza também funda seu movimento, em 1947, “Perceptismo”,
baseado na transformação, em contraposição à ilusão ótica do movimento.
Assim, seu movimento “perceptista” se baseia na “Cualimetria” (qualidade
mais quantidade) e afirma com segurança que a pintura de moldura irregular
é abstrata. Não é concreta porque há uma representação de espaço frontal.
Para que isso seja evitado, resolve: 1) introduzir a noção do campo colorido;
2) uma estrutura aberta, centrípeta, do centro à periferia; 3) uma teoria nova
da cor baseada na potencialidade relativa; 4) aplicação da “cualimetria” da
forma plana, sendo a matemática uma ferramenta a mais, posterior à praxis
criadora. Assim, se a cor do campo muda, muda a cor dos planos. Assim como
a relação de cores está determinada pela qualidade das formas.
O processo de criação de Lozza talvez seja um dos mais artesanais, apesar
de não se perceber a mão do artista, tal a elaboração de seu trabalho. Para ele,
a noção do “campo”, ou do “color field " do suporte, é a parede, como um
muralismo geométrico. Quando nos referimos à presença de um aparente
quadro convencional sob suas angulosas formas retilíneas recortadas, con
testa que o suporte retangular não passa de “um pedaço de parede”; mas tal
vez aí resida a contradição de sua obra. Trabalhando sobre conglomerado ou
madeira compensada, aplica primeiramente óleo e esmalte mesclados a fim
de obter consistência para a cor. Somente depois de passar lixa d’água, pedra
pome e limpar com água-raz a superfície pintada, em refinado polimento, é
que o artista a considera pronta para a aplicação do verniz.
Depois da viagem de Tomás Maldonado pela Europa, e após seu con
tato com Max Bill, é dissolvida a Asociación Arte Concreto-Invención, e
Maldonado forma um grupo de artistas concretos com Lidy Prati, Enio Iom-
mi, Cláudio Girola e Alfredo Hlito, diretamente vinculado aos princípios de
Max Bill.
Na busca de uma arte objetiva e não representativa, com formas que
fossem válidas por si, em composições fiéis à bidimensionalidade da superfí
cie dos trabalhos, de romper com a moldura retangular, os pintores começa
ram a trabalhar com materiais também condizentes com sua postura: de óleo
sobre cartão (Arden Quin) a óleo sobre conglomerado (Lydi Prati), ou óleo
sobre madeira, abandonando eventualmente a tela, embora sobre ela traba
110
ABSTRAÇÃO GEOMÉTRICA NA AMÉRICA DO SUL: A ARGENTINA COMO PRECURSORA
112
MULTICULTURALISMO, NOMADISMO, DESTERRITORIALIZAÇÃO
113
ARTE NA AMÉRICA LATINA
de a década de 60. Ao passo que nos diversos países da América Ladna, por
exemplo, há novas gerações sucessivas de artistas, como é o caso do Brasil,
que agora surpreende tanto europeus como norte-americanos por sua vitali
dade criativa. Na verdade, o que buscam nos diferentes países da América
Latina ou África, depois de “Magiciens de la Terre”, é menos o exotismo e
mais a criatividade. Em termos.
Por outro lado, a abertura de novos espaços para os artistas que proce
dem da América Central ou Sul, ou da Ásia e África, não significa que haja,
neste momento “multiculturalista”, um assumir com eqüidade que, sendo de
boa qualidade ou qualitativamente bons, todos os artistas, qualquer que seja
a sua procedência, têm igualmente as portas abertas. É o que registra tam
bém Yudice, ao lembrar que tanto na Europa como nos Estados Unidos um
artista sul-americano, mesmo descendente de europeus, ou seja, segundo eles,
de raça caucasiana, é discriminado no sentido de que tem a seu dispor espa
ços alternativos, e consegue ser reconhecido como “arte estrangeira”. E como
tal sempre se espera que seja sua arte. “Se o artista não se conforma com esta
separação, é considerado inautêntico, ocidentalizado, e como mero seguidor
ou copista do que ‘nós fazemos’. A universalidade é ‘nossa’, a particularida-
j e' csua ’ .”6°
de
No segundo semestre de 1993, esteve em São Paulo, a convite do Goe-
the Institut, o intelectual suíço-alemão Paolo Bianchi, que realizou aqui uma
conferência,7 a que assisti assombrada, por sua visão de mundo da sociedade
multicultural; evidente que havia implícita aí, em sua rigidez, uma abertura
para outros países (os exóticos), porém abertura relativa, como provavelmente
no caso dos artistas, desde que saibam de seus limites e não queiram compa
rar sua produção com a arte dos países “fechados”. Afirmou: “A sociedade
multicultural é dura, rápida, cruel e pouco solidária”. É uma constatação.
Todos o sabemos. Ao descrever a sociedade multicultural como um fenômeno
recente dentro do nacionalismo estreito que caracteriza a mentalidade cor
rente européia, como se olvidando de que toda a Europa é resultado de cru
7 Paolo Bianchi, conferência sobre o “Multiculturalismo”, Centro Cultural São Paulo, São
Paulo, set. 1993.
114
MULTICULTURALISMO, NOMADISMO, DESTERRITORIALIZAÇÃO
115
16.
Aqui, neste momento
[1995]
11.6
AQUI, NESTE MOMENTO
117
ARTE NA AMÉRICA LATINA
1 José Vasconcelos, La raza cósmica — M isión de la raza iberoam ericana: Argentina y Bra
sil, 7a ed., México, Espasa-Calpe Mexicana, 1982, p. 17.
2 Idem, ibidem, p. 11.
118
AQUI, NESTE MOMENTO
119
ARTE NA AMÉRICA LATINA
120
AQUI, NESTE MOMENTO
Esse estilo, que se espalhou por toda a América Latina, como o Arie-
lismo, é um fenômeno de um tempo. E nos faz indagar: é possível a um país
periférico que não dotado de uma cultura “forte” escapar às influências e aos
modismos? Achamos difícil. Mesmo as nações de cultura densa, de fortes tra
dições, como as do Oriente Médio e o México, por exemplo, não deixam de
adotar novas idéias, embora com maior relutância e adaptadas ou estilizadas
ao gosto de suas tradições.
Abertas as portas a um internacionalismo galopante, nem as tendências
de esquerda conseguiram passar de “oposição” a uma tendência que já exis
tia por todo o mundo. E a aspiração de nos tornarmos semelhantes ao mun
do foi a alavanca propulsora que, após a Segunda Guerra Mundial (1939-
1945), alterou o panorama das artes no mundo, agora sob a égide dos ven
cedores da guerra, no caso os Estados Unidos. Frank Lloyd Wright, Mies van
der Rohe, Walter Gropius, além de Le Corbusier, começam a ser admirados
pelos mais jovens. Prossegue, contudo, no Brasil, a absurda devoção ao con
creto exposto, na mais assombrosa desatenção à problemática da manuten
ção e de seus altos custos em um país permanentemente submetido a crises
contínuas. Ao mesmo tempo, edifícios são construídos sem a menor preo
cupação com acabamento, com materiais resistentes ao tempo, à deseducação
endêmica do povo. Assim, no Brasil, aos poucos a obra pública começou a
ser sinônimo de obra precária, efêmera, como para uma feira industrial que
dura uma semana. Caberia aqui uma reflexão sobre a responsabilidade social
do arquiteto, e que não objetiva somente abordar os luxuosos Tribunais de
Justiça recentemente inaugurados ou em obras, em Brasília e São Paulo. Co
mo explicar, a não ser pela corrupção devastadora, esta ausência de sobrieda
de que magnifica a atuação da Justiça com palácios de gosto discutível, num
país como o Brasil, caracterizado pela impunidade?
A segunda metade do século XX assistiu, em grande parte do território
e dos meios culturais da América Latina, à expansão de um internacionalismo
que se desenvolve a passos largos até chegarmos ao que hoje se denomina de
globalização em todos os setores da vida contemporânea. A facilidade de des
locamentos, as comunicações rápidas, as migrações internacionais, motivadas
pelas crises dos países periféricos, freqüentemente afetados pela baixa cons
tante das matérias-primas exportáveis ou pela dificuldade em competir, para
fins de exportação, com os produtos industrializados de países do Primeiro
ARTE NA AMÉRICA LATINA
Mundo, foram algumas das causas dessas migrações contínuas dos países em
desenvolvimento ou do Terceiro Mundo para a Europa e os Estados Unidos.
O deslocamento do eixo cultural de influência da Europa, e da França
em particular, para os Estados Unidos nos anos 40, 50 e 60, até meados de
70, seria a ruptura, em definitivo, da tradição cultural francesa na América
Latina. Artes e arquitetura foram, assim, contagiadas pela informação que se
tornava a cada ano mais absorvente. Se nas artes, por meio de Bienais e Do
cumentas, a influência dos Estados Unidos através de seus artistas e movi
mentos, a partir da arte pop, se tornou irreversível, rompendo de uma vez por
todas com a pintura e a escultura convencionais, em seu lugar surgindo o
happening, a perform ance, a arte ambiental que a partir dos anos 70 se deno
minará de “instalação”, inaugurando uma modalidade de expressão que as
sume, com os novos meios, a multimídia e o vídeo, formas poéticas efêmeras
passam a ser registráveis, após os eventos, somente através da fotografia. To
das as novas formas de arte que se tornam internacionais quase simultanea
mente. Se nasceram nos Estados Unidos, se espalham por todo o mundo, e
surgem artistas na mesma linha no Japão, Itália, Alemanha, França, Brasil,
Argentina, numa coincidência de emergência de postura somente explicável
pelo desencadeamento de uma forma de expressar-se que deixava de ser de
um país para tornar-se internacional.
Assim, essa invasão da informação norte-americana não afetou somen
te a América Latina, porém todo o mundo. A Europa, esfacelada pela guer
ra, recebia, junto com o Plano Marshall para sua reconstrução, as “lições” da
democracia americana através de sua arquitetura que passou a simbolizar o
triunfo da tecnologia e da modernidade, como no caso da Alemanha Ociden
tal, em comparação com os edifícios cúbicos de pedra do período nazista.3
Assim, esses cubos de pedra se transformaram em torres cúbicas de vidro e
aço a espelhar com transparência a sociedade industrial dos anos 50 e 60,
desenvolvimento do tópico do modernismo da Bauhaus dos anos 20, segun
122
AQUI, NESTE MOMENTO
123
ARTE NA AMÉRICA LATINA
124
AQUI, NESTE MOMENTO
ros do meio urbano. Mas é fundamental, nesse ponto, que esses profissionais
jovens possuam uma noção clara da história de nossos espaços urbanos, de
nossa ocupação urbana através das décadas, a fim de manter, com seus pro
jetos, uma atitude respeitosa para com valores que se apóiam na tradição
comportamental e no entendimento do espaço público. E não simplesmen
te projetem planos audaciosos como imagem, mas desfiguradores em relação
a esta sofrida metrópole. Sabemos que este estado de coisas não ocorre ape
nas em São Paulo, embora aqui essas interferências pareçam uma agressão
quase sistemática. Agressão que ocorre em todo o continente, e nas grandes
cidades brasileiras povoadas por uma população mínima de boa renda e má
xima de baixíssima renda. Essa desigualdade se reflete na fisicalidade das ci
dades, em sua imagem, nas ruas descuidadas, na fealdade do surgimento de
bairros pobres e de classe média sem qualquer planificação em que se possa
ver algum resquício de preocupação com o ser humano. Mas apenas comu
nica o estado das coisas no país pelo aspecto empobrecido das pessoas. Se a
arquitetura é, de fato, simbólica, ela irradia com precisão o estado do país.
Com crueldade até na desarmonia e nas contradições de nossas construções,
na sujeira das calçadas, no urbanismo inexistente, nas faixas de pano gritan
tes atravessando as ruas, poluindo violentamente o visual da cidade em bar-
barismo sem par, a apelar para compras, vendas, saudações e oferecimento
de serviços na área informal.
Mas o que vemos além de todas as mazelas de uma população sem qual
quer assistência dos poderes públicos? Vemos que o urbanismo, quando a
natureza não é deslumbrante como no Rio de Janeiro, pode oferecer, por
outro lado, possibilidades inauditas de aproveitamento de sua topografia pe
culiar, como foi o caso do estádio do Pacaembu, maravilhosamente projeta
do por Prestes Maia nos anos 40. Mas esta cidade parece maltratada pelos
deuses, pois se a arquitetura do período colonial foi demolida e superada por
outra, e, em seguida, por outra, parece que a cidade somente é alvo da ob
servação atenta dos urbanistas em momentos comemorativos, como o do
Centenário da Independência, em 1922, quando ganhou o Parque do Ipi
ranga e o Parque do Anhangabaú, com belo paisagismo, hoje destruído por
projetos e destinações insensíveis à sua beleza passada. Ou na comemoração
do IV Centenário da Cidade de São Paulo, quando, em 1954, a cidade foi
presenteada com o Parque do Ibirapuera, hoje lugar nobre para o lazer de seus
125
ARTE NA AMÉRICA LATINA
126
AQUI, NESTE MOMENTO
riam políticos de destaque em seus países. Hoje nos encontramos na era fas
cinante e aterradora da globalização, após a travessia de realidades tão dife
rentes que, parece-nos, tivemos várias vidas.6 Atualmente nos sentamos em
inesas para discutir as possibilidades de sobrevivência através de acordos como
o Nafta, o Mercosul, tentando defender a sobrevivência de nossos mercados
sob os olhos aterrados de todos diante das circunstâncias de uma nova econo
mia global, sob uma ameaça chinesa que descortinamos como irreversível,
tentando ainda defender, como diz o ministro brasileiro da Cultura, Francisco
Weffort, a identidade local, que se coloca como desafio dramático diante da
globalização que já está aqui, aí, em toda parte, demolindo o sonho de uma
Europa unida, desfazendo a paz em guerras de religião e em etnias antes jus
tapostas, adormecidas, ao longo dos anos, sob a imposição da força.
Creio que no fim do século XX devemos pensar em valores que, soma
dos à conscientização, possam fazer retornar às nossas culturas a esperança de
um respeito pelo que elas significam. Gostaria que a Arquitetura, esta arte
técnica, possa se fazer presente na vida cotidiana, compartilhando, desta for
ma, de maneira decisiva e reconhecida, de um novo tempo. Um tempo novo.
Que possa conter a dramaticidade do desafio. E traga consigo de volta a uto
pia do novo como esperança. Acho que é disso que necessitamos neste mo
mento em que vivemos.
^ Ver, de Octavio Ianni, “Globalização: novo paradigma das Ciências Sociais”, Estudos Avan
çados, USP, 8 (21), São Paulo, 1994, pp. 147-63.
127
17 .
História da arte moderna
na América Latina (1780 -199 0)
[1996]
1 Benedito Nunes, “Benedito Nunes ensina o caminho de volta”, O Estado de S. Paulo, São
Paulo, 29/1/1996.
128
HISTÓRIA DA ARTE MODERNA NA AMÉRICA LATINA (1780-1990)
2 Ver introdução do livro de Leopoldo Castedo, History ofL atin American Art and Ar-
chitecture, Nova York, Frederick A. Praeger, 1969.
3 Damián Bayón, Aventura plástica de Hispanoamérica, Cidade do México, FCE, 1974.
129
ARTE NA AMÉRICA LATINA
130
HISTÓRIA DA ARTE MODERNA NA AMÉRICA LATINA (1780-1990)
Rio Grande, como se fora, mais uma vez, um conjunto homogêneo ou total
mente coerente.
Voltando a Damián Bayón, foi ele mesmo quem comentou esse termo
__América Latina — como “uma expressão um tanto convencional, cunhada
sobretudo na Europa há mais ou menos um século, para poder incluir todos
os países colonizados por espanhóis e portugueses, mais algumas ilhas e zo
nas menores colonizadas — mais tarde — por franceses, ingleses e holande
ses. Alguns organismos internacionais denominam sistematicamente esta re
gião: o Caribe”.6 Bayón cita Charles Wagley,7 que, de maneira simplificado-
ra, designa “semelhante extensão territorial e tal variedade de povos, cujo
único ponto em comum seria — afinal de contas — a religião católica bási
ca e principalmente as duas línguas que lhes foram impostas”. Mas Wagley
finaliza admitindo que uma cultura “latino-americana não é tão errônea como
poderia parecer à primeira vista, posto que se encontram mais pontos de con
tato que de divergência entre todos estes grupos humanos que se estendem
desde o sul do Rio Grande à extremidade setentrional da Patagônia”.8
Na verdade, até há pouco, os estudiosos dos diversos países da América
Latina nunca se preocuparam com o desenvolvimento de trabalhos sobre toda
a produção artística do continente. Primeiro, porque nunca nos considera
mos um todo homogêneo, diga-se com franqueza, o que não somos na reali
dade, para que fosse premente um estudo único sobre essa criatividade. Em
segundo lugar, porque sempre estivemos até as últimas décadas muito preo
cupados em levantar a produção e a teoria diretamente vinculadas a nossas
regiões culturais. Isso, em todos os países. Como se somente pudéssemos co
meçar a pensar em termos do continente quando tivéssemos terminado um
inventário, que é relativamente recente, sobre as tendências e as artes em cada
um dos diversos países.
Assim, estudos teóricos como os de Juan Acha ou de Nestor Garcia
Canclini são extremamente recentes e fruto de trabalho de um intelectual raro
6 Damián Bayón, Arte moderno en América Latina, Madri, Taurus, 1985, p. 15.
7 Charles Wagley é autor de The Latin American Tradition, Nova York, Columbia Univer-
sity Press, 1968.
8 Damián Bayón, Arte moderno en América Latina, op. cit., p. 15. Tradução da Autora.
131
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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HISTÓRIA DA ARTE MODERNA NA AMÉRICA LATINA (1780-1990)
133
ARTE NA AMÉRICA LATINA
cia da informação que afeta a todos os criadores, sejam eles de arte popular,
artesanato ou arte “culta”.
134
HISTÓRIA DA ARTE MODERNA NA AMÉRICA LATINA (1780-1990)
^ Mary Anne Staniszewski, B elieving is Seeing: Creating the Culture ofArt, Londres, Penguin,
1995, p. 140.
10 F. De Trazegnies, “Postmodernidad y pluralismo jurídico”, apud Qtie m odernidad de-
seamos?, Lima, Epígrafe Editores, 1994, pp. 202 e 206. Tradução da Autora.
135
ARTE NA AMÉRICA LATINA
136
HISTÓRIA DA ARTE MODERNA NA AMÉRICA LATINA (1780-1990)
1 Damián Bayón, Pensar con los ojos, Bogotá, Procultura/Instituto Colombiano de Cultu
ra, 1982, p. 15- Tradução da Autora.
138
UM OLHAR SOBRE A AMÉRICA: DAMIÁN BAYÓN
2 “Escribe desde Paris Damián Carlos Bayón”, Very Estimar, vol. VI, n° 23, Buenos Aires,
mai. 1951, pp. 45-52.
139
ARTE NA AMÉRICA LATINA
Damián Bayón,
em 1970.
zada pelo próprio Damián Bayón — já então há dois anos dando aulas em
Austin — e por Kasuya Sakai, de origem argentina, porém então residente
no México, com o apoio de Donald Goodall, então diretor do Museu da
Universidade de Texas (Austin). Este encontro reuniu especialistas da área de
literatura e de artes visuais, artistas, críticos e historiadores, abrindo um novo
tempo para articulação entre críticos do continente, gente que nunca antes
tivera a oportunidade de se encontrar e debater problemas, como o da iden
tidade, tema do simpósio. No ano seguinte, publicou uma síntese das dis
cussões pela Editora Monte Ávila, de Caracas, intitulada El artista latino-
am ericano y su identidad. Em sua introdução ao livro, reunindo as comu
nicações e os debates, Bayón reconhece que ficou patente “a oposição críti-
co-artista, ambos com pontos de vista freqüentemente divergentes, mas quero
crer que complementares”, conforme afirma. Nessa reunião ele divisou tam
bém os diversos tipos de crítica, “vários tipos humanos diferentes e cuja
140
UM OLHAR SOBRE A AMÉRICA: DAMIÁN BAYÓN
função social resulta distinta em cada caso. Assim, estiveram em Austin o crí-
tico-chefe de clã, o crítico-teórico de corte filosófico, o crítico-sociólogo que
tudo quer ver sob a perspectiva histórica, embora esteja vendo a realidade mais
contemporânea”.3
Bayón já se tornara conhecido como “editor”, ao organizar um livro hoje
antológico, America Latina en sus artes, encomendado pela Unesco, após en
contro de críticos de vários países (o primeiro, na verdade), no Equador, em
junho de 1970, e do qual tinham participado dois brasileiros: Mário Barata
e Mário Pedrosa.
Em reunião realizada em Lima, em 1967, ficara estabelecido, como con
clusão, a série de livros-antologias que seriam organizados a partir desses en
contros (América Latina en su literatura , América Latina en sus artes, América
Latina en su arquitectura etc.), certos pontos como:
141
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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UM OLHAR SOBRE A AMÉRICA: DAMIÁN BAYÓN
143
ARTE NA AMÉRICA LATINA
7 Damián Bayón, Arte de ruptura , México, Cuadernos Joaquin Mortiz, 1973, pp. 67-8.
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UM OLHAR SOBRE A AMÉRICA: DAMIÁN BAYÓN
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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UM OLHAR SOBRE A AMÉRICA: DAMIÁN BAYÓN
147
19 .
Alteridade e identidade
na América Latina
[1998]
1 Apud Damián Bayón (org.), El artista latinoam ericano y su identidad, Caracas, Monte Ávi
la Editores, 1977, p. 27.
2 Idem.
148
ALTERIDADE E IDENTIDADE NA AMÉRICA LATINA
nem como expressão artística distinta, nem como expressão artística, fora dos
limites de nosso continente”. Esta afirmação até hoje se mantém válida, a meu
ver, tendo em vista a indiferença, por exemplo, de um Jean Clair, curador
da penúltima Bienal de Veneza, pela arte da América Latina, ao nem sequer
selecionar — ou quem sabe sem nem sequer ter visitado algum país de nos
so continente para o preparo de seu tema sobre a figura na arte contemporâ
nea. No entanto, continuamos presentes em todas as mostras que visam apre
sentar a arte de povos distantes, ou exóticos, no desejo de explicitar a ausên
cia de centros na contemporaneidade, como foi o caso citado de “Magiciens
de la Terre”, organizada há alguns anos por Jean-Hubert Martin.
Pode-se argumentar que, nas duas últimas décadas — que nos separam
do Simpósio de Austin — , vários artistas da América Latina têm circulado
pelos Estados Unidos e Europa, expondo em museus, centros culturais e
Documentas, como as de Kassel, sobretudo artistas brasileiros, o que lhes ga
rantiria um reconhecimento em meios artísticos a que antes não tinham aces
so. Mas isso é em termos, porque sobretudo eles serão sempre “artistas da
América Latina” e não artistas em pé de igualdade com artistas do chamado
Primeiro Mundo. Não é por acaso que um Alfredo Jaar, do Chile, não de
seja ser identificado como artista latino-americano, assim como o grande
Roberto Matta, ou um Vik Muniz. No entanto, os mais sofisticados e con
ceituais artistas da América Latina, como Luís Camnitzer, do Uruguai, vi
vendo em Nova York, movem-se num meio marcado pela presença latino-
americana nessa capital. Não se pode fugir à sua condição, ou à sua proce
dência, mesmo em países como os Estados Unidos. Ou mesmo a Alemanha.
Em particular na Alemanha, existe uma abertura para exposições sobre arte
brasileira, por exemplo, ou fotografia na América Latina. O que significa isto?
E que a individualidade da produção do artista não emerge, mas sim sua
procedência. Exceções honrosas foram, sem dúvida, as retrospectivas de Oi-
ticica e Lygia Clark, veiculadas na Europa por vários países, assim como a de
Cildo Meireles, a partir de entidades prestigiosas como o Jeu de Paume, em
Paris, Fundação Tápies, de Barcelona, no caso de Lygia Clark, ou IVAM,
Museu de Valência, no caso de Cildo Meireles. Mas, como se sabe, a exce
ção confirma a regra.
Damián Bayón pode ter afirmado no Simpósio de Austin em 1975 que
já somos “criadores de modelos”, ao mencionar os pontos altos deste século,
149
ARTE NA AMÉRICA LATINA
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ALTERIDADE E IDENTIDADE NA AMÉRICA LATINA
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ALTERIDADE E IDENTIDADE NA AMÉRICA LATINA
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ALTERIDADE E IDENTIDADE NA AMÉRICA LATINA
COMO SOMOS?
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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ALTERIDADE E IDENTIDADE NA AMÉRICA LATINA
1 Álvaro Medina, Procesos d ei arte en Colombia , Bogotá, I.C.C., 1978, p. 362. Tradução da
Autora.
158
COLÔMBIA: UM CONTEXTO PECULIAR
3 José Maria Salvador, in Negret, última década (1980-90). Regreso a lp a d re inca, Caracas,
Gobernación dei Distrito Federal, 1990.
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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COLÔMBIA: UM CONTEXTO PECULIAR
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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COLÔMBIA: UM CONTEXTO PECULIAR
164
ARTES VISUAIS SOB A ÓTICA DE JOSÉ NEISTEIN
2 Esse destaque emergente nos Estados Unidos se reflete igualmente nos leilões de casas co
mo Sotheby’s e Christie’s, como neste ano, em novembro de 2000, quando a arte brasileira ofere
cida foi a única, ao lado do México, a alcançar lances altos, dentre todos os países da América La
tina, dado assinalado como fenômeno decorrente da maior estabilidade econômica do Brasil, em
comparação a países como a Argentina.
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ARTE NA AMÉRICA LATINA
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ARTES VISUAIS SOD A ÓTICA DE JOSÉ NEISTEIN
167
ARTE NA AMÉRICA LATINA
4 Dois anos antes, em Washington, ocorreria a exposição “Ultramodern: The Art o f Con-
temporary Brazil”, em 1993, no National Museum o f Women in the Arts, dedicada às grandes
expressões artísticas de mulheres artistas no Brasil.
168
ARTES VISUAIS SOB A ÓTICA DE JOSÉ NEISTEIN
o Brasil, como um foco cultural com características específicas. Até lá, segui
remos aparecendo da maneira como agora apareceremos (da mesma forma
que ocorreu com a Argentina e o México, sob as mesmas condições), desde
que paguemos 8 milhões e meio de dólares para que aspectos da arte brasi
leira sejam apresentados em exposição em preparo para o Guggenheim de
Nova York e Bilbao.
No entanto, há artistas brasileiros que expõem em Nova York em espa
ços nobres: o PS1, o New Museum ou o MoMA. Referimo-nos ao grupo
neoconcreto, no primeiro espaço; a Cildo Meireles e Ernesto Neto, no segun
do e terceiro espaços, além de Vik Muniz, que, conforme mencionamos, te
rá uma individual no Whitney.
No amplo espectro das artes visuais no Brasil — fotografia, período co
lonial e século XIX — , o que continua atraindo a atenção dos scholars ame
ricanos continua sendo, sem dúvida, o aspecto do exotismo, da mestiçagem,
da presença do negro, como componentes sempre fascinantes de um país de
maioria branca e anglo-saxã como os Estados Unidos. No entanto, o Brasil
se desenvolve, e seus meios culturais, a cada dia, parecem expandir-se mais,
seja em direção à região Sul do país, como na direção de Minas Gerais e
Goiás, como no conservador e tradicional Nordeste brasileiro, sempre cio
sos de suas tradições culturais.
169
22.
Artes visuais: contatos com a Argentina
[2004]
170
ARTES VISUAIS: CONTATOS COM A ARGENTINA
171
ARTE NA AMÉRICA LATINA
172
Parte 2
Museus e circuitos de
23.
A Pinacoteca do Estado
[1982]
175
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
176
A PINACOTECA DO ESTADO
^ Túlio Mugnaini, ligeiro histórico da Pinacoteca do Estado de São Paulo, Catálogo, 1954.
6 O Estado de S. Paulo, São Paulo, 11/11/1911.
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
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A PINACOTECA DO ESTADO
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
8 Adolfo Augusto Pinto, M inha vida: memórias de um engenheiro paulista , São Paulo, Se
cretaria da Cultura, Esporte e Turismo/Imprensa Oficial, 1970, p. 128
9 A Comissão Executiva dessa I Exposição foi constituída pelos Srs. Adolfo Pinto, Sampaio
Viana, Amadeu Amaral e Julio Micheli. Participaram da mostra, segundo O Estado de S. Paulo,
67 pintores, oito arquitetos e decoradores e oito escultores, entre eles os pintores: Aldemar de Paula,
Alfredo Norfini, Benjamin Constant Neto, João Baptista da Costa, Beatriz Pompeu de Camargo,
Cesare Marchisio, José Otávio Corrêa Lima, Cybelino Freitas, Décio de Freitas, Edgar Parreiras,
Eliseu Visconti, José Fiuza Guimarães, Fausto Carmillo, Felisberto Ranzini, Georgina de Al
buquerque, Herculano da Rocha Bressane, Henrique Bernardelli, Henrique Távola, J. Fernandes
Machado, Joaquim Álvaro, Jonas de Barros, Modesto Brocos, Nicota Bayeux, Carlos Alberto
Petrucci, Pedro Alexandrino, Pedro Galbiatti, Pedro Weingartner, Torquato Bassine, Umberto
delia Latta. No setor de arquitetura e decoração: Victor Dubugras, Gino Catani, Carlos Ekman,
Maximiliano E. Hehl, Pujol Júnior, Gilberto Gullo, Aldo Lanza, Carlos Baraldi.
180
A PINACOTECA DO ESTADO
11 Os temas abordados pelo conferencista foram: “Os caracteres gerais da arte francesa”, “As
grandes catedrais da França”, “Os castelos do Loire”, “Versalhes”, “Arte no tempo de Luís XV”,
“A paisagem no século XIX na França” e “Influência monástica no desenho da arte cristã”.
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A PINACOTECA DO ESTADO
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
14 A Pinacoteca do Estado — uma preciosa coleção de telas que esteve ameaçada de desa
parecer”, O Estado de S. Paulo, São Paulo, s.d.
^ Idem, ibidem.
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A PINACOTECA DO ESTADO
para o Estado. Data de então até 1939,16 sua vinculação com essa Escola, de
tendência acadêmica. É a partir desse tempo que a Pinacoteca seria iden
tificada com as correntes mais conservadoras e reacionárias da arte em nosso
país, apesar de se viver, então, em época posterior já aos movimentos moder
nistas, em plena década de 30, dos Salões de Maio, de tão significativa pre
sença como veículo de novas correntes.
Acentuaram essa identificação as gestões prolongadas de dois diretores
da entidade, Paulo Vergueiro Lopes de Leão, de 1932 até fins de 1944, e em
seguida Túlio Mugnaini, de dezembro de 1944 até maio de 1965, ambos
desatentos a todas as alterações que ocorreriam entre nós, seja do ponto de
vista de desenvolvimento da arte, seja do ponto de vista de novas concepções
de museu, indiferente mesmo o último à fundação de museus dinâmicos,
como o Museu de Arte Moderna ou o Museu de Arte de São Paulo, na se
gunda metade dos anos 40.
O pintor Clóvis Graciano, em depoimento prestado sobre o assunto,
assinala que o cunho acirradamente acadêmico da Pinacoteca evidentemen
te afastava de sua visitação os jovens artistas dos anos 30, sobretudo os mais
interessados em idéias novas sobre arte. Assim, os jovens de então preferiam
reunir-se em ateliês de grupos de amigos (como no edifício Santa Helena, na
Praça da Sé, nos anos 30), e pouco ou nada freqüentavam o velho museu,
para evitar uma identificação que não aceitavam.
Em virtude de desapropriação do edifício da Imprensa Oficial, a Pina
coteca retornaria, a 25 de fevereiro de 1947, ao prédio ainda inacabado da
Praça da Luz, em reabertura solene, presidida pelo interventor José Carlos
Macedo Soares.
Exposições circulantes pelo interior do Estado se sucedem nos anos de
1959 e 1960, e hoje, evidentemente, muitas obras se ressentem desses deslo
camentos freqüentes desaconselháveis no processo de preservação de obras de
arte em estado frágil. Vivia-se, por certo, em clima que ainda favorecia a ima
gem da Pinacoteca do Estado como um depósito de obras que deveriam, de
185
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
quando em vez, ser exibidas pelo interior, sem maior preocupação, porém,
com o aspecto didático dessas mostras, ou com o aspecto crítico em relação
às mostras selecionadas.
Uma sucessão mais dinâmica de diretores viria, aos poucos, estimular,
com uma oxigenação necessária, a atualização da Pinacoteca. Depois da apo
sentadoria compulsória de Túlio Mugnaini, em maio de 1965, assumia a di
reção João de Scantimburgo e, dois anos depois, Delmiro Gonçalves passou
a dirigir a entidade. Jornalista e crítico, percebeu a desatualização do acervo,
tendo realizado aquisições (e aceito doações) de vários artistas contemporâ
neos, abstratos, primitivos, e mesmo trabalhos de modernistas como Anita
Malfatti e Flávio de Carvalho, além de Ernesto de Fiori. Depois de breve
passagem, poucos meses na direção, de Clóvis Graciano, Walter W ey assu
miu a diretoria em 1971, dando prosseguimento às reformas na área da Pi
nacoteca no edifício da Praça da Luz, iniciadas durante a gestão de Delmiro
Gonçalves. Em 1973, inteiramente renovado fisicamente, com a presença do
então presidente Garrastazu Médici, o Museu reabriu suas portas, depois de
ter seu diretor cuidado igualmente da restauração de obras que deveriam ser
apresentadas ao público. Parecia iniciar-se uma nova época na existência da
Pinacoteca, embora o esquema de seu funcionamento e o relacionamento
com o público permanecessem fundamentalmente o mesmo. Falecendo Wal
ter Wey, em inícios de 1975, depois de longa enfermidade, Alfredo Gomes
assumiu a diretoria, ficando nesse posto até fins de dezembro de 1975, quan
do a autora destas linhas, Aracy Amaral, a convite de José Mindlin, então
Secretário da Cultura, Ciência e Tecnologia, assumiu sua direção.
A partir de um projeto de trabalho definido objetivou-se, em relação ao
acervo, preservar, conservar e restaurar, mas somente aceitar doações e reali
zar aquisições que viessem preencher as lacunas da coleção, no sentido do que
a Pinacoteca pudesse, em breve espaço de tempo, oferecer ao visitante e ao
estudioso, um panorama completo da arte no Brasil de fins do século à con-
temporaneidade. Ao mesmo tempo, desejou-se colocar a entidade em diálo
go vivo, através de correspondência e boletins regulares sobre suas atividades,
com o interior, outras entidades museológicas do Brasil e da América Lati
na. Foi enfatizado, neste particular, seu caráter de museu de arte brasileira,
em primeiro lugar, e interessado em arte do continente latino-americano
(como transpareceu em exposições temporárias realizadas, bem como no es
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A PINACOTECA DO ESTADO
A FORMAÇÃO DO ACERVO
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
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A PINACOTECA DO ESTADO
Paralelamente à inclusão das obras que vieram, foi organizada uma “Re
trospectiva”, composta de “reproduções, fotografias, gravuras e moldes, que
permitem estudar diante das belas imagens, a história da arquitetura e da arte
francesa dos séculos XVIII e XIX. Esta parte da exposição é composta de ob
jetos que pertencem a São Paulo e que ficarão nesta cidade para constituir
um museu permanente de história da arte francesa”.17 Além da “Retrospec
tiva”, com fotos, apresentou-se uma “Seção de Belas-Artes, compreendendo
obras de pintores, escultores e arquitetos franceses contemporâneos”, bem
como “uma secção de arte decorativa”.18
A inexistência do espírito que deve reger o cuidado na preservação de
um patrimônio cultural público, sobretudo num meio como o nosso, ressalta
desde o início da implantação da Pinacoteca. Assim é que o conservador escre
ve, em 1912, ao secretário de Negócios do Interior, para eximir-se de respon
sabilidade, posto que, na nova entidade, que ocupava uma sala do Liceu, “to
dos os seus professores têm chave da sala, podendo nela entrar e sair quando
mais lhes aprouver”. Nesse documento ele registra a falta de uma obra, leva
da para casa para estudo por Alfredo Norfini, um dos professores do Liceu.19
Apesar de tudo, em 1914 já é publicado o primeiro Catálogo das obras
da Pinacoteca , que sairia com regularidade, com a lista das peças da coleção,
praticamente até 1965- São então registradas 86 peças de pinturas, além de
705 reproduções francesas, esculturas, medalhas e coleção de gessos. Já o catá
logo de 1917 registraria 90 obras de pinturas, além das reproduções, gessos,
terracotas, medalhas e peças em esculturas.
Os pensionistas do Estado, beneficiados com bolsas de estudos de arte
190
A PINACOTECA DO ESTADO
20 Em 1964, a Sra. Sofia da Silveira Cintra faria ainda doação de obras de Pierre Bernard,
Morizot (que não é a homônima do Impressionismo na França), Castagneto, Facchinetti, Baptista
da Costa e Antônio Parreiras.
21 Em 1960, através da Embaixada do Brasil em Paris, estabeleceu-se novo contato com a
Pinacoteca do Estado, desejando-se que a entidade ficasse com mais obras de seu espólio — com
o risco de a obra ser vendida em hasta pública. Mas a propósito, entretanto, o diretor Túlio
Mugnaini já respondera ao encarregado de negócios em Paris, informando-o de que além da Pi
nacoteca já possuir o maior conjunto de obras de um artista pela presença de Dario Barbosa, e
“dada a importância quase insignificante em que ele foi avaliado, deve esse legado ser recusado pela
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Pinacoteca”, opinando pela venda do mesmo em hasta pública. Carta de Túlio M ugnaini, datada
de São Paulo, 3 de março de 1956.
22 Foram adquiridas e doadas em sua gestão obras de artistas contemporâneos, entre eles:
Mabe, Tomie Ohtake, Tikashi Fukushima, Antonio Henrique Amaral, Ernesto de Fiori, Flávio
de Carvalho, Anita Malfatti, Volpi, Darei Valença Lins, Manezinho Araújo, Danilo Di Prete,
Oswald de Andrade Filho, Pedroso D’Horta, Francisco Rebolo Gonzales, Anatol Wladislaw.
23 O Salão Paulista de Arte Moderna, implantado a partir de 1951, é uma decorrência do
Salão Paulista de Belas-Artes, iniciado em 1934. Com a criação do SPAM, os acadêmicos passa
ram a expor num salão paralelo, existente até hoje, inexplicavelmente — Salão Paulista de Belas-
Artes — , como se houvesse dois tipos de arte, a acadêmica e a das correntes contemporâneas.
192
A PINACOTECA DO ESTADO
193
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Iher que detém o poder, figura elegante e perfumada que conheceria depois,
cultivada, e a quem vi circular com naturalidade entre artistas de cinema, tea
tro, diplomatas e artistas plásticos.
E foi essa a imagem que eu quis combinar com a figura digna, porém
já abatida, que vi pela última vez, em janeiro ou fevereiro último. Tinha en
tão diante de mim uma pessoa extremamente frágil, e da qual chegava-me a
impressão dolorosa da solidão. Sabia de sua saúde abalada, mas ignorava de
talhes. Conversamos sobre o MAC e expus-lhe os meus planos, nos quais a
prioridade máxima é a construção definitiva do edifício do Museu na Cida
de Universitária. Seu rosto se iluminou suavemente e pareceu recobrar de
repente o ânimo: pediu à secretária uma pasta com cartas ou papéis sobre o
assunto. Queria mostrar-me seu empenho em outros tempos para essa cons
trução. Julgou acertada a idéia de um projeto mais realista, de acordo com o
momento atual, a que já dava início o arquiteto Carlos Lemos. Contando de
sua luta para construir o MAC, na época da gestão de Walter Zanini — che
gou a ir à Brasília para esse efeito — , reconheceu que o MAC somente esta
ria plenamente concretizado quando tivesse no campus um espaço próprio,
dentro da Universidade, à qual Matarazzo Sobrinho e ela fizeram a doação
tão preciosa. Senti que se emocionou quando lhe disse que estávamos já em
penhados dentro da USP, pelo interesse do Reitor, para que ela se tornasse
nossa Presidente Honorária. Yolanda Penteado tinha noção exata da impor
tância da coleção do MAC, patrimônio do país, única coleção no Brasil de
arte contemporânea internacional, e que complementa, em nossa capital, com
felicidade, o panorama do fazer artístico do mundo ocidental. Privilégio que
conta com a coleção que se deve a outro brasileiro de espírito empreendedor,
Assis Chateaubriand, que com Matarazzo Sobrinho constitui, sem dúvida, o
ponto alto do mecenato no Brasil em nosso tempo.
D. Yolanda foi, por sua formação e talento inegável na comunicação
com as pessoas que a rodeavam, companheira rara de Matarazzo Sobrinho na
promoção de iniciativas em arte em São Paulo. Da formação do Museu de
Arte Moderna à implantação das Bienais, de entusiasta batalhadora de even
tos junto à Comissão do IV Centenário da Cidade de São Paulo, ao preparo
da marcante e inesquecível II Bienal de 1954, e mesmo posteriormente, por
ocasião da doação polêmica, porém acertada, da coleção do Museu de Arte
Moderna de São Paulo, por Francisco Matarazzo Sobrinho, à Universidade.
196
DONA YOLANDA E O MAC
Fiel à sua geração, à uma formação social e cultural hoje em dia inexis
tente, mesmo para os mais favorecidos da elite do Terceiro Mundo, Yolanda
Penteado não dissociava a preocupação com a cultura e com o patrimônio ar
tístico da vida das classes dominantes, assumindo a responsabilidade por sua
difusão como uma tarefa a que se dedicava com uma alegria e um savoirfaire
que sempre a caracterizavam, e que divulgou com encanto em seu livro de
memórias. A presença de D. Yolanda no meio artístico, social e cultural de
São Paulo nos anos 50 foi marcante e todos que a conheceram registraram
para sempre sua figura insinuante a receber em sua casa em São Paulo, como
em sua fazenda Empíreo, os intelectuais, professores, artistas e gente de socie
dade, em um convívio cada dia mais raro. Com seu desaparecimento, pode-
se dizer, acaba o espírito esfuziante da década de 50 entre nós, de que ela, mais
que testemunha, foi a agente e animadora: época da implantação da Vera
Cruz, do TBC, dos Museus, das Bienais, da indústria automobilística, enfim,
um tempo de otimismo que parecia não ter mais fim.
Ao Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, em
particular, seu nome está indelevelmente ligado ao de Ciccillo na investiga
ção de cada obra do acervo, que fazemos, em trabalho diário — posto que
ambos foram os autores das doações mais preciosas para o Museu. Um espí
rito público voltado para as coisas da cultura que, de fato, é tão excepcional
entre nós que nos obriga à reflexão sobre o desprendimento desse casal, tão
incomum nos dias que correm.
197
25.
Qual é o lugar da arte?
[1984]
198
QUAL É O LUGAR DA ARTE?
199
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
200
QUAL É O LUGAR DA ARTE?
1 O M AC possui um audiovisual com os registros dos eventos desses dois anos, sendo que
o de 1983 foi apresentado no espaço Funarte, no Rio de Janeiro, em setembro, com o apoio da
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
cussão, de qualquer forma, foi de tal nível, que já teve início uma reflexão, a
partir da avaliação feita, visando o ano de 1985. E possível que surjam novas
idéias para difundir a iniciativa, já que estamos preocupados em evitar repe
tições e ampliar o evento, porém sempre a partir do cartaz de rua.2
Corporação Bonfiglioli; e o do ano de 1984 foi realizado por Roberto Keppler, focalizando diver
sos trabalhos.
2 A autora agradece a Mônica Nador e Luciana Brito, por sua curadoria coordenada pe
M AC, bem como aos patrocinadores Corporação Bonfiglioli, Central de Outdoor e à Coor-
denadoria de Atividades Culturais da USP — CODAC.
202
26.
Agora, escolares aos museus
[1985]
203
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
204
AGORA, ESCOLARES AOS MUSEUS
205
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
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MAC: DA ESTRUTURAÇÃO NECESSÁRIA À PESQUISA NO MUSEU
se aproxima do modelo dos grandes museus, mais ele se distancia de sua casa,
a Universidade. Acho curioso colocar aqui também, tendo em vista a atuali
dade deste debate no âmbito de nossa Universidade, o problema da aceitação
do pesquisador, dentro do museu, como carreira reconhecida e, portanto, fora
dos departamentos da Universidade, pois, em geral, nos Estados Unidos, os
que trabalham em museus universitários ganham bem menos que os que tra
balham em museus fora das universidades. Tradicionalmente, as faculdades
e as equipes dos departamentos de arte consideram, nos Estados Unidos, o
trabalho no museu inferior ao trabalho didático e consideram, por outro lado,
o doutorado excessivo para uma carreira em museu. Enfim, nos Estados Uni
dos a tendência, segundo o autor, é considerar o museu de arte da Universi
dade como uma unidade que consome verbas, mesmo exíguas, sem produ
zir. Assim, no orçamento das universidades, fundos para funcionários, expo
sições e aquisição são sempre considerados como prioridades baixas.
Sendo assim, qual a função de um museu universitário no Brasil? Uma
extensão do departamento de arte de uma Universidade, competindo com ele,
patrocinando professores ou estudantes da Universidade, com função didá
tica por sua articulação com esta. Por outro lado, dada esta vinculação com
a Universidade, existem freqüentes menções às visitas guiadas, arte-educação,
mas quais ou quantas exposições são realmente montadas especificamente
para crianças?
Enfim, as questões surgem aos borbotões numa análise comparativa
entre as atribuições específicas de um museu de Universidade, que o possam
diferenciar de um museu comum de arte moderna ou contemporânea.
E num país como o nosso, de tantas carências e onde somente agora
assistimos, com cautela, o início da abertura de empresas para o patrocínio
de eventos culturais, acreditamos poder enfrentar o desafio e desejar uma
aproximação com a Universidade sem a preocupação de perder a vivacidade
por parte de nossa programação. Mesmo porque entre nós não existem “os
grandes museus” dos Estados Unidos. E sobretudo neste momento queremos
acreditar que uma nova vida cultural se abre para a Universidade, como para
todo o país.
Neste quadro de reflexões, vejo, acima de tudo, como dado enriquecedor
para um museu de arte dentro da Universidade (ou de outra modalidade, de
história, por exemplo), sua articulação com a comunidade a partir de: pes
209
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
quisa, publicações, cursos e exposições. Pois, a meu ver, os três últimos da
dos — publicações, cursos e exposições —, resultam de desdobramentos na
turais a partir da investigação realizada, como irradiação do conhecimento
acumulado. Sem a pesquisa não vejo a possibilidade do desenvolvimento de
um trabalho de ponta dentro de um museu, pois encaro a pesquisa como for
ma de renovação de conhecimento, atualização ou ampliação de contato com
novas fontes de conhecimento; da mesma forma, como único caminho para
o desenvolvimento intelectual e questionador de nossa realidade ou da reali
dade artística.
Assim, vejo a pesquisa como um longo percurso, inesgotável num mu
seu com acervo, como no caso do MAC — já que estou me referindo a uma
experiência profissional pessoal — , posto que a partir de um projeto de pes
quisa obteremos:
1. Ampliação do conhecimento;
2. Levantamento de informações inéditas (sobre o acervo do museu ou
outras, apresentando portanto o Museu como fonte de conhecimento);
3. Organização e sistemática de trabalho;
4. Eventuais exposições que podem surgir como decorrência da pes
quisa;
5. Publicações que irradiam essas informações, valorizando a atuação
do Museu junto à comunidade.
211
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
212
28 .
Artistas japoneses na coleção do M AC
[1985]
213
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
214
ARTISTAS JAPONESES NA COLEÇÃO DO MAC
215
I
29.
Situação dos museus de arte no Brasil:
uma avaliação
[1986]
216
SITUAÇÃO DOS MUSEUS DE ARTE NO BRASIL: UMA AVALIAÇÃO
217
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
218
SITUAÇÃO DOS MUSEUS DE ARTE NO BRASIL: UMA AVALIAÇÃO
pertence. Mas hoje não é mais secreto nem há mais expectativas: a produção
em uma universidade importante como a Universidade de São Paulo parece
ser considerada a partir de dois campos de atividade: a produção “estratégi
ca”, vinculada à alta tecnologia e a produção “prestigiosa”, como a da cultu
ra e das artes, que parece, aos olhos das autoridades universitárias, iluminar
uma realidade, sem dela participar. E não se investe, lamentavelmente, nesta
área. Área em que está o Museu de Arte Contemporânea. E há aqui, sem
dúvida, um menosprezo pelo patrimônio que abriga uma entidade como essa.
Qual seria o diagnóstico da situação dos museus de arte moderna ou
museus de arte do Brasil, diante deste quadro pouco otimista? Quer-nos pa
recer bem clara uma crise nessa área. Crise decorrente, em primeiro lugar, do
baixo nível cultural do país, e com reflexo direto no desrespeito pela cultura
nutrido, em geral, pelas autoridades. Poderia ser alegado que as autoridades
têm tantos desafios permanentes e urgentes em relação à população, que não
chega nunca a vez da área da cultura. E da arte. Então diríamos que é uma
situação típica do Terceiro Mundo, que nunca pode ser superada pela pró
pria problemática da sobrevivência humana, que deve, prioritariamente, se
antepor à preservação e difusão da cultura ou à criação artística.
Como decorrência direta desse baixo nível cultural deve-se mencionar
o pequeno número de teóricos (historiadores, críticos de arte, animadores
culturais, intelectuais vinculados às artes visuais, enfim), de difícil reposição
e de lenta formação, e que constituiriam os quadros dirigentes e curatoriais
das entidades acima mencionadas. Somente a capacidade de liderança, ela
boração e acompanhamento de projetos de bom nível em várias regiões do
Brasil alterariam a situação de desnível desses diversos pólos, já que hoje se
concentram os maiores eventos de arte contemporânea na região Sudeste do
Brasil. E poderia formar novas gerações de apreciadores, artistas e organi
zadores da área da cultura.
E nesse sentido que nos perguntamos: depois de dez anos de atividades
do INAP — Instituto Nacional de Artes Plásticas — da Funarte, a partir do
Rio de Janeiro e concentrada quase que exclusivamente no preparo do Salão
Nacional Anual de Arte Contemporânea, qual o saldo de uma instituição
como essa na formação deste tipo de profissional? Na verdade, um saldo ex
tremamente modesto, se não nulo, e absolutamente questionável do ponto
de vista de uso de verbas.
219
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Daí por que quer-nos parecer que é na Universidade que repousa a fonte
deste contingente de profissionais que poderá garantir o futuro dos museus
de arte moderna do Brasil. Mas desde que a Universidade não forme somente
pesquisadores de gabinete, com preocupação com a carreira universitária, e
passe a formar profissionais vinculados ao meio artístico contemporâneo.
Esses são excepcionais, porém existem. E nos caberia multiplicá-los. Porque
somente a partir de um elevado nível profissional, de uma experiência qua
litativa e da inquietação familiarizada frente à produção artística contempo
rânea, é que ocorrerá a renovação, ou a implantação de quadros. Por isso é
tão relativa quanto importante a contribuição dos cursos de Museologia.
Porque são estes profissionais, intelectuais da arte contemporânea, que
deverão pagar o elevado preço da ação cultural no Brasil, na área de museus
de arte moderna, que é a carga administrativa excessiva. Mas somente enfren
tando-a é que se pode realizar um projeto renovador. Por outro lado, dois
fatos, este ano, iluminam o meio cultural e o meio museológico brasileiro,
provocando novas formulações: a Lei Sarney (que traz o nome do presidente
José Sarney) e que visa dar benefícios fiscais aos que apliquem fundos na área
cultural, e o Sistema Nacional de Museus, que provavelmente começará a dar
frutos a partir do próximo ano.
A regulamentação da Lei Sarney, que oferecerá incentivos fiscais, aporta
um novo desafio aos museus existentes, em fase de organização, ou a serem
criados. Pressupõe um setor de planificação dentro dos museus, a ser inseri
do nas suas equipes de trabalho, a fim de propor e elaborar juntamente com
os setores de pesquisas da entidade projetos que interessem à comunidade e,
estabelecendo suas prioridades, encaminhá-los às empresas e agências cultu
rais ou promocionais que passarão agora a ser, sem dúvida, o grande interlo
cutor dos Museus de Arte que desejarem expandir suas atividades ou gozar
de possibilidades — antes impensáveis — de ampliar suas coleções. O gran
de desafio será manter o equilíbrio entre esse lado executivo de um museu
de arte (e que já se indica que surgirá de imediato nos grandes centros) e a
preservação, necessária para a sobrevivência de uma verdadeira entidade cul
tural, de seu setor de pesquisa e reflexão, em igualdade de condições. Setor
que é gerador de eventos a partir da criação artística, e nunca a partir de de
mandas ou pressões de empresas promocionais.
Por outro lado, a implantação do Sistema Nacional de Museus, meta
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SITUAÇÃO DOS MUSEUS DE ARTE NO BRASIL: UMA AVALIAÇÃO
222
OS SALÕES BENEFICIAM A FORMAÇÃO DOS ACERVOS DOS MUSEUS?
223
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
224
31 .
A Lei Sarney, o colecionador, os museus
[1987]
A Lei Sarney, por seu alcance e aberturas propiciadas, chega a ser uma
revolução e um desafio, simultaneamente, para o meio cultural brasileiro cri
vado de provincianismos. E sua implantação se faz acompanhar, imediata
mente, de um sem-número de interrogações, entre elas: quais as reais neces
sidades para um desejável desenvolvimento e irradiação da cultura brasilei
ra? Quais as carências de apoio, em que áreas, na produção artístico-cultu-
ral? Ao nível das regiões, posto que este país é um mosaico, como conceituar
as prioridades para subvenções a partir de incentivos que naturalmente sur
girão em conseqüência da dedução fiscal?
A essas interrogações se pode somar a preocupação dos dirigentes cul
turais e criadores no que tange ao distanciamento — ou divórcio — pelo
menos até o presente momento, entre a grande maioria do meio empresarial
e a realidade cultural brasileira. Acresce o dado de que as empresas, embora
preocupadas com impostos a pagar, transferem para seus respectivos depar
tamentos de “promoções culturais” a tarefa de seleção dos projetos que soli
citam apoios e/ou subsídios integrais para sua realização. O que faz com que,
em sua grande maioria, a cúpula das organizações se desvincule de um pro
nunciamento direto a propósito da destinação dos eventuais patrocínios. Ou
ainda esteja muito tímida para uma aproximação da criação artística no Bra
sil, seja na literatura, seja na música, no cinema, nas artes plásticas e no tea
tro. No que tange ao preparo — ou despreparo — do meio cultural, a nova
lei está a exigir, desde sua implantação, profissionais elaboradores de proje
tos, assim como coordenadores para os processos iniciados. Se não possuímos
ainda um número hábil de profissionais nestas áreas, eles por certo emergi
rão, canhestramente de início, ao longo dos meses e dos anos, como uma
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
226
A LEI SARNEY, O COLECIONADOR, OS MUSEUS
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ARQUIVO E DOCUMENTAÇÃO NA ÁREA DAS ARTES
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MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
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ARQUIVO E DOCUMENTAÇÃO NA ÁREA DAS ARTES
232
A POLÊMICA DO MUSEU D’ORSAY
233
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
1
234
A POLÊMICA DO MUSEU D’ORSAY
Ora, o piso térreo sempre representou para o francês o espaço nobre. Os al
tos, seja o troisième (ou o cinquième, o que seria pior, o sótão), o espaço “me
nor”. Por outro lado, a escolha de materiais por Gae Aulenti, isso sim, salta
aos olhos, ao conceber as paredes divisórias do piso térreo: em pedra e ferro,
materiais que definem, por si sós, por sua durabilidade e peso, o conclusivo
da organização do espaço para as obras assim dispostas. Tudo nos fala como
um espaço dogmaticamente apresentado, definitivo em sua consagração, e os
salões, amplos ou passagens, enfatizam as novas colocações dessa releitura da
história da arte do século XIX. Tudo parece vir junto nessa revalorização do
Academismo, ou na revisão da história da arte contada sem rupturas, e onde
a situação (o Academismo) ombreia em igualdade de condições com os trans
gressores (Courbet, Manet, Monet), como que nivelando todas as suas contri
buições. Além do mais, percebe-se aqui o pecado maior não se sabe se de Mi-
chel Laclotte ou de Gae Aulenti, ou de ambos, ou também de Françoise Ca-
chin, diretora do Museu d’Orsay: a manipulação das obras em sua apresen
tação, tal como Sheila Leirner na última Bienal com a chamada “grande tela”.
Pouco mais de 20 cm separam um Monet de outro, a sala de Gauguin está
atopetada, idem a de Van Gogh, enfim, ocorre no piso “de cima” uma desin-
dividualização das obras que leva todo o movimento de pintura a partir dos
nabis e do Impressionismo a ser colocado como um bloco, num achatamen-
to que desvaloriza as contribuições individuais, minimizando suas presenças.
E até que ponto houve uma atitude deliberada nesse accrochage que pro
põe a leitura através da continuidade e que chega aos impressionistas? Mes
mo que o movimento, à época, fosse recebido com total indiferença pela si
tuação, dentro do meio oficial das artes, para o francês bem-pensante de nosso
século, bem como para todos nós, o Impressionismo significa a ruptura, o dar
as costas à Academia, assim como não deixou de ser um marco o realista En
terro de Ornans (1849/50), de Courbet, aqui apresentado de forma consagra-
dora, sem maior diferenciação no tratamento do espaço.
Não se pode deixar de observar, como um dado positivo, a preocupa
ção em buscar telas representativas não apenas do século XIX da França, como
de toda a Europa. Daí a presença de obras recém-adquiridas de um Munch,
de um Klimt, embora se registre que foi impossível a obtenção dos italianos
da época (Macchiaioli), tendo em vista que a Itália proíbe a saída das obras
de seus artistas.
235
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
O Serviço Cultural é definido por Roland Schaer, seu diretor (na revis
ta Connaissance des Arts, “Orsay”, número especial), como “conjunto de me
diações entre as obras e o público” e possui cinco áreas de atuação: audiovisual
e informática, recepção para jovens visitantes, conferências e cursos, publi
cações e manifestações (concertos e debates), não sendo em absoluto exclu
sivo para menores, porém para todos os visitantes, demonstrando, assim, a
ampliação de uma área entre nós mais conhecida por “arte-educação”, inclu
sive com uma profundidade e uma responsabilidade de atuação desconheci
das no Brasil.
Cogitando do sentido “internacional” que se percebe como uma preo
cupação excepcional dentro do tradicional chauvinismo francês na organiza
ção deste gigantesco museu, não podemos, por outro lado, deixar de men
cionar vazios inexplicáveis: ao se focalizar o Impressionismo, como justificar
a ausência de uma sala dedicada à gravura japonesa (Hokusai, Hiroshige,
Utamaro, por exemplo), que tanta fascinação exerceu sobre os artistas fran
ceses, de Manet aos artistas do art nouveau e cartazistas? Até nossos artistas
da Academia, como Amoedo, registram a presença da estampa japonesa,
como uma voga assimilada, à volta da Europa. Como explicar, por sua vez,
a inexistência de uma sala dedicada à arte africana se o museu cobre até a
contribuição de Cézanne e se a máscara africana esteve presente na grande
exposição de Paris comemorativa do centenário da Revolução de 1789 —
quando também se inaugura a Torre Eiffel — e tendo em vista a fundamen
tal importância, nesse quadro de encontros de culturas, da arte da África pa
ra o nascimento do Cubismo?
De qualquer forma, o choque maior para os franceses, o Impressionismo
visto como um desdobramento, e não uma ruptura, é um dos dados mais
polêmicos do Museu d’Orsay. E terá, por certo, conseqüências ainda impre
visíveis para a formação dos jovens que lotam diariamente suas salas e obser
vam o desenvolvimento gradativo das artes, do Academismo (na pintura e na
escultura) até Cézanne, numa continuidade sem atritos, mas a partir de um
ponto de vista — quando antes iam ao Louvre para ver a arte do Classicismo
ao Romantismo e, em seguida, ao Jeu de Paume para observar os impres
sionistas, e ao Museu Nacional de Arte Moderna (no Centro Georges Pom-
pidou), para um contato direto e substancioso com a arte do Cubismo à
Contemporaneidade.
236
A POLÊMICA DO MUSEU D'ORSAY
238
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
239
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
1 Mário de Andrade, “Museus populares”, Problemas , São Paulo, jan. 1938. Ver de Sérgio
Milliet, abordando a idéia de um museu, o texto “Pintura Moderna”, O Estado d e S. Paulo, São
Paulo, 22/7/1938.
2 Carta de Nelson Rockefeller a Sérgio M illiet, datada de São Paulo, 25/11/1946. Gentileza
do Arquivo da Biblioteca Municipal Mário de Andrade.
240
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
241
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
4 Carta de Carlton Sprague Smith a Sérgio Milliet, datada de 30 de novembro de 1946 e Cart
de Carlton Sprague Smith a Eduardo Kneese de Mello, datada de 28 de novembro de 1946. Genti
242
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
leza do Arquivo da Biblioteca Municipal Mário de Andrade, São Paulo, apud MAC — Uma sele
ção do acervo na Cidade Universitária. Catálogo de exposição comemorativa dos vinte anos do MAC
na USP e abertura do novo espaço do Museu na Cidade Universitária, 1983.
5 Yolanda Penteado, Tudo em cor-de-rosa, 2a ed., Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1977, p.
174. A autora registra ainda: “teria sido, certamente, o primeiro diretor do MAM se, infelizmen
te, não tivesse falecido”.
243
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
6 Carta de Léon D egand a Francisco Matarazzo Sobrinho, datada de Paris, 9/7/1947. Tra
dução da Autora. Arquivos da Fundação Bienal de São Paulo.
244
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
volta, alguns exemplos de museus de arte moderna que são significativos. Não
há senão, atualmente, o Museu Municipal de Grénoble que pode ser citado
como exemplo: ali, realmente, com meio financeiro mais que modesto, deu-
se espaço a todas as tendências da arte contemporânea. Talvez haja também
o caso do Museu de Bâle. Mas lá agiu-se com a mais penosa timidez. Tam
bém penso em Paris: não somente o Museu de Arte Moderna é muito incom
pleto, mas os quadros escolhidos são raramente de primeira ordem, como
deveriam sê-lo na cidade que é incontestavelmente a capital mundial das ar
tes plásticas. O mesmo poder-se-ia dizer em relação ao Louvre, no que con
cerne a secção dos impressionistas e dos pintores do fim do século XIX: se
há algumas peças excelentes, elas não se devem à escolha dos conservadores
deste museu, mas às doações de particulares, como Camondo, que tinham
gosto, e que legaram sua coleção ao Estado. Observe também que o Museu
de Arte Moderna de Nova York, que é um dos mais belos museus do mun
do em seu gênero, não é criação oficial, mas de particulares.
245
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
246
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
Pesquisa de Marie Claire Anthonioz. Ver de Marie Odile Briot “Fonds Léon Degand”,
apud M odernidade — Art Brésilien du 20ém e siécle, Ministère des Affaires Etrangères/ Association
Française d Acrion Artistique, Musée d’Art Moderne de la Ville de Paris, Paris, dez. 1987, pp.
411-7.
247
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
13 Dois anos antes da I Bienal de São Paulo, por razões de ordem econômica, pelo que se
deduz, a capital paulista deixa de apresentar a Seção de “Pintores americanos”, com artistas como
Baziotes, Ralston Graworf, Stuart Davis, De Kooning, Burgoyne Diller, Enrico Danati, Jimmy
Ernst, Esteban Francês, Susy Frolinghuysen, AJbert Gallatin, Fritz Glaner, Gorky, Gottlieb, Gra
ves, Hayter, Hoffmann, Leon Kelly, K. Knaths, J. Maciver, Matta, Elsa Modell, Georges Morris,
Motherwell, Wolfgang Paalen, I. Rice Pereira, Jackson Pollock, Reinhardt, Rothko, Sage, Sa-
lemme, Sonia Sekula, L. Smith, Janet Sobel, Tobey, Alfred Russell. Entre os Pioneiros America
nos estavam Dove, Katherine Dreyer, Feininger, John Marin, Geórgia 0 ’Keefe, Joseph Stella, Man
Ray. E, curiosamente, na Seção Pintores Diversos achavam-se El Lissitsky, Kasimir Malevitch, Joan
Miró, Piet Mondrian, Arnédée Ozenfant, Kurt Schwitters, Yves Tanguy, Van Daesburg. Os Nove
escultores seriam Calder, Marie Callery, Naum Gabo, Peter Cripper, Richard Lippold, Maria
Martins, Isamu Noguchi, Anton Pevsner e David Smith.
248
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
idéia da articulação ocorrida entre Paris e São Paulo para o nível objetivado
pela exposição.
Observamos na correspondência de Léon Degand uma constante vaci-
lação que acompanha todo o preparo da abertura do MAM e que se alterna
com o entusiasmo do crítico belga. Na verdade, essa vacilação entrecortada
pelas dificuldades financeiras percorrerão toda a trajetória do MAM-SP, em
seus 15 anos de existência, desde antes de seu surgimento até a doação de sua
coleção à Universidade de São Paulo. Em Paris ainda, quando Degand es
creve a Matarazzo a 20 de abril de 1948, já menciona o início de sua escolha
de obras para a exposição inaugural, convidando artistas a participarem da
mostra de São Paulo, e o crítico belga se refere a René Drouin, que já solicita
ra a Mareei Duchamp e Sidney Janis que se ocupassem, em Nova York, da
seção americana do envio. Ao mesmo tempo percebe-se que, assumindo total
mente a iniciativa, publica em hebdomadário parisiense dados sobre Mata
razzo, a Fundação do Museu de Arte Moderna e as exposições que tentarão
realizar em São Paulo. Em junho de 1948, dois meses depois, entretanto,
vemos o caráter amadorístico, insinuante/autoritário de Ciccillo escrevendo
a Degand, que então já tinha sua seleção realizada, para fazer-lhe sugestões.
Estas sugestões refletiam a presença dos arquitetos influindo sobre o seu es
pírito e que ele, então, comunicava a Degand, com o intuito de enfatizar ain
da mais o objetivo cultural de uma exposição de arte abstrata em nosso mu
seu. Mencionando a influência da abstração sobre as artes aplicadas contem
porâneas e, conseqüentemente, sobre a vida cotidiana do público, por exem
plo, sugere ele para a exposição a presença da abstração no cartazismo, capas
de livros e móveis, estampados, tapeçaria e todos os outros ramos do dese
nho industrial. É clara por trás dessa sugestão de Matarazzo a influência de
Jacob Ruchti e Vilanova Artigas e, o que é mais interessante na análise de
nossa recente história cultural, a precedência, por parte dos arquitetos, ou de
um punhado de artistas plásticos, no interesse pela renovação das artes visuais,
e o desejo de focalizar a integração das artes, no caso a partir da abstração.
Evidentemente não se pode esquecer que esse é também o ano da vinda de
Romero Brest a exaltar a arquitetura em relação às artes plásticas, e a apre
sentação de Max Bill no MASP a demonstrar a articulação entre as artes vi
suais, o design e a arquitetura também não está distante.
Léon Degand não atende a essa solicitação de Matarazzo, já às vésperas
249
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
1
de seu embarque para São Paulo, e, de forma tanto taxativa quanto conven
cional, responde sumariamente que discutiu longamente com Magnelli — o
contato de Ciccillo em Paris, na verdade — a proposta de Matarazzo de acres
centar à exposição uma seção de “artes decorativas”. Definindo-se os dois pela
não aceitação da idéia tardia. E a sua resposta, bastante discutível, seria de que
“primeiro porque a pintura abstrata não tem maior influência sobre as artes
aplicadas, dado que a abstração é praticada, em matéria de artes decorativas,
há séculos”. Depois porque vale mais a pena concentrar toda a atenção na
pintura e na escultura do que perder a opinião pública. Alega ainda ser um
pouco tarde para encontrar os documentos sobre arte decorativa que pode
riam servir ao objetivo, e mesmo que material interessante pudesse ser loca
lizado esse era um dado a ser discutido em detalhe posteriormente, fora por
tanto do âmbito da exposição prevista.14
Dado positivo a se registrar é que o MAM de São Paulo, ao ser es
truturado por Léon Degand, não objetivou restringir-se a ser apenas um novo
espaço expositivo em São Paulo para a divulgação de novas tendências artís
ticas. O catálogo da exposição inaugural revela intenções bem mais ambici
osas. Publicação encadernada, com sobrecapa, mostra em suas primeiras pá
ginas, no elenco de sua diretoria, toda a estrutura de que se constitui o mu
seu desde os seus primeiros dias (Diretoria Executiva, Conselho de Adminis
tração, Relações Sociais, Diretoria Artística, além de Comissões Artísticas
contemplando as diversas áreas de atividades artísticas, como Arquitetura,
Cinema, Exposições, Folclore, Fotografia, Gráfica, Música, Pintura e Escul
tura, além evidentemente da Direção).15
14 Na mesma carta, Degand menciona a Ciccillo que acabara de ocorrer em Paris impor
tante Congresso Internacional de Críticos de Arte e que diante das trinta nações representadas,
inclusive o Brasil, ele participara a criação por Matarazzo do Museu de Arte Moderna de São Paulo,
tendo conversado a propósito, inclusive com James Johnson Sweeney, ex-diretor do Museu de Arte
Moderna de Nova York. E que a todos surpreendera, com impacto positivo, a audácia de se inau
gurar o museu com uma exposição sobre a abstração. “Então”, termina Degand, “isso me dá co
ragem e confiança, e espero que isso vos faça ter a mesma impressão.” Esse parágrafo, aliás, parece
ter o intuito de animar Ciccillo sobre o conceito da exposição a despeito de não acatar sua suges
tão sobre uma parte de design para a mostra.
15 Faziam parte da Diretoria Executiva: Presidente: Francisco Matarazzo Sobrinho, Vice-
250
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
Presidente: Carlos Pinto Alves, Io Secretário: Rino Levi, 2 o Secretário: Roberto Paiva Meira, Io
Tesoureiro: Aldo Magnelli, 2° Tesoureiro: Hernani Lopes. Já do Conselho de Administração par
ticipavam Oswald de Andrade Filho, J. Vilanova Artigas, Tullio Ascarelli, Maria Penteado Ca
margo, André Dreyfus, Mario Gracciotti, Clovis Graciano, Rino Levi, Lourival Gomes Macha
do, Aldo Magnelli, Eduardo Kneese de Mello, Sérgio Milliet, Jacob Ruchti, Luiz Saia, Francisco
Luiz de Almeida Salles, Antonio Cândido de Mello e Souza. Relações Sociais: Moussia Pinto Alves.
Diretoria Artística: J. Vilanova Artigas. Cinema: Benedito Duarte, Paulo Emílio Salles Gomes,
Saulo Guimarães, Rubem Miller, João de Araújo Nabuco, Francisco Luiz de Almeida Salles. Ex
posições: Aldo Bonadei, Miguel Forte, Clovis Graciano, Yolanda Penteado Matarazzo. Folclore:
Oneida Alvarenga, Oswald de Andrade Filho, Luiz Saia. Fotografia: Francisco Albuquerque, Be
nedito Duarte, Thomas Farkas, Eduardo Salvatore. Gráfica: Walter Levy, Jacob Ruchti. Música:
Alberto Soares de Almeida, Álvaro Bittencourt, Eunice Catunda, Eduardo Batista da Costa, Max
Feffer, Victor Simonsen, Jorge Wilheim. Pintura e Escultura: Maria Eugênia Franco, Antonio Alves
de Lima Jr., Lourival Gonmes Machado, Ciro Mendes, Sérgio Milliet. Diretor: Léon Degand.
16 Na orelha dessas publicações anunciavam-se, em conseqüência dessa Coleção Museu de
Arte Moderna, monografias de Lasar Segall (por Maria Eugênia Franco), Anita Malfatti (por
Lourival Gomes Machado), além de estarem previstas outras sobre Guignard, Brecheret, Portinari,
Pancetti e Volpi.
251
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Para a concretização dos três últimos itens Léon Degand reconhece que
é imprescindível o trabalho articulado com organismo similar no Rio de Ja
neiro “semelhante ao do Museu de Arte Moderna de São Paulo” a fim de que:
252
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
“PLANO MORAL”
Para dar “um novo e enérgico impulso à arte brasileira”, Degand esbo
ça nesse texto um item curiosamente denominado “Plano Moral”, no qual
articula a ação difusora da arte contemporânea a ser desenvolvida pelo MAM
de São Paulo com o crescimento da arte brasileira. Para alcançar este objeti
vo, condiciona o surgimento de um mercado de arte, um meio de os artistas
poderem sobreviver de sua arte. Para tanto, de forma muito direta e prática,
reflete como poderia ser a formação de um público com hábito de aquisição
de obras de arte de qualidade:
“Para que o público adquira tal hábito, é necessário formar esse hábito
oferecendo de início obras de arte de valor assegurado. Contam-se nesta ca
tegoria principalmente as obras dos mestres da Escola de Paris, mestres cujas
nacionalidades são as mais diversas”. Mais adiante deduz: “Quando existirem
colecionadores brasileiros, existirão compradores para a cultura brasileira, e
em número suficiente para que os pintores brasileiros comecem a viver me
lhor de sua arte”. Conclui: “E portanto do interesse da arte brasileira que
obras de artistas estrangeiros de valor, expostas no Rio de Janeiro e em São
Paulo, sejam vendidas aqui”.
Destacando a importância da agilidade quanto à entrada e saída de obras
de arte do país e possibilidade de vendas dentro do Brasil para a formação
de um público de arte, Degand enfatiza a necessidade de surgimento de um
público brasileiro comprador de arte: “Para este efeito, é muito importante
que as autoridades brasileiras garantam um tratamento de favor, rapidez no
processo burocrático e redução das taxas para importação e a venda de obras
253
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
17 Texto de Léon Degand, datilografado, Arquivo Fundação Bienal de São Paulo e Fonds
Léon Degand, Paris, Centro G. Pompidou.
254
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
18 Segundo depoimento à Autora de Paulo Mendes de Almeida, ao sair Degand entrou Sér
gio Milliet, que não pode permanecer à frente do museu por estar vinculado à Biblioteca Munici
pal de São Paulo, em tempo integral, sendo diretor dessa entidade.
19 Carta de Ludwig Grote a Francisco Matarazzo Sobrinho , datada de 24 de agosto de 1951,
provocou a imediata decisão de Lourival G. Machado de demitir-se de seu cargo. Grote acrescen
tava que não podia cogitar do cargo por estar prestes a “assumir a direção de um dos maiores mu
seus alemães”. Arquivo Família Lourival Gomes Machado.
255
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
20 “Encontra-se acéfalo o Museu de Arte Moderna de São Paulo”, Folha da Manhã, São
Paulo, 4/1/1952.
21 Carta d e Sérgio M illiet a Lourival Gomes M achado. A colaboração é solicitada “uma vez
por semana, das 18:30 às 19:30”, às terças-feiras. O mesmo pedido a Lourival para que permane
ça no MAM seria solicitado novamente um ano depois, desta vez por Wolfgang Pfeiffer. Arquivo
da Família Lourival Gomes Machado. Após sua saída definitiva do MAM em 1959, Lourival se
ria nomeado em 1962 como diretor de Atividades Culturais da UNESCO, vindo a falecer na Eu
ropa, no exercício dessas funções, em 1967.
256
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
257
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
logo da exposição com projeto feito por Jacob Ruchti, designer então muito
próximo de Ciccillo. Vivamente desagradado, Degand registra em enérgica
carta a Matarazzo Sobrinho que, quando concebe uma exposição responde
por cada um de seus detalhes, e, assim sendo, não poderia aceitar esse tipo
de interferência em sua ação cultural como diretor do Museu. Esse inciden
te, como vemos, inscreve-se entre os vários que pontilhariam a existência do
Museu de Arte Moderna.22
Anos depois o affaire Profili, pessoa de inteira confiança de Ciccillo e
cuja atuação no mercado de arte é subitamente revelada e, por pressão dos
artistas, é finalmente demitido da Secretaria da Bienal de São Paulo. Em
1961, Wanda Svevo assumiria totalmente essas funções, sendo de tal forma
ligada ao presidente do Museu que a figura de seu diretor artístico, até então
responsável pela realização das Bienais, parecia empalidecer diante de seu
poder crescente.23
Ao final de 1959, Lourival Gomes Machado se demitiria, com toda a
Diretoria, do Museu de Arte Moderna, mas o MAM então, em função das
crises permanentes também financeiras, busca auxílio para a realização da V
Bienal de São Paulo, com o apoio de intelectuais do Rio de Janeiro, bem
como junto a Jânio Quadros, governador; assim como em convênio assina
do com a Prefeitura de São Paulo, através do então prefeito Adhemar de Bar
ros, a Bienal já tivera, desde o ano anterior, auxílio para sua realização. E é
nesse ano de 1959 que o governo federal assinaria também apoio financeiro
à Bienal pela primeira vez a partir de 1960.
258
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
24 Talvez essa reserva de Chateaubriand fosse devida à influência de Pietro Maria Bardi,
posto que Mário Pedrosa levantara dúvidas em relação à autenticidade do Velázquez do Museu
de Arte de São Paulo.
25 Ciccillo já dissera, após a morte de Wanda Svevo, que faleceu em trágico acidente aéreo
em Lima, a serviço do preparo da Bienal de São Paulo: “Estou cansado de críticos e artistas, que
ro alguém que não entenda de arte”, para secundá-lo no museu. À época, convidou Dinah Coe
lho, mulher de Luiz Lopes Coelho, seu grande amigo, e que seria posteriormente também direto
ra do MAM, após sua reativação com nova coleção já em 1969.
259
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
O MUSEU NA UNIVERSIDADE
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DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
261
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
rava-se com agudeza num país sempre à beira — ou imerso — em crises po
líticas e econômicas sucessivas, sem estabilidade financeira, apesar da vitali
dade intensa que nosso meio cultural sempre evidenciou a despeito dessas
circunstâncias negativas.
Mas o MAC — Museu de Arte Contemporânea —, criado na Univer
sidade para receber a coleção do MAM e cuja primeira direção coube a Walter
Zanini, recém-chegado da Europa onde após longos anos obtivera seu dou
torado em História da Arte em Paris, permanecia com toda a precariedade
implícita nesse fato, no Parque Ibirapuera, no mesmo pavilhão que abriga as
Bienais, num edifício próprio da Prefeitura Municipal de São Paulo, que ce
deria ao MAC seu terceiro andar enquanto a Universidade não construísse
sua sede própria, como se esperava desde sua criação.
O desafio que se configurava era de não perder o espírito dessa entida
de que passava para a USP com o nome de MAC e que fora o MAM de São
Paulo. O que se tem parcialmente conseguido até agora: o MAC sempre foi
veiculador das novas tendências, a despeito de ser da Universidade. Na ver
dade, o importante, acima de tudo, é que o MAC mantenha sempre sua cha
ma de um museu na Universidade e não de um museu universitário, atrela
do a um departamento de uma Escola de Artes.
Como no Brasil não chegam a dez os museus de arte vinculados a uni
versidades, devemos nos mirar, quem sabe, na experiência norte-americana,
bem como no questionamento de sua situação e desempenho. Escrevendo
sobre o assunto, John R. Spencer menciona o caráter ambíguo dos museus
universitários norte-americanos, que embora sejam sempre considerados “o
símbolo da cultura no campus ”, são igualmente sempre os primeiros a terem
seus orçamentos cortados nas primeiras antevisões de crises (tanto na área de
espetáculos como na área de artes visuais).
Em debate antológico sobre “As Artes e a Universidade”, ocorrido em
Nova York em 1964 e patrocinado pelo Instituto de Educação Superior das
Repúblicas Americanas, com participantes ilustres, entre os quais o ex-reitor
da USP, professor Ulhoa Cintra, observou-se diferenciação marcante entre
as intervenções de professores de áreas bem distintas entre si, embora todas
pertencentes a universidades, e o pronunciamento, muito mais enfático, de
um artista, como o escultor Theodor Roszak (aliás representado também na
coleção do MAC). Polêmico, embora pacífico, em sua abordagem sobre a
262
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
263
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
na de forma a nos fazer refletir quando diz que “do ponto de vista de execu
ção, acho que o fenômeno artístico projeta-se melhor na cidade do que na
universidade”.29
Esse pronunciamento reflete bem a preocupação dos artistas e críticos
de São Paulo e do Brasil, porquanto o MAC transcende em muito a Univer
sidade pelo valor de sua coleção e por sua atuação ao longo das décadas, e uma
vinculação que afete sua plena autonomia não seria nunca desejável neste
Museu que, na verdade, é um patrimônio nacional como acervo artístico, ao
lado das coleções do Museu Nacional de Belas Artes e do Museu de Arte de
São Paulo.
A FORMAÇÃO DA COLEÇÃO
29 Idem, ibidem , p. 37. Sobre o debate a propósito do mesmo assunto, ver W . McNeil
Lowry, The University an d the Creative arts , Nova York, The Ford Foundation, 1962. Publicação
de conferência feita pelo autor em 1961.
30 Em geral, pouco mais de 10% da coleção de um museu é exposta ou acha-se exposta de
maneira permanente. A grande parte das coleções permanece no limbo das reservas técnicas.
264
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
Penteado31 nos fornece pistas sobre a forma de reunião das obras que seriam
as primeiras aquisições do MAM de São Paulo. Assim, ainda durante sua es
tada na Suíça, Ciccillo pediu a Alberto Magnelli que fizesse a escolha de qua
dros franceses que constariam do museu. “Homem íntegro” — escreve Yo
landa Penteado —, “excepcional como artista e criatura humana, Magnelli
comprou os quadros diretamente no ateliê dos pintores, em condições mui
to favoráveis. E sua escolha foi a melhor possível.”32
Na Itália “ele confiou a escolha a Magherita Sarfatti”, que “possuía gran
de conhecimento artístico e estava muito interessada na parte financeira.
Mesmo assim, havia obras muito boas, reforçadas pelas excelentes aquisições
de Enrico Salvatore, grande conhecedor de arte que comprou os De Chirico
e o Auto-retrato (1919), de Modigliani”. Pouco depois Ciccillo adquiriria o
Grande cavalo (1951), de Marino Marini, na Bienal de Veneza, antes do ar
tista ser contemplado com o primeiro prêmio de escultura nesse evento. E,
em geral, as dificuldades aduaneiras usuais no Brasil prejudicando o intercâm
bio cultural eram contornadas pelos relacionamentos do casal com o mundo
diplomático brasileiro na Europa.
Entre as várias obras adquiridas por mão de Magnelli, estão as de auto
ria de Kandinsky, Vasarely, André Lhote e possivelmente Henri Laurens,
posto que também adquirida em Paris.
Prova de que alguns artistas respeitáveis do século XX já se achavam re
presentados no MAM de São Paulo em maio de 1949, Ciccillo Matarazzo es
creve nessa data a Nelson Rockefeller, a provar-lhe, portanto, que o museu já
reunia as condições necessárias especificadas pelo milionário americano para
a recepção, pela entidade, das doações prometidas em carta de 1946. O museu
já era, então, uma realidade, e não mais um projeto, e fazia jus à posse das
obras. “Nosso museu”, diz sua carta, em inglês (que conta também, nos ar
quivos hoje no MAC, com um rascunho em francês, provavelmente de Léon
31 Yolanda Penteado, Tudo em cor-de-rosa, 2 a ed., Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira,
Rio de Janeiro, 1977.
32 Idem, ibidem, p. 177. Acrescenta ainda: “Ciccillo teve muita visão comprando primeiro
os quadros e pensando depois no prédio para guardá-los. Teve ainda a seu favor o câmbio, nessa
ocasião muito baixo na Europa, pois era logo depois da última guerra”.
265
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Degand) “está agora em plena atividade. Para mostrar-lhe incluo uma lista de
nossas atividades desde a inauguração. Esta lista foi enviada aos 730 sócios que
temos no presente momento, bem como aos 150 associados da cinemateca,
que gozam os direitos dos sócios”. E menciona estar a entidade recebendo novas
inscrições para seu quadro diariamente. “Já possuímos obras de Picasso, Miró,
Léger, Chagall, Arp, Kandinsky, Calder, Dove, De Chirico, Magnelli, De Pisis,
Sironi, Severini, Manessier, Singier, Le Moal, Guttuso, Bazaine, apenas para
mencionar os mais importantes e não contando os trabalhos de nossos artis
tas nacionais. Gostaria de acrescentar a esta coleção as obras que você doou
ao Brasil e reservou para São Paulo.”33 E menciona a carta de Carlton Sprague
Smith, do Consulado Americano em São Paulo, de 1946, que registrava es
tarem as obras a serem doadas para São Paulo e Rio em depósito no Instituto
dos Arquitetos de São Paulo. “De acordo com essa carta e segundo a escolha
de Alfred H. Barr Jr., os trabalhos de Browne, Calder, Grosz, Graves, Léger,
Masson e Chagall são destinados a São Paulo e aqueles de Spruce, Gwathmey,
Lawrence, Asver, Léger, Tanguy, Emst para o Rio de Janeiro.”
Em dezembro desse mesmo ano de 1949 duas cartas de Ciccillo a Nel
son Rockefeller e a Eduardo Kneese de Mello, já registram o recebimento,
por parte do MAM de São Paulo, das sete obras da doação Rockefeller, mo
desta doação, em verdade, para um magnata que tanto estimulara, desde me
ados da década, a criação de um museu de arte moderna em São Paulo. Na
verdade, essa doação é significativa na medida em que se desejou com ela se
lar a vinculação do museu paulista com aquele de Nova York, preocupado
em estabelecer através da cultura, de acordo com as diretrizes do Departamen
to de Estado a que era vinculado o MoMA, um relacionamento interessante
com os países da América Latina. Portanto, os trabalhos doados foram os se
guintes: um óleo de Byron Browne, um móbile de Calder, duas aquarelas,
de Georges Grosz e Marc Chagall, uma têmpera de Morris Graves, e dois
guaches, de André Masson e Fernand Léger. Na carta a Rockefeller, ao mes
mo tempo em que agradece as doações, menciona as colaborações prestadas,
nesse período de formação do museu, por duas personalidades, como Sérgio
Milliet e Eduardo Kneese de Mello.
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nao pelas implicações que naturalmente o mercado imporia. Até que ponto
foi positivo o resultado dessa iniciativa não estamos bem certos, pois, se par
cialmente o resultado foi alcançado, nem por isso os modismos, ou os “esti
los” existentes no febricitante universo das artes contemporâneas, deixaram
de estar presentes todos estes anos nas Bienais e Documentas do mundo
ocidental.
Para aquilatar a densidade da importância das Bienais no crescimento
da coleção do MAM de São Paulo — e portanto, do MAC, seu sucessor —
o que devemos nos indagar seria: de onde procediam as obras existentes no
MAM antes das Bienais? Sabemos, com segurança, pela documentação levan
tada no Museu de Arte Contemporânea da USP, por sua Divisão Científica,
a partir de 1983, primeiro sob a coordenação de Lisbeth R. Gonçalves e de
pois de Sônia Salzstein, que o número inicial do Museu advém de doadores
particulares e do próprio Matarazzo Sobrinho.
Na apreciação do patrimônio artístico internacional do MAC é bem
perceptível, a despeito de suas limitações, a presença das Bienais espelhando
suas peculiaridades internacionalistas, bem como seus prêmios regulamen-
tares mais importantes. Assim, é impossível deixar de destacar, nesse acervo,
obra como a Unidade tripartida (1948), de Max Bill, prêmio internacional
de escultura na I Bienal de São Paulo, peça-marco da coleção do MAC por
dupla razão: por ser representativa da I Bienal brasileira e, simultaneamen
te, por significar o ponto marcante de um evento que desencadearia um mo
vimento como o concretista de São Paulo, exatamente pelo impacto da re
presentação suíça, de que participaram também Lohse e Sophie Taeuber-Arp
em 1951. Ao mesmo tempo, coube às premiações, ao longo dos anos, possi
bilitar a presença de diversificados países centro-europeus com seus artistas
na coleção do MAC. É o caso das obras de autores iugoslavos, como Hege-
dusic, Lubarda, France Mihelic, e Petrovic, por exemplo, assim como da
Polônia nos viriam Kobzdej e Roszak, entre outros, em representações que
raramente seriam escolhidas para uma coleção de arte latino-americana, mes
mo que a entidade fosse dotada de um projeto elaborado para o desenvolvi
mento de seu acervo contemporâneo. Por outro lado, artistas japoneses pre
miados nas Bienais como Shimotani, Yasuda e Kawabata, comparecem ao
lado do antológico gravador Hamaguchi, ombreando com os trabalhos de
artistas da mesma procedência que se inscrevem na coleção do MAC pelo
271
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
272
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
35 Até fins de 1982, o MAC, contudo, não possuía uma estrutura museológica à altura de
273
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
sua coleção. Cerca de dez pessoas constituíam sua equipe de trabalho, insuficiente para o desafio
que a coleção e a animação cultural do museu demandavam. Assim, a partir de início de 1983 foi
dada ao M AC a estrutura funcional de acordo com o regimento dos museus da USP (Divisão Ci
entífica, Divisão Cultural, Divisão Administrativa), criados os cargos necessários e os setores im
prescindíveis (como Vigilância, Conservação e Restauro de Pintura e Escultura, Laboratório de
Conservação de Papel, patrocinado pela Fundação Vitae, Arte Educação, Videoteca, Documen
tação e Computação, por exemplo), assim como o Museu deu continuidade à apresentação de re
trospectivas — iniciadas sob a gestão de Walter Zanini, quando se realizaram retrospectivas de
Gomide, De Fiori, Rego Monteiro, Malfatti, Portinari, Tarsila, Zanini e, mais recentemente, de
desenhos de Di Cavalcanti na coleção do MAC, de Ismael Nery e Waldemar Cordeiro. Um setor
de Comunicação Visual foi implantado a fim de manter uma diretriz, do ponto de vista mu-
seográfico, para a fisicalidade das exposições realizadas.
274
I DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
275
1
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
sado, datado, ou cujo acervo não acompanhará a arte contemporânea que lhe
dá o nome, ou que sempre dependerá da garra de seus diretores para sensibi
lizar, quando possível, as sucessivas reitorias para delas obter — ou da inici
ativa privada — montante para aquisições. Sendo sua coleção um patrimô
nio inalienável como um bem do Estado, mesmo as redundâncias na cole
ção no que tange a suas “obras de museu” que realmente são raras dentro do
acervo, constitui-se realmente como um único precedente interessante para
aumentar a coleção do MAC o caso do intercâmbio Boccioni/Henry Moore.
Trata-se de longo e complicado processo levado a termo por Walter Zanini
quando de sua gestão, obtendo por fim a possibilidade de realizar um bron
ze de Formas únicas de continuidade no espaço, de Boccioni, a partir do gesso
original existente na coleção do museu, para a Tate Gallery, de Londres, em
troca recebendo um bronze de Henry Moore.
Mas não apenas na área internacional de seu acervo se ressente o MAC.
Também no que diz respeito a artistas latino-americanos mais atuais, nosso
acervo é defasado, além de não contarmos ainda com artistas antológicos
como Rivera, Orozco, Siqueiros, Tamayo, Matta, Lam, Botero, Pettoruti,
Berni, Forner, Torres-García, Xul Solar, Figari, Obregón, Kahlo, para somen
te citar alguns dos artistas mais ilustres do continente (muito embora Lam e
Matta estejam discretamente presentes no acervo com gravuras).
Quanto aos artistas nacionais que marcaram nosso século, evidentemen
te o museu se ressente de obras expressivas de Portinari e Rêgo Monteiro,
somente para citar alguns. Além de artistas contemporâneos estarem repre
sentados em suas fases iniciais, e não por vários períodos marcantes de sua
produção, o que, didaticamente, seria aconselhável numa coleção deste por
te. É o caso entre outros, de Geraldo de Barros, Brennand, Stockinger, Ru
bem Valentim, Shiró, João Câmara Filho, Antonio Henrique Amaral, José
Resende, Antonio Dias, Gerchman, Lygia Clark. Sem mencionar as ausên
cias ainda faltantes de Sérgio Camargo, Amilcar de Castro, Vergara, entre
tantos outros. Assim, o preenchimento das lacunas mais graves da coleção
deste museu é uma tarefa que se impõe. Por prioridade, a fim de que possa
mos informar o público de nosso país sobre o que se passa em arte contem
porânea não apenas no mundo ocidental como no Brasil em particular.
Outra constatação é de que, em função da própria liderança de Ciccillo
Matarazzo e da formação cultural totalmente eurocentrista existente nos anos
276
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
36 Ver MAC — Uma seleção do acervo na Cidade Universitária , catálogo por ocasião do 20°
aniversário do MAC-USP, 1983.
277
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
37 Lourival Gomes Machado, “Um museu e seu acervo”, Revista Arqtiitetura e Decoração
n° 10, mar./abr. 1955. O autor escreve a propósito de exposição abrangente da coleção do MAM-
S. Paulo, apudM A C — Uma Seleção do Acervo na Cidade Universitária , op.cit.
278
DO MAM AO MAC: A HISTÓRIA DE UMA COLEÇÃO
rio de Papel teve o patrocínio da Fundação Vitae para sua implantação, sen
do também, iniciada a construção da sede do museu.
Nesta gestão consideramos inovadora a situação que conseguimos criar
de relacionamento com a iniciativa privada, seja para obter equipamentos para
o museu, seja mobilizando-a para subsidiar publicações e setores de ativida
des do MAC. Ao mesmo tempo, foi criado o Espaço MAC na Cidade Uni
versitária, exemplarmente montado com equipamento projetado por K. H.
Bergmiller, visando tornar o museu mais conhecido pela própria Universida
de. Nasceu também a AAMAC — Associação dos Amigos do Museu de Arte
Contemporânea — , objetivando-se articular de forma permanente a inicia
tiva privada e o MAC, auxiliando-o na obtenção de obras para sua coleção e
buscando viabilizar seus projetos em geral. Igualmente, foi nossa preocupação
a realização de eventos que marcassem, a partir do museu, a nova geração de
artistas que surgiram com força a partir de inícios dos anos 80 (“Pintura como
meio”, “Arte na Rua I e II”, “Casa 7”, “A nova dimensão do objeto”).
Ana Mae Tavares Barbosa, arte-educadora e professora da Escola de Co
municações e Artes, diretora do MAC em 1988, interessa-se vivamente pelo
prosseguimento das obras do museu na Cidade Universitária. Por outro la
do, desenvolve sensivelmente os setores de cursos, já regulares na programa
ção do MAC, e em sua gestão ampliados com uma dimensão internacional.
Consideramos que o grande e crucial desafio para o Museu de Arte
Contemporânea da USP seja o de solidificar sua estrutura museológica com
quadros profissionais de elevado nível cultural e, ao mesmo tempo, intensi
ficar suas atividades diretamente vinculadas à mais viva contemporaneidade,
com dinamismo, minimizando os procedimentos burocráticos. Nesse senti
do, será básico que possa realizar aquisições regulares, pois somente dessa
forma terá condições para realmente apresentar a contemporaneidade inter
nacional e nacional. E claro que num país com as dificuldades que o Brasil
permanentemente enfrenta e sem tradições culturais fortes esse programa
pode parecer ambicioso. Daí porque acreditamos que a iniciativa privada
pode e deve participar desse objetivo, a fim de preservar e ampliar um pa
trimônio único de arte contemporânea, que não é exclusivo, por seu porte,
de São Paulo, mas se constitui em coleção que orgulha todo o país.
35.
Conversação com Pontus Hulten:
o território da arte
[1989]
ARACY AMARAL — Depois de ter sido o responsável p o r uma das prim eiras
exposições sobre a obra de M alevitch no Ocidente, épercep tível sua emoção ao ver
280
CONVERSAÇÃO COM PONTUS HULTEN: O TERRITÓRIO DA ARTE
reunidas tantas obras desse artista. Como p od e relembrar suas iniciativas quan
do diretor do M oderna M useet de Estocolmo?
PONTUS HULTEN — Na época, anos 60, estávamos realizando em Esto
colmo uma série de exposições de artistas pop norte-americanos — como
Lichtenstein, Segai etc. —, quando concebemos apresentar outro tipo de arte
e denominamos esse evento de “Inner and Outer Space”, concentrando em
Malevitch a maior carga de atenção como o maior artista contemplativo. Es
tiveram também representados Yves Klein, Gabo e mais 35 artistas, como
Rothko e Barnett Newman, cada um com uma obra. Isso foi em 1964.
Devo dizer que meu interesse procedia, evidentemente, de meu contato
com Sandberg, de quem fui aluno ao tempo em que ele, como diretor do
Stedelijk Museum, estava realizando as aquisições de Malevitch, no decorrer
dos anos 50. E em 1957 assisti à inauguração da exposição Malevitch, no
Stedelijk, reunindo também certas obras de coleções privadas da Dinamarca.
Depois, já trabalhando em Paris, no Centro Pompidou, organizamos
uma exposição comemorativa do 100° aniversário de seu nascimento (1978),
com a colaboração da Suécia, Dinamarca, e Stedelijk Museum. Nessa opor
tunidade, Ana Leporskaya, sua discípula de Leningrado, doou os Architectons
ao Pompidou. Jean-Hubert Martin, diretor do Pompidou, foi um dos cura
dores desta exposição.
Malevitch teve duas filhas: uma vive na Sibéria e a outra em Moscou. E
foi esta última que vendeu ao Museu de Leningrado cerca de cem obras, mais
ou menos há dez anos atrás. Alexandre Kobariow, nosso amigo, vice-diretor
do Museu Russo, foi alvo de muita polêmica por sua orientação na época.
Teve mesmo uma vida trágica, terminando por se suicidar.
Num parêntese nesta entrevista lembro que em rápido diálogo com
Jean-Hubert Martin, agora em Amsterdã, ele nos relata como esta retros
pectiva/reencontro das obras de Malevtich propicia igualmente alguns “acha
dos”. Quatro Architectons, de Malevitch, acham-se expostos em espaço espe
cialmente ambientado para recebê-los, mas quando em Paris se receberam as
doações, foram feitos restauros a partir de fotos e documentos da época, evi
dentemente a fim de obtenção de reconstituição o mais fiel possível das gran
des maquetes da arquitetura imaginária. De uma delas, contudo, só chegara
ao Pompidou um fragmento. Através de documentos a peça foi reconstituí
da em sua totalidade. Curiosamente, em Amsterdã, os russos enviaram pre
281
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
cisamente um Architecton ao qual faltava uma peça (o fragmento que fora pa
ra Paris), embora também tivessem reconstituído a maquete através de do
cumentação da época.
282
CONVERSAÇÃO COM PONTUS HULTEN: O TERRITÓRIO DA ARTE
283
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
284
CONVERSAÇÃO COM PONTUS HULTEN: O TERRITÓRIO DA ARTE
285
36.
Curadoria de exposições: a situação brasileira
[1991]
286
CURADORIA DE EXPOSIÇÕES: A SITUAÇÃO BRASILEIRA
287
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
288
CURADORIA DE EXPOSIÇÕES: A SITUAÇÃO BRASILEIRA
289
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
290
37.
Museu de Monterrey no M éxico
[1991]
291
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
nosso ponto de vista diante do “registro” (o catálogo), por sua vez paralelo à
realidade visual apresentada ao público.
Curiosamente, esta exposição temática — “Mito y Magia en América:
Los Ochenta” — tangencia, provavelmente sem o saber, o tema da I Bienal
Latino-Americana de São Paulo de 1978, “Mitos e Magia”. Este tema da
Bienal de São Paulo, oriundo de Juan Acha, crítico e teórico peruano há anos
residente exatamente no México, visava contemplar as manifestações sincré-
ticas ou vernaculares do indígena, do africano, do euro-asiático, assim como
aquelas reveladoras do espírito mestiço que preside o comportamento do
homem da América Latina. Signos, símbolos, gestos e rituais foram, assim,
objetos de atenção dos organizadores desta Bienal comandada pelo teórico
Juan Acha.
Outro dado interessante que depreendi da leitura do catálogo é como
também na América Latina, e, portanto, não apenas nos Estados Unidos, esta
exposição é devedora ao impacto de “Magiciens de la Terre”, realizada por
Jean-Hubert Martin, no Pompidou, em 1989. Nesta estavam presentes tam
bém mitos e magia, ao nível internacional, implícitos em sua preocupação
com a ancestralidade (ver o caso de Patrick Vilaire, do Haiti, também aqui
presente em MARCO, sigla do museu de Monterrey).
A curadoria da grande exposição mexicana visou apresentar uma visão
peculiar dos anos 80 na América. Eis aqui a afinidade com “Magiciens”, pois
não é apenas para mostrar a arte da América dita latina, terceiro-mundista,
nem apenas da América dita “do Norte” (Canadá, Estados Unidos e Méxi
co), mas ambas lado a lado, como se fossem um continente “irmanado”. A
utopia é importante, lembrava-nos Mário Pedrosa, sem ela não se vive. E ver
dade. Mesclemos estas realidades a partir das manifestações artísticas. Nem
que somente a partir delas.
As reflexões do catálogo talvez avancem um pouco, neste terreno res-
valoso do contemporâneo. Pois aqui surgem dados novos. A Miguel de Cer-
vantes coube a curadoria da exposição na parte da América Latina, a Charles
Merewether a indicação de alguns artistas do Canadá e Estados Unidos, em
função que o catálogo não deixa bem claro. O texto deste curador, contudo,
enfatiza coisas como espiritualidade, misticismo, a densidade do irracional em
povos onde a tecnologia não chega a alterar a qualidade de vida, desejando
mostrar a validade de determinado tipo de religiosidade, sempre vigente no
292
MUSEU DE MONTERREY NO MÉXICO
Terceiro Mundo, sobretudo hoje em dia, como evasão de uma realidade hos
til. Ao mesmo tempo, cita Rashed Araeen que, ao criticar “Magiciens de la
Terre” (ainda!), lembra que “a luta nos países do Terceiro Mundo não é pela
‘espiritualidade’, mas pelo trânsito em direção a sociedades independentes —
democráticas, modernas e seculares —, e a arte contemporânea desses países
é parte dessa batalha”.
Percebe-se, ao mesmo tempo, no texto de Merewether, a dificuldade no
enfoque de uma realidade que lhe é pouco conhecida, embora possua boas
intuições, principalmente quando cita à vontade Guillermo Gómez Pena, o
qual afirma, com razão, que “somos percebidos indistintamente como cria
turas mágicas com poderes xamânicos, boêmios felizes com sensibilidades pré-
tecnológicas [...] sem mencionar os mitos mais comuns que nos vinculam
com drogas, hiper-sexualidade, violência gratuita e terrorismo, mitos que ser
vem para justificar o racismo e disfarçar o temor pela alteridade cultural”.
Também em seu texto vê-se que focaliza com grande curiosidade os ar
tistas do Caribe. Entre eles, a estrela é Basquiat, abundantemente citado, ana
lisado ao longo do catálogo, como um enigma a ser desvendado. O amigo
de Warhol, morto tão jovem, ex-grafiteiro, traz o apelo do mito afro-ca-
ribenho, da miséria urbana dos grandes centros.
H
38.
Arte e instituições
[1991]
294
ARTE E INSTITUIÇÕES
295
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
aos artistas maduros e veteranos. Não têm, ao mesmo tempo, de maneira re
gular, exposições de nível internacional para estimulá-los, seja ao nível de His
tória da Arte, seja ao nível da arte contemporânea, porque, no caso do Bra
sil, a situação das instituições é má, senão desesperadora, imperando, na mai
oria dos casos, o amadorismo ou o não-profissionalismo. Em Cuba o artista
tem status privilegiado, não lhe faltando bons materiais nem locais domésti
cos para expor. Falta-lhe, contudo, a abertura do diálogo que o cubano está
buscando agora indo ao México, onde há, aparentemente, cerca de trinta ar
tistas cubanos procurando novos ares. Mas isso não significa que possuam
uma arte extremamente criativa ou provocadora. Ao contrário, pois todos os
países de origem hispânica têm uma tendência ao convencional, por possuí
rem uma tradição pictórica muito forte. Ousam menos, em geral, e isto é
válido também para a Venezuela. No México, o meio artístico tem um pri
vilégio que outros países do continente não possuem, de grandes exposições
internacionais. Ao mesmo tempo, com suas instituições fortemente ampara
das pelo Estado, nem por isso o meio artístico reflete uma criatividade ino
vadora ou atualizada. Pois inovadora é difícil até no Primeiro Mundo, onde
pouca coisa acontece. Mas no México o fenômeno mais marcante para mim,
além da força da cultura mexicana, é a mexicanidad. O mexicano revisto pe
los mexicanos. E de repente vejo hoje no México artistas jovens pintando à
maneira de Frida Kahlo, a temática mexicana à flor da pele.
Esse fenômeno é respeitável, mas incomoda. E parece que a efervescên
cia visível em Tijuana, fronteira com Estados Unidos, é o único ponto onde
se percebem inovações de comportamento por parte de artistas, não apenas
pela inexistência de instituições como pelas circunstâncias dramáticas que en
volvem a sociedade emigrante mexicana em sua dolorosa relação com os Es
tados Unidos (caso de ódio e paixão).
Na área da Europa é possível colocar como antíteses os casos da Alema
nha e da França. A primeira, como herança da guerra, e vivenciando o longo
pós-guerra encerrado somente com a queda do Muro de Berlim, há um ano
e meio, teve seu ambiente cultural permeado por crise de consciência, uma
preocupação social e moral refletida nas artes, seja no cinema, seja nas artes
visuais, sobretudo em Beuys e Kiefer, de considerável influência. Esse mes
mo clima de sinistro se faria presente também na arte polonesa contemporâ
nea até o momento e em Viena, através de seu catastrofismo violento do
296
ARTE E INSTITUIÇÕES
Aktiongruppe de fins dos anos 60, a refletir também esse clima de pós-guer-
ra. É claro que a arte desses países vai mudar, em função dos últimos aconte
cimentos. Porém, nas artes visuais, um tempo passará para que se observem
os resultados deste momento em que vivemos, ainda de funda perplexidade,
mudanças profundas e acomodação. O mesmo poderia dizer-se da arte na
União Soviética, por exemplo. A diferença maior da Alemanha para a Fran
ça, contudo, se reflete na abundância capitalista da Alemanha Ocidental, a
erigir museus como monumentos da cultura de sua prosperidade, com aqui
sições impressionantes de obras a ampliar as coleções já existentes. O meio
artístico efervescente de fins dos anos 70 e início de 80, entretanto, era para
lelo ao interesse da iniciativa privada na fundação de entidades e museus, e
concomitante à existência de galerias e de um forte mercado nas cidades mais
prósperas, como Colônia, Munique, Frankfurt, Dusseldorf, Hamburgo.
Já a França persegue uma tradicional política cultural, preocupada em
toda a década de 80 em projetar uma imagem renovada ou nova de sua mu-
seologia a partir a criação do Pompidou em meados dos anos 70, atrasadís
sima que era em relação à arquitetura de museus nos Estados Unidos. Acres
ce a esse fato o desejo de uma comemoração marcante do bicentenário da Re
volução Francesa em 1989. Não se deve esquecer, igualmente, que todos os
países da Comunidade Européia enfatizam suas nacionalidades e os investi
mentos na área cultural visam, em particular, registrar suas culturas peculia
res. Daí o surgimento na França, nos últimos anos, de entidades potentes
como o Museu d’Orsay, o Museu Picasso, além da reformulação do Museu
do Louvre, com a excêntrica pirâmide de cristal de I. M. Pei, a pós-moderna
ópera da Bastilha, o arco da Défense, e a reabertura agora do Jeu de Paume
para eventos contemporâneos. É indubitável aqui um jogo de confrontação
em termos de política cultural com a Alemanha. A França se quer “moder
na”, em termos de atualidade, a despeito de suas tradições. O que não signi
fica que todo esse poderoso investimento traga consigo artistas de renome in
ternacional, que se destaquem no panorama artístico internacional, a empa-
nar o brilho dos artistas norte-americanos dos anos 60 ainda vigentes, como
Bruce Nauman, Ed Ruscha, Rauschenberg, Jasper Johns, Richard Serra, en
tre outros. Pouca coisa de interesse ou vivacidade se vê nas galerias francesas,
seja da Rive Gaúche como do Marais. E no entanto o estado é o grande
patrono. Isso, a meu ver, não significa que uma coisa anule a outra, porém
297
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
que vivemos num tempo de “estação baixa” como criatividade. Daí a razão
do Primeiro Mundo haver por bem nos olhar com mais atenção, porque,
embora nossos artistas rezem pela mesma cartilha, lendo e vendo as mesmas
revistas, há um sabor diferenciado na produção brasileira, que talvez os inte
resse até um certo ponto.
O caso italiano é semelhante ao nosso, porquanto a Itália é praticamente
um país sem museus dinâmicos ou belos como a Alemanha de hoje, e sem a
tradição museológica da França ou Holanda. Há a Bienal de Veneza e seus
eventos paralelos. E há um mercado interessado, sobretudo na Itália mesma
e nos Estados Unidos (grandes estrelas). Ignora-se cabalmente tudo o mais.
O caso italiano é parecido também ao argentino, mais próximo de nós, onde
há um meio cultural sofisticado, porém poucas instituições culturais a ofere
cerem a “contemporaneidade”. Como aqui, os museus argentinos, em fun
ção da crise que não termina nunca, não adquirem obras, não se abrem no
vos museus (fora o Centro Cultural da Recoleta, é claro), não há profissio
nalismo ou competitividade nessas instituições. É o clima conhecido por ar
tistas de que “o artista que se vire” para obter reconhecimento e espaço. Há,
contudo, um clima cultural mais sedimentado que no Brasil, que oferece pou
co mais que a “geléia geral” antológica. Considero que existe mais profissio
nalismo e seriedade em São Paulo, Paraná e Rio Grande do Sul, apesar de
todos os nossos problemas imensos. Mas o que é isso comprado ao Brasil in
teiro? E o Rio de Janeiro que possui espaços nobres, como o do Banco do
Brasil, da Casa França-Brasil, do MAM, do Paço Imperial, todos dependen
tes do governo federal, sem iniciativa privada se mexendo, ou sem iniciativa
privada? Espaços belíssimos à espera de mecenas ou de um governo esclare
cido que coloque curadores profissionais à frente dessas entidades, oferecen-
do-lhes a possibilidade de financiamento de projetos audaciosos?
Entretanto, nem tudo são rosas, mesmo num estado como o de São Pau
lo, que apresenta problemas dramáticos em seu interior de municípios tão ri
cos. Procurada por um jovem artista do interior, que deseja expor na capital,
que deseja projetar-se, fiquei assombrada com a falta de articulação existente
entre as diversas cidades. Excetuando Americana, que com o MACA e a ação
de Lucimara Scomparim, se agita e promove salões, debates, exposições e cur
sos, qual o outro museu ou entidade do interior de São Paulo promove ini
ciativas a estimular novas vocações? Inexistindo a possibilidade de se levar
298
ARTE E INSTITUIÇÕES
boas exposições ao interior, por que não promover a vinda regular de ônibus
com interessados do interior a visitar as exposições (galerias e museus) exis
tentes na capital? Por que não promover cursos intensos e regulares de His
tória da Arte aos interessados do interior? Pode um jovem tornar-se artista
sem conhecimento de uma base mínima de História da Arte, sem o conhe
cimento da arte contemporânea internacional, sem o contato necessário com
outros com os quais tenha afinidades? Acho que é por essa razão que num
simpósio sobre modernismo e modernidade de que participei em Claremont
College, na Califórnia, em início dos anos 80, um dos presentes se referiu ao
fato de que a modernidade só poderia ocorrer em grandes centros, nunca na
província. Talvez hoje não vivamos mais naquele clima, de inícios do século,
da implantação da modernidade, dentro de cujo contexto viveu James Joy-
ce, Ezra Pound, Tarsila, Oswald de Andrade, Picabia, Duchamp, Picasso,
Erik Satie, entre tantos outros. Mas há alguma verdade naquela afirmativa.
Num tempo de meios de comunicação de massa, a metrópole é onde se pro
duzem os programas dos mass m edia (jornais, revistas, cinema, música, tele
visão), ou seja, ainda, o grande centro, ou os centros interligados, como a Co
munidade Européia. Na verdade, é prosseguir no discurso de centro e peri
feria, relações mútuas etc. Até o regionalismo que parece estar tomando conta
do mundo de hoje.
299
39.
A Pinacoteca do Estado: problemas em torno
à formação e desenvolvimento de um acervo
[1993]
300
A PINACOTECA DO ESTADO: PROBLEMAS EM TORNO À FORMAÇÃO DE UM ACERVO
de cursos. Pode trabalhar num museu por dez anos ou vinte anos e nem per
ceber o que é um museu e ser mantido no cargo. Depende do contexto e das
circunstâncias culturais e políticas locais.
No caso específico da Pinacoteca, o início de sua coleção centralizou-se
nos acadêmicos, pois estávamos no início do século XX e a pintura era a “pin
tura da Academia”. Uma ressalva, entretanto: a grande doação da produção
de Almeida Júnior, nos anos 40, ampliada ainda mais por Macedo Soares.
O que significa, na verdade, uma direção “regionalista”, pois o próprio nome
da entidade o indica: Pinacoteca do Estado de São Paulo. Não houve um
intuito de só buscar obras de autores paulistas. Espanhóis, italianos, até um
pontilhista mexicano, raro até no México (F. Romano Guillemin), veio dar
na Pinacoteca. Isso porque, ao invés de termos uma política de acervo, o que
ocorria era que as famílias abastadas, por ocasião do falecimento de seus che
fes, para esvaziar suas casas ou palacetes do excesso, doavam à Pinacoteca suas
“obras de arte”, que, poucas vezes, eram peças de museu. Exceção deve ser
feita ao gesto generoso de dona Leonor Mendes de Barros, que procurou esta
entidade para deixar consignada a ela uma bela tela de Almeida Júnior, Sau
dade (1899). Esse fato foi para mim uma surpresa que me emocionou bas
tante, dando-me até a impressão de atitude de milionário norte-americano.
No entanto, sua doação não teve seguidores.
Sou absolutamente contra se aceitar doações de artistas indiscrimina
damente. Todo museu deve ter uma diretriz, inclusive do ponto de vista
expositivo, e as doações devem ser realizadas de acordo com carências ou de
ficiências de sua coleção, depois de posteriormente examinadas pelo Conse
lho da entidade, assim como pelo Diretor. Somente desta forma obtém-se
uma coleção de fato, e não o recheio de um depósito.
Há implícita como fim último da atividade da Pinacoteca a arte brasi
leira. Arte internacional de outros séculos é com o MA.SP, e arte internacio
nal do século XX, em particular depois do Modernismo, é da área do MAC
LISP. Mas há também uma vocação em direção ao século XIX, tendo em vista
a coleção já existente, para exemplificar melhor nossas manifestações artísti
cas modernas e contemporâneas. Ulpiano Bezerra de Menezes disse há pou
co num debate no Museu Segall que o critério no Museu do Ipiranga para a
doação de obras à Pinacoteca, há cerca de cinqüenta anos atrás, era de que
toda pintura desvinculada de temática histórica deveria ser encaminhada à
301
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
302
A PINACOTECA DO ESTADO: PROBLEMAS EM TORNO A FORMAÇÃO DE UM ACERVO
1 “Art with a Plot Does Not Interest Me So Much” — From an Interview with W im Bee
ren, Kunst & Museum Joum aal, vol. 4, n° 3, Amsterdã, 1992, pp. 22-6.
2 Idem, ibidem.
303
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
3 David Elliot, “Framing the Frontiers: the Museum as Mediator”, Kunst & Museum Jour-
naal, vol. 4, n° 2, pp. 45-8, Amsterdã, 1992.
4 Idem, ibidem.
304
A PINACOTECA DO ESTADO: PROBLEMAS EM TORNO À FORMAÇÃO DE UM ACERVO
^ Octavio Zaya, “Hacia una reconsideración de la actividad artística? Arte y política en los
Estados Unidos”, Balcon-International, n°s 8 e 9, Madri-Canárias, 1992, pp. 167-74.
6 Henri Dorion, “Les Musées, carrefours du monde”, Forces/Les Musées/Museums, n° 98,
Montreal, 1992, pp. 42-7.
305
40.
Museus em crise?
[1994]
306
MUSEUS EM CRISE?
307
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
radas, com espaço expositivo climatizado, com equipe profissional e com or
çamento condizente, para responder às necessidades que uma exposição de
nível internacional solicita? Nem a capital do país, Brasília, está apta a rece
ber exposições de porte, o que depõe contra nós no concerto das nações civi
lizadas! E claro que o governo federal deveria reservar em seu babilônico or
çamento um montante suficiente para esse fim, pelo menos em quatro mu
seus do país por ano, realizando gradativamente o treinamento de um pes
soal especializado em várias regiões.
Museu sem aquisições regulares é um museu esclerosado. Se o objeto-
fim do museu for arte contemporânea, então mais grave será a carência. O
Estado pode atender, parcialmente, por certo, a essa necessidade, porém a
iniciativa privada deve dela participar, mas para isso é preciso criar instrumen
tos mais ágeis para estimulá-la, de fato, a arcar com a responsabilidade de
desenvolver a cultura do país. Para esse fim, talvez seja obrigatória uma con
quista, um processo de atração para conscientizar a classe empresarial. O
início já foi feito em São Paulo com relação a publicações; agora a etapa de
veria ser “aquisições”, na partilha das responsabilidades sociais dentro da
comunidade.
41.
A exposição Rodin
[1995]
309
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
310
A EXPOSIÇÃO RODIN
mento, o governador é, senão apático, quem sabe até hostil para com essa
área, em sua recusa de avaliar suas possibilidades de se tornar um cartão de
visitas que São Paulo possui e não cuida, melhor seria fechar tudo, na onda
imobilista do Estado. Dificuldade financeira pede revisão, não colapso. Po
de-se racionalizar, mas destruir tudo, ou anular um trabalho de anos (como
se passou com o trabalho anônimo dos que trabalham em museus e arqui
vos, profissionais que devem ser respeitados pois sua correta formação de
manda muito mais tempo do que um ou dois anos de contratação), é puro
obscurantismo.
A “Exposição Rodin” está aqui. Fruto de um contato do sensível e di
nâmico diretor da Pinacoteca do Estado, tudo foi feito, em meio à desarti
culação da Secretaria da Cultura, frente ao desrespeito pelos poucos trabalha
dores desse museu como dos demais, como o de Arte Sacra e Museu da Casa
Brasileira, para que a exposição ocorra em nossa capital. Não se creia, contu
do, que o fascínio de sua exibição, o cuidado que esse museu devotou para
seu preparo, tenha algo a ver com a situação reinante. É algo paralelo à situa
ção. Ou, paradoxal mesmo, como disse um profissional de museus diante do
que se passa atualmente na área de museus em São Paulo. Nosso estado nunca
teve apoio da área federal para seus museus (“São Paulo tem dinheiro”, foi
sempre o mote), a não ser agora, com a promessa para o término das obras
da Pinacoteca do Estado e Cinemateca. Até parece que somos um Estado que
não contribui com imposto de renda para o governo federal...
Estarrecedora é igualmente a apatia do meio cultural e artístico frente à
situação em que vivem nossas instituições. Não ocorre nenhum abaixo-assi-
nado, nenhuma manifestação pelo estado de coisas existente. É como se ama
nhã os museus do estado — com todo seu valiosíssimo e insubstituível pa
trimônio — pudesse deixar de existir, e a Secretaria de Cultura fechar por
inadimplência e ninguém sentisse falta. Essa paralisação vem também ao en
contro das idéias — ou da falta delas, por parte do governador — , confir
mando que a cultura não é necessária. Porém, na verdade, as instituições
culturais não existem para servir aos artistas, e sim, à sociedade como um
todo. Como escreveu Kyrre Reymert, “os museus e os monumentos históri
cos têm sido tradicionalmente símbolos da identidade e do orgulho nacio
nais. De fato, os trabalhadores dos museus têm o dever de conservar a beleza
e a grandeza do passado”, “devem ser exemplos da riqueza e variedade da di
311
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
312
42.
O desmanche da cultura no Estado de Sao Paulo
[1996]
313
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
314
O DESMANCHE DA CULTURA NO ESTADO DE SÃO PAULO
316
A EXPOSIÇÃO MONET
317
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
318
44.
Curadoria, museologia e arte construtiva
[1998]
319
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Temos tido ocasião de ouvir opiniões as mais diversas sobre este assun
to — expressando a dificuldade de se chegar a um consenso — , assim como
de ver obras nessas condições em várias exposições, e observa-se que ainda não
se chegou a um acordo sobre o que fazer quando se tem próxima uma obra
em estado de danificação, ou simples envelhecimento. Consideramos que a
obra original é, dentro da dignidade do trabalho do tempo sobre sua ma
terialidade, a mais autêntica como documento. Contudo, argumenta-se, se
o projeto construtivo abstrato-geométrico privilegia a assepsia da imagem, que
se deseja impecável pela própria natureza da tendência abstrato-geométrica,
por que impedir sua refeitura — ou drástica repintura — caso se observem
cuidadosamente as dimensões, os materiais, a identidade das cores?
Na verdade, vivemos num mundo em que se exaltam os originais, e as
cópias, a partir do século XIX, não detêm relevância enquanto obra reconhe
cível de autor. Porém, no caso de obra re-executada pelo autor ou por ou
trem, poderíamos falar também em “segunda versão” de mão do próprio au
tor, autorizada por ele ou por seus herdeiros.
De qualquer forma, considero também que o argumento “não está em
condições de ser exposta”, quando visível uma pequena danificação nos can
tos ou uma queda de pigmento, não é justificativa para um restauro total.
Acreditamos que este é um tema digno de uma discussão, seja por par
te de curadores, seja por parte de museólogos e restauradores de arte moder
na. E que deve nos interessar de maneira muito particular, no Brasil, pelos
inúmeros artistas que possuímos do período concreto desde os anos 50.
320
45.
500 anos de carência
[2000 ]
321
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
senadores deste país, grande parte comprometida com interesses que não são
benéficos para o povo sofrido, mas respondem a interesses deles próprios.
Quando se mencionam os benefícios escandalosamente auferidos por juizes,
vereadores, deputados, a total ausência de ética campeando por toda a parte,
com aviões da Força Aérea Brasileira sendo utilizados para tráfico de drogas
em número de vôos que pela imprensa, ao longo de meses, chegam a dezoi
to, fatos denunciados sem que, em seu caso, o ministro da Aeronáutica tivesse
se suicidado, se demitido ou sido sumariamente exonerado por sua respon
sabilidade moral pela pasta a que respondia, a população que lê jornal fica
paralisada. Não se alegue falta de dinheiro, porque o dinheiro corre à solta,
em suborno, em corrupção, em viagens fictícias de vereadores, à custa do
povão que paga, sem saber, todas essas faturas, calado, submisso como povo
escravo, karma que se carrega por gerações sem fim, desprovidas de qualquer
dignidade.
Não se diga que não há projetos de circulação de exposições pelo país,
pois nós mesmos já apresentamos há quase dez anos um esboço de projeto
— sem qualquer resposta por parte do Ministério da Cultura — , a tentar ele
var o nível de educação, cultura e mútuo conhecimento entre os estados, ten
tativa de profissionalizar as equipes profissionais dos museus tão desiguais
deste país com pouquíssimos museus. Mas o Ministério da Cultura aparen
temente desconhece a importância de museus devidamente estruturados para
a educação, o desenvolvimento do turismo interno, assim como ignora a
premência da auto-afirmação de um povo através de exposições bem realiza
das por todo o país, a fim de projetar nossa cultura, nossa gente e a cultura
dos demais povos do mundo.
Vão ser celebrados os 500 anos deste país que possui uma capital jovem,
que cumprirá quarenta anos. Quarenta anos sem que possua sequer um mu
seu digno deste nome para a visitação pública ou do turismo estrangeiro em
visita a Brasília. Não há um museu de História do Homem Brasileiro, assim
como não há um museu de arte, ou um museu das primeiras populações que
viveram em nosso território. Como explicar ou justificar tamanha indiferen
ça ou omissão?
Difícil que tenhamos esperanças, pois numa época em que temos como
presidente, bem como ministro da Cultura, um político oriundo da mais
prestigiosa universidade do país, depois de cinco anos de gestão, nada foi fei
322
500 ANOS DE CARÊNCIA
323
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
1 Por outro lado, como comemorar a cultura neste território que nos envergonha à simples
observação de novos selos dos Correios, concebidos como se não projetassem a imagem do país,
324
500 ANOS DE CARÊNCIA
tai como se vê recentemente em tiragem sobre frutas brasileiras, mal realizados, de qualidade infe
rior como nossas moedas sem peso, ou nossas notas de reais. Como desejar exibir respeitabilidade
a um papel-moeda de tão baixa qualidade, quando um dólar também em papel-moeda tem a re
sistência para anos e anos de circulação, exemplo de permanência e qualidade? Não se pode ficar
permanentemente na aceitação da frase de Simón Bolívar no século passado (“el vino d e banano és
amargo pero és nuestro ”), porém na exigência de dias melhores. Horacio Costa, “Carta de Brasil
— Brasília: una ciudad sin museos y con políticos”, Cuademos Hispanoamericanos, n° 587, Ma
dri, maio de 1999, p. 115.
325
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
2 Acrescenta ainda nesse parágrafo o sociólogo argentino radicado no México, país de am
pla e excepcional tradição museológica no contexto latino-americano: “O agrupamento de obje
tos e imagens por salas, uma para cada século ou período, reconstrói visualmente os cenários his
tóricos, torna-os quase simultâneos. Uma museografia rigorosa destaca as etapas decisivas na fun
dação ou na transformação de uma sociedade, propõe explicações e chaves de interpretação para
o presente”. Nestor Garcia Canclini, “Culturas híbridas: estratégias para entrar e sair da moder
nidade”, tradução de Ana Regina Lessa e Heloísa Pizza Cintrão, São Paulo, Edusp, 1998, p. 141.
326
500 ANOS DE CARÊNCIA
3 “Sofás, poltronas, tapetes, mesas e cadeiras foram devolvidos a lojas de decoração e anti
quários”, diz a reportagem. Sem falar nas 3 mil cadeiras, mil lixeiras, quatrocentas mesas e 180
armários mencionados na referida matéria que acrescenta que a companhia de limpeza urbana re
colheu nada menos que “160 toneladas de lixo”, equivalente “ao volume removido em oito jogos
de final de campeonato no Maracanã.” Isso tudo sem falar nas varredeiras mecânicas e jateadeiras
de alta pressão utilizados para a limpeza pós-Cimeira, no recinto do Museu. Será que toda essa
confusão não afetaria de algum modo o já combalido acervo do MAM-RJ? Estaria um coleciona
dor como Gilberto Chateaubriand, doador da coleção de arte brasileira do MAM, de acordo com
essa utilização do espaço do museu? E a equipe de profissionais do museu? “Entre as preciosida
des que decoraram a sala utilizada pelos presidentes estavam uma mesa de centro que pertencia à
casa de d. João VI, em Paquetá, e uma mesa datada do século XIX, que era da princesa Isabel”.
Ver “Governo desmonta estrutura da Cimeira”, O Estado d e S. Paulo , 1/7/1999.
327
46.
Mário Pedrosa: um homem sem preço
[2000 ]
328
MÁRIO PEDROSA: UM HOMEM SEM PREÇO
329
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
330
MÁRIO PEDROSA: UM HOMEM SEM PREÇO
331
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
332
47.
Mário Pedrosa
e a Cidade Universitária da USP
[2003]
333
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
recente da mesma a esta autora — é ainda hoje peça para todos nós para re
flexão sobre os destinos de instituições, coleções e entidades em nosso país.
Antevendo o equívoco de Matarazzo Sobrinho em doar as obras à Universi
dade de São Paulo (que até hoje não construiu um museu digno dessa ini
gualável coleção), Pedrosa refaz, com ponderação e ceticismo, a trajetória
de crises por que passou o MAM-SP até a doação de seu acervo, e não utili
za meias palavras: “Antes de mais nada é preciso afirmar-se e reafirmar-se que
não se fecha nem se suprime museu, como não se fecham nem se suprimem
teatros ou escolas, pois museu não é loja nem botequim [...]. Esperemos que
os responsáveis pelo seu destino na Universidade e no governo do Estado
compreendam as formidáveis implicações, de ordem cultural, espiritual e até
moral, da existência atuante e viva, de um museu com as tradições e possibi
lidades do nosso antigo Museu de Arte Moderna, e ajam em conseqüência”.2
Mais adiante ele se referiria, nesse mesmo pronunciamento, à “falência das
responsabilidades sociais da iniciativa particular, no plano extremamente gra
ve e delicado da cultura”.
Há algumas circunstâncias que apontam para a explicação do súbito
envolvimento de Mário Pedrosa com o projeto de edificação da Cidade Uni
versitária. Em primeiro lugar, pela própria presença, em São Paulo, de Pau
lo Camargo e Almeida, também trotskista, assim como o último diretor do
Museu de Arte Moderna de São Paulo antes da passagem de sua coleção para
a Universidade de São Paulo. Em segundo lugar, Mário Pedrosa viveu me
ses de angústia com a perspectiva de ver a coleção do Museu de Arte Moder
na de São Paulo passar à Universidade. O seu “Parecer sobre o Core da Ci
dade Universitária” assume, assim, realizada essa alentada reflexão/projeto
pouco antes de seu retorno definitivo ao Rio de Janeiro, nessa passagem de
1962 para 1963, o caráter de uma tentativa de prever para a Universidade
uma infra-estrutura enquanto centro cultural, que ainda não possuía. E que
ainda não possui, neste raiar do século XXI em que vivemos.
Seu desligamento próximo do MAM-SP e seu conhecimento da impor
tância de seu acervo — enriquecido com as coleções de Yolanda Penteado e
2 Idem, ibidem. Na verdade, estamos vivenciando em nosso país um tempo novo em que s
tenta passar para a iniciativa privada a responsabilidade que sempre recaiu, e ainda recai, na Euro
pa, ao Estado em particular, pelas coisas da cultura.
334
m Ar io p e d r o s a e a c id a d e u n i v e r s i t á r i a d a u s p
3 Já fizemos referência a esse compromisso tácito, porém não registrado em documentos for
mais, quando da passagem das obras da coleção MAM-SP à USP em nosso ensaio “A história de
uma coleção”, in Museu de Arte Contemporânea da USP: p erfil de um acervo, São Paulo, Ex-Libris/
Techint, 1988.
^ Certa vez ouvi de alguém de dentro da Universidade que a idéia de se fazer uma Bibliote
ca Central fora descartada à época do regime militar, posto que o governo não acolhia com bons
olhos locais que pudessem se configurar como espaço para reunião de estudantes, no período.
335
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
em afirmá-lo — que esse acervo será “um dos centros de atração artística e
social de maior destaque na Cidade Universitária”.5
Da maior importância está, nesse texto iluminado de Pedrosa, a idéia
da criação de um Instituto de Artes, todo “um departamento destinado ao
aprendizado e à formação profissional no plano artístico”, desde a iniciação
artística até a apreciação de obras de arte. Daí porque ele enfatiza: “O Insti
tuto de Arte, separado do contexto museográfico e da ambiência da obra viva,
tende a congelar-se num processo de ensino como outro qualquer”. Pedrosa
pensa num currículo abrangente, que situe as obras no contexto de seu tem
po, não se dando “uma história da pintura, digamos, gótica, sem curso para
lelo de arquitetura da mesma época, bem como das outras artes, música, tea
tro etc.”, referia-se ele, nesse trecho de seu projeto, à “história simultânea e
comparada”, a fim de fazer aflorar na sensibilidade do estudante o “espírito
do tempo” de cada período abordado. E não tem dúvidas em dizer que “das
criações contemporâneas é que se tem de caminhar até, através das idades, às
expressões artísticas mais recuadas, como a arte das cavernas”. Ou seja, a partir
do compromisso com o nosso tempo é que devem nos chegar as trajetórias
dos artistas de todas as épocas que nos precederam.
Enfim, este “Parecer”, que deu margem a um projeto de Oswaldo Bratke
para o Core da Cidade Universitária, caso realizado, teria infundido uma di
mensão cultural-artística à nossa Universidade, que, se era desconhecida no
início dos anos 60, permanece ainda hoje, quase quarenta anos depois, igual
mente lacunosa para o porte da USP por sua projeção nacional. Teria esse
Core concebido por Pedrosa alterado o perfil e o rumo das unidades de Ciên
cias Humanas e Artes da Universidade caso tivesse sido implantado, com a
relevância que ele deu ao Museu, pelo conhecimento que tinha do acervo re-
cém-doado à USP? Essa é a indagação que nos fazemos hoje, diante desse tex
to que nos cabe ler com atenção e respeito.
5 Falando da importância do papel educacional do museu e das monografias que lhe cabe
riam editar a partir de pesquisas que, dele oriundas, se igualam às pesquisas universitárias, Pedrosa
cita a esse propósito o prof. H. Daifuku, da Unesco, acrescentando, segundo esse especialista, que
“o conservador de um museu de arte, inspirando-se nas tendências atuais, é, ou deveria ser, cons
ciente dos fatores que influem na criação artística contemporânea”.
336
48.
Henry Moore no Brasil
[2005]
337
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
Aliás, essa preocupação em ver suas peças ao ar livre, como hoje se pode
apreciar na Henry Moore Foundation, vem ao encontro de uma declaração
sempre enfatizada pelo artista: “Prefiro ver as minhas esculturas dentro de
qualquer paisagem a vê-las dentro do mais belo edifício do mundo”.1 Este
desejo constante de integração de suas obras com o meio-ambiente é expli
cado também segundo o crítico José Augusto França, pela origem do escul
tor. Seu pai, mineiro, tivera a preocupação de que, apesar de serem modes
tos, através da educação — em escola pública na infância e depois por meio
de bolsas de estudo — nenhum de seus oito filhos descesse às minas. Assim
como também pode justificar o anseio pelo céu, pelo vazado que revela o es
paço aberto: “Moore é filho de mineiro e sabe que os homens vivem demais
longe do sol. Por isso, quando os transforma em estátuas, exige para eles o ar
livre. Mas não lhes disfarça a tragédia latente. Os túneis que abre nas figuras
representam ainda, e, sobretudo, talvez, o seu viver subterrâneo — e es
buracadas, elas são bem a imagem dos Hollow M en do poema de T. S. Eliot,
que já uma vez lembrei a seu propósito”.2
Entretanto, em entrevista, perguntado de onde lhe teria vindo a idéia
dos orifícios abertos em suas figuras, Moore respondeu com simplicidade:
“De tanto penetrar no coração da matéria acabei descobrindo o céu do ou
tro lado...”.
O artista inglês praticou desde o início o entalhe direto (direct carving)
em oposição à outra técnica escultórica, da modelagem (de modelar a mas
sa). Confessou em depoimento a Geraldo Ferraz, na visita do crítico brasi
leiro ao artista em sua casa e ateliê em Floglands, seu apreço pela observação
1 “Um grande bloco de pedra ou de madeira, colocado em qualquer lugar, ao acaso, numa
praça, está em seu lugar e é inspirador. As esculturas podem ficar até no meio do campo, porque
aí completariam a natureza, da qual aproximariam as pessoas. Nossos sentidos devem ser educa
dos com arte. E qual o papel do escultor? Muitos querem saber. É exatamente este — educar os
olhos das pessoas para que cheguem a compreender, a sentir a beleza da forma. A escultura só atin
girá esta finalidade se fizer parte da vida. Não o conseguirá se permanecer fechada entre as pare
des de um museu onde se olha para ela durante três minutos para esquecê-la em seguida”, apud
Ivo Zanini, “A arte maior de Henry Moore aos 88 anos”, O Estado d e S. Paulo, 23/8/1986.
2 José Augusto França, “Henry Moore”, O Estado d e S. Paulo (Suplemento Cultural), São
Paulo, 10/5/1959.
338
HENRY MOORE NO BRASIL
3 Geraldo Ferraz, “Moore e vários aspectos atuais da arte da escultura no mundo”, O Esta
do de S. Paulo, 28/2/1962.
4 Antonio Gonçalves Filho, “Gravuras de Henry Moore contam a trajetória das artes no
século 20 ”, Folha de S. Paulo, 5/1/1990.
^ Surpreendeu-nos encontrar nos Arquivos da Bienal de São Paulo duas cópias de telegra-
339
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
raas enviados por Matarazzo Sobrinho ao diretor do British Council no Rio de Janeiro (e o outro
em termos similares, ao prof. Perry, da Cultura Inglesa em São Paulo) expressando sua gratidão
pelo oferecimento do artista da escultura M ãe com criança (“Nossa Secretaria concertará com vos
sa senhoria detalhes para entrega oficial da estátua doada ao Museu”). Talvez seja uma referência
a uma das duas peças constantes da II Bienal: M ãe e criança, de 1936, pedra de Ancaster, e a ou
tra M ãe e criança sentadas, 1952, bronze. Porém ignoramos se tal doação realmente teve lugar.
6 Herbert Read, Catálogo Henry Moore, Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, 1965
(tradução revista por Antonio Callado).
340
HENRY MOORE NO BRASIL
UM MOORE NO MAC-USP
341
MUSEUS E CIRCUITOS DE ARTE
9 O fundador do MAM-SP e das Bienais adquirira essa obra de Umberto Boccioni da sra.
Benedetta Marinetti, viúva do poeta-agitador, em 1952, e em 1960 o museu paulista fundira um
bronze dessa peça, hoje na coleção do MAC-USP. Com efeito, existem, segundo se sabe, as se
guintes cópias em bronze desta peça de Boccioni, ocorrendo um compromisso tácito por parte do
MAC-USP em não mais realizar cópias: 1) um bronze castanho, em Milão; 2) um bronze brilhan
te, no MoMA-NY oferecido por Benedetta Marinetti; 3) um bronze na coleção Mattioli, em Ro
ma, este com base; 4) um bronze no MAC-USP e 5) um bronze feito em 1972 para a Tate Gal-
lery, em Londres.
10 Duas curiosidades: a cidade de Nova York possui uma cópia da peça, hoje no MAC, ten
do sido exposta no Central Park em 1988, resultado de doação dos colecionadores George e
Virginia Ablah, segundo se pode ver no M anhattans outdoor sculpture, 1988, p. 195. Por outro
lado, pode-se lembrar que a filha de Henry Moore, Mary Moore, acompanhada por seu marido,
Raymond Danowski, visitou o M AC em 1976, ocasião em que chega a manifestar a Walter Zanini
a idéia da família Moore, embora não realizada, de através de uma fundação, estabelecer um nú
cleo Moore em São Paulo, bem como nos Estados Unidos e Japão.
11 A Autora agradece aos Arquivos da Fundação Bienal de São Paulo, Arquivos do Museu
de Arte Contemporânea da USP, à Dalton D. Mazieiro e à Cristina Cabral.
342
Parte 3
A rte e cidade
49.
Arquitetura, Jaguaré e Barra Funda
[1988]
345
ARTE E CIDADE
realização maior dessa gestão, corporificada nos CIEPs, escolas integrais para
os menores sempre abandonados de nosso sofrido país. Jânio Quadros não
ficaria insensível a ter, para sua “inexistente” gestão na Prefeitura de São Pau
lo, fruto tardio de uma personalidade destruída, uma obra com a griffe Os
car Niemeyer. Mas tudo indica que as coisas não correram como o prefeito
desejara. E eis que agora, na Folha de S. Paulo , de 16/10/1987, Orestes Quér-
cia tenta captar de Niemeyer algo de seu carisma incontestável, num projeto
para a Marginal do Tietê, na Barra Funda, em São Paulo.
Por certo, cada imperador da Assíria tem o seu arquiteto. Mas parece-
nos que, às vésperas de seus 80 anos, se pode dizer que temos apenas um ar
quiteto no Brasil: Oscar Niemeyer. Será que somente o seu desaparecimen
to da cena cultural brasileira revelará outros profissionais que hoje se inibem
diante da gigantesca imagem do ditador Niemeyer? Sim, pois a cada visita a
Brasília nos damos conta do peso autoritário de sua personalidade. Está cer
to que seja a “sua cidade” e haja a necessidade de se preservar uma unidade
formal dos edifícios públicos do Plano Piloto e, nesse caso, quem assina os
projetos que surgem, sugeridos ou solicitados, com raras exceções, é Oscar
Niemeyer. Não importa que tenha sido desapontador o resultado plástico,
no caso do Memorial JK, onde uma canhestra escultura se eleva diante do
discutível espaço do Memorial. Embora elegante e poética como forma, a be
leza escultórica das linhas do Panteon não justifica neste, como no Memorial
JK, um interior tão kitsch em seu provincianismo, que desfaz a simbologia
necessária ao espaço, além do excessivo revestimento de carpetes, vitrais de
gosto questionável e recepcionistas trajados como em stand de feira industrial.
Estamos já fatigados de dizer e ouvir que este é um país de memória cur
ta, ou um país de arrivistas, e que a arquitetura serve sempre ao sistema, ou
somente mediante a arquitetura permanece o rastro do tempo, pois não são
os objetos ou as obras de arte de pequeno porte que “significam”, com elo
qüência, a passagem de um momento. Daí porque cada governo quer ter, no
Brasil, uma obra de Oscar Niemeyer. Não seria uma manipulação indevida
do nome de Niemeyer? Quantos bons arquitetos poderiam ter emergido, ca
so lhes fossem “dadas” oportunidades similares?
E possível fazer reservas quanto à sua trajetória ou personalidade, mas,
no que tange a São Paulo, é inegável que foi um projeto de visão aquele de
Ruy Ohtalce para o Parque Ecológico do Tietê, previsto pelo governo Paulo
346
ARQUITETURA, JAGUARÉ E BARRA FUNDA
1 O próprio Artigas, em depoimento, declarou-nos com amargura que, certa vez, Niemeyer,
interpretando uma observação sobre o seu trabalho, comentara com um amigo comum: “O Arti
gas não gosta mais de mim...”, reduzindo tudo ao plano pessoal.
347
ARTE E CIDADE
da arquitetura dos anos 40. Exceção feita ao arquiteto Joaquim Guedes, que
expõe suas críticas a Niemeyer quando as julga pertinentes. Na verdade, os
arquitetos de gerações intermediárias, que têm entre 50 e 60 anos, não fazem
reservas a Niemeyer, e chegamos até a pensar que eles, no fundo, pretendem
permanecer com a aura de seus seguidores, garantindo uma respeitabilidade
futura perante o estado encomendeiro, por excelência, em nosso país.
Por outro lado, sem entrar no mérito da iniciativa, surpreendidos dian
te da notícia da realização do Memorial da América Latina pelo governo
Quércia, em São Paulo, coloca-se, novamente, uma série de questões. Não
se trata nem de indagar o dado positivo do projeto cultural e político (!) por
trás dessa proposta, mas sim o processo democrático segundo o qual se espe
raria que um projeto dessa monta fosse realizado perante a Assembléia Le
gislativa do Estado, a Secretaria de Estado da Cultura, a concorrência ne
cessária entre diversos profissionais para a seleção da melhor proposta e a Se
cretaria da Fazenda do Estado. Mas, ao que parece, se o que importa é mar
car um governo, então o fundamental é, de fato, realizar uma obra assinada
por Niemeyer.
O desencanto dos que militam na área cultural não vem dessa iniciati
va, mas, por certo, é algo mais que se soma à descrença de toda a oposição
dos anos 70 diante da inércia e mediocrização dos órgãos ligados à Cultura,
onde cada nomeação ou comissão é mais grave que a seguinte. Na verdade,
apenas como um exemplo, se ainda não foi possível levar a cabo a constru
ção do segundo projeto do Museu de Arte Contemporânea da USP, uma
entidade que foi estruturada com um projeto cultural definido, vemos hoje
que isso é, em grande parte, conseqüência de não pertencermos à oligarquia
industrial do estado, ou possuirmos ligações diretas com o prefeito da cida
de, pois, se essa fosse a situação, nem seria necessário um projeto cultural, pois
obteríamos, sem sofrimentos maiores, não apenas o espaço no valioso meio
urbano, mas o apoio financeiro para realizá-lo. E talvez a falha residisse, nes
se caso, em desejar um projeto realista, à altura de um país em crise econô
mica, e, portanto, o arquiteto convidado tivesse se mantido em atitude de
atenção e sobriedade, buscando adequar uma estrutura já existente ao pro
grama do MAC. Quem sabe um projeto flamante de Oscar Niemeyer teria
se imposto aos governantes? O problema não é que exista espaço para todos.
Ao contrário. Aparentemente, só para Oscar Niemeyer. Um artista que me
348
ARQUITETURA, JAGUARÉ E BARRA FUNDA
rece nosso respeito, um amigo dos amigos, fiel, até passível de críticas seve
ras por ter escolhido -— no que tange às artes plásticas em seu desejo de
integração das artes — artistas que lhe eram próximos, sem maiores indaga
ções quanto à qualidade de sua produção. Um profissional muito querido,
muito respeitado, muito mitificado, que deveria, talvez, estar discutindo com
os jovens seus projetos, argumentando com sua experiência diante das críti
cas, que estão chegando...
Não é tarefa fácil fazer reservas a um arquiteto com a trajetória excepcio
nal de um Oscar Niemeyer, que vivenciou, ele mesmo, momentos dramáti
cos da história do Brasil no século XX. Daí porque nos chocamos quando,
há poucas semanas, respondeu autoritariamente às críticas de um ensaísta
estrangeiro em visita a nosso país. Aliás, qualquer observador, especialista ou
não, tem pleno direito de criticar nosso meio (e caos) urbano e nossa arqui
tetura, quando encontra a seus pés uma imprensa ávida de tirar partido de
quaisquer polêmicas.
Mas não deixa de ser difícil a explicação da vinculação da figura de Os
car Niemeyer com a série recente de projetos oficiais de custo bilionário, num
momento tão sombrio da realidade econômica e moral brasileira, a projetar,
com uma certa voracidade como arquiteto, no afã de ocupar todos os espa
ços deste país tão pobre. Isso nos faz refletir sobre as gerações de arquitetos
mais jovens, com outras preocupações, tanto do ponto de vista da organiza
ção do espaço quanto no nível plástico de suas propostas, ansiosos por parti
cipar de propostas similares e competir, a fim de que, democraticamente,
possamos assistir ao nascimento de uma nova arquitetura em nosso país. Ar
quitetura brasileira, cujo momento inaugural de ruptura foi marcado pelo
contato com Le Corbusier — centenário que hoje comemoramos — e de
quem Niemeyer foi, sem dúvida, o discípulo mais brilhante.
50.
A decadência da Paulista
[1991]
350
A DECADÊNCIA DA PAULISTA
351
ARTE E CIDADE
352
51 .
Imagem da cidade moderna:
o cenário e seu avesso
[1993]
1 “O novo é o desejo do novo, não é o novo era si. Esta é a maldição de tudo o que é novo”.
Jorge Schwartz, Vanguardas latino-americanas: estética e ideologia na década d e 20, Tese de Livre-
Docência apresentada à FFLCH-USP, São Paulo, 1989.
353
ARTE E CIDADE
354
IMAGEM DA CIDADE MODERNA: O CENÁRIO E SEU AVESSO
te pela arte, mas manchando também com violência os costumes sociais e po
líticos, o movimento modernista foi o prenunciador, o preparador e por mui
tas partes o criador de um estado de espírito nacional. A transformação do
mundo com o enfraquecimento gradativo dos grandes impérios, com a prá
tica européia de novos ideais políticos, a rapidez dos transportes e mil e uma
outras causas internacionais, bem como o desenvolvimento da consciência
americana e brasileira, os progressos internos da técnica e da educação, im
punha a criação de um espírito novo e exigiam a reverificação e mesmo a re
modelação da Inteligência nacional”.3
Fator determinante do estado de espírito que solicitava a renovação das
artes em vista de um novo tempo é a metropolização de São Paulo, de cres
cimento vertiginoso. No centro antigo, fotografado por Militão Augusto de
Azevedo em 1862, e depois novamente documentado pelo mesmo fotógrafo
em 1887, já se assistia a uma alteração visível em sua fisicalidade. Referimo-
nos à implantação do alinhamento e alargamento das ruas do centro, refor
mas embelezadoras ou novas construções, apresentando-se, na década de 10,
às vésperas de 1920-22, como um aspecto de cidade em nervosa mutação. Do
ponto de vista residencial, domina o estilo eclético, confusão inominável, se
gundo Monteiro Lobato, onde todos os estilos se mesclam em balbúrdia ator-
doante, tal como o poema, de “mal jeitosas adaptações de versos alheios, ti
rados de todas as línguas e de todas as raças”. Na arquitetura, São Paulo não
poderia ser diferente. Daí porque Lobato escreve: “São Paulo é hoje, à luz
arquitetônica, uma coisa assim: puro jogo internacional de disparates”.4
Ao mesmo tempo, essa destruição/construção, e reconstrução contínua
que sempre caracterizou a cidade, dá bem o clima de sua excitação, que se
comunica a seus poetas e artistas. Sempre transpiram o seu progresso e cres
cimento assombrosos, em particular na obra dos poetas, que são tocados pela
“vertigem” das novas tecnologias e da recém-criada agitação urbana. Luis
Aranha é exemplo peculiar: “Meu corpo cantaria/ Sibilando/ A sinfonia da
3 Mário de Andrade, O m ovim ento modernista , Rio de Janeiro, Casa do Estudante do Bra
sil, 1942.
4 Monteiro Lobato, “A questão do estilo”, in Idéias d e Jeca Tatu, São Paulo, Brasiliense,
1946, p. 34.
355
ARTE E CIDADE
356
IMAGEM DA CIDADE MODERNA: O CENÁRIO E SEU AVESSO
8 “São Paulo/ Eu adoro esta cidade/ São Paulo é como meu coração/Aqui nenhuma tradi
ção/ Nenhum preconceito/ Nem antigo nem moderno/ Só conta este apetite furioso esta con
fiança absoluta este otimismo esta audácia o trabalho o labor esta especulação que fazem construir
dez casas por hora de todos os estilos ridículos grotescos belos grandes pequenos norte sul egípcio
ianque cubista/ Sem outra preocupação que a de seguir as estatísticas prever o futuro o conforto
a utilidade mais valiosa e a de atrair uma maciça imigração/ Todos os países/ Todos os povos/ Eu
gosto disso”. Aracy A. Amaral, Blaise Cendrars no Brasil e os modernistas, São Paulo, Livraria Mar
tins Editora, 1970, pp. 141-6. Nova edição revista e ampliada, São Paulo, Editora 34, 1997.
9 Nicolau Sevcenko, Orfeu extático na metrópole: São Paulo, sociedade e cultura nos frem entes
anos 20, São Paulo, Companhia das Letras, 1922, pp. 23-8.
357
ARTE E CIDADE
358
IMAGEM DA CIDADE MODERNA: O CENÁRIO E SEU AVESSO
359
52 .
Criação: arquitetura e arte
[1994]
360
CRIAÇÃO: ARQUITETURA E ARTE
361
ARTE E CIDADE
362
CRIAÇÃO: ARQUITETURA E ARTE
363
ARTE E CIDADE
364
I
53.
Um olhar sobre a cidade
[1995]
365
ARTE E CIDADE
366
UM OLHAR SOBRE A CIDADE
savam por implantar bustos de poetas, a inspirar futuros talentos das novas
gerações.
A partir dos anos 60, uma coleção de desastres parece vir sistematica
mente povoando a cidade, em seus espaços públicos. É como se não tivésse
mos urbanistas, nem arquitetos, nem personalidades que pensassem a cida
de com o espírito público e a fdosofia que presidira a implantação dos jar
dins públicos nas diversas cidades do Brasil, com São Paulo incluída nesse
contexto, conforme nos narra em detalhe Hugo Segawa em sua Tese de Dou
torado sobre o surgimento dos jardins públicos e do paisagismo projetados
nos meios urbanos do nosso país.
De que serve nos reunirmos nesse encontro, se dessa troca de idéias não
surgir uma forma de pressionar os poderes constituídos para abrir os olhos e
tentar dar início a uma política estável e constante de correção de erros? Co
mo implantar uma política de conscientização da população, do tipo “Viva
o Centro”, de proteção a nossos monumentos e praças já existentes?
O Rio de Janeiro, além de sua beleza natural, sempre foi bem aqui
nhoado pelos poderes públicos federais, que protegem muito além do que
suas instituições culturais. Será que é por que foi capital federal durante 197
anos? Esse dado nunca ocorreu em São Paulo nem em outras capitais do Bra
sil, deixadas à sua própria sorte e/ou discernimento e iniciativa. No entanto,
as cifras estão aí para nos demonstrar que em São Paulo vive 22% da popu
lação de todo o país. Gente vinda de todos os cantos do mundo, do exterior,
como imigrantes aqui acolhidos e que se radicam e dinamizam nosso esta
do, como gente de todo o Brasil, sobretudo do Nordeste e de Minas Gerais,
objetivando o mesmo fim: sua sobrevivência à sombra do desenvolvimento
de São Paulo. Mas sabemos que aqui não se pensa “grande”. As soluções são
medíocres. Já no Rio de Janeiro, o Aterro do Flamengo veio depois da perda
do título de capital federal, assim como o alargamento da avenida Atlântica.
Porém, ambos foram projetos com a grandiosidade dos espaços de uma ex-
capital federal. Em São Paulo, temos minhocões, a catástrofe da construção
horrenda da praça da Igreja da Consolação, concepção equivocada de acumu
lação de diversos planos em concreto, local de encontro de marginais, pelo
rumo que a problemática econômica nos carrega.
Começou, se não me falha a memória, nos anos 70 a necessidade de
cercar de grades os espaços públicos ajardinados a fim de possibilitar sua vi
367
ARTE E CIDADE
368
UM OLHAR SOBRE A CIDADE
369
ARTE E CIDADE
370
UM OLHAR SOBRE A CIDADE
371
ARTE E CIDADE
1 Harriet F. Senie, Contemporary Public Sculpture: Tradition, T ransfom ation and Contro-
versy , Nova York, Oxford University Press, 1992.
372
UM OLHAR SOBRE A CIDADE
atitudes predatórias contra esse mesmo espaço. Creio que também faz parte
da mesma discussão. Nova York levou quatro longos anos de combate inces
sante por parte de suas autoridades (de 1984 a 1989) para se livrar dos grafi-
teiros do metrô, que emporcalhavam 6.245 vagões com uma pintura caóti
ca, que não trazia nenhuma mensagem senão o desespero da população ur
bana que usava esse meio de transporte coletivo, dando um aspecto sinistro.
Diz a imprensa da época: “Pressionada, a Prefeitura passou a aplicar 52 mi
lhões de dólares por ano na limpeza de trens, plataformas de espera, corre
dores e entradas de metrô. Ao mesmo tempo, os grafiteiros surpreendidos em
flagrante passaram a ser obrigados a apagar as pinturas. As lojas de materiais
de construção restringiram a venda de sprays a menores, [...] guardas foram
colocados em vários carros, o que desestimulou muita gente de grafitar”.2
Por que aqui não se age de maneira semelhante? Por que não se conse
gue colocar na prisão essa onda que oferece um aspecto deteriorado e sinis
tro às paredes de passagens e viadutos, aos altos de edifícios por vezes recém-
pintados ou recém-repintados? O pixador e o grafiteiro, ambos de qualidade
nula, utilizam-se dos espaços públicos ou da propriedade privada como se
fossem seus, em afronta aos direitos público e privado. A única explicação é
porque a municipalidade, ao longo de anos, tem sido cúmplice nessa perda
de visualidade de seus edifícios e ruas, permitindo e, freqüentemente, colo
cando faixas que atravessam vias públicas de um lado a outro, anunciando
eventos, dando ordens de circulação e trânsito, ou particulares que saúdam,
de maneira suja para a visualidade urbana, gente que chega de viagem, que
aniversaria, num flagrante uso do espaço público para fins privados, sem qual
quer punição. Não é diferente do caos urbano do Cairo.
Além do mais, não há uniformidade nas placas de estabelecimentos co
merciais para proteção da arquitetura, para melhor visualidade dos prédios,
que simplesmente desaparecem nesta selva de faixas; nem, aparentemente,
limitação para anúncios em postes, em lojas, em promoções as mais variadas.
Quando na primeira gestão do prefeito Paulo M aluf (1969-1972), ele come
çou a alugar os altos das placas de ruas para qualquer empresa, não houve
queixas suficientemente densas para impedir essa criminosa interferência num
373
ARTE E CIDADE
374
54.
Modernidade e nacionalismo no Brasil
[1995]
375
ARTE E CIDADE
Creio que é nessa linha de pensamento que surgiria Belo Horizonte, e, déca
das depois, na linha de preocupação com a interiorização do progresso, de
Goiânia, tendo Brasília como capital a desempenhar um papel determinante
na vida brasileira da segunda metade do século XX.
Há várias tendências de desenvolvimento paralelo que demonstram, des
de o início do século XX, uma vontade de mudança no estilo de construir e
de viver, na organização do espaço urbano e/ou doméstico. Não seria apenas
através do ecletismo que esse fenômeno se faz; notar. Ou talvez dentro dessa
denominação abrangente. Dois exemplos dessas tendências aparecem sinto
maticamente em São Paulo, no desenvolvimento gerado pela riqueza do café,
e, em seguida, pela industrialização nascente. Victor Dubugras, francês de
origem, que exerceu a profissão de arquiteto na Argentina e, depois, aportou
primeiro no Rio de Janeiro para depois se fxxar em São Paulo, seria o autor
de um projeto que foi pioneiro na arquitetura sem ornamento em nosso país:
a estação ferroviária de Mairinque, no interior de São Paulo. Funcionalista,
retilínea como desenho, trata-se do marco de nossa arquitetura moderna, ins
pirada em informações internacionalistas. Dubugras faria, mais tarde, incur
sões pelo art nouveau, assim como também pelo neocolonial nos pousos da
Serra do Mar, ao ser construída a primeira estrada de concreto armado no
Brasil, no início dos anos 20.
Se o internacionalismo se imporia, na segunda metade dos anos 20, com
Warchavchik e os projetos irrealizados, porém apresentados, de Flávio de
Carvalho, o nacional voltaria a ocupar e assumir um caráter de busca de iden
tidade, embora fantasiosa, ao ser traduzida para a arquitetura. Refiro-me ao
neocolonial, estilo de afirmação de um passado que varre como uma onda
de informação e invenção, posto que nossas sóbrias residências do período
colonial, salvo raras exceções como alguns solares existentes na Bahia, sem
pre foram de modéstia exemplar. Na vaga do neocolonial, a informação nos
chegava via Estados Unidos, onde arquitetos da Califórnia, a partir das três
últimas décadas do século passado, começam a se inspirar na arquitetura re
ligiosa das missões existentes nessa região, antes de sua ocupação pelos Es
tados Unidos, para construir um estilo que consideravam peculiar desse es
tado ou até mesmo como uma postura para qualificar sua identidade regio
nal, diferenciando-a do restante do país. Esse estilo, híbrido, por certo, na
quilo que denominamos “casa de artista de cinema”, vigoraria com plenitu
376
MODERNIDADE E NACIONALISMO NO BRASIL
de nos anos 30 e 40 do século XX. Na América Latina, esse estilo, que coin
cide com a busca de identidade, surgirá no México em 1910 e no Brasil por
volta de 1922, nas comemorações do centenário de nossas independências.
Na música, há um Alberto Nepomuceno; na literatura, um Euclides da
Cunha, com Os sertões ; nas artes plásticas, há um Almeida Júnior, a exem
plificar, desde fins do século XIX ao início do XX, que a preocupação com
o dado local irradia-se por toda a parte ao lado do novo perfil do país que se
alterava substancialmente.
Internacionalismo com uma pitada do nacional como preocupação fo
ram os desígnios de se pensar o desenvolvimento de uma cidade como o Rio
de Janeiro, capital em que o centro é redesenhado no começo do século XX.
A destruição do Morro do Castelo, que sediava inclusive o Colégio dos Jesuí
tas do Rio de Janeiro, abrirá uma área nova, onde seriam construídos edifí
cios que formam um conjunto harmonioso, que denominamos de arquitetu
ra da era getuliana, nas redondezas da avenida Graça Aranha, avenida Chur-
chill, avenida Presidente Wilson e adjacências da Igreja de Santa Luzia. Uma
arquitetura de qualidade resistente às modas. Em suas proximidades, seria,
em meados dos anos 30, iniciada a construção do futuro Ministério da Edu
cação e Cultura, hoje Palácio da Cultura, e marco da implantação da arqui
tetura moderna oficial do Brasil, neste projeto que ostenta com clareza o de
sejo da chamada “integração das artes”, aspiração tipicamente de caráter mo
dernista. O Rio de Janeiro ostentaria, portanto, no contexto de “modernis
mo paralelo” ao da arquitetura funcionalista do Ministério da Educação e
Cultura, outros edifícios interessantes nesse período em que o neocolonial
disputa com o moderno a visualidade de um novo tempo.
A frase de Mário Pedrosa de que somos um país “condenado ao moder
no” é definitiva, a despeito da variedade da acepção do termo “moderno”,
num país de tantas contradições culturais, quando pensamos em nossas con
tribuições no período, de início do século XX aos nossos dias, seja na área de
arquitetura, seja na de artes visuais. Essa dicotomia, esse confronto perma
nente existente nas realizações das duas áreas, entre internacionalismo e na
cionalismo, é prova dessa assertiva. Um crítico peruano, Carlos Rodriguez
Saavedra, escreveu certa vez que em toda a América Latina se sente essa preo
cupação que é como um movimento pendular, que oscila para um ou para
outro lado. Quando o nacionalismo emerge de forma mais contundente, por
377
ARTE E CIDADE
378
MODERNIDADE E NACIONALISMO NO BRASIL
379
ARTE E CIDADE
na arquitetura como nas artes visuais. Após a guerra, os nossos arquitetos, por
diversas circunstâncias, tornam-se atentos não apenas ao que se passa na Eu
ropa, no campo da arquitetura, à influência de um Le Corbusier ou Bauhaus,
fiéis à admiração à obra de Lucio Costa, Oscar Niemeyer ou Warchavchik,
porém abertos muito mais ao exterior. Assim, os arquitetos brasileiros dos
grandes centros começam a observar a arquitetura de pós-guerra norte-ame
ricana, como Frank Lloyd Wright, ao qual seria sensível um Vilanova Arti-
gas, por exemplo. Ao mesmo tempo, os Estados Unidos veiculam grandes no
mes de arquitetos que residem ou projetam eventualmente nesse país, após a
Guerra, como Eliel Saarinen, Mies van der Rohe, além dos próprios arqui
tetos norte-americanos. A vinda de Walter Gropius à II Bienal de São Paulo
(1954), ocasião em que realizou conferência entre nós, foi momento marcante
nessa nova fase do pensar a arquitetura no Brasil. O Congresso de Brasília,
em 1959, propiciaria um encontro enriquecedor, com a participação de no
mes consagrados internacionalmente, como Bruno Zevi, Richard Neutra, o
próprio Saarinen, ao lado de críticos da estatura de Sandberg, da Holanda,
Giulio Cario Argan, Meyer Schapiro, Roland Penrose, Tomás Maldonado e
W ill Grohmann, a convite de nosso crítico Mário Pedrosa e ao lado do ar
quiteto Oscar Niemeyer, a fim de discutir os caminhos da arte contemporâ
nea, às vésperas da inauguração oficial da nova capital. Contaram também
com a presença de Sérgio Milliet, Flávio Motta e Mário Barata, críticos de
arte brasileiros. Esse Congresso, realizado em três cidades (Brasília, Rio de Ja
neiro e São Paulo), constituiu-se um marco de discussão sobre a integração
das artes no século XX, a arquitetura e sua relação com as artes, objetivando,
ainda, analisar o projeto e a construção de Brasília.
Vivemos num tempo distante das inovações que rondavam nosso país,
durante a década de 50, num internacionalismo que vivenciávamos através
das artes visuais, Bienais, congressos, e triunfos de um cinema que se afirma
va através de um projeto montado numa indústria cinematográfica. Nessa
sociedade que nos envolve de maneira globalizada, na qual a transterritoria-
lidade é um fato palpável, no fim do século XX, quando cessaram as ideolo
gias, o pensar regional passa a significar a articulação econômico-financeira
por blocos de nações afins e próximas como única possibilidade de projetar
um futuro menos obscuro através da associação de interesses. Desta forma, a
discussão modernidade e nacionalismo pertence a um passado relativamente
380
MODERNIDADE E NACIONALISMO NO BRASIL
381
55.
Brasil: perfil de um meio artístico
marcado pela violência
[2000]
1 Robert Hughes, A toda crítica: ensayos sobre a rtey artistas, tradução de Alberto Coscarelli,
Barcelona, Anagrama, Col. Argumentos, 1997, p. 15.
382
BRASIL: PERFIL DE UM MEIO ARTÍSTICO MARCADO PELA VIOLÊNCIA
2 A violência em todas as grandes capitais do Brasil se reflete em sua classe média, temerosa
de assaltos e seqüestras, grades em portas e janelas, com seguranças nas ruas residenciais, reduzin
do as saídas noturnas, classe média cercada como um “gueto” pela massa das periferias que cres
cem assustadoramente.
383
ARTE E CIDADE
3 Ver, sobre o assunto, de George Yudice, “Poniendo en escena Ia ciudadania: ‘Viva Rio’
en contra de la violência urbana”, Trans, vol. 5, 1998, Nova York, Passim Inc., pp. 16-27.
4 Além da violência urbana declarada em assaltos e seqüestros, ocorre a ação de movimen
tos relativamente recentes como o dos “Sem-Teto”, em sua maioria desempregados, que ocupam
edifícios vazios e deteriorados do velho centro de São Paulo, transformando-os em cortiços, e di
ficultando, dessa forma, a tentativa do reerguimento dessas áreas pelo movimento “Viva o Cen
tro” de São Paulo. Sem falar na violência nova no campo, nos últimos dez anos, com o Movimento
dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra — MST — , que invade terras da propriedade privada, a fim
de reivindicar uma reforma agrária que nunca foi implantada no país, de forma devidamente es
truturada, o que acarreta para o campo insegurança e incerteza, contando com o apoio da Igreja,
das esquerdas e de entidades estrangeiras vinculadas aos Direitos Humanos. Contraditória a siste
mática de ação do MST, pois age inclusive com violência, por suas iniciativas e mortes, gerando
reação por parte dos proprietários, embora seja compreensível o desejo de diminuir a clamorosa
injustiça social. Participam do M ST não apenas agricultores sem-terra, mas todo tipo de profis
sionais, desempregados urbanos ou “sem-teto”.
384
BRASIL: PERFIL DE UM MEIO ARTÍSTICO MARCADO PELA VIOLÊNCIA
meio cultural da década. Não porque solucionem (nem cabe à arte fazê-lo)
ou busquem uma solução para a degenerescência do tecido urbano numa
metrópole terceiro-mundista. Nelson Brissac Peixoto, o filósofo que conce
be esses eventos, preocupa-se com sua concretização, como um tema para
reflexão e debate, a partir das instalações realizadas pelos artistas.
Assim, a cidade degenerada assume o papel de espaço ideal, como uma
cenografia poderosa e violenta para que o artista coloque o seu projeto. Com
uma ampla margem de patrocínios da iniciativa privada e pública, esses even
tos milionários colocam o artista visual dentro desses locais, com o desafio
de criar in situ obras dentro de ruínas de fábricas desativadas, edifícios aban
donados e ocupados por marginais como moradia, ou, ainda, em espaços ur
banos deteriorados do primeiro velho centro paulistano.
“Arte-Cidade” levanta a polêmica a propósito da intervenção do artista
atuando sobre o fio da navalha, entre a criatividade e o espaço urbano degra
dado, mas chegando a obter alguns resultados surpreendentes a partir de tra
balhos realizados por criadores de todo o país. No ano de 2000, Nelson
Brissac conta com a presença de artistas estrangeiros, numa tentativa de diá
logo entre situações criadas a partir de bairros hoje deteriorados, como Mitte,
em Berlim, e Brás, em São Paulo.5 O curioso é que cabe aos estrangeiros apre
sentar propostas de intervenção “com um sentido urbano e social aos espa
ços que ocuparão” na cidade. Pelo que divulga a imprensa, os brasileiros, em
sua maioria esmagadora, limitam-se a realizar mais um projeto de autoria, de
acordo com suas linhas de trabalho, desvinculados dessa possibilidade (mes
mo que efêmera, pois o evento tem uma breve duração) de beneficiar as po
pulações que vivem nesses espaços da cidade.6 Baseado na restauração do bair
ro de Mitte, em Berlim, Brissac concebeu a articulação entre artistas brasi
leiros e alemães. Mas a verdade é que os brasileiros se mantêm, em geral, den
tro de suas propostas estéticas, conceituais, “neutralizados” diante das carên
385
ARTE E CIDADE
7 Nuno Ramos, Balada, São Paulo, Editora 34, 1995, ed. limitada, assinada pelo Autor.
386
BRASIL: PERFIL DE UM MEIO ARTÍSTICO MARCADO PELA VIOLÊNCIA
8 Assumo hoje que tenho uma “visão sociológica da arte”, que pode ser censurável. Criti
cando a análise social da literatura, como exemplo do que se passa em outras áreas, Ivan Teixeira
declarou: “A visão sociológica da literatura acredita que existe um discurso literário que de algu
ma forma incorpora dados da realidade: ou reflete, ou é reflexo de, ou se apropria de, ou incorpo
ra dados da realidade social, ideológica ou histórica. Eu penso que a obra literária incorpora da
dos de um outro discurso que não é a realidade ainda. De certa forma, a realidade não é incorpo
rada por nenhum discurso, a realidade é um discurso paralelo, que existe por homologia com o
discurso da realidade”. Daí o concluir que “existe uma mediação de discursos sócio-culturais, que
não são a realidade, mas são discursos históricos, ideológicos, culturais e sociais”. “Poesia & Esta
do —• Ivan Teixeira conversa com Paulo Giovani de Oliveira”, Secretaria de Estado da Cultura
de Minas Gerais, Suplemento Literário , n° 55, jan. 2000, p. 23.
® Outra explicação, talvez excessivamente simples, seja a de que os artistas brasileiros dos
dois grandes centros, São Paulo e Rio de Janeiro, e, em conseqüência dos contatos do meio artís
tico de São Paulo com outras capitais, acham-se tão vinculados ao meio internacional no que res
peita à distribuição e difusão da criação contemporânea, que demonstram pouco interesse em abor
dar a realidade brasileira, local.
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ARTE E CIDADE
388
BRASIL: PERFIL DE UM MEIO ARTÍSTICO MARCADO PELA VIOLÊNCIA
10 Os seis galeristas do Brasil presentes nesta última edição de ARCO, por exemplo, são
unânimes em reconhecer — e a galerista Luciana Brito de São Paulo o confirma pessoalmente —
o quão positivo é a apresentação de seus artistas em Madri. E depois na feira de Nova York. Não
apenas pelo fato de venda de obras, como tendo em vista as posteriores solicitações para exposi
ções a que antes não teriam acesso. Desta forma, as feiras de arte assumem hoje igualmente o pa
pel difusor que antes cabia exclusivamente às Bienais internacionais e Documentas de Kassel.
389
ARTE E CIDADE
Sempre que me pedem uma reflexão sobre a arte no Brasil, tenho a preo
cupação de que meu discurso não seja exclusivo do que se passa nos dois gran
des centros de arte, São Paulo e Rio de Janeiro, mas que expresse também
algo do que ocorre em outros centros, como Minas Gerais, Rio Grande do
Sul, Nordeste e extremo Norte, mesmo que não mencione a riqueza da cria
tividade indígena e popular, sem dúvida as expressões mais autênticas de duas
facetas singulares de nossas culturas, tão múltiplas e sem qualquer inter-
comunicação.
A não ser quando surge um fenômeno como a personalidade excluída
de Artur Bispo do Rosário, um alienado que, ao longo de anos, viveu inter
nado e que, a partir dos anos 90, passa a ser exibido no Brasil e exterior, in
fluenciando inclusive alguns artistas, como ocorreu na arte e bordados de
Leonilson, artista emergente nos anos 80 e falecido prematuramente.
Qual a diferença maior que eu apontaria entre os artistas emergentes na
década de 80 e os artistas que vejo atuantes nos anos 90 no Brasil? Se no iní
cio dos anos 80 os artistas jovens redescobriram a pintura, estimulados pelo
fenômeno neo-expressionista vigente na Alemanha, pela transvanguarda da
Itália e mesmo pela arte dos Estados Unidos, abandonando o desenho pela
espátula e pelo pincel, essa produção ocasiona um boom nunca antes visto no
Brasil, a beneficiar o mercado de artistas jovens. Todavia, a partir de 1985,
ano da Bienal, uma alteração de rumos ocorrerá, desfazendo grupos de artis
tas que trabalhavam num mesmo estúdio e impulsionando-os para uma obra
inclinada, primeiramente, ao monocromatismo, depois ao materismo e re
velando, a partir do início dos anos 90, um completo abandono da pintura
que em toda esta década parece ser cultivada apenas por uns raros artistas jo
vens, além de, evidentemente, artistas pintores já reconhecidos que sempre
trabalham no bidimensional. O retorno ao conceituai se impõe cada vez mais
durante a década. Assim, objetos e instalações passam a ocupar os espaços
expositivos de maneira avassaladora. Mesmo artistas que trabalham no bidi
mensional — como um Emanuel Nassar, de Belém do Pará — tendem a in
corporar objetos a seus quadros que, gradativamente, deixam de ser estrita
mente pictóricos com esses novos elementos tridimensionais.
O corpo, o espaço, o cotidiano, o citacionismo, a abundância de novos
materiais em liberdade total de manipulação parecem ser recorrentes nesta
década, visíveis, por exemplo, em artistas como Edgard de Souza e nas inte-
390
f
BRASIL: PERFIL DE UM MEIO ARTÍSTICO MARCADO PELA VIOLÊNCIA
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ARTE E CIDADE
392
BRASIL: PERFIL DE UM MEIO ARTÍSTICO MARCADO PELA VIOLÊNCIA
393
ARTE E CIDADE
11 Referimo-nos, por exemplo, à atuação do Banco Safra, que publica um livro sobre um
museu a cada ano; do Banco Itaú, por meio do Instituto Cultural Itaú, produzindo exposições com
farto material de publicações, em espaço totalmente inadequado para os eventos que se propõe a
patrocinar; às iniciativas do SESC e SESI, que constroem e mantêm uma multiplicidade de gran
des espaços expositivos e para eventos, que animam pesadamente, com as contribuições de comer
ciantes, comerciários, industriais e operários. Desta forma, o montante que, anos atrás, podia ser
destinado a museus, é canalizado para as próprias entidades de classe ou empresas.
394
56.
“Arte-Cidade”: intestinos expostos
[2002]
Este ano — muito mais eloqüente que uma Bienal, enfadada e/ou eso
térica, com ênfase em vídeos, design , arquitetura e ruidosas artes visuais —
acontece a quarta edição do evento “Arte-Cidade” (os primeiros foram em
1994, 1995 e 1998), evento sensível a nossas hemorragias letais, para um país
que deveria se preocupar com sua qualidade de vida.
Já é perceptível sua visibilidade gritante quando nos aproximamos do
edifício deteriorado do SESC-Belenzinho, na Zona Leste da imensa cidade
de São Paulo, e vemos subindo por sua fachada a escultura trepante, e visceral
como intestinos expostos, de Avery Preeman, de Suriname (quase como em
versão irônica terceiro-mundista da fachada do Centro Pompidou). É bem a
marca da edição deste ano de “Arte-Cidade”, que reputamos como um dos
acontecimentos mais importantes das artes visuais no Brasil a partir dos anos
90. É evento relevante para quem tiver a coragem de vê-lo — ou a coragem
de enfrentar a cidade para observar seus diversos locais da metrópole — , co
locando em cheque o futuro das grandes cidades ou o papel dos artistas nes
sas megalópoles.
Idealização de Nelson Brissac, ele propõe “intervenções urbanas”, artis
tas realizando interferências no tecido urbano das regiões do Brás, Belém, Pa
ri e Belenzinho.
Empregando cerca de cem pessoas para a montagem e execução dos pro
jetos de autoria de 25 artistas (estrangeiros e brasileiros), em evento que custa
cerca de dois milhões e quinhentos mil reais, com patrocínio, além de uma
parte em doação de materiais, ele remexe no lixo da cidade, a deterioração
da megalópole. Toca nas feridas dos espaços abandonados e esquecidos. Toca,
e altera — sem a preocupação de reconstrução — , algumas das áreas mais es
pantosamente degradadas da maior cidade da América Latina. É assustadora
395
1
ARTE E CIDADE
396
“ARTE-CIDADE”: INTESTINOS EXPOSTOS
taram projetos que evidenciam uma preocupação com o social, com o cho
que, com o entorno humano e urbano, à flor da pele na área delimitada. Des
ses dez, apenas três são de brasileiros: Grupo Casa Blindada, Carlos Vergara
e Dias-Riedweg. Os primeiros fazem proposta irônica de design de “camas-
armários” para os quitinetes do edifício São Vito, um cortiço vertical de 27
andares; Carlos Vergara ocupa — com interrogantes sobre o futuro do espa
ço — o camelódromo que não vingou na erma praça da Estação Brás, aban
donada aos vendedores de cigarros contrabandeados e drogas (conforme a
hora da noite, e da madrugada, antes da sopa servida ao lado do albergue sob
a estação do metrô, às seis da manhã), e quase ao lado do Largo da Concór
dia, onde diariamente fervilha um camelódromo natural e não “produzido”;
Maurício Dias e Walter Riedweg, nesse mesmo Largo da Concórdia, fizeram
vídeos gravados com cerca de uma dezena de camelôs falando de suas vidas e
de seus produtos. É grave: de quinze brasileiros presentes ao evento, apenas
três se preocupam com o entorno urbano e social. Os demais se limitam a
criar propostas que poderiam estar situadas em outro espaço qualquer.
Qual é hoje o lugar da arte? É o que venho abordando desde o início dos
anos 80 com ênfase. Qual é a função do artista? Dizia Mário de Andrade —
em texto que li há pouco graças a Abílio Guerra — que se de 100% dos artis
tas apenas 1% é genial, os 99% que não o são deveriam colocar sua criação a
serviço da sociedade. É uma posição. Que pensar hoje, quando a tecnologia,
de alto custo, também está em jogo na concepção do trabalho de um artista?
Como aceitar que aos estrangeiros choquem mais nossa realidade que
aos brasileiros, já anestesiados diante da miséria, do sexo, da droga, do tráfi
co, banalizados como lugar-comum? Não é uma barbárie que isso ocorra no
meio luxuoso das artes e dos patrocínios? Daí porque interessa ver a inter
venção dos arquitetos holandeses (Paul Meurs e Tom Matton) que transfor
maram o antigo cinema Piratininga, na avenida Rangel Pestana, em parque
urbano para fruição da população residente em seu entorno. Utópico, quiçá ,
porém respeitável como projeto.
Como esquecer o Pátio do Pari, uma não-área, esquecida pelas muni
cipalidades e que poderia ser local de lazer da população da cidade, alvo que
um paisagista sensível poderia ter transformado em espaço aprazível para ven
das e exposição de mercadorias? Como borrar da memória visual o belíssimo
edifício de 1891 (do ex-setor de Finanças da REFESA), situado como uma
397
ARTE E CIDADE
398
“ARTE-CIDADE”: INTESTINOS EXPOSTOS
399
Sobre os textos deste volume
401
12. “O México e nós” — Publicado na G aleria Revista d e Arte, n° 24, mar./abr. 19 9 1 ,
pp. 74-5.
13. “A volta do Museu da Solidariedade” — Publicado na Revista M ário d e A ndrade
(edição comemorativa dos 50 anos), São Paulo, Secretaria M unicipal de Cultura,
1992, v. 50, jan.-dez. 199 2 , pp. 142-4.
14. “Abstração geométrica na América do Sul: a Argentina como precursora” —
Versão completa da primeira parte do ensaio “Abstract Constructivist Trends in
Argentina, Brazil, Venezuela and Colom bia”, publicado no catálogo Latin
A merican A rt in the T w entieth Century, organização de Edward J. Sullivan, Nova
York, M oM A, 1993.
15. “Multiculturalismo, nomadismo, desterritorialização: novo para quem?” — Texto
apresentado em Seminário na Pinacoteca do Estado, São Paulo, 1994.
16. “Aqui, neste momento” — Texto apresentado na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo de Salvador, BA, em 1995.
17. “História da arte moderna na América Latina ( 17 8 0 -1 9 9 0 )” — Texto apresentado na
Reunião de Oaxaca, México, em jan./fev. de 1996.
18. “Um olhar sobre a América: Damián Bayón” — Publicado pela Fundação Memorial
da América Latina, São Paulo, 1997.
19. “Alteridade e identidade na América Latina” ■
— Texto apresentado no I Forum de
Integração Cultural “A rte sem Fronteiras”, organizado por M onica Allende Serra,
São Paulo, SESI-Paulista, em novembro de 1998.
20. “Colômbia: um contexto peculiar” — Texto elaborado no final da década de 1990.
2 1. “Artes visuais sob a ótica de José Neistein” — Texto apresentado no Encontro de
Washington, em dezembro de 2000.
22. “Artes visuais: contatos com a Argentina” — Publicado em La N ación, Buenos Aires,
Argentina, 2 0 0 4
402
27. “M AC: da estruturação necessária à pesquisa no museu” — Texto elaborado para
a Conferência do International Council ofM useum s (ICOM ), Rio de Janeiro,
s.d./7/1985.
28. “Artistas japoneses na coleção do M A C ” — Publicado no catálogo da exposição
“Artistas japoneses na coleção do M A C ”, São Paulo, M AC-U SP, set. 1985-m ar.
1986.
29. “Situação dos museus de arte no Brasil: uma avaliação” — Texto elaborado para a
Conferência do International Council ofM useum s (ICOM ), Buenos Aires,
Argentina, s.d./10/1986.
30. “Os salões beneficiam a formação dos acervos dos museus?” — Publicado no Boletim
In form ativo do AÍARGS, n° 30, Porto Alegre, Museu de Arte do Rio Grande do
Sul, s.d./l 2/1986.
3 1. “A Lei Sarney, o colecionador, os museus” — Publicado no catálogo da exposição
“Obras para museu: catálogo da coleção Maria Anna e Raul de Souza Dantas
Forbes”, Galeria São Paulo, São Paulo, s.d./2/1987.
32. “Arquivo e documentação: infra-estrutura fundamental para a ativação museológica
brasileira na área das artes” — Texto elaborado para a Comunicação Triomus —
International Council ofM useum s (ICO M ), Rio de Janeiro, 20/5/1987.
33. “A polêmica do Museu d’Orsay: a continuidade como visão da arte do século XIX”
— Publicado na revista P rojeto, n° 104, São Paulo, out. 19 8 7 , pp. 81-4.
34. “Do M AM ao M A C : a história de uma coleção” — Publicado em Aracy Amaral
(org.), M useu d e Arte C ontem porânea da U niversidade d e São Paulo: p e r fil d e um
a cervo , São Paulo, Techint/MAC-USP, 19 8 8 , pp. 1 1 -5 1 .
35. “O território da arte: conversação com Pontus Hulten” — Publicado na Galeria
Revista d e Arte, São Paulo, 1989.
36. “Curadoria das exposições: a situação brasileira” — Texto elaborado para Simpósio
no Rio de Janeiro, 28/8/1991.
37. “Museu de M onterrey no México” — Publicado na Galeria Revista d e Arte,
São Paulo, n° 27, nov./dez. 19 9 1 , pp. 36-9.
38. “Arte e instituições” — Texto elaborado em 19 9 1.
39- “A Pinacoteca do Estado: problemas em torno da formação e desenvolvimento de um
acervo” — Texto apresentado em Seminário na Pinacoteca do Estado, São Paulo,
26/1/1993.
40. “Museus em crise?” — Texto elaborado para Seminário na Pinacoteca do Estado,
São Paulo, 1994.
4 1. “A exposição Rodin” — Publicado no J o rn a l da Tarde, São Paulo, 14/6/1995.
42. “O desmanche da cultura no Estado de São Paulo” — Texto elaborado em 1996.
403
43. “A exposição M onet” — Publicado com o título “Mostra de M onet frustra as
expectativas” em O Estado d e S. Paido, Caderno 2, 7/7/1997.
44. “Curadoria, museologia e arte construtiva” — Texto elaborado em 1998.
45. “500 anos de carência” — Publicado nos Anais da II Sem ana dos M useus da
U niversidade d e São Paido, Pró-Reitoria de Cultura e Extensão Universitária, São
Paulo, 2 0 00, pp. 15 -2 1.
46. “Mário Pedrosa: um homem sem preço” — Publicado em M ário Pedrosa: 100 anos,
São Paulo, Fundação Memorial da América Latina, 2000.
47. “Mário Pedrosa e a Cidade Universitária da U SP” — Publicado na revista Risco, n° 2,
São Carlos, EESC-USP, 2003.
48. “Henry M oore no Brasil” — Publicado no catálogo H enry M oore: um a retrospectiva,
São Paulo, Pinacoteca do Estado, 2005-
49. “Arquitetura, Jaguaré e Barra Funda” — Publicado na revista P rojeto, São Paulo,
1988.
50. “A decadência da Paulista” — Texto inédito elaborado em abril de 19 9 1.
51. “Imagem da cidade moderna: o cenário e o seu avesso” — Texto apresentado em
Seminário na ECA-USP, organizado por Anateresa Fabbris, 27/4/1993, e
publicado em Anateresa Fabbris (org.), M odern idade e m odernism o no Brasil,
Campinas, Mercado de Letras, 1994.
52. “Criação: arquitetura e arte” — Texto apresentado no Seminário “O Estudo da
História na Formação do Arquiteto”, 1994, e publicado na revista Pós, número
especial, São Paulo, FAU-USP/Fapesp, Anais do Seminário Nacional realizado
em São Paulo, 9-12/10/ 1994, pp. 114 -6 .
53. “Um olhar sobre a cidade” — Texto apresentado no Seminário “Arte Pública”,
São Paulo, SESC/USIS, 18/10/1995.
54. “Modernidade e nacionalismo no Brasil” — Texto apresentado em Colóquio na
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo de Salvador, BA, jun. 1995.
55. “Brasil: perfil de um meio artístico em década marcada pela violência” — Texto
apresentado no Simpósio “Políticas de la Diferencia: Arte Iberoamericana Fin de
Siglo”, Valencia, Espanha, 200 0 , e publicado em Políticas d e la diferen cia: arte
iberoam ericana fi n d e siglo, Recife, Centro de Convenções de Pernambuco, 2 0 0 1.
56. “Arte/Cidade: intestinos expostos” — Publicado no Estado d e S. Paido, 14/3/2002.
404
índice onomástico
Aalto, Alvar, 123 Almeida, Paulo Mendes de, Antunez, Nemesio, 272
Abramo, Livio, 251, 273 255-9 Apel, Otto, 123
Abularach, Rodolfo, 274 Almeida Júnior, José Ferraz Appel, Karel, 272
Acconci, Vito, 385, 396 de, 15, 176, 188, 190-1, Araeen, Rashed, 293
Acha, Juan, 27, 59, 72-3, 76, 301, 377 Arai, Tatsuo, 2 13
131, 150, 156, 162, 292 Almodóvar, Pedro, 363 Aranha, Luis, 355-6
Acosta, Daniel, 393 Altman, Robert, 363 Arantes, Otília, 333
Adachi, Shinzo, 214 Alvares, Ana Luisa, 391 Araújo, Emanoel, 393
Adam, Henri-Georges, 272 Alves, Carlos Pinto, 243, 251 Arciniegas, German, 160
Ades, Dawn, 55, 57-8, 137 Alves, Moussia Pinto, 243, Argan, Giulio Cario, 97,
Adorno, Theodor W ., 353 251 330, 380
Aebi, Hans, 111 Amado, Jorge, 151 Arman, 393
Agostinho, Santo, 43 Amaral, Antonio Henrique, Armitage, Kenneth, 99
Aizenberg, Roberto, 47 51, 192, 276 Arp, Jean, 247, 266, 339
Albuquerque, Georgina de, Amaral, Jim, 47, 162 Artigas, Vilanova, 249, 251,
1 8 0 ,1 8 8 Amaral, Tarsila do, 3 1, 36, 347, 380
Albuquerque, Lucílio de, 188 39, 4 7 ,5 1 ,5 7 , 75-6, 79, Artundo, Patrícia, 170
Alegria, Ciro, 154 135, 170, 182, 2 5 1 ,2 7 3 - Ashton, Dore, 76, 85-6, 98,
Aleijadinho, 88 4, 277, 287, 299, 357, 151
Alexandrino, Pedro, 176, 378-9 Assis, Machado de, 153
180-1, 188, 190 Amoedo, Rodolfo, 236 Assis, Nicolina de, 369
Alfonsín, Raul, 68 Andrade, Farnese de, 47 Asver, 266
Allende, Salvador, 97-8 Andrade, Mário de, 40, 75, Athayde, Tristão de, 88
Alley, Ronald, 341 89, 126, 170, 182, 240, Atlan, Jean-Michel, 247
Almeida, Belmiro de, 192 2 6 1,3 5 4 -6 , 358, 397 Aulenti, Gae, 233, 235
Almeida, Cardoso de, 176 Andrade, Oswald de, 75, 79, Ávila, Afonso, 324
Almeida, Paulo Camargo e, 136, 182, 299, 356 Azevedo, Militão Augusto
334 Anjos, Ciro dos, 89 de, 355
405
Azevedo, Ramos de, 175-6, Bayon, Damián, 24, 73, 129- Boothy, 247
182, 190, 193, 368 31, 138-49, 153, 287 Borges, Jacobo, 47, 50, 65
Aznar, M. Olivier, 181, 188 Bazaine, Jean, 247, 253, 266 Borges, Jorge Luis, 75, 112,
Baccaro, Giuseppe, 39 Beck, Gustav, 272 151
Baertling, Olle, 99 Bedia, José, 48, 133 Bosch, Jorge Eduardo, 107
Bailey, Edgar, 105 Beeren, Wim, 303 Botero, Fernando, 36, 47,
Baila, Giacomo, 239, 273 Belluzzo, Ana Maria, 166, 144, 276
Balmes, José, 99 354 Botero, Germán, 162
Barata, Mário, 141, 330, 380 Benedit, Luís, 171 Boto, Martha, 111
Baravelli, Luiz Paulo, 52 Benjamim, Marcos Coelho, Bottineau, Yves, 142
Barbosa, Ana Mae, 279 7 1 ,3 8 8 Bouguereau, Willian, 233
Barbosa, Dario Villares, 188, Bento, José, 388 Bouvard, J. A., 366
191 Bergmiller, K. H., 279 Brades, Susan, 55
Barbosa, Mário, 188 Berkowitz, Marc, 52, 160 Brancusi, Constantin, 285,
Bardi, Lina Bo, 317 Bermudez, 158 3 18, 339
Bardi, Pietro Maria, 39, 259, Bernardelli, Henrique, 180, Braque, Georges, 267, 291
341 190-1 Bratke, Oswaldo, 331, 335-6
Bardon, R., 233 Bernardes, Carmo, 17-8 Brecheret, Victor, 182, 251,
Barnitz, Jacqueline, 49 Berni, Antonio, 31, 47, 77, 273, 366, 368, 378
Barr Jr., Alfred H., 243, 266 276 Breivik, Anne, 215
Barragán, Luís, 102, 120 Beuys, Joseph, 36, 296, 364 Brennand, Francisco, 47, 276
Barreto, Lima, 153 Bhabha, Homi, 390 Brest, Jorge Romero, 23, 50,
Barrio, Artur, 52 Bianchi, Paolo, 114-5 1 0 4 ,1 0 8
Barros, Adhemar de, 185, Biddle, George, 51 Brett, Guy, 55-7, 104, 165,
258 Biessy, Gabriel, 191 286
Barros, Emygdio de, 329 Bill, Max, 80, 108, 110, Briot, Marie Odile, 92, 234,
Barros, Geraldo de, 276 249, 271-2, 345 246-7
Barros, Leonor Mendes de, Birolli, Renato, 273 Brizola, Leonel, 345
301 Blaszko, Martin, 106-8 Brizzi, Ary, 111
Barsotti, Hércules, 71 Bloc, André, 330 Brocos, Modesto, 180
Basaldella, Afro, 273 Blum, Andrea, 372 Browne, Byron, 266
Baselitz, Georg, 38 Boal, Augusto, 78 Bruce, Patrick, 247
Basquiat, Jean-Michel, 293 Boccioni, Umberto, 276, 342 Bruscky, Paulo, 200
Bassi, Torquato, 188 Bogliolo, F., 188 Buenaventura, Enrique, 158
Bastos, Augusto Roa, 153 Bolívar, Simón, 94, 153, Buren, Daniel, 284
Batista, Fulgêncio, 19 307, 325 Buschizzo, Mario, 142
Baudelaire, Charles, 391 Bonevardi, Marcelo, 50, Cabanne, Pierre, 109
Baumeister, W ill, 272 144, 272 Cabrera, 158
Bay, Juan, 111 Bonomi, Maria, 51 Cachin, Françoise, 235
406
Cassaro, Franklin, 393 Colboc, P., 233
Caldas, Waltércio, 71, 370,
Castagneto, Giambattista, Colombino, Carlos, 94
385
191-2 Contreras, Miriam, 98
Calder, Alexander, 51, 95,
Castedo, Leopoldo, 129, 142 Corbusier, Le, 76, 120-1,
97, 159, 247-8, 266, 272,
Castelli, Leo, 246-8, 263 349, 380
329
Castles, John, 162 Cordeiro, Waldemar, 171,
Calixto, Benedito, 188
Castro, Amilcar de, 52-3, 71, 193, 247, 274, 277, 372
Callado, Antonio, 66, 340
91, 103, 193, 276, 388 Corral, Maria, 144
Câmara Filho, João, 70, 82,
Catunda, Leda, 71 Cortázar, Julio, 29, 151
91, 133, 276
Cedrón, Aníbal, 29 Costa, Artur Timóteo da, 192
Camargo, Iberê, 52
Cendrars, Blaise, 356-7 Costa, Cacilda Teixeira da,
Camargo, Maria L. P. de, 188
Cervantes, Miguel de, 192 154
Camargo, Sérgio de, 56, 71,
Cézanne, Paul, 236 Costa, Carlos R., 100
100, 171, 194, 276
Chagall, Marc, 266 Costa, Horácio, 324
Camnitzer, Luís, 149
Charbonnier, P., 267 Costa, João Batista da, 180,
Campigli, Massimo, 267
Charoux, Lothar, 194 188
Campos, Augusto de, 57
Charpentier, Alexandre, 189, Costa, Lucio, 51, 120, 379,
Campos, Haroldo de, 57
234 380
Camus, Albert, 328
Charpentrat, Pierre, 143 Costi, Rochelle, 391
Cancel, Luis R., 49, 51
Chasseriau, Theodore, 233 Cottet, Charles, 233
Canclini, Nestor Garcia,
Chastel, André, 142, 272, Courbet, Gustave, 233, 235
13 1 ,3 2 5 -6 , 353-4
330 Couture, Thomas, 233
Cândido, Antonio, 23, 26,
Chateaubriand, Assis, 16, Covas, Mário, 309, 314-5
324, 328
196, 239, 259 Cravo Júnior, Mário, 51
Canogar, Rafael, 98-9, 273
Chavannes, Puvis de, 234 Cravo Neto, Mário, 91
Carbonero, José Moreno,
Chaves, Vera, 91 Cruz-Diez, Carlos, 4 1, 57, 97
181, 188
Che Guevara, Ernesto, 138 Cuevas, José Luis, 28, 94-5,
Cardenas, Santiago, 28, 50,
Chia, Sandro, 38 144
162
Chiarelli, Tadeu, 393 Cuixart, Modest, 272
Carneiro, Antonio, 191
Cintra, Silveira, 191 Dacosta, Milton, 273
Caro, Antonio, 47, 162
Cintra, Ulhoa, 260-2 Damasceno, José, 172, 393
Carpeaux, Jean Baptiste,
Clair, Jean, 149 Darié, Sandu, 107
189, 233
Clark, Lygia, 36, 53, 56, Daumier, Honoré, 362
Carrazzoni, Maria Elisa, 187
100, 10 3 -4 ,13 5 , 149, David, Catherine, 165
Carto, Antonio, 47
193, 273, 276, 389, 393 Davie, Alan, 273
Carvajal, Rina, 331
Claudel, Paul, 75 De Chirico, Giorgio, 265-6,
Carvalho, Flávio de, 52, 76,
Clemente, Francesco, 38 273
186, 192, 253, 358, 376,
Cohn, Thomas, 155 De Fiori, Ernesto, 186, 192,
378
Cohn-Bendit, Daniel, 115 274-7
Carvalho, Leôncio de, 176
407
De Kooning, Willem, 51, Dorion, Henri, 305 Ferrigno, Antônio, 188
248 Dorta, Marco, 142 Fiaminghi, Hermelindo, 57,
De La Vega, Jorge, 47, 171 Dove, Arthur G., 248, 266 193
De Martino, Edoardo, 188 Drouin, René, 246-7, 249 Figari, Pedro, 31, 47, 57, 276
De Pisis, Filippo, 266 Duarte, Paulo, 260 Figueiredo, Amélio de, 188
De Stael, Nicolas, 247 Dubugras, Victor, 76, 180-1, Flexor, Samson, 247
De Wilde, Edy, 303 376 Fontana, Lucio, 107-8
Debroise, Olivier, 86 Duchamp, Mareei, 246, 248- Forbes, Raul, 227
Degand, Léon, 243-4, 246- 9, 283, 285, 299, 3 18 Forner, Raquel, 36, 135, 276
55, 257-8, 266 Dufy, Raoul, 267 França, José Augusto, 338
Del Marle, Félix, 109, 247 Dupuy, Paul Michel, 191 França, José Monteiro, 188
Del Prete, Juan, 104 Durána, Gaitán, 158 Francastel, Pierre, 139, 142
Delacroix, Eugène, 190 Dutra, Alípio, 182 Francesca, Piero delia, 190
Delafon, Gille, 330 Duval, 191 Franco, Jean, 129
Delamônica, Roberto, 52 Edgard, Luiz, 71 Franco, Maria Eugênia, 241,
Delaunay, Sonia, 247 Ekman, Carlos, 180 2 5 1 ,3 7 1
Demarco, Hugo, 11 1 , 171 El Greco, 147 Franco, Siron, 47, 71, 82, 91
Dewasne, Jean, 247 Eliot, T. S., 84, 86, 338 Freitas, Iole de, 71
Deyrolle, Jean, 247, 253 Elliot, David, 304 Freud, Sigmund, 391
D ’Horta, Arnaldo Pedroso, Engblom, Soren, 99 Freundlich, Otto, 247
192, 260 Engel, Walter, 158 Freyre, Gilberto, 76
D ’Horta, Oscar Pedroso, 260 Ensor, James, 94, 3 18 Friedman, Martin, 52
Di Cavalcanti, Emiliano, 19, Ernst, Max, 266 Fuentes, Carlos, 46, 65
51-2, 57, 7 5 ,2 3 8 , 251, Erundina, Luiza, 369 Fukusawa, Ichiro, 213
253, 267, 273-4, 277, Esmeraldo, Sérvulo, 91, 100 Furtado, Celso, 42, 78, 324
378-9 Espinosa, Manuel, 105-6 Gabo, Naum, 248, 281
Dias, Antonio, 52-3, 70, Espírito Santo, Iran do, 391 Galeano, Eduardo, 63
276, 389 Evangelista, Roberto, 32 Gallé, Emile, 234
Dias, Cícero, 51, 247, 252- Fabris, Annateresa, 357 Galván, José Maria Moreno,
3, 378-9 Fahlstrom, Oyvind, 99 97
Dias, Maurício, 385, 397 Fajardo, Carlos, 52, 385 Gamarra, Francisco
Diaz, Gonzalo, 133 Farias, Patrício, 133 González, 47
Dittborn, Eugênio, 133 Fauchereau, Serge, 284 Gamzu, Hain, 330
Domela, Cesar, 106, 234, Fazzini, Pericle, 267, 273 Gasparini, Graciano, 142
247 Fernandez-Muro, 111 Gaudí, Antoni, 26, 159
Domingues, Oscar, 267 Ferrari, Arnaldo, 278 Gaudibert, Pierre, 19
Domingues, Raphael, 329 Ferrari, León, 29, 171 Gauguin, Paul, 235
Donasci, Otávio, 37 Ferraz, Geraldo, 251, 338-9 Gego (Gertrud
Dorfles, Gillo, 330 Ferreira, Adilson F., 269 Goldschmidt), 135
Gerchman, Rubens, 52-3, Greenaway, Peter, 363 Hepworth, Barbara, 272
276 Greenberg, Clement, 21 Herbin, Auguste, 247
Giannotti, Marco, 71 Grilo, Sarah, 50, 111 Herkenhoff, Paulo, 171
Gibson, Michael, 44-5 Grimm, Georg, 192 Hernandez, Mario, 159
Giorgi, Bruno, 273, 379 Grippo, Victor, 171 Hirano, Hidekazu, 2 14
Giotto, Ambrosio B., 339 Groh, Klauss, 215 Hiroshige, Ando, 236
Girola, Cláudio, 106, 110-1 Grohmann, Will, 330, 380 Hlito, Alfredo, 103, 105-6,
Gironella, Alberto, 47 Gropius, Walter, 121, 123, 110-1
Glusberg, Jorge, 104, 172 380 Hokusai, Katsukawa, 236
Goeldi, Oswaldo, 273 Gross, Carmela, 386 Holanda, Sérgio Buarque de,
Goeritz, Mathias, 36, 102 Grosz, Georges, 266 80, 257, 260
Gomes, Alfredo, 186 Grote, Ludwig, 255 Horiike, Tohei, 215
Gomes, Carlos, 366 Guanaes Neto, Gontran, Hosiasson, Philippe, 247
Gomes, Fernanda, 391 100, 171 Hourticq, Louis, 181, 189
Gomes, Marion Strecker, Guarnieri, Camargo, 89 Hoyos, Ana Mercedes, 28,
198, 200 Guedes, Joaquim, 348 50
Gómez-Sicre, José, 50 Guerra, Abílio, 397 Hughes, Robert, 112-3, 382
Gomide, Antonio, 51, 274, Guevara, Roberto, 160-1 Hulten, Pontus, 280-4
277, 378 Guignard, Alberto, 170, 251 Ianelli, Arcangelo, 52
Gonçalves Filho, Antonio, Guillaumet, Gustave, 233 Ideux, Claude, 247
339, 341 Guillemin, F. Romano, 301 Ilce, Vera, 100
Gonçalves, Delmiro, 186, Guimarães, Carlos, 179 Iniguez, Angulo, 142
192 Guimard, Hector, 234 Inoue, Bukichi, 2 13
Gonçalves, Lisbeth R., 208, Gullar, Ferreira, 72, 78, 324 Iommi, Enio, 36, 105-6,
271 Guston, Philip, 51 110-1
Góngora, Leonel, 47 Gutierrez, Ramón, 39, 153 Iturburu, Córdova, 104
Gonzales, Julio, 247 Guttuso, Renato, 266 Izquierdo, Maria, 135
González, Beatriz, 47, 162 Gwathmey, Robert, 266 Jaar, Alfredo, 36, 149
Goodall, Donald, 140 Haacke, Hans, 284 Jackson, David, 168
Graciano, Clóvis, 185-6, 251 Hahn, Otto, 103 Janis, Sidney, 246, 248-9
Graeser, Camille, 108, 273 Hall, Richard, 181 Jaramillo, Maria de la Paz,
Grant, Francês R., 51 Hals, Frans, 190 162
Grass, Antonio, 30, 162 Hamaguchi, Yozo, 213, 271 Jardim, Evandro Carlos, 82
Grassmann, Marcelo, 53 Hanotaux, Gabriel, 181 Jerôme, 233
Grau, Enrique, 159 Hans, Peter, 105 Johns, Jasper, 297
Graves, Morris, 248, 266 Hardey, Hal, 363 Joyce, James, 299
Graz, John, 378 Hartung, Hans, 347, 253 Judd, Donald, 56
Graz, Regina Gomide, 378 Hegedusic, Krsto, 271 Julião, Francisco, 78
Greco, Alberto, 29, 171, 277 Hehl, Maximiliano, 180 Kageyama, Mitsuyoshi, 214
409
Kahlo, Frida, 36, 47, 134-5, L’Hermitte, Léon, 233 Lima, Celso Renato de, 388
296 Labisse, Felix, 277 Lima, Maurício Nogueira,
Kahnweiler, Daniel-Henry, Lacaz, Guto, 36, 45, 71 100, 194
283 Laclotte, Michel, 233-5 Lins, Manuel Joaquim de
Kaminagai, Tadashi, 2 13 Laloux, Victor, 233 Albuquerque, 177
Kandinsky, Wassily, 105, Lam, Wifredo, 36, 47, 79, Littman, Robert, 94
247, 265-6, 285 274, 276 Llosa, Vargas, 151
Katz, Mané, 277 Lambrecht, Karin, 91 Lobato, Monteiro, 355
Kawabaca, Minoru, 213, 271 Lamus, Cote, 158 Lohse, Richard Paul, 108,
Kcho, 133 Lapicque, Charles, 247, 253 271
Kelemen, Pál, 142 Larrauri, Iker, 93 Lozano, Romero, 158
Kerr, Clarke, 261 Lauand, Judith, 193 Lozza, Raul, 105, 110 -11
Kiefer, Anselm, 38, 296, 396 Lauer, Mirko, 133 Lubarda, Petar, 271
Kim, Lina, 386 Lawrence, Jacob, 266 Lucchesi, Fernando, 45, 47,
Kitano, Takeshi, 388 Laurens, Henri, 265 71, 388
Klein, Yves, 281 Le Moal, J., 253, 266 Lucena, Munoz, 181
Klirat, Gustav, 235 Le Pare, Julio, 29, 57, 97, Lucie-Smith, Edward, 167
Kline, Franz, 51 11 1 , 171 Lucque, Aline, 92
Kobariow, Alexandre, 281 Leão, Paulo Vergueiro Lopes Mabe, Manabu, 52-3
Kobzdej, Aleksander, 271 de, 185, 190 Macció, Romulo, 171
Kodama, Masao, 2 14 Lee, Wesley Duke, 52, 54 MacEntyre, Eduardo, 111
Kokoschka, Oskar, 171, 291 Leenhardt, Jacques, 98 Machado, Antonio de
Kollwitz, Kaethe, 329 Léger, Fernand, 247, 266-7 Alcântara, 16, 75, 356
Komar, Vitaly, 284 Leirner, Adolpho, 57 Machado, Caio Alcântara,
Koolhaas, Rem, 398 Leirner, Felícia, 270 270
Kosice, Gyula, 57, 103, 105- Leirner, Nelson, 52, 82 Machado, Lourival Gomes,
9, 111 Leirner, Sheila, 235 2 5 1 ,2 5 4 -5 ,2 5 7 -8 , 277
Kosnick-Kloss, 247 Lemos, Carlos, 167, 196, 269 Mackintosh, Charles Rennie,
Krajcberg, Frans, 100 León, Carolina Ponce de, 163 234
Krieger, Peter, 122-4 Leonilson, 7 1, 390 Magalhães, Fábio, 187
Kubitschek, Juscelino, 330, Leontina, Maria, 273 Magalhães, Guilherme, 52
345 Leporskaya, Ana, 281 Magneili, Alberto, 244, 246,
Kubler, George, 142 Leroy, Louis, 3 16 250, 265-7
Kubota, Masuhiro, 2 1 4 Leuris, 283 Magno, Montez, 323
Kuitca, Guillermo, 47, 171 Levi, Rino, 251, 363 Mahler, Leopoldo, 36
Kuni, Masami, 107 Lévi-Strauss, Claude, 237 Maia, Antônio, 31
Kupka, Frantisek, 247 Lhote, André, 265 Maia, Prestes, 125, 368
Kusuno, Tomoshigue, 52, Liberato, Isaac, 329 Maldonado, Tomás, 104-5,
2 14 Lichtenstein, Roy, 281 108, 110-1, 17 1 ,3 3 0 , 380
410
Malevitch, Kazimir, 280-1, Médici, Emilio Garrastazu, Modigliani, Amedeo, 265,
285 186 267, 273
Malfatti, Anita, 36, 51, 135, Medina, Álvaro, 158-9 Mohalyi, Yolanda, 268, 273,
182, 186, 190, 277, 378 Meghreblian, Caren Ann, 278
Maluf, Paulo, 373 166 Molemberg, Alberto, 105
Manes, Pablo Curatella, 104 Meireles, Cildo, 52, 67, 70-1, Mônaco, Primaldo, 105-6
Manessier, Alfred, 253, 266 82, 133, 149, 169, 388-9 Mondrian, Piet, 105, 171,
Manet, Édouard, 234-6 Meirelles, Victor, 190 291
Manrique, Jorge Alberto, 20, Mel, M., 188 Monet, Claude, 234-5, 316-
151 Melamid, Alexander, 284 8
Manuel, Antonio, 133 Mele, Juan, 106 Monteiro, Paulo, 71
Marini, Marino, 265, 267 Mello, Eduardo Kneese de, Moore, Henry, 98, 171,
Marques, Azevedo, 191 242-3, 266 276, 2 9 1 ,3 3 7 -4 2
Márquez, Garcia, 151, 158 Mello, Fernando Collor de, Moraes, Nina, 71
Martin, Jean-Hubert, 85, 91, 300, 309 Morais, Avatar, 52
149, 2 8 1 ,2 9 2 Mellow, James R., 103 Morais, Frederico, 46, 102,
Martinez, Ricardo, 272 Menezes, Ulpiano Bezerra 161
Martins, Aldemir, 52 de, 301 Morales, Armando, 47, 272
Martins, Luís, 251 Merewether, Charles, 292-3 Morandi, Giorgio, 267, 273
Martins, Maria, 53, 135 Mérida, Carlos, 272 Morellet, François, 111
Martins, Paulo Egydio, 347 Mesquita, Alfredo, 193 Mori, Shoichiro, 213
Marx, Murillo, 146 Messer, Thomas, 52 Motherwell, Robert, 95
Mascherini, Marcello, 273 Meurs, Paul, 397 Motta, Flávio, 330, 380
Masson, André, 266 Michelangelo, 339 Moura, Sérgio, 204
Matarazzo Sobrinho, Mignot, Dorinne, 92 Mugnaini, Túlio, 176, 182,
Francisco (Ciccillo), 195- Miguez, Fábio, 71 185-6, 190
6, 213, 239-40, 243-4, Mihelic, France, 271 Mukai, Ryokichi, 213
247, 249-50, 255, 257- Miki, Tamon, 2 13 Munakata, Shiko, 213
61, 264-5, 267, 269, 271, Milhaud, Darius, 75 Munch, Edvard, 235, 318
273, 276, 330-1, 333-5, Millet, Jean-François, 190 Muniz, Vik, 149, 167, 169,
342 Milliet, Sérgio, 193, 240-3, 172, 391
Matisse, Henri, 267 248, 2 5 1,2 5 6 -7 , 266, Muntadas, Antonio, 399
Matsuzawa, Yutalca, 215 330, 380 Mutis, Álvaro, 158
Matta, Roberto, 47, 49, 95, Mindlin, Henrique E., 164 Muylaert, Roberto, 310
149-50, 274, 276 Mindlin, José, 186 Nador, Mônica, 7 1, 386
Matton, Tom, 397 Minguzzi, Luciano, 273 Nagy, Moholy, 109
Mavignier, Almir, 329 Minujin, Marta, 135, 172 Nambata, Tatsuoki, 2 14
Medalla, David, 56 Miró, Joan, 97, 266-7 Nassar, Emmanuel, 32-3,
Medeiros, Anderson, 31 Mix, Miguel Rojas, 99 7 1 ,9 1 ,3 9 0
411
Nasser, Frederico, 52 Orozco, José Clemente, 41, Péri, Laszlo, 106, 109
Nauman, Bruce, 297 276 Perissinoto, Giuseppe, 193
Negret, Edgar, 49, 103, 144, Osir, Rossi, 193, 379 Permeke, Constant, 267
158-60, 162 Ospina, Marco, 159 Pestana, Rangel, 397
Neistein, José, 52, 164-5, 167 Ostrower, Fayga, 330 Petrovic, Zoran, 271
Nepomuceno, Alberto, 377 Oteiza, Jorge de, 159, 272 Pettoruti, Emilio, 104, 170,
Nery, Ismael, 39, 47, 51, Otero, Alejandro, 41, 57 276
277, 378 Pacheco, Maria Luisa, 135 Pfeiffer, Wolfgang, 243,
Neto, Ernesto, 169, 393 Pacheco, Nazareth, 392 256, 278
Neuenschwander, Rivane, Palatnik, Abraham, 52, 57 Philippon, J.-P., 233
172, 392 Palliero, Carlos, 100 Piaubert, Jean, 247
Neutra, Richard, 380 Paolozzi, Eduardo, 98 Picabia, Francis, 247, 299
Newman, Barnett, 51, 281 Papadaki, Stamos, 330 Picasso, Pablo, 53, 79, 95,
Nicholson, Ben, 106 Parlagrecco, Beniamino, 188 109, 248, 266-7, 291,
Niemeyer, Oscar, 51, 59, 60, Parreiras, Antônio, 180, 188, 297, 299, 339
63, 90, 323, 330, 345-9, 192 Picchia, Menotti dei, 16
3 5 1 ,3 6 3 , 379-80 Pasta, Paulo, 71 Pichon-Riviere, 105
Nierendorf, 243 Paternosto, Cesar, 111 Pignatari, Baby, 366
Niotou, H., 215 Paula, Eurípedes Simões de, Pignatari, Décio, 57
Noé, Luís Felipe, 29, 72-4, 261 Pilon, Jacques, 363
7 9 ,8 1 , 171 Paulino, Rosana, 391 Pinello, José, 181, 188
Noguchi, Isamu, 372 Paz, Octavio, 72-3, 81, 139 Pinheiro, Israel, 330
Norfini, Alfredo, 181, 188-9 Pazé, Jean, 393 Pinto, Adolfo Augusto, 176,
Noronha, Julieta Bueno de Pedro, Martinez, 272 179
Andrada, 192 Pedrosa, Mário, 78, 97-9, Pinto, Carvalho, 260
Nunes, Benedito, 128 141, 171, 204, 259, 269, Pires, Cornélio, 16
Nunez, Oscar, 105 292, 328-36, 360, 380 Piza, Arthur Luiz, 100, 171
Obregón, Alejandro, 159, Pedrosa, Vera, 332 Piza, Vladimir de Toledo,
162, 276 Peixoto, Nelson Brissac, 385, 193, 273
Ocampo, Miguel, 111 395, 398-9 Platão, 43
Ohtake, Ruy, 346-7 Peláez, Amélia, 36, 135 Polesello, Rogelio, 111
Oiticica, Hélio, 52-4, 56, 70, Pellegrini, Aldo, 104, 111 Poliakoff, Serge, 247
81, 103-4, 133, 149, 389 Pena, Guillermo Gómez, 293 Pollock, Jackson, 51, 171,
Oldenburg, Claes, 284 Penrose, Sir Roland, 98, 391
Oliva, Achille Bonito, 70 330, 380 Pontual, Roberto, 145
Oliveira, Myriam Ribeiro de, Penteado, Yolanda, 195-7, Portinari, Cândido, 41, 51,
146 239-40, 243, 255, 260, 53-4, 170, 253, 276-7,
Oliveira, Raimundo de, 52 264-5, 267, 273, 334 3 18, 379
Ono, Tadahiro, 214 Perazzo, Nelly, 104, 107 Portocarrero, René, 272
412
Posadas, José Guadalupe, 31 Rembrandt (Harmensz van Rossi, Garcia, 111, 171
Pound, Ezra, 299 Rijin), 95 Roszak, Theodor, 262-3,
Pradilla, Francisco, 181, 188 René, Denise, 104, 109, 271
Prado, Paulo, 120 171, 246, 283 Rothfúss, Rhod, 105-7, 111
Prado, Yan de Almeida, Rennó, Rosangela, 391 Rothko, Mark, 281, 399
260-1 Resende, José, 36, 52, 57, Rubinho, Mônica, 391
Prampolini, Ida Rodriguez, 71, 276 Ruchti, Jacob, 249, 258
43 Reth, Alfred, 247 Rulfo, Juan, 42, 153
Prassinos, Mario, 247, 253 Reverón, Armando, 47 Ruscha, Ed, 297
Prati, Lidy, 105, 110 Reyes, Alfonso, 130 Saarinen, Eero, 123, 330
Prazeres, Heitor dos, 273 Reymert, Kyrre, 311 Saarinen, Eliel, 380
Preeman, Avery, 395 Ribeiro, Carlos Flexa, 170 Saavedra, Carlos Rodriguez,
Presta, Salvador, 104-5, Ribeiro, Darcy, 26, 29, 64, 20, 377
107-8 67, 77-8, 102, 117, 130, Saavedra, Castro, 158
Prestes, Júlio, 125, 182 150 Saccà, Lucila, 165
Profili, Arturo, 255, 258 Richier, Germaine, 272 Sacilotto, Luiz, 57, 193
Puente, Alejandro, 111 Riedweg, Walter, 397 Sakai, Kasuya, 140
Quadros, Jânio, 258, 346-7 Riley, Bridget, 99 Sakakibara, Hissao, 2 14
Quin, Carmelo Arden, 105- Rivera, Diego, 36, 41, 72, Sakata, Harumichi, 2 14
8, 11 0 -11 , 171 276 Salinas, Augustin, 188
Rabinovitz, Sérgio, 32 Rivers, Larry, 51 Salinas, Pablo, 188
Racine, Jean, 151 Rocha, Paulo Mendes da, 269 Salles, Walter, 388
Ragon, Michel, 103, 105, Rockefeller, Nelson, 166, Salmona, Rogelio, 158
109 240-3, 265-7 Salvador, José Maria, 159
Rama, Angel, 23, 26-7, 29, Rodin, Auguste, 234, 372 Salvatore, Enrico, 265
153 Rodó, José Enrique, 117 Salzstein, Sônia, 271
Ramos, Maria Elena, 31 Rodolfo, Bernardelli, 190 Samico, Gilvan, 31
Ramos, Nuno, 71, 386 Rodrigues, Augusto, 329 Samudio, Cepeda, 158
Rasmussen, Waldo, 144 Rodrigues, José Wasth, 182 Sandberg, W ., 2 8 1 ,3 3 0 ,3 8 0
Rauschenberg, Robert, 95, Rogers, Ernesto, 108 Sanin, Fanny, 162
297 Rohe, Mies van der, 121, Santomaso, Giuseppe, 273
Raymond, Marie, 247 380 Santos, Milton, 155
Rayo, Omar, 94-5, 162 Rojas, Carlos, 162-3 Saramago, José, 83
Read, Herbert, 89, 337, 340 Romero, César, 32-3 Sarfatti, Magherita, 265
Reed, Norman, 341 Rosa, Guimarães, 151 Sarkis, Z., 284
Rêgo Monteiro, Vicente do, Rosário, Artur Bispo do, 390 Sarmiento, Domingo
276-7, 378-9 Rosas, Etelvina Chamis, 333 Faustino, 153
Reidy, Afonso Eduardo, 330, Rosenberg, Harold, 332 Sarney, José, 220
363 Rosenwald, Lessing, 267 Sartoris, Alberto, 330
413
Satie, Erik, 299 Shiró, Flávio, 100, 276 Staniszewski, Mary Anne,
Scantimburgo, João de, 186, Sibellino, Antonio, 104 135
192 Silva, Áurea Pereira da, 146 Starzynski, Julius, 330
Scattolini, Luiz, 182 Silva, Carlos, 111 Stastny, Francisco, 18
Schaer, Roland, 236 Silva, José Antonio da, 253 Stella, Frank, 97
Schapiro, Meyer, 330, 380 Silva, Maria Helena Vieira Stempel, Karen, 165
Scharf, Kenny, 274 da, 105 Stern, Grete, 105
Schenberg, Mário, 378 Silva, Oscar Pereira da, 176, Stockinger, Francisco, 276
Schendel, Mira, 56, 71, 103- 188 Sued, Eduardo, 71
4, 135, 278 Silveira, Valdomiro da, 16 Sujo, Clara Diament de, 50
Schneckenburger, 36 Singier, Gustave, 247, 253, Sullivan, Edward, 167
Schneider, Gerard, 247, 253 266 Svevo, Wanda, 255, 258-9
Schwartz, Jorge, 353 Siqueiros, David Alfaro, 41 Szyslo, Fernando de, 28, 144
Schwarz, Roberto, 324 Sironi, Mario, 266 Tabe, Kenzo, 2 15
Scomparim, Lucimara, 298 Smith, Carlton Sprague, Taeuber-Arp, Sophie, 247,
Scorza, Manuel, 21 240-2, 266 271
Scott, William, 272 Smith, Courtney, 391 Takeda, Nagatoshi, 214
Segall, Lasar, 51-2, 253, 281, Smith, Robert C., 165 Tamayo, Rufino, 36, 47, 67,
378 Soares, Genilson, 32 94-5, 139, 144, 14 8 ,15 0 ,
Segawa, Hugo, 146, 331, Soares, José Carlos Macedo, 276, 340
333, 367 185, 191, 301 Tanaka, Kenzo, 2 14
Segre, Roberto, 130 Soares, Valeska, 391 Tanguy, Yves, 266
Segui, Antonio, 94, 274 Sodré Bittencourt, Niomar Tapié, Michel, 283
Senie, Harriet, 372 Muniz, 239, 330 Tápies, Antoni, 97
Senise, Daniel, 71 Soffici, Ardengo, 273 Tarcísio, José, 31
Senna, Ayrton, 370 Solar, Xul, 47, 75, 104, 276 Tatlin, Vladimir, 285
Serna, Crespo de la, 330 Soria, 142 Tavares, Ana, 392
Serpa, Ivan, 52, 204, 273, Soto, Jesus Rafael, 36, 41, Teshigahara, Sofu, 2 13
329 57, 94-5, 98 Testa, Clorindo, 50
Serra, Richard, 297 Soulages, Pierre, 97, 247 Ticiano, 190
Serrano, Eduardo, 47 Soutine, Chaim, 318 Toledo, Álvaro de, 179
Servranck, Victor, 247 Souza, Edgard de, 172, 391 Toledo, Francisco, 47, 67,
Seuphor, Michel, 109 Souza, Jorge, 105-6 94-5
Sevcenko, Nicolau, 357 Souza, Márcio, 17, 21 Tomasello, Luís, 11 1, 171
Severini, Gino, 266 Spanudis, Theon, 268, 330 Torres, Augusto, 105
Severo, Ricardo, 175, 183 Speer, Albert, 123 Torres-García, Joaquín, 30,
Shakespeare, William, 151 Spencer, John R., 208, 262 3 6 ,4 1 ,4 7 , 57, 80, 98,
Shima, Kuniichi, 214 Spruce, Everett, 266 102-3, 105, 126, 150, 276
Shimotani, Chihiro, 215, 271 Squirru, Rafael, 109 Toshio, Yotani, 135-6
414
Traba, Marta, 15, 23-9, 41, Vergara, Carlos, 276, 397 Warhol, Andy, 293
66, 72-3, 76-8, 103, 138- Vergez, Juan Augusto, 172 Waugh, Carmen, 98
9, 144-5, 148, 150, 287, Veríssimo, Erico, 89 Weffort, Francisco, 127
358 Viana, Sampaio, 176 Weingartner, Pedro, 180, 188
Triana, Jorge Elias, 159 Vidal, Miguel Angel, 111 Weissmann, Franz, 194
Tsuchiya, Kimio, 47 Vidigal, Luis Eulálio Bueno, Wey, Walter, 186
Tsutaka, Waichi, 213 259 Wiig Hansen, Svend, 274
Tunga, 60, 70-1, 82, 389 Vieira, Antonio Hélio Wilheim, Jorge, 269, 347
Urena, Pedro Henriquez, 154 Guerra, 195 Winter, Fritz, 272
Uribe, Juan Camilo, 31, 47 Vilaça, Marcantonio, 155, Wolf, Ernesto, 270
Utamaro, Kitagawa, 236 172 Wolf, Liuba, 273
Valentim, Rubem, 32, 194, Vilaire, Patrick, 292 Worms, Berta, 188
276 Villalba, Virgilio, 106 Wright, Frank Lloyd, 121,
Vallauri, Alex, 45, 47 Villa-Lobos, Heitor, 75 123, 358, 362, 380
Valle, José de Freitas, 176-7, Villamizar, Eduardo Ramirez, Ximenez, Ettore, 366
182, 190 49, 158-9, 161-2, 272 Yamaguchi, Gen, 213
Vallejo, Mejia, 158 Villanueva, Carlos Raúl, 120 Yasuda, Haruhiko, 214, 271
Valluerca, E. T„ 181, 188 Villela, Milú, 393 Yazima, Sada, 213
Van Gogh, Vincent, 235, 391 Villieri, Jean, 247 Yimou, Zhang, 388
Van Lieshout, J., 398 Villon, Jacques, 247 Yoshida, Kenji, 215
Van Velde, Bram, 234, 247 Vinci, Laura, 392 Yoshida, Yoshie, 214-5
Vantongerloo, Georges, 108, Vinci, Leonardo da, 109, 391 Yoshitome, Yo, 2 14
247 Vio, Enrico, 181 Yudice, G., 113-4
Vardánega, Gregorio, 106, Visconti, Eliseu, 180, 188, Yvaral, J.-P., 111
111 191-2 Zabala, Horácio, 29
Vargas, Getúlio, 41, 51, 76, Viteri, Oswaldo, 31 Zadig, William, 181
82, 379 Vitureira, Cipriano, 170 Zalamea, Alberto, 24
Vasarely, Victor, 97, 109, Vollon, Antoine, 233 Zalamea, Jorge, 158
247, 265 Volpi, Alfredo, 32-3, 41, Zani, Amadeu, 181
Vasconcelos, José, 118, 126, 273, 278, 287 Zanini, Mário, 277
378 Vordemberghe-Gildewart, Zanini, Walter, 64, 196,
Vater, Regina, 52, 54 Friedrich, 272 214, 262, 268-70, 273-4,
Vaz, Guilherme Magalhães, VostelI, Wolf, 97 276, 278, 341-2
52 Wajda, Andrzej, 17 Zaya, Octavio, 304
Vega, Inca Garcilaso de la, Wagley, Charles, 131 Zea, Glória, 152
153 Wakabayashi, Kazuo, 53 Zerbini, Luiz, 71
Vega, Rafael, 163 Wani, Soroku, 2 14 Zerpa, Carlos, 31, 36, 47
Venturi, Lionello, 230 Warchavchik, Gregori, 76, Zevi, Bruno, 380
Venturi, Robert, 124 120, 358, 376, 380
415
Relação dos textos da coleção
416
23. Joan Ponç
24. Mavignier 75 anos
417
18. Um olhar sobre a América: Damián Bayón
19. Alteridade e identidade na América Latina
20. Colômbia: um contexto peculiar
21. Artes visuais sob a ótica de José Neistein
22. Artes visuais: contatos com a Argentina
418
51. Imagem da cidade moderna: o cenário e seu avesso
52. Criação: arquitetura e arte
53. Um olhar sobre a cidade
54. Modernidade e nacionalismo no Brasil
55. Brasil: perfil de um meio artístico marcado pela violência
56. “Arte-Cidade”: intestinos expostos
Parte 1 ■
— A propósito das Bienais
1. Bienal: isto já foi importante
2. Anotações à margem da XVIII Bienal — 1 : 0 ecletismo da arte de nosso tempo
3. Anotações à margem da XVIII Bienal — II: Os “históricos”, os latino-americanos e
« 1 »
os avulsos
4. Anotações à margem da XVIII Bienal — III: O Expressionismo no Brasil
5. Anotações à margem da XVIII Bienal — IV: O desafio da grande promoção
6. Indagações em torno da XIX Bienal
7. O curador como estrela
8. Vinte Bienais de São Paulo
9. A XX Bienal: anotações de um observador
10. A expansão da Bienal de Veneza: entre a materialidade e o conceito
11. Expandindo o internacionalismo
12. Grandiloqüência e marketing
13. Bienais ou da impossibilidade de reter o tempo
419
25. Mira Schendel
26. Geórgia Creimer
27. Amilcar de Castro: o vigor da expressividade fundada na geometria
28. Fernando Lucchesi
29. Emmanuel Nassar
30. Marco Giannotti
31. Leda Catunda
32. Quatro artistas
33. A propósito do trabalho de Beralda Aitenfelder
34. Uma nova geração
35. A efervescência dos anos 80
36. Guto Lacaz: entre o urbano, a memória e a “Aerobrás”
37. A mulher nas artes
38. Carmela Gross: um olhar em perspectiva
39. Jeanete Musatti: do abismo entre o onírico e a memória
40. Uma geração emergente
41. Espelhos e sombras
42. Voluntarismo de Cravo Neto
43. Visita a Caetano de Almeida
44. Geórgia Kyriakakis
45. A propósito da arte construtora: das poéticas visuais às interferências urbanas
46. Marcelo Grassmann, gravador
47. Regina Silveira: vocação internacionalista
48. Uma trajetória: Giselda Leirner
49. A mulher é o corpo
50. Lugar chamado arte
51. Arte paulistana
52. Vik Muniz: o ilusionismo além da aparência especular
53. Artur Lescher: a tática da elegância
54. Gregório Gruber
55. León Ferrari: os anos paulistas (1976-1984)
56. Conversação com Evandro Carlos Jardim: imagens revisitadas
420
Agradecimentos
421
Sobre a autora
Aracy Abreu Amaral (São Paulo, SP, 1930) graduou-se em Jornalismo na PUC-
SP em 1952, obteve o mestrado pela FFCLH-USP em 1970 e o doutorado pela ECA-
USP em 1971. Livre-Docente (1983), Professor-Adjunto (1985) e Professora-Titular
(1988) de História da Arte pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universida
de de São Paulo (hoje aposentada). Em 1978 recebeu bolsa da Fundação Guggenheim.
Foi diretora da Pinacoteca do Estado de São Paulo (1975-79) e do Museu de Arte Con
temporânea da Universidade de São Paulo (1982-86). Participante de colóquios e semi
nários no Brasil e no Exterior, foi membro do Comitê Internacional de Premiação do
Prince Claus Fund, Haia (2002-03 e 2004-05), e co-curadora/coordenadora-geral do
Projeto “Rumos” Itaú Cultural (2005-06). Vive e trabalha em São Paulo.
Entre as várias exposições que organizou, destacam-se: “Tarsila: 50 Anos de Pin
tura” (1969), “Alfredo Volpi: Pintura 1914-1972” (1972), “ExpoProjeção” (1973), “A
Nova Dimensão do Objeto” (1986), “Modernidade: Arte Brasileira do Século XX” (com
Marie Odile Briot, Frederico Morais e Roberto Pontual, Paris, 1987; São Paulo, 1988),
“Brasil: La Nueva Generación” (Caracas, 1991), “Espelhos e Sombras” (1994), “De Bra
sil: Aiquimias y Procesos” (Bogotá, 1999), “Mavignier 75” (2000), “Política de las Di
ferencias” (Recife/Buenos Aires, curadora pelo Brasil, 2001), e “Arte e Sociedade” (2003).
Vive e trabalha em São Paulo.
Livros publicados:
Blaise Cendrars no Brasil e os modernistas. São Paulo: Martins, 1970 (São Paulo: Editora
34, 1997, 2a ed.).
Artes plásticas na Semana de 22. São Paulo: Perspectiva, 1970 (Coleção Debates) (São
Paulo: Bovespa, 1992, edição especial; São Paulo: Editora 34, 1998, 5a ed.).
Desenhos de Tarsila. São Paulo: Cultrix, 1971.
Tarsila: sua obra e seu tempo. São Paulo: Perspectiva/Edusp, 1975 (Coleção Estudos) (São
Paulo: Tenenge, 1986, 2a ed.; São Paulo: Editora 34/Edusp, 2003, 3a ed.).
422
Mário Pedrosa. Mundo, homem, arte em crise (organização e apresentação). São Paulo:
Perspectiva, 1975.
Projeto construtivo brasileiro na arte (1950-1962) (organização e texto). Rio de Janeiro:
MEC-Funarte/MAM-RJ; São Paulo: Secretaria da Cultura, Ciência e Tecnologia
do Estado de São Paulo/Pinacoteca do Estado, 1977.
Artey arquitectura en el modernismo brasileno (organização e texto). Tradução de Marta
Traba. Caracas: Ayacucho, 1978.
A hispanidade em São Paulo. São Paulo: Nobel, 1981.
Mário Pedrosa. Dos murais de Portinari aos espaços de Brasília (organização e apresen
tação). São Paulo: Perspectiva, 1981.
Arte e meio artístico: entre a feijoada e o x-burger (1961-1981). São Paulo: Nobel, 1983.
Arte para quê? Apreocupação social na arte brasileira (1930-1970). São Paulo: Nobel, 1984
(2003, 3a ed.).
Ismael Nery: 50 anos depois (organização e texto). São Paulo: Banco Cidade de São Pau-
lo/MAC-USP, 1984.
Desenhos de Di Cavalcanti na coleção do MAC (organização e texto). São Paulo: CNEC/
MAC-USP, 1985.
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo: perfil de um acew o (organi
zação e texto). São Paulo: Techint/MAC-USP, 1988.
Arquitectura neocolonial: América Latina, Caribe, Estados Unidos (organização e texto).
São Paulo: Memorial da América Latina/Fondo de Cultura Econômica, 1994.
Tarsila do Amaral. Buenos Aires: Banco Velox/Fundação Finambrás, 1998 (Projeto
Cultural Artistas do Mercosul).
São Paulo: imagens de 1998 (organização com Rubens Fernandes Jr. e texto). São Paulo:
Bovespa, 1998.
Arte construtiva no Brasil: Coleção Adolpho Leimer (organização e texto). São Paulo: DBA/
Melhoramentos, 1998.
Marcos Coelho Benjamim/Fernando LucchesUJosé Bento (organização e textos). São Pau
lo: Banco ABC Brasil; Belo Horizonte: C/Arte, 2000, 3 vols.
Correspondência Mário de Andrade & Tarsila do Amaral (organização, introdução, cro
nologia e notas). São Paulo: Edusp/IEB-USP, 2001 (Coleção Correspondência de
Mário de Andrade, 2).
Tarsila cronista (organização e introdução). São Paulo: Edusp, 2002.
Arte e sociedade no Brasil (1930-2003) (3 vols., com André Toral). São Paulo: Callis,
2004.
423
Historiadora da arte brasileira e, ao mesmo tempo, crítica
atenta dos movimentos artísticos contemporâneos, Aracy Amaral
reúne em sua trajetória aspectos bastante incomuns: ao trabalho
minucioso da pesquisa e capaz de associar o golpe de vista ousado
do crítico que acompanha de perto as últimas tendências, do cura
dor que monta exposições para revelar a arte que ainda está por vir,
ou da intelectual que, à frente de instituições museológicas, propõe,
na teoria e na prática, a discussão profunda sobre o lugar da arte e
do artista na sociedade.
Textos do Trópico de Capricórnio , que ora se publica com apoio
do Programa Petrobras Cultural, reúne em três volumes — “Mo
dernismo, arte moderna e o compromisso com o lugar” (vol. 1),
“Circuitos de arte na América Latina e no Brasil” (vol. 2) e “Bienais
e artistas contemporâneos no Brasil” (vol. 3) — cerca de 150 en
saios, artigos e entrevistas realizados pela autora entre o início dos
anos 80 e 2005.
Este segundo volume apresenta, em sua primeira parte, escri
tos referentes à realidade cultural latino-americana, suas matrizes e
seus impasses, discutindo, entre outros temas, a problemática inser
ção da arte brasileira no continente. A segunda parte e terceira par
tes exploram as múltiplas relações entre os circuitos de arte e o meio
urbano, particularmente em contextos do Terceiro Mundo, tendo
como objetos de reflexão tanto a formação de importantes museus
brasileiros como inteivenções singulares, alternativas, que propõem
reinventar os meios de circulação da arte na sociedade.
Patrocínio:
m PETROBRAS n
LEI DE
B: A i
INCENTIVO
À CULTURA
" PA IS DE TODOS
GOVERNO FE D E R " 1
M INISTÉRIO
DA CULTURA
ISBN AS-732b-3b,5-E
editora 34
788573 263657