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Revista 7
de Geografía Norte Grande, 39: 7-20 (2008)
PERSPECTIVA MULTIESCALAR. REFLEXÕES A PARTIR DO CASO DE SÃO PAULO
Sandra Lencioni2
RESUMO
A grande dimensão territorial da metrópole contemporânea é produto de um
processo que conurba cidades e também fragmenta o território, o que remete à
idéia de arquipélago urbano. Essa realidade é analisada a partir da discussão
sobre a idéia de aglomeração, já que essa é fundamental para a definição do
urbano. Mas, o centro da discussão repousa sobre a necessidade de distinguir
dois conceitos para se compreender essa realidade: o de concentração e o de
centralização do capital. Enfatiza, também, a necessidade de uma análise
multiescalar, pois além da escala topográfica é importante na análise da
metrópole contemporânea se considerar a escala topológica, relativa aos fluxos
imateriais, pois essa escala insere a questão da distância numa lógica virtual
que modifica a noção do longe e do perto, aproximando lugares distantes e
distanciando lugares próximos.
Palavras chaves: Aglomeração, concentração, centralização, metrópole, escala.
ABSTRACT
The vast territorial dimension of the contemporary metropolis is a product of
the process of conurbanization that also entails the fragmentation of the
territory, which leads to the idea of urban archipelago. This reality is analyzed
starting from the discussion on the notion of agglomeration, since it is a
fundamental notion for the definition of the urban. Yet, the center of the
discussion rests on the need of distinguishing between two concepts to
understand urban reality: concentration and centralization of the capital. The
text emphasizes, also, the need of multi-scalar analysis. Indeed, besides the
topographical scale, it is important to consider the topological scales in the
analysis of the contemporary metropolis. The topological scale relates to the
immaterial flows, putting the issue of distance in a virtual logic that modifies
the notions of the far and near, approximating remote places and separating
nearby places.
Key words: Agglomeration, concentration, centralization, metropolis, scale.
postos da cidade (Derruaux, 1964: 561). Po- possui um alto coeficiente de concentração,
rém, apenas esse atributo não basta para a exemplo da concentração de trabalho qua-
considerarmos que as aglomerações seden- lificado, de serviços produtivos, ou seja, da-
tárias se constituam cidades. Se assim o fos- queles serviços voltados ao atendimento às
se consideraríamos muitas aldeias indígenas empresas, notadamente de empresas com
como sendo cidades. fortes vínculos com o mercado mundial, de
fluxos virtuais, de população, de renda e de
No caso de relacionarmos a aglome- edifícios verticalizados.
ração, já com seu atributo de ser sedentária,
à idéia de cidade, devemos considerar ape- A cidade de São Paulo, o centro desse
nas as aglomerações que se caracterizam aglomerado metropolitano, é a maior praça
pelo desenvolvimento de atividades não financeira do país. O número de agências
agrícolas? A resposta a essa questão é nega- no ano de 2006 era de 2.067, enquanto que
tiva, como observou Derriaux, em meados o Rio de Janeiro, em segundo lugar, possuía
do século XX, quando disse que muitas cerca da metade, 1.031 agências. Enquanto
aglomerações constituem cidades muito em- as operações de crédito, no Rio de Janeiro,
bora apresentem grande parte de sua popu- significaram 35 bilhões de reais, em São
lação voltada para as atividades agrícolas Paulo esse número foi de 236 bilhões de
(Derruaux, 1964). Exemplifica falando de reais (IBGE, 2006). Quanto aos depósitos to-
várias aglomerações mediterrâneas, como tais eles saltaram de 106 bilhões de reais,
Mesina, Palermo ou Murcia. Diz ele que es- em 1996, para 204 bilhões em 2001, apre-
sas aglomerações, embora com uma popu- sentando um crescimento da ordem de 52%
lação vinculada ao campo, apresentam as- (Banco Central do Brasil, 2001). Dos 48
pectos próprios de cidade, tais como o maiores bancos do país, 30 deles possuem a
mercado e a administração pública. Esse au- sede principal na cidade de São Paulo (Fe-
tor para reforçar a posição de Ratzel, faz um rreira, 2007: 238). Essa cidade abriga a sede
raciocínio em direção oposta dizendo que o da BOVESPA -Bolsa de Valores de São
fato de um aglomerado se caracterizar por Paulo-, que se constitui no maior centro de
população não agrícola, não significa neces- negociação de ações da América Latina con-
sariamente, que estamos diante de uma ci- centrando 70% do volume de negócios rea-
dade e dá como exemplo os aglomerados de lizados (SEMPLA, 2003).
fábricas com algumas casas ao redor que es-
tão longe de constituírem cidade. Essa combinação de dispersão e concen-
tração é que configura o espaço da metró-
Recuperamos essas premissas da relação pole contemporânea. A metrópole coesa,
entre aglomeração e cidade porque estamos como “grande cidade”, é a forma clássica da
nos referindo à metrópole de São Paulo que metrópole. O seu espraiamento por um ex-
se apresenta territorialmente espraiada, com tenso território e seus limites imprecisos
um tecido urbano esgarçado que pode mati- pode levar a entender que o que é disperso
zar um dos elementos fundamentais de sua não é o aglomerado, mas o novo patamar da
constituição que é o de aglomeração. Essa urbanização. Trata-se apenas de uma apa-
aglomeração pode se apresentar coesa, rência, pois o que é disperso é a forma que
como o foi no passado, ou dispersa, como assume a aglomeração. Seja qual for a confi-
tem se apresentado nos dias atuais. guração metropolitana, quer seja um espaço
mais denso ou mais disperso, esse espaço é
A metrópole contemporânea, devido ao condição, processo e produto associado à
seu espraiamento territorial e a conurbação urbanização, que tem na idéia de aglome-
de cidades apresenta uma densidade popu- ração um dos elementos centrais de sua de-
lacional menor que a metrópole coesa do finição. Portanto, o que é disperso é sua for-
passado. Seus limites territoriais são difusos, ma.
dado o grande grau de dispersão, por exem-
plo, da população, das atividades de consu- Essa gigantesca mancha urbana, como a
mo, da área construída e das atividades pro- da atual metrópole de São Paulo, requer in-
dutivas. Mas, essa dispersão não deve corporação crescente de áreas que chegam
comprometer, no entanto, a visão de que ela ao mercado de terras supervalorizadas em
10 R E V I S TA DE GEOGRAFÍA NORTE GRANDE
relação à valorização anterior. Mas, essas te- mam um conjunto apesar de separadas umas
rras apresentarem valor unitário menor em das outras pelo oceano, algumas áreas dessa
comparação a algumas áreas tradicionais da metrópole constituem verdadeiras ilhas que
cidade e é essa dinâmica de preços que faz pouco contato têm com seu entorno, como
com que novas áreas sejam continuadamen- se tivessem um oceano entre elas. Esse é o
te incorporadas à lógica do mercado de te- caso das áreas de condomínios fechados,
rras da metrópole, contribuindo para a inde- que podem apresentar população até maior
finição dos limites metropolitanos. que a de cidades, onde o que importa não é
tanto o contato com o seu entorno, mas o
Uma metrópole espraiada e dispersa sig- acesso a alguma autopista. Também é o caso
nifica maior tempo de deslocamento de seu dos shopping-centers que se espalham por
habitantes, maior tráfego de veículos e várias áreas da cidade, bem como das torres
maior movimento pendular entre o local de de escritório onde se desenvolvem os ser-
moradia e o local de trabalho. Produz-se viços superiores. Muitas dessas torres são
nessa metrópole uma irracionalidade que chamadas de edifícios inteligentes porque
cobra do capital maior dispêndio de tempo apresentam infra-estrutura de telecomuni-
com a locomoção pela cidade, com possibi- cações avançada e otimização dos recursos
lidades de se multiplicarem os acidentes de instados para seu funcionamento, além de
trânsito e de se aumentar o ambiente carre- segurança e conforto.
gado de poluentes. Tudo isso compromete o
funcionamento da metrópole e a própria Essas ilhas representam a fragmentação
existência da cidade. Borja e Castells dizem da cidade, muito embora essa cidade arqui-
que podemos evoluir “para um mundo sem pélago se constitua numa única bacia de ha-
cidades, ao menos em grande parte do pla- bitat e de trabalho. O ir e vir não se dá, pre-
neta e para a maioria da população. Um ferencialmente, no entorno dessas ilhas, mas
mundo organizado em torno de grandes no seu interior, a indicar a fragmentação do
aglomerações difusas de funções econômi- tecido urbano que é um dos grandes respon-
cas e assentamentos humanos disseminados sáveis pela negação da rua como lugar de
ao largo de vias de transportes, com zonas encontro de transeuntes e de desiguais. A at-
semi rurais intersticiais, áreas periurbanas mosfera no interior dessas ilhas é mais de
sem controle e serviços desigualmente re- um clube do que de uma cidade, não sendo
partidos em uma infra-estrutura descontínua. propriamente urbana.
O global poderia se organizar em torno de
centros de direção, tecnológicos e residen- Assim, no interior dessa metrópole es-
ciais das elites, conectados entre si por co- praiada, novas formas de segregação espa-
municações a longa distância e redes eletrô- cial emergem num mosaico onde condomí-
nicas, enquanto a população poderia nios de luxo se apresentam ao lado de
individualizar seu habitat na difusão urbana bairros pobres ou favelas. Esse novo mosai-
descrita, ou agrupar-se em comunidades de- co urbano compromete a tradicional forma
fensivas de ideologia quase tribal para asse- de viver na cidade e, do ponto de vista da
gurar sua sobrevivência em um mundo es- explicação compromete a interpretação que
truturado globalmente em seu centro e imperou no final do século XX, o modelo
desestruturado localmente em múltiplas pe- centro-periferia que norteou a compreensão
riferias” (Borja y Castells, 1997: 13). Adver- do crescimento urbano das metrópoles lati-
tem, dizendo: “os tons de ciência de ficção no-americanas.
de nosso discurso tem a intenção apenas de
chamar a atenção do leitor sobre um proces- Assim, a metrópole espraiada, com limi-
so em marcha, inscrito na lógica do potente tes difíceis de precisar, é a expressão máxi-
sistema tecno econômico emergente, mas ma da indefinição das fronteiras e da des-
que de modo algum é uma fatalidade” (Bor- agregação da cidade compacta típica do
ja y Castells, 1997: 13-14). início do século XX. Trata-se de uma metró-
pole difusa, de limites imprecisos, que co-
No território dessa metrópole espraiada nurba cidades e se estende por centenas de
formam-se verdadeiras ilhas urbanas. Tanto quilômetros, mas essas características todas
quanto um arquipélago em que as ilhas for- não comprometem a interpretação de que
C ONCENTRAÇÃO E CENTRALIZAÇÃO DAS ATIVIDADES URBANAS : UMA 11
PERSPECTIVA MULTIESCALAR. REFLEXÕES A PARTIR DO CASO DE SÃO PAULO
tana, a saber: Barueri, Guarulhos, São Ber- Quanto à centralização, a primeira dis-
nardo do Campo e Osasco, bem como dos tinção é que essa não se confunde com a
municípios de Campinas e São José dos acumulação. Centralizar é, acima de tudo,
Campos, todos a uma distância menor que centralizar capitais. O processo de centrali-
100 quilômetros da cidade de São Paulo zação constitui-se num processo em que
(SEADE, 2005). frações individuais de capitais se associam,
se fundem ou se reagrupam. A centralização
Os dados do Estado de São Paulo indi- é, a rigor, a abolição da autonomia do capi-
cam que esse Estado é responsável por tal individual; ou seja, significa a expro-
32,3% do PIB brasileiro 3. A cidade de São priação de um capitalista por outro capita-
Paulo e mais 4 municípios: Barueri, Guarul- lista, que acaba por transformar capitais
hos, São Bernardo do Campo - todos esses menores, num capital de maior magnitude.
pertencentes à Região Metropolitana de A centralização é, portanto, uma reorgani-
São Paulo – e, ainda o município de Cam- zação na distribuição da propriedade dos
pinas, respondem por cerca de 50% do PIB capitais. Altera-se apenas o agrupamento
paulista, 50% do valor adicionado da in- das partes constitutivas do capital social e,
dústria paulista e, também por 58% do va- nesse sentido, é que concentra a proprieda-
lor adicionado dos serviços4. Revela-se, as- de do capital, mas não se constitui num pro-
sim, a grande concentração territorial da cesso acumulação, não resultando, portanto,
riqueza gerada nesse país de dimensões em nenhum aumento do capital social
continentais. (Marx, 1984, Livro I, Vol. 3: 778). Em outros
Quadro Nº 1
PRODUTO INTERNO BRUTO DO ESTADO DE SÃO PAULO MUNICÍPIOS COM MAIOR PIB (2005)
Municípios PIB
Fonte dos dados: SEADE - Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados; IBGE - Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (2005).
o efeito da globalização. Mais do que isso, gestão define a cidade como sendo global
possibilitam uma interpretação das relações ou não. O que nos parece mais relevante e
sócio-espaciais situadas além e aquém dos significativo é compreender que há uma re-
reflexos da globalização. lação direta entre o crescimento da centrali-
zação do capital nas mais diversas ativida-
A principal contribuição do conceito de des econômicas e o crescimento dos
centralização para a interpretação do urba- serviços avançados nas metrópoles. Esses,
no é que a gestão empresarial dos grupos por se acharem concentrados territorialmen-
econômicos e das grandes empresas em te garantem a centralidade da metrópole,
rede priorizam a metrópole e, no caso brasi- seu poder de dominação e direção; ou seja,
leiro, prioriza a metrópole de São Paulo. É sua hegemonia.
no exercício da função central da metrópo-
le, que é de controle do capital, que se Segundo Smith, enquanto “na cidade
adensam os serviços produtivos, os serviços pré-capitalista foram as necessidade da tro-
voltados às empresas, muitas vezes denomi- ca mercantil que ditaram o movimento de
nados de serviços avançados. Daí provém o centralização espacial, na cidade capitalis-
grande desenvolvimento dos serviços nas ta avançada são os ditames financeiros e
metrópoles e, no caso em exame, da metró- administrativos que perpetuam a tendência
pole de São Paulo. à centralização. Isso ajuda a explicar por-
que certas atividades chamadas de serviços
São serviços, portanto, voltados ao con- são centralizadas e outras são suburbaniza-
sumo produtivo e não individual, tais como das, e porque a reestruturação das áreas
os serviços de consultoria jurídica às empre- centrais assume esta forma corporativa/pro-
sas. Muito embora esses serviços possam ser fissional” (Smith, 2007: 25). Desenvolven-
oferecidos à distância, a proximidade física, do seu raciocínio podemos dizer que na
muitas vezes, é fundamental, por exemplo, metrópole moderna, típica de grande parte
entre advogados, clientes e profissionais es- do século XX, a industrialização e as multi-
pecialistas. O contato próximo e imediato nacionais foram importantes para o desen-
entre as pessoas possibilita decisões quanto volvimento dos serviços produtivos e, con-
aos acordos financeiros, às transações inter- sequentemente, para a centralidade da
nacionais, às aplicações financeiras e aos metrópole. Hoje em dia o que caracteriza a
contratos assinados. Por decorrência, já que metrópole contemporânea é a presença dos
esses serviços avançados requerem uma mi- grupos econômicos, notadamente a gestão
ríade de outros que gravitam em seu redor, desses grupos.
aglomeram-se os serviços nas diversas cen-
tralidades da metrópole. É necessário perseguir a idéia de locali-
zação dos serviços avançados no interior
Sassen discutindo a produção de ser- dos territórios da metrópole (Figura Nº 1).
viços produtivos, aqueles voltados à pro- Esses se dão em áreas que expressam o poli-
dução, diz que a “característica particular centrismo, o qual vem progressivamente se
da produção desses serviços, especialmente desenvolvendo.
aqueles envolvidos em operações complexas
e inovadoras, é de exprimir sua concen- E o que é interessante é que essa multi-
tração acentuada nas maiores cidades” (Sas- centralidade apresenta uma hierarquia se-
sen, 1995: 68). gundo o grau de internacionalização das ati-
vidades que nelas se desenvolvem, sendo o
Nesse sentido, podemos afirmar que o topo da pirâmide ocupado pelas áreas onde
grau de concentração territorial dos serviços o grau de internacionalização dos serviços é
produtivos na metrópole tem relação direta maior, expresso pela presença de firmas es-
com o desempenho de seu papel central. trangeiras e pelos vínculos densos com o ex-
Muitos desses serviços estão diretamente re- terior no desenvolvimento dos negócios. Em
lacionados à gestão do capital, tratando-se geral, é nas novas áreas centrais que os ho-
de serviços que viabilizam a realização do téis voltados para os homens de negócio
comando da produção. A nosso ver o que apresentam a tendência de nelas se localiza-
menos importa é saber se a concentração da rem. Na base da pirâmide temos o centro
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PERSPECTIVA MULTIESCALAR. REFLEXÕES A PARTIR DO CASO DE SÃO PAULO
Figura Nº 1
A EXPANSÃO DAS ATIVIDADES TERCIÁRIAS NA CIDADE DE SÃO PAULO
um arquipélago, cujo tecido urbano é frag- redes que se estruturam não são mais redes
mentado. Apresenta locais em que convivem hierarquizadas, como no passado, sendo,
lado a lado, áreas elitizadas, a exemplo de sobretudo, redes anastomosadas.
alguns condomínios fechados, e favelas. Es-
tranhos um ao outro e separados socialmen- Podemos, esquematicamente, apresentar
te compartilham uma vizinhança territorial algumas características mencionadas nesse
que impossibilita apreendermos arranjos texto relacionadas à metrópole que se des-
que obedeçam a uma hierarquia piramidal. envolveu do último terço do século XIX ao
último terço do século XX; ou seja, da me-
Do século XIX ao atual assistimos, assim, trópole moderna e da metrópole contem-
a uma trajetória de mutação da metrópole: porânea, como São Paulo, que anuncia uma
de compacta para dispersa e de coesa para nova forma de viver na cidade (Quadro Nº
fragmentada. Desenvolve-se, assim, uma 1). Não é demais advertir que todo esquema
nova lógica espacial que se caracteriza pela é simplificador, mas tem o mérito de fazer
dominação do espaço de fluxos sobre a do saltar à vista transformações que considera-
espaço dos lugares , em que o espaço de mos relevantes para a discussão em pauta.
fluxos, é “estruturado em circuitos eletrôni-
cos que ligam entre si, globalmente, nodos A metrópole contemporânea é uma reali-
estratégicos de produção e gestão”. E, que dade nova que necessita ser compreendida de
se caracteriza, também por se constituir várias perspectivas. Aqui, a ênfase foi dada
num espaço dos lugares, “como forma terri- aos processos de concentração e de centrali-
torial de organização da cotidianidade e da zação como emuladores de novas visões sobre
experiência de grande parte dos seres huma- a metropolização contemporânea.
nos” (Borja y Castells, 1997: 67). Para esse
autor, “enquanto o espaço de fluxos está Situados enquanto processos do capital,
globalmente integrado, o espaço dos lugares a concentração do capital se relaciona à
está localmente fragmentado” (Borja y Cas- aglomeração urbana e sua contra face, à dis-
tells, 1997: 67). Nesse espaço de fluxos as persão. Por outro lado, a centralização do
Quadro Nº 3
ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DA METRÓPOLE MODERNA E DA METRÓPOLE CONTEMPORÂNEA
gráfico -, que compromete uma visão mais termos topográficos pode ser uma grande
ampla dos fenômenos espaciais. É necessá- distância em termos virtuais; ou seja, a
rio ir além. pouca distância em termos topográficos en-
tre A e B, por exemplo, 5 quilômetros, pode
Buscando maior clareza, vejamos o ser uma grande distância em termos virtuais
exemplo: se tomarmos apenas a escala na se A não tiver uma infra-estrutura de infor-
perspectiva topográfica, a opção por diferen- mação e comunicação que possa se comu-
tes escalas, 1: 25.000 ou 1: 100.000, levará à nicar com B, restando, assim, muito distante
interpretação de que o fenômeno urbano é de B. Por outro lado, a longa distância, me-
disperso, no primeiro caso e, concentrado, dida em quilômetros de superfície, pode, na
no segundo, o que resvala, facilmente, num escala topológica, ser praticamente anulada
inadequado relativismo. O mesmo pode ser dada a capacidade dos fluxos imateriais.
dito quando nessa mesma perspectiva e a
partir de uma grande escala se interpreta que Pumain interroga se as novas tecnologias
os bairros elitizados estão mesclados com os de informação e de comunicação não esta-
bairros empobrecidos. Mas, se examinados a riam conduzindo a uma geografia sem esca-
partir de numa pequena escala a conclusão é la (Pumain, 2003: 1). E, Buzenot diz que da-
a de que não se trata de uma mescla, mas, ao qui em diante, as interações espaciais não
contrário, de uma separação. É por isso que se farão mais unicamente segundo as regras
Harvey alerta que o que é relevante ou faz de um espaço topográfico onde as distancias
sentido numa escala não o é em outra (Har- são os fatores de diferenciação, mas segun-
vey, 2004: 108). do as regras de um espaço topológico onde
a capacidade de estar conectado ou vincula-
Importa, ainda, destacar a importância do torna-se fator de diferenciação e gerador
da escala do corpo humano no espaço urba- de desigualdades” (Buzenot, 2007).
no, relativa ao lugar que o corpo individual
ocupa na cidade. Essa dimensão é topográfi- Devemos considerar, também, uma ca-
ca mas parece muito ausente na discussão racterística dos dias atuais decorrente do
sobre a cidade. Conforme Harvey, o “capital desenvolvimento do território em rede que
se empenha continuadamente em moldar os veio suplantar o território de redes. Para Mo-
corpos de acordo com seus próprios requisi- gin “o território rede se caracteriza essen-
tos, ao mesmo tempo em que internaliza em cialmente... por ter propriedades de ordem
seu modus operandi efeitos de desejos cor- ‘topológica’ que valorizam as ‘relações hori-
porais, vontades, necessidades e relações zontais’ e sua ligação pólo a pólo a expen-
sociais...” (Harvey, 2004: 157). sas das relações verticais e piramidais, pólo-
hinterlância”. Acrescenta, ainda, que a
Isso significa que além de moldar a ex- “cidade global está presa em uma rede
periência individual dos corpos, o capital (web) que corresponde a uma organização
busca socialmente discipliná-los na pro- em rede ( reticulum ), isto é, a uma estrutu-
dução e, o que é importante para a discus- ração que privilegia a horizontalidade e cria
são em pauta, discipliná-los, também, na ci- hierarquias que não são de natureza pirami-
dade. O que vem ocorrendo em Los Angeles dal” (Mogin, 2006: 226).
é um exemplo do esforço em disciplinar o
corpo humano na cidade. Foi aprovada re- A idéia de ordem topológica vem reafir-
centemente a norma, pelo City Council, de mar a importância de se considerar os fluxos
que os moradores de rua podem dormir nas imateriais na análise espacial, como obser-
calçadas no período compreendido entre 9 vamos anteriormente, já que a virtualidade
horas da noite às 6 da manhã do dia seguin- subverteu a maneira de se pensar o espaço.
te se eles guardarem, pelo ao menos, 3 me- Dizendo de uma outra maneira, o virtual re-
tros das casas ou das lojas (International He- afirmou a importância de se levar em conta
rald Tribune, 2007). as relações horizontais, por exemplo, as re-
lações entre cidades globais, e, também as
Numa perspectiva multiescalar, como a relações verticais como as do global em re-
discutida nesse texto, que envolve escalas lação ao local, sem necessariamente passar
de natureza diferentes, a pouca distância em pelo regional ou nacional.
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