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METODOLOGIA

DO ENSINO DE
HISTÓRIA

Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão

GRADUAÇÃO
Unicesumar
Reitor
Wilson de Matos Silva
Vice-Reitor
Wilson de Matos Silva Filho
Pró-Reitor Executivo de EAD
William Victor Kendrick de Matos Silva
Pró-Reitor de Ensino de EAD
Janes Fidélis Tomelin
Presidente da Mantenedora
Cláudio Ferdinandi

NEAD - Núcleo de Educação a Distância


Diretoria Executiva
Chrystiano Mincoff
James Prestes
Tiago Stachon
Diretoria de Graduação e Pós-graduação
Kátia Coelho
Diretoria de Permanência
Leonardo Spaine
Diretoria de Design Educacional
Débora Leite
Head de Produção de Conteúdos
Celso Luiz Braga de Souza Filho
Head de Curadoria e Inovação
Tania Cristiane Yoshie Fukushima
Gerência de Produção de Conteúdo
Diogo Ribeiro Garcia
Gerência de Projetos Especiais
Daniel Fuverki Hey
Gerência de Processos Acadêmicos
Taessa Penha Shiraishi Vieira
Supervisão de Produção de Conteúdo
Nádila Toledo
Coordenador de Conteúdo
Marcia Maria Previato de Souza
Designer Educacional
Giovana Vieira Cardoso
Iconograia
Isabela Soares Silva
Projeto Gráico
Jaime de Marchi Junior
José Jhonny Coelho
C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Arte Capa
Distância; PAIXÃO, Priscila C. M.. Arthur Cantareli Silva
Metodologia do Ensino de História. Priscilla Campiolo Manesco Editoração
Paixão. Arthur Cantareli Silva
Maringá-Pr.: UniCesumar, 2018. Qualidade Textual
240 p. Hellyery Agda
“Graduação - EaD”.

1. Metodologia. 2. Ensino . 3. História 4. EaD. I. Título.

ISBN 978-85-459-0733-6
CDD - 22 ed. 372-89
CIP - NBR 12899 - AACR/2

Ficha catalográica elaborada pelo bibliotecário


João Vivaldo de Souza - CRB-8 - 6828
Impresso por:
Em um mundo global e dinâmico, nós trabalhamos
com princípios éticos e proissionalismo, não so-
mente para oferecer uma educação de qualidade,
mas, acima de tudo, para gerar uma conversão in-
tegral das pessoas ao conhecimento. Baseamo-nos
em 4 pilares: intelectual, proissional, emocional e
espiritual.
Iniciamos a Unicesumar em 1990, com dois cursos
de graduação e 180 alunos. Hoje, temos mais de
100 mil estudantes espalhados em todo o Brasil:
nos quatro campi presenciais (Maringá, Curitiba,
Ponta Grossa e Londrina) e em mais de 300 polos
EAD no país, com dezenas de cursos de graduação e
pós-graduação. Produzimos e revisamos 500 livros
e distribuímos mais de 500 mil exemplares por
ano. Somos reconhecidos pelo MEC como uma
instituição de excelência, com IGC 4 em 7 anos
consecutivos. Estamos entre os 10 maiores grupos
educacionais do Brasil.
A rapidez do mundo moderno exige dos educa-
dores soluções inteligentes para as necessidades
de todos. Para continuar relevante, a instituição
de educação precisa ter pelo menos três virtudes:
inovação, coragem e compromisso com a quali-
dade. Por isso, desenvolvemos, para os cursos de
Engenharia, metodologias ativas, as quais visam
reunir o melhor do ensino presencial e a distância.
Tudo isso para honrarmos a nossa missão que é
promover a educação de qualidade nas diferentes
áreas do conhecimento, formando proissionais
cidadãos que contribuam para o desenvolvimento
de uma sociedade justa e solidária.
Vamos juntos!
Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está
iniciando um processo de transformação, pois quando
investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou
proissional, nos transformamos e, consequentemente,
transformamos também a sociedade na qual estamos
inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportu-
nidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de
alcançar um nível de desenvolvimento compatível com
os desaios que surgem no mundo contemporâneo.
O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de
Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo
este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens
se educam juntos, na transformação do mundo”.
Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica
e encontram-se integrados à proposta pedagógica, con-
tribuindo no processo educacional, complementando
sua formação proissional, desenvolvendo competên-
cias e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em
situação de realidade, de maneira a inseri-lo no mercado
de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal
objetivo “provocar uma aproximação entre você e o
conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento
da autonomia em busca dos conhecimentos necessá-
rios para a sua formação pessoal e proissional.
Portanto, nossa distância nesse processo de cresci-
mento e construção do conhecimento deve ser apenas
geográica. Utilize os diversos recursos pedagógicos
que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita.
Ou seja, acesse regularmente o Studeo, que é o seu
Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns
e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das dis-
cussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe
de professores e tutores que se encontra disponível para
sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de
aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranqui-
lidade e segurança sua trajetória acadêmica.
AUTORA

Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão


Mestre em História pela Universidade Estadual de Maringá (UEM), especialista
em História Econômica pela mesma instituição; Especialista em Metodologia do
Ensino da Arte pelo Centro Universitário Internacional (UNINTER), Graduada em
História pela Faculdade de Filosoia, Ciências e Letras de Mandaguari (FAFIMAN)
e Licenciada em Pedagogia pelo Centro Universitário de Maringá (UNICESUMAR).
Tem experiência na área da educação atuando como Coordenadora (Ensino
Fundamental e Ensino Superior) e Professora da Educação Básica e em Cursos
de Graduação e Pós-graduação Lato-sensu. Atualmente é Professora de Pós-
graduação Lato-sensu em Cursos de Educação, integrante da Comissão de
Elaboração e Revisão de Itens/ENADE do Banco Nacional de Itens (BNI) pelo
Instituto Anísio Teixeira (INEP/MEC), integrante do Comitê de Pesquisa da
Unicesumar e Coordenadora de Cursos de Graduação do Núcleo de Educação
a Distância (NEaD) da Unicesumar - Centro Universitário de Maringá.
Para informações mais detalhadas sobre sua atuação proissional, pesquisas
e publicações, acesse seu currículo, disponível no endereço a seguir:
<http://lattes.cnpq.br/7502281268919774>.
APRESENTAÇÃO

METODOLOGIA DO ENSINO DE HISTÓRIA

SEJA BEM-VINDO(A)!
Prezado(a) aluno(a),
Na primeira unidade deste material procuramos buscar pelas origens da palavra His-
tória, compreendendo seus diversos sentidos. Partiremos da análise da História como
ciência e depois enquanto disciplina escolar, buscando entender questões epistemoló-
gicas do conhecimento histórico na atualidade.
Na sequência, vamos compreender que ensinar História é criar a possibilidade de in-
vestigação, sem separar o ensino da aprendizagem e da pesquisa. Daremos ênfase no
professor, enquanto um sujeito histórico, inserido em um grupo social no qual interage
e, por isso, tem um papel fundamental na construção do conhecimento histórico por
parte dos alunos.
Isso porque o ponto de partida de qualquer trabalho voltado para o ensino-aprendi-
zagem de História envolve considerar o repertório dos alunos. As crianças participam
de inúmeros espaços de convívio em que se socializam, produzem e reproduzem uma
ininidade de regras, valores, hábitos e costumes. Além do convívio familiar, do bairro, da
escola, das festas e da Igreja, ainda contam com os meios de comunicação e informação
como a televisão, o rádio, o jornal, o cinema e o mais adorado de todos, a internet.
Na terceira unidade, aguçaremos em você, caro(a) aluno(a), o interesse pelas várias for-
mas de acesso ao conhecimento histórico e diferentes fontes e linguagens: fotograia,
vídeo, obras de arte, textos e documentos de época. Isto porque se faz necessário de-
senvolver as habilidades de observação, identiicação e compreensão, além da própria
linguagem (forma, estética, composição do todo), para estabelecer relação entre for-
ma e conteúdo nas fontes históricas, além, é claro, de aprender a utilizar didaticamente
estes documentos históricos em sala de aula. Em outras palavras, devemos considerar
nossos alunos como sujeitos que possuem um repertório cultural enorme e que exer-
cem a cidadania constantemente, daí a necessidade de considerar estes documentos
históricos como recursos que possibilitam a aprendizagem do alunado.
Dando continuidade, na quarta unidade apresentamos o planejamento e a avaliação con-
siderando suas características e especiicidades voltadas ao ensino de História. Além disso,
analisaremos o Parecer/Lei 10.639/03 – transformada na Lei 11.645 de 2008, que incluiu a
temática Cultura Afro-brasileira e Indígena, abrindo possibilidades à ediicação da igual-
dade e da repreensão às atitudes e posturas de discriminação no ambiente escolar.
Para inalizar, a última unidade traz a questão do tempo como categoria essencial para
se pensar a História. Aqui analisaremos o mundo e sua temporalidade, adquirindo a
capacidade de transcender os referenciais usados na divisão do tempo histórico, que
considera somente os marcos do poder e da dominação. Por im, daremos condições a
você, de identiicar e avaliar as etapas em que as crianças se encontram com relação ao
domínio das relações temporais.
Boa leitura!!
Professora Priscilla C. M. Paixão
09
SUMÁRIO

UNIDADE I
A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA

15 Introdução

16 Origem e Sentido da Palavra História

20 A História Enquanto Ciência

28 A História Enquanto Disciplina Escolar

33 A História Ensinada na Atualidade

38 Considerações Finais

45 Referências

UNIDADE II
TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA

51 Introdução

52 Mudanças e Permanências nos Métodos da História Escolar

60 Concepções de Conteúdos Escolares e de Aprendizagem

70 A Formação de Conceitos

78 A Formação do Professor e o Cotidiano de Sala de Aula

85 Considerações Finais

93 Referências

95 Gabarito
10
SUMÁRIO

UNIDADE III
A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA

99 Introdução

100 Historiadores e Professores: Diferentes Usos das Fontes Históricas

103 A Análise Didática de uma Fonte Histórica

107 Documentos Escritos e Não Escritos

119 A Construção de Conhecimento por Meio das Fontes Históricas

123 Considerações Finais

125 Anotações

133 Referências

135 Gabarito

UNIDADE IV
A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA

139 Introdução

140 Efetivando a Aprendizagem: O Planejamento Como Ponto de Partida

145 As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar

162 Cultura Afro-Brasileira e Indígena

179 Avaliação Como Processo de Melhorias da Ação Docente e Discente

188 Considerações Finais

196 Referências

199 Gabarito
11
SUMÁRIO

UNIDADE V
HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO

203 Introdução

204 O Tempo: Categoria Essencial para Pensar a História

206 O Tempo como Aprendizagem Social

212 Identiicando os Diferentes Tipos de Tempo

214 A Criança e as Primeiras Noções de Tempo

223 O Trabalho com Linhas do Tempo

229 Considerações Finais

236 Referências

238 Gabarito

239 Conclusão
Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão

I
UNIDADE
A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA

Objetivos de Aprendizagem
■ Buscar pelas origens da palavra História, compreendendo seus
diversos sentidos.
■ Analisar a História enquanto ciência e disciplina escolar.
■ Entender questões epistemológicas do conhecimento histórico e a
problemática do conhecimento no ensino de História da atualidade.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■ Origem e sentido da palavra História
■ A História enquanto ciência
■ A História enquanto disciplina escolar
■ A História ensinada na atualidade
15

INTRODUÇÃO

Para iniciarmos nossas discussões, teremos que nos remeter à origem da pala-
vra História, visto que tudo tem uma História, um começo, uma origem. Com
esta palavra não poderia ser diferente. É por isso que dizemos que a História
tem história. Partiremos de sua deinição, buscando suas origens. Depois, pen-
saremos na História enquanto disciplina escolar. Talvez, neste momento, você
já esteja pensando que estudar tal disciplina seja um tanto monótono. Porém,
tenho certeza que ao inal desta leitura, você se dará conta do quão prazeroso é
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

estudar uma disciplina que por muito tempo icou relegada a um segundo plano.
A História é uma disciplina que faz parte das chamadas “humanidades”, termo
pelo qual os franceses designam estudos humanos superiores. Apesar disso, a
história teve seus foros de ciência negados por muito tempo, sendo considerada
uma disciplina de segunda categoria. Lembremo-nos que no Brasil dos séculos
XIX e XX, a educação escolar se limitou a ensinar a “ler, escrever e contar”. A
ênfase do trabalho docente restringia-se à “alfabetização”, na maioria das vezes
compreendida como aquisição da leitura, da escrita e do domínio das quatro
operações matemáticas. Assim, raramente havia lugar para o Ensino de História.
No entanto, compreendemos a alfabetização como a capacidade de leitura
não só do texto, mas também da experiência humana vivida por todos e como
construção da própria história. Nesta perspectiva, entendemos leitura/escrita
não somente como a habilidade mecânica, mas como uma manifestação de
cidadania. Estudar as informações históricas a partir da realidade social com o
objetivo de desenvolver o raciocínio histórico deve constituir o objeto das aulas
de História. Há vários encaminhamentos na defesa da disciplina. A História fas-
cina e é capaz de transformar o sujeito, por isto dizemos que cabe a ela “formar
um cidadão crítico, relexivo e atuante”.
Portanto, caro(a) aluno(a), podemos airmar que a História tem histó-
ria e que sua aplicação como disciplina escolar passa por uma revisão que lhe
confere um grande valor na atualidade.

Introdução
16 U N ID A D E I

ORIGEM E SENTIDO DA PALAVRA HISTÓRIA

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Nas três dimensões básicas do tempo – passado, presente e futuro – a História
tem seu destaque. Marc Bloch (1886-1944), um dos fundadores da escola dos
Annales francesa, deiniu a história como a ciência do homem no tempo. Este
historiador, vítima dos nazistas, foi executado por não concordar em por sua
história a serviço dos ideais de seus torturadores, e merece toda ênfase por ter
participado da revisão de conceitos e métodos da chamada Nova História.
Parece claro que, se todos os homens puderem perceber a realidade vivida
e compará-la com aquela que estão vivendo, seriam mais conhecedores de seus
destinos. É a nossa experiência posta a serviço de nossos “acertos” em nossas
escolhas de vida. É por isso que existe a necessidade de conhecer a “história”
que a disciplina histórica nos oferece, a sucessão de fatos passados fornecendo
exemplos a serem imitados ou rejeitados no presente.
Este resgate parcial da História, como uma “mestra” da vida, ainda persiste
como um dos meios mais eicazes para educar as novas gerações e a elas apre-
sentar o que o passado humano tem a oferecer de didático. Gosto muito de citar
a introdução da obra do historiador Leandro Karnal (2004), História na sala de
aula: conceitos, práticas e propostas para pensarmos sobre os sentidos da pala-
vra História.
Para o historiador, podemos entender o exercício proissional da História
de muitas formas. Karnal também faz opção pelo diálogo entre o passado e o
presente, porque não podemos reconstruir um passado exatamente como era,
nem tão pouco podemos nos remeter ao passado com “os olhos do presente”,
ou melhor, com “pré-conceito”. Uso o termo desta maneira, porque deinimos

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


17

o “pré” como sendo algo que antecipa o que está por vir, assim olhamos o pas-
sado com a concepção que temos do presente.
O passado existe e isto é inegável. Porém, quem lança o olhar sobre ele, faz
o recorte, escolhe, dimensiona e narra este passado é um sujeito do tempo pre-
sente. Para ilustrar tal airmação, Karnal (2004, p. 8) nos conta uma icção:
Imaginemos uma menina de 15 anos que esteja no seu baile de de-
butantes (será que ainda existem no século XXI?). Vestida de branco,
emocionada, ela vive um momento muito especial. Música, amigas, um
possível namorado, comida e muitos fatos para guardar e comentar.
A festa é densamente fotografada e ilmada. Passados dez anos, nossa
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

protagonista iccional chegou aos 25. Ela olha os ilmes e as fotos e pode
vir a considerar tudo de extremo mau gosto. Abrindo o álbum em meio
a suspiros, poderia dizer: “Por que não iz uma viagem com esse di-
nheiro?”. Passado mais meio século do baile, eis nossa personagem aos
65 anos. Já de cabelos brancos, ela abre o álbum amarelado e comenta
com seus netos: ”Olhem como eu era bonita! Que noite maravilhosa
foi aquela”.

Na ilustração, podemos veriicar que houve um fato: o baile de debutantes. Por


outro lado, o olhar que se lança sobre o fato muda conforme a concepção de
mundo e do tempo em que o sujeito está inserido.
Assim, podemos veriicar que a palavra História pode ser entendida sob três
sentidos, como airma Glénisson (1961):
■ Realidade histórica: conjunto dos fenômenos pelos quais se manifestou,
manifesta ou manifestará a vida da humanidade; a realidade objetiva do
movimento do mundo e das coisas.
■ Conhecimento histórico: a observação subjetiva da realidade pelo
historiador.
■ Obra histórica: o registro da observação da realidade feita pelo historia-
dor em um relato escrito.

Se pudéssemos, desta maneira, estabelecer um comparativo entre a icção e os


sentidos da palavra História, teríamos a realidade histórica como sendo o baile
de debutantes; o conhecimento histórico sendo o olhar subjetivo da protago-
nista da história e as lentes da ilmadora e da máquina fotográica como sendo
a obra histórica.

Origem e Sentido da Palavra História


18 UNIDADE I

A representação do passado e do que consideramos importante repre-


sentar é um processo constante de mudança. Se a memória muda so-
bre fatos concretos e protagonizados por nós, também muda para fatos
mais amplos. A História está envolvida em um fazer orgânico: é viva
e mutável. Um livro sobre uma guerra escrito há cem anos continua
válido como documento, mas é muito provável que a visão de quem o
escreveu esteja superada. Por superação entendemos o que não é mais
compartilhado pela maioria (KARNAL, 2004, p. 8).

Para Karnal (2004), o “fazer histórico” está submetido a duas transformações


constantes: do objeto em si e da ação pedagógica. Isto porque as novas descober-
tas arqueológicas, os debates metodológicos e as novas documentações mudam

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
constantemente; o fazer histórico é mutável no tempo, sendo assim, mudam-se
também seus agentes. Além disso, a ação pedagógica não pode icar presa ao pas-
sado, pelo contrário, precisa acompanhar tais mudanças sociais e de mentalidade.

Exercitando a História, remetemo-nos ao passado para entender o presente,


não é mesmo? Parece que esta é a deinição mais aceita pelos historiadores.
Então, de onde e de quando vem essa origem?

Os gregos (atenienses em particular) foram os primeiros a utilizar o termo histor


para representar quem aprende pelo olhar e, mais tarde, a palavra se estendeu ao
testemunho, ou seja, quem testemunhou acontecimentos ou a realidade.
Aquele que é por muitos considerado o Pai da História - Heródoto de
Halicarnasso (484 - 425) - foi uma espécie de repórter que viajou pelo mundo
conhecido, realizou pesquisas acerca das guerras entre gregos e persas que acon-
teciam em seu tempo e até procurou por causas que explicassem a vitória helênica
perante um exército muito mais armado e numeroso. Os persas contavam com
um exército predominantemente mercenário, mas os gregos (atenienses, prin-
cipalmente) combatiam em causa própria e eram todos patriotas, movidos pelo
fervor de defender a sua terra dos invasores. Combater com o coração lhes deu a
grande vantagem, e além de seus generais serem grandes estrategistas, os persas

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


19

tinham um excesso de coniança em seus


armamentos e poder de sua esquadra
(BOURDÉ; MARTIN, 1990).
Com o passar do tempo, o termo
História passou a signiicar pesquisa e
os resultados dessa pesquisa eram reu-
nidos em uma obra histórica.
Segundo Glénisson (1961, p. 13), esta
maneira de encarar os estudos históri-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Figura 1 - Heródoto
Fonte: Edukavita (2015, on-line) 1.
cos parece ter-se consagrado na época do
historiador Políbio, no século II a.C. “com a
reserva de que, como o saber histórico daqueles tempos não conhecia o rigor
atualmente exigido, associando-se ainda a fábulas e as lendas” a precisão dos
fatos cedia lugar a um termo empregado para deinir a disciplina, qual seja o
de “narrativa”.
O mesmo Glénisson (1961, p. 13-14) nos adverte que “hoje, ao pronunciar-
mos a palavra História”, temos de diferenciá-la entre “três sentidos possíveis: o
de realidade histórica (...), de conhecimento histórico e (...) de obra histórica”,
assim como ilustramos a icção da personagem em seu dia do baile de debutan-
tes (KARNAL, 2004).
Isto signiica que existe um conjunto de fenômenos a ser estudado na vida
passada da humanidade, a história representando a observação deste movi-
mento pelo historiador que, em seguida, registra tais observações em seu relato
de cunho cientíico numa obra histórica.
Por este ângulo, podemos deinir a palavra História como sendo:
■ A ciência que estuda as mudanças e as permanências.
■ O processo de transformação em que todos os homens são agentes.
■ A narração metódica dos fatos mais relevantes ocorridos na vida dos
povos, em particular, e na vida da humanidade, em geral.
■ O conjunto de conhecimentos (cultura) adquiridos por intermédio da
tradição e/ou por meio dos documentos, relativos à evolução, ao pas-
sado da humanidade.

Origem e Sentido da Palavra História


20 UNIDADE I

A História atualmente é considerada uma ciência e tem seu devido valor reco-
nhecido nos meios acadêmicos, escolares entre outros. Essa estuda as mudanças
e as permanências dos fatos e acontecimentos por meio de um método próprio,
buscando compreender os caminhos traçados por um povo especíico ou pela
humanidade em geral. Além do mais, a História busca a cultura das sociedades
para entendê-las.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A HISTÓRIA ENQUANTO CIÊNCIA

Na relação entre a visão geral e a especíica está o cerne dos conhecimentos


históricos, esta relação, segundo Lakatos (1990), vai da conexão ascendente
do particular para o geral, e é o produto visado por aquele que segundo Marc
Bloch (1976) se dedica ao “ofício” de historiar e sempre começa pelo “ídolo” das
origens, partindo do passado para o presente e, depois, em relação inversa, do
presente para o passado.

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


21

Finalmente, temos de lembrar alguns comentários que dão o valor aos conhe-
cimentos históricos: “o proveito que se poderá tirar do conhecimento certo do
passado, para prejulgar acontecimentos análogos ou idênticos, a brotar futura-
mente no fundo comum da natureza humana” ou “a história é o estudo da ação
humana ao longo do tempo, concomitantemente ao estudo dos processos e dos
eventos ocorridos no passado” (GLÉNISSON, 1961, p. 17).
A aula de História “nasce da própria História”, pois a “análise da dimensão
temporal das relexões sociais” é o grande objetivo da disciplina. Isto equivale a
considerar a história uma “construção coletiva”. É para essa direção que Nemi e
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Martins (1996, p. 25) apontam quando fazem um comentário didático: “as aulas
de história para crianças das séries iniciais do Ensino Fundamental têm por base
essa concepção de vida”, qual seja a “busca” de uma transformação “constante e
possível”. Esse aprimoramento do saber, oferecido pela história como um ins-
trumento de cidadania, só pode ser obtido se confrontarmos as experiências do
passado com as do presente, sempre visando um futuro melhor e de maior qua-
lidade de vida para todos.
É preciso que a escola deixe de ser aquilo que os crítico-reprodutivistas como
Bourdieu (1930-2002) assinalam, e caminhe, porque os novos tempos exigem
um melhor uso para os conhecimentos previamente acumulados. Por meio do
uso da noção de violência simbólica, Bordieu tenta desvendar o mecanismo que
faz com que os indivíduos vejam como “naturais” as representações ou as ideias
sociais dominantes. A violência simbólica é desenvolvida pelas instituições e
pelos agentes que as animam, sobre a qual se apoia o exercício da autoridade.
Bourdieu (1997), considera que a transmissão pela escola da cultura escolar (con-
teúdos, programas, métodos de trabalho e de avaliação, relações pedagógicas e
práticas linguísticas), própria à classe dominante, revela uma violência simbó-
lica exercida sobre os alunos de classes populares.
Bourdieu (1997) partia do conceito de que a dominação recobria formas
variadas de relações de poder, sendo a mais insidiosa a “violência simbólica”.
No livro “Les héritiers” (Os herdeiros, 1964), ele revela que o sucesso escolar é
condicionado à origem social dos alunos e, assim, torna-se o primeiro a reve-
lar os mecanismos cognitivos ligados às condições sociais. O termo violência

A História Enquanto Ciência


22 UNIDADE I

simbólica aparece como eicaz para explicar a adesão dos dominados: domina-
ção imposta pela aceitação das regras, das sanções, à incapacidade de conhecer
as regras de direito ou morais, às práticas linguísticas e outras.
Pierre Bourdieu (1997) elabora, assim, um sistema teórico que não cessará
de desenvolver: as condições de participação social baseiam-se na herança social.
O acúmulo de bens simbólicos e outros estão inscritos nas estruturas do pen-
samento (mas também no corpo), e são constitutivos do habitus por meio do
qual os indivíduos elaboram suas trajetórias e asseguram a reprodução social.
Esta não pode se realizar sem a ação sutil dos agentes e das instituições, preser-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
vando as funções sociais pela violência simbólica exercida sobre os indivíduos
e com a adesão deles.
A crítica de Bourdieu (1997) permanece atual como um alerta, ainda que outras
tendências e explicações sobre o fenômeno escolar a ela se acrescentem. Sua posição
contrária ao neoliberalismo e ao poder da mídia é, ainda hoje, muito comentada.
Construir o conhecimento junto com os nossos alunos parece ser uma urgên-
cia de nossos tempos. Isso inclui saber o que vem do cotidiano para elevá-lo ao
nível da ciência. Tal postura se faz necessária por parte do docente, seja qual for a
corrente por ele adotada, ressalvado que a História exige uma metodologia dife-
renciada daquela que foi característica da escola “positivista” no século XIX. Para
que possamos compreender melhor a escola “Positivista” passamos a analisá-la.
Remetemo-nos ao século XIX, quando a Europa presenciou amplo desenvolvi-
mento tecnológico e industrial, permitindo sua evolução econômica e a airmação
como o continente mais poderoso do mundo até a Primeira Guerra Mundial. Ao
mesmo tempo em que crescia internamente, o continente se expandia para fora
de seus domínios, conquistando terras, pessoas e novas riquezas na África e Ásia,
numa reedição do colonialismo do Antigo Regime. No entanto, não bastava con-
quistar tais territórios e impor uma dominação à força em suas populações: era
preciso justiicar a razão daquele domínio e gerar um argumento incontestável.
Para tal im, os pensadores e intelectuais europeus utilizaram-se do conceito de
ciência, entendida como conhecimento superior e acessível a poucas pessoas.
Nessa perspectiva, os europeus, donos da ciência e do desenvolvimento, se
dirigiam àquelas novas terras para “salvar” suas populações do estado de barbá-
rie e abandono em que estavam. Justiicava-se assim o Imperialismo por meio de

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


23

argumentos cientíicos, baseados na superioridade técnica e racial do europeu


branco sobre o negro africano e o asiático. Cientiicamente falando, o continente
europeu tinha o direito de dominar os novos colonos porque era uma civilização
mais avançada, dado o desenvolvimento que mostrava e o poder de seu conheci-
mento. Essa forma de se compreender o mundo, isto é, baseada no cientiicismo
tornou-se em pouco tempo a tônica de todo o pensamento do Velho Continente,
espalhando-se para diversos campos do saber. Renasceu a importância da Física
e da Química como disciplinas exatas, por exemplo. Mas o caso mais destacado
desse processo de construção de conhecimento é a transformação que ocorre
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

nas chamadas disciplinas humanistas, como a História. Elas também incorpora-


ram a tendência cientiicista, auxiliando a explicar o domínio europeu nas novas
colônias e impondo novos métodos de se estudar as relações sociais e o anda-
mento da História dos povos (BOURDÉ; MARTIN, 1990).
Duas correntes dominaram o pensamento europeu a esse respeito. Tratavam-se
do Racionalismo, surgido no inal do século XVIII com a Revolução Francesa, e o
Conservadorismo, presente no pensamento do continente desde o inal da Idade
Média e durante a Idade Moderna. Contudo, Robert Alexander Nisbet, Sociólogo
Americano e seguidor de Emile Durkheim (BOURDÉ; MARTIN, 1990), não
aprovava a visão individualista presente na fase pós-Revolução Francesa, a qual
pregava a autossuiciência e a individualidade de cada ser humano e que servia
de base para a cientiização do conhecimento e do estudo social. Esta negava,
pois, a própria existência da sociedade como organização e como meio de inlu-
ência de comportamentos humanos. O homem seria um ser de livre-arbítrio
sobre seus atos, sem a necessidade de estabelecer relações com seus semelhan-
tes. Ele se bastaria por si mesmo. Com isso, surgiram correntes de pensamento
relacionadas a essa forma de pensar e que se opunham a seus princípios, como
o próprio Positivismo.
O Positivismo pregava a cientiização do pensamento e do estudo humano,
visando a obtenção de resultados claros, objetivos e completamente corretos. Os
seguidores desse movimento acreditavam num ideal de neutralidade, isto é, na
separação entre o pesquisador/autor e sua obra: esta, em vez de mostrar as opi-
niões e julgamentos de seu criador, retrataria de forma neutra e clara uma dada
realidade a partir de seus fatos, mas sem os analisar. Os positivistas creem que

A História Enquanto Ciência


24 UNIDADE I

o conhecimento se explica por si mesmo, necessitando apenas seu estudioso


recuperá-lo e colocá-lo à mostra. Não foram poucos os que seguiram a corrente
positivista: Auguste Comte, na Filosoia; Émile Durkheim, na Sociologia; Fustel
de Coulanges, na História, entre outros, contribuíram para fazer do Positivismo
e da cientiização do saber um posicionamento poderoso no século XIX.
Pode-se inclusive dizer que o Positivismo reduz o papel do homem enquanto
ser pensante, crítico, para um mero coletor de informações e fatos presentes nos
documentos, capazes de fazer-se entender por sua conta. “Os fatos históricos
falam por si mesmos”, dizia Coulanges, historiador francês (BOURDÉ; MARTIN,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
1984, p. 99). Assim, para os positivistas que estudaram a História, essa assume
o caráter de ciência pura: é formada pelos fatos cronológicos e o que realmente
signiicam em si. São objetivos à medida que possuem uma verdade única em
sua formação (que é o seu sentido e sua única possibilidade de compreensão)
e não requerem a ação do historiador para serem entendidos: como já dito, o
papel deste é coletá-los e ajeitá-los, constatando pela análise minuciosa e liberta
de julgamentos pessoais sua validade ou não. O saber histórico, dessa forma,
provém do que os fatos contêm, e assume um valor tal qual uma lei da Física ou
da Química, ciência exatas.
Tão objetiva é a História para os positivistas que um de seus maiores ensi-
namentos é a busca incessante de fatos históricos, além de sua comprovação
empírica. Daí a necessidade, como pregavam, de se utilizar na pesquisa e aná-
lise o máximo de documentos possíveis para se obter a totalidade sobre os fatos
e não deixar nenhuma margem de dúvida no que se refere à sua compreensão. A
busca desses fatos deve ser feita por meio da neutralidade, pois qualquer juízo de
valor na pesquisa e análise altera o sentido e a verdade própria dos fatos, modii-
cando a própria História. Essa se tornaria uma ciência falha e totalmente fora de
seu caráter cientíico, e, portanto destituída de valor e validade. Coulanges che-
gou a airmar que a “História não é arte, mas uma ciência pura (...) a busca dos
fatos é feita pela observação minuciosa dos textos, da mesma maneira que o quí-
mico encontra os seus em experiências minuciosamente conduzidas” (BOURDÉ;
MARTIN, 1984, p. 100).
A objetividade, a minuciosidade, o detalhe e a dedicação impessoal são, por-
tanto, as grandes lições da escola positivista para o estudo da História no século

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


25

XIX e no início do século XX. Os historiadores que nessa época tentaram pro-
var outras formas de se estudar a disciplina foram desconsiderados e postos à
margem. Numa sociedade europeia que buscava seu próprio desenvolvimento e
avançava rumo a grandes descobertas na ciência e na tecnologia, a cientiização
que marcou a época também se espalhou para o campo dos estudos humanos,
reduzindo o papel do proissional desse campo para um mero coletor de infor-
mações. A implicação de opiniões externas aos sentidos dos fatos históricos
alterava a História, na opinião positivista, e eliminava assim sua legitimidade
como saber de importância social. Para positivistas como Fustel de Coulanges,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

a História é uma ciência pura (...) o historiador não deve ter outra am-
bição que a de ver bem os fatos e compreendê-los com exatidão. Não
é em sua imaginação ou lógica que ele os procura, mas sim na obser-
vação minuciosa dos textos, da mesma maneira que o químico encon-
tra os seus em experiências minuciosamente conduzidas (BOURDÉ;
MARTIN, 1984, p. 102).
A História deveria, sob essa perspectiva, ser tratada como a química e a matemá-
tica, por exemplo: sua compreensão estaria na perfeita observação dos fatos por
parte do historiador, e não em sua análise, visto que a opinião humana mudaria
o verdadeiro sentido do conhecimento histórico. Os fatos falam por si mesmos
e, além do mais, possuem uma verdade implícita que aparece quando postos
à tona. O trabalho e o ofício do pesquisador seria tão somente resgatá-los do
esquecimento e possibilitar sua divulgação, mas nunca interpretá-los ou propor
um entendimento para os mesmos: este seria conhecimento falho e mentiroso,
por se basear nos sentidos e na avaliação de um ser humano passível de erros e
que não possui a exatidão da verdade histórica.
Essa forma de se estudar a História nacional predominou até o início dos
anos 1930, quando a emergente Escola dos Annales francesa, que emergia na
Europa desde a década anterior, começou a inluenciar os autores e pensadores,
forçando uma renovação no pensamento histórico e social da nossa realidade.
Tratava-se de um novo olhar dado ao Humanismo, com a retomada do papel do
historiador na formação do saber histórico: ele reassumiria sua atuação na esco-
lha do que pesquisar, como o fazer e a linha que seu trabalho seguiria.
A partir da década de 60, com a Escola dos Annales, a História passou a dia-
logar também com a Literatura, revendo a forma com esta era escrita a partir da

A História Enquanto Ciência


26 UNIDADE I

análise do discurso. Depois disto, a História recebeu diversas contribuições do


pós-estruturalismo e do pós-modernismo através, principalmente, dos estudos
de Michel Foucaut e de Michel de Certeau, sendo importantes, ainda, as contri-
buições de E. P. hompson e do marxista Eric Hobsbawn.
A Historiograia Marxista é baseada nas ideias defendidas por Karl Marx.
Este alemão herdou a ideia da dialética de Hegel e completou seu pensamento
dando ao homem o papel de sujeito na história. Sua contribuição permitiu uma
nova compreensão do passado, valorizando as massas que ganharam destaque
nos feitos históricos. Sua abordagem mais econômica da humanidade encara a

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vida social a partir da luta de classes e considera as mudanças em função das
alterações no sistema produtivo das sociedades.
Atualmente, além de historiar na curta duração, com aquela orientação fac-
tual criticada por Fernand Braudel, não mais procuramos pelos heróis da pátria
nem ressaltamos apenas os acontecimentos políticos. Com tal ponto de partida,
procuramos evitar a parcialidade intencional que levou a esconder fatos que
manchavam o patriotismo, por exemplo. Foi a orientação “positivista” que levou
Rui Barbosa (1849-1923) a cometer um ato prejudicial contra o nosso patrimô-
nio histórico, ordenando a destruição de documentos (muitos deles) existentes
sobre a escravidão em nosso país.
Uma consideração que se pode fazer sobre atos como aquele, ordenado por
um dos luminares de nossa pátria, mas que representa um ato de “esconder a
cabeça” como o avestruz, para não ser visto, é que uma simples incineração não
pode apagar os fatos daquela à qual se chamava a “mancha negra” de nosso pas-
sado e nos fazia – e ainda nos faz – envergonhados.
Contudo, tal vergonha não promoveu a integração do negro liberto na socie-
dade e levou à formação de favelas, atualmente rotulada por alguns como as
grandes vilãs da violência urbana.

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


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“Chamamos ideologia àquele saber que falseia a realidade apresentando


um conhecimento parcial sobre ela” (Nemi; Martins, 1996, p. 34). Segundo
Marilena Chauí (2000, p. 12), “a ideologia é um saber cheio de lacunas ou
de silêncios que nunca poderão ser preenchidos” isto porque, “se o forem,
a ideologia se desfaz por dentro; ela tira sua coerência justamente do fato
de só pensar e dizer as coisas pela metade e nunca até o im” (SOUZA, 1989,
p. 8). A necessidade de vencer a grande distância que vai da consciência
ingênua, que aceita tudo que lhe é apresentado, à consciência crítica que
procura sempre avaliar e pensar por si mesma introduz a grande exigência
– e nova responsabilidade – do trabalho docente.
Fonte: a autora.

A História Enquanto Ciência


28 UNIDADE I

A HISTÓRIA ENQUANTO DISCIPLINA ESCOLAR

Ao historiar sobre a
História, veriicaremos que
seu desempenho como dis-
ciplina teve início na França,
em um cenário presidido
pelo “iluminismo”, onde
razão e ciência se uniam

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para promover a libertação
do homem e uma relativa
igualdade entre eles. Esse
era o ideal da educação bur-
guesa oferecida na França
de Napoleão, onde o ensino
público, gratuito e obriga-
tório foi a “novidade” do
século XIX.
Segundo a historiadora
Elza Nadai (1986, p. 106), “o
século XIX acrescentou, paralelamente aos grandes movimentos que ocorreram
visando construir os Estados Nacionais” a utilidade da História como uma dis-
ciplina que atendia à necessidade de se retornar ao passado “com o objetivo de
identiicar a ‘base comum’ formadora da nacionalidade”. Foi onde se começou a
falar em conceitos que ainda hoje existem em nossas histórias ensinadas: nação,
pátria, nacionalidade e cidadania.
Paralelamente a este requisito, tivemos a escola metódica ou positivista, sendo
posta a serviço da República Francesa pós-napoleônica quando ocorria aquela
que Bourdé e Martin (1984, p. 110) chamam de “exaltação permanente” da mãe
pátria: uma propaganda “nacionalista desenfreada” trazia em primeiro lugar o
que se esperava do aluno-soldado, inlamado por exemplos e cantos marciais:

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


29

Para ser um homem é preciso saber escrever

E em pequeno, aprender a trabalhar.

Pela Pátria, uma criança deve instruir-se

E na escola, aprender a trabalhar.

Soou a hora, marchemos a passo,

Jovens crianças sejamos soldados

(BOURDÉ; MARTIN 1984, p. 110).


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Esse canto, citado ao nível da escola maternal e do atual Ensino Fundamental,


entrava em um clima onde “os manuais de história” selecionavam “os feitos de
armas que ilustravam a defesa do território contra o invasor”. Foi ainda nessa
época que Joana d’Arc tornou-se “heroína nacional, o símbolo da resistência”,
uma das iguras mais impressionantes que apareceram na Terra; nenhum outro
povo tinha em sua história “uma Joana d’Arc conforme trazia o Manual Gautier-
Deschamps” (BOURDÉ; MARTIN, 1984, p. 111).
No Brasil, segundo Schmidt e Cainelli (2004), a trajetória da História como
disciplina teve início no Segundo Reinado e a partir do colégio Dom Pedro II,
sempre sustentada pelas diferentes concepções e “escolas” históricas, como que-
rem Bourdé e Martin (1984).
A República “Velha” brasileira, sob a égide de republicanos “históricos” como
Rui Barbosa, Benjamin Constant e outros, pretendia um Estado presidido pela
“ordem e progresso”, como até hoje lemos em nossa bandeira. E este não é outro
senão um dístico positivista, que em sua origem com Augusto Comte (1798-
1857) se acrescentava ainda da palavra “amor”.
A Europa era, principalmente no foco francês, a principal referência de nos-
sos historiadores como Capistrano de Abreu (1853-1927) na época positivista.
É de Capistrano a tese ensinada em todas nossas escolas até pelo menos a
década de 50 do século passado, que o Brasil foi descoberto por acaso. Segundo
ele, teriam sido as calmarias as principais responsáveis pelo afastamento da esqua-
dra de Cabral das costas africanas para o Atlântico Sul, na latitude da atual Bahia.
Mesmo após a comprovação da experiência náutica portuguesa e seu evidente
conhecimento de terras, que pensavam ser uma grande ilha, décadas anteriores

A História Enquanto Disciplina Escolar


30 UNIDADE I

a Cabral, muitos ainda acreditavam na teoria do acaso.


Historiadores como Tito Lívio Ferreira e outros muitos discutiram até que
a intencionalidade no descobrimento português do Brasil deixasse de ser vista
como obra do acaso, e assumisse o caráter de empresa de navegação planejada
por uma nação mercantilista, visto o mercantilismo como a política econômica
do capitalismo em sua fase comercial. Capistrano, como todo historiador posi-
tivista, tinha suas preferências e elegia seus ídolos ou desafetos, como podemos
comprovar em notas sobre sua obra compiladas por José Honório Rodrigues
(1979) em seu “História da História do Brasil (tomo I, fase colonial)”:

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“Capistrano de Abreu, que não foi muito simpático à oratória do Padre Vieira,
escreveu a João Lúcio de Azevedo (historiador português) em 14 de abril de 1918:
entre os colonos e os jesuítas minha posição é bem deinida: sou pelos jesuítas”
(RODRIGUES, 1979, p. 478). Essa parcialidade, que pode ser vista como a par-
cialidade intencional dos positivistas para colocar a História a serviço de uma
exaltação de valores cívicos e nacionalistas, começou a ceder a outra “escola”,
desta vez a marxista, quando o historiador Caio Prado Júnior fez escola entre nós.
Por meio das leituras realizadas, percebemos que Capistrano de Abreu foi
um dos primeiros grandes historiadores do Brasil, o qual produziu ainda nos
campos da etnograia e da linguística. A sua obra é caracterizada por uma rigo-
rosa investigação das fontes e por uma visão crítica dos fatos históricos.
Hoje, ao lado desta explicação e de outras, entre as quais avultam as expli-
cações tiradas à Nova História, herdeira da escola dos Annales de Bloch (1976)
e Braudel (o historiador da longa duração), temos historiadores que pensam em
termos de descontinuidade e relação, uma outra história que procura analisar
mitos, textos e rituais, outros que como Henri Marrou, Paul Veyne ou Michel
de Certeau inserem pontos de dúvida sobre a história.

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


31

Para Braudel (1965), a duração pode ser distinguida em três ordens que não
são diferenciadas de maneira mecânica por medidas cronológicas. São três
ritmos diferentes:
Acontecimento (duração breve) – trata-se de um momento pontual, preci-
so: greve, nascimento, acordo etc.
Estrutura (duração longa) – são “marcos cronológicos que escapam à per-
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cepção dos contemporâneos” (BITTENCOURT, 2004, p. 207): cristianismo,


escravidão etc.
Conjuntura (duração média) – resultado de lutuações que são mais ou
menos regulares em uma estrutura: Revolução Industrial, Guerra Fria etc.

Fonte: Paixão (2016).

Michel Foucault mostrou, sobretudo, a intenção de “exibir os princípios” da trans-


formação em curso na história. A história estrutural e serial de Braudel (1965),
que se esforçava por tirar consequências teóricas dos eventos, deu lugar à conhe-
cida “Arqueologia do Saber”, de 1969. Aquilo que Bourdé e Martin, comentando
Foucault, chamam de mutacionismo “que privilegia as rupturas bruscas e a emer-
gência de estruturas novas” passou a ser a tônica (1984, p. 189). Bourdé e Martin
(1984, p. 197) mencionam um corte que conigura uma escrita “etnológica que
consiste em distinguir, por detrás da irredutível estranheza, a presença de certo
número de invariantes que se encontram ligados a uma única e mesma natureza
humana” ou, ainda, a uma lógica universal.
Paul Veyne pode ser visto como um hipercrítico que procura banir da História
as ilosoias totalizantes como o marxismo, ainda que sua crítica não seja a de
um cético do valor histórico: “a história continua a ser capaz de elaborar um
conhecimento autêntico” apesar de parcial, do homem (BOURDÉ; MARTIN,
1984, p. 201).
No nosso país, Brasil, continuamos as relexões ao impacto dessas escolas,
que trazem o dinamismo à nossa disciplina e são muito importantes na medida

A História Enquanto Disciplina Escolar


32 UNIDADE I

em que norteiam os rumos da escola em nível fundamental ou médio, seja qual


for o objeto de nossa discussão e, ainda, os rumos dos estudos universitários
ligados à disciplina histórica.
Um desses momentos aconteceu durante o período de ditadura, por volta de
1964 e 1985, quando não havia preocupação em resgatar o homem como sujeito
de sua história, mas sim reservar para ele um caráter de mero expectador, den-
tro da perspectiva de que o indivíduo serve o seu Estado. Nesse sentido, foram
introduzidas no currículo disciplinas que privilegiavam o civismo em detrimento
da crítica ao conhecimento advindo do passado, como foi o caso da Educação

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Moral e Cívica.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (Lei Federal n. 9.394) procu-
rou readequar os conteúdos das ciências na direção da democracia e verdadeira
cidadania. Sendo assim, há alguns anos tivemos a composição dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs), programados para servirem de referência em
conteúdos e metodologias de ensino para a estruturação escolar brasileira. Na
área de história, os Parâmetros Curriculares Nacionais tiveram como proposta
fundamental a modiicação da estrutura dos conteúdos até então apresentados”.
Mais que isso, “a idéia básica era a transformação dos conteúdos organizados de
forma linear em eixos temáticos (SHMIDT; CANELLI, 2004, p. 14).
Atentando-se a este assunto, aguarde, pois ele será retomado na próxima
unidade.

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


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A HISTÓRIA ENSINADA NA ATUALIDADE

A colocação da História como disciplina e não apenas como matéria escolar é um


primeiro passo indicado por Circe Bittencourt (2004), onde ocorre uma expla-
nação sobre conceitos. A História deve ir além daquela “transposição didática”
que caracterizou o nosso passado, e se situar em um processo dinâmico de pro-
dução, que obedece a uma inalidade e deinição de métodos que garantam a
sua eicácia como “disciplina”.

O que é uma disciplina escolar e quais são suas especiicidades? Qual tem
sido a participação dos professores na constituição da disciplina de História
nas salas de aula?

A História Ensinada na Atualidade


34 UNIDADE I

Segundo Bittencourt (2004, p. 35), “responder à pergunta ‘o que é uma disci-


plina escolar’ não é simples, e existe séria polêmica a respeito desse conceito”.
Para entendermos a disciplina escolar em seu sentido amplo, é preciso situá-la
em um processo dinâmico de produção. Isso é o mesmo que dizer que toda dis-
ciplina precisa ter estabelecida suas inalidades, explicitar os conteúdos a serem
ensinados e deinir os métodos que garantam tanto a apreensão de tais conteú-
dos como a avaliação de tal aprendizagem. Assim,
cada disciplina formula seus objetivos no intuito de contribuir para
uma formação intelectual e cultural que desenvolva o espírito crítico e

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capacidades diversas de comparação, dedução, criatividade, argumen-
tação, lógica e habilidades técnicas, entre outras (BITTENCOURT,
2004, p. 41).

Um constituinte fundamental da disciplina é seu conteúdo explícito que se arti-


cula com os outros componentes da disciplina escolar, que envolve os métodos
de ensino e de aprendizagem. A avaliação é o momento inal do ensino-apren-
dizagem, e por isso tem de estar relacionada a métodos e inalidades.
Temos airmado que a concepção de disciplina escolar está intimamen-
te associada à de pedagogia e à escola e, portanto, ao papel histórico
de cada um desses componentes. Ao concebermos a disciplina esco-
lar como produção coletiva das instituições de ensino, admitimos que
a pedagogia não pode ser entendida como uma atividade limitada a
produzir métodos para melhor ‘transpor’ conteúdos externos, simplii-
cando da maneira mais adequada possível os saberes eruditos ou aca-
dêmicos (BITTENCOURT, 2004, p. 49).

“Dar aula” é uma ação complexa, que demanda do professor o domínio de saberes
característicos e heterogêneos: o trabalho proissional que se deine como “saber
docente” traz a necessidade de liberar esses saberes do professor,
e submetê-los ao reconhecimento por parte dos grupos produtores de
saberes da comunidade cientíica, enquanto um saber original sobre o
qual detêm o controle é um empreendimento que lhe parece condição
básica para um novo proissionalismo (TARDIFF, 2002, p. 232).

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


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Quando pensamos em qual História devemos ensinar, poderemos reletir sobre


o que escreve a respeito dos objetivos da História no então “curso secundário”
(hoje Ensino Fundamental – nível 2) (COSTA, 1957 apud BITTENCOURT, 2004,
p. 93), em um exemplar de 1957, da Revista de História, mas que ainda perma-
nece atual quanto ao seu legado, ressalta:
“A História matéria tem uma inalidade a preencher (...) como a de for-
mar a personalidade integral do adolescente e, em segundo plano, fornecer-lhe
conhecimentos básicos”. A autora cita como matéria o que hoje tomamos como
disciplina, mas à parte dessa diferença avulta a necessidade de formar antes de
informar, no melhor sentido que lhe davam os gregos antigos quando pensa-
vam em uma educação liberal, voltada para a formação integral do ser humano.
Costa (1957 apud BITTENCOURT 2004, p. 94) prossegue, indagando-se
como seria possível à História preencher tal função, e aí encontramos um mote
para a resposta que buscamos em nossa pergunta título: “Inicialmente pelo seu
caráter informativo, amplia a visão intelectual, fornece conhecimentos novos.
Por outro lado, ela dá margem à expansão do aluno – oralmente e por escrito”.
A partir da informação básica e obtida por leitura em documento real, vir-
tual ou aula expositiva, a expressão do aluno será consequente e natural. Ainda

A História Ensinada na Atualidade


36 UNIDADE I

sobre isso, Costa (1957 apud BITTENCOURT, 2004, p. 94) esclarece: “A exposi-
ção oral contribui para dar segurança ao aluno, domínio e controle de si mesmo,
hábito de falar em público. Diminui inibições. Dessa forma, estamos contri-
buindo para a formação de sua personalidade”.
Nesse ponto, a historiadora passa da informação para a ênfase à formação,
porém, outras aplicações para o conhecimento histórico que podem nos respon-
der sobre qual a melhor História a ser ensinada são expostas:
a História ainda pode também desenvolver o raciocínio indutivo. Edu-
ca a imaginação. Formulando problemas, analisando os porquês, as

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razões, as condições que explicam um determinado fenômeno, pro-
blemas da sociedade. Enxergar soluções. Mas tudo isto sempre que a
História ensinada permaneça num plano explicativo e não se restrinja a
fastidiosa enumeração de fatos, dados, nomes, geralmente sem signii-
cado, e que são obrigatoriamente decorados pelos alunos (grifo nosso)
(COSTA, 1957 apud BITTENCOURT, 2004, p. 94).

Schmidt e Cainelli (2004) nos dão orientações sobre como efetivar uma aula de
História:
Abordagem magistral é um método tradicional que possibilita receber
muitas informações dadas pelo professor em pouco tempo. Porém, o aluno ica
em posição passiva e não se pode garantir que ele seja capaz de reproduzir os
conhecimentos fora da aula.
Abordagem dialogada parte de perguntas direcionadas aos alunos, mobi-
lizando o conhecimento apreendido em aulas anteriores. Os alunos precisam
estar motivados a participar para que surta o efeito desejado. Contudo, por apre-
sentar questões fechadas que não demandam uma relexão ou que não possam
ser colocadas em um conjunto de problemáticas, “traz o risco de dar ao aluno
uma concepção positivista da história, que signiica mais a restituição coletiva
de uma pseudoverdade histórica do que a reconstrução hipotética do passado”
(SCHMIDT; CAINELLI, 2004, p. 39).
Por im, a Abordagem construtivista favorece a autoaprendizagem expe-
rimental, colocando o aluno como agente de sua própria formação. Entre os
métodos cientíicos desta abordagem, conforme Bittencourt (2004), encontramos:
■ Método Indutivo – sua aproximação dos fenômenos se encaminha do
particular para o geral, ou seja, parte das constatações mais especíicas

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


37

para as mais abrangentes, numa conexão ascendente. Podemos partir da


biograia do indivíduo inserido em sua sociedade e tempo de vida para
o retrato de uma época histórica, por exemplo.
■ Método Dedutivo – parte das teorias e leis, num âmbito geral, para a
ocorrência de fenômenos particulares, numa conexão descendente. Ou
seja, podemos estudar a globalização e então compreender suas caracte-
rísticas e aplicações na sociedade brasileira.

Percebemos que o pensamento de Viotti da Costa é basicamente ilustrativo, para


que entendamos a História não mais como uma matéria meramente decorativa,
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mas sim como uma disciplina que nos permite a apropriação de um conheci-
mento cientíico que tem um método e atende a uma inalidade.

A História Ensinada na Atualidade


38 UNIDADE I

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta primeira unidade, procuramos nos aproximar do universo da História,


buscando pelas suas origens. Além disso, estudamos os sentidos dados a palavra
História e vimos o quanto esta ciência do tempo é necessária para o entendimento
da sociedade em seus diversos nuances, do passado ao presente ou vice-versa.
Analisamos a História enquanto uma ciência e nos aproximamos das cor-
rentes historiográicas como o Positivismo, o Marxismo e a Nova História.
Vimos que o Positivismo visa explicar a História por meio do estudo dos

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
fatos, datas e personagens históricos considerados importantes durante o período
estudado. Há uma neutralidade do historiador, cabendo apenas analisar os fatos
de modo objetivo. O Marxismo, também chamado de Materialismo Histórico,
procura explicar as mudanças históricas mediante as condições materiais, modos
de produção ou disputa entre classes sociais existentes em um determinado perí-
odo histórico. Enquanto a Nova História, inluenciada pela Escola dos Annales,
objetiva o estudo da História do cotidiano de um povo, do modo como vivem,
se organizam, produzem ou se relacionam política e socialmente: aqui cabe ao
historiador realizar uma análise dos fatos sob um olhar mais crítico.
Devemos considerar, além disso, que a disciplina História percorreu um bom
caminho para chegar ao entendimento do que concebemos hoje. De origem tra-
dicional, apoiada no positivismo, essa matéria passou a ser concebida como uma
disciplina essencial na formação do cidadão consciente e participativo, embora
entendamos que cidadania seja um direito não possível de ser formado, mas sim
uma visão de conscientização ao exercício pleno dessa cidadania.
Na unidade seguinte nos remeteremos às mudanças e permanências dos
métodos do Ensino de História, bem como a ação docente, objetivando a for-
mação global de nossos educandos.

A HISTÓRIA TEM HISTÓRIA


39

1. Inicialmente, procuramos nesta unidade reletir sobre a origem da palavra His-


tória e os sentidos dados a ela, segundo o historiador Glénisson. Assim, procure
explicar e dar exemplos para os três sentidos da palavra História.
2. Ainda nesta primeira unidade, discutimos o ensino de História e suas várias
perspectivas. Nesse sentido, estabeleça um contraponto entre a concepção
positivista e a Nova História, ressaltando aspectos como a utilização de do-
cumentos, o enfoque do estudo, a visão do herói e a temporalidade.
3. Leia o excerto retirado da obra de um grande historiador.
“A destruição do passado – ou melhor, dos mecanismos sociais que
vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas – é um
dos fenômenos mais característicos e lúgubres do inal do século XX.
Quase todos os jovens de hoje crescem numa espécie de presente
contínuo, sem qualquer relação orgânica com o passado público da
época em que vivem. Por isso os historiadores, cujo ofício é lembrar
o que os outros esquecem, tornam-se mais importantes que nunca
no im do segundo milênio” (HOBSBAWM, 1995, p. 13).

Partindo de tais considerações, expresse a opinião do historiador quanto às


inalidades do Ensino de História da atualidade, destacando ainda sua pró-
pria opinião.
4. Segundo Caio Boschi (2007, p. 12) “[...] a história serve para que o homem conhe-
ça a si mesmo – assim como suas ainidades e diferenças em relação a outros”.
Acerca da História enquanto ciência e disciplina, analise as airmações abai-
xo e assinale a alternativa correta:
a. Como a experiência humana é objeto de estudo da História, qualquer evidên-
cia da ação humana será suiciente para o trabalho historiográico, ou seja,
para a construção do conhecimento histórico.
b. A disciplina de História deve proporcionar ao aluno a compreensão do ser hu-
mano através das suas relações sociais ao longo do tempo, contudo, é funda-
mental que aspectos do cotidiano do aluno sejam inseridos nesses estudos.
c. Pela sua contribuição para a compreensão de questões sociais, a História se
destaca como a disciplina que gera maior interesse nos alunos.
d. A ciência História possibilita que evitemos os erros cometidos no passado,
pois estudando o passado de uma sociedade podemos desenvolver fórmulas
sociais aplicáveis à sociedade contemporânea.
e. A disciplina de História permite ao aluno tornar-se mais pacíico diante das
questões políticas, econômicas e sociais que assolam nosso país, pois através
de seu estudo o aluno tem condições de neutralizar seus impactos.
40

5. É comum escutarmos que a «História não serve para nada», desse modo, é im-
portante que os objetivos e limites da História enquanto Ciência e disciplina es-
tejam claros. Assim, analise as airmações a seguir e assinale V para as ver-
dadeiras e F para as falsas:
( ) Há uma expectativa de que a História possibilite um melhor direcionamento
social na atualidade, para que erros passados não se repitam no tempo presente.
Porém, esse não é o objetivo dessa ciência.
( ) Não se pode aplicar em uma sociedade da atualidade, ideias e ações desen-
volvidas em uma sociedade do passado, pois ideias e atitudes são determinadas
pelo contexto histórico de uma sociedade.
( ) A rapidez com que as informações têm sido difundidas na atualidade con-
tribui para a desvalorização da História. Assim, é fundamental que o professor
demonstre desde cedo que informação é diferente do Conhecimento Histórico,
pois este se conserva por anos.
( ) Sem História, perderíamos nossa identidade social, pois não seria possível
conservar o conhecimento acerca das ações de uma sociedade.
A sequência correta é:
a. V, V, V e V.
b. V, F, V e V.
c. V, V, F e V.
d. F, V, V e V.
e. V, V, V e F.
41

O século XIX foi o período em que a História se constituiu enquanto uma ciência. Em
um contexto de formação de Estados Nacionais, a História passou a servir enquanto
instrumento de airmação das identidades nacionais e da legitimação de poderes
políticos. Nesse sentido, a abordagem tradicional exaltou o feito de grandes “heróis”,
ou seja, esteve centrada na história de Estados e aqueles que teriam sido responsá-
veis por formá-los e/ou regê-los. O ensino de História foi sendo delineado seguin-
do as mesmas premissas, inclusive no Brasil. Contudo, essa prática foi questionada,
como podemos ver na crítica expressa no poema abaixo:

Perguntas de um Operário Letrado (Bertold Brecht)


Quem construiu Tebas, a das sete portas?
Nos livros vem o nome dos reis,
Mas foram os reis que transportaram as pedras?
Babilônia, tantas vezes destruída,
Quem outras tantas a reconstruiu? Em que casas
da Lima Dourada moravam seus obreiros?
No dia em que icou pronta a Muralha da China para onde
foram os seus pedreiros? A grande Roma
está cheia de arcos de triunfo. Quem os ergueu? Sobre quem
triunfaram os Césares? A tão cantada Bizâncio
só tinha palácios
para os seus habitantes? Até a legendária Atlântida
na noite em que o mar a engoliu
viu afogados gritar por seus escravos.

O jovem Alexandre conquistou as Índias


Sozinho?
César venceu os gauleses.
Nem sequer tinha um cozinheiro ao seu serviço?
Quando a sua armada se afundou Filipe de Espanha
chorou. E ninguém mais?
Frederico II ganhou a guerra dos sete anos
Quem mais a ganhou?
42

Em cada página uma vitória.


Quem cozinhava os festins?
Em cada década um grande homem.
Quem pagava as despesas?

Tantas histórias
Quantas perguntas”
Fonte: Escritas.org ([2017], on-line)2.
Nesse sentido, no Brasil, somente a partir da década de 1980 é que novas abordagens
em torno da História como ciência e enquanto disciplina escolar foram sendo traçadas,
na busca de formar cidadãos críticos.
Fonte: a autora.
MATERIAL COMPLEMENTAR

História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas


Leandro Karnal
Editora: Contexto do Brasil
Sinopse: a presente obra é, antes de tudo, uma
declaração de amor ao ofício de ensinar História. Catorze
profissionais reconhecidos da área unem suas experiências
e concepções em um livro que lança novas luzes sobre
o trabalho do professor, tanto do ensino fundamental
quanto do ensino médio. O livro é, também, um libelo
em defesa das aulas de História, que, em tempos de
informação instantânea e alta competitividade profissional,
corre o risco de perder espaço para disciplinas tidas
como mais práticas e úteis na preparação do estudante
para o mercado de trabalho. Não podemos abrir mão
de apresentar nossos jovens ao patrimônio cultural
da humanidade. E qual é o papel do professor senão
estabelecer uma articulação entre o patrimônio cultural
da humanidade e o universo cultural do aluno? Você também tem acesso a esta obra através da
biblioteca virtual Pearson, disponível em seu Ambiente Virtual de Aprendizagem.

Que é história?
Edward H. Carr.
Editora: Saraiva.
Sinopse: Que é história? Que é fato histórico? Existem
verdades históricas ‘objetivas’? Mestre no ofício,
Edward Hallet Carr responde a essas indagações com
sutileza e sabedoria. Segundo Carr, o historiador não
pode relatar um fato histórico exatamente como
se passou. Seleciona uma infinidade de eventos,
tomados das mais diversas fontes, aqueles que, sob
sua ótica, merecem ser historiados. Este livro reúne
uma série de conferências proferidas pelo Prof. E. H.
Carr na Universidade de Cambridge, em 1961, onde
ele desvenda o ofício de historiador que ele próprio
exerce com dignidade, engenho e arte.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

A Escrita da História: novas perspectivas


Peter Burke
Editora: UNESP
Sinopse: o livro A Escrita da História, de Peter Burke,
discute as mudanças ocorridas na historiografia a partir
do surgimento da corrente denominada Nova História.
Assim, temas diversos da história, entre eles, a história
das mulheres, o renascimento da narrativa, a história
oral etc., merecem atenção especial. Para definir a
Nova História, Burke retoma sua origem associando-a a
Escola de Annales e que, além de lutar por uma história
total, opõe-se totalmente ao paradigma tradicional da
historiografia.

Noções de Coisas
Darcy Ribeiro
Editora: FTD
Sinopse: nesta obra, o autor apresenta a cultura como
sendo tudo que é feito pelos homens ou resultado do
trabalho deles. Diferencia cultural material de imaterial
nos levando a refletir sobre tais diferenças. Vale a leitura
até para os “grandinhos”.
45
REFERÊNCIAS

BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cor-


tez, 2004.
______ O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2004. (Coleção Re-
pensando o ensino).
BLOCH, M. Introdução à História. São Paulo: Publicações Europa-América, 1976.
BOURDÉ, G; MARTIN, H. As escolas históricas. São Paulo: Publicações Europa
América, 1984.
BOURDIEU, P. Sobre a televisão. Rio de Janeiro: Zahar, 1997.
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Subcheia para Assuntos Jurídicos. Lei
nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação
nacional. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9394.htm>.
Acesso em: 3 abr. 2017.
BRAUDEL, F. A história e as Ciências Sociais: a longa duração. Revista de História, v.
XXX, n. 62, ano XVI, abr. / jun., 1965.
CHAUÍ, M. Convite à ilosoia. São Paulo: Editora Ática, 2000.
BOSCHI, Caio César. Por que estudar história? São Paulo: Ática, 2007.
GLÉNISSON, J. Iniciação aos Estudos Históricos. São Paulo: Difusão Européia do
Livro, 1961.
KARNAL, L. História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. 2. ed. São Pau-
lo: Contexto, 2004.
LAKATOS, E. M. Sociologia geral. 6. ed. São Paulo: Atlas, 1990.
NADAI, E. A escola pública contemporânea: os currículos oiciais de História e o en-
sino temático. Sociedade e Trabalho na História. Revista Brasileira de História. São
Paulo: v. 6, n. 11, set. / fev. 1986.
NEMI, A. L. L.; MARTINS, J. C. Didática de História: o tempo vivido: uma outra histó-
ria? São Paulo: FTD, 1996.
PAIXÃO, P. C. M. Metodologia do Ensino de História. São Paulo: Pearson, 2016.
RIBEIRO, D. Noções das coisas. São Paulo: FTD. 1995.
RODRIGUES, J. H. História da História do Brasil 1. A parte da historiograia colonial.
São Paulo, Editora Nacional, 1979.
SCHMIDITT, M. A.; CAINELLI, M. Ensinar História. São Paulo: Editora Scipione, 2004.
SOUZA, A. H. de. A ideologia. São Paulo: Ed. do Brasil, 1989.
TARDIFF, M. Sobre docentes e formação proissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
REFERÊNCIAS

REFERÊNCIAS ON-LINE
1
Disponível em: <https://edukavita.blogspot.com.br/2015/06/biograia-de-herodo-
to-historiador-grego.html>. Acesso em: 3 abr. 2017.
2
Disponível em: <http://www.escritas.org/pt/p/tema/perguntas%20de%20um%20
oper%C3%A1rio%20letrado>. Acesso em: 3 abr. 2017.
47
GABARITO

1) Os três sentidos da palavra História são:


Realidade histórica: conjunto dos fenômenos pelos quais se manifestou, mani-
festa ou se manifestará a vida da humanidade; a realidade objetiva do movimen-
to do mundo e das coisas.
Conhecimento histórico: a observação subjetiva da realidade pelo historiador.
Obra histórica: o registro da observação da realidade feita pelo historiador em
um relato escrito.
Quanto aos exemplos, eles são subjetivos, mas você, caro aluno, precisa ser coe-
rente com os estudos realizados.
2) Na concepção positivista, há uma preocupação com o estudo dos fatos,
neutralidade do historiador, ênfase na história política, na história dos heróis e
na história do passado. O tempo é cristalizado e busca formar o cidadão para a
pátria, construindo identidades nacionais. Já na Nova História, a história é de
todos os homens, busca analisar o processo histórico e considera as várias his-
tórias: história por conceitos e história temática. Tem forte contribuição para a
construção da cidadania, e a história é interpretada sob os diferentes tempos e
suas nuances.
3) A resposta é interpretativa, porém, é preciso considerar que hoje as inalidades
do ensino de História tem sido objeto de preocupação de vários historiadores,
principalmente no que diz respeito aos conteúdos, objetivos e métodos das au-
las de História, e isso foi discutido nesta unidade.
4) Alternativa “B”.
5) Alternativa “A”.
Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão

II
TENDÊNCIAS E

UNIDADE
PERSPECTIVAS DO ENSINO
DE HISTÓRIA

Objetivos de Aprendizagem
■ Compreender que ensinar História é criar a possibilidade de
investigação, sem separar o ensino da aprendizagem e pesquisa.
■ Reconhecer que o professor de História é um sujeito histórico,
inserido em um grupo social no qual interage e, por isso mesmo, tem
um papel fundamental na construção do conhecimento histórico por
parte dos alunos.
■ Destacar os conhecimentos prévios dos alunos como ponto de
partida e das metas de aprendizagem.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■ Mudanças e permanências nos métodos da História escolar
■ Concepções de conteúdos escolares de aprendizagem
■ A formação de conceitos
■ A formação do professor e o cotidiano de sala de aula
51

INTRODUÇÃO

Toda ciência tem seus métodos de abordagem e procedimento, e são eles que
mostram a nossa orientação ideológica e pedagógica. Um historiador que seja
herdeiro da escola dos Annales francesa, como vimos na primeira unidade (e que
consequentemente se inclua entre os neo-historiadores), obedece a uma linha
mestra que foi demarcada pelos “fundadores” da corrente, Marc Bloch e Lucien
Fèbvre, na década de 40 do século passado.
Estudamos que tanto Bloch (historiador) como Fèbvre (geógrafo) se insur-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

giram contra o rigorismo da escola metódica (positivista) e ampliaram o sentido


de documento histórico. Além disso, esses homens trouxeram para o estudo de
nossa disciplina as outras ciências coirmãs, tais como a Geograia, a Sociologia,
a Antropologia e a Arqueologia, dando o devido reconhecimento que cada uma
merece.
A segunda geração da Nova História – liderada por Fernand Braudel – além
de incluir a Geograia e o espaço como básico, ampliou o conceito de tempo da
curta duração (fatos e datas) para a média (conjuntura), e mais notadamente para
a longa duração dos séculos, em que aparecem mais nítidas as estruturas histó-
ricas. Assim, o feudalismo tinha uma estrutura diferente do sistema capitalista
que o seguiu, sendo as mudanças sempre marcadas por época de transição, onde
coexistem o velho e o novo até que este último deinitivamente se instale. Esta é
a formação que vai estabelecer o peril do professor que está se formando, para
partir e formar o quadro docente que informa e forma os alunos em sala de aula.
Dessa forma, nesta unidade estudaremos as concepções de conteúdos
escolares e de aprendizagem, dando ênfase às atuais propostas que colocam o
conhecimento como centro de todo o processo ensino-aprendizagem da disci-
plina de História. Discutiremos também a formação de conceitos, considerando
os conhecimentos prévios dos alunos e o papel de relevo que o professor merece,
visto que acreditamos que ele exerce função fundamental neste processo de
ensino-aprendizagem.

Introdução
52 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
MUDANÇAS E PERMANÊNCIAS NOS MÉTODOS DA
HISTÓRIA ESCOLAR

Por muito tempo, a escola denominada elementar ou escola primária era o lugar
de ensinar a “ler, escrever e contar”. Para o ensino da leitura, os professores deve-
riam utilizar, entre outros, a “Constituição do Império e a história Geral”. O
objetivo maior era o fortalecimento do senso moral por meio de deveres para
com a Pátria e seus governantes, o que segundo Bittencourt (2004, p. 64), se acen-
tuou no decorrer dos séculos XIX e XX.
Seguindo preceitos do Positivismo, a escolarização das classes popula-
res incluía ensinar a História para “inculcar determinados valores para
a preservação da ordem, da obediência à hierarquia, de modo que a
Nação pudesse chegar ao progresso, modernizando-se segundo o mo-
delo dos países europeus.

Nesta prerrogativa, aprender História signiicava memorizar nomes, fatos e datas,


repetindo exatamente o que estava escrito nos livros ou copiados nos cadernos.
Não precisamos ir longe para constatar tal airmação. Ainda hoje é possível verii-
car professores que se recusam a inovar e acompanhar as tendências atuais para o

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


53

ensino, gabando-se na sala dos professores, dizendo que seus alunos já “termina-
ram mais um caderno” ou que “todos vão bem nas provas”, ainal, faz apenas uma
revisão dando-lhes um questionário para responder, e cobra tal e qual na prova.
A História, segundo o método catecismo, era apresentada por pergun-
tas e respostas, e assim os alunos deviam repetir, oralmente ou por es-
crito, exatamente as respostas do livro. Como castigo, pela imprecisão
dos termos ou esquecimento de algumas palavras, recebiam a famosa
palmatória ou férula. O sistema de avaliação era associado a castigos
físicos (BITTENCOURT, 2004, p. 67).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Assim, infelizmente “aprender de cor” tem sido uma constante desde ins do
século XIX. O que nos chama a atenção é a perpetuação de um sistema que por
vezes sofreu críticas e continua perpetuando-se, muitas vezes, em nossas esco-
las. Entretanto, precisamos ainda considerar que memorizar conscientemente é
diferente de “aprender de cor”, ou memorizar mecanicamente.

Você se lembra de suas primeiras aulas de História? Como elas aconteciam?


O que aprendeu? Quais recursos o professor utilizava para que a aprendiza-
gem acontecesse?

Mudanças e Permanências nos Métodos da História Escolar


54 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Se por um lado tal método nos incomoda até hoje, a situação se agravou ainda
mais quando, a partir dos anos de 1930, os Estudos Sociais passaram a cons-
tituir disciplina escolar nas “escolas primárias” em substituição à História, à
Geograia e ao Civismo. Tal substituição visava à integração do indivíduo na
sociedade, devendo os conteúdos auxiliar a inserção do aluno na comunidade
da qual fazia parte.
Os Estudos Sociais foram adotados em algumas escolas denominadas
“experimentais” ou “vocacionais”, no decorrer da década de 60, e depois
da reforma educacional na fase da ditadura militar, pela Lei 5.692 de
agosto de 1971, a área foi introduzida em todo o sistema de ensino – o
qual então passou a se chamar de primeiro grau -, estendendo-se para
as demais séries do antigo ginásio (BITTENCOURT, 2004, p. 73).

Vale ressaltar que tal mudança provocou um esvaziamento de cada uma das
disciplinas, uma vez que agora todas elas se diluíam, assim como as categorias
e conceitos básicos provenientes das ciências de referência. Dessa maneira, os
métodos, que antes eram destinados à memorização, passaram a se tornar vitais

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


55

para o bom resultado do então chamado Estudos Sociais, devendo destacar a


observação e descrição do meio local. As crianças das escolas primárias deveriam
observar e descrever situações de trabalho, a organização das ruas e praças, os
transportes, etc. O mais importante era criar uma atmosfera pedagógica, “para
formar, a partir da escola, um indivíduo socialmente eiciente para o sistema”
(BITTENCOURT, 2004, p. 75).
As datas cívicas e as comemorações dos feitos dos heróis e dos grandes acon-
tecimentos políticos nacionais eram, na prática, os únicos conteúdos históricos
para os alunos da escola primária.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O professor deveria manter uma atitude de neutralidade diante de


todos os acontecimentos históricos do passado ou do presente. A
constante solicitação da postura neutra do professor evidenciava,
paradoxalmente, o caráter político da disciplina (BITTENCOURT,
2004, p. 89).

Podemos perceber que todas as mudanças dos anos de 1970 para o ensino de
História estavam ligadas especiicamente aos métodos e técnicas, como deixamos
evidente em nossas discussões, e visavam adequar-se a um reduzido conheci-
mento histórico, sem que essencialmente os conteúdos fossem alterados, mas
apenas simpliicados e resumidos.
Contudo, todos os esforços por reformulações que se iniciaram no im dos
anos 80 do século passado ganharam força nos anos 90, graças à nova conigu-
ração mundial, que impunha um modelo econômico para submeter todos os
países à lógica do mercado.
Vale lembrar que esta série de reformulações curriculares não foi exclusiva
em âmbito nacional.
Outros tantos países também sofreram mudanças em seus currículos
oiciais, e muitas dessas propostas curriculares, como as dos países in-
tegrantes do Mercosul, a de Portugal e a da Espanha, possuem a mesma
estrutura na organização dos documentos oiciais e a mesma termino-
logia pedagógica (BITTENCOURT, 2004, p. 100).

Consagrando-se como tendências atuais, a partir do im da década de 1980, cria-


ram-se várias propostas curriculares de História para o Ensino Fundamental,
além dos PCNs, que explicitaremos ainda nesta unidade. Essas propostas tiveram

Mudanças e Permanências nos Métodos da História Escolar


56 UNIDADE II

em comum algumas características que passamos a considerar, assim como fez


nossa historiadora e professora Circe Bittencourt, em seu livro intitulado “Ensino
de História: fundamentos e métodos”, publicado pela primeira vez em 2004, pela
Editora Cortez, em sua coleção Docência em formação: ensino fundamental.
■ A alteração nas formulações técnicas dos textos curriculares, que
passaram a apresentar fundamentações sobre o conhecimento his-
tórico e sobre os demais tópicos da disciplina.

■ A preocupação com a implementação dos currículos, buscando


sua legitimidade junto aos professores, justiicando sua produção

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
e procurando diluir formas de resistência aos documentos oiciais.
■ A redeinição do papel do professor, fornecendo-lhe maior auto-
nomia no trabalho pedagógico, concepção esta expressa na ausên-
cia de um rol de conteúdos estabelecidos de forma obrigatória para
cada série ou ciclo.

■ A apresentação mais detalhada dos pressupostos teóricos e meto-


dológicos do conhecimento histórico;

■ A fundamentação de maneiras diversas, mas tendo como princí-


pio que o aluno é sujeito ativo no processo de aprendizagem.
■ A aceitação de que o aluno possui um conhecimento prévio sobre
os objetos de estudos históricos, obtido pela história de vida e pe-
los meios de comunicação, o qual deve ser integrado ao processo
de aprendizagem.

■ A introdução dos estudos históricos a partir das séries iniciais do


ensino fundamental (BITTENCOURT, 2004, p. 111-112).

A partir destas características, podemos fazer uma contraposição entre a História


tradicional e as tendências atuais.
Da preocupação do estudo dos fatos e a ênfase na história dos fatos polí-
ticos, debaixo da tentativa irreal de “neutralidade” do historiador, passamos a
uma história onde todos os seus componentes são vistos como homens e suas
esferas de atuação (da política à econômica, da social à ideológica) são vistas
em interação recíproca.

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


57
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A interdisciplinaridade é uma característica dessa nova tendência, na qual a histó-


ria se relaciona com a sociologia, antropologia cultural, ilosoia e outras ciências
do homem, até a psicologia (ênfase ao inconsciente coletivo, por exemplo). Mas
este é um assunto para tratarmos daqui a pouco na Unidade 4. Aguarde!
O estudo das origens da genealogia das nações, com o objetivo de formar
o cidadão patriota voltado para o legado europeu, cedeu lugar à integração do
educando em um meio cada vez mais amplo, que evita o estudo do passado pelo
passado e tem sempre em mente o presente.
Só o conhecimento crítico do passado permite a construção da cidadania
tal como se pretende hoje, com o desenvolvimento de um senso histórico-crí-
tico. Na apreensão da pluralidade da memória humana parece estar o caminho, e
não apenas na memória nacional. É esta uma das preocupações de Edgar Morin
(2001), quando airma o quanto o pensamento é complexo e quantas lacunas
estão aí embutidas sem que nos déssemos conta disto.

Mudanças e Permanências nos Métodos da História Escolar


58 UNIDADE II

Recomendamos a leitura da obra: “Introdução ao pensamento complexo”,


de Edgar Morin, em que ele aborda aqueles que consideram os atos inibido-
res do conhecimento em nossa sociedade. Para ele, “o pensamento comple-
xo é animado por um saber não parcelar, não fechado, não redutor e pelo
reconhecimento do inacabado, do incompleto, que isola todos os objetos
daquilo que os envolve” (MORIN, 2001, p. 18). O autor propõe distinguir
ideias sem separar, associar, identiicar ou reduzir.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Fonte: a autora.

Todas essas modiicações deslocam o professor do papel de transmissor do


saber pronto e acabado para um professor mediador, servindo como elo entre
o aluno e a produção do próprio conhecimento que este aluno efetua, atuando
como sujeito de suas operações mentais, que o levam a recuperar a historicidade
e apreender conceitos que levem às sínteses visadas como o ponto mais alto da
escalada do conhecimento.
Aliás, desde que a Revolução da Informática (1970), quando os computado-
res se uniram às telecomunicações (Internet), a informação está ao alcance de
todos, o que deixa claro que o professor não tem mais o monopólio da informa-
ção. A lexibilidade necessária à docência inclui ser, além de um informante, um
formador de consciências críticas e criativas, capazes de pensarem por si mesmas.
A avaliação passa, a partir daí, por um processo de revisão que inclui a eli-
minação da “avaliação bancária”
apontada por Paulo Freire, e sua
substituição por outra avaliação.
Esta se deine agora como diag-
nóstica, processual e formativa
e, segundo Schmidit e Cainelli
(2004, p. 17), essa avaliação busca
“o crescimento do aluno e não
sua classiicação e exclusão”.

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


59

Hobsbawm (1995, p. 13), na sua obra “Era dos Extremos”, lembra que a
destruição do passado é um dos fenômenos mais “lúgubres” enfrentados pelo
historiador hoje e recoloca a história no verdadeiro papel que também vem enfa-
tizado por autores nacionais como José Murilo Carvalho (1998, p. 454):
Nada do que é humano será agora alheio ao historiador. Daí a multi-
plicação de estudos sobre a cultura, os sentimentos, as idéias, as men-
talidades, o imaginário, o cotidiano. E também sobre instituições e fe-
nômenos sociais antes considerados de pequena importância, se não
irrelevantes, como o casamento, a família, organizações políticas e pro-
issionais, igreja, etnias, a doença, a velhice, a infância, a educação, as
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

festas e rituais, os movimentos populares.

Portanto, a construção de uma memória social exclusivamente nacional cederá


lugar a uma memória que fale da identidade humana, além de considerar a sime-
tria entre as culturas para erradicar os preconceitos que fortalecem os inimigos
da democracia, como acontece com os totalitarismos de toda espécie.

Mudanças e Permanências nos Métodos da História Escolar


60 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
CONCEPÇÕES DE CONTEÚDOS ESCOLARES E DE
APRENDIZAGEM

Ao longo de muitas décadas do século passado e mesmo deste que se inicia,


a questão do conteúdo programático tem-se apresentado como um problema
para a maioria dos professores. Muitos deles sentem diiculdades de contemplar
todos os itens a serem ministrados em suas aulas e, quase sempre, os fatos mais
atuais não são vistos, em detrimento do passado que é sempre estudado, quase
sem ligação com o presente.
Infelizmente percebe-se que ainda temos professores pedagogos, ou seja,
que ministram todas as disciplinas, como é o caso dos professores dos anos ini-
ciais do Ensino Fundamental, que carecem de domínio dos conteúdos como os
especíicos de História. Isto porque essa matéria possui complexidades que vão
além de “saber” os conteúdos, é preciso dominar os eixos que estruturam a disci-
plina e que transpassam todos os conteúdos, como o domínio da temporalidade.
Há professores que ainda consideram o aprender como equivalência a memo-
rizar, dominar muitas informações de acontecimentos de uma história nacional,
datas, episódios, heróis e seu desempenho, sendo esse processo chamado de
História factual de curta duração, que Braudel (1965), da segunda geração de
neo-historiadores franceses, criticou e propôs substituir pela longa duração.
Ainda que admitisse que a ideia de tempo estivesse ligada ao pensamento

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


61

do historiador, assim como a terra adere à pá do jardineiro, Braudel (1965) pen-


sava em estruturas que duravam por um tempo bem mais longo do que aquela
ocupada por uma simples batalha.
Nas diferentes formas de produzir currículos escolares, os conteúdos são
fundamentais, ainda que permitam a comparação entre os currículos ideais, os
da teoria e o currículo real. Tudo envolve, ainda, o currículo oculto, aquele que
está implícito nas formulações oiciais e que é o resultado da orientação peda-
gógica, da ideologia que se pretende contemplar.
Como escreve Circe Bittencourt (2004), um debate que então se possa insta-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

lar é benéico, na medida em que permite avanços para a seleção de conteúdos,


como fruto de uma concepção que orienta o processo de ensino-aprendizagem.

Portanto, a se julgar pelos currículos mais recentes, os conteúdos escolares corres-


pondem à integração dos vários conhecimentos adquiridos na escola. “Destarte,
concebem-se como conteúdo escolar tanto os conteúdos explícitos de cada uma
das disciplinas como a aquisição de valores, habilidades e competências que fazem
parte das práticas escolares” (BITTENCOURT, 2004, p. 106).
Para a História todos os autores são unânimes em airmar que a apreensão
do conteúdo envolve não apenas a capacidade dos alunos de dominar informa-
ções e conceitos de um determinado período, mas principalmente a capacidade

Concepções de Conteúdos Escolares e de Aprendizagem


62 UNIDADE II

analítica que permitirá a síntese. Sendo assim, faz-se necessária a habilidade


interpretativa do texto, a leitura de tabelas, gráicos e mapas, visto que esses con-
teúdos são o “lugar” do saber histórico mais privilegiado.
Convém destacar que informação não é conhecimento. Informação é
“matéria-prima” e só se torna conhecimento se for transformada pelo sujeito
cognoscente, se izer sentido para este e se relacionar com outros conhecimen-
tos já construídos e incorporados.
Seguindo orientações dos PCNs, apesar das críticas recebidas desde a sua
elaboração por parte de alguns educadores, explicitamos seus objetivos gerais

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para o Ensino de História (BRASIL, 1997, p. 41). Assim, espera-se que ao longo
do Ensino Fundamental, os alunos gradativamente possam ler e compreender
sua realidade, posicionar-se, fazer escolhas e agir criteriosamente. Nesse sentido,
os alunos deverão ser capazes de:
■ Identiicar o próprio grupo de convívio e as relações que estabelecem
com outros tempos e espaços.

■ Organizar alguns repertórios histórico-culturais que lhes permita


localizar acontecimentos numa multiplicidade de tempo, de modo a
formular explicações para algumas questões do presente e do passado.
■ Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos sociais, em
diversos tempos e espaços, em suas manifestações culturais, econômicas,
políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças entre eles.
■ Reconhecer mudanças e permanências nas vivências humanas, pre-
sentes na sua realidade e em outras comunidades, próximas ou distan-
tes no tempo e no espaço.
■ Questionar sua realidade, identiicando alguns de seus problemas
e reletindo sobre algumas de suas possíveis soluções, reconhecendo
formas de atuação políticas institucionais e organizações coletivas da
sociedade civil.

■ Utilizar métodos de pesquisa e de produção de textos de conteúdo


histórico, aprendendo a ler diferentes registros escritos, iconográicos,
sonoros.

■ Valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a diversidade, reco-


nhecendo-a como um direito dos povos e indivíduos e como um ele-
mento de fortalecimento da democracia.

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


63

Se analisarmos a metodologia adotada em nossas escolas hoje com relação aos


objetivos do ensino da História, teremos especiicado para os anos iniciais do
Ensino Fundamental itens envolvidos em um conteúdo que permita, sobretudo,
identiicar o seu grupo de convívio e as relações que entre eles se estabelecem
com outros tempos e espaços. Como lemos no próprio documento emanado do
MEC é necessário “organizar alguns repertórios histórico-culturais que lhes per-
mitam (aos estudantes) localizar acontecimentos numa multiplicidade de tempo,
de modo a formular explicações para algumas questões do presente e do pas-
sado” (BRASIL, 1997, p. 50).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Além do mais, é necessário superar o preconceito e trabalhar com a tolerân-


cia, objetivando uma convivência harmônica entre os membros de uma mesma
sociedade, como querem Morin (2001) e outros.
Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, é importante identiicar as relações
sociais no seu grupo de convívio, situar acontecimentos históricos na multipli-
cidade dos tempos, fazer a relação com outras disciplinas aprendidas como a
Geograia, por exemplo, e, novamente, conhecer e respeitar o modo de vida dos
outros, independentemente do país.
A grande intenção é estabelecer a harmonia, do micro ao macro, visando
nossa humanidade, tão atingida pelo fenômeno do “estranhamento” entre culturas,
hostilidade motivada pela diferença que brota da especiicidade de cada grupo.
A valorização do patrimônio sociocultural não escapou aos que pensaram
em termos de PCNs conforme a orientação vinda da Europa, aplicada a nossa
realidade, e a busca da verdadeira cidadania e democracia inalizando, como a
síntese do documento.
Muito interessante é o texto anotado por Schmidt e Cainelli (2004, p. 25),
que mostra uma menina anônima de quatro anos se perguntando: “Como era
isso antes de eu estar aqui?”.
Isso é um bom ponto de partida para uma aula de História, pois permite que
se parta do interesse e da curiosidade do próprio aluno e, além disso, permite que
um conhecimento verdadeiramente histórico seja construído. Quando trata do
ensino da História no que diz respeito aos conteúdos relacionados aos concei-
tos, Holien Gonçalves Bezerra (2004) não só estuda a nossa Lei de Diretrizes e
Bases de 1996, como também se preocupa com a maneira com que os conteúdos

Concepções de Conteúdos Escolares e de Aprendizagem


64 UNIDADE II

alcançarão seus objetivos, em termos de articulação de conhecimentos e valores.


Uma das grandes preocupações desse autor é como tudo o que vem no bojo
dos conteúdos poderá contribuir de uma maneira “efetiva” na sempre invocada
“transformação da sociedade” (BEZERRA, 2004, p. 37). Além disso, esse autor é
bastante explícito com relação à seleção e organização dos conteúdos e na orien-
tação primeira de não atender a uma única metodologia, como diz a seguir: “a
necessária seleção de conteúdos faz parte de um conjunto formado pela preocu-
pação com o saber escolar, com as capacidades e com as habilidades, e não pode
ser trabalhada independentemente” (BEZERRA, 2004, p. 38).

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Além de enfatizar que os conteúdos são um meio, e não um im em si mesmo,
o autor recomenda também a diversidade na apresentação dos conteúdos, não
obstante se imponha sempre a linearidade e a sequência cronológica, básicas à
apreensão do fato histórico.

EXEMPLIFICANDO:

1. Abaixo temos trechos da carta de Pero Vaz de Caminha, o escrivão da esqua-


dra de Cabral. Ela é considerada a certidão de nascimento do Brasil. Datada
de 1º de maio de 1500 e destinada a Dom Manuel, rei de Portugal. Leia-a e
faça o que se pede a seguir:
Senhor:

[...] Neste dia 22 de abril de 1500... avistamos terra! Primeira-


mente um grande monte, mui alto e redondo; e outras serras
mais baixas ao sul dele; e de terra plana, com grandes arvoredos:
ao monte alto o Capitão pôs nome de Monte Pascoal, e a terra de
Vera Cruz. [...]

Os habitantes eram pardos, todos nus, sem coisa alguma que lhes
cobrisse suas vergonhas. Nas mãos traziam arcos com suas setas.
[...]

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


65

Ao domingo de Páscoa pela manhã, determino o Capitão para


irmos a missa naquele ilhéu. Mandou naquele ilhéu [...] armar
um altar... E ali com todos nós o Padre Frei Henrique presidiu a
missa. A missa, segundo meu parecer, foi ouvida por todos com
muito prazer e devoção. [...]

Esta terra, senhor, [...] é muito extensa e muito formosa.

Nela, até agora, não pudemos saber se há ouro, nem prata, nem
coisa alguma de metal ou ferro... Porém a terra em si é de muitos
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

bons ares...

Águas são muitas: inindas. E em tal maneira é graciosa que,


querendo-a aproveitar para plantar, dar-se-á nela tudo, por bem
fruto que dela se pode tirar me parece que será salvar esta gente.

Beijo as mãos de Vossa Alteza.

Deste Porto Seguro, da vossa ilha da Vera Cruz, hoje, sexta-feira,


primeiro dia de maio de 1500.

Pero Vaz de Caminha.


Fonte: adaptado de: <http://www.dominiopublico.gov.br/pesquisa/DetalheObraForm.
do?select_action=&co_obra=17424>. Acesso em: 17 abr. 2017.

a) A carta acima pode ser considerada uma fonte histórica? Justiique.


b) É uma fonte primária ou secundária? Comprove sua resposta.
c) Em que data foi escrita?
d) Onde foi escrita?
e) Quem escreveu?
f) Retire do texto duas informações que considerar importante.
g) Ao escrever a carta, Pero Vaz de Caminha tinha seus motivos. Cite o
motivo pelo qual escreveu a carta.
h) Julgue a informação: Através das fontes históricas podemos estudar o
modo de vida dos povos do passado?

Concepções de Conteúdos Escolares e de Aprendizagem


66 UNIDADE II

2. Observe o documento iconográico (1ª missa do Brasil) com atenção e


registre a sua primeira impressão. Em seguida descreva o que viu, decompondo
a imagem em partes.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Figura 1 - 1ª missa do Brasil, Pintura de Victor Meirelles (1861).
Fonte: Infoescola ([2017], on-line)1.

■ Pessoas (olhar, gestos, vestuários, adornos, posição...);


■ Espaço (lugares, chão, fundo e utilização do espaço);
■ Objetos (disposição);
■ Iluminação (claro, escuro);
■ Fonte primária ou secundária;

■ Intenção do artista.

3. Imagine que você seja um escrivão, assim como foi Pero Vaz de Caminha,
e tenha que produzir uma carta caracterizando sua cidade e endereçada a turis-
tas. Como icaria?
A temporalidade cronológica, ao lado da temática, são importantes compo-
nentes daquela a qual chamamos hoje uma História integrada, que atende não
só ao conteúdo como im, mas também à necessidade de capacitação envolvida
na apreensão desses conteúdos.

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


67

Bezerra (2004, p. 40) lembra, ainda, alguns cuidados especiais com relação
aos conteúdos: “o primeiro se refere ao envolvimento do aluno com o objeto de
estudo que está sendo trabalhado” e, em seguida, jamais descuidar da preocu-
pação com o desenvolvimento das habilidades cognitivas que fazem parte dos
horizontes dessas propostas pedagógicas.
Trabalhar historicamente os temas e objetos em pauta parece ser a priori-
dade que se impõe quanto aos conteúdos de História. Neste sentido, passamos
a apresentar resumidamente as transformações do ensino de História no Brasil:
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Quadro 1 – Transformações do ensino de História no Brasil

ENSINO TRADICIONAL ENSINO DE TENDÊNCIAS ATUAIS


ESTUDOS SOCIAIS
VISÃO DA Preocupação com Interdisciplinari- História como história de todos
CIÊNCIA o estudo dos fatos, dade das ciências os homens e não somente de
neutralidade do his- sociais (História, heróis. Inclusão de novas contri-
toriador e da explica- Geograia, Antro- buições historiográicas: história
ção histórica. Ênfase pologia e Sociolo- econômica, cultural e social.
na história dos fatos gia). Predomínio Análise do fato histórico subs-
políticos e na história do ensino de estu- tituída por outras possibilida-
como produto da ação dos sociais. Estudo des, como análise do processo
de indivíduos, de he- das sociedades histórico e da experiência dos
róis. História conside- no transcorrer do sujeitos da história. Incorpora-
rada como ciência que tempo como obje- ção dos novos temas e objetos
estuda exclusivamente tivo do ensino. da História, como a história das
o passado. mulheres, a das crianças e a dos
movimentos sociais.
FUNÇÃO Estudo das origens das Integração do Contribuição para a construção
DO ENSI- nações. Objetivo de educando em da cidadania. Desenvolvimento
NO formar o cidadão para um meio cada de raciocínios historicamente
a pátria e construir vez mais amplo. corretos. Aquisição da capaci-
identidades nacionais. Estudo da história dade de análise da relação pre-
Estudo dos legados, do presente, evi- sente-passado. Apreensão da
principalmente daque- tando o estudo do pluralidade de memórias, e não
les da civilização euro- passado pelo pas- somente da memória nacional.
péia. Compreensão da sado. Formação Preocupação com as inalida-
nação brasileira como de cidadãos para des do ensino de História no
fruto da integração en- a sociedade em mundo contemporâneo.
tre três raças: branca, desenvolvimento,
índia e negra. democrática e
industrial.

Concepções de Conteúdos Escolares e de Aprendizagem


68 UNIDADE II

ENSINO TRADICIONAL ENSINO DE TENDÊNCIAS ATUAIS


ESTUDOS SOCIAIS
RELAÇÃO Professor como trans- Aluno como Importância do domínio do
PROFES- missor do saber histó- centro do ensino. conteúdo especíico pelo pro-
SOR X rico verdadeiro, pronto Professor como fessor, que deve ser comprome-
ALUNO e acabado. Aluno facilitador da tido com o aluno e o mediador
como receptor passivo aprendizagem. entre este e o conhecimento
do conhecimento Relação baseada histórico. Professor como
histórico transmitido na vigilância do responsável pela intermediação
pelo professor. aluno pelo pro- entre o aluno e o percurso para
fessor. produção do conhecimento

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
histórico. Aluno sujeito de seu
próprio conhecimento e do
conhecimento histórico.
CONTEÚ- Organização de forma Fragilização do Recuperação da historicidade
DO linear, cronológica, conteúdo espe- do conhecimento histórico.
baseada principalmen- cíico da História. Conteúdo histórico como
te na periodização Valorização da produto do saber-fazer espe-
política e baseada em aprendizagem cíico. Novas possibilidades de
fontes escritas. História baseada no desen- organização curricular para
narrativa e descritiva. volvimento de o ensino de História, como a
Conteúdos selecio- atividades. Livros história temática e o ensino
nados com base em didáticos em que por conceitos. Valorização do
visões “oiciais” da His- predominam conteúdo e de visões plurais
tória. Valorização das ilustrações. Simpli- e críticas da História. Incorpo-
datas comemorativas. cação do conhe- ração de novas produções de
cimento histórico. historiadores.
Currículos organi-
zados em “círculos
concêntricos”:
família, escola,
bairro, cidade, país
e mundo.

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


69

ENSINO TRADICIONAL ENSINO DE TENDÊNCIAS ATUAIS


ESTUDOS SOCIAIS
MÉTODO Formal e abstrato, sem Baseado no ensi- Tem como referência a pró-
relação com a vida do no por atividades. pria ciência. Recuperação do
aluno. Conteúdos e Ênfase na pesqui- método da História em sala de
métodos sem objeti- sa e no trabalho aula. Preocupação com a trans-
vo de desenvolver a em grupos. posição didática: relação entre
criticidade. Predomí- saber cientíico, saber a ser
nio do “ponto” (texto ensinado, saber ensinado, saber
sobre determinado aprendido e prática social. Va-
conteúdo), questioná- lorização do uso de documento
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

rio, testes de múltipla histórico em sala de aula. Incor-


escolha e exercícios poração de novas linguagens
com lacunas a serem e tecnologias no ensino da
completadas. História, como análise de ilmes
e uso da informática.
AVALIA- Avaliação centrada no Baseada em obje- Diagnóstica, processual, forma-
ÇÃO professor. Avaliação de tivos previamente tiva. Busca o crescimento do
resultados, do produ- propostos. Avalia- aluno e não sua classiicação e
to da aprendizagem, ção do processo, e exclusão.
baseada na memori- não do conteúdo.
zação de informações
transmitidas pelo
professor. Avaliação
classiicatória.

Fonte: Schimidt e Cainelli (2004, p. 15 - 17).

Concepções de Conteúdos Escolares e de Aprendizagem


70 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A FORMAÇÃO DE CONCEITOS

O conhecimento histórico que aqui nos propomos a analisar, não se limita a


apresentar o fato no tempo e no espaço acompanhado de documentos que com-
provem e dão legitimidade a sua existência. É preciso considerar os sujeitos que
os produziram para buscar uma explicação plausível. “E para explicar e interpre-
tar os fatos, é preciso uma análise, que deve obedecer a determinados princípios.
Nesse procedimento são utilizados conceitos e noções que organizam os fatos,
tornando-os inteligíveis” (BITTENCOURT, 2004, p. 183).

Pensando sobre a formação de conceitos, podemos nos interrogar: como


nossas crianças aprendem conceitos? É possível que crianças de qualquer
faixa etária dominem conceitos?

Tomando como referência os pensamentos do pesquisador russo L. S. Vygotsky


(1896 – 1934), acreditamos que há uma proximidade entre os conceitos espon-
tâneo e cientíico. Na passagem do conhecimento espontâneo para o cientíico

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


71

não há necessariamente o desaparecimento do primeiro, mas há modiicações


de esquemas intelectuais anteriormente adquiridos. Tal teoria recai sobre a aqui-
sição social dos conceitos.
Observando a dinâmica do processo de formação de conceitos, Vygotsky
chegou a algumas conclusões que passamos a destacar:
■ A percepção e a linguagem são indispensáveis à formação de con-
ceitos;

■ A percepção das diferenças ocorre mais cedo do que as semelhanças


porque existe uma estrutura de generalizações e de conceituação mais
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

avançada;

■ O desenvolvimento dos processos que resultam na formação de con-


ceitos começa na infância, mas as funções intelectuais que formam a
base psicológica do processo de formação de conceitos amadurecem e
se desenvolve somente na adolescência;
■ A formação de conceitos é o resultado de uma atividade complexa,
em que todas as funções intelectuais básicas (atenção deliberada, me-
mória lógica, abstração, capacidade para comparar e diferenciar) to-
mam parte;

■ Os conceitos novos e mais elevados transformam o signiicado dos


conceitos inferiores (VYGOTSKY, 1991, p. 76).

Nesse sentido, o conhecimento prévio dos alunos é a condição necessária para


a construção de novos signiicados e esquemas.
Outro aspecto bastante relevante sobre a formação de conceitos, tratado por
Vygotsky (1991), diz respeito aos processos cotidianos, às experiências pessoais
da criança e à instrução formal, e também à aprendizagem em sala de aula que,
em seu entender, desenvolvem dois tipos de conceitos, que se relacionam e se
inluenciam constantemente. Nesse aspecto Vygotsky contesta Piaget, pois para
este segundo psicólogo, os conceitos “espontâneos” que constituem as ideias da
criança acerca da realidade são independentes dos conceitos cientíicos.
Vygotsky (1991) acredita que os conceitos espontâneos e os cientíicos não
estão em conlitos, pois fazem parte de um mesmo processo, ainda que se for-
mem e se desenvolvam sob condições externas e internas diferentes e motivadas
por problemas diferentes.
Segundo ele, nas experiências cotidianas, a criança centra-se nos objetos e

A Formação de Conceitos
72 UNIDADE II

não tem consciência de seus conceitos (por exemplo, usa corretamente o con-
ceito de município, mas não é capaz de fazê-lo numa situação experimental),
ao passo que nos conceitos aprendidos na escola, em colaboração com o adulto,
consegue resolver melhor problemas que envolvem o uso consciente do conceito.
No entanto, seus estudos conirmaram a hipótese de que os conceitos espontâ-
neos e os conceitos cientíicos, inicialmente afastados, visto que se desenvolvem
em direções contrárias, terminam por se encontrar.
Pode-se dizer que o desenvolvimento dos conceitos espontâneos da criança
é ascendente (indutivo), enquanto o desenvolvimento dos seus conceitos cien-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tíicos é descendente (dedutivo) (VYGOTSKY, 1991, p. 93).
Contudo, Vygotsky airma que é necessário que o conceito espontâneo
tenha alcançado certo nível para que o conceito cientíico correspondente seja
internalizado, levando em conta que eles
dependem e se constroem a partir dos con-
ceitos cotidianos.
Antes do ingresso na escola, a criança
já construiu um conjunto de conhecimento
informal, produto do desenvolvimento onto-
genético a partir de suas experiências, que
constitui o seu sistema de crenças sobre o
mundo, que inluenciará profundamente a
obtenção do conhecimento formal, que se dará
de forma planejada pela aprendizagem escolar.
Considerando então que o aluno traz
uma riqueza de conhecimentos sobre o
mundo e seu funcionamento, que na maio-
Figura 2 - Vygotsky
ria das vezes entram em conlito com o que é Fonte: Concepções (2012, on-line)2.
imposto pela escola e tem de ser aprendido,
como o professor pode agir para que os estudantes não rejeitem esses conheci-
mentos, não tenham diiculdades em assimilá-los ou, ainda e principalmente,
não deem “respostas corretas” apenas para cumprir tarefas escolares sem sen-
tido e inúteis?
Para os professores essa tarefa não é fácil, pois implica uma revisão tanto de

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


73

conteúdos quanto de metodologias. Para que as práticas pedagógicas sejam mais


adequadas à formação de conceitos cientíicos, algumas sugestões são apontadas
com o intuito de primar pela busca do conhecimento historicamente acumu-
lado pela humanidade:
■ As ideias que o aluno traz para a escola são necessárias para a cons-
trução de signiicados. Suas experiências culturais e familiares não po-
dem ser negadas. Essas ideias devem ser aceitas para progressivamente
evoluírem, serem substituídas ou transformadas.

■ A resistência para substituir alguns conceitos só é superada se o con-


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ceito cientíico trouxer maior satisfação: for signiicativo, izer sentido e


for útil. Os conceitos cientíicos com maior grau de aplicabilidade, que
explicam um maior número de situações e resolve um maior número
de problemas, facilitam a mudança.
■ O diálogo com os alunos possibilita o diagnóstico de suas ideais em
vários momentos da aprendizagem. Da mesma forma, a interação entre
parceiros e a observação dos diálogos travados entre eles.

■ Provocar conlito com contra-exemplos pode gerar dúvidas e insatis-


fação, levando os alunos a testarem suas concepções.

■ Resolver problemas com um plano de atividades cognitivas deve ser


estimulado, uma vez que a simples nomeação das características essen-
ciais e a repetição de deinições não garantem a formação de conceito.
Deve-se estimular o aluno a considerar soluções alternativas para um
mesmo problema.
■ Deve-se possibilitar ao aluno retomar seu processo de trabalho, ex-
plicando suas ideias e analisando a evolução das mesmas.

■ No processo de formação de conceitos, é desejável desenvolver ações


de inclusão – estabelecer se um objeto dado refere-se ao conceito indi-
cado, e de dedução – reconhecer as características necessárias ou sui-
cientes para incluir ou não os objetos em um conceito dado.

■ Nem todo conceito é passível de experimentação, daí o valor de


meios variados: ilmes, explorações de campo, vestimentas do passado,
entrevista, etc. (NÉBIAS, 1998, on-line)3.

É importante lembrar que o ensino sistemático e explícito na escola deve levar


o aluno a reconceitualização e, principalmente, ao desenvolvimento de formas

A Formação de Conceitos
74 UNIDADE II

de pensar que se estendam para outras áreas do conhecimento e situações que


transcendam a sala de aula.
Em seu estudo sobre o livro didático, Maria Carolina Bovério Galzerani (2013)
chegou à conclusão que tratam de “belas mentiras”, comentando a ideologia nos
estudos sobre o livro didático. Tratando assim, a ideologia com o sentido que
Marilena Chauí (2000) tão bem explica, nossa autora trata dos conceitos ainda
que de maneira indireta, mas de forma a fazer a ligação com tudo o mais que os
autores têm nos apresentado.
Suas conclusões nos levam a inferir que o livro didático, em sua relação dialé-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tica (airmações X contradições) com a sociedade ainda tem muito a contribuir,
pois contém elementos que permitem manter a ambiguidade em aspectos vitais
que dizem respeito dessa própria sociedade. É a tentativa de manter a ordem
antes do progresso, como ocorre na nossa bandeira de lema positivista. Em seu
título, a autora se apropria com autorização das ideias de Maria de Lourdes D.
Nosella, que se preocupa com as “belas mentiras” permitidas pela ideologia sub-
jacente aos livros didáticos.
Um ranço de autoritarismo em prejuízo da ciência como conhecimento é o
que ela procura diagnosticar, bem como a “sobrevalorização do conhecimento
dito cientíico” como mais importante do que “outros tipos de conhecimento pos-
síveis de serem adquiridos e vivenciados no cotidiano da vida social ou mesmo
da vida escolar” (PINSKY, 2004, p. 109).
Os fatos são “senhores de segredos que se deixam revelar com lentidão”
(AQUINO; FRANCO; LOPES, 1980, p. 41). Pensando desta forma, temos de
nos render ao fato de que as apreensões do conteúdo e sua consequente elabo-
ração em conceitos ou partes do entendimento em que se deinem palavras e
ideias envolvem não só a episteme ou ciência em si, mas também uma deter-
minada forma de tratar o objeto. Assim, a elaboração de conceitos exige um
planejamento de ação e depois um método (do grego methodo = caminho) para
se chegar ao que se pretende.
Nesta perspectiva, numa primeira fase teríamos a observação e a análise, e
essas se fariam seguir a partir da formulação de conceitos. Desse modo, é impor-
tante lembrar que:
o ponto mais importante de qualquer processo compreensivo está jus-

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


75

tamente aí: esta ou aquela forma de tratar o objeto está intimamente


ligada à própria estrutura mental da sociedade em determinada época,
ou seja, à própria visão de mundo, à forma como o objeto é percebido
pelo ser que compreende (AQUINO; FRANCO; LOPES, 1980, p. 23).

Um conceito, para ser totalmente assimilado, necessita levar em conta a concep-


ção que se tem da relação entre o ser que compreende e os seres compreendidos,
sem nunca esquecer a outra parte importante que é a realidade apresentada. É
essa realidade que vai determinar a ixação dos conceitos teóricos, seguida a ação
de ixação dos mesmos conceitos.
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Assim, como apresentam nossos autores citados com muita propriedade, é


fundamental diferenciar história e teoria. Pois “a teoria é a visão geral do que se
apresenta e, portanto, é a priori, o que vai presidir e condicionar a apreensão da
realidade” (AQUINO; FRANCO; LOPES, 1980, p. 24).
Fernand Braudel (1965, p. 24), responsável por tantas colocações interessan-
tes ao nosso “ofício”, escreveu que “a realidade do social, a realidade fundamental
do Homem revela-se inteiramente nova aos nossos olhos e, queiramos ou não,
nosso velho ofício de historiador não cessa de brotar e de relorir em nossas
mãos”. É essa a verdade que tem de informar a nossa prática, que só será real-
mente importante quando a tarefa de construir um novo homem, à altura do
passado e do presente, com vistas às mudanças futuras for assumida por nós.

A Formação de Conceitos
76 UNIDADE II

Da história engajada a uma história que vise à verdadeira integração do cida-


dão, existem alguns conceitos fundamentais.
Holien Bezerra (2004), por exemplo, menciona quais seriam esses conceitos
quando fala de escolaridade básica. Em primeiro lugar, é abordada a cidadania
ou a formação histórica que contribuem para a vivência do cidadão. O autor
considera ainda o conhecimento histórico como a compreensão dos processos e
dos sujeitos históricos, além do desvendamento das relações que se estabelecem
entre os grupos humanos em diferentes tempos e espaços. A problematização
pode ser um bom método, bem como a prática interdisciplinar.

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A ampliação das fontes históricas, bem como a percepção da complexidade
das relações sociais presentes no testemunho individual ou dos fatos é própria
da trama histórica.
Finalmente, a historicidade dos conceitos históricos envolve um senso muito
próprio. “Os conceitos históricos somente podem ser entendidos na sua histori-
cidade”, escreve Bezerra (2004, p. 46). “Isto quer dizer que os conceitos criados
para explicar certas realidades históricas têm seu signiicado voltado para essas
realidades, não sendo possível empregá-los indistintamente para toda e qual-
quer situação semelhante”. Mais que isso, “os conceitos, quando tomados em sua
acepção mais ampla, não podem ser utilizados como modelos, mas apenas como
indicadores de expectativas analíticas” e por isso mesmo quando permitem uma
compreensão geral podem receber o nome de “categoria” (BEZERRA, 2004, p.
47). E o autor exempliica: a categoria trabalho, continente, homem e revolução.
O conceito de cidadania, por exemplo, envolve o conjunto de preocupações
que informam o conhecimento histórico e suas relações com o ensino vivenciado
na escola, que por sua vez leva ao aprimoramento de atitudes e valores impres-
cindíveis para o exercício da cidadania, dotando de recursos para atuar e dispor
dos instrumentos que a cultura põe à nossa disposição.
Depois que Braudel (1965) demoliu o factual e a ênfase ao político, temos
de novo à volta do político, mas desta vez ao lado do social, do ideológico, do
econômico, num todo, como esferas. Em relação a essa nova visão, temos, sobre-
tudo, o conceito que permite a historicidade. Porém, evite o historicismo, como
escreve Jaime Pinsky (2004), quando comenta a ciência que Aristóteles consi-
derava apenas a ciência do particular.

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


77

Esmagado duplamente, de um lado pelo herói, do outro pelo


“processo” do qual era vítima passiva, o homem começa a ser
descoberto como agente real da história, como aquele que atua
para que ela possa ocorrer”, resgata de uma forma mais “nobre”,
a sua “particularidade, mas sem abandonar a sua universalidade
enquanto ser humano (PINSKY, 2004, p. 21).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Schmidt e Cainelli (2004) listam diversos recursos didáticos para comunica-


ção de conceitos em sala de aula. Veja alguns deles:
Narrar situações que foram vivenciadas no passado contadas pela família.
Desenhar cenas de acontecimentos a partir de narrativas históricas.
Desenhar diagramas e mapas.
Reconstruir acontecimentos históricos com dança ou teatro.
Utilizar linhas do tempo.
Dar títulos a narrativas históricas.
Descrever aspectos concretos do passado, a partir de uma fotograia antiga
ou livros, por exemplo.
Redigir frases utilizando os conceitos históricos ensinados.
Listar aspectos históricos obtidos em diferentes fontes (imagens e textos).
Responder às perguntas: “Onde?”, “Como?”, “O quê?” e “Por quê?”.
Fazer desenhos, murais, colagens etc.
Reunir fontes históricas diferentes.
Redigir textos imaginativos e breves sobre o passado, textos descritivos e
textos sobre o passado a partir de fontes orais.
Redigir textos com base em trabalhos de campo ou estudos do meio.
Fazer resumos e sínteses.
Comentar documentos (escritos ou iconográicos).
Fonte: Paixão (2016, p. 21).

Essas são as principais diretrizes de nosso tempo para tal abordagem.

A Formação de Conceitos
78 UNIDADE II

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR E O COTIDIANO
DE SALA DE AULA

Munido de conhecimento, baseado em seu próprio meio subjetivo de encarar a


História em suas individualidades, fatos, processos e visão geral, o professor tem
perante a si o encargo de transportar tudo isso para a prática.
Isto porque é ele quem transforma o saber a ser ensinado em saber aprendido,
ação fundamental no processo de produção do conhecimento (BITTENCOURT,
2004). Além disso, o cotidiano da sala de aula é, ao mesmo tempo, laboratório e
palco de sua capacidade de levar aos seus alunos a historicidade, em conceitos
e fatos, a permitir-lhes a apropriação pessoal de um verdadeiro conhecimento
histórico, em seu sentido e propriedades.
Circe Bittencout (2004) organizou um precioso volume sobre “O saber his-
tórico na sala de aula”, com a colaboração de vários professores aqui já citados,
como Maria Auxiliadora Schmidt.
Nesse livro, que trata dos saberes práticos necessários ao historiador, a pro-
fessora doutora Maria de Lourdes Monaco Janotti expressa suas preocupações a
respeito do papel que a história pode (ou não) representar a partir do cotidiano

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


79

de nossas salas de aula nacionais, amparada nas relexões de Hobsbawm em


obras como a “Era dos Extremos” (1995).
O fenômeno indesejável a que ela se refere é “uma inimaginável alienação
coletiva de resultados imprevisíveis” (JANOTTI, 2004 apud BITENCOURT,
2004, p. 42), que pode ocorrer agora, em plena sociedade dita do conhecimento
precedida pela globalização.
O esquecimento é uma arma poderosa nesse movimento que, não in-
genuamente, promove pela mídia internacional espetáculos regionais –
originalmente fruto de reações à cultura dominante – tornando-os pro-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

dutos consumíveis pelo público dos talk-shows (JANOTTI, 2004, p. 42).

Essa é uma importante indicação para um professor fazer sua escolha, dentre os
temas que considera relevantes para levar à sala de aula.
Prestigiar temas apenas do passado ou as irrelevâncias do presente são igual-
mente perigosos, pois o passado visto em si mesmo não ilustra e nem informa o
presente. Nem mesmo o presente se explica a partir de si mesmo, como escreve
a professora.
Do passado, devem ser destacados fatos que permitam a conexão com o
presente, e nenhum aspecto ou esfera deve ser desprezado, da política ao eco-
nômico, do social ao ideológico.
Isso tudo tem de ser lembrado, pois se “a História não é o terreno do ‘interes-
sante’ e do mundo privado enquanto tal”, ao mesmo tempo, “o perigo de ignorar
o passado público pode acarretar a perda da visão dialética da História”. Ainal,
conclui a professora (JANOTTI, 2003 apud BITENCOURT, 2004, p. 43), é “a von-
tade política que leva à crítica e à construção de projetos futuros”. Para operar a
transformação a partir da consciência individual de nossos alunos, cuja relexão
tem de ser convenientemente suscitada, temos de partir de suas próprias experi-
ências cotidianas, além de encaminhá-los à linguagem culta própria da ciência e
aos conhecimentos sistemáticos característicos da ciência, de forma planejada,
paulatina, onde os problemas sejam apresentados em forma crescente e ao mesmo
tempo cuidadosa, para não assustar ou causar desinteresse ao aluno pela incapa-
cidade de apreender.
Janotti cita Durmeval Trigueiro Mendes (2004, p. 44), quando alerta aos
gestores educacionais da necessidade que vem imposta pela compreensão de

A Formação do Professor e o Cotidianode Sala de Aula


80 UNIDADE II

que “toda ação eicaz, sobretudo no mundo de hoje, é antes de tudo a ação que
muda a consciência – a própria e a dos outros”. Eis aí um momento de relevân-
cia, visto que a professora da USP nos alerta para a necessidade de revisarmos
bem o nosso papel de intelectuais “orgânicos” assim como pensava Gramsci, que
ressaltava que os professores estão sempre, ainda que inconscientemente, enga-
jados num processo de construção de um Estado (que o Estado quer.)
O que Janotti (2004) pretende, ainal, é que ao professor não passem desper-
cebidos aqueles “segredos” que existem nas sociedades, ou que não caiam nas
armadilhas postas em seu caminho intelectual pelas ideologias vigentes.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Reletindo sobre o tema, examine o que se diz sobre o quadro negro:


O quadro negro fez e faz parte do cotidiano de nossas salas de aula e, desde o
advento da tecnologia, ele tem sido substituído por máquinas tais como o retro-
projetor, o multimídia e o data-show. Aliás, é sobre a tecnologia que falaremos
agora. Os novos recursos postos a nosso serviço em sala de aula podem nos indu-
zir a outro excesso, tão prejudicial quanto contar só com a lousa tradicional ou

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


81

as aulas expositivas, que se alongam por horas a io.


A esse respeito, Karnal (2004) faz uma importante observação sobre o coti-
diano de nossa prática pedagógica. “Há algumas décadas houve um equívoco
expressivo na modernização do ensino. Julgou-se que era necessário introduzir
máquinas para se ter uma aula dinâmica”. E, nesse intuito, “multiplicaram-se os
retroprojetores, os projetores de slides e, posteriormente, os ilmes em sala de
aula” (KARNAL, 2004, p. 9).
O autor não se insurge contra o acréscimo de recursos em prol da apren-
dizagem, mas sim quanto a uma nova hipertroia que demonstra um excesso.
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Independentemente da tecnologia utilizada em sala de aula, o que realmente


importa é a intervenção do mediador, no caso o professor ou o intelectual que
responde a questionamentos.
A produção do conhecimento se faz de maneira formal, mas também a par-
tir do informal, do cotidiano e da experiência do aluno.
Le Gof (1983 apud NEVES, 2002), quando discute esse tema do que é impor-
tante em História ou como a disciplina deve ser ensinada, nos remete a uma
relexão sobre o seguinte: o que se discute não é o ensino, mas sim a produção
do conhecimento histórico no seu sentido mais restrito e especíico.
Ainda no interesse de organizar o pensamento para o docente da disciplina,
o autor aponta “para os imprescindíveis elementos de ordenação do conheci-
mento histórico”, tais como: “o que aconteceu? Como aconteceu? Quando, em
que ritmo aconteceu?”, pois sem tais questões não se constroem os processos e as
explicações gerais. E mais “que isso não se faz uma ciência da história” (NEVES,
2002, p. 163).

EXEMPLIFICANDO:

Ao se trabalhar com os povos indígenas, por exemplo, é possível oferecer aos


alunos trechos de documentos que retratam situações do cotidiano destes povos.
Abaixo, apresentamos a cerimônia de casamento para dois destes povos indí-
genas distintos.

A Formação do Professor e o Cotidianode Sala de Aula


82 UNIDADE II

POVO BORORO POVO SURUÍ


Entre os índios Bororo, a moça prepara A cerimônia de casamento acontece
uma refeição e, acompanhada pela da seguinte forma: o noivo, com sua
mãe, leva o alimento à cabana onde rede nas costas, aproxima-se do grupo
mora e o rapaz por volta do meio-dia. onde estão todas as mulheres da aldeia
A mãe da moça entrega o alimento ao e chama sua noiva.
rapaz, dizendo: Os dois caminham juntos até o chefe,
- Meu genro, vim com minha ilha que que pronuncia o nome do noivo. O
deseja viver contigo, porque te quer jovem, voltando-se para a noiva, diz
bem. “Icê taukana emrikó” (“você é minha
mulher”) e ela responde: “icê taukana
Depois que a moça e a mãe se retiram,

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imena” (“você é meu marido”).
o jovem toma a decisão: se quer casar
com ela, saboreia o alimento oferecido; Em seguida, o noivo oferece à noiva
se não quer casar, não o come. mel e carne de jabuti, alimentos muito
apreciados por esse povo.
Então o rapaz encarrega sua mãe de
devolver a vasilha cheia ou vazia à mãe Fonte: MUNDUKURU, D. Coisas de Ín-
da moça juntamente com a resposta. dio. São Paulo: Callis, 2000, p. 25.
Fonte: MELATTI, J. C. Índios do Brasil.
São Paulo: Hucitec, 1993, p. 126.

Ao comparar dois textos sobre o casamento entre o povo Bororo e Suruí, é neces-
sário levar os alunos a traçar diferenças e semelhanças, e, ainda, comparar as
cerimônias de casamento da atualidade e da comunidade da qual os alunos per-
tençam. Para isto pode-se, ainda, sugerir que façam uma entrevista com alguém
da família que tenha se casado para que este relate como foi a cerimônia.
Percebe-se que, fazendo este tipo de intervenção pedagógica, o professor está
sendo muito mais que um simples transmissor de conteúdo, ele passa a ser um
mediador entre o conhecimento histórico e o sujeito, no caso o aluno.
Os detalhes introduzidos em nossa prática didática em sala de aula podem
parecer insigniicantes à primeira vista, mas são os responsáveis pela nossa
eicácia docente.
O que e como ensinar é algo que passa muito além dos temas que envolve
nossa investigação e tratamento metodológico, mas, sobretudo, põe à prova a
nossa verdadeira capacidade de comunicação do que sabemos. “A produção his-
toriográica busca estabelecer diálogos com o seu tempo, reairmando o adágio
que ‘toda a história é ilha do seu tempo’, mas sem ignorar o fruto de muitas tra-
dições de pensamento” (KARNAL, 2004, p. 9). Assim, da mesma forma que não

TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


83

podemos descartar as boas heranças do passado ou só coniar nas necessidades


do presente, temos de entender o que existe de verdade na dinâmica da inovação.
Ainda sobre isso, o autor menciona “que seja dito e repetido à exaustão: uma
aula pode ser extremamente conservadora e ultrapassada contando com todos
os mais modernos meios audiovisuais. Uma aula pode ser muito dinâmica e ino-
vadora utilizando giz, professor e aluno” (KARNAL, 2004, p. 9).
Isso signiica que o importante é a nossa concepção de História nas opções
que fazemos, e que devem sempre levar em conta o aluno e suas necessidades,
curiosidade, indagações e pré-requisitos ou recursos intelectuais prévios, que
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variam de um para outro, sempre.


Le Gof, pelos comentários de Joana Neves (2002, p. 166), nos permite uma
conclusão: a história como disciplina escolar não deixa nunca de ser história
ciência, mas necessita partir “de um conjunto de provocações” que encaminhem
para o verdadeiro saber histórico.
O educador frances Edgar Morin, em entrevista à Revista Nova Escola, acre-
dita que instigar a curiosidade da criança é a melhor forma de despertá-la para o
saber. No nosso caso, o saber histórico. Para o autor, “se vivemos em um mundo
complexo e interligado, e novas informações nos fazem, a toda hora, mudar de
planos, por que a escola ainda teima em ensinar certezas e conhecimentos que
parecem únicos e absolutos?” (MORIN, 2003, p. 36-37). Diante de suas inquie-
tações pela forma como a educação caminha, o autor fez um estudo sobre quais
seriam os temas que não poderiam faltar para formar o cidadão do século XXI.
Dessa forma, nasceu “Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro”, texto
que serviu de base para a elaboração de nossos Parâmetros Curriculares Nacionais,
entre outros documentos.

A Formação do Professor e o Cotidianode Sala de Aula


84 UNIDADE II

Mas, o que tem essa proposta de diferente? Ela coloca o ser humano e o
planeta no centro do ensino. “É preciso aprender sobre a condição humana, a
compreensão e a ética, entender a era planetária em que vivemos e saber que
o conhecimento, qualquer que seja ele, está sujeito ao erro e à ilusão”, adverte
Edgar Morin (2003, p. 36-37).
O autor ainda acrescenta que é no cotidiano da sala de aula que tudo acon-
tece. Por esse motivo, a nossa responsabilidade enquanto professores aumenta.
Precisamos ser mais que professores, como nos lembra Rubem Alves. Temos
que ser EDUCADORES.

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TENDÊNCIAS E PERSPECTIVAS DO ENSINO DE HISTÓRIA


85

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta segunda unidade, passamos a estudar as mudanças e permanências dos


métodos do ensino de História e, assim como devemos fazer com nossos alunos,
nos propomos a destacar o que mudou e o que permaneceu como concepção de
História ao longo do último século e início deste século XXI. O que merece des-
taque é o entendimento de que hoje todos somos sujeitos da História e não mais
somente os heróis, como queriam os ilhos da escola metódica.
Entendemos que ensinar História vai além da exposição de fatos e datas por
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

parte do professor; e ao aluno cabe a responsabilidade de ser sujeito de seu pró-


prio processo de aprendizagem. Para tanto, o professor deve escolher mais do
que conteúdos de História. O educador deve selecioná-los e encontrar meios
para que instigue a curiosidade no alunado, fazendo-os buscarem as respostas
para as perguntas referentes a um grupo social de modo especíico, e/ou a huma-
nidade de modo geral.
Desse modo, no ensino de história, é necessário considerar os repertórios
trazidos pelos alunos, suas vivências e o contato com o meio e com os outros,
o que dá condições a estes para construir conceitos históricos. Isso exige, como
vimos, que o professor valorize duas questões: Respeitar o conhecimento do
aluno, seu conjunto de representações que foi construído com sua história, e por
im entender que ele é capaz de formular suas próprias ideias a partir das repre-
sentações que traz para a sala de aula.
Também estudamos que o espaço e o tempo de aprendizado é extremamente
ininito, se considerarmos o ambiente virtual, e o mediador do processo para a
compreensão do pensamento de determinada época é o professor. Portanto, ser
professor é uma tarefa complexa, porém apaixonante, vocês não acham?
Na próxima unidade nos limitaremos ao estudo dos documentos históricos
e às possibilidades dos seus usos em sala de aula.

Considerações Finais
86

1. Faça a leitura do texto abaixo para posicionar-se criticamente diante da ta-


refa de exercer a proissão docente e sua prática pedagógica voltada para o
ensino de História, considerando todas as especiicidades do mundo atual.
“As grandes mudanças políticas e econômicas ocorridas no inal do século XX causa-
ram muita perplexidade entre professores e estudantes de História em geral, crian-
do, em certos círculos, atitudes de ceticismo com relação ao próprio conhecimento
histórico, o valor do ensino de História nas escolas e seu potencial transformador.
Por outro lado, diante da difusão das novas tecnologias globais, questiona-se e até
duvida-se da eicácia educacional dos livros (considerados, com freqüência, um
meio de comunicação desinteressante e obsoleto), da utilidade dos professores
como agentes de ensino (tidos como comunicadores inábeis e incompetentes) e
das propostas curriculares ligadas às realidades nacional e local (vistas como inade-
quadas e ultrapassadas). Procurando acompanhar as mudanças, os novos tempos,
muitos professores acabam comprando a idéia de que tudo que não é muito veloz
é chato. Na sala de aula, o pensamento analítico é substituído por “achismo”, alunos
trocam a investigação bibliográica por informações supericiais (e não complemen-
tar) livros. E o passado, visto como algo passado, portanto superado, tem tanto inte-
resse quanto o jornal do dia anterior”.
Fonte: Pinsky (2004, p. 17).
2. Consagrando-se como tendências atuais, a partir do im da década de 1980,
criaram-se várias propostas curriculares de História para o Ensino Fundamental.
Desse modo, espera-se que ao inal deste segmento (Ensino Fundamental) os
alunos tenham desenvolvido diversas habilidades. Descreva estas habilidades,
discorrendo sobre elas.
3. As inalidades do ensino da história têm sido objeto de preocupação de vários
historiadores brasileiros e de outros países. Essa preocupação é tanto maior à
medida que alguns acontecimentos históricos apontam questões relativas aos
conteúdos e objetos do ensino da história, e também à construção da democra-
cia e dos direitos humanos. Nesta perspectiva, enumere três motivos para que
ensinemos história às crianças dos anos iniciais do Ensino Fundamental.
4. Para Karnal (2004), o “fazer histórico”, ou seja, ensinar História está submetido
a duas transformações constantes: do objeto em si e da ação pedagógica. Isto
acontece por que:
I. As novas descobertas arqueológicas, os debates metodológicos, as novas docu-
mentações mudam constantemente.
II. O fazer histórico é mutável no tempo, sendo assim, mudam-se também seus
agentes.
III. A ação pedagógica não pode icar presa ao passado, pelo contrário, precisa
acompanhar tais mudanças sociais e de mentalidade.
87

IV. A ação pedagógica precisa se concentrar apenas no presente onde tudo aconte-
ce no exato momento em que nossos alunos estão estudando.
É correto o que se lê em:
a. I e II, apenas.
b. II e IV, apenas.
c. I, II e III, apenas.
d. II, III e IV, apenas.
e. I, II, III e IV.
5. A Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996 (Lei Federal n. 9.394) procurou
readequar os conteúdos das ciências na direção da democracia e verdadeira ci-
dadania. Sendo assim, foram produzidos os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs, 1997) programados para servirem de referência em conteúdos e metodo-
logias de ensino para a estruturação escolar brasileira. Sobre o assunto é correto
airmar que:
I. Na área de História, os Parâmetros Curriculares Nacionais tiveram como proposta
fundamental a modiicação da estrutura dos conteúdos até então apresentados.
II. A ideia básica era a transformação dos conteúdos organizados de forma linear
em eixos temáticos.
III. Os PCNs são guias didáticos que, se seguido “ao pé da letra”, a aula se torna muito
mais signiicativa.
IV. Um dos objetivos do Ensino de História, segundo os PCNS, é levar o aluno a se
apropriar do patrimônio da humanidade e modiicá-lo sempre que necessário.
É correto o que se airma em:
a. I e II, apenas.
b. II e IV, apenas.
c. I, II e III, apenas.
d. II, III e IV, apenas.
e. I, II, III e IV.
88

Isabel Barca, historiadora portuguesa, fala sobre o ensino de História para a Revista Nova
Escola (2013)
Muitas pessoas ainda acham que a disciplina de História é uma complexa reunião de
datas, fatos, lugares e personagens de outrora. Talvez por isso se pense que a disciplina
trata do passado longínquo de sociedades das quais nem os estudantes nem os educa-
dores participaram. Isabel Barca mostra por que essa ideia é equivocada. Dedicada ao
estudo do ensino de História para a Educação Básica, ela defende a importância de um
trabalho em sala com recortes temáticos, que estabeleça ligações entre o ontem e o
hoje e faça dos alunos sujeitos históricos.
Faz sentido apresentar os fatos históricos em ordem cronológica ou esse é um
modo de trabalhar ultrapassado?
ISABEL BARCA Ensinar História de modo linear faz com que os estudantes lembrem so-
mente os marcos cronológicos. Com isso, a moçada se torna incapaz de relacionar tem-
pos distintos e compreender em profundidade o mundo em que vivemos. O ideal é que
o educador trabalhe em sala com recortes temáticos, estabelecendo relações entre o
passado e o presente, sem jamais negligenciar a temporalidade. Se essas duas questões
não forem levadas em conta, a turma pode ter uma compreensão limitada da disciplina
e da história propriamente dita, formulando ideias vagas e genéricas, o que contribui
para o não-entendimento das causas e consequências dos fenômenos estudados.
Como conduzir uma atividade de interpretação de objetos antigos?
ISABEL BARCA O professor deve propor uma observação cuidadosa do objeto. Depois
disso, ele tem de fazer perguntas não muito complicadas para os alunos sobre o passa-
do. Podemos convidá-los a imaginar a vida das pessoas a quem ele pertencia. Para que
era usado? De que maneira? De onde essas pessoas eram? A análise das respostas ajuda
a entender até que ponto as crianças ultrapassam a simples materialidade dos exempla-
res, se os relacionam com uma comunidade e um estilo de vida e de que forma o fazem.
É o início de um pensamento histórico.
Investigar objetos de família ajuda as crianças a relacionar a história de vida delas
com a História em geral?
ISABEL Sim, desde que aprendam a pensar historicamente com esses utensílios, saindo
do aqui e agora. Para isso, o professor tem de ajudar o grupo a relacionar as peças com
outros tempos e pessoas que podem estar próximas deles em termos geográicos e fa-
miliares, mas que tiveram outra forma de viver. No entanto, não é satisfatório estudar
somente o histórico da peça em questão. É necessário ensinar a garotada a generalizar
situações e conceitos.
O que é fonte histórica e documento histórico? Há diferenças entre eles?
ISABEL Segundo alguns especialistas, como o inglês Robin George Colingwood (1889-
1943) e o francês Marc Bloch (1886-1944), qualquer vestígio do passado é fonte. Cabe
89

aos historiadores e a qualquer pessoa que queira pensar historicamente fazer uma per-
gunta sobre a História e, em função dela, selecionar as fontes e extrair delas as respostas.
Esses traços do passado não são só os deixados pelos agentes do período estudado.
Outras fontes, construídas posteriormente, também são interessantes, incluindo o tra-
balho de estudiosos que já exploraram o mesmo tema. O termo documento histórico,
por sua vez, tem diversas acepções entre os especialistas. Preiro usá-lo para deinir fon-
tes históricas com valor legal ou institucional. Não signiica que os documentos tenham
mais valor que as fontes. Muitas vezes apresentam um ponto de vista conveniente para
a instituição que representam.
Qualquer fonte ou documento histórico pode ser analisado na escola?
ISABEL De modo geral, sim. Mas devemos usar o que for acessível aos alunos com os
quais trabalhamos. Os materiais não podem ser complexos a ponto de impedir a turma
de lidar com eles. Há estudos em Portugal que mostram que os alunos tendem a ter
mais facilidade de entender a História por meio de suportes escritos. No mais, há fontes
visuais superelaboradas, difíceis para jovens com pouca experiência. Por im, temos de
considerar o tempo disponível para a realização da atividade, fazendo uma adequação
realista das fontes às situações escolares.
Como planejar aulas que não desencadeiem uma interpretação parcial da história?
ISABEL É fundamental não só garantir a variedade de fontes, como considerar a pers-
pectiva de cada uma e planejar momentos diferentes para estudá-las. Por exemplo: o
imperador conhecido como dom Pedro I no Brasil e dom Pedro IV em Portugal tem uma
imagem muito mais positiva para os portugueses do que para os brasileiros. Apresentar
dois trechos da historiograia de cada país que mostrem as imagens contraditórias do
personagem e pedir que as crianças dissertem sobre isso não é tão rico. É mais interes-
sante que elas analisem os dois trechos de forma isolada para depois buscar similarida-
des e diferenças, questionando as distintas perspectivas.
Há fontes históricas mais indicadas para explorar em cada etapa da escolaridade?
ISABEL Não. Para eleger os materiais apropriados, que possibilitem o ensino dos conte-
údos e o pensar histórico, é preciso analisar a situação da classe. A decisão não tem a ver
com a idade dos estudantes, e sim com o letramento histórico alcançado por eles. Além
disso, o que é mais próximo da turma hoje não é só o que está no entorno. As crianças
e os jovens têm muito contato com a TV e com a internet e, por isso, algo que para os
adultos pode parecer longínquo no tempo e no espaço para eles é mais próximo.
Fonte: Revista Nova Escola (2013, on-line)4
MATERIAL COMPLEMENTAR

Sobre História
Eric J. Hobsbawm
Tradutor: Cid Knipel Moreira
Editora: Companhia das Letras
Sinopse: nesta coleção de ensaios, muitos ainda
inéditos, Eric Hobsbawm relete sobre prática e teoria da
disciplina que fez sua justa fama como um dos maiores
historiadores contemporâneos. Em suas relexões sobre
o papel do historiador, Hobsbawm analisa problemas
da ordem do dia, como: a identiicação das identidades
nacionais na Europa e o uso ideológico do discurso
histórico naquele contexto; um balanço dos 150 anos
do Manifesto Comunista; as relações entre história e
economia; o signiicado da redução da narrativa histórica à mera variante da narrativa; as modas e
vertentes da historiograia contemporânea; a noção de progresso no conhecimento histórico.

Ensino de História: fundamentos e métodos


Circe Maria Fernandes Bittencourt
Editora: Cortez
Sinopse: este livro aborda aspectos de ensino e
aprendizagem de História do ponto de vista dos
problemas teóricos que fundamentam o conhecimento
escolar e dos problemas das práticas em sala de aula.
A História, enquanto conhecimento escolar, possui
uma história que é brevemente apresentada, a im de
proporcionar ao leitor relexões sobre o atual momento
da disciplina no processo de reformulações curriculares.
O livro preocupa-se em fornecer fundamentos sobre
a seleção de conteúdos e métodos para os futuros
professores ou para os que já estão enfrentando o
trabalho nas salas de aula.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Um Historiador Fala de Teoria e Metodologia


Ciro Flamarion Cardoso
Editora: EDUSC
Sinopse: coletânea de ensaios em que o autor discute
questões pertinentes ao ofício do historiador. Tal leitura
complementa nossas discussões.

Os sete saberes necessários a Educação do Futuro


Edgar Morin
Editora: Cortez
Sinopse: nesta obra, o autor traz a sistematização de
um conjunto de relexões que servem como ponto de
partida para se repensar a educação do século XXI. Os
sete saberes indispensáveis enunciados por Morin, objeto
do presente livro: as cegueiras do conhecimento; o erro
e a ilusão; os princípios do conhecimento pertinente;
ensinar a condição humana; ensinar a identidade terrena;
enfrentar as incertezas; ensinar a compreensão; a ética do
gênero humano, são eixos e, ao mesmo tempo, caminhos
que se abrem a todos os que pensam e fazem educação
e que estão preocupados com o futuro das crianças e
adolescentes.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

O Triunfo
Ano: 2006
Gênero: Drama
Direção: Randa Haines
Sinopse: Ron Clark é um jovem professor de História, criativo
e idealista, sai de sua pequena cidade da Carolina do Norte
para ensinar, em uma escola pública de Nova York. Através
da utilização apaixonada de regras especiais para a sua sala
de aula, ensinando técnicas altamente inovadoras e uma
inesgotável devoção aos seus alunos, Clark é capaz de fazer
uma notável diferença nas vidas de seus alunos.

Parâmetros Curriculares Nacionais – História e Geograia


Acesse <http://portal.mec.gov.br/seb/arquivos/pdf/livro051.pdf> e conheça os parâmetros que
permeiam os caminhos do Ensino de História em nossas escolas.
93
REFERÊNCIAS

AQUINO, R. S. L.; FRANCO, D. A.; LOPES, O. G. C. História das sociedades. v. 2. Rio de


Janeiro: Ao Livro Técnico, 1980.
BEZERRA, H. G. Ensino de história: conteúdos e conceitos básicos. In: KARNAL, L.
(Org.). História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. 2. ed. São Paulo:
Contexto, 2004.
BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cor-
tez, 2004.
______. O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2004. (Coleção Re-
pensando o ensino).
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-o-ensino-de-historia>. Acesso em: 4. abr. 2017.
95
GABARITO

1) A resposta é subjetiva, contudo espera-se que você, caro acadêmico, possa rele-
tir sobre a sua própria prática pedagógica a partir do estudo desta unidade, bem
como a partir da leitura deste excerto.
2) São várias as habilidades que precisamos desenvolver em nossos alunos:
■ Identiicar o próprio grupo de convívio e as relações que estabelecem com
outros tempos e espaços;
■ Organizar alguns repertórios histórico-culturais que lhes permita localizar
acontecimentos numa multiplicidade de tempo, de modo a formular expli-
cações para algumas questões do presente e do passado;
■ Conhecer e respeitar o modo de vida de diferentes grupos sociais, em di-
versos tempos e espaços, em suas manifestações culturais, econômicas,
políticas e sociais, reconhecendo semelhanças e diferenças entre eles;
■ Reconhecer mudanças e permanências nas vivências humanas, presentes
na sua realidade e em outras comunidades, próximas ou distantes no tem-
po e no espaço;
■ Questionar sua realidade, identiicando alguns de seus problemas e rele-
tindo sobre algumas de suas possíveis soluções, reconhecendo formas de
atuação política institucionais e organizações coletivas da sociedade civil;
■ Utilizar métodos de pesquisa e de produção de textos de conteúdo histó-
rico, aprendendo a ler diferentes registros escritos, iconográicos, sonoros;
■ Valorizar o patrimônio sociocultural e respeitar a diversidade, reconhecen-
do-a como um direito dos povos e indivíduos e como um elemento de for-
talecimento da democracia.
3) São vários os motivos, dentre eles podemos citar:
■ Contribui para a construção da cidadania;
■ Colabora no desenvolvimento de raciocínios historicamente corretos;
■ Permite formular questões que permeiam nosso cotidiano;
■ Possibilita a aquisição do diálogo entre presente-passado;
■ Analisa fatos cotidianos como processos históricos;
■ Localiza e identiica acontecimentos no tempo e no espaço;
■ Relete a atuação do homem em sociedade e as transformações no espaço
ocorridas em detrimento de suas necessidades.
4) Alternativa “C”.
5) Alternativa “A”.
Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão

III
A UTILIZAÇÃO DOS

UNIDADE
DOCUMENTOS HISTÓRICOS
EM SALA DE AULA

Objetivos de Aprendizagem
■ Aguçar o interesse pelas várias formas de acesso ao conhecimento
histórico e diferentes fontes e linguagens: fotograia, vídeo, pintura,
textos e documentos de época.
■ Desenvolver habilidades de observação, identiicação e
compreensão, além da própria linguagem (forma, estética,
composição do todo), para estabelecer relação entre forma e
conteúdo das fontes históricas.
■ Aprender a utilizar didaticamente documentos históricos em sala de
aula.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■ Historiadores e professores: diferentes usos das fontes históricas
■ A análise didática de uma fonte histórica
■ Documentos escritos e não escritos
■ A construção do conhecimento por meio das fontes históricas
99

INTRODUÇÃO

Desde que o conceito de documento foi ampliado, da posição de um positivista


(ou metódico) para um neo-historiador, houve um enriquecimento quanto às
fontes possíveis para um historiador. O uso das fontes históricas passou a incluir
não só o documento escrito em seu sentido restrito, como foi ampliado para
outros materiais disponíveis.
Contrariamente ao que Charles Langlois ou Seignobos (positivistas) defen-
diam, Marc Bloch (1886-1944) airmava que a História dispõe de um leque de
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

documentos dos escritos aos arqueológicos, passando pelos artísticos entre outros.
(BOURDÉ; MARTIN, 1990).
Portanto, o autor levantou a hipótese de se consultar certidões de batismo e
outros documentos pessoais e oiciais, que constavam nos arquivos municipais,
estaduais e até nacionais, observar imagens pintadas ou esculpidas, o mobiliário
dos túmulos e inscrições das lápides, crônicas, cartas do passado, objetos retira-
dos de escavações arqueológicas entre outros.
O diferente uso das fontes históricas inclui a análise didática de uma fonte
histórica e a construção do conhecimento por meio dessas fontes. Por esse
motivo, Bloch insistia que a formação de um historiador deveria obedecer a um
cuidadoso processo, que o preparasse corretamente para aquele que chamava
de “ofício” de historiar.
Por isso, caro estudante, nesta nova unidade você compreenderá os diferentes
usos das fontes históricas pelos historiadores e professores. Além disso, conhe-
ceremos os processos de análise didática de uma fonte histórica, isto porque a
fonte em si não é produzida com ins didáticos. É preciso fazê-la “falar”, para ser
usada como um recurso didático, e desenvolver a aprendizagem em nossos alunos.
Ademais, faremos a distinção entre os documentos escritos e não escri-
tos e, para isso, utilizaremos como referência os estudos da historiadora Circe
Bittencourt.

Introdução
100 UNIDADE III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
HISTORIADORES E PROFESSORES: DIFERENTES
USOS DAS FONTES HISTÓRICAS

Marc Bloch (1976) insistia não apenas em explorar novos documentos, mas tam-
bém em descobrir novos “domínios” para a História, ou seja, tentava alargar o
campo da História para outras direções.
Orientava seus estudos, por exemplo, para a análise dos fatos econômicos e,
nesse ponto, foi inluenciado “sem o reconhecer explicitamente, pela obra de Karl
Marx, que o incita a relacionar as estruturas econômicas e as classes sociais”. Ou,
ainda, foi inspirado por outros historiadores como Henry Hauser, com relação
aos estudos em que se ocupava da apreciação das lutuações econômicas, com
base em séries de preços (BOURDÉ; MARTIN, 1990, p. 226).
Aquilo que ele preconizava para todo aquele que aspirasse à ciência histórica,
ele aplicou aos seus próprios trabalhos, dos quais um dos maiores foi: “Os carac-
teres originais da história rural francesa, do século XI ao século XVIII” de 1931.
Além do culto às origens e do correto enquadramento no tempo que se exige
de toda obra histórica, Bloch observou as formas de ocupação do solo (espaço

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


101

e produção), as técnicas produtivas e os modos de povoamento (demograia), e


também as práticas comunitárias (realidade/imaginário), tudo contextualizado
na longa duração e em relação ao conjunto do território nacional. Desse modo,
o autor deu o modelo básico para as vias que levaram os neo-historiadores as
suas pesquisas e seus resultados, ao longo de todos os tempos até a atualidade.
Bloch escreveu: “É bom que o historiador possua pelo menos uns laivos das
principais técnicas do seu ofício”. Saber epigraia, paleograia, diplomática, arque-
ologia, estatística e história da arte é algo necessário a “um autêntico proissional
da história” que, além disso, precisa conhecer “as ciências vizinhas” tais como
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

“a geograia, a etnograia, a demograia, a economia, a sociologia, a lingüística”


(BLOCH, 1976 apud BOURDÉ; MARTIN, 1990, p. 227).

Se considerarmos a graia das palavras veremos que é possível compreen-


dê-las e entender o quanto elas têm relação direta com a História, por exem-
plo: a epigraia é uma ciência que estuda as inscrições feitas em pedras e
metais. A paleograia é a ciência que se dedica a decifrar os escritos antigos
e, por im, a arqueologia estuda os monumentos e vestígios de civilizações
antigas.
Fonte: a autora.

Bloch (1976), sentindo a diiculdade de preencher tais requisitos, então sugere:


se não for possível conseguir a multiplicidade das competências num
mesmo homem (o historiador) pode-se encarar uma aliança das técni-
cas praticadas diferentes eruditos, sendo que isto supõe a organização
de um trabalho por equipes, o que reagrupa especialistas de diversas
disciplinas (apud BOURDÉ; MARTIN, 1990, p. 127).

Em sua obra “Introdução à História” (1976), Bloch traz a tona uma pergunta
feita a um pai historiador por seu ilho: “Para que serve a História?” e esclarece
que a obra se destinará a responder esta pergunta.

Historiadores e Professores: Diferentes Usos das Fontes Históricas


102 UNIDADE III

A História, como um “profeta com o olhar voltado para o passado”, segundo


Eduardo Galeano, é para Bloch “uma ciência dos homens no tempo, que, sem ces-
sar, precisa unir o estudo dos mortos ao estudo dos vivos” (BLOCH, 1976, p. 15).
O historiador deve ter a “paixão de compreender, o que implica que renuncie,
tanto quanto possível ao juízo de valor” ou àquilo que é dominado pelo antropo-
centrismo do bem e do mal. Para Bloch (1976), o parecer do historiador é o do
sábio, que examina sempre os dois lados de uma questão com isenção de ânimo.
Para nos livrar da mania de colocar sempre uma superioridade humana
(donde antropos em grego= homem, sediar o núcleo da concepção), Bloch (1976,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
p. 70) lembra que, para penetrar numa consciência alheia, é preciso que nos des-
pojemos “de nosso próprio eu”.
O saber objetivo, ainda que não absoluto, entra no rol de metas de um his-
toriador que procura “compreender o passado a partir do presente” (1976, p. 11)
ou, numa via de duas mãos, “compreender o presente à luz do passado” (1976,
p. 13). Aliás, o autor enfatiza sempre que é o perpétuo “vaivém entre passado e
presente” que permite “enriquecer o conhecimento das sociedades antigas e escla-
recer sobre ela mesma e a sociedade actual” (BOURDÉ; MARTIN, 1990, p. 128).
Dessa forma, perante manuscritos, escritos gráicos, epigráicos e materiais de
toda sorte, desde moedas até selos, o historiador tem de saber “conversar”, o que
equivale a “dialogar atentamente” com suas fontes, como recomenda Marc Bloch.
A metodologia do Ensino de História inclui, em seus capítulos mais impor-
tantes, o uso das fontes históricas e suas análises didáticas.
Na perspectiva histórica da Escola dos Annales, fundada por Frebvre e Marc
Bloch, é proposta a utilização de diversos tipos de fontes, não se restringindo
apenas à utilização da história política, dos grandes feitos, como propunham os
positivistas. Isto porque,
diante dessas considerações conigura-se a necessidade da utilização de
diversas metodologias, fontes e linguagens para a construção de uma
História mais atrativa para os jovens desinteressados e desmotivados
diante de repetições, decorações e nulidade analítica. Dentre as lingua-
gens que podem ser abordadas no estudo da História estão a literatura,
a música, a cultura material e imaterial, o teatro, as artes plásticas e o
cinema (FERRAZ; CAVALCANTI, 2006, p. 159).

No entanto, é importante frisar que os historiadores utilizam-se das fontes

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


103

históricas para desvendar a História dos povos em particular ou a sociedade


em geral e, para isto, utiliza-se de métodos cientíicos. No entanto, os professo-
res transformam essas fontes em recursos didáticos, e por esse motivo é preciso
dominá-los.
Isto é o mesmo que dizer que todos os documentos têm uma linguagem que
lhe é própria e, para poder utilizá-la como instrumento pedagógico para a cons-
trução do conhecimento histórico, é necessário dominar as suas especiicidades
enquanto produto cultural e histórico.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A ANÁLISE DIDÁTICA DE UMA FONTE HISTÓRICA

Ensinar História representa um desaio para os professores, como demons-


trado anteriormente, pois há uma permanente necessidade de unir o papel de
docente ao ofício de historiador, o que nem sempre é viável. Além disto, existe
um público estudantil nem sempre disposto a estudar História que, de forma pre-
conceituosa e inadequada, tem sido conotada ao caráter de matéria meramente
decorativa, pouco digna do status de ciência. Tudo isso nos leva a privilegiar,
num momento inicial, conteúdos realmente signiicativos e que permitam todo

A Análise Didática de uma Fonte Histórica


104 UNIDADE III

o suporte didático à tarefa de um professor que ministra aulas de História, com


todos os quesitos que tem de preencher, muitas vezes sem o suporte necessário.
Os materiais didáticos são instrumentos do trabalho docente e se apresentam
como suportes fundamentais na mediação entre o ensino e a aprendizagem. Por isso
mesmo, por meio do uso de documentos oiciais e não oiciais, como reportagem
de jornal, fotograia, ilme, monumento, arte rupestre, carta, música e testemunhos
de personagens que viveram na época, encontramos muitos tipos de documen-
tos históricos que podem facilitar nossa tarefa de mediadores entre o aluno e sua
aprendizagem do método indutivo, que por sua vez caracteriza a História.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Inovar quanto ao ensino de História, por meio de recursos pré-selecionados
que proporcionem aulas mais interessantes e atrativas, viabilizando assim a melhor
aprendizagem é, sem dúvidas, algo necessário para que o aluno compreenda a
História enquanto uma área do conhecimento em construção, e não apenas um
rol de informações quase sem valor sobre o passado. “O processo de conheci-
mento é a grande aventura e o grande desaio que o educador enfrenta quando
prepara suas aulas e quando as envolve com os seus alunos” (RUIZ, 2004, p. 75).
Ultimamente, generalizou-se entre nós o uso de livros didáticos, paradidáti-
cos, ilmes, excertos de jornais e revistas, mapas, dados estatísticos e tabelas, CDs,
DVDs e outros suportes informativos que produzidos (ou não) especialmente
para a escola, exigem dos professores uma análise de sua viabilidade quanto a
promover a verdadeira ciência a serviço da aprendizagem.
Bittencourt (2004) explica como fazer a análise destes suportes informati-
vos e, além do mais, pesquisadores do ensino de História e Geograia do Institut
National de Recherche Pédagogique (INRP) da França nos indicam alguns meios
para tal raciocínio, que decompõe em partes o que vem apresentado em tantos
instrumentos novos a nossa disposição.
Nossa sociedade atual, chamada de Sociedade ou Economia do Conhecimento,
ainda Sociedade Pedagógica, segundo pensadores como Peter Drucker (1993)
ou Michel Serres (1999), assinala a ascensão do conhecimento como um com-
ponente nuclear do capital.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


105

Visto como um bem que gera outro bem, renda ou produção, o capital,
com todos seus componentes (equipamento, patrimônios, títulos, proprieda-
des...) ainda tem por centro de convergência o dinheiro. Ainda porque cada vez
mais se tem por máxima que a socialização da renda se fará por meio do conhe-
cimento. É fácil compreender isso se pensarmos que, sem dinheiro no bolso,
poucos adquirem conhecimento (donde o papel das escolas públicas é cada vez
mais enfatizado), porém sem conhecimento, o dinheiro no bolso escasseia na
mesma medida em que o conhecimento o enche.
Além disso, estamos em um tempo em que as novas tecnologias propiciam
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

o conhecimento e tornam seu acesso possível para um grande número de pes-


soas, e não apenas aos professores, como ocorria no passado.
A informação transpôs os limites da sala de aula após a Revolução da
Informática, quando em 1993 a Internet permitiu a “globalização”, criando um
ciberespaço onde se pôde falar em uma cibercultura.
Segundo Pierry Lévy, em seu livro “Cibercultura” (1999), ciberespaço é o
novo meio de comunicação que surge da interconexão mundial dos computa-
dores, especiicando não só a infraestrutura, mas o universo de informações e
os próprios seres humanos que o movimentam.
A partir do acesso às novas tecnologias, portanto, foram criados novos espa-
ços do conhecimento tanto nas empresas, domicílios e espaços sociais, assim
como nas escolas. Tal conhecimento se relete nas múltiplas oportunidades de
aprendizagem que, agora, cabe à escola selecionar e rever criticamente, sempre
no sentido de melhorar, inovar e conservar o melhor do tradicional, dos “clás-
sicos” autores e saberes do passado.
Nesta perspectiva de inovar enfocamos o ensino de História. Nosso obje-
tivo centra-se em propiciar à sociedade uma nova forma de pensar esse ensino,
voltada para uma aprendizagem por excelência, oportunizando compreender o
homem como um todo, dentro de uma visão holística, por meio de uma aborda-
gem mais próxima da realidade cotidiana do educando e, portanto, signiicativa.

A Análise Didática de uma Fonte Histórica


106 UNIDADE III

Por holístico, da palavra grega holos, entendemos a concepção pela qual


o homem é um todo. Tal pensamento nos informa que o ser humano é um
todo, em que o espírito move a mente e esta move o corpo, ou seja, “somos
aquilo que pensamos”.

A abordagem holística nos permite ver o aluno como um ser anímico total, e

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
não apenas uma máquina de aprender.
Segundo Antunes (2001, p. 30), “a aprendizagem signiicativa é o processo
pela qual uma nova informação se relaciona de maneira não arbitrária e substan-
tiva (não literal) à estrutura cognitiva do aprendiz”, ou seja, é uma aprendizagem
que tem signiicado para o aluno, dirigindo-o à construção do conhecimento.
Bittencourt (2004, p. 190) se serve dos ensinamentos de Paulo Freire para
lembrar que:
cabe ao professor [...] reconhecer e estabelecer um diálogo com esse co-
nhecimento, porque os alunos estão sempre em processo de aprender
mais e não são absolutamente sujeitos acomodados; ademais, adverte-
-nos o grande educador, o conhecimento não é um dado imobilizado
apenas transferido de um especialista para outra pessoa que ainda não
o possui.

Portanto, a tarefa de estabelecer signiicados envolve estabelecer a ponte entre


leitura, interpretação e correta assimilação das informações, com vistas ao
pensamento autônomo. É uma tarefa complexa, que envolve sempre levar da
memorização pura e simples às análises críticas e ao pensamento crítico, que
se expressa nas conclusões ou sínteses que elaboramos com base nas informa-
ções recebidas.
É nesse sentido que a seleção de materiais, seguida de uma análise que dará
o diagnóstico sob sua viabilidade, tendo em vista o melhor aproveitamento do
aluno, é sempre necessária.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


107
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

DOCUMENTOS ESCRITOS E NÃO ESCRITOS

Muitos autores contemporâneos como Bittencourt (2004) ou Cardoso (1997),


defendem a ideia de utilizar documentos históricos como um recurso inovador
adequado ao ensino de História. Bittencourt também recorre ao Institut National
de Recherche Pédagogique francês para explicar o que tal pesquisa pedagógica
signiica, em conexão com o conceito de documento, de acordo ao que foi esta-
belecido conforme nossa visão de neo-historiadora:
todo conjunto de signos, visuais ou textuais, que são produzidos em
uma perspectiva diferente dos saberes das disciplinas escolares e poste-
riormente passam a ser utilizados com inalidade didática. (...) Contos,
lendas, ilmes de icção ou documentários televisivos, músicas, poemas,
cartas, romances são documentos produzidos para um público bastan-
te amplo que, por intermédio do professor e seu método, se transforma
em materiais didáticos (BITTENCOURT, 2004, p. 296).

Dentro de tal categoria, portanto, podemos inserir documentos escritos e


não escritos, que podem ser utilizados pelos educadores em sala de aula desde
os anos iniciais do Ensino Fundamental. Sua inalidade, já assinalada, será a de
desenvolver habilidades cognitivas, como a capacidade de observar, interpretar

Documentos Escritos e Não Escritos


108 UNIDADE III

e extrair informações dessa “fonte”, sempre em conexão com a realidade vivida.


É, portanto, uma maneira de possibilitar o contato com o “real”, por meio das
situações concretas de um passado abstrato, tornando as aulas mais atrativas e
dinâmicas.
Para Napolitano (2004, p. 149), “nos últimos anos tem sido cada vez mais
freqüentes o uso de ‘novas linguagens’ não só para motivar os alunos, mas para
tentar ‘atualizar’ a concepção de documento histórico”.
Bittencourt (2004, p. 330) aponta o principal objetivo,
[...] favorecer sua exploração pelos alunos de maneira prazerosa e in-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
teligível, sem causar muitos obstáculos iniciais. É preciso cuidado para
que os documentos forneçam informações claras, de acordo com os
conceitos explorados, e não tornem difícil a compreensão das infor-
mações.

Tudo que foi abordado, juntamente com a possibilidade de ampliar o leque e


a utilização de documentos aberta pela Nova História, sem sombra de dúvidas
facilita e moderniza o trabalho de um professor de História. Contudo, se faz
necessário seguir algumas recomendações para a utilização didática dos docu-
mentos históricos, a saber:
1. O documento deve ser interrogado com base no problema estu-
dado, ou seja, ele não fala por si mesmo. Por esse motivo se faz
necessário questioná-lo com base nos objetivos que se quer atingir
e na relação entre presente e passado;
2. É preciso considerar o método, ou seja, os procedimentos que vão
orientar a observação, identiicar ideias, temas e contextos, descre-
ver aquilo que foi identiicado no documento, distinguir relações
de oposição, associação e identidade, bem como interpretar dados;

3. A estratégia didática mais eiciente é aquela que considera sua for-


ma material, gráica e discursiva tanto quanto seu conteúdo, que
permitam compreendê-lo segundo o contexto de sua produção.

É preciso, agora, diferenciar os documentos escritos e não escritos que


se apresentam para a utilização em sala de aula, portanto, à disposição
do professor que pretende dinamizar a sua didática.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


109

DOCUMENTOS ESCRITOS

Entre os documentos mais comuns estão os escritos, aqueles que tradicional-


mente são os mais empregados em aulas de História e que se utilizam do registro
escrito para expressar sentimentos, ideias e impressões do mundo. Entre eles
temos os documentos não oiciais como jornais, literatura, revistas, poemas e
letras de música.
Existem duas vantagens
ao utilizar os documen-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tos escritos em sala de


aula. Primeiro, pela fami-
liaridade em seu uso, ou
seja, desde nossa forma-
ção somos condicionados
a ler e escrever textos para
divulgação de resultados de
pesquisas, e isso nos torna
familiar a este tipo de docu-
mento. Segundo, porque são facilmente reproduzíveis em cópias reprográicas
(os famosos “xérox”) ou em meio digital.
Assim, para utilizá-los com ins didáticos, se faz necessário interrogá-los:
a. Qual o tipo de documento?
b. Em que data foi escrito?
c. Onde e quem escreveu?
d. Que outras informações ele traz?
e. De que material é feito? Foi manuscrito ou impresso?
f. Quais suas condições de conservação?

Nessa época, de crítica interna e externa minuciosa e detalhista, só eram


considerados idedignos os documentos que passavam por rigoroso exame e
provinham de instituições governamentais e reletissem a atuação de grandes

Documentos Escritos e Não Escritos


110 UNIDADE III

personalidades, e que tratassem de questões de política internacional. Entretanto,


Certidões de Nascimento, RGs, CICs e outros documentos pessoais podem
emprestar autenticidade a outro documento, respeitada as condições do fato, e
entram como matéria-prima de debates acerca do que signiica a cidadania nas
sociedades contemporâneas.

O Jornal

A utilização de tais documentos emanados da imprensa escrita é um dos mui-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tos instrumentos que podem enriquecer o processo de ensino-aprendizagem.
Especiicamente a respeito do uso de textos jornalísticos, Bittencourt ressalta
que é importante considerar tais notícias como um discurso que jamais é neu-
tro ou imparcial. É isto que nos permite uma crítica mais cuidadosa “referente
aos limites do texto e aos interesses de poder implícitos nele” (BITTENCOURT,
2004, p. 337).
Um discurso que não seja neutro pode ser visto como um produto de uma
empresa capitalista, que então oculta estratégias tendentes a facilitar a recepção
da mensagem por parte dos leitores, ainda que as ideias veiculadas não expressem
a realidade em todas as suas faces possíveis. É o que Marilena Chauí (2000) nos
ensina quando airma que esse tipo de ideologia é “a arte de dizer meias-verda-
des”, pois se a verdade for dita inteira, a intenção de mascará-la não se completa.
O jornal, portanto, é um material didático de fácil acesso, com conteúdos
atualizados ou que permitem retrospecto histórico, porém tudo que envolve o
ato de educar pressupõe também cuidados que resguardam a responsabilidade
com a verdade. Acreditando no jornal como uma das formas mais acessíveis de
acompanharmos as mudanças vertiginosas dos fatos, (e aqui nos remetemos às
aulas de História), é fundamental que professores e alunos desenvolvam habi-
lidades e o hábito de ler, e descubram na leitura formas de ingressar no mundo
do saber e da cultura.
É importante que os educadores atentem à fatores básicos para o planeja-
mento de atividades com o jornal em sala de aula:
1. O tempo que se pretende dedicar ao jornal, no conjunto de atividades de
seu programa anual.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


111

2. Trabalho prévio com a criança sobre a dimensão social da escrita e da lei-


tura (escolha das atividades que se pretende desenvolver para que o aluno
manifeste sobre qual seção prefere, enumerando-as em ordem crescente
de escolha e justiicando-a; opine sobre o texto lido, recortando uma notí-
cia e identiicando-a).
3. Trabalho com o jornal na sua totalidade e não desmembrando letras e
palavras que só possuem signiicado no contexto (dentro de um contexto
e não como pretexto).
4. O uso do jornal não deve icar restrito às aulas de Língua Portuguesa. Nas
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

aulas de História, por exemplo, os jornais funcionam como importante


recurso didático para estudar fatos vividos por grupos sociais distintos.

Determinados esses pontos, vem o principal: estabelecer as estratégias pedagó-


gicas a serem utilizadas, atentando-se aos pontos:
1. Os objetivos que se pretende atingir com as atividades escolhidas;
2. O estabelecimento de uma progressão equilibrada entre uma atividade
e outra;

Estabelecidos estes pontos, será preciso ainda, reunir o material necessário à


execução do trabalho e determinar previamente os locais em que as atividades
serão desenvolvidas: na sala de aula, em casa, na biblioteca...

A Literatura

Outro tipo de documento escrito não oicial que pode ser trabalhado de maneira
interdisciplinar é a literatura, como romances, poemas ou contos. Tais textos
cabem como consulta não apenas nas aulas de Língua Portuguesa, mas também
para o ensino de História e outras disciplinas.
Os estudos de textos literários têm como objetivo não apenas desenvolver o
gosto pela leitura, mas também fornecer condições de análises mais profundas
para o estabelecimento de relações entre conteúdo e forma. Para analisar uma
literatura, é necessário também oferecer outros textos de apoio como informações
sobre o autor e a obra, dicionários, enim, complementos para a compreensão
do texto literário.

Documentos Escritos e Não Escritos


112 UNIDADE III

Para o ensino de História, a literatura torna-se um referencial possível de


ser analisado e estudado como documentos da época, cujos autores pertencem a
um contexto histórico e fazem parte de uma cultura. Fonseca traz palavras bas-
tante esclarecedoras:
a leitura de textos literários, reservando as especiicidades artísticas,
pode nos oferecer pistas, referências do modo de ser, viver e agir das
pessoas, dos valores e costumes de uma determinada época. É uma
fonte/documento/evidência que auxilia o desvendar da realidade, as
mudanças menos perceptíveis, os detalhes sobre lugares e paisagens, as
mudanças naturais, os modos de o homem relacionar-se com a nature-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
za em diferentes épocas (FONSECA, 2003, p. 165-166).

Cabe aos professores uma escolha que permita não confundir história com ic-
ção ou aventura, ainda artigos e textos que contenham mais opiniões do que
análises e sínteses cientíicas, que não permitam que no educando se instalem
concepções fantasiosas a respeito do assunto em discussão.

A Fotograia

Entre os documentos não escritos, fotograias e imagens ocupam um lugar de


destaque, sensibilizando quem as observa com seu impacto real e multifacetado
em sensações e informações. São denominados documentos iconográicos por
utilizar-se de imagens para imprimir o mundo.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


113

A palavra iconograia vem do grego, e signiica “eikon” imagem e “graphia”


escrita. Desse modo, é possível airmar que se trata do estudo baseado em
imagens. Para a História ela é importante, pois nos permite analisar as foto-
graias, ilustrações, obras de arte entre outros itens que remetem aos fatos
históricos.
Fonte: a autora.
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Cabe lembrar que a pesquisa iconográica pode enriquecer um estudo sobre


determinado período histórico com imagens de esculturas, obras arquitetôni-
cas, quadros ou fotograias de pessoas. Isso dentro de uma perspectiva da Nova
História, que dá o devido valor aos diferentes tipos de fontes e não exclusiva-
mente aos documentos escritos, como a escola metódica fazia.
Fotograias, quadros e charges, ou ilmes, vídeos e DVDs se enquadram nessa
categoria e, para todos eles, existem métodos de análise que permitem avaliar as
características de suas linguagens ou a forma especíica pela qual veiculam suas
informações. Celso Antunes (2005, p. 120) lembra como a “ausência da palavra
aguça a imaginação e sensibiliza a mente”, permitindo uma leitura não verbal
que “dá asas à imaginação”.
É o mesmo que Leite (1993, p. 158) quer nos dizer quando explica:
Os contextos em que estão inseridas as imagens que se deseja ler re-
servam ou exprimem sentidos que podem ser transformados em no-
vas mensagens, que por sua vez podem atingir os diferentes sentidos.
Assim, [...] é necessário um conhecimento prévio e direto da realidade
que a imagem representa, simboliza ou indica para não icar desorien-
tado [...].

Antunes (2005, p. 122) acrescenta que é preciso selecionar documentos que esti-
mulem “os alunos a enxergar as entrelinhas das fotos, os detalhes da ilustração”,
para aprimorar sua acuidade visual e espacial “em aprendizagens mais estrutu-
radas e mais signiicativas”.

Documentos Escritos e Não Escritos


114 UNIDADE III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Figura 1: Na foto, uma menina vietnamita, Kim Phuc, de apenas 9 anos de idade corre pela estrada nua e
gritando em meio à indiferença dos soldados norte-americanos, logo após ter sua aldeia incendiada por
uma bomba de napalm.
Fonte: Bitaites (2007, on-line)1.

Portanto, ao observar uma foto, deve-se reletir sobre os elementos que ela com-
põe e o que signiicam. Seguem abaixo algumas perguntas que contribuem para
essa relexão:
a. Que pessoas aparecem na fotograia?
b. Descreva a aparência física e o vestuário das pessoas da foto.
c. Descreva o local onde foi tirada a fotograia.
d. O que as pessoas da foto estão fazendo?
e. Há alguma informação escrita no verso da fotograia?
f. Em que época ou data ela foi tirada?
g. Quem a tirou?
h. Quais as condições de preservação da fotograia?

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


115

Além disso, qual o conhecimento histórico que a fotograia permite? Bittencourt


(2004, p. 366) explica:
A fotograia registra fatos, acontecimentos, situações vividas em um
tempo presente que logo se torna passado. Os álbuns de família são um
exemplo de como esse suporte material de imagem serve de registro da
memória. Rever fotos signiica relembrar, rememorar ou mesmo “ver”
um passado desconhecido.

Portanto, a imagem fotográica pode revelar aspectos da vida material de um


determinado tempo com muita facilidade, comparado a uma descrição verbal.
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Finalmente, a fotograia inclui signiicados e permite uma comunicação instan-


tânea, que a qualiica como um meio para aprimorar nossos conhecimentos.

O Cinema

O cinema pode ser visto como outra forma de registro, que amplia o foco do
professor interessado em utilizar o dinamismo de suas imagens, visto que um
programa de televisão ou um ilme nos despertam sensações, e o conhecimento
ocorre com profundidade quanto às emoções e percepções provocadas.
Bittencourt (2004) recomenda ao professor identiicar as preferências dos
alunos e conciliá-las com o tipo de imagens que permitirão o levantamento de
questões e incentivarão à curiosidade. O fundamentalismo, tal como acontece
no Irã, as sempre retomadas cenas da 2ª Guerra Mundial, o julgamento de Joana
d’Arc e a história de Abelardo e Heloísa, por exemplo, são excelentes para reme-
terem nossos alunos a uma realidade em seu contexto, com cores e impressões
duradouras. O cinema é uma instituição aberta ao público que conserva e exibe
evidências do passado, e têm a inalidade de promover a pesquisa e a educação,
valendo-se de um recurso prazeroso e de lazer.

Documentos Escritos e Não Escritos


116 UNIDADE III

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
As Músicas

Além do mais, entre os documentos não escritos, podemos citar as peças musi-
cais. Assim como a literatura, é comum airmar que elas são espelhos da sociedade
que as produziu.
Há mais de dois mil anos, ilósofos como Platão e Aristóteles já exaltavam
a sonoridade como veículo da educação. Era comum os jovens gregos declama-
rem seus poemas acompanhados de suas cítaras ou liras.
Anchieta, enquanto catequista dos curumins do Brasil, associava música e
dança, ensinando a esses indiozinhos com sons e passos de cateretê.
Fonseca (2003, p. 187) dá seu testemunho a esse respeito, lembrando que:
ensinar história por meio de canções foi meu maior desaio e minha
grande paixão desde o início da minha carreira docente. Nos primeiros
anos de magistério, procurava auscultar os interesses dos adolescentes

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


117

e, sempre que possível – muitas vezes por sugestões deles -, incorporava


uma ou mais canções históricas, especialmente nas temáticas ligadas à
história do Brasil.

Com ela concorda Bittencourt (2004), quando airma que a música, erudita ou
popular, integra nossa cultura tão fortemente que pode ser classiicada entre os
mais atuantes dos documentos não escritos, considerando os que temos à dis-
posição em nossa docência.
Porém, fazer uso da música como mera ilustração do conteúdo não conduz
à relexão e tampouco ao conhecimento histórico, tão privilegiado atualmente,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

como vimos apresentando até aqui, pois não promove o pensamento crítico do
aluno e nem o leva a se interrogar sobre sua historicidade, já que o mesmo está
condicionado a olhar as canções como alegorias ilustrativas e até mesmo des-
prezá-las, desvinculando-as de seu período histórico.
Para Bittencourt (2004, p. 379), “o uso da música é importante por situar os
jovens diante de um meio de comunicação próximo de sua vivência, mediante
o qual o professor pode identiicar o gosto, a estética da nova geração”.
A historiadora propõe uma atividade ao trabalhar com músicas em sala de aula:
1. Colocar uma música atual ou de interesse da turma;
2. Questionar aos alunos a respeito do tema, do ritmo e da interpretação
que se pode ter a partir da primeira impressão da canção;
3. Chamar a atenção dos alunos para os instrumentos utilizados na canção;
4. Perguntar onde os alunos costumam ouvir músicas;
5. Então, levantar questões a respeito do ato de ouvir música sem as técni-
cas eletrônicas da atualidade.
6. A partir das respostas dos alunos na etapa anterior, o professor deve ofere-
cer documentos que respondam aos questionamentos ou que conirmem
o que foi mencionado pelos alunos;
7. Sempre indo além de uma primeira análise do que se propõe como docu-
mento histórico (BITTENCOURT, 2004).

Documentos Escritos e Não Escritos


118 UNIDADE III

Bittencourt não foi a única historiadora a estudar o “poder” que a música exerce
sob as pessoas. O historiador britânico Erick Hobsbawm foi um dos pioneiros
no estudo das canções, fazendo um estudo aprofundado sobre o jazz norte-ame-
ricano e observando suas inluências no mundo ocidental. Por ser materialista
histórico, ele analisou as condições sociais e também o contexto em qual este
gênero estava inserido.
Podemos destacar, portanto, que a música é um importante instrumento de
transmissão de mensagem, que consegue abranger uma gama de pessoas por todo
mundo. Devido a isso, não utilizá-la em sala de aula é o mesmo que o professor

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
não oferecer aos alunos materiais suicientes para seu desenvolvimento intelec-
tual e social, pois a música é presença constante na vida das pessoas.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


119
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

A CONSTRUÇÃO DE CONHECIMENTO POR MEIO DAS


FONTES HISTÓRICAS

Está icando cada vez mais óbvio o sentido que pretendemos dar à constru-
ção do conhecimento por meio das fontes históricas, sem desprezar nenhuma
delas, desde as manuscritas, tais como encontramos em arquivos antigos mais
difíceis de manusear, mas sempre interessantes como testemunho, até as escri-
tas impressas e não escritas de vários tipos e, ainda, os documentos virtuais que
a informática e a internet nos proporcionam.
O uso de documentos em sala de aula, independentemente de seu teor e forma,
permite que operemos a construção e reconstrução do conhecimento histórico.
Na visão positivista da História, o documento era encarado como prova
do real. A aplicação dessa visão ao livro escolar assumia um caráter teleoló-
gico – o documento cumpria a função de ressaltar, exempliicar e, sobretudo,

A Construção de Conhecimento por Meio das Fontes Históricas


120 UNIDADE III

dar credibilidade à argumentação desenvolvida pelo autor. Na sala de aula, isso


se reproduzia: o documento servia para ampliar e, principalmente, conirmar o
que o professor disse durante sua exposição.
Todos nós sabemos que o passado não pode ser recuperado tal como acon-
teceu, e que sua retomada só pode ser realizada a partir de problemas colocados
pelo presente. Paralelamente a isso, uma nova concepção de documento se for-
mou, ganhando uma nova dimensão nos estudos da História. O começo da
utilização desse rico acervo à nossa disposição ainda está começando, mas já se
revela um meio útil para suscitar o interesse dos alunos.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O trabalho com o documento histórico, independente da sua natureza, deve
ser pautado na interpretação. É evidente que as interpretações são relacionadas
a todo o conhecimento histórico acumulado, ou seja, às interpretações de histo-
riadores consagrados. Nesse sentido, docentes e alunos devem atuar não apenas
como consumidores, mas como cocriadores deste conhecimento.
Ao se trabalhar com documentos em sala de aula, principalmente os escri-
tos, devemos considerar algumas etapas:
1. Exploração inicial: permite ao aluno explorar o documento sem a inter-
venção do professor. Aqui vale a primeira impressão, o que marcou,
chamou a atenção, etc., buscando informações (internas ou externas ao
documento);
2. Identiicação da data e local: geralmente constam na fonte original.
Quando não, o professor deve fornecer condições para que os alunos iden-
tiiquem a data e o local de produção e difusão do documento;
3. Finalidade: identiicar o objetivo do documento a partir da leitura do
próprio documento. Deve-se questionar se o documento foi produzido
como registro para o futuro (documento) ou se tinha ins práticos para
resolver uma questão imediata (monumento);
4. Contextualização: visa estabelecer em qual conjuntura o documento foi
produzido. Isso pode ser notado tanto nas características explícitas, quanto
aquelas que conseguimos identiicar através da leitura nas “entrelinhas”.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


121

5. Interpretação: interpretar o documento a partir de sua análise, questio-


nando-o: “A que interesses eles atendiam? Quais eram suas intenções?
A que objetivos visavam atingir? De que forma os valores e as doutrinas
que constituem sua visão de mundo se expressam no texto?” (OLIVEIRA,
2012, p. 76).

Vale ressaltar o cuidado que devemos ter ao analisarmos um documento his-


tórico, isso porque, segundo Mauad (1996), ele pode “mentir”. Isso é o mesmo
que dizer que o documento em si foi produzido com uma intenção. A propósito,
todas as ações são resultados de intenções, o que requer por parte de professores
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

e alunos, no caso do Ensino de História, uma apreensão da totalidade, buscando


as razões pelos quais esses foram produzidos. Vejamos um trecho da obra da
autora e o exercício que se possa veriicar a partir dele:
Através da imagem: fotograia e imagem
“Nunca icamos passivos diante de uma fotograia: ela incita nossa ima-
ginação, nos faz pensar sobre o passado a partir do dado de materia-
lidade que persiste na imagem. Um indício, um fantasma, talvez uma
ilusão que, em certo momento da história, deixou sua marca registra-
da, numa superfície sensível, da mesma forma que as marcas do sol
no corpo bronzeado. Num determinado momento o sol existiu sobre
aquela pele, num determinado momento um certo aquilo existiu diante
da objetiva fotográica, diante do olhar do fotógrafo, e isso é impossível
negar.

Discute-se a possibilidade do mentir da imagem fotográica. A revo-


lução digital provocada pelos avanços da informática torna cada vez
maior esta possibilidade. Permitindo até que os mortos ressurjam para
tomar mais um chope, tal qual a publicidade já mostrou. Não importa
se a imagem mente; o importante é saber por que mentiu e como men-
tiu. O desenvolvimento dos recursos tecnológicos demandará do his-
toriador uma nova crítica que envolva o conhecimento das tecnologias
feitas para mentir.

Toda imagem é histórica. O marco de sua produção e o momento


da sua execução estão calcados nas superfícies da foto, do quadro, da
escultura, da fachada do edifício. A história embrenha as imagens, nas
opções realizadas por quem escolhe uma expressão e um conteúdo,
compondo através de signos de natureza não verbal, objetos de civili-
zação, signiicados de cultura.”
Fonte: Mauad (1996, p. 73).

A Construção de Conhecimento por Meio das Fontes Históricas


122 UNIDADE III

Exercitando a História a partir da leitura do texto acima, procure analisar a


posição da autora em relação aos métodos de análise das imagens tecnológicas;
os diferentes tipos de imagem que podem ser utilizados no ensino de História;
o papel do professor de História consciente de sua responsabilidade social e o
aluno enquanto sujeito histórico.
O que mais se impõe é a percepção do explícito em conjunto com o implícito,
os chamados testemunhos involuntários, que se revelam quando conseguimos
ler um documento nas suas entrelinhas, naquilo que escapou ao autor e revela
algo de sua percepção a respeito do seu tempo, ou algo que quer ocultar daque-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
les que estão lendo o documento.
A sala de aula pode ser vista como um ambiente ideal para a reconstrução
de tais conhecimentos por intermédio de fontes históricas, e aqui nos referimos
às que se encontram no sistema presencial ou que caracterizam a realidade vir-
tual de um ensino a distância.
Neste último caso, as telecomunicações unidas à informática proporcionam
um veículo rápido, que encurta distâncias para o conhecimento.
Em sua obra, em que os novos modelos que podem se estabelecer para o
ensino de História são abordados, Karnal (2004) parte do princípio que a História
linear está condenada ao desaparecimento e, depois do advento do fenômeno
da globalização – marcadamente na década de 1990, – temos de olhar em múl-
tiplas direções e atender a divergentes contextos.
“Até agora”, escreve, “a história era ensinada como se tratasse de quadros já
acabados”. Hoje já não é suiciente explicar como se chegou ao Renascimento
ou à Segunda Guerra Mundial, à construção do capitalismo ou ao desprestígio
do socialismo, que levou à hegemonia do neoliberalismo como política econô-
mica. “Ensinar a ediicar o próprio ponto de vista histórico signiica ensinar a
construir conceitos e aplicá-los diante das variadas situações e problemas”. Isso
equivale a “interpretar dados e informações de maneira a ter uma maior com-
preensão da realidade que estiver sendo estudada” (KARNAL, 2004, p. 77-78).
O autor parece preocupado com a retomada do humanismo em tempos
dominados pela tecnologia, e para valorizar o homem, nada melhor do que o
pensamento autônomo, construído pelo próprio indivíduo, produto de “uma
percepção mais abrangente possível da condição humana, nas mais diferentes

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


123

culturas e diante dos mais variados problemas” (KARNAL, 2004, p. 78).


“O nosso desaio”, inaliza, “consiste não em saber se é possível fazer isso ensi-
nando História, mas em responder positivamente, com um método adequado,
à pergunta sobre como é possível fazer isso, ensinando História” (KARNAL,
2004, p. 78).
E é aí que os documentos citados assumem seu lugar, como uma alterna-
tiva viável e atual a nossa disposição, com todas as tecnologias de que dispomos.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Os documentos não têm intenção didática e, por isso, são produzidos em di-
ferentes linguagens, por diversas formas de comunicação. Portanto, devem
ser analisados com antecedência para serem utilizados com ins didáticos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desta unidade, veriicamos que para compreender as sociedades nos


seus aspectos mais amplos, devemos considerar todas as informações, desde
as vestimentas e as grandes construções, passando por textos escritos, ima-
gens, objetos do cotidiano entre outros. Além disso, veriicamos que é possível
adquirir conhecimento histórico por meio das fontes e, contudo, constata-
mos que os historiadores e professores fazem uso de maneira diferente destes
documentos históricos.
É interessante ressaltar que os documentos e as fontes históricas, por nós,
foram tomados como sinônimos. E, além do mais, hoje houve uma mudança
quanto ao entendimento do que seja um documento. Tal ênfase deve-se a herança
deixada pelos historiadores da Escola dos Annales, que lançaram um novo olhar
aos documentos.
Nessa perspectiva, podemos destacar os objetivos que podemos alcançar
fazendo uso desses documentos no processo ensino-aprendizagem:

Considerações Finais
124 UNIDADE III

■ Fazer o aluno conhecer uma grande variedade de fontes e adquirir expe-


riência na sua leitura.

■ Desenvolver no aluno a capacidade de análise e avaliação crítica das fon-


tes, distinguindo o que são dados de informação e o que são opiniões.

■ Ensinar a “olhar historicamente” um fenômeno.

■ Desenvolver no aluno a capacidade de síntese interpretativa e narrativa.

■ Aprender a recolher informações sobre o passado distante e próximo.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
■ Desenvolver habilidades de pesquisar em arquivos e constituir os seus
próprios.

Por im, consideramos o educador como responsável pela intermediação entre


o aluno e o percurso do conhecimento histórico, e que as fontes são recursos
didáticos inesgotáveis de conhecimento, basta, para isso, dominar suas especi-
icidades e ser um eterno pesquisador.
Na unidade seguinte daremos continuidade as nossas discussões, reletindo
sobre a prática pedagógica e as possibilidades que o professor tem para minis-
trar uma boa aula de História.

A UTILIZAÇÃO DOS DOCUMENTOS HISTÓRICOS EM SALA DE AULA


125
ANOTAÇÕES
126

1. Procure analisar os documentos históricos que seguem para fazer o que se


pede:
Imagem 1:

Imagem 2:

a. Descreva as imagens, observando todos os detalhes que envolvem cada cena: o


que os personagens estão fazendo, sua expressão (se estão tristes, alegres, irrita-
dos etc.), suas roupas, a paisagem e tudo o que compõe as fotograias.
b. Construa uma tabela destacando as diferenças e semelhanças entre as fotogra-
ias analisadas.
c. Escolha uma das crianças das fotograias e redija uma biograia, imaginando
como seria sua vida cotidiana.
127

2. A truculência e falta de preparo, herança do modelo policial adotado pela Dita-


dura Militar, não poderia ter saído ileso às canções que a juventude da década
de 1980 cantava. A Banda Titãs expressou bem este cenário na canção abaixo. A
partir da leitura de sua letra, expresse sua opinião sobre o assunto.
Polícia
Dizem que ela existe
Prá ajudar!
Dizem que ela existe
Prá proteger!
Eu sei que ela pode
Te parar!
Eu sei que ela pode
Te prender!...
Polícia!
Para quem precisa
Polícia!
Para quem precisa
De polícia...
(Tony Beloto)
3. Muitos historiadores contemporâneos, como Bittencourt (2004), defendem a
ideia de utilizar os documentos históricos em sala de aula como um suporte in-
formativo, capaz de conduzir o alunado ao conhecimento histórico. Partindo
desta premissa, identiique e exempliique alguns dos diferentes tipos de
documentos históricos que podem ser utilizados em sala de aula.
4. O uso de documentos em sala de aula, qualquer que seja o seu teor e forma,
permite que operemos a construção e reconstrução do conhecimento histórico.
A respeito da utilização de fontes históricas em sala de aula, assinale a al-
ternativa correta.
I. O trabalho com documentos históricos pouco contribuem para a formação de
nossos alunos, pois são vistos apenas como prova do real.
II. A sala de aula pode ser vista como um ambiente ideal para a reconstrução dos
conhecimentos relacionados à História, por meio do estudo das fontes históricas.
III. O trabalho com o documento histórico, independente da sua natureza, deve ser
128

pautado na interpretação. É evidente que as interpretações são relacionadas a


todo conhecimento histórico acumulado, ou seja, às interpretações de historia-
dores.
IV. As fontes históricas, ao serem trabalhadas em sala de aula, visam à comprovação
do que aconteceu no passado, não exigindo que o aluno faça uma leitura a res-
peito do conteúdo e, portanto, não auxiliam na construção desse conhecimento.

a. Somente as airmativas I e II estão corretas.


b. Somente as airmativas II e III estão corretas.
c. Somente as airmativas III e IV estão corretas.
d. Somente as airmativas I, II e III estão corretas.
e. Todas as airmativas estão corretas.

5. Ao deinir quais documentos vão compor sua fonte de pesquisa, um historiador


tem o conhecimento histórico do período, bem como o domínio dos concei-
tos para a fundamentação da análise. Contudo, a situação do professor não é a
mesma do historiador, pois além de dominar os contextos e conceitos históri-
cos ele também deve ter conhecimentos pedagógicos. Acerca do trabalho do
professor e de seus cuidados na utilização de documentos como material
pedagógico, analise as airmativas abaixo e assinale a alternativa correta.
I. Ao introduzir um documento histórico em sua aula, o professor deve considerar
que seus alunos ainda estão assimilando os conteúdos e os conceitos históricos,
portanto, eles não têm domínio sobre o contexto em que o documento foi pro-
duzido.
II. O documento histórico em sala substitui o material didático contextual ofertado
pela instituição de ensino.
III. O documento histórico pode ser utilizado como introdução a um tema, assu-
mindo a condição de situação-problema, no qual o aluno deve identiicar no
documento o objeto ou o tema de estudo.
IV. O professor, ao selecionar o documento, deve considerar o interesse dos alunos
pelo mesmo.

a. Somente as airmativas I e II estão corretas.


b. Somente as airmativas II e III estão corretas.
c. Somente as airmativas I, II e III estão corretas.
d. Somente as airmativas I, III e IV estão corretas.
e. Todas as airmativas estão corretas.
129

PLANO DE AULA

IMPORTÂNCIA DA ARQUEOLOGIA NA INVESTIGAÇÃO HISTÓRICA


Objetivo(s)
■ Compreender o que são documentos históricos e vestígios arqueológicos
e identiicar a sua importância para a construção de explicações históricas.
■ Compreender como os arqueólogos pesquisam.
■ Notar que o tempo se materializa em camadas no solo.

Conteúdo(s)
■ A ciência da Arqueologia.
■ Construção do conhecimento histórico.
■ Tempo estimado: 6 aulas

Material necessário
■ Luvas lexíveis de borracha, caderno, lápis.
■ Imagens de sítios arqueológicos e pinturas rupestres encontradas nos sites:
■ Instituto Itaú Cultural;
■ Fundação Museu do Homem Americano;
■ Portal ComCiência;
■ Museu de Arqueologia e Etnologia da USP;
■ Portal Arqueologia;
■ Desvendar
■ Artigos cientíicos no site do Museu Arqueológico de Sambaquis de Joinville

Desenvolvimento
1ª etapa: Quando os alunos entrarem na sala de aula, diga que aquele ambiente não
foi arrumado de propósito (para isso, certiique-se de que a área já tenha sido usada).
Proponha que procurem vestígios que informem sobre o que ocorreu ali. Explique que,
130

assim como pesquisadores, eles investigarão o passado - na lata de lixo, no que está
escrito no quadro, nas inscrições das carteiras, no mural, nos materiais espalhados e na
posição das mesas. Organize a turma em duplas: um aluno deve usar luvas para vascu-
lhar objetos e outro deve tomar notas. Em seguida, diga que respondam à pergunta: o
que houve na sala?
2ª etapa: No quadro, seja o escriba de um relato coletivo, procurando ligar os objetos
às interpretações dos alunos. Questões que podem ser respondidas: de qual disciplina
era a aula anterior a essa? Os estudantes parecem ter se concentrado? Saíram da sala
com pressa? Proponha que respondam à questão: como foi possível escrever um relato
histórico a respeito do que houve no passado sem que nós estivéssemos lá para ver?
3ª etapa: Apresente fotograias de escavações sendo realizadas por arqueólogos. Expli-
que que, de maneira semelhante ao que eles izeram na sala, há proissionais que procu-
ram vestígios das antigas sociedades. Discuta sobre como os arqueólogos podem saber
o que ocorreu perguntando: que vestígios eles podem encontrar e que interpretações
fazem? Como lição de casa, distribua cópias de uma fotograia de desenho rupestre e
solicite que descrevam e interpretem a imagem.
4ª etapa: Na sala de informática, visite com os jovens o site do Instituto Itaú Cultural
sobre Arqueologia Brasileira e acesse o link “linha do tempo”. Diga que analisem a ima-
gem do sítio arqueológico e as camadas de solo. Esse é o momento de aprenderem que,
quanto mais profundos os objetos estão, mais antigos são. Solicite que cada dupla entre
em um dos links e recolha informações a serem compartilhadas com a classe (caso você
não disponha de computadores, imprima as páginas do site).
Avaliação
Para avaliar a aprendizagem dos alunos, distribua um texto sobre a serra da Capivara,
um parque nacional e sítio arqueológico do sertão do Piauí. Peça que elaborem uma
linha do tempo nos moldes da vista no site do Itaú Cultural. Note se consideram que os
vestígios mais antigos devem estar na parte mais profunda, e os mais novos, na superior.
Fonte: Nova Escola Clube (2017, on-line)2.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Ensino de História para o Fundamental 1:


teoria e prática
Adriane Santarosa dos Santos e Maria Belintane
Fermiano
Editora: Contexto
Assunto: Educação, Formação de Professores, História
Sinopse: aprender História deve ser importante e
estimulante para alunos do ensino fundamental 1.
Com um professor preparado e um método adequado,
as crianças podem ser levadas a tomar conhecimento
da realidade que as cerca, a observar semelhanças e
diferenças, permanências e mudanças. A partir disso,
elas descobrem que todos possuem história. O maior potencial do ensino de História nessa fase é
contribuir para localizar a criança no seu contexto e, assim, torná-la capaz de se reconhecer como
ser humano dentro de um sistema de relações sociais que foi formado ao longo do tempo.
Com este livro, as professoras Maria Belintane Fermiano e Adriane Santarosa dos Santos mostram
como é possível desenvolver nas aulas de História atividades que articulem as diretrizes dos PCNs,
materiais e suportes diversos e o respeito à realidade dos alunos.
Unindo teoria e prática, as autoras apresentam, com base em exemplos reais, uma série de
ferramentas de ensino para que todos os professores de História que desejam encontrar soluções
criativas para o trabalho em sala de aula. Este livro consta na Biblioteca Virtual Pearson que você
tem acesso através de seu AVA.

Cibercultura
Pierre Lévy
Editora: 34
Sinopse: o que é a cibercultura? Que movimento social
e cultural encontra-se oculto por trás deste fenômeno
técnico? Podemos falar de uma nova relação com
o saber? Quais são as mutações que a cibercultura
gera na educação e na formação? Quais são as novas
formas artísticas relacionadas aos computadores e às
redes? Como o desenvolvimento do ciberespaço afeta
o espaço urbano e a organização do território? Quais
são as implicações culturais das novas tecnologias?
Da digitalização à navegação, passando pela memória,
pela programação, pelo software, a realidade virtual, a multimídia, a interatividade, o correio
eletrônico, etc, este livro apresenta as novas tecnologias, seu uso e suas questões.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

O Substituto
Ano: 2012
Sinopse: Henry Barthes (Adrien Brody) é um professor
de ensino médio, que apesar de ter o dom nato para se
comunicar com os jovens, só dá aulas como substituto, para
não criar vínculos com ninguém. Mas quando ele é chamado
para lecionar em uma escola pública, se encontra em meio
a professores desmotivados e adolescentes violentos e
desencantados com a vida, que só querem encontrar um apoio
para substituir seus pais negligentes ou ausentes. Sofrendo
uma crise familiar, Henry verá três mulheres entrando em sua
vida e vai começar a perceber como ele pode fazer a diferença,
mesmo que isso venha com um alto custo.

O Uso de Documentos e a Construção do Conhecimento Histórico


A noção tradicional de documento histórico, que compreendia somente documentos oiciais,
hoje se ampliou bastante. Um depoimento oral, uma fotograia, um desenho, uma carta oicial,
ou pessoal, um antigo caderno escolar, etc., hoje podem ser considerados até mais importante
que um registro oicial, dependendo do caso. Assim, leia o artigo “O USO DE DOCUMENTOS E A
CONSTRUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO”, disponível em: <http://www.uesb.br/anpuhba/
artigos/anpuh_III/jairo_carvalho.pdf>. Acesso em 5 abr. 2017.

Nós da Educação
O programa “Nós da Educação” entrevista a professora Marlene Rosa Cainelli, Doutora em História
Social pela Universidade Federal do Paraná, abordando o ensino de História, a formação de
professores e alternativas para a prática em sala de aula. TV Paulo Freire.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=TWGKFrIRcI0>. (Parte 1 de 3); <https://www.
youtube.com/watch?v=BfgP63HRvTQ>. (Parte 2 de 3)
<https://www.youtube.com/watch?v=uTamlVmRI8c>. (Parte 3 de 3).
Acesso em: 17 abr. 2017.
133
REFERÊNCIAS

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dizagem signiicativa e competências do dia-a-dia. 4. ed. Campinas: Papirus, 2001.
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zes, 2005.
BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cor-
tez, 2004.
______ O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2004.
BLOCH, M. Introdução à História. São Paulo: Publicações Europa-América, 1976.
BOURDÉ, G.; MARTIN, H. As escolas históricas. São Paulo: Publicações Europa Amé-
rica, 1990.
CARDOSO, C. F.; VAINFAS, R. (org). Domínios da História: ensaios da teoria e meto-
dologia. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997.
CHAUÍ, M. Convite à ilosoia. São Paulo: Editora Ática, 2000.
DRUCKER, P. F. Sociedade pós-capitalista. Trad. de Nivaldo Montigelle Jr. São Paulo:
Pioneira, 1993.
FERRAZ, L. O. M.; CAVALCANTI, V. R. S. História e cinema: Luz, câmera, transposição
didática. Revista HISTÓRIA & ENSINO, Londrina, v. 12, ago. 2006. Disponível em:
<http://www.uel.br/revistas/uel/index.php/histensino/article/view/11727/10375>.
Acesso em: 12 de janeiro de 2017.
FONSECA, S. G. Didática e prática de ensino de História. 4. ed. Campinas: Papirus,
2003.
KARNAL, L. História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. 2 ed. São Pau-
lo: Contexto, 2004.
LEITE, M. M. Retratos de família: leitura da fotograia histórica. São Paulo: Edusp,
1993.
LEVY, P. Cibercultura, 1. ed. São Paulo: Editora 34, 1999.
NAPOLITANO, M. A televisão como documento. In: BITTENCOURT, C. (org). O saber
histórico na sala de aula. 9. ed. São Paulo: Contexto, 2004.
OLIVEIRA, D. Metodologia do ensino de história e geograia: professor-pesquisa-
dor em educação histórica. Curitiba: Inter-Saberes, 2012.
SERRES, M. Luzes: cinco entrevistas com Bruno Latour. Trad. de Luiz Paulo Rouanet.
São Paulo: Unimarco, 1999.
REFERÊNCIAS

REFERÊNCIAS ON-LINE

1Disponível em: <http://bitaites.org/fotograia/tres-fotos-mudaram-guerra-vietna-


me>. Acesso em: 4 abr. 2017
2Disponível em: <http://rede.novaescolaclube.org.br/planos-de-aula/importancia-
-da-arqueologia-na-investigacao-historica>. Acesso em: 4 abr. 2017
135
GABARITO

1. Esta atividade permite a você, caro aluno, exercitar o que discutimos nesta uni-
dade, portanto, ela é subjetiva.
2. A segunda atividade também é subjetiva, mas aqui você ainda pode fazer uma
pesquisa pela internet para contextualizar o momento e a proposta que a can-
ção nos traz.
3. São vários os documentos históricos que podemos utilizar em sala de aula. Al-
guns deles são:
Documentos Escritos:
Expressam ideias, sentimentos e impressões do mundo por meio de registros escri-
tos. São subdivididos em oiciais e não oiciais. Ex: a carta de Pero Vaz de Caminha.
Documentos Iconográicos (imagens):
São utilizados para representar as ideias, objetos, pessoas e suas vestimentas, além
dos acontecimentos por meio de imagens, desenhos, pinturas e fotograias.
Documentos de cultura material:
Os objetos, as roupas, os brinquedos, os monumentos, ferramentas e móveis são
fontes valiosas, principalmente se tratando de sociedades que não deixaram regis-
tros escritos.
Documentos orais:
As entrevistas e depoimentos são reconhecidos como fontes históricas. Ex: todo o
conhecimento dos indígenas transmitido de geração em geração oralmente (tradi-
ção oral).
Documentos sonoros:
As músicas e os ritmos em geral informam sobre como pensavam os homens de
determinada época.
4. Alternativa “B”.
5. Alternativa “D”
Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E

IV
UNIDADE
O ENSINO DE HISTÓRIA

Objetivos de Aprendizagem
■ Discutir o planejamento como ponto de partida de qualquer ação
didática, visando à aprendizagem por parte dos alunos.
■ Compreender as diferentes linguagens para o ensino de História.
■ Analisar o Parecer/Lei 10.639/03 – transformada na Lei 11.645 de
2008, que incluiu a temática Cultura Afro-brasileira e Indígena,
abrindo possibilidades à ediicação da igualdade e da repreensão às
atitudes e posturas de discriminação no ambiente escolar.
■ Estudar o processo avaliativo para a disciplina de História,
considerando suas características e compreendendo suas
especiicidades.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■ Efetivando a aprendizagem: o planejamento como ponto de partida
■ As diferentes linguagens no Ensino de História: uma proposta
interdisciplinar
■ Cultura Afro-brasileira e Indígena
■ Avaliação como processo de melhorias da ação docente e discente
139

INTRODUÇÃO

Autores como Bernard Charlot (1990; 1994), nos alertam sempre, em suas obras,
sobre o perigo de se enveredar por uma “mistiicação pedagógica”.
A diferença ou o abismo, que muitas vezes se abre entre o que se projeta e o
que se alcança é lagrante, e a se julgar pelo que airma Charlot, nas terras fran-
cesas ocorre o mesmo fenômeno frustrador que sentimos entre nós brasileiros.
Uma das grandes prioridades do mundo intelectual nas últimas décadas tem
sido a necessidade de planejar. Planejamento é a primeira atividade, sem a qual
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

nada parece viável em uma atividade pedagógica. Ao propormos o ensino de


História como prioridade, precisamos pressupor um método, tal como a melhor
receita de Descartes em seu combate à escolástica.
O método – entenda-se, o caminho – inclui vários passos, todos eles enca-
minhando para um estado de esclarecimento, da dúvida inicial para algumas
certezas. Seja pela leitura, pela pesquisa ou outra metodologia qualquer, a aula
precisa sempre caminhar em uma direção segura, visando à sistematização do
conhecimento tão exigido na atualidade.
A sala de aula é o nosso campo de provas e nosso permanente laboratório,
onde são testados os procedimentos que podem dar os resultados que pretende-
mos em nossa tarefa docente. Lá é onde tudo acontece, e é nesse local privilegiado
da relação ensino-aprendizagem que depositamos o melhor de nossas energias,
ideias, propósitos e crenças.
É também neste espaço que temos a possibilidade de inserir um tema neces-
sário e atual: a Cultura Afro-brasileira e Indígena, que precisou ser transformada
em Lei para adentrar o ambiente escolar.
Por que será que vemos o outro com diferença? Por que omitimos informa-
ções sobre nossas origens? Por que a cultura africana e indígena ainda é vista como
primitiva? Por que faltam esclarecimentos de como trabalhar a temática em sala
de aula? Estas e outras questões serão respondidas nesta unidade, impondo-se
também um estudo mais pormenorizado desse momento de educar, fazendo do
ensino de História o nosso instrumento e da prática pedagógica a nossa relexão.

Introdução
140 UNIDADE IV

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
EFETIVANDO A APRENDIZAGEM:
O PLANEJAMENTO COMO PONTO DE PARTIDA

Segundo Ruiz (2004, p. 75), “o processo do conhecimento é a grande aventura e


o grande desaio que o educador enfrenta quando prepara as suas aulas e quando
as desenvolve com os seus alunos”.
Em 1996 houve uma conferência, proferida pelo historiador francês François
Hartog, o qual dividia a História em três modos de entendê-la e, consequente-
mente, entender o papel do historiador. Seriam eles: a história voltada para o
passado, a história teológica voltada para o futuro e, por im, a história do presente.
Assim, o primeiro modo seria o modelo clássico proposto por Tucídides
e Cícero, os quais entendiam a história como a magistra vita (velha mestra), a
qual educaria por meio do passado, preparando nosso caminho para o futuro.
O segundo modelo seria o de Chateaubriand, um historiador e escritor fran-
cês que viveu no próprio tempo em que escreveu. Chateaubriand, diferentemente
dos primeiros, procurava escrever sobre o passado, vislumbrando o futuro e, ao
mesmo tempo, tentando entender a Revolução Francesa que acontecia na mesma
época. Ele airmava: “eu escrevia História Antiga e a História Moderna estava a
bater em minha porta” (KARNAL, 2004, p. 76).

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


141

O terceiro e último modelo surgiu ao inal da Segunda Guerra Mundial,


quando o presente tornou-se mais importante que o futuro. Segundo Hartog
(1996), o que temos experimentado no Ocidente ao longo do século XX é uma
ênfase crescente no presente enquanto tal. Portanto, ica a pergunta: como nós,
professores de História, devemos encaminhar nossas aulas de modo que essas
sejam signiicativas aos alunos? (KARNAL, 2004).
Para este mesmo pesquisador, a queda do muro de Berlim, em 1989, sim-
bolizou o momento de mudança, pois a partir daí foi mais fácil perceber que há
muitos pontos de vista sobre o passado, porém narrados de maneiras diferentes.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Segundo Rafael Ruiz (2004, p. 77), existem dois princípios para estudar e
ensinar História:
■ Ediicar o próprio ponto de vista tão explicitamente quanto possível;
■ Realizar sempre uma abordagem comparativa.

Desse modo, não devemos ensinar o edifício da História em si, mas sim, ensinar
os alunos a ediicarem o edifício. Pois, até agora, a História era ensinada como se
já houvessem quadros acabados. Ensinar a ediicar é o mesmo que levar nossos
alunos a construir conceitos e aplicá-los diante das várias situações-problema
que a vida impõe. Signiica ainda ensinar a selecionar, relacionar, interpretar,
compreender e construir argumentos. Enim, “ensinar a ter uma percepção mais
abrangente possível da condição
humana, nas mais diferentes cul-
turas e diante dos mais variados
problemas” (RUIZ, 2004, p. 78).
Portanto, o desaio do profes-
sor não é saber se isso é possível,
mas sim fazê-lo ensinando História
e, por esse motivo, o planejamento
é um dos primeiros passos para
a aprendizagem eiciente e eicaz.
Planejar é um processo de
busca e equilíbrio entre meios e
ins, envolve recursos e objetivos,

Efetivando a Aprendizagem: O Planejamento Como Ponto de Partida


142 UNIDADE IV

convergindo para a eicácia que se traduz em resultados. O planejamento é um


ato relexivo, que vai da decisão à ação, previsão e racionalização, deinindo eta-
pas e pressupondo uma avaliação.
Segundo Vasconcellos (1995, p. 56), o planejamento curricular é “o processo
de tomada de decisões sobre a dinâmica da ação escolar. É previsão sistemática
e ordenada de toda vida escolar do aluno”. Desse modo, é evidente que planejar
é um dos melhores instrumentos disponíveis aos professores e uma verdadeira
bússola para a ação educativa, pois as experiências de aprendizagem implíci-
tas e explícitas são programadas para o estudante por meio dos componentes

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
curriculares.
Vale lembrar que não devemos entender o planejamento como uma simples
tarefa burocrática, ou seja, realizá-lo somente porque a equipe diretiva exige. Muito
mais que isto, o planejamento é o momento inicial de qualquer ação docente,
pois sempre que acordamos planejamos nossas ações diárias e fazemos planos
para o futuro. Na escola não poderia ser diferente.
Esse processo de decisão sobre a atuação concreta dos docentes, envolvidos
no cotidiano de seu trabalho
pedagógico, não deve nunca
ser improvisado e, além disso,
o professor deve não só conhe-
cer os alunos para os quais
planeja tais atividades, como
também saber sobre o que irá
ensinar e como ensinar.
Campos e Nigro (1999, p.
99) se dedicam a explicar algo
sobre o planejamento de uma
unidade didática “de olho na
sala de aula”. Seus exemplos
são importantes para explicar
o que ocorre quando um professor desconsidera as concepções que as crianças têm
sobre o assunto abordado e faz um planejamento descuidado, que compromete
seus objetivos e torna as unidades didáticas frágeis e a aprendizagem supericial.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


143

Existem alguns princípios que o professor deve considerar ao planejar. Iniciar


novos conteúdos ainda não problematizados, por exemplo, pode não ser a melhor
escolha. Conteúdos diferentes precisam ser trabalhados por meio de várias ativida-
des, considerando as múltiplas inteligências dos alunos. Embora tais inteligências
já foram um tanto criticadas, para nós, sem dúvidas, elas são importantes para
atingirmos o foco do aprendizado em cada um de nossos alunos.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Em 1994, Howard Gardner publicava sua obra “Estruturas da mente: a teoria


das inteligências múltiplas”, apresentando as inteligências múltiplas e múlti-
plas linguagens nos caminhos do aprendizado. Ele retoma as linhas de ação
do aluno sobre o conhecimento. Para ele, são inteligências: Linguística ou
verbal; Lógico-matemática; Espacial; Sonora ou musical; Cinestésico-corpo-
ral; Naturalista; Pessoais.
Fonte: a autora.

O contexto no qual a aprendizagem acontece é fundamental para o planejamento.


A respeito disso, a atividade de planejar não deve ignorar alguns pressupostos
fundamentais para o ensino de História, segundo nossa visão:
■ Os conteúdos não devem ser desligados do mundo, pelo contrário, devem
ser contínuos e prosseguir ao longo da vida.
■ Os conteúdos devem considerar os conhecimentos prévios dos alunos,
suas experiências cotidianas.
■ A aula deve estar comprometida com o nível cognitivo da turma, nem
tão além e nem tão aquém do exigido para a série.
■ As atividades devem desenvolver a autonomia dos alunos.
■ Deve-se considerar a aplicabilidade dos conhecimentos adquiridos na escola.
■ O professor precisa ser lexível com relação a sua ação docente, ou seja,
considerar a variabilidade didática.

Efetivando a Aprendizagem: O Planejamento Como Ponto de Partida


144 UNIDADE IV

■ O ensino de História deve ter “lugar” em outros ambientes que não a


escola formal, por intermédio de uma pesquisa de campo, nos museus etc.

Ainda, em acréscimo, podemos airmar que a modalidade de ensino que mais


tem se airmado ultimamente é aquela que se vale de trabalhos interdisciplinares.
Uma alternativa que vem ganhando forças entre educadores no que tange o
planejamento é a perspectiva Histórico-crítica. João Luiz Gasparin propõe uma
ação docente-discente, na qual o professor trabalha com o aluno e não pelo
aluno. Essa proposta de trabalho pedagógico consiste no uso do método dialé-
tico prática-teoria-prática.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
Em sua obra “Uma didática para a pedagogia histórico-crítica”, de 2002,
Gasparin divide a nova didática em cinco passos: prática social inicial; proble-
matização; instrumentalização; catarse e prática social inal, com o intuito de
alcançar um único objetivo: a aprendizagem por parte do alunado.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


145
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

AS DIFERENTES LINGUAGENS NO ENSINO DE


HISTÓRIA: UMA PROPOSTA INTERDISCIPLINAR

Segundo Neto (2004, p. 57),


o ato de educar é constante! Desde os fundamentos ilosóicos acerca
do modo de conhecer até os procedimentos contínuos em sala de aula é
comum supor que educadores e educandos se confrontem e questionem
sobre as ações e conteúdos trabalhados e aprendidos pelos estudantes. O
mundo em contínua transformação, as constantes alterações das diretri-
zes e orientações legais, o controle burocrático cada vez mais eiciente, e
alunos pouco dispostos a aceitarem o universo escolar como algo útil e
aplicável ao seu cotidiano, provocam no educador a necessidade conti-
nua de discussão e alteração para que a escola, em sua tarefa de educar,
não se esvazie, e com ela, sua própria proissão (NETO, 2004, p. 57).

A valorização da educação traz uma ideia de redenção e grandeza, a qual se choca


com o que o aluno esperava. Logo quando se passa os anos iniciais do Ensino
Fundamental, é comum o aluno se perguntar: por que devo estudar isso? Onde
vou usar este conhecimento? Ele é importante? Pois, muitas vezes, os argumen-
tos dos professores de que estudar é importante e são fundamentos da civilização
são insuicientes e incompreensíveis para os alunos. Para esses, estudar é inútil,

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


146 UNIDADE IV

como airmou Içami Tiba, em uma de suas palestras, lembrando que os alunos,
embora adorem estar na escola, não gostam de estudar.
Alguns professores falham na hora
de explorar a realidade e descobrir o
conhecimento acumulado historica-
mente pela humanidade com o aluno.
Esse fato ocorre principalmente na
disciplina de História, na escolha dos
conteúdos, quando o professor valoriza

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
somente o passado. Além disso, a frag-
mentação dos conteúdos, dos horários e
da estrutura burocrática na escola dii-
culta mais ainda esse aspecto.
Para alunos atualizados e moder-
nos, que têm acesso à internet, explorar signiica “navegar”. Já para o aluno
excluído desse processo, explorar a realidade signiica a busca pela sobrevivência
no mundo atual, com violência e violação da dignidade e direitos. Assim, para
ambos os alunos, “a realidade é mais dinâmica e mais urgente do que a exposi-
ção de uma aula” (NETO, 2004, p. 58).
Para superar o problema, há a proposta da transversalidade, atrelada aos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), que já mencionamos na unidade
anterior.
A transversalidade apresenta uma proposta que ultrapassa a fragmen-
tação dos conteúdos e disciplinas, prevendo um trabalho cujo conheci-
mento seja construído em função dos temas e propostas apresentados.
Atrelado aos PCNs, publicados pelo Ministério da Educação, onde se
pretende obter um referencial de conteúdos das diversas disciplinas,
são apresentados temas que devem nortear a elaboração dos objetivos,
programas e conteúdos que serão desenvolvidos por professores e alu-
nos nas escolas brasileiras (NETO, 2004, p. 59).

A partir da análise da realidade brasileira por especialistas, foram propostos


cinco temas para a transversalidade na Educação Nacional: ética, meio ambiente,
orientação sexual, pluralidade cultural e saúde. Assim, esses temas devem ser
referência na prática escolar de alunos do Ensino Fundamental, aproximando-os

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


147

de seus cotidianos e evitando o choque citado acima, entre conhecimentos dos


professores e expectativas dos alunos.
Pelo fato de os temas ultrapassarem as visões disciplinares dos professores,
é proposto três situações de aplicação da transversalidade:
■ Trabalho interdisciplinar: a partir de uma temática em comum, profes-
sores de duas ou mais disciplinas trabalham por um período de tempo
com o tema indicado, levando em consideração as especiicidades de
cada uma delas. A diiculdade dessa situação está em uniicar o tema a
partir da divisão de cada disciplina e suas particularidades. Assim, deve-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

-se tentar englobar todos na busca de uma compreensão ampla sobre o


determinado tema (NOGUEIRA, 1998).
■ Espaço dentro da grade horária: a escola deve reservar uma aula para dis-
cussão dos temas da transversalidade. Porém, ao criar este instante, o tema
transversal não estará mais ligado às disciplinas tradicionais, trazendo um
conhecimento repetitivo e até mesmo descontextualizado, contrariando
o princípio da transversalidade.
■ As disciplinas como meios e a transversalidade como im: apresentando
temas que ultrapassam as diferentes áreas do conhecimento, a proposta
de trabalho transversal requer uma nova concepção das disciplinas den-
tro da escola.
■ Desse modo, não excluiremos uma disciplina ou criamos uma nova, mas
mudamos a forma de abordagem das disciplinas atuais.

Devemos capacitar nossos alunos para estarem aptos a viverem nestes tempos
que se impõem, ou seja, prepará-los para resolver situações-problema por meio
da autonomia. Dessa forma, o desenvolvimento dessas capacidades habilitará
o estudante a relacionar as informações e instrumentalizá-las na sua leitura de
mundo, que por sua vez deverá ser menos preconceituosa e mais plural e ética,
conforme os temas propostos pela transversalidade.
Para chegar a essa realização, todas as áreas têm compromissos que impli-
cam em maior participação no processo de formação dos alunos.
No processo de formação de estudantes, alguns menosprezam os saberes
tradicionais, como se a presença de formação ética e cidadã signiicasse a ausên-
cia do domínio de conteúdos e das ciências. Outros desprezam as formulações

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


148 UNIDADE IV

feitas ao longo da tradição ocidental em nome de uma discussão atual, correndo


o risco de icar num discurso inconsciente. O professor deve lembrar que o saber
não surge espontaneamente, porém é adquirido, produzido e transformado his-
toricamente. Para Neto (2004, p. 64),
os temas transversais não deverão ser vistos como opositores dos sabe-
res clássicos, mas necessidades e questões do presente, de grande im-
portância, que não podem ser ignorados pelos educadores. Se o mun-
do, a família, os modelos mudaram, faz-se necessário uma nova prática
escolar, que atualize e valorize a própria escola e os que nela estão. Não
permitir que os temas do cotidiano se façam presentes em sala de aula

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
em detrimento dos grandes feitos do passado, é ignorar a angústia dos
alunos e educar com o olho voltado para trás, com um saudosismo in-
justiicável que signiica dizer que as questões de outras gerações foram
mais importantes que as da atualidade.

A implantação da transversalidade implica alterações no ensino de História,


tanto por meio das mudanças didático-pedagógicas e conceituais quanto pelo
ato de educar.
Os estudantes brasileiros são educados com uma disciplina de História
marcada por grandes acontecimentos sequenciais, até chegarmos ao que somos
hoje. Essa prática gerou um distanciamento e indiferença ao ensino de História
com relação aos estudantes, principalmente nos anos iniciais, criando um senso
comum no qual airma que a disciplina trata-se apenas de coisas antigas, sem
conexão com a realidade. Segundo Neto (2004, p. 66),
a inserção dos temas transversais deve ser considerada nesse contexto
de questionamento aos procedimentos escolares. Alterar a compreen-
são de que a disciplina não é um im em si mesma, mas um meio de
chegar a outros objetivos, reletindo e atuando na educação de valores e
atitudes dos alunos e cidadãos, é condição fundamental para renovação
do ensino. Deve-se abandonar a visão do conhecimento especíico da
disciplina, sem abrir mãos dos repertórios e recursos de cada área de
conhecimento, e, ao mesmo tempo, incorporar o papel de formação
exercido pelo educador, tratando de temas e questões que ultrapassam
o conteúdo programático, por meio dos temas transversais. A busca da
compreensão da realidade e a efetiva participação do indivíduo a partir
de dados e noções relativos ao seu cotidiano, ao seu universo, fazem
com que a escola passe a ser considerada como um, espaço de conheci

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


149

mento e reconhecimento, onde por intermédio das diversas disciplinas


e de sua nova abordagem o aluno seja capaz de ver e vislumbrar-se
como construtor de sua própria história.

Dessa forma, o ensino de História deve ser realizado de acordo com os temas
propostos pela escola, a im de se tornar presente e capaz de dizer sua função
no processo escolar.
Dois são os procedimentos utilizados no ensino de História:
■ A divisão em períodos da História: História do Brasil, História Geral ou
da América.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

■ A divisão por temas, como a organização do trabalho, industrialização,


formação de cidades e a vida urbana.

Em ambos os processos, pode-se trabalhar com os temas transversais. A proposta


de renovação e de visão da História, que supere a divisão cronológica, aponta
para o segundo procedimento como o mais adequado para o ensino transversal.
Podemos, a partir das discussões, apontar algumas primeiras conclusões sobre
o tema. O ensino é algo dinâmico e necessita se adaptar à realidade dos alunos.
Dessa maneira, o professor pode e deve renovar e modiicar o ensino de História.

Você é adepto a um ensino transversal? Como faria para que isto se tornasse
vivo em suas aulas?

A seguir, são citados alguns pontos que resumem a proposta de trabalho com
os temas transversais:
■ Valorizar o aluno e seu universo.
■ Estimular a oralidade, a produção textual e análise de documentos.
■ Selecionar o que falar e como falar para que o aluno possa fazer a articu-
lação entre sua individualidade e a história coletiva.

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


150 UNIDADE IV

■ Saber identiicar o esgotamento ou a necessidade de aprofundamento de


um tópico, pela maturidade, envolvimento e proximidade com o que é
vivido pelos alunos, devendo estar atento ao ritmo dos mesmos.
■ Expor ao aluno o que se ensina, por que se ensina e aonde quer chegar,
para que eles reajam e discutam em torno desses mesmos objetivos.
■ Dar a dimensão que o conhecimento histórico é um meio para com-
preender o mundo, as questões da atualidade, suas origens, as diversas
respostas e explicações para um determinado fato, levando o aluno a ver
que há diversas explicações para uma mesma realidade devendo abrir-se

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para ouvi-las e questioná-las (NETO, 2004).

Nilbo Ribeiro Nogueira (1998) faz uma interessante distinção, que merece nossa
atenção, ao discutir sobre os termos multidisciplinaridade, pluridisciplinaridade,
interdisciplinaridade e transdisciplinaridade.
A multidisciplinariedade, segundo ele, acontece quando há integração de
diferentes conteúdos de uma mesma disciplina. O professor de História pode
tratar de temas como a escola, integrando-os ao contexto da cultura.
Na pluridisciplinaridade, existem sinais de uma cooperação entre as disci-
plinas, ainda que pequena. Exemplo típico, segundo Nogueira (1998), é quando
trabalhamos com um mesmo tema nas diferentes disciplinas.
Já na interdisciplinaridade, a tônica é o trabalho de integração dos diferen-
tes áreas do conhecimento. As diferentes disciplinas não aparecem isoladas, visto
que a dinâmica conduz à uniicação. Neste momento, se propõe um sistema sem
fronteiras, em que a integração chega a um nível tão alto que é impossível dis-
tinguir onde começa uma disciplina e termina a outra.
Segundo Nogueira (1998), este nível beira a utopia. Ademais, Ivani Fazenda
(1995, p. 31), concordando com ele, considera o nível transdisciplinar “o mais
alto das relações iniciais nos níveis multi, pluri e interdisciplinares”. É assina-
lado, porém, que isso se trata de uma utopia, por apresentar uma incoerência
básica. E explica: “a própria ideia de uma transcendência pressupõe uma instân-
cia cientíica que imponha sua autoridade às demais, e esse caráter impositivo
da interdisciplinaridade negaria a possibilidade do diálogo, condição sine qua
non para o exercício efetivo da interdisciplinaridade”.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


151

Para Nogueira (1998), é importante reletir sobre a postura do professor,


visto que ela norteará os trabalhos de caráter interdisciplinar. Ele acredita que
não basta ter vontade de praticar a interdisciplinaridade, mas deve haver tam-
bém uma vontade política que supere o mero discurso e assuma uma atitude
concreta, principiando por romper com velhos paradigmas.
Isto porque há que se presumir que o aluno já é possuidor de um “espectro
de competências, ávidas por serem desenvolvidas” e que a centralização nos con-
teúdos não é superior “às vivências, à interação social e todos os demais fatores
essenciais à construção do conhecimento” (NOGUEIRA, 1998, p. 31).
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A postura de aceitação do novo não deve, no entanto, partir de um único ou


de poucos dentre os professores que trabalham com a mesma série, isso quando
não é um único docente que trabalha com todas as disciplinas. A grande dii-
culdade consiste em formar uma equipe, chegar ao consenso, superar a fase dos
sujeitos isolados e terminar com uma divisão de tarefas que permita os bons
resultados, como resultado dos projetos interdisciplinares.
Uma boa proposta de trabalho é a união entre o ensino de Língua Portuguesa
e de História. Nas aulas de Língua Portuguesa, o professor propõe a leitura de lite-
ratura infantil ou mesmo de paradidáticos que tratem de temas relativos à História.
Vale ressaltar que, enquanto os livros de literatura infantil se preocupam
apenas em contar uma “história”, os paradidáticos visam oferecer informação ao
leitor. Neste sentido, esses materiais são uma ferramenta adicional que o profes-
sor pode e deve utilizar em suas aulas, para que se tornem atrativas e produtivas
aos olhos dos alunos. Mesmo quando o autor destes paradidáticos faz uso de uma
pequena história para ilustrar o contexto, ela é sempre um pretexto para facilitar
a compreensão do assunto de determinada área do conhecimento.
No entanto, o texto expositivo não deve se restringir meramente à transmis-
são de informações. Isso porque, no mundo atual, ocorreu uma incrível mudança
com a crescente ampliação do campo do saber e o avanço da tecnologia, sobre-
tudo no setor das comunicações, o que tornou a informação bastante acessível.
Por isso mesmo, o leitor precisa ter condições de selecionar essas informações e
de lançar sobre elas um olhar crítico, o que só é possível com o desenvolvimento
da autonomia do pensar e do agir.

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


152 UNIDADE IV

A formação desse leitor autônomo supõe que a informação seja contextuali-


zada: que parta do que é familiar ao aluno e, ao inal, retome a realidade vivida,
para que não se reduza a abstrações, mas adquira sentido vital.
O conhecimento contextualizado, inserido nas situações vividas, deixa de ser
passivo, como acontece com o saber acabado e recebido de fora. De fato, quando
o aluno consegue identiicar os problemas e conlitos da realidade, tudo o que
aprende adquire novo sentido para sua vida. Assim, o conhecimento deixa de
ser uma aventura apenas intelectual, porque se encontra enriquecimento por
contornos afetivo e valorativo.

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O saber incorporado ao vivido é uma condição importante para a forma-
ção integral do aluno, pois estimula a atitude crítica e responsável, preparando-o
para se tornar um cidadão ativo na sociedade, membro integrante da comuni-
dade e possível agente transformador.

HISTÓRIA E LITERATURA

Esta relação que podemos estabelecer entre literatura e História merece destaque
nos últimos anos, por meio de estudos aproximando as duas áreas. Essa aproxi-
mação, pouco valorizada até a algum tempo atrás, oferece novas possibilidades
de trabalho aos professores polivalentes, como é o caso dos pedagogos que atuam
da Educação Infantil aos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Para estabelecer esta relação, é preciso “quebrar” as fronteiras entre o dis-
curso histórico e o discurso literário, sistematizando alguns elementos e propondo
novas formas de trabalho, principalmente nas salas de aula dos anos iniciais do
Ensino Fundamental, no momento da “hora do conto” em que, normalmente,
a professora da turma reúne seus alunos para ouvirem contos de fadas, lendas,
histórias infantis atuais ou obras de literatura infantil. Desse modo, propomos
que haja um trabalho conjunto, promovendo articulações entre o discurso lite-
rário e o histórico, problematizando as características das narrativas histórica e
literária. Para Sefner e Bicca Jr. (2002, p. 65),

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


153

reconhecer que a escrita histórica toma a forma da narrativa e partilha com


outras narrativas, inclusive as iccionais, numerosas características em co-
mum, pode signiicar ameaça ao próprio estatuto cientíico da narrativa
histórica, trazendo a percepção de que as fronteiras entre história e lite-
ratura apresentam contornos pouco nítidos (SEFFNER; BICCA JUNIOR,
2002, p. 65).

Isto porque “a história foi por longo tempo considerada um ramo da retórica -
a arte de bem dizer- modalidade esta que admitia a proximidade entre ela e as
manifestações literárias em geral (HICKMANN, 2002, p. 65).
A aparente confusão entre História e literatura que hoje em dia parece existir,
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se resolve melhor se o professor puder trabalhar ambos os discursos conjunta-


mente na sala de aula, destacando proximidades e diferenças, concordâncias e
discordâncias, para que o aluno possa perceber características do pensamento
cientíico.
Como forma de representação do mundo das relações sociais, a nar-
rativa traz, inevitavelmente, para o corpo da ciência, a igura ativa do
sujeito. Reconhecer a história como discurso narrativo é reconhecer a
presença do sujeito no ato da formulação cientiica. Negar à narrativa
legitimidade de representação do mundo real é retiicar o projeto de
uma ciência sem sujeito. Uma história sem sujeito, centrada no objeto,
preiguraria o ideal cientiico do positivismo, do estruturalismo e quem
sabe até dos pioneiros de uma ilosoia da história no sentido preciso
de um “telos” que amarraria vontades e instintos às leis gerais objetivas
que determinam as relações sociais (BOMENY, 1990, p. 92 apud HI-
CKMANN, 2002, p. 67).

Dessa forma, tratar do problema da narrativa, abordando a igura do autor, é


algo que pode ser feito logo nos anos iniciais, na hora do conto.
A História e a literatura são formas de conhecer o mundo por meio da nar-
rativa, e sua apresentação desde cedo às crianças trará intimidade com elementos
típicos da narrativa, tais como: enredo, trama, personagens, ação, contexto
etc., facilitando, assim, a compreensão da criança aos dramas sociais vividos,
dando-lhes capacidade de interferência neles, além de desenvolver na criança
competências de leitura, escrita e leitura histórica do mundo.

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


154 UNIDADE IV

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Convém destacar que ambas as matérias narraram o mundo de formas diferen-
tes, pois enquanto a literatura trabalha com a convenção da iccionalidade, a
história trabalha com a convenção da veracidade.
Se adotarmos o modo de ver as coisas “ao pé da letra” como tratavam iló-
sofos e teóricos das ciências sociais até o início do século XIX, que acreditavam
que o fato real não se reduzia a si mesmo para constituir a “verdade”, e esta, por
sua vez, seria alcançada no momento em que se integrasse a um “conceito”, for-
mando o “discurso”, teremos problemas ao trabalhar História e literatura, tendo
em vista que, ao considerarmos a icção como “o que não é verdade”, teremos o
obstáculo da compreensão da realidade.
Devemos considerar equivocada uma pessoa que busca desqualiicar uma
obra de arte, procurando nela erros históricos. A obra literária é totalmente ic-
cional ou artística, mas também é totalmente histórica. De acordo com Sefner
e Bicca Junior (2002, p. 68), “analisada pelos olhos da história, uma obra de ic-
ção deixa perceber pistas e pegadas históricas que existem dentro dela”, podendo
proporcionar um debate em sala de aula. Muitas obras literárias inluenciam até
hoje gerações, sendo considerados documentos históricos de tal época.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


155

Houve um tempo, não muito longínquo, em que a maioria dos historia-


dores proissionais desconiavam da escrita elegante como se existisse
algo de imoral em tentar atrair os leitores oferecendo-lhes mais do que
‘os fatos’, servido sem nenhum ornamento, como a comida inglesa. Fe-
lizmente na França e em outros lugares, alguns dos melhores historia-
dores em atividade hoje se destacam também como escritores – mesmo
se não encaram a história como forma de icção (BURKE, 1998, p. 3).

A hora do conto ou hora da história, como muitos professores enfatizam, é uma


metodologia que propõe atividades a partir da relação entre História e litera-
tura. As obras literárias, em geral, são abordadas a partir de um roteiro original,
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dividido em quatro tópicos, que permitem estabelecer relações entre o iccio-


nal e o histórico:
■ Descrever e analisar situações presentes na narrativa literária, aprofun-
dando a compreensão através de pesquisa histórica.
■ Caracterizar os personagens iccionais, como proissão, aproximando os
com personagens históricos.
■ Perceber e analisar os espaços iccionais, como castelo, loresta.
■ Perceber a crítica ideológica presente na literatura, analisando as falas,
tanto do narrador quanto dos personagens (HICKMANN, 2002, p. 69).

Ao inal, deve-se aprofundar uma análise mais ampla da obra, com elementos
históricos e literários.
Assim, o objetivo da metodologia não é o de corrigir as obras literárias de
seus erros históricos, mas sim, estabelecer uma narrativa histórica que segue
e comenta as cenas descritas na literatura, até mesmo apontando divergências
entre o iccional e o histórico, no intuito de problematizar os diferentes cami-
nhos de produção das narrativas.
Deve-se, portanto, escolher uma narrativa rica em cenas que possam ser
comentadas a partir de um ponto de vista histórico, fazendo com que a narra-
tiva histórica preencha algumas lacunas que possam existir, como, acrescentar
informações a respeito de um determinado personagem histórico, permitindo
que o aluno se familiarize com conceitos como tempo, cultura, história, iden-
tidade, memória, guerreiro, cavaleiro, dinastia, casamento, cidade, passado,

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


156 UNIDADE IV

presente, futuro etc., conceitos esses que lhes serão úteis quando estudarem a
disciplina de História na sua totalidade e especiicidade. Para Sefner e Bicca
Junior (2002, p. 70),
o trabalho de história sobre as literaturas infantis orienta-se no sentido
de recuperar os elementos históricos dispersos pelo texto, e aprofundá-
-los com leituras complementares, feitas pela professora e depois trans-
mitidas aos alunos através de contação de histórias, do uso de gravuras,
da leitura de pequenos textos, etc. conigurando a ‘hora da leitura.’

Desse modo, podemos veriicar as proissões que aparecem na literatura, em que,

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por exemplo, o povo trabalha, o clero reza e os nobres guerreiam. Ainda podemos
analisar os costumes do cotidiano, como: o que os personagens comem, quais
objetos possuem em suas casas, quais animais possuem, quais os meios de loco-
moção, onde moram etc. além da estrutura familiar, como o papel da madrasta,
localizando-os no tempo e no espaço.
Além disso, as gravuras e ilustrações também merecem destaque, conside-
rando sua importância para análise da obra. Podemos utilizar gravuras de épocas,
como as presentes em literaturas infantis clássicas, ou imagens atuais, reletindo
sobre o modo com que o ilustrador interpretou as situações e os personagens
presentes na obra. Além do mais, pode-se fazer uma comparação entre essas gra-
vuras com as gravuras históricas relacionadas ao mesmo tema.
A produção de uma aprendizagem signiicativa na aula de História é dada
pela capacidade de analisar situações históricas pelo aluno. E, assim, uma obra
literária fornece várias situações históricas, tanto do passado quanto do presente.
Para Sefner e Bicca Junior (2002, p. 72),
o ensino da história é um ensino de situações históricas [...] é a partir
de questões do mundo de hoje que o professor orienta seus alunos no
estudo de situações do passado [...] nesta medida torna-se importan-
te orientar o aluno a veriicar recorrências, mudanças e permanências
dentro de cada situação estudada.

A partir de fragmentos históricos contidos na literatura infantil e de outras infor-


mações, montamos uma história complexa, trazendo aprendizagens signiicativas
em sala de aula, visto que essa é nossa proposta.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


157

Nos momentos do professor contar histórias a seus alunos, é possível orien-


tá-los a identiicar elementos históricos presentes na literatura, associando com
a realidade da época em que a obra foi escrita. Sefner e Bicca Junior (2002) nos
lembram que é possível perceber a atualidade de alguns dramas sociais apresen-
tados pelas histórias infantis, e que justamente contribuem para garantir suas
permanências como clássicos na literatura, como é o caso do clássico Chapeuzinho
Vermelho. Neste exemplo, podemos estabelecer um comparativo, destacando
diferenças e semelhanças entre como a história era, no tempo que foi narrada,
e como seria hoje. O que substituiria o lobo mau, a loresta, a menina que levou
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os doces para a vovozinha, etc.


■ Uma vez selecionada a obra, os procedimentos de trabalho envolvem a
coleta das diferentes edições e versões do conto disponíveis em língua
portuguesa.
■ Leitura e interpretação dos textos, identiicando diferenças relevantes
entre as várias edições.
■ Identiicação dos elementos característicos, tanto no aspecto histórico
(a divisão da herança, a vida dos camponeses, o casamento de interesses
etc.) como no aspecto cultural- simbólico (o castelo, o gato, as botas etc.).
■ A pesquisa histórica acerca dos elementos selecionados, permitindo mon-
tar um roteiro de questões para discussão com as crianças.
■ Elaboração de um texto apresentando os resultados da pesquisa histórica.
■ Seleção e análise das ilustrações, identiicando os aspectos históricos nelas
presentes, identiicando diferenças e recorrências entre as gravuras das
diferentes edições.
■ Comparação de aspectos discordantes nas diferentes versões do conto.
■ Construção de roteiro de atividades para o trabalho em sala de aula
(SEFFNER; BICCA JUNIOR., 2002, p. 73).

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


158 UNIDADE IV

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Fonte: Fatos Desconhecidos (2014, on-line)1.

HISTÓRIA EM QUADRINHOS

Um recurso didático que as crianças adoram e que pode ser usado também para
estudar conteúdos de História é a utilização das Histórias em Quadrinhos.
É fundamental que o professor selecione bem as HQs que serão utilizadas na
aula. Por sua grande variedade, a seleção deve ser feita tendo em mente o obje-
tivo da aula e atentando para os temas e a linguagem da história em quadrinhos,
bem como para o grau de desenvolvimento dos alunos e a faixa etária. Para os
primeiros anos do ensino fundamental, os alunos começam a socializar-se mais
e a ter mais atenção ao ambiente, identiicando características de pessoas e gru-
pos. Dessa forma, podem ser apresentadas diferentes HQs e incentivá-los a fazer
trabalhos que incorporem essa linguagem.
As HQs podem ser utilizadas para complementar as aulas de história, por
exemplo, com os conceitos das dimensões do tempo. No recordatório, que é um
texto que contextualiza as ilustrações para o leitor nas HQs, em que “se lê ‘mais
tarde... ’ ou ‘logo depois… ’ [no quadrinho] pode ser um exemplo de sucessão,
e aquele em que se lê ‘enquanto isso… ’ pode facilitar ao aluno a percepção da

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


159

ideia de simultaneidade” (COSTA, 2012, p. 133). Além disso, os elementos visu-


ais que compõem as HQs também podem ser utilizados para ilustrar a relexão
acerca da noção de tempo. Por exemplo, o anoitecer ilustrado pela lua indica o
tempo da natureza, um personagem saindo do escritório indica o término do
expediente do trabalho.
Costa (2012) aponta três maneiras para utilizar os quadrinhos especiica-
mente nas aulas de história:
1. Ilustração dos aspectos da vida social de outras épocas – para esse caso,
são selecionados os quadrinhos “históricos”, cuja criação se deu posterior-
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mente à época representada. São icções históricas que podem fornecer


informações sobre o período em que a história é ambientada.
2. Registro da época em que os quadrinhos foram produzidos – nesse
caso, os quadrinhos são um registro do próprio período em que foram
produzidos.
3. Introdução de conceitos históricos – para essa inalidade, Costa (2012)
cita a obra As aventuras de Conan. Apesar de estar ambientada em lugares
e épocas imaginárias, tem inspiração em civilizações da Antiguidade, o
que pode ser um ponto de partida para a discussão dos conceitos de civi-
lidade, barbárie, Estado, império, expansionismo etc. no mundo antigo.

A ATIVIDADE LÚDICA

A atividade lúdica, por intermédio de jogos e brincadeiras é também de fun-


damental importância, uma vez que possibilita o desaparecimento da fronteira
entre o trabalho, que é obrigatório e exige esforço, e o divertimento, prazeroso e
alegre, levando os alunos a se envolverem, arriscarem, interessarem e aprende-
rem com satisfação, prazer e autoconiança.
Os jogos utilizados com ins didáticos devem apresentar regras criadas
pelo professor ou juntamente com os alunos para trabalhar determinadas
habilidades, atitudes, conteúdos e valores. Deve ser uma atividade orientada
na qual a criança utiliza-se do faz de conta, que é próprio das brincadeiras e
da recreação, em que o aluno é espontâneo e tem autonomia para imaginar e

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


160 UNIDADE IV

desenvolver atividades em que, geralmente, não há interferência do professor.


Além disso, o lúdico deve proporcionar maior socialização e integração entre o
grupo de alunos e entre professor aluno e, acima de tudo, o estabelecimento de
valores que venham a contribuir na formação de cidadãos responsáveis, críticos
e construtores de um mundo melhor.

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São inúmeras as vantagens dos jogos educativos que envolvem aspectos
motores, afetivos, morais e sociais. Cabe ao professor utilizar os jogos que deem
oportunidades aos alunos para desenvolverem esses aspectos que estão, na rea-
lidade, interligados.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


161

Uma possibilidade é a brincadeira do gato e rato. Nessa brincadeira, os ami-


gos fazem uma roda, dando as mãos. Alguém tem de ser o rato e icar dentro
da roda. Outra pessoa é o gato e ica do lado de fora. O gato pergunta e a
roda responde:
-O senhor rato está em casa?
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-Não! - A que horas chega?


-Às cinco horas!
A roda, então, começa a girar, contando as horas combinadas.
Quando terminar, solta os braços, mas mantém a posição. O gato entra na
roda para pegar o rato.
O gato e o rato podem entrar e sair da roda, correndo.
O gato tenta agarrar o rato, que foge do gato o quanto pode. Quando o rato
é preso, recomeça o jogo.
Quem foi o rato é o gato na vez seguinte. Outra pessoa da roda é o rato.
Esta possibilita desenvolver a noção de tempo, bem como permite a sociali-
zação entre outros. Para conhecer algumas brincadeiras, a Revista Nova Es-
cola reuniu uma série de brincadeiras de todas as regiões do Brasil.
Acesse o link e conira: <http://acervo.novaescola.org.br/brincadeiras-regio-
nais/>
Fonte: Autora

As Diferentes Linguagens no Ensino de História: Uma Proposta Interdisciplinar


162 UNIDADE IV

CULTURA AFRO-BRASILEIRA E INDÍGENA

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Diferentes culturas e modos de vida sobrevivem lado a lado no território brasi-
leiro. Quais reações tem provocado o encontro dessas culturas? Como cada um
de nós interpreta o outro, o desconhecido? Leia a canção a seguir, escrita pelos
compositores e estudiosos da cultura popular Antonio Nóbrega e Wilson Freire,
que procura reproduzir a impressão dos habitantes do território brasileiro na
chegada dos portugueses (CABRINI; CATELLI; MONTELLATO, 2009).
CHEGANÇA
Sou Pataxó, sou Xavante e Cariri,
Ianomâmi, sou Tupi, Guarani, sou Carajá,
Sou Pancaruru, Carijó, Tupinajé,
Potiguar, sou Caeté, Ful-ni-ô, Tupinambá,
Depois que os mares dividiram os continentes,
Quis ver terras diferentes.
Eu pensei “vou procurar um mundo novo, lá depois do horizonte,
levo a rede balançante pra no Sol me espreguiçar”.
Eu atraquei num porto muito seguro, céu azul, paz e ar puro...
Botei as pernas pro ar.

Logo sonhei que estava no paraíso, onde nem era preciso dormir para sonhar.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


163

Mas de repente me acordei com a surpresa...


Uma esquadra portuguesa veio na praia atracar
Da Grande-nau, um branco de barba escura,
vestindo uma armadura me apontou pra me pegar.
E assustado dei um pulo lá da rede, pressenti a fome, a sede,
Eu pensei: “Vão me acabar”.
Me levantei de broduna já na mão.
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Aí, senti no coração, o Brasil vai começar.


(NÓBREGA; FREIRE, 1997)

Na primeira unidade do nosso material didático, foi abordado que a ciência his-
tórica procura compreender a cultura das sociedades. Nosso Brasil é rico tanto
em extensão quanto em culturas e sociedades. Na canção acima, é possível per-
ceber, por exemplo, que mesmo se tratando de indígenas há várias tribos, cada
qual com seus costumes, crenças, etc. Para tratar da temática, buscamos como
referência o antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro.
O antropólogo Darcy Ribeiro (1913-1997) foi um dos maiores intelectuais
brasileiros do século XX. Em um passeio pela internet é possível encontrar vários
vídeos, que mostram os programas da série baseada na obra central de Darcy: O
Povo Brasileiro, em que o autor responde a questão “quem são os brasileiros?”,
investigando a formação do nosso povo. Coproduzida pela TV Cultura, a GNT
e a Fundar, a série conta com a participação de Chico Buarque, Tom Zé, Antônio
Cândido, Aziz Ab´Saber, Paulo Vanzolini, Gilberto Gil, Hermano Vianna entre
outras personalidades. O Povo Brasileiro é uma recriação da narrativa de Darcy
Ribeiro, e discute a formação dos brasileiros, sua origem mestiça e a singulari-
dade do sincretismo cultural que dela resultou.

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


164 UNIDADE IV

Você já assistiu a um vídeo do Darcy Ribeiro? Que tal assistir antes de dar-
mos continuidade às nossas discussões?

Se buscarmos uma deinição universal sobre cultura, chegaremos a Edward B.


Tylor (1832 – 1917), que a deiniu como sendo o conjunto complexo de conhe-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
cimentos, crenças, arte, moral e direito, além de costumes e hábitos adquiridos
pelos indivíduos em uma dada sociedade.
Tal conceito se faz importante para compreendermos porque cada um tem
uma visão de mundo, avalia determinado assunto sob certa ótica, nasce e con-
vive em uma classe social, pertence a uma etnia, etc. Todas estas são condições
que nos levam a pensar na diversidade cultural e, consequentemente, na alte-
ridade, isto é, no outro ser humano, que é igual a cada um de nós e, ao mesmo
tempo, diferente.
Se nos remetermos especiicamente à cultura brasileira, muitos foram aque-
les que tentaram determinar e entendê-la em suas múltiplas dimensões. Mas,
é certo que, embora com diferentes posições ideológicas e política, a grande
maioria concorda com o fato de que a característica marcante desta cultura é a
pluralidade cultural, o que é resultado do processo histórico-social e das dimen-
sões continentais de nosso imenso território. Desse modo, acredita-se que não
há somente uma cultura brasileira, mas sim várias culturas inseridas em uma,
fruto da multiplicidade étnica de sua concepção.
No Brasil, a miscigenação e a diversidade multicultural da sociedade foram
constituídas em suor e trabalho não remunerado de indígenas e africanos, que
receberam como fruto de seu esforço físico a segregação e os maus-tratos.
Foram séculos de dívida que marcaram nossa história, comemorada no dia 20
de novembro.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


165

DIA DA CONSCIÊNCIA NEGRA


No dia 20 de novembro, comemora-se o Dia da Consciência Negra. Nesse
dia, várias cidades fazem opção pelo feriado – ele é facultativo, contudo, nas
escolas brasileiras é data oicial do calendário. A data faz menção ao dia em
que foi assassinado, no ano de 1695, o líder Francisco Zumbi, do Quilombo
dos Palmares, herói e um dos principais símbolos da resistência negra à es-
cravidão.
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Fonte: a autora

Trazendo a problemática para o âmbito Educacional, percebemos que ela também


icou relegada a um modelo eurocêntrico, como airma Nascimento (1978, p. 95):
o sistema educacional [brasileiro] é usado como aparelhamento de
controle nesta estrutura de discriminação cultural. Em todos os níveis
do ensino brasileiro – elementar, secundário, universitário – o elenco
das matérias ensinadas, como se se executasse o que havia predito a fra-
se de Sílvio Romero constitui um ritual da formalidade e da ostentação
da Europa, e, mais recentemente, dos Estados Unidos.

E o autor prossegue indagando:


se consciência é memória e futuro, quando e onde está a memória afri-
cana, parte inalienável da consciência brasileira? Onde e quando a his-
tória da África, o desenvolvimento de suas culturas e civilizações, as
características, do seu povo, foram ou são ensinadas nas escolas brasi-
leiras? Quando há alguma referência ao africano ou negro, é no sentido
do afastamento e da alienação da identidade negra. Tampouco na uni-
versidade brasileira o mundo negro - africano tem acesso. O modelo
europeu ou norte-americano se repete, e as populações afro-brasileiras
são tangidas para longe do chão universitário como gado leproso. Falar
em identidade negra numa universidade do país é o mesmo que pro-
vocar todas as iras do inferno, e constitui um difícil desaio aos raros
universitários afro-brasileiros (NASCIMENTO, 1978, p. 95).

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


166 UNIDADE IV

Este cenário de discriminação cultural passou a ser repensado com a Lei de


Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9394/96, e mais especiicamente com
o advento do Parecer/Lei 10.639/03 – transformada na Lei 11.645 de 2008, que
incluiu a temática indígena – abrindo grandes possibilidades no que diz respeito
à ediicação da igualdade e da repreensão às atitudes e posturas de discrimina-
ção no ambiente escolar.
A Lei 10.639 é de autoria de Esther Grossi, promulgada pelo então presidente
da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em 9 de fevereiro de 2003. Ela incluiu
no currículo oicial dos estabelecimentos de Ensino Básico das redes pública e

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
privada a obrigatoriedade do estudo da temática história e cultura africana e
afro-brasileira. Ferreira (2005, p. 1) expõe sobre o conteúdo da Lei:
de acordo com a lei, o conteúdo programático das diversas disciplinas
deve abordar o estudo de história da África e dos povos africanos, a luta
das pessoas negras no Brasil, a cultura negra brasileira e o(a) negro(a)
na formação da sociedade nacional, resgatando a contribuição do povo
negro nas áreas social, econômica e política pertinentes à história do
Brasil. Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira de-
vem ser ministrados no âmbito de todo o currículo escolar e, principal-
mente, nas áreas de educação artística, literatura e história brasileira.

Esta Lei foi regulamentada por um parecer, homologado em 19 de maio de 2004,


que institui as diretrizes curriculares do país para a educação das relações étni-
co-raciais e traz direções de como a Lei deve ser colocada em prática. Ela ainda
pertence à lista de medidas educacionais que devem ser implementadas pelo
governo federal como signatário de pactos internacionais no combate ao racismo.
Para Ferreira (2005, p. 1), esta medida “atende uma demanda gerada pelo des-
conhecimento, por parte de grande parcela da população brasileira, das questões
relativas às sociedades africanas”, de modo especial no que diz respeito às mar-
cantes inluências do povo africano na formação da sociedade brasileira. O autor
entende que este parecer “foi elaborado para contribuir com a efetivação dessa
medida de ação airmativa e estabelecer as diretrizes curriculares nacionais para
a educação das relações étnico-raciais e para o ensino da história e cultura afro-
-brasileira e africana no país”.
A partir de sua homologação pelo Ministro da Educação, esse parecer se cons-
tituiu como uma ferramenta para que todo cidadão, especialmente pais, mães,

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


167

estudantes e proissionais de educação, pudessem dialogar com as escolas e todo o


sistema de ensino, além de acompanhar e iscalizar o cumprimento da Lei. Este pare-
cer tem força de lei, e deve, portanto, ser utilizado como norma regulamentadora.
Ele corrige conceitos e abordagens das políticas de reparações; reco-
nhece e valoriza os indivíduos e as ações airmativas; contextualiza a
educação nas relações étnico-raciais; apresenta as determinações para
a inclusão da história e cultura afro-brasileiras e africanas e suas impli-
cações e repercussões pedagógicas, incluindo a formação do professo-
rado. O parecer trata de questões como consciência política e histórica
da diversidade, fortalecimento de identidade e de direitos, ações educa-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

tivas de combate ao racismo e às discriminações e discute o papel dos


conselhos de educação em adequar o proposto pela lei, e pelo próprio
parecer, à realidade de cada sistema de ensino (FERREIRA, 2005, p. 1).

O QUE DIZ A LEI?

Transcorremos abaixo o que a Lei vem nos explicitar para então darmos conti-
nuidade as nossas discussões:
LEI Nº 11.645, DE 10 MARÇO DE 2008.

Altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modiicada pela Lei


no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases
da educação nacional, para incluir no currículo oicial da rede de en-
sino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira
e Indígena”.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacio-


nal decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o O art. 26-A da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa
a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e de ensino


médio, públicos e privados, torna-se obrigatório o estudo da história e
cultura afro-brasileira e indígena.

§ 1o O conteúdo programático a que se refere este artigo incluirá di-


versos aspectos da história e da cultura que caracterizam a formação
da população brasileira, a partir desses dois grupos étnicos, tais como
o estudo da história da África e dos africanos, a luta dos negros e dos

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


168 UNIDADE IV

povos indígenas no Brasil, a cultura negra e indígena brasileira e o ne-


gro e o índio na formação da sociedade nacional, resgatando as suas
contribuições nas áreas social, econômica e política, pertinentes à his-
tória do Brasil.

§ 2o Os conteúdos referentes à história e cultura afro-brasileira e dos


povos indígenas brasileiros serão ministrados no âmbito de todo o cur-
rículo escolar, em especial nas áreas de educação artística e de literatura
e história brasileiras.” (NR)
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.

Brasília, 10 de março de 2008; 187o da Independência e 120o da Re-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
pública.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA


Fernando Haddad

Este texto não substitui o publicado no DOU de 11.3.2008. (BRASIL,


2008, on-line).

A necessidade de aprofundar o estudo sobre a questão étnica no Brasil icou sub-


sidiada com a promulgação das Leis n. 10.639/03 e 11645/08, que altera a Lei
9394/96 e torna obrigatória, nos currículos do Ensino Fundamental e Médio em
todos os estabelecimentos de ensino do país, a inclusão da temática “História e
Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Para Barbosa (2007, p. 1),
todo esse legado cultural trazido pelos escravos africanos, ainda
permanece, infelizmente desconhecido por boa parte de nossas
crianças. A lei federal 10.6931, sancionada em 2003, tornando
obrigatório o ensino de história e cultura afro-brasileira nas esco-
las de ensino fundamental e médio, público e particular, em disci-
plinas como história e literaturas brasileiras, é uma conquista da
sociedade e pretende justamente possibilitar que nossas crianças
percebam a importância desses valores civilizatórios na sociedade
brasileira.

Percorrendo sites de editoras do nosso país, vemos a preocupação de adequar-


-se à Lei. A editora Ática, por exemplo, explicita em seu meio eletrônico que a
demanda que a comunidade afro-brasileira há décadas vem exigindo, cristaliza-
-se com essa lei, pois reconhece e exige valorização e respeito às pessoas negras,
à sua descendência africana, sua cultura e sua história.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


169

A editora prossegue airmando que, historicamente, a política educacional


brasileira traz a exclusão já em seu bojo, pois não só o preconceito de classe, mas
o preconceito de raça e as propostas curriculares voltadas para as classes popu-
lares constituem-se em falácias e fortalecem o mito da democracia racial. Isso
porque, na medida em que não inclui a História da África e a cultura afro-bra-
sileira nos currículos escolares do país, nossa política educacional não leva em
conta a identidade dos negros, não respeita seu modo de ser e pensar o mundo
e resiste a considerar a imensa inluência que a cultura africana sempre exer-
ceu sobre o modo de ser do brasileiro, que possui mais de 40% da população
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

negra e mestiça.
Esse segmento, com escolaridade insuiciente e padrão de vida bem abaixo da
média, precisa conhecer a história brasileira sob o ponto de vista não dos pseudo
vencedores, mas daqueles que realmente foram protagonistas dela.
A Lei explicita que não há uma disciplina ou série especíica para se traba-
lhar com a temática, pois esse tema deverá ser inserido no âmbito escolar nas
diversas disciplinas e séries a im de compreender, valorizar e integrar tal cul-
tura a própria cultura brasileira.
Contudo, Braga aponta que, embora decorridos quase dez anos da promul-
gação da Lei 10.639/04, “veriica-se que há muito para percorrer na trilha da
educação igualitária. Houve muita polêmica, e o que se constata é que as esco-
las não desenvolvem atividades concentradas no ensino de ‘História da Cultura
Afro-Brasileira’”. Continua justiicando este fato “pela ausência de material didá-
tico-pedagógico apropriado e de formação docente necessária à compreensão da
profundidade e importância desse tipo de aprendizagem ou mesmo pela resis-
tência pura e simples de alguns setores” (BRAGA, 2009, p. 3).
Percebe-se, então, que é necessário incentivo à aplicação da Lei, e não somente
sua iscalização, mas ambas, aplicadas conjuntamente, para resultados mais
efetivos na Educação Básica. Isso porque somos herdeiros de um pensamento
dominante que exclui a África, seus descendentes e os povos indígenas da pró-
pria história do Brasil, que foi oicializada pela versão lusitana.
Mas Ki-Zerbo (1982, p. 28) entende que é preciso resgatar essas histórias e
inseri-las no contexto escolar, por meio de atividades pedagógicas relexivas e compro-
metidas com fontes históricas ou documentos escritos, bem como pela tradição oral.

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


170 UNIDADE IV

Porém, faz-se necessário compreender que existem problemas de acesso às


fontes para os estudos históricos. A maioria delas foi apagada pela ação do tempo
e humana, e em decorrência do jogo de interesses em cada período da história.
A dinâmica histórica e os interesses em disputa em cada momento permitem
ou impedem a sobrevivência das fontes e sua organização, bem como sua distri-
buição no tempo e no espaço. Além destes fatores, a história destes povos possui
fontes históricas fragmentadas, geralmente encontradas muito dispersadas. O
Centro de Referência Virtual do Professor (2011, p. 1) explica que:
a história da África não nos permite pensar numa homogeneidade de

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experiências históricas do continente, mas num complexo mosaico de
experiências simultâneas em diferentes pontos do continente e não
raro díspares. Outra questão importante para o estudo da história afri-
cana e para análise das fontes é a interdisciplinaridade.

Para se estudar a cultura afro-brasileira e indígena, além de inseri-la no ambiente


escolar, é necessário unir diversas áreas de conhecimento. Além disso, é impor-
tante que as informações sejam expostas do ponto de vista africano e indígena,
e não atrelado a padrões eurocêntricos.
Atualmente, o professor pode recorrer a vários contos africanos reunidos em
obras paradidáticas ou de literatura. Uma das pessoas que contribuiu imensa-
mente com o saber africano no Brasil é o escritor e contador de histórias Rogério
Andrade Barbosa que, ao morar no continente, teve conhecimento de diversos
contos, mitos e lendas, por meio de grupos étnicos africanos, e pôde então escre-
ver vários livros didáticos para crianças e jovens.
A oralidade constitui-se como um organismo que promove a compreensão
e assimilação, neste caso especíico, da identidade cultural africana. Assim, “o
estudo das fontes linguísticas – em sua dispersão e compreendidas como fontes
em constante mutação – muito contribui para compreensão das transformações
culturais e sociais pelas quais passaram as sociedades africanas” (CENTRO DE
REFERÊNCIA VIRTUAL DO PROFESSOR, 2011, p. 1).
O Centro de Referência Virtual do Professor (2011, p. 1) ainda exalta a arque-
ologia, especialmente enfatizando a cultura africana:
a arqueologia é uma ciência que estuda a história através da análise de
objetos e vestígios considerados testemunhos da existência humana em

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


171

algum ambiente. Esses objetos e vestígios podem ser variados, como


ossos, peças feitas de osso, cerâmicas, artefatos em ferro, vidro, metal e
pedraria, além de pegadas, rastros e outros. Na África, a arqueologia já
ofereceu aos estudiosos muitos indícios acerca da existência de socie-
dades antigas, as mais antigas do planeta. Há também vestígios de so-
ciedades organizadas, muitas delas com soisticada capacidade artística
e técnica, como é o caso de comunidades da região de Ifé, Oió e Benin,
além do Egito Faraônico (CENTRO DE REFERÊNCIA VIRTUAL DO
PROFESSOR, 2011, p. 1).
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem
ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se po-
dem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar.
(Nelson Mandela)

Quando se discute com estudantes a respeito das fontes mais utilizadas no pro-
cesso de construção da história de um povo, no caso, o africano, é interessante
introduzir os assuntos da espoliação e da dispersão destas fontes, que muitas
vezes foram desviadas do continente.
Questões instigadoras que levem à relexão destes processos são muito
valiosas, pois forçam a memorizar fatos importantes, por exemplo, no questiona-
mento: “Por que será que o Museu do Louvre, em Paris, possui um dos mais ricos
acervos de arte africana egípcia? Como estas peças passaram a integrar aquele
acervo?”. Dessa forma, há uma multidisciplinariedade no processo educacional.
Com esta única questão, retoma-se o contexto das “invasões napoleônicas, no
início do século XIX, quando uma quantidade enorme de produções artístico-
-culturais egípcias foram levadas para a França, constituindo parte importante
do acervo de arte egípcia do Louvre” (CENTRO DE REFERÊNCIA VIRTUAL
DO PROFESSOR, 2011, p. 3).
No que diz respeito às fontes arqueológicas, embora possuam variedade e
riqueza para compreensão da história, não há homogeneidade para seu estudo.
Desse modo, faz-se necessário ter em mente a importância da produção artística

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


172 UNIDADE IV

e cultural em determinados contextos e, especialmente, das práticas e percepções


de mundo conferidas a estes objetos em certas utilizações, ressaltando que “numa
determinada sociedade uma estatueta tenha sido produzida para representar o
poder de um grupo sobre outro, ou a capacidade de um elemento natural de
modiicar ou controlar a vida humana” (CENTRO DE REFERÊNCIA VIRTUAL
DO PROFESSOR, 2011, p. 3).
As danças são riquezas culturais que merecem destaque, visto que há muita
inluência africana nas danças difundidas pelo Brasil. Até mesmo as criações
nacionais possuem raízes africanas. Especialmente na região sudeste do país, há

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grande pluralidade cultural nas manifestações de dança. O Portal Brasil Escola
([2017], on-line)2 lista alguns tipos de danças folclóricas de origem africana:
Batuque – dança de origem africana, do ritual da procissão. É uma festa muito
popular nas cidades do interior de São Paulo, nas festas do Divino Espírito Santo,
ou nas festas juninas. O batuque é dançado em terreiro ou praça pública. Uma
ileira de homens ica a 15 metros de distância das mulheres, quando começa
a dança, os homens se aproximam das mulheres e encostam suas barrigas por
três vezes na companheira.
Samba de Lenço – é uma dança de origem africana, ele é sambado no meio
urbano (samba de salão), e no meio rural há três modalidades: samba de roda,
samba de campineiro e samba de lenço.
Festa de Iemanjá – Iemanjá é a mais prestigiada entidade feminina do
Candomblé, Umbanda e Macumba. O culto à Iemanjá é realizado na noite de
31 de dezembro para 1° de janeiro. Nesse dia os devotos vão prestar sua homena-
gem. Quando a noite vem chegando, milhares de iéis dirigem-se para a praia, e
todos festejam a Rainha do Mar, protetora das viagens marítimas e mãe de todos
os orixás. As pessoas levam presentes, lores, comidas e bebidas e fazem danças
temáticas, de origem africana.
Capoeira – Moreira (2007, p. 1) deine as raízes da capoeira:
a capoeira, essa arte de origem controversa e que ainda desperta muita
polêmica, emergiu no bojo das camadas populares e adentra as institui-
ções públicas e privadas de forma arrebatadora e efusiva, sendo capaz
de um pouco mais de quatrocentos anos de trajetória estar presente
na maior parte das escolas, clubes, universidades, academias, dentre
outros, se irmando com força em vários países do mundo, força esta,

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


173

que ora estamos precisando veriicar os interesses ideológicos que estão


sendo defendidos nas entrelinhas de sua expansão pelo mundo [...].
A partir da análise deste contexto acima, ica fácil compreender o ta-
manho do “desaio” e das transformações, que foram necessárias para
enquadrar a capoeira na lógica escolar, pois a capoeira historicamente
foi também símbolo de contestação da lógica vigente e sua fundamen-
tação ilosóica, centra-se em uma simbologia que extrapola o conceito
de educação escolar, ratiicando o verdadeiro conceito de educação,
que não estabelecem fronteiras, nem limites para as relações de ensino-
-aprendizagem (MOREIRA, 2007, p. 1).

Ainda segundo Moreira (2007, p. 1),


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

as transformações sofridas no processo de ensino da capoeira inicia-


riam a aproximação da mesma no ambiente escolar, favorecendo seu
reconhecimento e ampliando suas perspectivas com vista a se irmar
como ferramenta pedagógica no processo educativo.

A expansão da capoeira nas instituições de ensino brasileiras deu-se por volta do


inal dos anos 1970 e início da década de 1980, acrescentando a estes ambientes de
trato com o conhecimento um toque da cultura, além de inúmeras possibilidades
de intervenção no que se refere à atividade física, que acabam sendo respalda-
das por leis e sugerida por diversos instrumentos informativos que orientam a
educação escolar como, por exemplo, os Parâmetros Curriculares Nacionais.
Com a instituição da Lei 11.645 de 2008, que prevê o ensino de assuntos e
história da África nos currículos escolares, a capoeira ganhou mais força para
ser “reconhecida como conteúdo riquíssimo para o acervo cultural do aluno,
desenvolvendo não somente os aspectos motor, mas também o cognitivo e afe-
tivo-social” (SILVA, 2002, p. 1).
A capoeira é considerada uma manifestação genuinamente brasileira (SILVA,
2002, p. 2), mas que contém muitos traços da cultura africana, e por isso, deve
ser considerada como manifestação afro-brasileira.
Assim, esta análise de registros culturais necessita compreender as práti-
cas culturais a eles relacionadas, e também o momento social e histórico destes
objetos, registros e práticas. Ocorre, metaforicamente à multidisciplinariedade,
que todas as manifestações culturais tornam-se pertinentes para a assimilação
deste mosaico cultural africano, em que as festas, ritos, saberes, modos de fazer, a
música, os modos de vestir, a rica e diversa alimentação, as concepções políticas,

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


174 UNIDADE IV

as cosmogonias etc., todos partem de um processo histórico e cultural funda-


mental para o ensino educacional.

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Recursos Didáticos

Já dissemos anteriormente que há variados recursos que os professores podem


utilizar em sua prática pedagógica. Entre o professor tradicional e o professor
atual e moderno, existe uma diferença fundamental quanto ao foco. O que antes
se centralizava no professor, como principal agente do processo de ensino-apren-
dizagem, agora se focaliza no aluno.
Desse modo, não basta apenas mostrar os caminhos, mas também orien-
tar o aluno para que desenvolva um olhar crítico que lhe permita desviar-se do
desnecessário e reconhecer, em meio às informações, as trilhas que conduzem
às verdadeiras fontes do conhecimento.
Dessa maneira, uma primeira medida que pode melhorar em deinitivo
nossa prática em sala de aula é “reconhecer” que nosso aluno “é, na verdade, o
sujeito de sua aprendizagem; é quem realiza a ação, e não alguém que sofre ou

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


175

recebe uma ação” (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO, 2002, p. 122).


E ao professor cabe a tarefa de orientar este processo. Infelizmente temos, ainda,
muitos professores despreparados para assumir essa tarefa.
Isto equivale a dizer que “não há como ensinar alguém que não quer aprender,
uma vez que a aprendizagem é um processo interno que ocorre como resultado
da ação de um sujeito” (DELIZOICOV; ANGOTTI; PERNAMBUCO 2002, p.
122). O papel do professor como mediador ou facilitador do processo de apren-
dizagem aparece como condição óbvia neste enunciado.
Coerentemente ao que já airmamos, a aprendizagem é o resultado das ações
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de um indivíduo e não de qualquer ação, pois ela se constrói por meio de uma
interação entre um sujeito e seu meio circundante, natural e social.
É o mesmo tema que Demo (2003) desenvolve quando propõe o educar pela
pesquisa. Este modo de ver parte da deinição da educação como processo de for-
mação da competência humana, dentro de um quadro renovador, que permita
ao aluno ser um pesquisador criterioso que enxergue o processo de aprendiza-
gem como algo que dele depende fundamentalmente.
Temos como sujeito nosso aluno, e nesta perspectiva o autor enfatiza que:
A proposta de educar pela pesquisa tem pelo menos quatro pressupostos
cruciais:
■ a convicção de que a educação pela pesquisa é a especiicidade mais pró-
pria da educação escolar e acadêmica;
■ o reconhecimento de que o questionamento reconstrutivo com qualidade
formal e política é o cerne do processo de pesquisa;
■ a necessidade de fazer da pesquisa atitude cotidiana no professor e no
aluno;
■ e a deinição da educação como processo de formação da competência
histórica humana (DEMO, 2003, p. 5).

Na proposta de Demo (2003), a base teórica representa o cerne do trabalho. A ela


cabe consolidar a capacidade explicativa do educando, buscando por causas, condi-
ções, argumentações e contra argumentações, para desenvolver a familiaridade com
a ciência, na capacidade de induzir e deduzir. Pesquisa, segundo Bagno (1999, p. 17),

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


176 UNIDADE IV

é uma palavra que nos veio do espanhol. Este por sua vez herdou-se
do latim. Havia em latim o verbo perquiro, que signiicava “procurar;
buscar com cuidado; procurar por toda parte; informar-se; inquirir;
perguntar; indagar bem, aprofundar na busca”. O particípio passado
desse verbo latino era perquisitum. Por alguma lei da fonética histó-
rica, o primeiro r se transformou em s na passagem do latim para o
espanhol, dando o verbo pesquisar que conhecemos hoje. Perceba que
os signiicados desse verbo em latim insistem na idéia de uma busca
feita com cuidado e profundidade. Nada a ver, portanto, com trabalhos
supericiais, feitos só para “dar nota” (BAGNO, 1999, p. 17).

E, se pensarmos bem, a pesquisa faz parte do nosso dia a dia. Realizamos pes-

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quisa quando vamos ao supermercado fazer compras, buscamos nos classiicados
do jornal anúncios de produtos que desejamos etc.
Por outro lado, não é necessariamente desta pesquisa que nos propomos a
discutir. Sem pesquisa não há ciência, muito menos tecnologia. Um exemplo
disto é que todas as grandes empresas do mundo atual possuem um departa-
mento denominado “Pesquisa e Desenvolvimento” (P&D), ou seja, a pesquisa
possibilita o progresso intelectual de um indivíduo.
Na escola isso não poderia ser diferente. Quando lançamos mão de uma
pesquisa, precisamos antes ensinar nossos alunos a pesquisar. O que quere-
mos dizer é que antes de pedirmos a eles que façam por conta própria uma
pesquisa, devemos mostrar como se faz esse tipo de trabalho. Isso porque só
podemos obter um produto depois que tivermos conhecimento do processo
de produção (BAGNO, 1999).
Somente assim eles terão a oportunidade de enriquecer intelectualmente, e
hoje não nos falta possibilidades com o acesso à internet. O tema cultura afro-
-brasileira e indígena pode muito bem ser trabalhado partindo da pesquisa em
diversas fontes, mas o professor exerce papel indispensável. A tarefa de dire-
cionar nossos alunos à pesquisa não é fácil, pois requer orientação e mediação
pedagógica.
A utilização de ilmes educacionais é outra possibilidade da ação docente.
Esta, na concepção histórica, visa o exercício da desconstrução dos conteúdos
escolares estruturados, numa matriz eurocêntrica, além de ser fundamental como
material de apoio no processo ensino-aprendizagem.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


177

O educador precisa ter em mente que não será sempre que o ilme escolhido
exprimirá a crítica que deseja incitar aos alunos, mas que a exibição do material
pode servir como um canal que leve à relexão da representação que se deseja
debater (DINIZ, 2009, p. 12).
Neste processo a intervenção do professor se faz necessária na promo-
ção do diálogo sobre o que está sendo abordado no ilme. Não há que
se ter, de certa forma, receios de direcionar o aluno à relexão proposta,
uma vez que este, sem nenhum preparo ou acompanhamento pedagó-
gico é “bombardeado” diariamente com representações sociais e espa-
ciais hegemônicas presentes nos veículos midiáticos (jornais, novelas,
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ilmes etc.) (DINIZ, 2009, p. 12).

Em relação à utilização dos ilmes na abordagem dos conteúdos educacionais,


Souza (2006, p. 9) enfatiza:
na sala de aula, como em qualquer espaço educativo, o cinema é um
rico material didático. Agente socializante e socializador, ele desperta
interesses teóricos, questionamentos sociopolíticos, enriquecimento
cultural. E cada vez mais, tem-se intensiicado o número de programas
educativos e formativos em que o cinema é utilizado como um dos apa-
ratos tecnológicos da educação.
A utilização de ilmes caracteriza-se como uma forma de acentuar a curiosidade
do aluno, além de tornar um pouco concreto aquilo que é extremamente subje-
tivo nos conteúdos presentes nos livros didáticos (DINIZ, 2009, p. 12). Quando
utilizados corretamente, os ilmes auxiliam no processo de desconstrução de
visões de mundo tendenciosas que são naturalmente aceitas pelos alunos.
O Centro de Referência Virtual do Professor (2011, p. 1) lista alguns dos
ilmes que são considerados educativos e auxiliam no ensino da cultura afro-
-brasileira e indígena. Nesse centro é possível encontrar vários ilmes que podem
ser considerados didáticos, com a temática do ensino da cultura e história afro-
-brasileira e indígena, além de servir como um valioso auxílio para a educação.
Dessa maneira, o cinema é uma ferramenta importante para o desenvolvi-
mento da aprendizagem em um momento formal e informal, proporcionando ao
sujeito experimentação, descoberta, invenção, aprendizado e desenvolvimento
de suas habilidades. Além do que, estimula a curiosidade, a autoconiança e a
autonomia, propiciando o desenvolvimento da linguagem, do pensamento, da
concentração e da atenção.

Cultura Afro-Brasileira e Indígena


178 UNIDADE IV

Estamos airmando que o uso de ilmes em sala de aula traz diversos bene-
fícios, assim passamos a listar alguns destes benefícios:
■ Reforça a capacidade de argumentação, melhorando o vocabulário, desen-
volvendo a imaginação, dando uma visão mais ampla de mundo.
■ Aproxima os conteúdos escolares do estudante por ser um recurso lúdico,
facilitando a compreensão de temáticas que por vezes podem ser bastante
complexas e difíceis de trabalhar em sala de aula.
■ Mobiliza as emoções, possibilitando aos alunos se envolverem e terem

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mais disposição para aprender.
■ Melhora o vocabulário.
■ Desenvolve a imaginação.
■ Dá uma visão mais ampla de mundo ao estudante.
■ Aproxima os conteúdos escolares do estudante por ser um recurso lúdico.

■ Facilita a compreensão de temáticas que por vezes podem ser bastante


complexas e difíceis de trabalhar em sala de aula.
■ Abre espaço para debates e comparações com o que foi dito em aula ou
estudado a partir de outras fontes.
■ Mobiliza não apenas a razão e o intelecto, mas também as emoções, o que
é, sem dúvida, bastante importante para que esses alunos se envolvam e
tenham mais disposição para aprender.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


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AVALIAÇÃO COMO PROCESSO DE MELHORIAS DA


AÇÃO DOCENTE E DISCENTE

A ruptura com as visões simplistas sobre o ensino de História, o conhecimento


extenso sobre a matéria a ser ensinada, a exata dimensão dos limites entre os
conhecimentos prévios dos alunos e a busca pelo conhecimento formal são fun-
damentais, tanto quanto planejar e preparar atividades capazes de gerar uma
aprendizagem efetiva, dirigindo os trabalhos dos alunos, mas permitindo aos
mesmos os questionamentos.
É preciso, nesse momento, adicionar um fator que consideramos de extrema
relevância, um verdadeiro teste para a aptidão educacional do professor de
História: o saber avaliar.
Campos e Nigro (1999, p. 161) consideram a avaliação o “motor da aprendi-
zagem”. Sua abordagem se inicia explicando como, ultimamente, tem-se imposto
a aprendizagem signiicativa dos conteúdos. “Com isso, novas metodologias e

Avaliação Como Processo de Melhorias da Ação Docente e Discente


180 UNIDADE IV

paradigmas são impostos aos novos professores, muitos dos quais formados sob os
moldes do ensino por transmissão-recepção” (CAMPOS; NIGRO, 1999, p. 162).
Os autores citados apresentam que, em meio à busca de novos caminhos,
a opção pelas provas escritas tem algumas vantagens. Entre elas: permite ava-
liar muitos alunos e conteúdos de uma só vez, além de ser um documento que
se pode rever e analisar. Ademais, a prova escrita é relativamente fácil de apli-
car e pode ser fácil de corrigir, pois sua execução exige um tempo relativamente
curto. Tudo isto, portanto, pode explicar sua deinitiva inserção no processo de
ensino-aprendizagem.

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
No entanto, Campos e Nigro (1999) lembram que a memória é apenas uma
das capacidades relacionadas ao ensino-aprendizagem e fazem constar a neces-
sidade de contemplar, igualmente: a percepção quanto à clareza do conteúdo no
plano consciente, a percepção acentuada do mesmo conteúdo, a consciência crí-
tica ou posicionamento do sujeito em relação aos suportes do fenômeno. Por isso,
os autores sugerem algumas modiicações que levem ao incentivo das diferentes
capacidades relacionadas acima.
A correção “transparente” que
enuncia os valores das questões,
por exemplo, é outro momento
focalizado, com a sugestão de
uma correção “coletiva” das pro-
vas aplicadas (CAMPOS; NIGRO,
1999, p. 172). Os autores enfati-
zam, ainda, que a avaliação deve
cumprir diferentes inalidades,
“ocorre em diversos momen-
tos do ensino e não apenas ao
inal de uma unidade didática”
(CAMPOS; NIGRO, 1999, p.
173). Quanto ao importante momento de avaliar atitudes, eles sugerem crité-
rios para avaliar trabalhos em grupo antes de chegar à avaliação somativa.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


181

Pessoa de Carvalho e Gil-Pérez (2003, p. 55) escrevem que:


é provável que a avaliação seja um dos aspectos do processo de ensino-
-aprendizagem, em que mais se faça necessária uma mudança didática,
isto é, um trabalho de formação dos professores que questione “o que
sempre se fez” e favoreça uma relexão crítica de idéias e comporta-
mentos docentes de “senso comum” muito persistentes.

Apontando as “tentações” que levam a avaliar de forma insatisfatória a capaci-


dade discente ou, ainda, pensando no fracasso de uma percentagem signiicativa
dos alunos de História perante tais avaliações, esses autores nos apresentam sua
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

visão de saber avaliar.


■ Conceber e utilizar a avaliação como instrumento de aprendizagem que permita
fornecer um feedback adequado para promover o avanço dos alunos.
■ Ampliar o conceito e a prática de avaliação ao conjunto de saberes, destrezas e
atitudes que interesse contemplar na aprendizagem de História.
■ Introduzir formas de avaliação de sua própria tarefa docente como instrumento
de melhoria de ensino (PESSOA DE CARVALHO; GIL-PÉREZ, 2003, p. 59).

Ou seja, para tais autores, o importante é que a avaliação possa transformar-se


em um instrumento efetivo de aprendizagem.
Faz-se necessário lembrar que, para o ensino de História, os Parâmetros
Curriculares Nacionais instituíram a necessidade da avaliação como “um con-
junto de atuações que têm a função de alimentar, sustentar e orientar a intervenção
pedagógica e fornecem orientações didáticas que deverão subsidiar a relexão do
professor a respeito de como ensinar” (BRASIL, 1997, p. 39).
Como podemos perceber, uma avaliação que inalize um processo didático
que esteja em conformidade com o que relatamos estará apta a ser chamada de
uma avaliação eicaz, com relação aos resultados pretendidos.

Avaliação Como Processo de Melhorias da Ação Docente e Discente


182 UNIDADE IV

A avaliação apresenta basicamente três funções: diagnosticar, controlar e clas-


siicar. Relacionadas a essas três funções, existem três modalidades de avaliação:
■ Diagnóstica
■ Formativa

■ Somativa

Para Schmidt e Cainelli (2004, p. 148), “as várias atitudes de avaliação têm carac-
terísticas que podem ser enumeradas com base em sua inalidade, sua utilização,

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
seus objetivos e nos principais aspectos enfatizados por ela”. Neste sentido, a pri-
meira avaliação pode ser denominada inicial ou diagnóstica, e têm por objetivo
obter informações sobre os conhecimentos prévios dos alunos, seus gostos, inte-
resses e atitudes. Geralmente, ela é usada no início de um conteúdo novo, de um
período letivo ou de um projeto.
Em outras palavras, a avaliação diagnóstica é aquela realizada no início de
um curso, para veriicar os pré-requisitos necessários de cada aluno, ou seja: se
eles possuem ou não conhecimentos e habilidades imprescindíveis para as novas
aprendizagens. Ela subsidia o planejamento e a organização de sequências de
ações, e também permite estabelecer o nível de necessidades iniciais para a realiza-
ção de um projeto adequado. Luckesi (2005, p. 52) deine a avaliação diagnóstica:
com isso, queremos dizer que a primeira coisa a ser feita, para que a
avaliação sirva para a democratização de ensino, é modiicar a sua uti-
lização de classiicatória para diagnóstica. Ou seja, avaliação deverá ser
assumida como instrumento de compreensão do estágio de aprendiza-
gem do aluno, tento em vista tomar decisões suicientes e satisfatórias
para que ele possa avançar no seu processo de aprendizagem. Desse
modo avaliação não seria somente um instrumento para a aprovação
ou reprovação do aluno mais sim um instrumento de diagnóstico de
sua situação, tendo em vista a deinição de encaminhamentos adequa-
dos para sua aprendizagem.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


183

A segunda forma de avaliar pode ser denominada formativa, e tem como principal
objetivo detectar problemas de ensino-aprendizagem. Por meio dela, o profes-
sor enfatiza os resultados da aprendizagem e estabelece um comparativo entre os
diferentes resultados obtidos pelo mesmo aluno, o processo de aprendizagem que
permitiu a obtenção dos resultados e as causas dos fracassos na aprendizagem.
A avaliação formativa é realizada no decorrer do ano letivo, com intuito de
veriicar se os alunos estão atingindo os objetivos de aprendizagem previstos.
Esse tipo de avaliação é basicamente orientadora, pois encaminha tanto o estudo
do aluno quanto os procedimentos do professor. Além do mais, essa avaliação
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

fornece dados para uma tomada de decisão, com o objetivo de criar condições
de melhoria do ensino visando uma aprendizagem, considerando-se que o pro-
cesso não está acabado.
Esse tipo de avaliação desempenha um papel controlador, ou seja, localiza
deiciências no ensino e informa - professor e aluno - sobre o rendimento da
aprendizagem, além de possibilitar ao educador formas para que possa corrigir
as falhas e aperfeiçoar mais o processo.
A avaliação formativa é, então, uma importante fonte de informações para o
atendimento às diferenças culturais, sociais, psicológicas dos educandos, o que
se torna grande conquista na luta contra as desigualdades e o fracasso escolar
(PERRENOUD, 1999, p. 28).
Quando age relexiva e razoavelmente partindo de princípios morais,
transformamos aquela atividade espontânea, natural, em atividade
formativa. Pelo fato de que obtemos conhecimento a partir da avalia-
ção, podemos intervir inteligentemente de um modo justo, equânime,
eqüitativo para aumentar o conhecimento de quem aprende e de quem
ensina. O que não é racional, e menos razoavelmente sustentável, é que
sejam exames os que deinam o conhecimento, isso é a própria perver-
são do conhecimento. Trivializam-no e empobrecem-no, reduzindo-o
a um produto de consumo imediato para o êxito fugaz da prova, da

Avaliação Como Processo de Melhorias da Ação Docente e Discente


184 UNIDADE IV

qual se torna e é tratado como mercadoria. É a perversão também do


que é aprender e do que é avaliar, considerando como evidente a pobre-
za intelectual de quem ensina com esse espírito (MENDEZ, 2002 p. 85).

Os mecanismos de avaliação devem ser aliados ao processo ensino-aprendiza-


gem, de modo a auxiliar a ação do professor na adequação de conteúdos e na
identiicação de diiculdades.
A prática formativa na avaliação tem como objetivo fazer com que todos
adquiram conhecimento e apropriem-se deste saber, de maneira relexiva e cons-
trutiva. No entanto, não signiica que aqueles que não atinjam esse objetivo serão

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
eliminados. A avaliação formativa acompanha o processo de ensino-aprendiza-
gem, veriicando se os objetivos iniciais de um trabalho estão sendo atingidos.
A avaliação formativa está muito ligada ao mecanismo de “Feedback”, à
medida que permite ao professor detectar e identiicar deiciências na forma de
ensinar, possibilitando reformulações no seu trabalho didático, visando aperfei-
çoá-lo. Nesse sentido, Esteban (1997, p. 53)
enfatiza que avaliar signiica deixar de fazer julgamento sobre a apren-
dizagem do aluno, para constituir um momento capaz de expressar os
conhecimentos que os alunos já têm estruturado, o processo cognitivo
que realizou para alcançar tais conhecimentos, o que o aluno ainda não
sabe, o que pode vir a saber, as suas possibilidade de aprendizagem
e suas necessidades para que a superação sempre transitória, do não
saber, possa ocorrer.

A avaliação formativa fornece informações que possibilitam uma adaptação do


ensino às diferenças individuais na aprendizagem. É importante ressaltar que
essa adaptação dever ser feita “antes que seja tarde demais” (BLOOM, 1978 apud
HAYDT, 2000, p. 13). Após a avaliação formativa, que possibilita um ensino eicaz
e aprendizagens efetivas, a avaliação somativa, que ocorre no inal do bimestre
escolar, constitui uma melhor aproximação, visto que é realizado um diagnóstico
do aluno no inal de um período, seja no inal de uma unidade, de um bimes-
tre ou de um ano letivo. O principal aspecto enfatizado nesse tipo de avaliação
é o resultado da aprendizagem baseada nos objetivos. Consiste em classiicar
os alunos de acordo com o nível de aproveitamento previamente estabelecido,
tendo em vista sua promoção de uma série para outra, ou de um grau para outro.
Organizamos estas informações resumidamente para melhor compreensão

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


185

Quadro 1 – A avaliação: quanto à formação

PERÍODOS TIPOS OBJETIVOS INTERESSES BUSCAS


INÍCIO DIAGNÓSTICA ORIENTAR ALUNO A avaliação
EXPLORAR ENQUANTO busca conhe-
IDENTIFICAR PRODUTOR cer, principal-
ADAPTAR mente as ha-
bilidades, os
interesses, as
capacidades e
competências
dos alunos.
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DURANTE FORMATIVA SITUAR ALUNO A avaliação


COMPREENDER ENQUANTO busca infor-
ATIVIDADE, mações sobre
FACILITAR
PROCESSOS DE estratégia de
DIALOGAR PRODUÇÃO solução de
APOIAR problemas e
das diiculda-
des surgidas
no processo.
DEPOIS SOMATIVA CLASSIFICAR ALUNO A avaliação
INFORMAR ENQUANTO busca obser-
PRODUTO var compor-
CERTIFICAR
FINAL tamentos
VERIFICAR globais
socialmente
signiicativos,
determinar
conhecimen-
tos adquiridos
e, se possível,
dar um certii-
cado.

Fonte: adaptado de Hofmann (1993).

Vale lembrar que a prática avaliativa como acompanhamento cotidiano da apren-


dizagem possibilita ao professor emitir juízos de valor mais adequados sobre o
aproveitamento escolar dos alunos.

Avaliação Como Processo de Melhorias da Ação Docente e Discente


186 UNIDADE IV

Independentemente da forma pela qual a escola expressa esses juízos de valor


– notas, conceitos e da frequência com o qual o emite – bimestral, trimestral,
semestral – essa formalização tem um caráter de síntese. Nesses momentos, se
faz uma relexão maior e mais cuidadosa sobre os resultados atingidos.
Nesse sentido, é importante deinir com clareza e antecedência os pontos de
chegada desejados pelos professores, bem como os critérios pelos quais o grupo
vai julgar se os alunos estão ou não se aproximando dessas metas. Embora tais
critérios tenham uma dimensão subjetiva e dependam dos valores do professor,
é importante fazer um esforço para deini-los. Isso torna as regras do jogo mais

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explícitas, esclarecendo o que é esperado, tanto para o professor como para o aluno.
Tão importante quanto a avaliação é o ato de corrigir. A correção pode ser
realizada a partir da problematização e discussão das respostas – as incompletas,
incompreensíveis, as que mostram que o aluno não entendeu o que foi solici-
tado, que reproduzem ielmente os assuntos tratados e as que mostram que não
havia uma resposta possível. As formas de correção, os critérios e a atribuição
de valores também devem ser discutidos com os alunos, principalmente entre
os dos 3°, 4° e 5° anos, considerando que os alunos desses anos já possuem uma
compreensão do processo.
Não se pode esquecer que, o retorno para os alunos sobre os resultados cor-
retos ou esperados é parte inseparável da prova, pois cada aluno precisa saber
em que e por que acertou ou errou. Isto dará oportunidade para que o aluno não
erre num segundo momento.
Aqui apresentamos os indicadores de compreensão por parte dos alunos dos
conteúdos de História, explicitados por Pluckrose (1996).

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


187

Quadro 2 – Indicadores de compreensão por parte dos alunos

ELEMENTOS HISTÓRICOS INDICADORES DE COMPREENSÃO PELO ALUNO

CRONOLOGIA Tem experiências no estabelecimento de limi-


tes históricos, como antes de Cristo e depois
de Cristo, geração, década e século.
É capaz de estabelecer sequências de datas e
períodos, determinar sequências de objetos e
imagens; relacionar acontecimentos com uma
cronologia.
TESTEMUNHOS É capaz de compreender tipos de testemunho
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

que o historiador utiliza. Distingue fontes


primárias e secundárias.
É consciente da necessidade de ser crítico na
análise de documento.
Tem consciência de como os historiadores em-
pregam os testemunhos para chegar a uma
explicação do passado.
LINGUAGEM Compreende o signiicado de determinadas
palavras num contexto histórico.
SEMELHANÇA E DIFERENÇA Estabelece comparações simples entre passa-
do e presente com referência a uma diversida-
de de períodos, culturas e contextos sociais.
CONTINUIDADE E MUDANÇA Entende que a História é tanto um estudo da
continuidade como da mudança.
Compreende que um acontecimento históri-
co pode responder a uma multiplicidade de
causas.
IDENTIFICAÇÃO É capaz de se identiicar com pessoas que
viveram no passado e cujas opiniões, atitudes,
cultura e perspectiva temporal são diferentes
das suas.

Fonte: Pluckrose (1996).

Avaliação Como Processo de Melhorias da Ação Docente e Discente


188 UNIDADE IV

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De tudo que até agora assinalamos sobre o ensino de História, que vise à eicácia
e à adequação aos nossos tempos, em resposta às novas exigências ora apresen-
tadas, avultam algumas considerações.
Uma das primeiras é que o conhecimento acontece como um todo, e que se
o fragmentamos é apenas para facilitar o entendimento. Para reagrupar a inte-
gralidade faz-se necessário, então, deixar de lado a posição característica de
décadas atrás, quando cada ciência era vista em si mesma ou, mais, a especiali-

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dade se impunha sobre a visão geral.
Hoje em dia, não existem mais compartimentos estanques e isolados quando
se trata do saber e do ensinar, para que haja realmente o aprender. Pelo contrá-
rio, as disciplinas têm de se comunicar e depois se complementar, chegar aos
princípios de aproximação e esclarecimento do todo.
São as diversas graduações deste processo que enfatizamos em nossa quarta
unidade, da qual consideramos a interdisciplinaridade como a mais recomen-
dada e viável no estágio em que nos encontramos, visto que compreendemos o
ser numa visão holística, e nunca de modo fragmentado.
Além disso, outro setor que merece exame e carece de modiicações é o que
diz respeito à avaliação. Pedra de toque e ao mesmo tempo pedra no sapato de
muitos educadores, avaliar é um processo difícil e doloroso, tendo em vista que
causa muitos problemas entre alunos e professores. Os primeiros querem ter a sua
opinião aceita sempre, e os professores têm diiculdades em estabelecer o que pre-
tendem como disciplina escolar e busca pelo conhecimento por parte dos alunos.
Novos critérios ou um número maior de “provas” levam em conta os aspectos
cognitivos, sem desdenhar os que representam as mudanças de comportamento obje-
tivadas, modiicar e diversiicar quanto a questões de provas, são sempre aventados.
O ideal que representa a convergência entre questões contextuais, que evi-
denciem a visão ampla e o especíico, que encaminhe à tônica da disciplina, ainda
está longe de ser atingido na nossa prática docente.
Portanto ica evidente que, quanto mais nos conscientizamos da realidade que
ora vivemos, mais nos aproximamos da realização de nossos objetivos enquanto
docentes, informando de forma clara a nossa metodologia e epistemologia.

A PRÁTICA PEDAGÓGICA E O ENSINO DE HISTÓRIA


189

1. Estudos apontam que as gerações atuais, nascidas em meio às novas tecnolo-


gias de informação e comunicação, desenvolveram novas aptidões cognitivas.
Desse modo, as crianças atuais precisam ser estimuladas a aprender. Para tanto,
a educação que é praticada na escola necessita de uma nova postura pedagó-
gica. Assim, discutimos a respeito do uso de diferentes linguagens no ensino
de História. Levando em consideração o contexto acima descrito e as nossas
relexões sobre o trabalho docente a partir de diferentes linguagens, discorra
criticamente sobre os benefícios que esses recursos podem trazer à prática
de ensino de um professor.
2. Estudamos nesta unidade que o planejamento escolar é uma tarefa docente que
inclui tanto a previsão das atividades em termos de organização e coordenação
em face dos objetivos propostos, quanto a sua revisão e adequação no decorrer
do processo de ensino. Assim, redija um texto dissertativo acerca do seguinte
tema: O PLANEJAMENTO ESCOLAR
3. Aborde, em seu texto, os seguintes aspectos:
a. De 5 a 10 linhas.
b. A importância do planejamento para ensinar História.
c. A responsabilidade do professor frente ao processo educativo.
4. A necessidade de aprofundar o estudo da questão étnica no Brasil icou sub-
sidiada com a promulgação das Leis nº 10.639/03 e 11.645/08 que torna obri-
gatória a inclusão da temática “História e Cultura Afro-brasileira e Indígena” em
nossas escolas brasileiras. Para se estudar esta temática é preciso unir diversas
áreas de conhecimento e usar de estratégias metodológicas que versam sobre
os assuntos pertinentes, partindo do ponto de vista africano e indígena e não
eurocêntrico. Partindo desta premissa, apresente uma estratégia didática que
evidencie este compromisso com as Leis.
5. A inserção obrigatória da temática História e Cultura afro-brasileira e indígena
nas escolas brasileiras no Ensino Fundamental e Médio, nada mais é que um con-
junto de medidas e ações com o objetivo de:
I. Corrigir injustiças.
II. Eliminar discriminações.
III. Promover a inclusão social.
IV. Promover a cidadania para todos no sistema educacional brasileiro.
190

É correto o que se airma em:


a. I e II.
b. I, II e III.
c. I, II e IV.
d. I, III e IV.
e. I, II, III e IV.
6. “A maneira mais comum de ensinar História ainda hoje tem sido através da aula
expositiva do professor ou a utilização inadequada do livro didático. Esta ação
docente sempre parte de uma questão do passado descrito e explicado de for-
ma descontextualizada do lugar ou do tempo no qual se encontra inserido. Feito
isso, o professor avalia através de exercícios de memorização” (Trecho extraído
dos PCNs de História e Geograia, com adaptações).
O texto acima explicita uma visão tradicional do ensino de História, opondo-se a ela
surgiram novas abordagens que buscam práticas pedagógicas que levem a aprendi-
zagem signiicativa. Podemos entender aprendizagem signiicativa como sendo:
a. A utilização de questionários para a veriicação do conteúdo trabalhado e com-
preendido pelo aluno.
b. Aulas dialogadas com a utilização de livros didáticos como importante e único
recurso pedagógico.
c. A aprendizagem por meio da imitação do professor, sendo este o detentor do
saber.
d. O meio pelo qual uma nova informação se relaciona a um aspecto relevante que
o aluno conhece, contrapondo-se à aprendizagem mecânica conquistada pela
repetição e memorização.
e. A maneira como o aluno se apropria da informação. Contudo, esse tipo de apren-
dizagem acaba sendo esquecido, por utilizar-se da memorização.
191

Nessa Unidade IV, veriicamos o quanto a inovação na utilização dos recursos didáticos
tem trazido diversas contribuições para o processo ensino-aprendizagem de História.
Assim, apresentamos como leitura complementar a introdução de uma discussão pro-
posta por Selva Guimarães Fonseca sobre a utilização do cinema no ensino da História,
na Revista do Arquivo Público Mineiro.
Cinema e Ensino de História
(Selva Guimarães Fonseca)
Que o ilme, imagem ou não da realidade, documento ou icção, intriga autêntica ou
pura invenção, é história.
Cinema é história. Filme: imagem, documento, icção, intriga, invenção, história. Partin-
do dessas contribuições de Marc Ferro, apresentamos algumas relexões sobre as rela-
ções entre o cinema e o ensino da História. O texto é fruto de uma pesquisa bibliográica
e documental e, ainda, de minha experiência didática, tanto como professora de me-
todologia de ensino de História na educação superior, quanto no ensino de História na
escola fundamental e média.
Desde o im do século XIX e ao longo do XX, o cinema tornou-se arte, meio de expres-
são, de construção de sensibilidades, de comunicação, de entretenimento da socieda-
de. Distrai, fascina, inquieta, seduz, comove, inspira e provoca diversas sensações, como
medo, alegrias e tristezas. Alimenta nossa imaginação e sonhos, amplia o modo de ver,
sentir e compreender as pessoas e o mundo. Com o avanço das novas tecnologias, de-
senvolveu-se de forma rápida e soisticada, tornando-se uma poderosa indústria, capaz
de mobilizar milhões de espectadores, consumidores culturais em diferentes lugares do
planeta. Logo, o cinema detém um enorme poder de produção, difusão e introjeção de
valores, ideias, padrões de comportamento e consumo, modos de leitura e compreen-
são do mundo.
Nas últimas décadas do século XX e início do XXI, uma das principais discussões na área
da metodologia do ensino de História no Brasil tem sido a incorporação de diferentes
linguagens e fontes no estudo dessa disciplina. Como exemplos, imagens, obras de ic-
ção, jornais, canções, TV, internet, mídias em geral e o cinema. Esse debate se acentuou
no contexto de revisão dos currículos, de crítica aos livros didáticos tradicionais, pós-
-ditadura militar; do avanço tecnológico da indústria cultural brasileira, do desenvolvi-
mento das chamadas mídias educacionais e do movimento de ampliação documental
e temática das pesquisas nas áreas da história e da educação. Entre essas fontes mais
utilizadas no processo de ensino e aprendizagem de História, estão os ilmes.
Esse movimento pode ser apreendido em diversas publicações, revistas especializadas,
sites e livros, por exemplo, a coletânea A história vai ao cinema, na qual diversos histo-
riadores analisam, em uma perspectiva histórica, 20 ilmes brasileiros produzidos entre
os anos de 1970 a 1990. A coleção Cinema e educação apresenta vários títulos no campo
educacional, analisando diferentes aspectos (ideológicos, estéticos, psicológicos, edu-
192

cacionais, formativos) das relações entre o cinema e a educação. Proliferam publicações


didáticas para professores sobre “como usar o cinema na sala de aula” e experiências de
utilização de ilmes na escola em várias perspectivas. Destacam-se também pesquisas e
teses acadêmicas nas áreas de história, comunicação e educação.
No entanto, estudos demonstram que as relações entre cinema e história e cinema e
educação, tanto no contexto europeu como no Brasil, são bem mais antigas. Desde o
início do século XX, há registros e publicações de intelectuais, cineastas, historiadores
e educadores sobre história e cinema e a viabilidade do uso do cinema na educação.
Como airma Ferro: “[...] desde que o cinema se tornou uma arte, seus pioneiros passa-
ram a intervir na história com ilmes, documentários ou de icção”. Simultaneamente,
alerta-nos o autor: “[...] desde que os dirigentes de uma sociedade compreenderam a
função que o cinema poderia desempenhar tentaram apropriar-se dele e pô-lo a seu
serviço” ...
Fonte: Fonseca (2009, on-line)3.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Tecnologias de Aprendizagem em Rede e


Ensino de História
Alfredo Matta
Editora: Liber Livro
Sinopse: Alfredo Matta realizou este estudo tendo por
base sua prática como coordenador de informática
educacional do Instituto Social da Bahia (ISBA), um
importante colégio confessional de Salvador. A
pesquisa foi, portanto, a sistematização de uma prática
pedagógica, na qual a mais moderna tecnologia
educacional, a Internet e a rede de computadores,
serviu como ambiente mediador para a construção da
aprendizagem nos mais diversos conteúdos escolares.

Como usar as histórias em quadrinhos em sala de aula


Angela Rama (Org.) e Waldomiro Vergueiro (Org.)
Editora: Contexto
Sinopse: os quadrinhos afastam as crianças e
adolescentes do mundo dos livros ou podem
representar, na verdade, um valioso recurso
pedagógico em sala de aula? Depois da leitura
deste volume, não restarão mais dúvidas. Aqui,
os autores provam que os antigos preconceitos
contra as histórias em quadrinhos não têm nenhum
fundamento. Por meio de exemplos práticos e muitas
sugestões de atividades, os educadores encontrarão
nesta obra uma fonte inesgotável de inspiração
para trabalhar as HQs com seus alunos. Capítulos
especíicos dão orientações didáticas sobre o uso
delas em várias disciplinas, como Português, História,
Geograia e Artes. O livro traz também, em sua
primeira parte, um guia básico sobre a linguagem
dos quadrinhos, indispensável para que os
professores se familiarizem ainda mais com o gênero e,
assim, possam extrair o maior número possível de recursos do rico e fascinante universo das HQs.
Este livro também pode ser lido pela Biblioteca Pearson que você tem acesso através de seu AVA.

Material Complementar
MATERIAL COMPLEMENTAR

O Espelho Tem Duas Faces


1966
Sinopse: dois professores da Columbia University
sentem-se solitários, pois não conseguiram se
envolver com quem eles queriam. Ele, Gregory
Larkin (Jef Bridges), é um professor de matemática
extremamente introvertido e que ainda idolatra
Candy (Elle Macpherson), a antiga namorada que o
trocou por outro. Ela, Rose Morgan (Barbra Streisand),
é uma professora de literatura muito comunicativa,
que viu sua grande paixão, Alex (Pierce Brosnan), se
casar com Claire (Mimi Rogers), sua irmã. Ao ver o
anúncio de Gregory em um correio sentimental, ela
decide responder como se fosse apenas Rose, já que
ambos pertencem a mesma universidade. Após alguns
encontros totalmente platônicos Gregory pede Rose
em casamento, mas decidem ter uma união baseada
apenas nas suas preferências intelectuais e totalmente desprovida de sexo. No início ela consegue
suportar tal situação, mas com o tempo a relação entra em crise e ela decide se produzir, para
conquistar realmente seu marido e ter um casamento de fato e não apenas de direito.

Sociedade dos Poetas Mortos


1990
Sinopse: em 1959 na Welton Academy, uma tradicional
escola preparatória, um ex-aluno (Robin Williams) se torna
o novo professor de literatura, mas logo seus métodos de
incentivar os alunos a pensarem por si mesmos cria um
choque com a ortodoxa direção do colégio, principalmente
quando ele fala aos seus alunos sobre a “Sociedade dos
Poetas Mortos”.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Do giz ao tablet: por que a tecnologia não revolucionou a educação


O documentário “Do giz ao tablet: por que a tecnologia não revolucionou a educação’’ propõe
uma discussão sobre o papel que a instituição escolar atual deve exercer em resposta às
demandas que as novas gerações e as tecnologias atuais puseram em voga.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=ozpEMQ5niUA>. Acesso em: 6 abr. 2017.

História: História e Literatura


No documentário “História: História e Literatura’’, a jornalista Mônica Teixeira conversa com o
professor Sidney Chalhoub sobre a importância da literatura para os historiadores.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=e5jnTFQg6as>. Acesso em: 6 abr. 2017.

Convido você a navegar pelo site: <http://www.acordacultura.org.br/>. Trata-se da apresentação


de um projeto educativo de valorização da cultura afro-brasileira.

Material Complementar
196
REFERÊNCIAS

BAGNO, M. Pesquisa na escola: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 1999.
BARBOSA. R. A. ABC do continente africano. São Paulo: Edições SM, 2007.
BRAGA, A. F. Educação Afro-Indígena: caminhos para a construção de uma socieda-
de igualitária. Revista África e Africanidades, n. 4, fev. ano I, 2009.
BRASIL. Parâmetros curriculares nacionais: história e geograia. Secretaria de Edu-
cação Fundamental. Rio de Janeiro: DP&A, 1997.
BURKE, P. As fronteiras instáveis entre história e icção. In: AGUIAR, F. et. al. (Orgs.).Gê-
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pdf?sequence=1>. Acesso em: 20 abr. 2018.
199
GABARITO

1. O trabalho docente com diferentes linguagens, que podem ser recursos tecnoló-
gicos ou jogos e brincadeiras, possibilitam ao professor de História dinamizar as
suas aulas, tornando a compreensão dos conteúdos mais clara, além de romper
com uma metodologia tradicional muito praticada ainda hoje em nossas esco-
las. Esperamos que você apresente esta visão positiva da utilização destes recur-
sos à prática de ensino do professor.
2. O planejamento é um processo de racionalização, organização e coordenação
da ação docente, articulando a atividade escolar e a problemática do contexto
social. A escola, os professores e alunos são integrantes da dinâmica das relações
sociais; tudo o que acontece no meio escolar está atravessado por inluências
econômicas, políticas e culturais que caracterizam a sociedade de classe. Isso
signiica que os elementos do planejamento escolar - objetivos-conteúdos-mé-
todos – estão recheados de implicações sociais, têm um signiicado genuina-
mente político. Por essa razão, o planejamento é uma atividade de relexão acer-
ca das nossas opções e ações; se não pensarmos didaticamente sobre o rumo
que devemos dar ao nosso trabalho docente, icaremos entregues aos rumos
estabelecidos pelos interesses dominantes da sociedade.
3. Para responder a esta questão você poderá recorrer à própria interdisciplinari-
dade, partindo de uma literatura, uma música, uma arte indigena e/ou africana
para evidenciar a estratégia didática solicitada.
4. Alternativa “E”.
5. Alternativa “D”.
Professora Me. Priscilla Campiolo Manesco Paixão

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO

V
UNIDADE
HOMEM NO TEMPO

Objetivos de Aprendizagem
■ Analisar o mundo e sua temporalidade, adquirindo a capacidade de
transcender os referenciais usados na divisão do tempo histórico, que
consideram somente os marcos do poder e da dominação.
■ Identiicar e avaliar as etapas em que as crianças se encontram com
relação ao domínio das relações temporais.
■ Possibilitar a apreensão do objeto de estudo por meio da relação
entre presente e passado.

Plano de Estudo
A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade:
■ O tempo: categoria essencial para pensar a História
■ O tempo como aprendizagem social
■ Identiicando os diferentes tipos de tempo
■ A criança e as primeiras noções de tempo
■ O trabalho com linhas do tempo
203

INTRODUÇÃO

Nossa Unidade V será, ao mesmo tempo, o núcleo e a prática histórica no que


ela tem de mais legítimo e característico.
Desde a antiguidade, o homem busca entender o tempo como um meio de
orientação dentro de um universo social e como forma de regulação de sua exis-
tência. Isso quer dizer que conceber o tempo é algo complexo e exige abstrações.
Para Elias (1998, p. 13), “[...] a expressão tempo remete-se a esse relacionamento
de posições ou segmentos pertencentes a duas ou mais sequências de aconteci-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

mentos em evolução contínua”.


O tempo é a categoria essencial para pensar a História. Ao mesmo tempo em
que inclui um exame de todos os componentes de uma estrutura social humana, ele
pode admitir diferentes interpretações, que decorrem de uma determinada visão
de mundo. A identiicação dos diferentes tipos de tempo nos remete a povos anti-
gos, da época medieval, e os modernos, nós, com todos outros contemporâneos.
Da clepsidra à ampulheta, do despertar ao canto do galo e do recolhimento
para o sono com os mesmos sons da natureza, o aparecimento dos primeiros
relógios coincidentemente ao descobrimento de nosso país, muito a humanidade
teve de caminhar para chegar até hoje e, certamente, vai continuar caminhando.
Filha do tempo e ao mesmo tempo dona dele, a História tem na categoria tem-
poral a sua categoria marcante e deinitiva, sua marca registrada.
Tudo isso é o que procuraremos reletir nesta última unidade. Intencionalmente,
escolhemos esta para inalizarmos nossas discussões para icar aqui uma lição
de vida. O homem ao longo de sua existência criou mecanismos para facilitar
sua vida e, uma delas, talvez a mais importante, seja o tempo. No entanto, essa
mesma criação nos trouxe um grande problema: hoje somos “escravos” de nossa
própria invenção.
Por isso, essa unidade inaliza não só nossas discussões acerca da História
enquanto ciência, como também o ensino-aprendizagem da História enquanto
disciplina escolar, enfatizando a temporalidade como sua marca registrada.

Introdução
204 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O TEMPO: CATEGORIA ESSENCIAL PARA PENSAR A
HISTÓRIA

Quando Marc Bloch apresentou a História como a ciência do homem no tempo,


ou quando Braudel com ele concordou, airmando que o tempo “adere” ao
pensamento de qualquer historiador, ambos estavam estabelecendo categorias
essenciais.
Os gregos pensavam em termos de uma roda dos tempos, ou seja, os per-
sonagens indo e voltando de forma cíclica, de modo a airmarem que sempre
haveria um Sócrates, Platão ou Aristóteles.
Nós pensamos no tempo como algo que teve um começo, um meio (nós) e
um im. Marizete Lucini (2007) é uma autora que, em sua obra sobre o “Tempo,
Narrativa e Ensino da História” nos propõe interessantes relexões. Ela se socorre
de autores conceituados como Paul Ricoeur, em seu livro “Tempo e Narrativa”
de 1994, airma que:
a história revela uma primeira vez a sua capacidade criadora de rei-
guração do tempo pela invenção e pelo uso de certos instrumentos de
pensamento, tais como, o calendário, a idéia de seqüência de gerações e

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


205

a idéia, conexa, do triplo reino dos contemporâneos, dos predecessores


e dos sucessores, enim e, sobretudo, pelo recurso a arquivos, docu-
mentos e rastros (RICOUER, 1994, p. 179 apud LUCINI, 2007, p. 71).

Paul Ricoeur nasceu em 1913, é considerado um dos principais pensadores


da hermenêutica (ou seja, a ilosoia da interpretação). Foi professor na Uni-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

versidade de Estrasburgo, e também na Sorbonne e em Chicago. Publicou


numerosos livros fascinantes, que falam da literatura e da ilosoia com pala-
vras simples, sem o peso do saber arrogante. Entre eles destacamos “Tempo
e Narrativa”.
Para saber um pouco mais sobre Paul Ricoeur, acesse: <http://www.voltaire-
net.org/article125537.html>.
Fonte: a autora.

Portanto, o pensar do calendário e o fenômeno das gerações pode incluir o pensar


do tempo cósmico e do tempo vivido, pois “pensa o tempo de que faz uso a his-
tória”. Esclarece ainda que se trata de um tempo construído pelo historiador, do
qual advém a narrativa histórica que comunica a correlação das ações humanas
com o imperativo temporal. “Todo calendário possui um acontecimento funda-
dor, o qual constitui o ponto zero do cômputo” e, mais que isso, esse ponto zero
“pode ser pensado a partir da noção fenomenológica de presente, como ponto
que determina o que veio antes e o que veio depois” (LUCINI, 2007, p. 71).
Do tempo cristalizado referenciado pelos positivistas ou mesmo das catego-
rias propostas por Braudel (1965), uma das mais importantes é a longa duração,
porém, todas são exemplos de como o núcleo da História é o tempo, em torno
dele tudo gira e a ele se refere como condição primeira. Bloch fala no “ídolo”
das origens e como um historiador caminha entre passado e presente, presente
e passado, com possibilidade de vistas para o futuro, quando se equaciona razo-
avelmente o nosso tempo.

O Tempo: Categoria Essencial para Pensar a História


206 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
O TEMPO COMO APRENDIZAGEM SOCIAL

Antes de ser dimensionado em forma de calendários e datas, que repercutem


em uma compreensão dos acontecimentos como sendo pontuais, o tempo em
si admite outras categorias.
Para ser dimensionado em partes apreciáveis de sua totalidade, o tempo pode
ser apresentado para um aluno por seu professor, com base nas suas vivências
pessoais. Um bom ponto de referência para isso é o caso do tempo biológico,
que envolve crescimento, maturidade e envelhecimento.
Existe ainda aquele tempo psicológico inerente à nossa ideia de sucessão
e mudança, um tempo que para nós, ocidentais, se norteia sempre pela busca
do progresso, bem como pela ideia de que podemos melhorar sempre, material
e intelectualmente. Temos, por esse motivo, a dimensão de povos atrasados e
adiantados, civilizados e selvagens. Todos estes conceitos, postos entre nós há
séculos, hoje passam por um processo de revisão.
Em nossa visão atual, de que o tempo é sempre um mestre para a nossa
aprendizagem social, buscamos por uma maior simetria - entenda-se igualdade
- entre os diferentes povos e culturas.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


207

O respeito às diferentes sociedades, incluídas na comunidade humana como


um todo, nos leva a refutar conceitos já estabelecidos. Um ponto de partida signi-
icativo vem de Karl Marx, quando redime os pré-letrados e airma que civilização
é apenas um estágio tecnológico mais avançado.
Para entender tal airmação, leia a seguir trechos de uma obra que acabou se
tornando uma lição de vida ao homem ocidental, aqui chamado de “Papalagui”.

O PAPALAGUI NÃO TEM TEMPO


Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O Papalagui gosta de metal redondo e do papel pesado; gosta de manter para


dentro da barriga muitos líquidos que saem das frutas mortas, além da carne
de porco e de vaca, e de outros animais horríveis; mas ele gosta principalmente,
daquilo que não se pode pegar e que, no entanto, existe: o tempo. Fala muito
no tempo, diz uma tolice a respeito do tempo. Nunca existe mais tempo do que
aquele que vai do nascer ao pôr do sol e, no entanto, isto nunca foi suiciente
para o Papalagui.
O Papalagui nunca está satisfeito com o tempo que tem; e acusa o Grande
Espírito por não lhe ter dado mais. Chega até a blasfemar contra Deus, contra
a sua grande sabedoria, dividindo e subdividindo em pedaços cada dia que se
levanta de acordo com um plano muito exato. Divide o dia tal qual o homem
partiria um coco mole com uma faca em pedaços cada vez menores. Todos os
pedaços têm nome: segundo, minuto, hora. O segundo é menor que o minuto,
este é menor do que a hora; juntos, minutos e segundos formam a hora e são
precisos sessenta minutos e uma quantidade maior de segundos para fazer o
que se chama hora.
É uma coisa complicada que nunca entendi porque me faz mal estar pen-
sando mais do que é necessário em coisas assim pueris. Mas o Papalagui faz disso
uma ciência importante: os homens, as mulheres, até as crianças que mal se têm
pernas usam na tanga, presa a correntes grossas de metal, ou pendurada no pes-
coço, ou atada com tiras de couro ao pulso, certa pequena máquina, redonda,
na qual lê o tempo, leitura que não é fácil, que se ensina as crianças, aproximan-
do-lhe do ouvido a máquina para diverti-las.

O Tempo como Aprendizagem Social


208 UNIDADE V

Esta máquina fácil de carregar em dois dedos parece-se por dentro com as
máquinas que existem dentro dos grandes navios, que todos vós conheceis. Mas
também existem máquinas do tempo grandes e pesadas, que se colocam dentro
das cabanas, ou se suspendem bem alto para serem vistas de longe. Para indicar
que passou uma parte do tempo, há do lado de fora da máquina uns pequenos
dedos, ao mesmo tempo, a máquina grita e um espírito bate no ferro que está
do lado de dentro. Sim, produz-se mesmo muito barulho, um grande estrondo
nas cidades europeias quando uma parte do tempo passa.
Ao escutar este barulho, o Papalagui queixa-se: “Que tristeza que mais uma

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
hora tenha se passado”. O Papalagui faz, então, uma cara feia, como um homem
que sofre muito; e, no entanto logo depois vem outra hora novinha.
Só consigo entender isso pensando que se trata de doença grave. “O tempo
corre feito um corcel!”; “Dêem um pouco mais de tempo”: são as queixas do
Branco.
Digo que deve ser uma espécie de doença porque, supondo que o Branco
queira fazer alguma coisa, que seu coração queima de desejo, por exemplo, de
sair para o sol, ou passear de canoa no rio, ou namorar sua mulher, o que acon-
tece? Ele quase sempre estraga boa parte do seu prazer pensando, obstinado:
“não tenho tempo de me divertir”. [...]
Ó amados irmãos! Nunca nos queixamos do tempo; amamo-lo conforme
vem, nunca corremos atrás dele, nunca pensamos em ajuntá-lo ou parti-lo.
Nunca o tempo nos falta, nunca nos enfastia. Adiante-se aquele entre nós que
não tem tempo! Cada um de nós temos tempo a vontade e nos contentamos com
ele. Não precisamos de mais tempo do que temos e, no entanto, temos tempo
que chega. Sabemos que no devido tempo havemos de chegar ao nosso im e o
Grande Espírito nos chamará quando for sua vontade, mesmo que não saibamos
quantas luas nossas passaram. Devemos livrar o pobre Papalagui, tão confuso,
da sua loucura! Devemos devolver-lhe o verdadeiro sentido de tempo que per-
deu. Vamos despedaçar a sua pequena máquina de contar o tempo e lhe ensinar
que, do nascer ao por do sol, o homem tem muito mais tempo do que é capaz
de usar (SCHEURMANN, s.d.)
Para entender melhor: Na década de 1920, Tuávii, chefe de uma aldeia loca-
lizada numa ilha no arquipélago de Samoa, na Polinésia, decidiu conhecer a

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


209

civilização europeia, para veriicar como era a vida deste dito homem branco,
visto que, em sua cultura, havia uma grande integração do homem com a natu-
reza. A vida nesta aldeia estava organizada conforme o clima, as mudanças de
estação, a caça, o curso dos rios e outros elementos da natureza. Dessa forma, seu
modo de vida desconhecia noções como propriedade privada, dinheiro, roubo,
pobreza, falta de tempo e consumismo.
Pela leitura é constatado, a priori, que os níveis das durações estão relacio-
nados às mudanças ou permanências nas vivências humanas. Estas podem ser
identiicadas a partir dos acontecimentos ou das estruturas (aqui pensamos com
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Braudel) que eles formam, quaisquer que sejam os fenômenos focalizados.


Existem comportamentos coletivos enraizados, ou ideias que atravessam
séculos. O preconceito contra o povo judeu, por exemplo, pode ter tido uma pro-
vável origem na ideia de que eles foram os assassinos de Jesus, se levarmos em
conta o imaginário medieval do Ocidente entre os séculos V e XV. Além disso,
em implicações mais profundas, de um antissemitismo como ódio racial, moti-
vado por várias razões (alguns apontam a econômica). Além do mais, Hitler os
rotulou de “fermentos de decomposição” em sua obra “Minha Luta” e partiu para
o Holocausto que tantas narrativas apresentam.
Figura 1 - Adolf Hitler. A maior prova de que o tempo inclui uma
aprendizagem social, não só pelo legado, mas
pelo ambiente vivido, pode ser encontrado
no exemplo da vida de personagens que,
aparentemente, conduziram o processo
histórico como o mencionado Hitler ou,
antes dele, Napoleão. Há de se considerar,
porém, que na discussão entre quem lidera
o processo, o personagem ou a História,
sabemos que sem condições especíicas
e próprias de um ambiente sociocultural
ninguém lidera ou convence outras pessoas
a se engajar em seu projeto político ou
econômico.
Fonte: Shutterstock.

O Tempo como Aprendizagem Social


210 UNIDADE V

Um provérbio árabe diz que os homens são mais ilhos dos seus tempos do
que dos seus pais. Em outras palavras, um Napoleão ou um Hitler, com todas
suas potencialidades não teriam logrado êxito em suas pretensões, se tivessem
nascido em uma conjuntura histórica – um tempo – diferente. É necessário todo
um arranjo de fatores que permitam que os novos valores substituam outros.
Georg Plekahnov escreveu que o grande homem é grande não porque suas
particularidades individuais imprimiram uma isionomia individual aos gran-
des acontecimentos históricos, mas porque é dotado de singularidades que o
tornam mais capaz de servir às grandes necessidades sociais de sua época, sob

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
a inluência de causas gerais e particulares.
Tomando-se os calendários como formas socializadas de medida do tempo,
é possível imaginar que existam outras medidas da categoria que não sejam a
corrente em nossa cultura ocidental. Outras sociedades se valem de outros calen-
dários, ou seja, nem todos os povos do mundo utilizam o calendário cristão (o
gregoriano) para contar o tempo.

O Calendário gregoriano é o calendário utilizado na maior parte do mundo.


Foi promulgado pelo Papa Gregório XIII em 24 de Fevereiro do ano 1582, de-
pois de ter passado por uma reformulação do calendário romano elaborado
por Júlio César (45 a.C.). Oicialmente o primeiro dia deste calendário foi 15
de Outubro de 1582.
Neste calendário gregoriano:
Omitiram-se dez dias (5 a 14 de Outubro de 1582).
Corrigiu-se a medição do ano solar, estimando-se que este durava 365 dias
solares, 5 horas, 49 minutos e 12 segundos, o equivalente a 365,2424999
dias solares.
Estabeleceu-se o início do novo calendário em 1º de janeiro do respectivo
ano.
Fonte: adaptado de Cabrini e Catelli (2004, p. 52).

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


211

Os muçulmanos, por exemplo, usam como marco inicial do islamismo e do seu


calendário a Hégira, data da fuga de Maomé, seu maior profeta, da cidade de
Meca para Medina, ambas na atual Arábia Saudita (16 de julho de 622, segundo
nosso calendário). Os judeus utilizam como marco inicial o que acreditam ser a
data de criação do mundo. O nascimento de Cristo, por exemplo, ano 1 da era
cristã, corresponde ao ano 3.761 do calendário judaico.
Os chineses, que por milênios tiveram seu próprio calendário, adotaram o
calendário gregoriano em 1912. A divisão da História que pretende corresponder
às grandes eras da humanidade tem sido muito criticada, pois os termos Antiga,
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Medieval, Moderna e Contemporânea têm exigido uma revisão, principalmente


quando se trata de considerar o homem pós-Revolução Francesa (1789) como
nosso contemporâneo.
Essas críticas, levantadas por historiadores como Geofrey Barraclough em
seu livro “Introdução à História contemporânea” se misturam à outras daqueles
que consideram nossa maneira de historiar eurocêntrica, por ignorar grandes
culturas como a dos incas ou maias americanos, além de ignorar a organização
da produção nessas sociedades.

O Tempo como Aprendizagem Social


212 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
IDENTIFICANDO OS DIFERENTES TIPOS DE TEMPO

Considerando as diiculdades que nossos alunos têm em situar um fato no


contexto temporal e, ao mesmo tempo, levá-los a reletir sobre o processo da uti-
lização do tempo nas diferentes sociedades, agora passemos a entender melhor
a problemática.
A noção de tempo transcende a própria história humana, e por esse motivo
ela se torna complexa para o entendimento de nossos alunos, além de ser con-
siderada uma questão puramente convencional e referencial. É também uma
regularidade convencionada socialmente, colocada sobre uma sucessão de acon-
tecimentos com intuito de organizá-los e facilitar sua referência posterior.
A disciplina de História tem como eixo norteador o estudo do tempo, den-
tro de suas diversas perspectivas. Diferentemente da concepção dada pelos

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


213

povos primitivos e da Antiguidade, na qual o tempo era visto como uma ques-
tão cíclica, modernamente o tempo é, na maioria das vezes, tomado dentro de
uma perspectiva linear, como uma sucessão de fatos que não se repetem, sendo
a maneira mais concreta de compreendê-lo. Esse tempo passou, então, a ser
conhecido como tempo cronológico.
Mas, busquemos compreender os diferentes tipos de tempo. O tempo deno-
minado cíclico é o tempo da natureza. Esta noção diz respeito aos fenômenos que
ocorrem na natureza e que independem da vontade humana. Como exemplo,
teríamos a duração da Rotação da Terra, ocasionando o dia e a noite; das fases da
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Lua e do movimento de Translação da Terra em torno do Sol. Esses fenômenos


naturais repetem-se continuamente, e os chamamos de cíclicos (ELÍADE, s/d.).
O tempo histórico é o mesmo que tempo cultural, pois o homem, nas suas
relações sociais e enfrentamentos cotidianos, constroem histórica e cultural-
mente, sua forma de agir, pensar e viver. Ou seja: o tempo histórico é construído
pela ação humana a im de responder às necessidades concretas impostas pelo
vivido, tendo como referência o tempo da natureza.
Além disso, há também o tempo subjetivo ou pessoal, pois o tempo em si é
algo universal e absoluto, fora do nosso alcance e, por isso mesmo, uma sensa-
ção. Às vezes sentimos o tempo bom como curto e o tempo ruim como longo,
exaustivo. Sentimos, também, à medida que icamos mais velhos, que o tempo
do relógio parece passar cada vez mais depressa (WHITONW, 1993).
Esse tempo é interno de cada indivíduo, é o tempo das mudanças pessoais.
Ele é particular, de acordo com nosso modo de vida. A sensação que temos da
passagem do tempo ocorre de acordo com o prazer ou dor causado pelos acon-
tecimentos. Assim, ao brincar durante uma hora, as crianças terão a sensação
de que o tempo passou muito rápido, mas, se passarem o mesmo intervalo de
tempo sendo atendidos por um dentista, terão a sensação de que o tempo demo-
rou a passar.

Identiicando os Diferentes Tipos de Tempo


214 UNIDADE V

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
A CRIANÇA E AS PRIMEIRAS NOÇÕES DE TEMPO

É bastante difundida a ideia de que a escola deva atuar na produção das identidades
socioculturais dos alunos, na perspectiva da cidadania. “Mas para constituírem-se
cidadãos é necessário o domínio de categorias e conceitos que permitam com-
preender e intervir no mundo” (HICHMANN, 2002, p. 21).
Quando o aluno inicia seu processo de escolarização, ele já domina alguns
referentes temporais, como noções de duração, pois são visões ideologicamente
construídas de temporalidade social. No entanto, o que se vê nas escolas é um
ensino de História numa perspectiva que se resume em festejar datas num des-
ile linear, anacrônico e sem signiicado, como airma Karnal (2004). Agindo
dessa forma, a escola está contribuindo para canonizar uma verdade absoluta,
na qual não cabe a multiplicidade tampouco a vida das crianças que as estudam.
Nessa perspectiva, cabe à escola levar a criança a compreender que, para o
senso comum, tempo e medida são a mesma coisa. Isso ocorre pela necessidade
de se normatizar de forma “exata” algo que é apreendido sensorial e intuitiva-
mente. Assim, não há sentido na observação empírica de se falar em dimensões
temporais compreendidas fora do espaço do calendário.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


215

Esse tempo cientíico, expresso no calendário e marcado nos relógios, foi


sendo moldado com essas características pela sociedade burguesa, que começou
com o ritmo marcadamente agrícola, ditado pela temporalidade natural até che-
gar à jornada de trabalho, medida por horas. Os sinos das Igrejas, que chamavam
os homens às orações, foram sendo substituídos, em determinado tempo, pelos
relógios nas torres que chamavam os homens para o trabalho.
Segundo Norbert Elias (1998), atualmente os relógios exercem as mesmas
funções que exerciam os fenômenos naturais em outras épocas, ou seja, orienta
as pessoas que estão inseridas numa sucessão de processos, procurando har-
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monizar os diferentes comportamentos e situando-os na duração dos mesmos.

Você já parou para pensar que atualmente nossas vidas são regidas pelos
ponteiros do relógio?

A investigação e a problematização que se propõe é de não somente trabalhar


as divisões do calendário, além de não fazer a pura e simples transmissão de
conteúdos, sem reletir sobre os processos históricos que originam os mesmos.
Mais importante que um conteúdo de história de caráter factual é ne-
cessário que, no Ensino Fundamental, os alunos construam noções
temporais básicas para localizarem-se e organizarem-se no tempo his-
tórico, diferenciarem e relacionarem temporalidades, identiicarem re-
ferências e medições temporais, perceberem a existência de diferentes
ritmos e épocas e compreenderem que tempo é uma convenção social
(HICHMANN, 2002, p. 24).

A forma de contar o tempo é própria de cada cultura. Não basta destacar que
existiram outros calendários em outras culturas, mas sim localizar o aluno no
seu tempo e espaço, oportunizando lhe condições de relexão sobre a criação
histórica de seu tempo. Assim, na nossa cultura ocidental, o valor do tempo é

A Criança e as Primeiras Noções de Tempo


216 UNIDADE V

medido pela produtividade e otimização do trabalho. “Tempo é dinheiro”, lem-


bra Nadai (1986).
Para a criança domi-
nar os diferentes tipos de
tempo, é preciso propiciar
momentos de compreen-
são das noções de duração
em seus diferentes nuances
(curta, média e longa dura-

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ção como queria Braudel), ou
seja, quanto tempo durou a
ação. Além disso, devem ser
abordadas as permanências
e mudanças, as continuida-
des e descontinuidades, “o
que é mais antigo”, “o que é mais atual” e o que cada aluno entende por “antigo
ou por passado”.
Outra noção é a de sucessão, as coisas que acontecem uma após a outra, “o
muito antes”, “o muito depois” e os diferentes ritmos desse suceder, desse tempo
sequencial. Além do mais, é importante compreender a simultaneidade tempo-
ral, que permite ao aluno perceber que existem coisas que acontecem ao mesmo
tempo e, enquanto se está na escola, a mãe e o pai estão fazendo outras coisas.
Portanto, “a noção de tempo é uma aprendizagem processual e muito complexa
que exige a construção de conceitos” (HICHMANN, 2002, p. 36).
Apesar de, ao longo de todas nossas discussões, tenhamos feito referên-
cias à construção do conhecimento numa perspectiva dada por Vygotsky, agora
passamos a mencionar Piaget, pois defendemos a ideia de que ele, melhor do
que qualquer outro pesquisador, realizou estudos e chegou às constatações que
comungamos concernentes ao domínio do tempo na criança.
Considerando a teoria de Piaget (2002), a criança passa por períodos na
construção das noções temporais: após uma primeira fase – “tempo sensório-
-motor” – a criança passa pelo estágio do “tempo intuitivo”, até chegar ao “tempo
operatório”. Passemos a examinar cada uma destas etapas mais detalhadamente:

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


217

No primeiro estágio – denominado Estágio Sensório-motor - existe um tempo


prático, ligado às ações e experiências imediatas da criança. O tempo só existe na
medida em que o bebê está ocupado numa atividade. Não há nenhuma possibi-
lidade de raciocinar sobre um tempo futuro, ou sobre a noção do antes e depois,
nem qualquer rudimento da causalidade. A noção temporal corresponde unica-
mente à experiência da duração de um relexo: mamar, engatinhar etc., e é uma
espécie de egocentrismo prático, como se a criança vivesse suas próprias ações,
imobilizadas num presente contínuo (ANTUNES, 1993). Ou melhor, o período
sensório-motor corresponde à passagem do exercício dos relexos à inteligência
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sensório-motora, e encontra-se dividido em seis subestágios.


No primeiro estágio, que corresponde ao primeiro mês após o nascimento,
algumas atividades especíicas que a criança realiza têm por função formar os
primeiros esquemas, que são ainda muito autistas visto que formam um todo
fechado em si mesmo, rígido.
No segundo estágio, que corresponde ao segundo, terceiro e quarto meses
aproximadamente, o bebê já é capaz de expandir seus esquemas, assimilando
novos objetos por meio do tato muitas vezes sem intencionalidade, ou seja, sem
ter consciência de seus objetivos, mas feitos repetidamente.
No terceiro estágio, aproximadamente do quarto ao oitavo mês, a conduta
de repetição de ações ligadas ao próprio corpo estende-se gradativamente para
o meio exterior; o bebê procura repetir um acontecimento novo que envolve sua
ação sobre os objetos. Por exemplo, após realizar uma ação espontânea sobre
os objetos, o bebê procura repeti-la várias vezes (ex.: chacoalhar o brinquedo).
No quarto estágio, aproximadamente do oitavo até o décimo segundo mês,
a criança começa a coordenar os esquemas que ela já construiu como esquemas
meio, para alcançar intencionalmente um objetivo. Agora, é capaz de buscar
meios conhecidos para superar o obstáculo e alcançar seu objetivo.
No quinto estágio, do décimo segundo mês até o décimo oitavo mês, aproxi-
madamente, a criança começa a criar esquemas novos por meio da experimentação
para alcançar seus objetivos. Diante de um novo obstáculo imposto pelo meio,
primeiro a criança aplica os esquemas conhecidos para alcançar seu objetivo e,
caso não tenha sucesso, ela não desiste e passa a realizar tentativas que levam à
acomodação. Aqui, Piaget (2002) considera que a inteligência sensório-motora

A Criança e as Primeiras Noções de Tempo


218 UNIDADE V

encontra-se constituída, isso porque essa inteligência encontra-se presa à expe-


riência prática, ou seja, ao contato direto com o mundo, por intermédio de uma
ação sensório-motora.
Finalmente no sexto estágio, do décimo oitavo até o vigésimo quarto mês, a
criança, ao se deparar com um obstáculo, não realiza mais tentativas por expe-
rimentação ativa, que está presa à percepção e ação direta; ela agora realiza uma
experimentação mental ou interiorizada, ou seja, ela executa essas tentativas
mentalmente para depois aplicar os esquemas. Essa inteligência agora irá evoluir
para outro plano, em que o sujeito poderá continuar assimilando um universo

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cada vez maior, considerando a temporalidade e a espacialidade por intermédio
de um sistema de representação que ele virá a construir.
Para Antunes (1993), no estágio intuitivo ou pré-operatório, se englobarmos
todo o período, as primeiras intuições temporais são centradas sobre alguma
relação-privilegiada, ligada ao egocentrismo. Progressivamente, as centraliza-
ções primitivas se diluem por meio do processo de descentração.
Nesse estágio, cada movimento percebido caracteriza um tempo particular,
e os momentos sucessivos do tempo não podem, ainda, se relacionar entre si
por uma medida comum. A criança se apoia, por exemplo, na percepção espa-
cial para calcular o tempo: é mais velho quem é mais alto; correu mais tempo
quem foi mais longe. Ela ainda não consegue coordenar a duração e a ordem
de sucessão e age por tentativas empíricas, ou seja, por meio do ensaio e erro.
Esse período compreende aproximadamente dos dois aos sete anos. É um perí-
odo intermediário entre os esquemas sensório-motores e os esquemas conceituais,
constituído de estruturas semiconceituais que são chamadas de pré-conceitos.
O pré-conceito, no início do período representativo, ultrapassa os esquemas
sensório-motores, porque a criança coordena as experiências mentais e não sim-
plesmente os esquemas práticos. Por outro lado, ela ainda não consegue objetivar
a realidade, ou seja, não consegue reunir os objetos em classes, extrair relações
ou coordenar relações em raciocínios; ela simplesmente deforma a realidade
conforme seus desejos e interesses.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


219

O desenvolvimento ocorrido nessa primeira etapa do período pré-operató-


rio é denominado de período intuitivo.
A propriedade de reversibilidade do pensamento é um dos principais pres-
supostos da teoria piagetiana, relacionada à inteligência mais elaborada que
possibilita a objetivação do meio. A capacidade de reversibilidade do pensa-
mento signiica a tomada de consciência de que, as ações interiorizadas, que
correspondem às transformações de ações mentais, podem ser executadas simul-
taneamente em seus dois sentidos, direto e inverso, mantendo a identidade de
cada ação por si mesma.
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Tomamos como exemplo a atividade de conservação de objetos descontínuos:


quando solicitada a comparar quantidades de objetos descontínuos, contidos em
recipientes de forma bem diferenciada (um ino e alto e outro grosso e baixo), a
criança do período intuitivo airma que não há a mesma quantidade, apoiando-
-se em um determinado aspecto igurativo dos dois copos que estão cheios (ou
a largura como o comprimento no caso dessa prova). Se questionada quanto à
certeza de sua resposta, por exemplo, dizendo que outra criança respondeu em
relação a outro aspecto, a criança se desequilibra e alterna seu ponto de vista (ex.:
deixa de se centrar na altura para se centrar na largura, por exemplo).
No Estágio Operatório, tais métodos de tentativas perduram aproximada-
mente dos sete aos doze anos, quando se observa uma organização, caracterizada
por uma compreensão de conjunto das relações de sucessão, simultaneidade e
dos intervalos, isto é, das durações. Um tempo único é construído e abarca todos
os momentos, graças a uma coordenação da duração e da ordem de sucessão. A
gênese do tempo operatório revela claramente a ligação entre o egocentrismo e
a reversibilidade numa relação inversa, ou seja, quanto mais a criança vence o
primeiro, mais adquire a segunda (ANTUNES, 1993).
O pensamento operatório é aquele em que as estruturas mentais encontram-
-se equilibradas, constituindo um sistema coerente e integrado de operações, em
que cada operação está integrada ao sistema total e só tem signiicado se for enten-
dida como parte desse todo, em oposição à ideia de um segmento de elementos

A Criança e as Primeiras Noções de Tempo


220 UNIDADE V

justapostos. Assim, o conceito de operação é determinante para compreender o


principal avanço dessa fase do desenvolvimento cognitivo.
Consideramos o termo operação como uma ação interiorizada e reversível,
que deve compor um sistema em coordenação com outras operações. Sendo
assim, não podemos considerar uma única operação, mas várias operações que
se coordenam em estruturas.
Quando a criança é capaz de operar, começa-se o período operatório for-
mal, que se inicia por volta dos doze anos e perdura por toda a vida. A maior
complexidade que o pensamento equilibrado pode alcançar é no período das

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operações formais, a partir dos doze anos em média, quando o adolescente é
capaz de operar sobre hipóteses. Ele é capaz, frente a uma situação problema,
operar sobre os dados empíricos (realizar operações concretas) e além do mais,
é capaz de pensar todas as possibilidades que poderiam ocorrer além daquelas
que ocorrem de fato e vice-versa (levantar todas as possibilidades para testar
qual é verdadeira). Ele toma os resultados das operações concretas como pro-
posições e depois opera sobre essas proposições, isolando todas as variáveis e
relacionando todas as possíveis combinações entre elas (por análise combinató-
ria). Seu pensamento diferencia o real do possível.
Analisando os períodos supracitados, podemos inferir, assim como fez Piaget
em sua obra “Noção de tempo na criança”, que o tempo não pode ser considerado
um conceito, visto que não é possível deini-lo, e ele está sempre em mutação.
Além disso, existem muitas variáveis para entendê-lo em toda a sua dimensão:
tempo físico, psicológico, vivido e histórico. Desse modo, a criança da faixa etá-
ria que aqui nos propomos a trabalhar, do zero aos dez anos em média, não é
capaz de elaborar o conceito de tempo. Ela apenas adquire noções que poste-
riormente se transformarão em conceitos.
Como exercício de análise do que nos propomos a discutir, leia os dois frag-
mentos abaixo:
■ Texto 1
Entrevistador (E) – Ivan, você pode contar pra mim a história do Descobrimento
do Brasil, o que você sabe?

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


221

R – Ah, é o Pedro Álvares Cabral, estava navegando no mar. Era barco à vela.
Daí o vento, o vento estava para um lado... Depois o vento foi para o outro.
Ele estava indo descobrir outro país não sei qual é. Aí o vento bateu para o
outro lado e ele foi para o Brasil e quando ele chegou no Brasil só tinha índio,
não tinha nenhuma pessoa assim, só índio.
E – Quando isso aconteceu?
R – Ah, eu não sei.
E – Em 1500. Está bem?
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R – Quando aconteceu o descobrimento do Brasil? 1500.


E - Seu pai era vivo quando isso aconteceu?
R – Não.
E – Por quê?
R – Ah, porque isso era muito antigamente, nem acho que meu avô existia.
E – O que é muito antigamente?
R – Ah, faz muitos anos, faz muitos anos que isso aconteceu.
E – Quando você acha muitos anos?
R – Faz 400 e alguns anos.
E – 400 é muito tempo?
R – É.
E – Seu avô era vivo na época do descobrimento do Brasil?
R – Meu avô? Acho... Talvez sim?
E – Por que você acha que sim?
R – Porque meu avô faz muito tempo que ele nasceu e que ele viveu.
E – E seu bisavô era vivo na época do descobrimento do Brasil?
R – Meu bisavô era.

A Criança e as Primeiras Noções de Tempo


222 UNIDADE V

E – Por quê?
R – Porque faz muito tempo que ele nasceu e que ele viveu e também faz
muito tempo que aconteceu isso, o descobrimento (OLIVEIRA, 2000, p. 121).

■ Texto 2

Todo ser humano tem consciência do passado (deinido como o período imedia-
tamente anterior aos eventos registrados na memória do indivíduo), em virtude
de viver com pessoas mais velhas. Provavelmente todas as sociedades que interes-
sam ao historiador tenham um passado, pois mesmo as colônias mais inovadoras

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
são povoadas por pessoas oriundas de alguma sociedade que já conta com uma
longa história. Ser membro de uma comunidade humana é situar-se em relação
ao seu passado (ou da comunidade), ainda que apenas para rejeitá-la. O passado
é, portanto, uma dimensão permanente da consciência humana, um compo-
nente inevitável das instituições, valores e outros padrões da sociedade humana.
O problema para o historiador é analisar a natureza desse “sentido do passado”
na sociedade e localizar suas mudanças e permanências.
Fonte: Hobsbawn (1998, p. 22).
No primeiro texto – a entrevista – podemos veriicar os elementos da tem-
poralidade histórica que a criança possui, considerando sua idade e a teoria de
Piaget. Para o historiador Hobsbawn (1998), qual signiicado do passado? Quais
as relações entre a perspectiva do passado da criança e as ideias do historiador?
É possível estabelecer um paralelo? Tente você também realizar este exercício.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


223
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

O TRABALHO COM LINHAS DO TEMPO

Uma boa parte dos historiadores compreende que a História da humanidade está
organizada em quatro grandes períodos, numa divisão chamada de quadripar-
tismo: Idade Antiga, Idade Média, Idade Moderna e Idade Contemporânea. O
início e o im de cada um desses períodos são marcados por um acontecimento
considerado de relevância do ponto de vista eurocêntrico, ou seja, da História
do Ocidente europeu.
Ao tratar do tempo histórico, os historiadores se deparam com um problema:
a divisão entre História e Pré-história, considerando que a Pré-História é com-
preendida como um período em que os povos não deixaram registros escritos.
Por outro lado, defendemos a ideia de que todos fazem história e deixam seus
registros das experiências cotidianas. Portanto, acreditamos que, embora haja
aqueles que simplesmente não consideram a Pré-história um período digno de
ser estudado, ele também é tão importante como qualquer outro.

O Trabalho com Linhas do Tempo


224 UNIDADE V

Visto sob este ângulo, achamos pertinente deinirmos alguns conceitos que
permeiam os trabalhos com linhas do tempo. Um marco se refere ao fato que
delimita um período e outro. Este período é compreendido como um intervalo
de tempo que vai de um marco a outro.
Quando o professor trabalha com representações cronológicas pessoais,
comparativamente ao exercício de cronologias de uma dada sociedade, poderá
inferir e reletir sobre a continuidade ou ruptura dos movimentos sociais dessa
sociedade. O aluno, por exemplo, perceberá que sua história pessoal faz parte
da história de outras pessoas – simultaneidade – e que nasceram antes ou depois

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
dele – ordenação e sucessão.
Dessa maneira, é possível construir uma linha do tempo para cada socie-
dade, organizando sua história. Quando se estabelece a linha do tempo de uma
sociedade, ou mesmo do mundo, não há apenas uma possibilidade. Com base no
estudo de momentos ou fatos amplamente aceitos, cada pesquisador julgará aquilo
que considera mais importante e que deve fazer parte de uma linha do tempo.
O trabalho com linhas do tempo possibilita desenvolver diferentes habilida-
des cognitivas. Cabe ao professor adequá-las a seus objetivos:
■ São organizadas dentro de uma ordem cronológica de fatos e ideias que
não se repetem.
■ São tomadas como períodos initos ou ininitos: tempo geológico, tempo
da vida de uma pessoa, de uma cidade, tempo da história humana.
■ É contada a partir de um referencial. Lembremo-nos da linha do tempo
tradicional da História que tem como marco o nascimento de Cristo, esses
referenciais assumem “valores” crescentes e decrescentes.
■ Pode apresentar diferentes unidades de medida de tempo: dias, semanas,
meses, anos, décadas, séculos, milênios, horas... adequando ao tamanho
do período de tempo que se deseja representar.
■ Existem diferentes formas de representações de linha do tempo: com
desenhos, com valores estatísticos, com fotos, com mais ou menos dados
explicativos, na forma espiral.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


225
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

Fonte: adaptado de Orosco Roman ([2017], on-line)1.

Para o historiador, em todo estudo há um elemento central: o ser humano.


Mas, para outros cientistas, o elemento central é o planeta Terra, cuja histó-
ria começou bem antes do aparecimento dos seres humanos. Esses pesqui-
sadores criaram a linha do tempo geológico. Ela se inicia com a formação
do planeta e é marcada por vários fatos considerados importantes, como as
mudanças naturais pelas quais passou o planeta, o surgimento dos primei-
ros seres vivos e as mudanças na superfície e na atmosfera terrestre. A linha
do tempo explicitada em espiral nos permite analisar o tempo geológico.
Fonte: a autora

O Trabalho com Linhas do Tempo


226 UNIDADE V

As linhas do tempo podem ser traçadas na horizontal ou também na vertical se


forem retas, mas há ainda as elaboradas em linhas curvas, considerando que a
história é feita de oscilações, além das em espiral. O importante é que as crian-
ças tenham a oportunidade de construir linhas do tempo, inicialmente coletivas,
tendo a professora como escriba, depois individualmente, sob a supervisão da
professora e, por im sozinhas, considerando o grau de complexidade que uma
linha do tempo exige.
Vale frisar que aproveitar o tempo subjetivo ou vivido das crianças da
Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental é de extrema impor-

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.
tância e, por isso, deve ser bem aproveitado em todas as atividades escolares, pois
é a partir dele que melhor se estabelece relação com os tempos mais distantes e
não vividos pelo indivíduo. Assim, torna-se evidente valorizar os conhecimen-
tos cotidianos de cada aluno para estruturar o planejamento, de forma que este
se torne coerente e próximo da realidade da turma.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


227

Criação de Santo Agostinho, no ponto de vista linear o calendário cristão as-


sinala uma diiculdade que custa muito aos estudantes: compreender uma
divisão do tempo que começa do meio, e admite dois sentidos: um negati-
vo, outro positivo.
- +
/2008/.....................1.a.C. CRISTO.1 d.C ....................../2008/
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Esta maneira de datar o tempo começou com o monge Dionísio, o Breve ou


Pequeno em 525 (no séc.VI d.C.), durante a Idade Média.
Dionysius Exiguus (em latim) alterou a forma de calcular as datas que utiliza-
vam na altura e que era um método romano. O monge não agiu por conta
própria, mas sim, a pedido das autoridades eclesiásticas.
O Papa João I pediu a um monge que izesse os cálculos do ano em que Je-
sus teria nascido. Para fazê-lo, Dionísio tomou como referência as descrições
de Mateus e Lucas sobre o nascimento de Jesus, chegando à conclusão que
Cristo teria nascido 753 anos depois da fundação de Roma. A história icou
assim dividida em antes de Cristo (a.C.) e depois de Cristo (d.C.).
Anteriormente, portanto, os romanos contavam o tempo a partir da data
da fundação de Roma, (ab urbe condit - em latim) e foi por isso que a data
provável do nascimento de Jesus Cristo foi tomada como tendo ocorrido no
ano de 753 ab urbe condit (da fundação de Roma), contando, para trás no
tempo, os reinados dos imperadores romanos.
O fato se explica: observando o evoluir da História, constatamos uma pro-
gressiva eliminação dos cultos antigos romanos em favor do cristianismo.
Em 380, este se tornou a religião oicial do Estado romano. No séc. IV, de
religião perseguida, passou a ser a única religião permitida no Império Ro-
mano. Vai-se dando uma progressiva cristianização da sociedade.
A contagem do tempo de Dionísio, depois de ampla aceitação popular, foi
aceita pela Igreja Católica a partir do ano 1000 e progressivamente acatada
pelos países católicos e, bem depois, pelos protestantes.
Fonte: a autora

O Trabalho com Linhas do Tempo


228 UNIDADE V

Podemos propor uma atividade para fazer e aprender mais sobre o tempo, como
no exemplo abaixo:

Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

HISTÓRIA: A CIÊNCIA DO HOMEM NO TEMPO


229

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nessa última unidade do nosso material de Metodologia do Ensino de História,


veriicamos que o domínio do tempo é abstrato, em virtude de não apresentar
uma materialidade como o objeto ou o espaço e nem apresentar relações obser-
váveis como a causalidade. O tempo é, além disso, a categoria mais difícil de ser
veriicada no comportamento da criança, assim como é a mais signiicativa, se
a considerarmos do ponto de vista pedagógico, visto que, uma vez dominadas,
essas categorias permitem ao sujeito realizar a reversibilidade dos fatos e esta-
Reprodução proibida. Art. 184 do Código Penal e Lei 9.610 de 19 de fevereiro de 1998.

belecer relações entre os ocorridos no passado e no presente.


Medir o tempo é algo tão abstrato que não pode ser percebido pelos senti-
dos. Desse modo, em todos os momentos de nossas vidas atravessamos o tempo,
e isso se refere ao tempo como se este tivesse uma forma na qual fosse objetiva da
existência. Exatamente por isso, os grandes pesquisadores seguiram essas orien-
tações para entender primeiramente a natureza e decifrar suas composições e,
posteriormente, entender o que é o tempo e como se constituiu até a atualidade.
Sem dúvida, o tempo organiza nossos modos de ver e conceber a vida em
sociedade. Neste sentido, apresentamos aqui a complexa aquisição do conceito de
tempo por parte dos alunos, inseridos nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Para que ocorra essa aquisição do tempo, o aluno precisa compreender o
antes, o agora e o depois, permeando a relação que se estabelece entre o tempo
passado e o tempo presente, para poder perceber que, conforme o tempo passa,
a sociedade muda seus costumes e valores sociais.
Todo o processo de aquisição de qualquer conhecimento é abstrato. No
entanto, o tempo é o mais complexo e, por essa razão, exige do professor uma
grande responsabilidade na formação de seus alunos, visto que é necessário que
esta criança consiga estabelecer relações especíicas entre essas marcas tempo-
rais: relações de ordem dos acontecimentos e relações das durações, bem como
da simultaneidade.

Considerações Finais
230

1. As coisas estão sempre mudando. Crianças nascem todos os dias, pessoas en-
velhecem, cidades são construídas e outras são destruídas, enim, muita coisa
se ganha e outras se perdem. Tudo se transforma. E com isso, sentimos o tem-
po passar, às vezes mais rapidamente, quando há muitas mudanças, e outras
mais devagar, quando pouca coisa muda. Nesse sentido, vimos que as noções
de temporalidade precisam ser trabalhadas na criança desde a mais tenra idade
– pois não é um conceito inato e, por isso, precisa ser construído na escola com
a mediação do professor. Desse modo, discorra sobre a importância de se tra-
balhar noções temporais com crianças dos anos iniciais do Ensino Funda-
mental. Apresente um exemplo prático de como você abordaria a temática
em sala de aula.
Para auxiliá-lo em sua discussão, leia o artigo “O tempo histórico no ensino funda-
mental”, de Maria Aparecida Bergamaschi, no link: <http://www.pead.faced.ufrgs.
br/sites/publico/eixo4/estudos_sociais/O_tempo_historico_no_ensino_de_histo-
ria.pdf>. Acesso em: 7 abr. 2017.
2. Uma professora da Educação Infantil quer desenvolver com seus alunos as no-
ções de temporalidade. O que ela deve considerar? Apresente seus conheci-
mentos sobre as etapas que as crianças vivenciam ao conceber a temporali-
dade, exempliicando.
3. Pesquise na Internet a biograia de um autor, escritor, músico etc. de sua
preferência. A partir de sua biograia, construa uma linha do tempo conside-
rando a ordem cronológica, a duração e a simultaneidade dos fatos. Para
isso, leia as instruções abaixo:
• Pegue um papel sulite e, no alto, escreva o título “Linha do tempo de (fulano
de tal)”.
• No meio do papel sulite, trace uma linha horizontal ocupando toda a sua ex-
tensão.
• Divida essa linha em partes iguais equivalentes ao número de anos que você
possui.
• Escreva nas divisões o ano em que nasceu e os principais fatos que marcaram a
vida da pessoa, até o ano atual ou até sua morte.
• É possível acrescentar fotograias ou ilustrações desses fatos.
• Lembre-se que os fatos que aconteceram simultaneamente devem vir na mes-
ma divisão da linha do tempo
4. A noção de tempo é uma aprendizagem processual e muito complexa, que exi-
ge abstrações e a construção e domínio de conceitos que não são inatos. Sobre
estes conceitos é correto airmar que:
231

a. A simultaneidade é um dos conceitos mais fáceis de serem trabalhados e, por-


tanto, inserem-se na vida do aluno desde a mais tenra idade.
b. Estes conceitos se remetem à sucessão, duração e simultaneidade, que precisam
ser trabalhados sistematicamente para que nossos alunos se apropriem deles de
modo gradativo e signiicativo.
c. O conceito de sucessão diz respeito à supericialidade da História, bem como
dos fatos e ideias da vida de um povo.
d. A duração remete-se à concepção da História dada pelos antigos para medir o
tempo.
e. Como a noção de tempo é uma aprendizagem processual e complexa, deve ser
inserida na matriz curricular somente depois do 6º ano do Ensino Fundamental.
5. Considerando as diiculdades que nossos alunos têm em situar um fato no con-
texto temporal e, ao mesmo tempo, levá-los a reletir sobre o processo da utili-
zação do tempo nas diferentes sociedades, devemos saber e entender os dife-
rentes tipos de tempo. Sendo assim, assinale a alternativa correta sobre os
tipos de tempo:
I. O tempo denominado cíclico é chamado de tempo da sociedade, e diz respeito
aos fenômenos que ocorrem na natureza/sociedade e que depende, principal-
mente, da vontade humana para acontecerem.
II. O tempo histórico é o mesmo que tempo cultural, nas suas relações sociais e
enfrentamentos cotidianos, e constroem histórica e culturalmente, suas formas
de agir, de pensar e viver. É construído pela ação humana, tem como referência
o tempo da natureza.
III. O tempo subjetivo ou pessoal é interno de cada indivíduo, é o tempo das mu-
danças pessoais. Ele é particular, de acordo com nosso modo de vida.
IV. Com relação ao tempo subjetivo, podemos dizer que, ao brincar durante uma
hora, as crianças terão a sensação de que o tempo passou muito rápido, mas se
passarem o mesmo intervalo de tempo sendo atendidos por um dentista, terão
a sensação de que o tempo demorou a passar.
a. Somente a I está correta.
b. Somente a II está correta.
c. Somente a II e III estão corretas.
d. Somente a II, III e IV estão corretas.
e. Todas as airmativas estão corretas.
232

A LINHA DO TEMPO DE CADA UM E O QUE O ALUNO PODERÁ APRENDER


COM ESTA AULA
Os alunos dos anos iniciais do Ensino Fundamental, na faixa etária de 7 a 8 anos, poderão:
■ Compreender o que é uma linha do tempo.
■ Levantar as características essenciais de uma linha do tempo.
■ Resgatar junto à família acontecimentos marcantes da sua vida.
■ Construir sua linha do tempo contextualizada.
A atividade se divide em três momentos de aproximadamente 50 minutos cada. Os co-
nhecimentos prévios trabalhados pelo professor com o aluno servirão para vivenciar
essa aula, então os alunos precisam saber ler e interpretar informações.
Vamos às estratégias e recursos da aula:
1º MOMENTO - A organização de uma linha do tempo
O professor deverá iniciar discussão dessa temática lançando para a turma a questão:
‘O que é uma linha do tempo?’ À medida que os alunos vão apresentando suas ideias,
o professor registra em uma cartolina. Depois disso, o professor apresenta imagens de
linhas do tempo variadas, promovendo uma discussão com seus alunos a im de que
percebem as semelhanças na leitura das imagens apresentadas, ou seja, o que há em
comum entre as nas linhas do tempo, quais sejam: a organização por datas dos acon-
tecimentos marcantes, em um determinado momento histórico, com espaço entre si
proporcionalmente à distância de tempo entre eles.
2º MOMENTO - A linha do tempo de cada um
Em outro momento, o professor sugere que as crianças pesquisem, junto aos seus fa-
miliares, os acontecimentos mais marcantes de suas vidas, ressaltando as datas em que
ocorreram, no período entre o seu nascimento até os dias de hoje. Depois de ter esse
material em mãos, o professor sugere que cada criança construa a sua linha do tempo. É
importante que durante a construção das linhas os aspectos levantados no 1º momen-
to da aula sejam relembrados e considerados, ou seja: o espaçamento entre um ano e
outro (os espaços precisam ser do mesmo tamanho), a escolha dos fatos mais marcan-
tes, por exemplo.
3º MOMENTO
Depois de construídas, as linhas poderão ser analisadas pelas crianças. É importante que
elas sejam dispostas uma a uma, lado a lado, e que seja proporcionado discussões sobre
qual a criança mais velha, qual a mais nova, qual fato foi comum entre as crianças e etc.
233

Depois dessa apresentação, o professor poderá sugerir uma pesquisa de fatos importan-
tes que aconteceram no Brasil ou no Mundo nos períodos apresentados nas linhas do
tempo das crianças, podendo, assim, trazer para elas a visualização de que ao mesmo
tempo em que acontecia algo importante na vida dessas crianças, acontecia também
algum fato importante no mundo.
Recursos Complementares
Sugerimos o Parâmetro Curricular Nacional de História.
Avaliação
Ao inal da aula, o professor deverá observar se as crianças:
■ Participaram da construção do conceito de linha do tempo.
■ Conseguiram reconhecer as características essenciais de uma linha do tempo.
■ Participaram da construção da sua linha do tempo contextualizada.

Fonte: adaptado de Santos (2011, on-line)2.


MATERIAL COMPLEMENTAR

Lolo Barnabé
Eva Furnari
Editora: Moderna
Sinopse: nesta história vocês vão ver que Lolo Barnabé era um sujeito
inteligente e criativo. Ele nasceu há muito tempo, no tempo das cavernas.
E caverna, vocês sabem, é um lugar úmido e escuro. A família do Barnabé,
com razão, queria um lugar melhorzinho para morar, com mais conforto.
Ainal, vocês vão concordar comigo: conforto é bom demais. Só que, nessa
busca, algo saiu errado. Você é capaz de entender o que foi que aconteceu?
Comentário: Para reletirmos sobre a relação do homem com o tempo e
o quanto isso afeta nossa visão de mundo, leia a literatura infantil “Lolo
Barnabé” de Eva Furnari. Você também poderá utilizar desta literatura com
seus alunos do Ensino Fundamental. Caso não tenha acesso à obra, pesquise na internet. Após a
leitura, registre sua impressão; isto é um bom exercício para a proissão docente.

Sobre o tempo
Norbert Elias
Editora: Jorge Zahar
Sinopse: o tempo não existe em si, airma Norbert Elias - não é nem dado
objetivo, como sustentava Newton, nem uma estrutura a priori do espírito,
como queria Kant. O tempo é antes de tudo um símbolo social, resultado de
um longo processo de aprendizagem. Nesta vasta exploração da experiência
do tempo ao longo das eras, Norbert Elias convida o leitor a reletir sobre um
aspecto fundamental do ‘processo civilizador’.

Laboratório de Estudos do Tempo Presente da UFRJ


Laboratório de Estudos do Tempo Presente da UFRJ. Disponível em: <http://www.tempopresente.
org/>. Acesso em: 7 abr. 2017

As grandes correntes historiográicas: da Antiguidade ao século XX


SILVA, P. As grandes correntes historiográicas: da Antiguidade ao século XX. Disponível em:
<http://historiaaberta.com.sapo.pt/lib/art001.htm>. Acesso em: 7 abr. 2017.
MATERIAL COMPLEMENTAR

Tempos Modernos com Charles Chaplin


Sinopse: um operário de uma linha de montagem, que
testou uma “máquina revolucionária” para evitar a hora do
almoço, é levado à loucura pela “monotonia frenética” do seu
trabalho. Após um longo período em um sanatório ele fica
curado de sua crise nervosa, mas desempregado. Ele deixa o
hospital para começar sua nova vida, mas encontra uma crise
generalizada e equivocadamente é preso como um agitador
comunista, que liderava uma marcha de operários em protesto.
Simultaneamente uma jovem rouba comida para salvar suas
irmãs famintas, que ainda são bem garotas. Elas não têm mãe
e o pai delas está desempregado, mas o pior ainda está por vir,
pois ele é morto em um conflito. A lei vai cuidar das órfãs, mas
enquanto as menores são levadas a jovem consegue escapar.

Tempo, historiograia e mundo líquido”


“Tempo, historiograia e mundo líquido”. Aula inaugural do Programa de Pós-graduação em
História da Universidade Federal de Uberlândia, proferida pelo Prof. Dr. Leandro Karnal (Unicamp).
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=cqYpFwki1CA>. Acesso em: 7 abr. 2017

Dinâmicas de ensino de A a Z
CASTRO, R de C. S. Dinâmicas de ensino de A a Z. Disponível em: <http://livrariasbs.com.br/
dinamicasensino/indice.asp>. Acesso em: 7 abr. 2017

Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil


Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC). Disponível
em: <http://cpdoc.fgv.br/>. Acesso em: 7 abr. 2017

Material Complementar
REFERÊNCIAS

ANTUNES, A. R. Estudos Sociais: Teoria e Prática. Rio de Janeiro: Access Editora,


1993.
BITTENCOURT, C. M. F. Ensino de História: fundamentos e métodos. São Paulo: Cor-
tez, 2004.
______. O saber histórico na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2004. (Coleção Re-
pensando o ensino).
BRAUDEL, F. “A história e as Ciências Sociais: a longa duração”. Revista de História,
n. 62, ano XVI, v. XXX, abr. / jun. 1965.
BURKE, P. As fronteiras instáveis entre história e icção. In: Gêneros de fronteira:
cruzamentos entre histórico e o literário. São Paulo: Xamã, 1997.
ELÍADE, M. O sagrado e o profano: a essência das religiões. São Paulo: Edição Livros
do Brasil, s/d.
ELIAS, N. Sobre o tempo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.
HICKMANN, R. I. Estudos Sociais: outros saberes e outros sabores. Porto Alegre: Me-
diação, 2002.
HOBSBAWN, E. Sobre a História. São Paulo: Companhia das Letras, 1998.
KARNAL, L. História na sala de aula: conceitos, práticas e propostas. 2 ed. São Pau-
lo: Contexto, 2004.
LUCINI, M. Tempo, narrativa e ensino de História. São Paulo: Mediação, 2007.
NADAI, E. “A escola pública contemporânea: os currículos oiciais de História e o en-
sino temático”. In: Sociedade e Trabalho na História. Revista Brasileira de História,
v. 6, n. 11, São Paulo: ANPUH/ Marco zero, set. 1985/ fev. 1986.
OLIVEIRA, S. R. de. A noção de tempo histórico na criança: um estudo sobre a no-
ção do passado, das idéias espontâneas relativas à história da civilização e da rela-
tividade dos conhecimentos e julgamentos históricos em crianças de 7 a 10 anos.
2000. Dissertação de mestrado, UNESP/MARILIA.
PIAGET, J. A noção de tempo na criança. Rio de Janeiro: Record, 2002.
SCHEURMANN, E. O papalagui. Rio de Janeiro: Marco Zero, s.d.
237
REFERÊNCIAS

REFERÊNCIA ON-LINE

1Disponível em: < http://blogdoorosco.blogspot.com.br/2014/08/vivemos-ou-nao-


-uma-nova-epoca-geologica.html>. Acesso em: 20 abr. 2017.
2Disponível em: <http://portaldoprofessor.mec.gov.br/ichaTecnicaAula.html?au-
la=26959>. Acesso em: 20 abr. 2017.
GABARITO

1. Como o conceito de tempo não é inato e precisa ser desenvolvido com a ajuda
de uma pessoa adulta, no caso da escola, com a mediação do professor, o profes-
sor precisa planejar atividades práticas nos quais os alunos vão desenvolvendo
noções de sucessão, duração e simultaneidade, a partir de brincadeiras direcio-
nadas, atividades práticas, construção de linhas do tempo, etc.
2. Para Piaget, a criança passa por três grandes etapas no domínio da temporali-
dade. Sendo elas: Tempo sensório-motor: um tempo prático, ligado às ações e
experiências imediatas da criança. A criança só sente o tempo que durou a ação.
Tempo intuitivo: inicialmente ligado ao egocentrismo. O tempo é calculado atra-
vés da percepção espacial. Ex: o mais alto também é o mais velho. Tempo ope-
ratório: aquisição de reversibilidade e, portanto, uma compreensão do tempo
único.
3. Esta atividade é subjetiva, mas tenha atenção a todas as explicações dadas para
que possa fazer uma linha do tempo coerente com nossos estudos. Lembre-se
que para ensinar seus alunos, primeiramente precisa saber fazer.
4. Alternativa “B”.
5. Alternativa “D”.
239
CONCLUSÃO

Percorremos juntos neste universo da História e, conforme aqui apresentado, esta


disciplina envolve um preparo especial e cuidados revistos por parte do docente,
visando o bom resultado da aprendizagem por parte dos alunos.
É evidente que a História tem “história” e, se a sociedade mudou e o conhecimento
se impõe como um valor de capital, o ensino da matéria tem de acompanhar tais
mudanças.
Uma situação de mudança nunca envolve a mudança total, e é sempre prudente
lembrar: a conservação do que existe de bom no velho paradigma deve se conjugar
àquelas novidades trazidas pelas necessidades dos novos tempos.
Uma decisão fundamental que o professor deve tomar é quanto à História que deve
ser ensinada e, desde já, anotamos nossa opção pela Nova História, ainda que dos
tempos “positivistas” não sejam descartadas todas as práticas.
É uma sugestão sempre retomada compreender que, ensinar História é criar possi-
bilidades de investigação, sem separar aprendizagem e pesquisa, antes mantendo
a somatória das duas.
O professor que ministra aulas de História é um sujeito histórico, inserido em seu
grupo social e no seu tempo e, dessa forma, a imparcialidade absoluta não existe.
O que é possível é manter-se coerente quanto às concepções de conteúdos que
serão empregados, para a formação de conceitos e repasse de informações quanto
à disciplina histórica.
É neste ponto que faz importante a utilização dos documentos históricos de todo
tipo, em sala de aula, para desenvolver nos discentes habilidades como a identiica-
ção, comparação, compreensão e, por im, a própria apreensão do conteúdo históri-
co, como um ponto de partida que agrega novos valores a sua vida.
As fontes históricas são, como o próprio nome indica, o primeiro manancial que se
deve recorrer para atingir partes da verdade histórica que, por conseguinte, deter-
minado personagem ou tempo visto do alto ou a partir do particular nos revelam.
Como ciência do homem no tempo, a História permitirá analisar o mundo, com seus
personagens agindo na temporalidade, e isso envolve não só os heróis e bandidos,
mas também o contingente anônimo daqueles que nos antecederam e, na via de
duas mãos mencionada por Marc Bloch, entender o passado pelo presente e o pre-
sente pelo passado.
Em relação ao momento atual, outra consideração não menos importante do que
aquelas já apresentadas aqui se trata da inserção nos currículos e aulas, com desta-
que para as de História da “cultura afro-brasileira e indígena”, explicitada na Lei 10.639
elaborada em 2003, posteriormente transformada na Lei 11.645 de 2008, que trouxe
para o âmbito escolar a obrigatoriedade do ensino dessa temática, o que propor-
cionou a abertura de grandes possibilidades quanto à ediicação da igualdade, bem
como da repreensão às atitudes e posturas de discriminação no ambiente escolar.
CONCLUSÃO

Contudo, é grande o desaio que se impõe, pelo desconhecimento de grande par-


te da população no que diz respeito às sociedades africanas e indígenas. Diversos
estudiosos da área entendem que esta Lei foi elaborada para contribuir com a efe-
tivação de uma ação airmativa, além de estabelecer diretrizes curriculares para a
educação das relações étnico-raciais, bem como para o ensino da história e cultura
afro-brasileira e africana no país que se impõe há tanto tempo.
Por im, autores insistem que desconsideram, perante o tamanho da turbulência
atual, a possibilidade da História fornecer exemplos para o futuro. Mas nós nos so-
mamos a outros, que consideram a ciência histórica como inestimável para o ho-
mem, e que da memória auferida dos tempos passados procede um manancial ines-
gotável de fontes que jamais devemos deixar de procurar, estudar e retomar, em
termos de grande proveito para a humanidade.

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