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ELEMENTOS DE GEOLOGIA E MINERALOGIA

Prof. Dr. Marco Antonio Galarza, Faculdade de Geologia, IG/UFPA, antogt@ufpa.br


1- INTRODUÇÃO
1.1- Objetivo e campo de atuação da mineralogia
Mineralogia é a parte das Geociências que estuda os minerais, suas
características e propriedades, reconhecimento e classificação, como eles se
formam e onde ocorrem. Qualquer pessoa já teve algum contato direto com
minerais, pois eles estão presentes nas rochas das montanhas, nas areias das praias
e no solo das florestas e jardins. Além disso, todo produto inorgânico utilizado pelo
homem, se não é mineral bruto, é mineral na origem. A exploração espacial,
embora ainda muito restrita, tem demostrado que a importância dos minerais
transcende o planeta terra, pois rochas e minerais semelhantes aos que ocorrem em
nosso planeta foram reconhecidos na Lua e em meteoritos.
A Mineralogia é uma ciência básica das Geociências que se relaciona
diretamente, portanto, com quase todos os domínios da Geologia, sobretudo a
petrologia, a geoquímica, a geologia econômica, exploração mineral e
geocronologia. A importância crescente dos minerais na civilização humana e sua
diversificada aplicação em nossa presente cultura tecnológica tornaram a
Mineralogia uma ciência praticamente independente, com uma íntima interação
com a geologia, a física, a química inorgânica, ciência dos materiais e meio
ambiente.
1.2- Conceitos Fundamentais:
Mineral é uma substância sólida homogênea de ocorrência natural, com
estrutura interna ordenada e composição química definida e formada normalmente
por processos inorgânicos. Uma análise ponto por ponto dessa definição ajuda a
compreender melhor o que são os minerais.
Considerando que os minerais são definidos como substâncias sólidas, os
líquidos e gases, ainda que de origem natural e inorgânica, estão excluídos do reino
mineral. Desse modo, o gelo natural das calotas polares é mineral, mas a água e o
mercúrio, que ocorrem em estado líquido, não. Sólido homogêneo significa uma
substância sólida que não pode ser fisicamente subdividida em componentes
quimicamente mais simples. A definição de homogeneidade de uma substância é
relativa porque depende da escala de observação. Por exemplo, uma substância que
à vista desarmada parece homogênea, pode se revelar heterogênea quando
observada ao microscópio. Desse modo, uma substância caracterizada
macroscopicamente como um mineral, pode na verdade, ao ser observada em mais
detalhe, ser constituída por mais de um mineral.
A condição de ocorrência natural exclui as substâncias sintetizadas em
laboratório ou formadas diretamente através de alguma atividade humana.
Portanto, as substâncias sintéticas, mesmo que idênticas às substâncias naturais,
tais como algumas gemas artificiais (esmeraldas, rubis e diamantes), não são
consideradas minerais. Do mesmo modo, o gelo das geladeiras e frigoríficos, por
ser artificial, também não pode ser considerado mineral. A síntese de substâncias
em laboratórios, apesar de não produzir minerais verdadeiros, tem sido cada vez
mais amplamente utilizada para melhor definir as condições de formação dos
minerais.
A fronteira entre os processos naturais e artificiais nem sempre é nítida.
Por exemplo, como considerar a formação de CaCO3 (calcita) em tubulações de
água, ou a formação de hidróxido de ferro e sulfato de cobre como produto de
oxidação em objetos de ferro e de cobre? Essas substâncias são formadas por
processos naturais, porém em um sistema elaborado pelo homem. Muitos
mineralogistas consideram estas substâncias como minerais, pois a interferência
humana no processo foi involuntária. Entretanto esta questão é polêmica.
A estrutura interna ordenada, estabelecida por definição para os minerais,
é uma característica das substâncias cristalinas. Estas substâncias são sólidas com
um arranjo estrutural interno geometricamente regular de suas partículas
constituintes (átomos ou íons). Por outro lado, as substâncias amorfas como o
vidro, são sólidos que não apresentam estrutura interna ordenada, tal como as
substâncias líquidas e gasosas. As partículas constituintes destas substâncias estão
caoticamente distribuídas no espaço, de maneira não ordenada, portanto. Algumas
substâncias amorfas são naturais e embora satisfaçam a maioria das condições
prevista na definição de mineral, não podem ser consideradas minerais, pois não
apresentam estrutura interna ordenada. Entretanto, estas substâncias, além da água
e do mercúrio (que também não apresentam estrutura interna ordenada), ocorrem
como minerais e são tratadas no domínio da mineralogia com a denominação de
mineralóide. Opala (sílica amorfa), obsidiana (vidro silicoso vulcânico), allofana
(silicato de alumínio hidratado = argila amorfa) são exemplos de mineralóides.
A composição química definida, prevista na definição de mineral, significa
que os minerais podem ser representados por fórmulas químicas específicas. Por
exemplo, a composição química do mineral quartzo é expressa por SiO2. Como o
quartzo é um mineral praticamente puro, ou seja, não contem outros elementos
além de silício e oxigênio, sua composição química, além de definida, é fixa.
Entretanto, a composição da maioria dos minerais, embora não seja fixa, varia
dentro de limites definidos. Por exemplo, o mineral dolomita é um carbonato de
cálcio e magnésio CaMg(CO3)2 normalmente impuro, pois ele pode conter
considerável quantidade de ferro e manganês no lugar do magnésio. A quantidade
de Fe e Mn é variável, porém dentro de limites definidos. Além disso, o Fe e Mn
são os únicos elementos, além dos componentes básicos, que entram em
quantidades significativas na composição das dolomitas que, desse modo, apesar
de não ser fixa, é definida. A fórmula química que melhor expressa essa
composição variável das dolomitas é, portanto, Ca(Mg,Fe,Mn)(CO3)2.
De acordo com a definição tradicional, os minerais são formados por
processos inorgânicos. Entretanto, Klein & Hurlbut Jr. (1993), sem discordar
completamente deste aspecto da definição, estabelecem que os minerais são
“normalmente” formados por processos inorgânicos, incluindo no reino dos
minerais as substâncias não carbônicas de origem orgânica que satisfazem todos os
outros pontos da definição de mineral, ou seja, substância homogênea de
ocorrência natural, cristalina e de composição química definida. Para esses
minerais, Lowenstam (1981) e Klein & Hurlbut Jr. (1993) propõem a denominação
de minerais biogênicos. Por exemplo, as carapaças de diversos organismos
marinhos, como os moluscos, são constituídas de carbonato de cálcio (calcita ou
aragoníta). A carapaça das ostras e a pérola que ocorre dentro delas, são
constituídas de aragonita idêntica àquela formada inorganicamente. Embora os
minerais biogênicos sejam constituídos principalmente por carbonato de cálcio,
vários outros minerais (ou mineralóides) biogênicos já foram reconhecidos, tais
como a opala (sílica amorfa), a magnetita (Fe3O4), a fluorita (CaF2), diversos
fosfatos, alguns sulfatos, óxidos de manganês, a pirita (FeS2) e enxofre nativo. O
organismo humano também produz minerais, tais como a apatita Ca5(PO4)3(OH)
que é o principal constituinte dos ossos e dentes. Os cálculos renais também são
compostos pelos seguintes minerais: fosfatos e oxalatos de cálcio e fosfato de
magnésio (Gilson, 1974). Petróleo e carvão, freqüentemente referidos como
minerais combustíveis, não podem ser considerados como minerais, pois, embora
de ocorrência natural, eles não apresentam estrutura interna ordenada e nem
composição química definida.
O termo cristal foi definido originalmente para se referir aos corpos sólidos
cristalinos (minerais ou não), com faces naturais geometricamente regulares e
reconhecíveis macroscopicamente (à vista desarmada). Entretanto, logo foi
percebido que os cristais com faces macroscópicas correspondiam a situações
particulares das substâncias cristalinas as quais, dependendo das suas condições de
formação, podem ou não apresentar faces em escala macroscópica. A presença de
faces regulares é uma característica exclusiva das substâncias cristalinas, mas elas
se desenvolvem em escala macroscópica somente em condições de formação
favoráveis, quando a velocidade de cristalização é suficientemente lenta e há
disponibilidade de espaço para o crescimento das faces. Desse modo, a presença de
faces macroscópicas pode ser considerada um acidente de crescimento dos cristais
e sua falta não implica em ausência de estrutura interna ordenada que é a
característica fundamental das substâncias cristalinas. Por esta razão, o termo
cristal é mais empregado atualmente em seu sentido amplo, como sinônimo de
substância cristalina, e definido como um sólido homogêneo cristalino que, sob
condições favoráveis de formação e crescimento, pode manifestar-se externamente
com faces macroscópicas naturais geometricamente regulares.
A definição de cristal está incluída na definição de mineral, ou seja, todo
mineral é um cristal (em seu sentido amplo), mas pelo menos dois pontos da
definição de cristal (ocorrência natural e composição química definida) não estão
incluídos na definição de cristal, isto é, nem todo cristal é um mineral. Os cristais
artificiais e aqueles com composição química complexa não fazem parte do reino
mineral.
Rocha é um agregado natural de minerais que compõe as unidades básicas
de constituição da terra. As camadas terrestres (crosta, manto e núcleo) são
constituídas por corpos rochosos e estes por minerais.
Minério é uma rocha com concentração anômala de minerais ou
elementos químicos de interesse econômico.
1.3- História da Mineralogia
O estabelecimento da Mineralogia como ciência é relativamente recente,
mas o homem vem fazendo uso dos minerais, para diversos fins, desde os
primórdios da nossa civilização. Pigmentos naturais de hematita vermelha e óxido
de manganês preto foram usados por homens pré-históricos em pinturas rupestres.
Ferramentas de sílex foram usadas durante a Idade da Pedra e na Idade do Bronze,
o homem já conseguia extrair metais de diversos minerais.
O primeiro trabalho escrito sobre minerais deve-se ao filósofo grego
Theofhratus (372-287 AC), enquanto que Pliny, 400 anos mais tarde, registrou o
pensamento mineralógico de seu tempo. Durante os 1300 anos seguintes os poucos
trabalhos publicados sobre minerais contêm mais fábulas e lendas com pouca
informação factual.
A obra De Re Metallica, publicada em 1556 pelo físico alemão Georg
Bauer (Georgius Agrícola) marcou o inicio da emergência da Mineralogia como
ciência. Em 1669, o dinamarquês Niels Stensen (Nicolas Steno) observou que os
ângulos entre faces equivalentes de cristais de quartzo são constantes. Em 1780,
Carangeot inventou o goniômetro de contato, um instrumento para medir os
ângulos interfaciais dos cristais. Após diversas medidas angulares em cristais,
Romé de I’Isle confirmou as observações de Steno e anunciou em 1783, a lei da
constância dos ângulos interfaciais dos cristais, conhecida como “lei de Steno”. No
ano seguinte, René J. Hauy argumentou que os cristais eram constituídos por
pequenas unidades denominadas de “moléculas integrantes”.
Na primeira metade do século 19, importantes avanços foram alcançados
na Mineralogia. Em 1809, W. H. Wollaston inventou o goniômetro de reflexão que
permite alta precisão nas medidas das posições da faces dos cristais, o que tornou
a cristalografia uma ciência exata. Em 1815, o naturalista francês Cordier
desenvolveu um microscópio para observar fragmentos de minerais imersos em
água, que foi o precursor do método de imersão para o estudo das propriedades
ópticas dos minerais. O estudo microscópico dos minerais foi consideravelmente
aprimorado através do polarizador, desenvolvido pelo escocês William Nicol em
1828. O microscópio de luz polarizada continua sendo uma importante ferramenta
no estudo e na determinação dos minerais. O químico sueco Berzelius e seus
estudantes, desenvolveram, entre 1779 e 1848, os princípios da presente
classificação química dos minerais.
A descoberta da difração dos Raios-X pelos cristais marcou o início do
século 20, através de uma experiência coordenada pelo físico alemão Max Von
Laue em 1912. Estava demostrado, portanto, pela primeira vez, o arranjo regular e
ordenado de átomos e íons constituintes das substâncias cristalinas. Em 1914, a
determinação da estrutura interna de uma substância cristalina (halita) foi
anunciada pela primeira vez pelos físicos ingleses William H. Bragg e William L.
Bragg (pai e filho). Os Bragg também aperfeiçoaram o tratamento matemático da
difração dos Raios-X e simplificaram as equações de Von Laue. Como
conseqüência imediata destas descobertas, a difração dos Raios-X tornou-se um
importante método para o estudo e determinação dos minerais e de qualquer outra
substância cristalina.
O advento dos microscópios e das microssondas eletrônicas na década de
60, permitiu a análise química pontual de minerais em micro-escala (até 10.000
vezes de aumento), uma outra poderosa ferramenta no estudo e determinação dos
minerais. Na década de 70, foi desenvolvido o microscópio eletrônico de
transmissão, capaz de aumentar vários milhões de vezes a imagem dos minerais,
permitindo o estudo das substâncias cristalinas em uma escala próxima das
distâncias atômicas.
A Sociedade Mineralógica da América (Mineralogical Society of
America) vem concedendo anualmente, desde 1937, a medalha Roebling, para as
melhores contribuições científicas no campo da Mineralogia. Essa medalha foi
dedicada à memória do coronel Washington A. Roebling, entusiasmado pela
Mineralogia, que fez uma generosa doação para a Sociedade Mineralógica em
1926, ano de seu falecimento.

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