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A presença do YouTube nos media – Razões

e consequências∗
Catarina Rodrigues
Universidade da Beira Interior

Índice 1 Broadcast yourself


1 Broadcast yourself 1 Nos últimos anos tem surgido um conjunto
2 Jornalistas de circunstância 2 de ferramentas que possibilitam novas for-
3 Informação e entretenimento 4 mas de comunicação. Sem a exigência de
4 (R)evolução? 5 grandes conhecimentos técnicos, os cida-
5 A difícil questão dos Direitos de Autor 7 dãos têm à sua disposição um leque de pos-
6 Conclusão 9 sibilidades que permite a participação no es-
7 Bibliografia 10 paço público, a partilha de ideias ou o sim-
ples entretenimento. A blogosfera é um bom
exemplo da participação activa dos cidadãos
Resumo que debatem e exploram temas nas mais di-
O sucesso crescente do YouTube eleito pela versas áreas. Descobertas as potencialida-
revista Time “a melhor invenção de 2006” é des tecnológicas, aliadas à simplicidade e à
um exemplo da participação activa dos ci- ausência de custos, muitos não hesitam em
dadãos no relato de factos recorrendo a no- utilizá-las e, em determinados casos, conse-
vas ferramentas e tecnologias. Ao longo guem mesmo destacar aspectos que por al-
deste trabalho procura-se compreender se fe- gum motivo escaparam aos media. Quando
nómenos como este podem concorrer com presentes num determinado acontecimento,
a própria televisão, nomeadamente no que os indivíduos participam no relato dos fac-
diz respeito à transmissão de determinados tos, através de blogs ou de outras ferramen-
acontecimentos, e perceber como respondem tas.
os media a estas inovações tentando definir O sucesso crescente do YouTube1 , eleito
quais as razões do sucesso do YouTube e pos- pela revista Time “a melhor invenção de
síveis consequências. 2006” é um exemplo disso. No espaço de

um ano, o YouTube alcançou uma enorme
Comunicação apresentada no 5o Sopcom - Co-
popularidade. Programas televisivos, entre-
municação e Cidadania, Universidade do Minho,
Braga, 6 a 8 de Setembro de 2007. vistas, críticas, denúncias, discursos políti-
1
http://www.youtube.com
2 Catarina Rodrigues

cos, vídeos caseiros, curiosidades, tudo pode deos como aquele que foi produzido pelo
ser visto e partilhado, a qualquer hora e em responsável pelo ataque na Universidade
qualquer lugar. Alguns aspectos indicam que Virgínia Tech? Recorde-se que os familia-
a cidadania se exerce também na Internet e res das vítimas criticaram fortemente a NBC
através dela. A participação activa dos cida- pela divulgação dessas imagens e pela lin-
dãos é o aspecto que aqui mais nos importa guagem nelas contida, mas os utilizadores da
realçar, embora não seja demais lembrar que Internet têm acesso aos mais diversos vídeos
aqueles que disponibilizam conteúdos neste sem qualquer tipo de filtro. Estará o sucesso
espaço constituem ainda uma minoria face do YouTube relacionado com a televisão, ou
ao número total de visitantes do site. melhor, com o que os telespectadores não en-
contram na pequena caixa mágica? Poderão
fenómenos como este concorrer com a pró-
2 Jornalistas de circunstância
pria televisão, nomeadamente no que diz res-
Os vídeos do YouTube têm muitas vezes ocu- peito à transmissão de determinados aconte-
pado espaços nos media, nomeadamente em cimentos?
noticiários televisivos onde a imagem é fun- A televisão, em especial os canais gene-
damental. À semelhança do que já havia ralistas têm vindo a perder telespectadores
acontecido com os blogs surge novamente a de uma forma acentuada. No caso dos jo-
questão do “cidadão-jornalista”, referida por vens em especial é notório um maior inte-
Dan Gillmor. Num texto publicado no seu resse pela comunicação via Internet, até por-
blog, Luís Carmelo compara o YouTube ao que são cada vez mais as possibilidades pro-
“tempo da iminência”2 . Para Carmelo “o porcionadas em frente ao pequeno ecrã do
YouTube permite ver imagens que se anteci- computador. Como lembra Moral o com-
pam às captadas pelos media tradicionais, ao putador é utilizado socialmente. “Todavia,
filtro da edição e sobretudo às consequências muitos adultos têm a imagem de uma criança
dos factos filmados. Há no YouTube um novo solitária que passa o dia colado ao ecrã do
tempo, o tempo da iminência, que nada tem computador a jogar ou a ver coisas indevi-
já que ver com o tempo da notícia, nem com das”3 .
o tempo da meta-ocorrência (i.e., os factos Uma outra característica das facilidades
reais transformados, num dado período, em permitidas pelos novos meios passa pelo
efabulação ficcional e contagiosa - veja-se o facto de os cidadãos se terem apropriado de
caso Sócrates, o caso Casa Pia, o caso gripe características que até então haviam sido de-
das aves, etc...)”. O autor dá o exemplo do legadas aos jornalistas: informar sobre o que
massacre Virginia Tech que denota o lado de mais relevante se passa, o que implica à
“abismado e terrível” dizendo mesmo que partida uma atenção constante em relação ao
“hoje em dia, deixámos de ter tempo para mundo envolvente. Munidos de câmaras fo-
nos prepararmos para a actualidade”. tográficas digitais, telemóveis ou câmaras de
O que dizer perante a transmissão de ví- vídeo (por sua vez também cada vez mais
2 3
http://luiscarmelo.blogspot.com/2007_04_01_ar http://blogs.alianzo.com/redessociales/2006/11/
chive.html#8397645546112102133 09/icomo-es-la-generacion-youtube

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A presença do YouTube nos media 3

acessíveis ao grande público) não hesitam Estes dispositivos permitem-nos falar de


em distribuir na rede instantes captados num uma redefinição dos mediadores de conteú-
determinado momento. A diferença crucial é dos. O jornalismo caracteriza-se pelo seu
que os jornalistas devem seguir todo um con- papel mediador, porque existe sempre um
junto de regras profissionais e deontológicas. processo de selecção entre o que é ou não
Os próprios media têm recorrido frequen- publicado, entre os acontecimentos e o pú-
temente a imagens divulgadas por cidadãos blico. Mas hoje em dia, qualquer cidadão
anónimos, nomeadamente em situações de pode publicar o que bem entender acerca de
interesse público ou que envolvam figuras um determinado acontecimento. Acredita-
públicas. Recorde-se o exemplo do vídeo mos contudo que não pode haver jornalismo
do eurodeputado português Paulo Casaca a sem jornalistas, mas defendemos que a par-
dançar com membros do grupo iraniano Mu- ticipação dos cidadãos é cada vez mais im-
jahedin do Povo (considerados terroristas). portante e não pode ser ignorada. O conceito
As imagens disponibilizadas no YouTube fo- de cidadãos-jornalistas, introduzido por Gill-
ram amplamente divulgadas nos vários espa- mor está ainda rodeado de algumas dúvi-
ços informativos dos vários canais de tele- das. É certo que os indivíduos se têm re-
visão portugueses, depois de avançadas em velado muito participativos, quando presen-
primeira-mão pelo Expresso on-line. As no- tes num determinado acontecimento não he-
tícias levaram mesmo a que Paulo Casaca pe- sitam em participar de forma activa no relato
disse ao YouTube a remoção do vídeo. dos factos, através da escrita em blogs, da
Mas não só os meios de comunicação so- publicação de vídeos no YouTube, ou atra-
cial se aperceberam do potencial de ferra- vés de qualquer outro dispositivo tecnoló-
mentas como o YouTube. Também os polí- gico, como um simples telemóvel com câ-
ticos estão atentos a esta temática. Helena mara fotográfica. Os media mainstream,
Roseta, candidata independente às eleições apercebendo-se de todo este potencial, têm
para a Câmara Municipal de Lisboa, dispo- vindo a criar espaços destinados a esta par-
nibilizou um vídeo no YouTube em que se ticipação cívica. As pessoas ganham voz e
apresenta, em pouco mais de um minuto, capacidade de intervir rompendo com o es-
aos internautas pedindo ideias para a cidade. quema tradicional emissor-receptor, na me-
A candidata refere-se à Internet como um dida em que os tradicionais receptores pas-
meio usado pelos cidadãos para “comuni- sam agora também a emissores. Esta é
carem uns com os outros, criticarem o po- uma das consequências da simplificação do
der, arranjarem soluções e sugestões” enal- acesso à difusão de conteúdos na web. Mas
tecendo ainda o facto de a cidade precisar de daí a podermos chamar a estes cidadãos-
mobilizar esta energia. Mas esta não foi a jornalistas ainda vai um longo caminho. Pe-
primeira experiência que um político portu- rante a enorme quantidade de informação a
guês teve com o YouTube. Marcelo Rebelo que temos acesso, o papel do jornalista como
de Sousa gravou, em Janeiro de 2007, um ví- mediador é indiscutivelmente importante. A
deo onde afirmou a sua posição face à des- fronteira entre produzir e consumir informa-
penalização do aborto. Todas estas situações ção está cada vez mais diluída, mas o papel
foram noticiadas pelos media. do jornalista continua a ser fundamental.

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3 Informação e entretenimento mais importante é perceber quais as caracte-


rísticas da participação que possam ser apro-
O desejo de divulgar a opinião pessoal face
veitadas do ponto de vista jornalístico. Os
aos mais variados assuntos foi decidida-
blogs são o suporte para um conteúdo, que
mente vincado pelo fenómeno dos blogs. No
pode ou não ser jornalístico, e como é óbvio
início do boom da blogosfera, Paulo Querido
muitas vezes não é, não passando de simples
referia que “ao disporem pela primeira vez
entretenimento. Também a grande maioria
de uma forma de acesso directo às massas,
dos vídeos disponibilizados no Youtube não
até há pouco tempo reservada a uma elite (a
tem qualquer valor jornalísticos, contudo é
classe jornalística), os cidadãos se embria-
necessário estar atento por se tratar, sem dú-
guem com tal poder e se entusiasmem com
vida de uma importante fonte de informação
a possibilidade do acesso directo às fontes, a
e de comunicação.
consulta de visões diferentes do enfoque tí-
A cobertura de acontecimentos importan-
pico dos jornais e a emissão das suas pró-
tes, tragédias, etc. teve grande repercussão
prias versões dos acontecimentos” (Querido
na blogosfera, basta para isso recordar o tsu-
& Ene, 2003:26).
nami na Ásia ou os vários atentados terroris-
No espaço público surgem, a cada ins-
tas. Nos blogs encontraram-se testemunhos
tante, novos pontos de vista. “A possibili-
importantes sobre estas matérias. Também
dade de qualquer um produzir informação
agora no YouTube se encontram, de forma
dará voz a pessoas que a não têm tido. E
rápida, vídeos sobre os conflitos do Iraque,
precisamos de ouvir o que elas têm a dizer-
Líbano ou em Darfur. Os jornalistas estão
nos. Para já, estão a mostrar a todos e cada
perante novas fontes de informação onde se
um de nós – cidadão, jornalista, objecto da
destaca a velocidade informativa. Lee Rai-
notícia – que existem novas formas de falar
nie lembra que “a fronteira entre produzir e
e de aprender” (Gillmor, 2005:19). O facto
consumir informação está a ser obliterada”4 .
de os cidadãos poderem dizer o que pensam
A ideia de aproximar os cidadãos das cau-
ou divulgar as imagens que captaram em de-
sas públicas deu passos largos com a intro-
terminado momento e que julguem de inte-
dução de novas tecnologias. Surgiram no-
resse público não fará deles jornalistas, até
vas formas de comunicar, de trocar ideias e
porque a formação para o exercício da pro-
de debater. As facilidades de interactividade
fissão é fundamental, mas não pode simples-
proporcionadas pela Internet em geral, e pe-
mente ser ignorada, pois os meios de comu-
las várias ferramentas existentes em particu-
nicação social deixaram de ter exclusividade
lar, são um forte estímulo à participação.
de publicação e a audiência passou a ter tam-
No seu livro, Nós, os Media, Dan Gill-
bém esse poder. Com o aparecimento dos
mor defende o conceito de “jornalismo de
blogs apareceram novos vigilantes, os vigi-
base”, se é que assim se pode traduzir do ori-
lantes dos próprios media. Gillmor fala tam-
ginal “grassroots journalism”. A diferença
bém dos blogs como “sistemas de retorno”
4
(Gillmor, 2005:228),no sentido em que cap- Inquérito publicado por Lee Rainie, direc-
tam as ideias de cada um podendo responder tor do Pew Internet & American Life Project em:
http://www.pewinternet.org/PPF/r/144/report_display.
instantaneamente e a uma escala global. O
asp

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A presença do YouTube nos media 5

essencial entre o jornalismo cívico e esta cor- questiona-se a mediação entre o público e o
rente defendida por Gillmor reside no facto privado. A que se deve afinal o sucesso do
de o primeiro ser exercido por jornalistas, en- YouTube? Como respondem os media em
quanto que o segundo pode ser uma oportu- geral, e os jornalistas em particular, a estas
nidade para qualquer cidadão, ou seja para inovações tecnológicas e até culturais? Esta-
própria audiência. Uma das principais ideias remos perante novas formas de comunicação
de Gillmor é que cada um de nós pode ser e novas linguagens?
autor de notícias, deixando de ser um mero O Youtube é um espaço híbrido que soube
espectador, passando a ter um papel activo aproveitar as ferramentas que os cidadãos
na produção, ou seja, abordar temáticas que têm hoje ao seu dispor, podendo aqui aplicar-
de outra forma talvez não chegassem aos me- se a ideia de “estar no sítio certo à hora certa”
dia tradicionais. Dan Gillmor traça assim acrescentando-se ainda a possibilidade de
a (r)evolução do jornalismo de massas para nessa mesma hora poder dar a conhecer o su-
um jornalismo mais cívico, como se todos cedido a milhões de pessoas.
pudessem ser jornalistas. “A linha divisória De informação a entretenimento é possí-
entre produtores e consumidores vai esbater- vel publicar e encontrar de tudo um pouco
se, provocando alterações, que só agora co- no YouTube. Esta ferramenta é utilizada por
meçamos a antever, nos papéis de cada um simples curiosos que fazem pesquisas so-
dos grupos” (Gillmor, 2005:15). A audiên- bre um determinado tema, assim como por
cia desempenha agora um papel mais activo. bloggers que procuram documentar opiniões
E para além da informação que é possível e jornalistas que podem encontrar ali todo
encontrar em sites como o YouTube, os ci- um conjunto de informação. Através de um
dadãos procuram também o entretenimento, pequeno questionário5 realizado a bloggers
encontrando conteúdos alternativos aos me- e utilizadores do YouTube percebe-se que
dia mainstream e procurando satisfazer as grande parte do sucesso desta ferramenta se
suas preferências próprias. deve ao seu carácter inovador, bem como à
5
O questionário foi composto pelas seguintes
4 (R)evolução? questões: 1. É utilizador regular do YouTube? 2. O
que mais procura nesta ferramenta? 3. Porque utiliza
Estão a ser dados passos importantes no vídeos do YouTube no seu blog? 4. No seu entender, a
caminho traçado pela Web 2.0, relacionada que se deve o sucesso do YouTube? 5. Podem os cida-
dãos encontrar neste espaço o que não encontram nos
com o aparecimento de ferramentas que fa- meios de comunicação social? 6. Como devem res-
cilitam a publicação pessoal seja através dos ponder os media em geral e os jornalistas em particu-
blogs, do YouTube, da Wikipedia, ou da par- lar, a estas inovações tecnológicas e até culturais? 7.
ticipação nos próprios meios de comunica- Observou alguma vez o recurso a imagens do YouTube
ção social em espaços por estes proporciona- por parte dos media? 8. Estaremos perante novas for-
mas de comunicação e novas linguagens? Preocupa-o
dos em que simples cidadãos anónimos são a questão dos direitos de autor? A realização deste
agora produtores de conteúdos. Compreen- questionário não teve qualquer pretensão estatística,
der este fenómeno e a relação com os me- apenas procurou auscultar opiniões e sentir o pulsar
dia é fundamental. Observam-se mudanças de quem utiliza as ferramentas. Algumas das opiniões
ao nível do aparecimento de novas fontes e recebidas são por isso reproduzidas neste paper.

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vontade de partilhar informação aliada à fácil levar a imagem a qualquer parte do mundo”.
utilização. Trata-se de um espaço onde, para Houve também quem sublinhasse o facto de
além da actualidade se pode ter acesso a pe- os próprios media recolherem informação no
ças antigas que seriam difíceis de encontrar Youtube. Neste sentido a opinião geral é
em qualquer outra parte. A maioria dos utili- a necessidade de existir um filtro crítico ao
zadores que respondeu ao inquérito tem um manancial de informação disponível e neste
blog onde disponibiliza frequentemente ví- domínio os jornalistas devem ter um papel
deos do YouTube. Vasco Santos6 explica que fundamental. Podem aproveitar o desenvol-
a maior parte dos vídeos publicados se des- vimento da tecnologia, a participação activa
tina ao “entretenimento dos leitores embora dos cidadãos para investigar e divulgar novos
sejam também utilizados pontualmente para temas ou assuntos entretanto já esquecidos.
complementar algo, omo seja um evento que Para além dos noticiários televisivos da-
tenha ocorrido, uma crítica etc.”. Ricardo rem destaque a vídeos publicados na Internet
Cordeiro7 , autor de um blog sobre desporto, sobre os mais variados assuntos, é também
justifica que o recurso ao YouTube serve para cada vez mais frequente a criação de espa-
enriquecer os textos que escreve. “Como o ços multimédia com vídeos nos jornais on-
blog versa essencialmente sobre futebol, ao line. Relativamente às eleições presidenciais
falar de um determinado jogador, nada me- americanas está a ser promovida uma inici-
lhor que os visitantes poderem ver um vídeo ativa interessante entre o YouTube e a esta-
do atleta em causa. Como se costuma dizer ção televisiva CNN. Os cidadãos estão a ser
uma imagem vale mais do que mil palavras”, convidados a colocar questões aos candida-
explica. Questionados sobre o facto de ser tos através de vídeos. Os melhores e os mais
possível encontrar neste espaço o que não se criativos vão ser exibidos durante os vários
encontra nos meios de comunicação social, debates a ser realizados na presença dos res-
todos responderam que isso de facto acon- pectivos autores. A sua reacção poderá de-
tece, no sentido em que é possível encontrar, pois ser vista no Citizentube9 , um canal de
por exemplo, “programas que foram censu- conteúdos vocacionado para a política onde
rados”, tal como referiu Nuno Teles8 , e por qualquer cidadão pode participar. O diário
este meio deixaram de o ser. Vasco Santos espanhol El País10 , o jornal francês Le Fí-
refere que “é como se cada cibernauta pu- garo11 , o jornal inglês The Guardian12 são
desse ser um cameraman e facilmente difun- exemplos disso. Em Portugal existem tam-
dir imagens por todo o mundo numa ques- bém vários exemplos. O Expresso on-line13
tão de minutos. É sem dúvida uma ferra- disponibilizou mesmo no seu site a Expresso
menta poderosa, pois onde não está um ca- TV. Ao nível universitário têm de facto sur-
meraman de uma estação televisiva para le- gido casos interessantes da integração de ele-
var a imagem do acontecimento pode estar 9
http://www.youtube.com/citizentube
uma pessoa com o seu telemóvel apenas a 10
http://www.elpais.com
11
6 http://www.lefigaro.fr
http://ladroesdebicicletas.blogspot.com 12
7 http://www.guardian.co.uk
http://futebol-bonito.blogspot.com 13
8
http://ladroesdebicicletas.blogspot.com http://expresso.clix.pt

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A presença do YouTube nos media 7

mentos multimédia. O Urbi@Orbi14 – jornal pessoa em qualquer parte do mundo, agora o


on-line da Universidade da Beira Interior e YouTube (e outras ferramentas
o Jornalismo Porto Net15 , da Universidade similares) pode trazer o que cada um dos
do Porto são bons exemplos do que é possí- nossos olhos acabou de ver em determinado
vel fazer no jornalismo integrando elemen- instante”. Neste sentido podemos estar pe-
tos que complementam as notícias. A nível rante novas linguagens comunicacionais as-
regional começa também a ser notável a inte- sentes em novos métodos de transmissão de
gração de elementos multimédia nos jornais informação que há muito têm vindo a evoluir
on-line. Por ocasião do seu quinto aniversá- tornando-se acessíveis a um maior número
rio o Diário XXI 16 lançou o seu espaço de ví- de pessoas. O autor do blog Casegas Vai
deos com recurso ao YouTube. Segundo Luís Nua17 acrescenta ainda o facto de “a infor-
Fonseca, director do Jornal, “hoje, qualquer mação chegar mais rapidamente e acaba por
pessoa pode captar imagens e exibi-las na In- haver uma natural aproximação positiva en-
ternet. Mais importante que a qualidade de- tre as pessoas, principalmente a comunidade
las é aquilo que mostram. Momentos únicos emigrante, que se delicia a ver notícias do
que muito provavelmente ninguém iria ver seu país ou da sua terra natal de uma forma
se essa pessoa não estivesse no sítio certo, muito prática, tudo dentro do pacote da In-
à hora certa”. Neste sentido o responsável ternet e sem TV Cabo”. De facto estas ferra-
lançou o desafio: “se o que conta é ser opor- mentas são relevantes não só ao nível do en-
tuno, quem melhor que os jornalistas, cuja tretenimento, como também ao nível infor-
profissão é estar onde há notícia, para captar mativo, onde ganham destaque assuntos de
este tipo de imagens?”. Quando estão em re- interesse público, e ainda ao nível regional
portagem, os jornalistas do Diário XXI têm e local permitindo a aproximação entre ele-
a oportunidade de filmar detalhes que, em- mentos de uma mesma comunidade ou que
bora não sendo o trabalho jornalístico, lhe partilham interesses, como é o caso das co-
servem de complemento. São um pormenor munidades emigrantes.
multimédia para saciar curiosidades: sobre
o local, as pessoas, o ambiente em que se
5 A difícil questão dos Direitos
passou aquilo que se lê. A 14 de Junho de
2007, data de lançamento da ideia, estavam de Autor
disponíveis no site do jornal cerca de 50 ví- O facto do Youtube ser actualmente o portal
deos com duração variável entre alguns se- de vídeos de maior sucesso em todo o mundo
gundos até perto de dois minutos, gravados acaba por levantar questões pertinentes, no-
experimentalmente ao longo dos últimos me- meadamente no que diz respeito aos direitos
ses. Agora a actualização é constante. de autor. A disponibilização on-line de ex-
Vasco Santos recorda que “se os blogs certos de programas televisivos, séries, etc.
trouxeram a escrita ‘em directo’ de qualquer fez com que o tamanho máximo dos vídeos
14
http://www.urbi.ubi.pt/ publicados ronde os 10 minutos, evitando-se
15
http://jpn.icicom.up.pt/ assim a publicação de episódios completos
16
www.diarioxxi.com
17
http://casegas.blogspot.com

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8 Catarina Rodrigues

(mas não das partes...). No Japão, o You- que a Internet “se caracteriza por ser um es-
Tube foi mesmo acusado de violar os direi- paço de comunicação atípico, pela inexis-
tos de autor. Foram já vários os produtores tência de um mediador, contrariamente aos
de conteúdos que acusaram o site de publi- meios tradicionais de comunicação” (Silva,
car vídeos não autorizados. A Viacom, de- 2005:7). O autor defende ainda que a “vi-
tentora de marcas como a MTV, VH1, Para- são poética da Internet não pode prevalecer.
mount Pictures, Comedy Central e Nickelo- Tal como na sociedade em geral, também
deon também processou recentemente a em- na Sociedade da Informação a existência de
presa do grupo Google exigindo uma indem- normas jurídicas de molde a evitar e contra-
nização de mil milhões de dólares pela pu- riar conflitos é uma inevitabilidade” (Silva,
blicação indevida de excertos do conhecido 2005:10). Ao analisar o Direito à luz do caso
programa “Daily Show”. Para evitar ques- concreto dos blogs, Hugo Silva defende a no-
tões como esta a Time Warner e a Walt Dis- ção de “responsabilidade civil”, ou seja, “a
ney são os parceiros do YouTube na criação obrigação de reparar os danos causados a ou-
de uma ferramenta que permite verificar se trem, indemnizar os prejuízos que alguém foi
quem submete um vídeo está a respeitar os vítima” (Silva, 2005:10). Este conceito faria
direitos de autor18 . São inúmeros os vídeos todo o sentido se não estivéssemos constan-
de programas portugueses também disponí- temente perante o anonimato, que de facto
veis no site. Os sketches do Gato Fedorento coloca problemas nas questões relacionadas
são um exemplo disso. Consequência ou não como os direitos de actor.
a RTP passou a disponibilizar no seu site ofi- A participação cada vez mais activa dos
cial o programa semanal “Diz que é uma es- cidadãos, que deixaram de ter um papel ape-
pécie de magazine”. nas passivo é relevante. “A novidade da
Para além desta questão dos direitos de au- Internet está quer no facto de reunir num
tor há a questão da reserva da vida íntima e só diferentes meios de comunicação (im-
pessoal. A empresa da Google foi mesmo prensa, rádio, televisão, etc.) quer na cir-
obrigada pelo tribunal a impedir o acesso cunstância de as mensagens, em forma di-
a um vídeo que mostrava cenas íntimas de gital, poderem revestir natureza multimédia
uma modelo brasileira, mas entretanto esse (texto/som/imagem). Contudo, a nota mais
mesmo vídeo já estava disponível em sites e impressiva deste novo meio de comunica-
blogs um pouco por todo o mundo. ção é, para além da convergência multimé-
Tal como refere Alexandre Dias Pereira dia, a interactividade com o destinatário, o
“O Código do Direito de Autor não foi qual pode conformar os conteúdos informa-
feito para regular o novo meio de comu- tivos que utiliza. Sendo que quer a conver-
nicação que é a Internet, onde se congre- gência quer a interactividade são possíveis
gam as potencialidades dos meios tradici- graças à digitalização das mensagens. (Pe-
onais acrescentando-lhes a interactividade, reira, 2002:4) “Hoje em dia, o direito de au-
transformando o papel do utilizador em ac- tor, deixou de estar somente ligado à clássica
tivo” (Pereira, 2002:1). Hugo Silva lembra imagem da pessoa física, para ser um direito
18
de protecção, não apenas da criação literá-
http://tek.sapo.pt/4M0/749665.html
ria e artística, mas também da publicação e

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A presença do YouTube nos media 9

duplicação em rede de conteúdos”19 . Iden- 6 Conclusão


tificar a fonte será sempre uma prática ade-
A recepção que temos da actualidade tem
quada no que diz respeito a qualquer publi-
vindo a sofrer alterações caracterizando-se
cação, nomeadamente na Internet. Até por-
sobretudo pela ausência de mediação. Ví-
que “não existe ainda na legislação portu-
deos da Internet, nomeadamente as publica-
guesa nenhuma lei sobre os direitos de au-
ções encontradas no YouTube, oriundas de
tor no mundo digital que concilie e equilibre
todas as partes do mundo, sobre todos os
os legítimos interesses dos criadores e edito-
temas possíveis e imaginários, começam a
res, com a necessidade e o direito de acesso
concorrer com a televisão que no caso dos
à cultura e à informação (ambos consagra-
canais generalistas se encontra cada vez mais
dos constitucionalmente)”20 . Existe ainda
vazia de conteúdos pautados pela qualidade
um grande vazio legal referente a esta ques-
e capazes de ganhar audiência.
tão.
Temos assistido nos últimos anos a uma
No caso do questionário realizado no âm-
crescente segmentação dos media dirigidos
bito deste trabalho, a maioria dos inquiridos
a públicos específicos. A este fenómeno
não se mostrou preocupado com a questão
associa-se, por exemplo, um decréscimo no
dos direitos de autor. Entre outras opiniões
número de pessoas que sintonizam os canais
foi referido que os autores devem aproveitar
generalistas e um aumento das pessoas que
estas tecnologias para promover e rentabili-
aderem à blogosfera, aspectos em que im-
zar o seu trabalho. Foi também sublinhado
porta pensar. A segmentação criada por es-
que ao fazer uma publicação na Internet se
tas novas ferramentas acaba por conseguir
corre o risco de a ver multiplicada, muitas
uma maior proximidade das pessoas aos te-
vezes sem ser feita referência à fonte origi-
mas com os quais mais se identificam.
nal. Mas esta não é, de facto, uma prática
Criado em Fevereiro de 2005, o Youtube,
correcta, que pela facilidade e continuidade
por toda a contextualização envolvente, é um
com que é realizada deva ser aceite natural-
dos sites que mais tem crescido, sendo assim
mente. A responsabilidade de cada autor é
líder na partilha de vídeos. É sem dúvida
fundamental e contribui decididamente para
umas das ferramentas que melhor define a
a sua credibilidade. Neste domínio, saliente-
Web 2.0, uma revolução social que acontece
se ainda, a necessidade e importância de uma
de forma rápida e inevitável, por um lado,
literacia digital. A educação para os media e
devido aos avanços tecnológicos, por outro,
para a própria utilização da Internet é fun-
devido à própria predisposição dos cidadãos
damental. Só assim o utilizador poderá per-
para desta forma participarem e darem uso às
ceber a importância da publicação e do acto
várias ferramentas que têm ao seu dispor.
de tornar algo público, conseguindo também
Com base nesta ideia original têm surgido
distinguir a credibilidade e qualidade de um
tantas outras que partilham de ideais seme-
determinado espaço ou meio que consulta.
lhantes. Videolectures.net21 é um desses ca-
19
http://www.minerva.uevora.pt/internet- sos. Trata-se de uma espécie de YouTube di-
direitos/introducao.htm reccionado para a investigação, ou seja, um
20
Idem
21
http://videolectures.net/

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10 Catarina Rodrigues

site onde é possível encontrar excertos de /youtube-research-gazette/ [consultado


conferências de várias área científicas e até 19-06-2007].
alguns cursos e tutoriais. Este projecto tem
a partilha de ideias e a troca de conheci- Castanheira, José Pedro (2004). No reino
mento como lemas fundamentais. Em Junho do anonimato – O estudo sobre o jor-
de 2007 nasceu o YouTube Remixer22 , um nalismo onlin, Colecção Comunicação,
espaço que permite editar vídeos a partir do Coimbra: MinervaCoimbra.
próprio YouTube incentivando a criatividade Correia, João Carlos (2006). A frag-
de cada um. mentação do espaço público: novos
Registam-se assim mudanças ao nível do desafios ético-políticos, disponível em:
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