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1. INTRODUÇÃO

O cenário político, econômico e social brasileiro, nas ultimas décadas, tem sido
marcado pelo processo de redefinição do papel do estado, a partir da universalização
dos direitos de cidadania, descentralização e gestão democrática das políticas públicas.

Surgindo assim, um novo formato institucional, legitimado pela Constituição


Federal de 1988, integrante do processo de implementação da gestão descentralizada e
participativa, que ocorreu no Brasil nos anos de 1990, nas esferas municipal, estadual e
federal.

A participação da população por meio de organizações representativas, na


formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis foi garantida na
Constituição Federal, institui no âmbito das políticas públicas, a participação social
como eixo fundamental na gestão e no controle das ações do governo.

Nesse formato institucional, a gestão compartilhada constitui-se, no que diz


respeito às políticas públicas, como um novo padrão de interação entre governo e
sociedade, exigindo-se das organizações da sociedade civil uma atuação efetiva por
meio de processos interativos no âmbito da gestão pública. Esse modelo de gestão
absorve em sua estrutura vários segmentos da sociedade, passa a se constituir o novo
modelo de articulação política na defesa pela democratização da gestão das políticas
públicas, através dos quais diversas pessoas interagem no processo de deliberação,
gestão e controle social das políticas.

Este trabalho tem o objetivo de abordar detalhadamente a reorganização das


políticas públicas quanto a gestão compartilhada nas três esferas federal, estadual e
municipal dando foco nas áreas de ação social, saúde e educação, já que são os pilares
para o desenvolvimento de um país.
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2. O PROCESSO DE REDEFINIÇÃO INSTITUCIONAL DA GESTÃO


PÚBLICA BRASILEIRA

No Brasil a década de 1980 foi marcada por profundas mudanças sociais,


políticas e econômicas, reflexos da intensa mobilização popular em busca da
democratização da gestão pública brasileira no qual se inicia fortes embates entre poder
estatal, movimentos sociais e organizações da sociedade civil, desencadeando-se uma
trajetória de lutas pela ampliação democrática, que visava assegurar a participação da
sociedade nos processos decisórios da gestão e controle dos recursos públicos e o inicio
do processo de ruptura com o poder autoritário e centralizado do regime militar (vigente
até então), intensifica-se esse ideário participativa, em que os mais diversos setores
organizados da sociedade buscavam construir formas e encontrar instrumentos capazes
de influenciar as administrações públicas no país.

Na Constituição Federal de 1988 encontram-se claros sinais da luta pela


democratização da gestão pública, quando nela se garantiu, por exemplo, o princípio da
gestão descentralizada e participativa. Nos artigos 204 e 227, a Carta Constitucional
assegura a participação da população, por meio de organizações representativas, no
processo de formulação e controle das políticas públicas em todos os níveis da gestão
administrativa (municipal estadual e federal). A Constituição apresenta ainda, outra
configuração da gestão das políticas públicas, instituindo novos mecanismos nos
processos de tomada de decisões, o que faz emergir um regime de ação pública
descentralizada, no qual são criadas formas inovadoras de interação entre governo e
sociedade, através de canais e estratégias de participação social, denominada de gestão
compartilhada. É, aliás, a instituição dessas novas formas de interação que sinaliza a
emergência de novos padrões de governo, baseados na gestão democrática, centrada em
três eixos fundamentais, como “a maior responsabilidade dos governos em relação às
políticas sociais e às demandas dos seus cidadãos; o reconhecimento dos direitos
sociais; e a abertura de espaços públicos para a ampla participação cívica da sociedade”
(SANTOS JÚNIOR, 2001, p. 228).

Com isso surgi às novas iniciativas de gestão democrática das políticas públicas,
com a introdução de reformas institucionais que visam ao fortalecimento da autonomia
dos municípios e ao estabelecimento de novos formatos de organização do poder local,
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vinculados à criação de parcerias entre o poder público e setores organizados da


sociedade civil.

Para garantir a participação popular de forma ordenada foram criados os


conselhos de direitos, também denominados conselhos de políticas públicas ou
conselhos gestores de políticas setoriais, são órgãos colegiados, permanentes e
deliberativos, incumbidos, de modo geral, da formulação, supervisão e da avaliação das
políticas públicas, em âmbito federal, estadual e municipal sendo definidos na
legislação ordinária para concretizar a participação e controle social preconizados na
Constituição Federal de 88. São organismos que articulam participação, deliberação e
controle do Estado. Suas características e atribuições são definidas na legislação
ordinária.

3. CONSELHOS DE DIREITOS

Os conselhos de direitos, independentemente do nível de atuação nacional,


estadual ou municipal são espaços nos quais o governo e a sociedade deve discutir
formular e decidir, de forma compartilhada e co-responsável, as diretrizes para as
políticas públicas de promoção e defesa dos direitos, portanto, executores de políticas,
são formuladores, promotores de políticas, defensores de direitos, controladores das
ações públicas governamentais e não-governamentais, normatizadores de parâmetros e
definidores de diretrizes das políticas na perspectiva da garantia dos direitos humanos,
sociais e políticos.

3.1 Os conselhos nacionais

Os conselhos nacionais devem estar vinculados administrativamente aos


Ministérios respectivos ao seu interesse temático e dos direitos. Deliberam sobre
questões no âmbito na política nacional e suas decisões devem ser parâmetros tanto para
os órgãos nacionais, quanto para estados e municípios. Os principais conselhos são:

Conselho Nacional dos Direitos do Idoso –(CNDI)


Conselho Nacional dos Direitos da Mulher –(CNDM)
Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência (CONADE)
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Conselho Nacional de Promoção da Igualdade Racial –(CNPIR)


Conselho Nacional de Combate à Discriminação (CNCD)
Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA)
Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH)

3.2 Os conselhos estaduais

A maioria dos conselhos estaduais dos direitos existentes no País foi criada nos
anos 1990, tendo como característica principal a participação expressiva da sociedade
civil e a independência perante o Poder Executivo de seus respectivos Estados. A
criação desses conselhos inspirou-se nos princípios da participação e descentralização,
estabelecidos na Constituição Cidadã de 1988, em cujos dispositivos estão previstos a
participação da cidadania representação da sociedade na gestão e fiscalização pública.

Criados por lei estadual estão vinculados administrativamente às Secretarias de


Estado das respectivas áreas temáticas ou de direitos e não devem estar sujeitos a
nenhuma subordinação hierárquica. Deliberam sobre questões no âmbito na política
estadual e suas decisões devem ser parâmetros tanto para os órgãos estaduais, quanto
para os municípios.

3.3 Os conselhos municipais

A criação de um conselho municipal dos direitos é uma medida voltada para


garantir uma esfera pública com representantes da comunidade local e dos órgãos
governamentais, para monitorar o impacto das políticas públicas na proteção e
efetivação dos direitos da pessoa humana, e, também, para investigar as violações de
direitos no território municipal.

O conselho deve ser criado por lei municipal e, para o exercício de suas
atribuições, não pode ficar sujeito a qualquer subordinação hierárquica. Deliberam sobre
questões no âmbito na política municipal e suas decisões devem ser parâmetros para os
órgãos municipais e para a execução das ações públicas governamentais e não
governamentais.
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4. PROJETOS DE AÇÃO SOCIAL

Merecem destaque, na década de 1990, devido à pressão e construção coletiva de


espaços de gestão, as áreas que envolvem políticas de defesa dos direitos da criança e do
adolescente, do idoso e da pessoa com deficiência. Através das novas leis criadas, como
o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e a Lei Orgânica da Assistência Social
(LOAS), essas políticas, marcadas tradicionalmente pelo paternalismo e clientelismo,
são redefinidas e alcançam formalmente caráter universal e democrático, submetidas ao
controle social, exercido por movimentos, entidades profissionais e outros
representantes da sociedade civil. Em outros termos, a participação da sociedade na
gestão das políticas públicas ganhou grande relevância com a criação e ampliação de
canais propositivos e deliberativos, como os fóruns e os conselhos gestores, surgindo,
então, duas novas denominações: participação cidadã e participação social (GOHN,
2001, p. 56).

O conceito de participação cidadã está baseado na universalização dos direitos


sociais, na ampliação da cidadania e numa nova compreensão sobre o papel e o caráter
do Estado, remetendo à definição das prioridades nas políticas públicas, a partir de um
debate também público. Assim, a participação passa a ser concebida como intervenção
social periódica e planejada, posto que se dá ao longo de todo o processo de formulação
e implementação de políticas públicas. A característica principal deste tipo de
participação é a tendência à institucionalização, entendida como inclusão no arcabouço
jurídico-institucional do Estado, a partir da criação e implementação de novas estruturas
de representações, compostas por pessoas eleitas diretamente pela sociedade civil e por
representantes do poder público.

O sentido da participação social está, por sua vez, fundado na idéia do


desenvolvimento de uma cultura cívica, que pressupõe comunidades atuantes,
compostas de organizações autônomas da sociedade civil, imbuídas de espírito público,
com relações sociais igualitárias e estruturas fincadas na confiança e na colaboração,
articuladas em redes horizontais.
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5. SAÚDE: A CONSTRUÇÃO DO SUS NOS TRÊS NÍVEIS

 
Constitucionalmente definiu-se o município como o responsável pela gestão de
serviços e ações de saúde no seu âmbito de abrangência, com a cooperação técnica e
financeira das demais esferas governamentais.

No decorrer da organização do sistema de saúde o princípio da descentralização


foi sendo cumprido, com ênfase na municipalização da saúde. Este processo foi
possível, sobretudo, pela crescente participação dos atores sociais e a organização e
mobilização dos gestores municipais, que passaram a ocupar espaços importantes no
processo de consolidação do SUS.

A transferência de responsabilidades e recursos para a esfera municipal passou a


exigir novas competências e capacidades político-institucionais do gestor local, além de
meios adequados à gestão de redes assistenciais de caráter regional e macro-regional, a
fim de permitir o acesso, a integralidade da atenção e a racionalização de recursos.
Assim, também ganha destaque neste processo a redefinição das funções dos gestores
estadual e federal, na medida em que se faz necessário uma qualificação do apoio e
cooperação aos municípios, com vistas à implementação de redes de atenção.

A viabilização do SUS, portanto, requer a instauração de processos de


concertação entre as três esferas de governo, a clara definição de competências comuns
e específicas de cada ente, uma adequada repartição dos recursos financeiros,
mecanismos mais efetivos à integração de ações e condições políticas para o exercício
de ações coordenadas e de cooperação.

A municipalização da saúde, entretanto, não foi acompanhada de uma


reorganização das funções do Ministério da Saúde e das secretarias estaduais de saúde
para fazer valer a responsabilidade de coordenação do sistema no âmbito dos estados,
denotando uma limitação político-institucional que dificultou o processo de
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reconstrução de serviços e práticas de saúde e requereu a constituição de novos espaços


e processos de gestão.

A constituição e funcionamento das Comissões Intergestores no âmbito estadual


(CIB) e nacional (CIT), a partir de 1993, tem desempenhado um papel decisivo na
negociação dos conflitos entre os gestores, viabilizando pactos importantes à
consolidação do SUS. Contudo, intensificaram-se os conflitos com os Conselhos de
Saúde que perceberam uma subtração de suas competências nesse processo de
pactuação.

5.1 Diretrizes

Superação do processo burocrático-normativo, que tem pautado a ordenação de


atribuições e responsabilidades no processo de habilitação à gestão de municípios e
estados, com vistas à formalização de contratos em que se explicitem responsabilidades,
objetivos e metas sanitárias socialmente construídas e passíveis de avaliação;

Instituição de processos permanentes de avaliação do desempenho do Sistema de Saúde


nas três esferas de governo;

Revisão dos mecanismos de alocação e repasse de recursos para reorientar a gestão e os


modelos de atenção vigentes;

Regulamentação do dispositivo constitucional que trata da destinação de recursos para o


setor, para precisar responsabilidades com o financiamento do sistema e definir as
modalidades do gasto sanitário;

Incentivo à participação cidadã e à utilização dos instrumentos legais disponíveis para o


controle social e efetivação de compromissos e responsabilidades entre os gestores, em
sintonia com as mudanças desejadas para a construção do “SUS que queremos”.

6. REFORMA NA EDUCAÇÃO

A partir do ano 1980, a educação teve significativo impulso, como resultado do


movimento dos educadores, da luta das entidades organizadas e da redemocratização do
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Estado Brasileiro decorrente da promulgação da Constituição Federal de 1988. Com


este marco decisivo na estruturação dessa instância de administração pública, os
municípios ampliaram gradativamente sua participação e passaram a ser reconhecidos
como entes federados e com novas responsabilidades na administração pública da
educação, antes da promulgação, existiam apenas o sistema federal e os sistemas
estaduais de educação. A partir deste ano, os sistemas municipais passaram a atuar em
regime de colaboração com os sistemas federais e estaduais, para o oferecimento da
educação escolar como direito subjetivo do cidadão.

Outros dois movimentos foram igualmente responsáveis pela ampliação e maior


participação dos municípios como atores no cenário educacional: as discussões sobre a
implantação da nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) e, a
vinculação dos recursos destinados à Educação Básica que resultaram na aprovação da
Lei 9394/96 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Estes dois novos marcos
legais, resultado de discussões, divergências, negociações e acordos, na maioria das
vezes não consensuais, ampliaram as responsabilidades e as possibilidades dos
municípios, na direção de organizarem seus sistemas de ensino, na medida em que a
LDB, e o FUNDEF (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental) estabeleceram diretrizes que exerceram um caráter indutor de
fortalecimento da municipalização do ensino e da gestão local.

A maior inovação do FUNDEF consiste na mudança da estrutura de


financiamento do Ensino Fundamental no País (1ª a 8ª séries do antigo 1º grau), ao
subvincular a esse nível de ensino uma parcela dos recursos constitucionalmente
destinados à Educação. A Constituição de 1988 vincula 25% das receitas dos Estados e
Municípios à Educação. Com a Emenda Constitucional nº 14/96, 60% desses recursos
(o que representa 15% da arrecadação global de Estados e Municípios) ficam reservados
ao Ensino Fundamental. Além disso, introduz novos critérios de distribuição e
utilização de 15% dos principais impostos de Estados e Municípios, promovendo a sua
partilha de recursos entre o Governo Estadual e seus municípios, de acordo com o
número de alunos atendidos em cada rede de ensino.
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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A partir das questões apontadas nessa pesquisa é possível iniciar uma discussão,
um processo de busca de partilha e de troca sobre as políticas e encaminhamentos dados
pelas autoridades à gestão publica nos seguimentos da ação social, saúde e educação
abordada neste trabalho. Sabemos que as concepções sobre ação social, saúde e
educação escolar estão diretamente articuladas às exigências do mundo atual, mas faz-se
necessário considerar os problemas e as situações do dia-a-dia nestes setores,
entendendo a realidade não como algo pronto e acabado, mas como um movimento que
extrapola os limites das instituições.

Nesse novo contexto os sujeitos coletivos presentes na gestão pública são co-
responsáveis na implementação de decisões e respostas às necessidades sociais. Como
afirma Carvalho (1999, p. 25), “não é que o Estado perca sua centralidade na gestão do
social, ou deixe de ser o responsável na garantia de oferta de bens e serviços de direito
dos cidadãos; o que se altera é o modo de processar esta responsabilidade”. Dessa
forma, a descentralização, a participação, o fortalecimento da sociedade civil
pressionam por decisões negociadas, por políticas e programas controlados por
organizações sociais, por uma relação de parceria..
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12. REFERÊNCIAS

ARRETCHE, M. T. S. Estado federativo e políticas sociais: determinantes da


descentralização. Rio de Janeiro: Revan, 2000.

BRASIL. Ministério da Educação. Constituição da República Federativa do Brasil.


Brasília: 1988.

CARVALHO, M. C. A. A. A participação social no Brasil hoje. São Paulo: Pólis,


1998.

DINIZ, Eli. Em busca de um novo paradigma: a reforma do Estado no Brasil dos anos
90. In: São Paulo em Perspectiva, vol. 10, n. 04. São Paulo: Sead, 1996.

FERNANDES, C. R. Privado, porém público: o terceiro setor na América Latina. Rio


de Janeiro. DUMARÁ, 1999, p. 19-125.

GOHN, M. G. Conselhos gestores e participação sociopolítica. São Paulo:


Editora Cortez, 2000.

SANTOS JÚNIOR, O. Alves dos. Democracia e governo local: dilemas e reforma


municipal no Brasil. Rio de Janeiro: Revan, 2001.

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