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“Esta gentil moça, pois ajudou a donzela, e entre ambas engenharam uma
cama suficientemente má para D. Quixote, num sótão, que dava visíveis
mostras de ter noutro tempo servido de palheiro muitos anos.”
(CERVANTES, 2002. p. 245)
Em anos onde a presença dos cavaleiros era necessária, muitas estalagens não
cobravam suas estadias, porém, ao analisar o trecho em destaque, pode-se observar que
o dono daquele lugar havia preparado um quarto as pressas para D. Quixote. A vontade
de lucrar era maior do que a preocupação com o lugar onde as pessoas passariam a
noite, logo o dono da estalagem pouco estaria visando o conforto e satisfação de seus
hóspedes.
Com o passar dos anos, muitos autores surgiram e conta-se com uma série de
escritores notáveis, como Thomas Mann, Virgínia Woolf, Franz Kafka, etc. O romance,
graças ao papel que representa desde o romantismo e com o auxílio de alguns escritores,
é a forma literária que mais agudamente testemunha a metamorfose verificada nas
atividades artísticas modernas.
Neste presente trabalho, pretende-se explorar e procurar entender que traços uma
obra detém para ser considerado um romance. Para isso, iniciaremos uma abordagem,
sob a luz da teoria de Massaud Moisés, do que seria um conto e uma novela para que
possamos entender a diferença entre eles, para então partimos com segurança para o
romance.
Conto
O fato de ter-se a existência de uma única ação ou conflito está ligado a um traço
importante do conto: ele “aborrece as digressões, as divagações, os excessos”
(MÓISES, 2006. Pag.41).
Massaud Móises explicita que a meta do conto “não consiste em criar seres vivos
a nossa imagem e semelhança, complexos e quiçá múltiplos”, esse seria a meta do
romance, mas criar conflitos em que o leitor possa se espelhar.
Novela
A novela geralmente é tida com aquela visão de ser uma história com mais de 100
páginas e menos que 200, mas essa concepção não se torna abrangente para explicar o
que seria uma novela de fato.
A novela ocupa uma posição menos relevante que a do conto e do romance. Ela
busca o deleite. Não se preocupa com o exame do dia a dia, o que nos leva à teoria de
Massaud Moisés quando diz que a novela contempla, finge e fantasia ao invés de
indagar, questionar ou interrogar.
Não é uma característica forte a profundidade dramática (o que cabe no romance e
pode estar presente no conto). Isso não significa que o novelista seja menor que
qualquer romancista, afinal há autores que podem e fizeram obras magníficas no gênero.
A Novela, portanto, como Massaud Móises afirma não busca recriar a realidade,
“mas uma realidade a partir dos dados que o mundo concreto lhe oferece”. Busca mais
gerar um novo mundo com base no universo concreto, o que lhe diferencia do conto e
principalmente do romance.
“Pode, mais do que o conto, a novela e a poesia [...] apresentar uma visão global
do mundo. Sua faculdade essencial consiste em recriar a realidade: não
fotografa, recompõe-na; não demonstra ou reduplica, reconstrói o fluxo da
existência com meios próprios, de acordo com uma concepção peculiar, única,
original.”
Era janeiro de 1939. Liesel tinha nove anos, logo faria dez.
Para tornar clara a diferença entre os três gêneros, podemos estabelecer através do
gráfico baixo uma alegoria:
Dentro de uma imensa cidade há um autor que decidiu escrever três textos com
estruturas diferentes. Primeiramente o escritor andou pela cidade e viu uma situação
interessante a se passar com um casal de idosos e decidiu se ocupar a retratar todo
aquele único conflito, aquele único momento daquele casal. Ao terminar, sabia,
escrevera um conto.
Mas a mente do autor voou longe e decidiu que aquela cidade tinha muita história
a contar. Definiu um protagonista e se pôs escrever uma história tentando contemplar
uma visão global do mundo que o cercava. Preceitos, Moral, Contexto, Profundidade,
buscou assim ele ao escrever o que ele sabia ser um romance.
O Romance em Bakhtin
O que podemos constatar no romance de Suzanne é a alusão que a autora faz com
nossa realidade em diferentes pontos da trama: a Capital, que contém todo o poder
perante os Distritos, explorando todo um povo, subjugando e rechaçando àqueles que
tentam ir contra seu poder, suas regras e suas leis.
O ‘Jogos Vorazes’, como forma de alienação da população da Capital e forma de
coerção para com a população dos Distritos. São Jogos televisionados para toda a
sociedade daquele território (que consistiria num País, atualmente), com crianças e
jovens levados a um estado animalesco para sua sobrevivência, cumprindo provas e
realizando atos que em nossas vidas particulares nós repudiamos.
Não é diferente do que ocorre atualmente, o Poder de toda uma nação centralizado
em um só país, com sua cultura, seus costumes e seu pensamento sendo impostos para
todo um povo alienado por reality-shows, jogos de futebol, promessas de governos
melhores, etc. Tais jogos sangrentos não diferenciam muito daqueles de gladiadores,
ocorridos na Antiguidade, onde a política do Pão e Circo era exercida com sucesso,
perante um povo carente e conseqüentemente, alienado.
"Por que sou egoísta. Sou covarde. Sou o tipo de garota que, mesmo
podendo ser claramente útil em alguma coisa, fugiria para continuar viva e
deixaria para trás para sofrer e morrer aqueles que não tinham como segui-la.
Essa é a garota com que Gale se encontrou hoje na floresta. Não é surpresa
nenhuma eu ter vencido os Jogos. Nenhuma pessoa decente jamais consegue
essa proeza“
(COLLINS, Suzanne.Em Chamas, 2008 – Pág. 12)
Lukács, como filósofo nos expõe sua teoria sobre o Romance em configurações
baseadas em teóricos filósofos e concepções mais objetivas do que as de Bakhtin.
No romance, o retrato da busca pela sua essência é latente no personagem. Ele irá
retratar a busca pela totalidade do ser; assim como Bakhtin nos expõe sobre o
personagem inacabado, Lukács também teoriza sobre esse personagem ‘desconstruído’,
que no romance, busca pela sua forma total. Não significando, porém, que esse
personagem irá conseguir tal ato.
O personagem no romance, para Lukács, irá representar toda uma vida típica de
sua sociedade e do seu período histórico, mas ao mesmo tempo irá ser um uno, um
personagem ainda com suas singularidades. O personagem concentra em si as tensões e
contradições do mundo em que vive, porém, ele traz uma problemática que permeia sua
vida, sendo esta característica o seu singular, o seu diferencial.
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GALLO, Renata Altenfelder G. Considerações acerca da concepção de romance nos escritos
"A Teoria do Romance" (1914-15) e "O Romance como epopeia burguesa". Pg. 380.
O Personagem no Romance
Dada esta primeira identificação, o teórico Massaud Moisés assinala ainda que é
necessário classificar as personagens independente de sua importância na trama. De
acordo com seu argumento, dois protagonistas podem divergir bastante, agindo em
planos diferentes, apesar de assumirem o mesmo papel hierárquico no desenrolar da
trama.
Desse modo, Massaud apresenta os personagens tipo e/ou caricaturas. Este tipo
de personagem é moldada por seu ambiente social, recebe dele seus modos de
linguagem, gestos, hábitos, comportamento e até mesmo a maneira de pensar e sentir,
por isso tem uma individualidade um tanto precária ou quase inexistente. Massaud
Moisés defende que o tipo define-se por sua característica distintiva levada ao extremo,
diferenciando-o; por isso não se pode considerá-lo completamente não individualizado.
Esse tipo de personagem geralmente funciona como uma espécie de índice social.
(ROWLING, J. K - pág. 7)
“são, por assim dizer, quimicamente puros; eis porque são frequentemente
tônicos, mesmo intoxicantes. Seu realismo é marcado pela intensidade,
singularidade, vivacidade.”
Na série de livros Harry Potter J.K apresenta muitos personagens que oscilam
entre a vilania (mesmo que parcial) e o heroísmo, mas aqui darei mais destaque ao
personagem Severo Snape, em que essa oscilação está mais presente. Desde o início,
Severo tem todos os traços e personalidade de um ser perverso:
(ROWLING, J. K. – pág. )
MÓISES, Massaud. A Criação Literária – Prosa 1. 20. ed. Editora Cultrix, São Paulo,
2006.