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Revista virtual EFArtigos - Natal/RN - volume 02 - número 07 - agosto - 2004

MUSCULAÇÃO NA GRAVIDEZ

Allan José Silva da Costa *

Introdução

A prática de atividades físicas por mulheres grávidas sempre se constituiu em um assunto


bastante divergente. Historicamente, muitas dúvidas e questões foram levantadas sobre o
tema, já que as gestantes apresentavam preocupações quanto a ocorrência de nascimentos
prematuros, receios de abortos, baixo desenvolvimento do feto, lesões musculoesqueléticas,
entre outras, em função da prática de exercícios. Hoje em dia, sabe-se que estas
preocupações não devem existir em uma gestação sadia, pois pesquisas recentes
demonstraram que a participação regular de grávidas em um programa de atividades físicas
pode melhorar o condicionamento fisiológico das mães, restringir o ganho de peso sem
comprometer o desenvolvimento do feto e ainda facilitar a recuperação pós-parto (Artal,
Clapp e Vigil, 2000).

Mesmo sabendo dos benefícios que a prática regular de atividades físicas pode trazer à
mulher grávida, alguns cuidados devem ser adotados durante a prescrição dos exercícios no
sentido de promover uma completa adequação as condições específicas apresentadas pela
gestante. Neste contexto, alguns importantes fatores devem ser considerados. São eles:
segurança, meio ambiente e tipo de exercício.

Em relação a segurança, Foss e Keteyian (2000) apontam algumas importantes


recomendações que devem ser adotadas. A primeira delas afirma que os exercícios nas
posições supina (barriga para cima) e pronada (barriga para baixo) devem ser evitados após
o primeiro trimestre de gravidez, pois tais posições estão associadas com uma possível
redução no débito cardíaco na maioria das mulheres. Atividades que resultem em riscos de
perda de equilíbrio, traumatismo abdominal e fadiga física (exaustão completa) também
não são recomendadas. Já em referência ao meio ambiente, Artal, Clapp e Vigil (2000)
destacam a importância de praticar atividades em ambientes que apresentem temperatura
moderada, pois assim evita-se o estresse físico e a perda excessiva de líquidos corporais.
Neste sentido, as mulheres grávidas que se exercitam devem garantir uma boa dissipação de
calor por meio de hidratação adequada e de vestimentas caracterizadas por roupas leves
(Foss e Keteyian, 2000).

O tipo de atividade física talvez seja o fator mais importante a ser considerado na
prescrição de exercícios para gestantes. A escolha da atividade deve ser precedida por uma
avaliação médica, para que somente assim haja a segurança correta. Após a aprovação do
médico especializado, a mulher grávida deve ingressar em atividades que lhe garantam
prazer e bem estar, assim como também em atividades que apresentem baixo risco.
Segundo Matsudo e Matsudo (2000), as atividades físicas para gestantes podem ser
classificadas em três tipos: atividades de baixo risco, atividades de médio risco e atividades
desfavoráveis. O primeiro tipo refere-se aos exercícios mais convenientes e benéficos para
a gestante, pois comportam pequenos riscos tanto para a mãe quanto para o bebê. Incluem-
se neste grupo a caminhada, ciclismo em bicicleta ergométrica, a natação e a hidroginástica
leve. As atividades de médio risco são aquelas que podem ser praticadas pela mulher
grávida, porém quando tomadas certas precauções; ginástica aeróbia, musculação e os
esportes de raquete (tênis, squash) estão incluídos neste grupo. Por fim, temos as atividades
desfavoráveis, que são totalmente contra indicadas para todas as mulheres em gestação.
Neste grupo estão as atividades de esportes de contato físico ou de grande probabilidade de
trauma, entre as quais podemos destacar o voleibol, basquetebol, esqui aquático, ginástica
de alto impacto e hipismo (Matsudo, 2004).

O presente trabalho dará ênfase sobre uma das atividades citadas anteriormente: a
musculação. Nosso objetivo principal será apresentar, através de uma revisão de literatura,
considerações levantadas a respeito da prática da musculação durante a gestação, com
enfoque especial sobre os efeitos orgânicos na saúde da gestante e no crescimento fetal.

Para que o objetivo geral acima citado seja atingido, alguns objetivos específicos foram
delimitados. São eles: apresentar as principais adaptações fisiológicas em repouso que
ocorrem com a gravidez, verificar as prescrições de cargas corretas para o trabalho de
musculação com gestantes, analisar as contra indicações da musculação durante a gravidez
e apresentar os principais benefícios biológicos e psicológicos que podem resultar da
prática de musculação para mulheres grávidas.

Ao atingir os objetivos acima propostos, acreditamos estar dando contribuições


significativas para a disseminação do conhecimento metodológico a respeito do tema
"Musculação na gravidez", visto que constatamos existir um número reduzido de pesquisas
científicas na área. Estas contribuições representam, então, a principal justificativa para a
realização de um trabalho acadêmico com a presente temática.

Assim sendo, iniciaremos a seguir nossa explanação abordando a análise conceitual do


estado de gravidez, enfatizando primariamente as principais adaptações fisiológicas que
resultam deste estado físico da mulher.

1. Análise conceitual de gravidez

A gravidez consiste em um fenômeno biológico que compreende todo o período de


gestação da mulher, o qual se inicia no ato da fecundação do óvulo e se encerra nove meses
depois, através do processo de parturição.

Normalmente, a gravidez é dividida em 3 períodos. O primeiro deles compreende os três


meses iniciais de gestação, sendo caracterizado por uma verdadeira "revolução hormonal"
no organismo da mulher, o que leva à ocorrência de enjôos, sonolência, tontura e humor
oscilante. Segundo Guyton (1988), este período também é fundamental para o crescimento
e o desenvolvimento do bebê, pois é onde se desenvolvem as estruturas básicas de todos os
órgãos fetais. Por este motivo, uma dieta balanceada que atenda as quatro leis nutricionais
(quantidade, qualidade, harmonia e adequação biológica), aliada a hidratação adequada e ao
descanso assumem papel fundamental na vida da gestante e do feto em crescimento. O
segundo e terceiro períodos - 3 a 6 meses e 6 a 9 meses, respectivamente - representam o
espaço de tempo caracterizado pelas modificações significativas no corpo da mulher. De
acordo com Artal, Clapp e Vigil (2000), ocorre ganho de massa corporal localizada na
região do abdômen e da pelve, o que faz alterar a postura e o centro de gravidade da
gestante. Assim, atividades que necessitem do equilíbrio e da agilidade podem se tornar
mais difíceis devido a mudança de distribuição de massa corporal. Nestes períodos a
mulher se sentirá mais disposta e poderá seguir seu programa de exercícios físicos até o fim
da gravidez, desde que respeite seus limites e a prática lhe esteja sendo prazerosa.

Durante a gestação inúmeras adaptações fisiológicas e anatômicas são induzidas pelo


fenômeno da gravidez, e devem ser levadas em conta durante o planejamento e prescrição
das atividades físicas. Segundo Foss e Keteyian (2000), estas adaptações incluem
modificações cardiovasculares, respiratórias, termorreguladoras, metabólicas hormonais e
bioquímicas.

Dentre as alterações metabólicas, podemos destacar como importante para o exercício


físico o aumento do metabolismo em cerca de 5% a 10% que ocorre na grávida em repouso,
sendo que grande parte deste aumento é derivada da maior necessidade nutricional para o
correto desenvolvimento do feto. Portanto, ao programar atividades físicas, o profissional
deverá considerar os efeitos metabólicos da prática, principalmente em relação aos níveis
de glicose sanguínea, pois se sabe que em exercícios extenuantes e prolongados a gestante
pode sofrer hipoglicemia mais rapidamente, e esta resposta hipoglicêmica observada
principalmente no terceiro trimestre de gravidez pode levar a efeitos potencialmente
adversos ao feto (Matsudo e Matsudo, 2000). Esta é uma das causas que levam à
recomendação geral de exercícios leves e moderados no período de gestação.

Outra justificativa para a prescrição de exercícios de baixa intensidade refere-se as


adaptações cardiovasculares que resultam da gravidez. Estas adaptações incluem o aumento
da freqüência cardíaca de repouso e do volume de ejeção, levando como conseqüência o
aumento no fluxo sanguíneo em direção ao útero e ao feto. Em atividades de intensidade
muito elevada, ocorre redistribuição seletiva de sangue aos músculos funcionalmente mais
utilizados, com redução aos órgãos esplâncnicos, ao útero e ao feto. Esta redução do fluxo
sanguíneo em direção ao feto ocasionada pela atividade física praticada de forma
excessivamente intensa, pode chegar a produzir hipóxia ou asfixia fetal (idem).

Assim sendo, podemos perceber ser de fundamental importância para o profissional de


Educação Física o conhecimento a respeito de todas as adaptações fisiológicas e anatômicas
que resultam da gravidez, pois são estas modificações orgânicas que delimitarão as
características que o exercício deve apresentar ao ser prescrito.

Abaixo estão representadas resumidamente as principais alterações fisiológicas em repouso


que se manifestam na mulher grávida.

Cardiovasculares
• Aumento no débito cardíaco de repouso de até 50 %
• Aumento no volume sanguíneo circulante
• Aumento no tamanho diastólico terminal do ventrículo esquerdo
• Aumento na freqüência cardíaca de repouso e no volume de ejeção
• Aumento no fluxo sanguíneo em direção ao útero

Pulmonares
• Aumento na ventilação-minuto acarretando uma ligeira queda na PCO2 arterial
• Aumento no volume corrente

Outras
• Aumento no VO2 em repouso, aproximando-se no terceiro trimestre de 30% acima dos
valores das mulheres que não estão grávidas
• Aumento nos hormônios estrogênios e relaxina
• Aumento no peso corporal total de 10-14 kg
• Aumento no dispêndido energético em repouso em aproximadamente 150 kcal/dia durante
o primeiro trimestre e de aproximadamente 350 kcal/dia durante o segundo e terceiro
trimestres.

Quadro 01 - alterações fisiológicas em repouso que se manifestam na mulher grávida


(adaptado de Foss e Keteyian, 2000)

2. Prescrições do trabalho de musculação na gravidez

A musculação pode ser definida como sendo a utilização de exercícios contra resistência
objetivando atuar nos ambientes competitivo, profilático, terapêutico, recreativo, estético e
de preparação física (Bittencourt, 1986). Segundo Santarém (2000b), o trabalho de
musculação pode ser realizado através de dois tipos de sobrecarga: tensional e metabólica.
A sobrecarga tensional representa o grau de tensão que ocorre nos músculos durante a
contração, e do ponto de vista prático é dada pela carga de trabalho; quanto maior for a
carga, maior será a sobrecarga tensional. Já a sobrecarga metabólica representa a solicitação
acentuada dos processos de produção de energia, principalmente a partir da glicólise
anaeróbia. Do ponto de vista prático é dada pelo alto número de repetições e pelo intervalo
curto entre as séries.

O trabalho de musculação na gravidez talvez se constitua no assunto de maior controvérsia


dentro da área de atividades físicas para grupos especiais, já que o número de pesquisas
científicas publicadas ainda é muito pequeno. Batista et al. (2003), por exemplo, indicam a
musculação como uma atividade não recomendada para gestantes, ao ponto que Artal,
Clapp e Vigil (2000) e Matsudo (2004) apontam esta atividade física como sendo de médio
risco, porém podendo ser praticada desde que sejam adotadas certas precauções.

Em relação aos efeitos da prática de musculação sobre a gestante, as controvérsias


continuam existindo. Batista et al. (2003) indicam a existência de riscos tais como lesões
ósteo-musculares, diminuição do fluxo sanguíneo à placenta e conseqüentemente ao feto,
aumento excessivo da temperatura corporal, entre outros. Por outro lado, Matsudo e
Matsudo (2000) afirmam que a musculação proporciona fortalecimento muscular à grávida,
deixando-a mais hábil para tolerar o seu peso corporal, realizar as atividades do dia-dia,
melhorar a postura e evitar uma das principais queixas da gravidez: a lombalgia.

Após uma extensa revisão bibliográfica, acreditamos que o trabalho de musculação para
gestantes pode sim ser realizado, porém somente quando é utilizado com objetivos
recreativos, ou seja, quando representa uma forma de lazer através do exercício com pesos
(Bittencourt, 1986). A prática de atividades resistidas que visa o aperfeiçoamento da
preparação física desportiva e da capacidade competitiva deve ser desencorajada entre as
gestantes, já que a gravidez não é o momento apropriado para competições sérias de alto
nível de rendimento.

Assim sendo, a prescrição dos exercícios de musculação para mulheres grávidas, segundo
Matsudo e Matsudo (2000), deve privilegiar o treinamento com número de repetições em
torno de 10, com estimulação de 10-15 grupos musculares, duas vezes por semana. A
recuperação das fontes energéticas entre cada exercício deve ser completa e a intensidade
das cargas deve ser bastante moderada; algo em torno de 1,5 a 2,5 Kg.

Uma forma bastante simples e correta de controlar a intensidade das cargas é através da
escala de percepção de esforço subjetivo proposta por Borg (1998). No trabalho de
musculação com gestantes, os valores devem variar entre 9 e 11 nesta escala, o que
corresponde a atividades com estímulos de carga muito leves e leves, respectivamente (ver
quadro 02).

Tradicionalmente, a escala de Borg vem sendo utilizada somente para a avaliação e


controle da intensidade em exercícios de características aeróbias. Porém, não existe nada na
literatura pesquisada que impeça tal recurso de também ser utilizado em atividades de força
muscular, tais como os exercícios resistidos característicos da musculação, daí a
justificativa para a sua utilização em trabalhos com gestantes.

A seguir, a escala de Borg está representada no quadro 02 para que haja melhor
entendimento sobre o assunto em discussão.

06
07 Extremamente leve
08
09 Muito leve
10
11 Leve
12
13 Moderadamente forte
14
15 Forte
16
17 Muito forte
18
19 Extremamente forte
20
Quadro 02 - escala de percepção de esforço subjetivo
(adaptado de Borg, 1998)

Quanto a respiração, o melhor método na prática da musculação para gestantes é o método


continuado, onde a praticante executa o movimento sem se preocupar com os momentos de
inspiração e expiração; ela respira normalmente como se estivesse fazendo uma atividade
rotineira do dia-dia. Já a "Manobra de Valsalva" (apnéia respiratória) não deve ser realizada
pela grávida durante a execução dos exercícios.

3. Situações que contra-indicam a prática da musculação na gravidez

No trabalho de musculação existem algumas situações específicas que devem ser evitadas
quando os exercícios são realizados por uma mulher grávida, sob pena de colocar a mesma
em riscos potencialmente prejudiciais. Estas situações contra-indicam a prática da
musculação na gestação, e por este motivo devem ser estudadas detalhadamente pelos
profissionais de Educação Física que trabalham na área.

A primeira situação refere-se aos tipos de respiração durante a execução dos exercícios de
musculação. Neste contexto, as respirações do tipo bloqueada e combinada não devem em
hipótese alguma ser aplicadas no trabalho com gestantes. O primeiro tipo é aquele em que a
praticante, antes de iniciar o movimento, inspira, realiza os movimentos concêntrico e
excêntrico, e só depois expira o ar, ou seja, ela bloqueia a circulação de oxigênio durante
toda a execução do movimento; já a respiração combinada é aquela em que a praticante,
antes de iniciar o movimento, inspira, realiza o movimento concêntrico e expira durante a
realização do movimento excêntrico. Tanto uma quanto a outra envolvem a chamada
"Manobra de Valsalva", a qual provoca aumento do percentual isométrico da atividade, o
que conduz a uma elevação da resistência periférica na passagem sanguínea, fazendo com
que a pressão arterial apresente-se mais alta, tendo como conseqüência uma solicitação
cardíaca maior e uma elevação da freqüência cardíaca. Em outras palavras, os tipos de
respiração anteriormente descritos provocam sobrecarga ao coração e problemas de
circulação sanguínea, principalmente no que se refere a obstrução do retorno venoso,
sendo, portanto, não recomendadas para a prática com gestantes, já que estas devem
apresentar uma circulação sanguínea estável para proporcionar um fluxo de sangue
adequado ao feto em desenvolvimento.

Outra situação que contra-indica a musculação na gravidez é a aplicação de altas


sobrecargas tensionais, representadas pelas cargas bastante elevadas. Nesta situação a
praticante corre o risco de ser levada à fadiga e à exaustão, podendo, a partir daí, ser
acometida por lesões musculoesqueléticas, aumento excessivo da temperatura corporal,
diminuição do fluxo sanguíneo à placenta e, conseqüentemente, ao feto, pois o sangue é
redistribuído em direção a musculatura funcional que está sendo mais requisitada no
momento.
Uma terceira situação que podemos apontar como contra-indicante da musculação na
gravidez é a aplicação de exercícios em posições supinada (barriga para cima) e pronada
(barriga para baixo) após o primeiro trimestre de gestação (Artal, Clapp e Vigil, 2000). Esta
situação é contra-indicada porque tais posições estão relacionadas com uma redução no
débito cardíaco e possível obstrução do retorno venoso (Foss e Keteyian, 2000),
dificultando a circulação sanguínea. Deste modo, exercícios como o supino reto com pés
apoiados no chão, crucifixo com pés apoiados no chão, leg press, entre outros, não são
recomendados. Além desta possível dificuldade provocada ao sistema circulatório, existem
também os riscos de acidentes que podem ocorrer devido ao fato dos implementos
(halteres, barras etc) estarem sendo utilizados próximos a região abdominal, podendo gerar
algum tipo de traumatismo sobre a mesma.

Além das situações práticas do dia-dia, existem também algumas situações de saúde que
contra-indicam a prática da musculação na gravidez. Baseados em Artal, Wiswell,
Drinkwater e Jones (1991), podemos dividir estas situações de contra indicações em dois
tipos: absolutas e relativas.

As situações de saúde que contra-indicam de forma absoluta os exercícios de musculação, e


outras atividades físicas, na gestação incluem risco de parto prematuro, suspeita de estresse
fetal, gestação múltipla, doenças miocárdicas, entre outras. Já as situações de contra-
indicação relativa incluem falta de controle pré-natal, diabetes mellitus, obesidade
excessiva ou baixo peso extremo, entre outras.

A seguir estão resumidas as principais situações de saúde que representam contra-


indicações absolutas e relativas para a prática da musculação e de outras atividades físicas
durante a gravidez.

Situações de saúde: contra-indicações absolutas


• Doenças miocárdicas
• Suspeita de estresse fetal
• Insuficiência cardíaca congestiva
• Enfermidade hipertensiva grave
• Enfermidade cardíaca reumática
• Macrossomia
• Tromboflebite
• Retardo de crescimento intra-uterino
• Embolismo pulmonar recente
• Gestação múltipla
• Enfermidade infecciosa aguda
• Risco de parto prematuro

Situações de saúde: contra-indicações relativas


• Falta de controle pré-natal
• Hipertensão arterial essencial
• Diabetes mellitus
• Obesidade excessiva ou peso baixo extremo
• Anemia e outras alterações sanguíneas
Quadro 03 - situações de saúde que representam contra-indicações absolutas e relativas
para a prática da musculação e de outras atividades físicas durante a gravidez
(adaptado de Artal, Wiswell, Drinkwater e Jones, 1991)

Aliado a estas situações contra-indicantes, o American College of Obstetricians and


Gynecology (2003) indica alguns sintomas que sinalizam para a interrupção imediata do
programa de exercícios. Dentre estes sintomas podemos destacar a perda de líquido
amniótico, dores no peito, contrações uterinas, hemorragia vaginal, enxaqueca, dispnéia,
edema, dores nas costas ou na zona do púbis, fraqueza muscular, tontura e redução dos
movimentos do feto.

4. Benefícios ocasionados pela musculação na gravidez

Assim como qualquer outra atividade física, a musculação proporciona diversos benefícios
à gestante, porém desde que os exercícios sejam prescritos de forma individualizada e com
cargas adequadas. De acordo com Matsudo e Matsudo (2000), tais benefícios podem ser
divididos em dois tipos: biológicos e psicosociais. Os benefícios biológicos incluem as
alterações físicas, fisiológicas, posturais, entre outras, sendo representados pelos principais
efeitos orgânicos dos exercícios sobre a gestante (O'Toole, 2003). Já os benefícios
psicosociais incluem as alterações de comportamento e sensações, exercendo influência
direta sobre as atitudes da mulher grávida durante a gestação.

Dentre os benefícios biológicos, podemos destacar o que Santarém (2000a) denomina de


independência funcional, ou seja, a capacidade de realizar as atividades desejadas do dia-
dia sem colocar em risco a integridade física do organismo. Como sabemos, a gestante pode
vir a apresentar algumas limitações em virtude das adaptações fisiológicas resultantes da
gravidez. Entretanto, a prática adequada da musculação pode minimizar os efeitos destas
possíveis limitações, pois proporciona o fortalecimento muscular e deixa a mulher grávida
mais hábil para tolerar a sua massa corporal aumentada, alterar o centro de gravidade e
realizar as atividades do dia-dia sem riscos nenhum para sua integridade e para a
integridade do bebê, atingindo um bom nível de independência funcional e,
conseqüentemente, uma boa qualidade de vida.

Outro benefício biológico importante refere-se a redução e prevenção da lombalgia, talvez


a principal queixa da gravidez. Com o fortalecimento muscular proporcionado pela
musculação, a grávida consegue minimizar os efeitos da hiperlordose que geralmente surge
durante a gestação, em função da expansão do útero na cavidade abdominal e o
conseqüente desvio do centro gravitacional (Batista et al, 2003). Nestes casos, os exercícios
de musculação proporcionam alterações que contribuem significativamente para a
adaptação a nova postura física, levando ao aprendizado de uma boa atitude postural.

Um terceiro benefício biológico que podemos analisar consiste na menor duração da fase
ativa do parto. Neste contexto, Matsudo (2004) indica que os exercícios que promovem o
fortalecimento, alongamento e relaxamento dos músculos que são utilizados no processo de
parturição, podem facilitar a chegada do bebê, auxiliando a gestante no momento do parto e
contribuindo para sua recuperação no período pós-parto, diminuindo assim os riscos de
complicações obstétricas.

Em relação aos benefícios psicosociais, podemos citar como de fundamental importância o


fato de que a musculação, quando praticada no ambiente recreativo, geralmente envolve
atividades em grupo, onde as integrantes apresentam idéias e sentimentos bastante
semelhantes. Isto faz com que a gestante apresente uma diminuição das sensações de
isolamento social e de estresse, o que, conseqüentemente, também diminui os riscos de
depressão durante a gravidez.

Mais um benefício no contexto psicosocial refere-se ao aspecto estético proporcionado pela


musculação. Sabe-se que a gravidez é um período onde ocorre ganho significativo de massa
corporal e adiposidade materna, geralmente acompanhado de uma situação de flacidez
muscular. Ao praticar a musculação, a gestante consegue obter o desenvolvimento da
tonicidade e da mobilidade muscular, além também de conseguir atingir um menor ganho
de massa corporal e adiposidade. Isto faz com que a mulher grávida apresente melhoria da
auto-imagem e auto-estima, o que só faz aumentar sua sensação de bem estar.

Enfim, os benefícios são múltiplos e mais variados possíveis. Abaixo segue um pequeno
quadro resumindo todos estes benefícios proporcionados pela musculação e demais
atividades físicas, sejam eles biológicos ou psicosociais.

Benefícios biológicos
• Maior nível de independência funcional
• Prevenção da lombalgia
• Menor duração na fase ativa do parto
• Menor ganho de massa corporal e adiposidade materna
• Diminuição de complicações obstétricas
• Melhoria da capacidade física
• Diminuição da incidência de cesárea
• Menor tempo de hospitalização
• Menor risco de parto prematuro

Benefícios psicosociais
• Melhoria da auto-imagem
• Melhoria da auto-estima
• Melhoria da sensação de bem estar
• Diminuição da sensação de isolamento social
• Diminuição da ansiedade
• Diminuição do estresse
• Diminuição do risco de depressão

Quadro 04 - benefícios proporcionados pela musculação e demais atividades físicas


(adaptado de Matsudo, 2004)

Conclusão

O objetivo principal de nosso estudo consistiu na realização, através da revisão


bibliográfica, de uma análise a respeito da prática da musculação durante a gestação, com
enfoque especial sobre os efeitos orgânicos na saúde da gestante e no crescimento fetal.
Acreditamos que tal objetivo tenha sido atingido, do mesmo modo como também
acreditamos que a realização do presente trabalho contribuiu de forma significativa para a
consolidação do aprendizado científico sobre o tema "Musculação na gravidez".

Perante a literatura pesquisada, verificamos que a musculação não se constitui em uma das
atividades físicas mais recomendadas pelos profissionais de saúde durante a gravidez,
sendo classificada como uma prática de médio risco para a gestante. A hidroginástica,
caminhada, natação e outras atividades de características predominantemente aeróbias, são
as atividades priorizadas e normalmente recomendadas para mulheres grávidas. No entanto,
verificamos também que a musculação, quando ambientada em um contexto recreativo e
com prescrições adequadas de cargas, pode proporcionar importantes benefícios à gestante.

Deste modo, podemos concluir que a prática da musculação, quando prescrita


adequadamente, não modifica a duração da gestação, não prejudica o desenvolvimento do
feto e muito menos induz a ocorrência de abortos espontâneos, como muitas mulheres
temem, o que só vem a ressaltar sua importância na manutenção da saúde materna e do bem
estar do feto. De qualquer modo, devido ao número bastante limitado de pesquisas
científicas publicadas na área, sugerimos que outros estudos sejam realizados com o
objetivo de analisar de forma mais aprofundada os efeitos da atividade de musculação sobre
a mulher em gestação.

Referências bibliográficas

1) AMERICAN COLLEGE OF OBSTETRICIANS AND GYNECOLOGY. Exercise


during pregnancy and the post partum period. Clin obst gynecol, 2003.

2) ARTAL, Raul., CLAPP, James F., VIGIL, Daniel V. Exercícios durante a gravidez:
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Baltimore: Williams e Wilkins, 1991.

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nutrição esportiva, 23 ed, mar. 2004.

9) MATSUDO, V.K.R., MATSUDO, S.M.M. Atividade física e esportiva na gravidez. In:


TEDESCO, J.J. A grávida. São Paulo: atheneu, 2000.

10) O'TOOLE, M. L. Physiologic aspects of exercise in pregnancy. Clin obst gynecol,


2003.

11) SANTARÉM, José Maria. Atualização em exercícios resistidos: exercícios com pesos e
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http://www.saudetotal.com/saude/musvida/pesos.htm . Acesso: 16 jul. 2004.

12) SANTARÉM, José Maria. Hipertrofia muscular: aptidão física, saúde e qualidade de
vida. [on line] Disponível na Internet. URL: http://www.saudetotal.com/saude/hptrofiq.htm.
Acesso: 16 jul. 2004.

Nota: * Acadêmico de Educação Física pela UFRN

Resumo

A prática de atividades físicas por mulheres grávidas sempre se constituiu em um assunto


bastante divergente. Historicamente, muitas dúvidas e questões foram levantadas sobre o
tema, já que as gestantes apresentavam preocupações quanto a ocorrência de nascimentos
prematuros, receios de abortos, baixo desenvolvimento do feto, lesões musculoesqueléticas,
entre outras, em função da prática de exercícios. Hoje em dia, sabe-se que estas
preocupações não devem existir em uma gestação sadia, pois pesquisas recentes
demonstraram que a participação regular de grávidas em um programa de atividades físicas
pode melhorar o condicionamento fisiológico das mães, restringir o ganho de peso sem
comprometer o desenvolvimento do feto e ainda facilitar a recuperação pós-parto (Artal,
Clapp e Vigil, 2000). O presente artigo dará ênfase sobre o tema "Musculação na gravidez".
Nosso objetivo principal será apresentar, através de uma revisão de literatura,
considerações levantadas a respeito da prática da musculação durante a gestação, com
enfoque especial sobre os efeitos orgânicos na saúde da gestante e no crescimento fetal.

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