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17º ENCONTRO INTERNACIONAL

DE MÚSICA E MÍDIA

CADERNO DE RESUMOS
17º Encontro Internacional de Música e Mídia
Centro de Estudos em Música e Mídia
Caderno de resumos

Coordenação: Heloísa de A. Duarte Valente.


Comitê Científico e organização: Diósnio Machado Neto, Fernando Magre, Raphael F.
Lopes Farias, Ricardo Santhiago e Thiago Cazarim.
Equipe técnica: Daniel Trevisan de Araújo, Felipe Tavares da Silva, Fernando Pedro
Moraes.
Arte: Roberto Bispo e Fernando Magre.
Tradução: SaraTomazeli Monrroe.

Contato:
musimid17@gmail.com
facebook.com/musimid
@musi.mid

Apoio:

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Dia 15/09

https://youtu.be/ofwd0U3F4WY

https://youtu.be/2ja__WCuelo

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Magali Kleber

Os projetos sociomusicais: um fato social total no fluxo espiral de rosas e espinhos

Três perspectivas que têm como argumento central a visão de que as práticas
musicais são fruto da experiência humana vivida concretamente em uma
multiplicidade de contextos conectados. A primeira parte de uma visão cultural da
música proposto por Shepherd e Wicke (1997) cuja teoria que reconhece a
constituição social e cultural da música como “um particular e irredutível forma de
expressão e conhecimentos humanos”. A segunda perspectiva inspira-se nos
estudos do antropólogo Marcel Mauss (2003) sobre fenômenos sociais, analisando
o processo pedagógico-musical como um “fato social total”, enfatizando-o seu
caráter sistêmico, estrutural e complexo, portanto pluridimensional. A terceira
perspectiva diz respeito à produção do conhecimento musical analisado à luz da
teoria da práxis cognitiva cunhada por Eyerman e Jamison (1998). Essa teoria
permite analisar a produção de conhecimento sociomusical das ONGs como fruto
da dinâmica das forças sociais que abrem espaços para a produção de novas
formas de conhecimento. Não obstante os projetos sociais terem conseguido
resultados positivos promovendo acesso a atividades culturais, esportivas e de lazer
ao jovem morador de comunidades pobres, possibilitando alternativas, há que se ter
uma perspectiva crítica para uma análise dos processos decorrentes das ações
políticas para se pensar em encaminhamentos que resultem, de fato, a inclusão
social sem ter no seu reverso a estigmatização tácita. Novaes (2002) faz um alerta
bastante pertinente quando destaca que “ter parceiros para tirar do crime é uma
expressão bem intencionada, mas ela também potencializa uma capacidade de
estigmatizar toda uma geração, como se todos fossem para o crime, todos fossem
criminosos em potencial” (NOVAES, 2002). E isso aparece como algo muito
incomodativo e, até mesmo, motivo de sofrimento para os jovens moradores das
favelas ou bairros com fama de violentos. Cabe aqui questionar a equação entre a
discriminação, a exclusão social, a violência urbana, o estigma permeando as
comunidades dos morros e favelas reforçados pelo discurso da mídia. Qual é o papel
dos projetos sociais e da cultura, especialmente da música, nesses contextos?

Paulo Costa Lima

A celebridade e a flor (a flor da celebridade)

Em sua biografia de Freud, Emilio Rodrigué registra uma época de cores mais
vibrantes e sonhadoras, antecedendo os ensaios O Futuro de uma Ilusão e O mal
estar na civilização — 1927 e 1929, respectivamente —, traduzida, por exemplo, por
uma afirmação feita por Freud em carta a Jung de 13 de janeiro de 1910: “Estou
convencido de que a bandeira da psicanálise deve tremular sobre o território da vida
amorosa normal”. Rodrigué arremata (1995, p. 239): “Freud, alguma vez, acreditou
numa revolução erótica universal”. Essa expressão é muito interessante,
embora relativamente pouco comentada. Ela exprime e reúne uma quantidade
enorme de fenômenos e intuições que se estendem pelo menos do início do século
passado até hoje. Acreditar numa revolução erótica universal significa estar
envolvido num embate com os limites da moral e da tradição, os mesmos que
aparecem na clínica a partir do esforço psicanalítico, e que reaparecem como
reação, em ondas diversas de fundamentalismo. Ora, esse embate acontece no
âmbito de um movimento de natureza cultural, e não resta dúvida de que o campo
da música teve um papel dos mais relevantes no alargamento dessas fronteiras.

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Impossível, por exemplo, deixar de avaliar a importância de John Lennon como uma
das maiores lideranças da segunda metade do século nessa direção. Haveria então
uma filiação entre o discurso de Lennon e o discurso de Freud? O grito pela
liberação do amor, pela simbologia da flor, seria, assim, um marcador de uma
nova etapa de conformação da libido? E existe mesmo essa possibilidade de pensar
a libido em termos de longa duração, tal como Foucault propõe com a episteme
epocal? Uma libideme? Como é que a construção daquilo que passaríamos a
denominar de celebridade, condição indispensável para o capitalismo tardio se
envolveria com esse complexo cenário? Dando um salto no tempo de Lennon para
Michael Jackson, seria possível refletir sobre processos distintos de construção de
celebridade? E os fluxos e refluxos de tudo isso na música brasileira?

Juan Pablo González

Sampling como apropiación y reciclaje en la música chilena de fines del siglo XX

Como una nueva opción estética basada en la fragmentación del pasado, el


sampling es afín al collage y la retromanía posmoderna que reinaba en los noventa.
Desde una perspectiva política, el sampling se sumaba a la apropiación y reciclaje
del propio sistema imperante, como podía ser entendido desde el hip-hop. La
apertura cultural y comercial chilena en los noventa permitió el desarrollo de esta
apropiación en plenitud. Finalmente estaríamos ante una manifestación más de la
tendencia de la cultura popular a devorarse a si misma, tendencia exacerbada con
los resabios de posmodernidad de fines de siglo. En esta comunicación revisamos
dos casos de apropiación y reciclaje del pasado a través del sampling en el hip-hop
practicado en Chile en los noventa: el de Tiro de Gracia y el de Makiza, y
las escuchas cruzadas o crossover que generaron en músicos, programadores y
audiencias.

Felipe Radicetti

A associação com a obra Homens em Tempos Sombrios de Hannah Arendt não é


mera coincidência. Vamos discutir sobre os gargalos que enfrentamos hoje à
atividade musical no que se refere à criação, produção e distribuição no mercado de
bens simbólicos. Não apenas os músicos, mas a música, sofrem no Brasil, nestes
tempos sombrios que guardam similitudes em ideário e em violência ao tempo vivido
por Hannah Arendt. Em um ambiente hostil à produção cultural diversa como a
brasileira, sob deliberado desinvestimento, sob o signo da criminalização das
categorias profissionais do campo das artes, estando sob reiterada cassação de
direitos, sob asfixia econômica, músicos, compositores e intérpretes lutam por
sobrevivência sob contradições insustentáveis. Estamos imersos em um cenário
distópico que se segue e se opõe a um ciclo histórico - e tão recente - de participação
da sociedade civil organizada na formulação de políticas públicas para a cultura no
país. Não será a nossa memória recente a matéria e a ferramenta para a tão
necessária resposta da música à necropolítica instituída no país?

Moderação: Heloísa Valente

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Dia 16/09

https://youtu.be/XoEQV46H1E4

https://youtu.be/aJrQ6SqECN0

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Guilherme de Almeida Prado

A Boca do Lixo e a Censura Federal tinham uma relação curiosa. Enquanto os


produtores e diretores lutavam de todas as formas possíveis numa ditadura militar
contra a censura e tinham seus filmes proibidos ou liberados com cortes que muitas
vezes inviabilizavam os filmes comercialmente ou descaracterizavam seu conteúdo,
por outro lado o Cinema da Boca do Lixo talvez não tivesse tido tanto sucesso
comercial se não existisse uma censura que proibia os filmes estrangeiros com forte
conteúdo sexual de serem exibidos no país. Na verdade a Boca produzia um tipo de
cinema softcore, no limite da hipocrisia da censura, que era produzido apenas na
Itália e França, mas sem o humor e picardia particular que existe apenas no Brasil.
Os demais países do mundo não produziam esse cinema porque seu cinema erótico
era hardcore, o que a censura brasileira impedia totalmente de ser exibido no Brasil.
Quando esse cinema hardcore foi liberado, através de processos judiciais, o Cinema
da Boca do Lixo foi extinto.

Pablo Alabarces

Música popular, colaboracionismo y resistencia: algunos apuntes desde la


trayectoria de Palito Ortega

En mi reciente investigación sobre la vida y obra del cantautor Palito Ortega, el


segundo mayor vendedor de discos de la historia de la música popular argentina y
cuya trayectoria se extiende desde 1961 hasta la actualidad –es decir, los últimos
sesenta años de la cultura y la política local–, aparece como clave su compleja
relación con los sucesivos momentos políticos; en particular, durante la dictadura de
1976-1983, una dictadura ferozmente represiva y criminal, la obra musical y
cinematográfica de Ortega –devenido también director de cine– puede verse como
de un alto grado de complicidad y colaboracionismo. Sin embargo, a partir de los
años 90 Palito se incorporó a la vida política como gobernador democrático de su
provincia, Tucumán, llegando a ser Senador nacional y derrotado candidato a
vicepresidente de la Nación en 1999; sus antecedentes no parecen haber
deteriorado su consideración popular. Por eso, mi presentación toma el caso como
disparador de una reflexión más amplia sobre las relaciones entre música popular,
dictaduras, resistencias y complicidades en la Argentina y, por extensión, en
América Latina.

Cida Moreira

"Se fossemos infinitos tudo mudaria... como somos finitos muito permanece" -
B Brecht, 1928.

Jaqueline Moll

Numa democracia nenhuma obra supera a da Educação. Haverá, talvez, outras,


aparentemente mais urgentes ou imediatas, mas estas mesmas pressupõem, se
estivermos em uma democracia, a educação. Todas as demais funções do estado
democrático pressupõem a educação. Somente esta não é consequência da
democracia, mas a sua base, o seu fundamento, a condição mesma para sua
existência”. (Anísio Teixeira, 1947). A partir desta perspectiva serão propostas
questões e reflexões acerca das relações entre o projeto de nação e as políticas
educacionais, ao longo da vida republicana brasileira, apontando aspectos da

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ruptura democrática de 2016, sobretudo em relação as políticas de educação
integral. O Programa Mais Educação, ação indutora para retomada de uma agenda
de educação integral, no período de 2007 a 2016, a partir das matrizes das
pedagogias humanistas presentes em experiências como as Escolas-Parque, os
Centros Integrados de Educação Pública, os Ginásios Vocacionais, entre outras;
representou uma expansão curricular integrada ao imperativo do direito a
educação.Nestes horizontes o debate será construído.

Moderação: Diósnio Machado Neto

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Dia 17/09

https://youtu.be/mvM52GB8vQY

https://youtu.be/mYWjJUQfCxY

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Luisa Toller

Artivismo: carnavalizações e primaveras feministas

Aqui, propõe-se pensar a mobilização de diversas práticas relativas ao fazer


artístico – atuação institucional, pedagógica, músico-composicional, discursivo-
midiática – para pensar possíveis articulações entre arte e política.

Laert Sarrumor

Sarro-humor Sarrumor: Laert, sutil como um cassetete

A partir de relatos de sua trajetória artística, Laert Sarrumor põe em perspectiva o


cenário das artes em São Paulo.

Marcelo Galbetti

Premeditando o tech: políticas e tecnologias da experimentação musical

Tomando como ponto de partida a trajetória artística de Marcelo Galbetti, do


Premê aos dias atuais, apresenta-se aqui um ponto de vista alternativo à
compreensão dos desenvolvimentos das vanguardas artístico-musicais em São
Paulo e no Brasil.

Julinho Bittencourt

Tirando a viola do saco: música, crítica e política na trajetória do ateu (do) Torto!

Descrição: Nesta intervenção, busca-se colocar em perspectiva algumas interfaces


entre performance e crítica musicais. Assim, nos perguntamos: quais caminhos
(tortos) a música popular tem trilhado? Quais as encruzilhadas para o crítico e a
crítica musical no atual cenário político? De que formas eles podem (ou não) intervir
hoje?

Téo Ruiz

Música e mercado fonográfico: das políticas públicas ao público das políticas

Propõe-se aqui a discussão de aspectos práticos do mercado fonográfico em suas


interfaces com políticas públicas de fomento à cultura. Inclui relatos e reflexões
oriundos de experiências profissionais, artísticas e acadêmicas.

Moderação: Thiago Cazarim

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Resumos

Siguen los pregones, la melancolia: O álbum Mi Tierra (1993) de Gloria


Estefan entre colaborações, ressentimento e cubanidades
Igor Lemos Moreira
Lançado em 1993, o álbum Mi Tierra marcou o retorno da cantora cubana
exilada Gloria Estefan, ao segmento Latin Pop Music. O disco, produzido como
uma forma de tributo as identidades cubanas no exílio, e por desdobramento
a uma latinidade global, evocava (re)sentimentos, nostalgias, expectativas e
esperanças da comunidade exilada cubana em Miami. Reunindo diversos
artistas cubanos exilados renomados na indústria fonográfica, a exemplo de
Arturo Sandoval, Cachao Lopez, Paquino Riveira e Jon Secada, Mi Tierra foi
lançado no mesmo contexto em que as ondas do exílio cubano os Estados
Unidos iniciavam uma nova fase. Marcada pela crise econômica pós-Queda da
União Soviética, que levou a instalação do Período Especial Em Tempos De Paz,
a população cubana descontente com os rumos do governo revolucionário
passou a procurar vias alternativas a saída autorizada do país, sendo esse
processo o impulsionador da crise dos balseiros instalada nos anos 1990. Mi
Tierra, foi produzido e lançado nos Estados Unidos e globalmente no contexto
de crise cubana em que, por um lado, a comunidade exilada percebia o momento
como potencialidade para pressionar o governo revolucionário, mas que era
atravessado por ressentimentos e nostalgias com uma promessa que país
interrompida pela revolução. A presente comunicação analisa o álbum de Gloria
Estefan como possibilidade de reflexão sobre tal contexto, observando de que
maneira sua composição, narrativa e circulação midiática representava projetos
e sentimentos de grupos integrantes anticastristas que eram parte das
comunidades exiladas. Inserido na interface entre História do Tempo Presente e
Musicologia, ao problematizar os sentidos, significados e representações
presentes em Mi Tierra, com ênfase em seu viés narrativo (NAPOLITANO, 2016;
RICOEUR, 1994; OLIVEIRA, 2002), este trabalho explora Mi Tierra a partir de
três aspectos principais: 1. O processo de colaboração entre artistas cubanos
exilados que foi demando para sua composição, tornando o disco uma narrativa
coletiva sobre o exílio cubano que manifesta, pela música, sentimentos de
nostalgia e saudade; 2. O lugar do ressentimento com a Revolução presente nas
narrativas; 3. A formulação de representações de identidades cubanas a partir
do álbum e das divulgação midiática associada. Os três aspectos citados,
possibilitaram pensar que o álbum ocupou um lugar central na construção de
representações e na manifestação de sentimentos sobre o exílio cubano em um
contexto de crise política e de novas ondas de deslocamentos.

Referências
ABREU, Christina. Rhythms of race: cuban musicians and the making of Latino
new York City and Miami. Chapel Hill: The University of North Carolina Press,
2015.
BUSTAMANTE, Michael J. Cuban Memory Wars: Retrospective Politics in
Revolution and Exile. Chapel Hill: University of North Carolina Press, 2021.
GONZÁLEZ, Juan Pablo. Pensando a música a partir da América Latina. São
Paulo: Letra e Voz, 2016.
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NAPOLITANO, Marcos. História & música: história cultural da música
popular. 3. ed. rev. Belo Horizonte: Autêntica, 2016.
OLIVEIRA, Márcia Ramos de. Uma Leitura Histórica da Produção
de Lupcínio Rodrigues. Tese de Doutorado - UFRGS, 2002.

Palavras-chave: Gloria Estefan, Mi Tierra, Cubanidades, História do Tempo


Presente.

Festivais e Flores: Brasil e Portugal (1964-1975)


José Fernando S. Monteiro
Desde sempre as flores permeiam a imaginação dos poetas e destes se irradia
para os letristas de canções que as cantam tanto quanto às suas musas ou ao
amor. Nos festivais da canção isso não é diferente e muitas são as canções que
tem as flores por tema ou que a elas fazem menção, no Brasil e também em
Portugal. Tendo em conta os festivais da canção destes dois países,
nomeadamente, os Festivais da MPB e os Festivais da RTP, vemos muitas
canções com referências às flores, das mais diversas. Maysa cantou Dia das
Rosas, no Festival Internacional da Canção (FIC), de 1966, no mesmo ano,
Roberto Carlos defendia Flor Maior, no II Festival da TV Record, e Gutemberg
Guarabyra encantou a todos com Margarida, no FIC do ano seguinte. Em 1968,
Geraldo Vandré atingiu o auge da canção de protesto entoando Pra não Dizer
que não Falei das Flores, no III FIC, enquanto Taiguara vencia o III Festival da
TV Excelsior com Modinha, cantando: “olho a rosa da janela”. Já em 1972, Luli
& Lucina levaram Flor Lilás para o palco do VII FIC. Do lado português temos
Simone de Oliveira, cantando uma “primavera em flor”, em Sol de Inverno,
apresentada em 1965, Flor Bailarina, interpretada por Lilly Tchiumba, no Festival
RTP de 1969, Flor sem Tempo, cantada por Paulo de Carvalho, em 1971, e, no
mesmo ano, o grupo Efe 5 apresenta Rosa, Roseira. Em 1974 eclode a
Revolução dos Cravos, momento em que esta flor toma o lugar das balas nos
canos das espingardas dos soldados e, como não poderia deixar de ser, a
Revolução e o cravo vermelho, que se tornou seu símbolo, são os principais
temas das canções a concurso no festival português de 1975, a exemplo da
vencedora, Madrugada, interpretada por Duarte Mendes, que cantava a “arma-
flor”, com um cravo vermelho na lapela, no Eurovisão, ou Com uma Arma, Com
uma Flor, apresentada por Paulo de Carvalho. Deste modo, vemos que as flores
estiveram dentre os temas preferidos do cancioneiro apresentado nos festivais
tanto do Brasil quanto de Portugal, seja de forma simples e singela, como
corriqueiramente se faz referência às flores, seja relacionadas a momentos
turbulentos como uma ditadura ou uma revolução.

Referências:
CASTELO-BRANCO, Salwa (dir.). Enciclopédia da Música em Portugal no
Século XX. 4 vols. (A-C, C-L, LP, P-Z). Lisboa: Círculo de Leitores/ Temas e
Debates, 2010.
MANGORRINHA, Jorge. Festival RTP da Canção: Uma história de 50 anos
(1964-2014). Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas, 2014.
MELLO, José Eduardo (Zuza) Homem de. A Era dos Festivais: Uma parábola.
São Paulo: Editora 34, 2003.

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MONTEIRO, José Fernando S.. Festivais RTP e Festivais da MPB: Entre a
tradição e a modernidade (1964-1975). Seropédica: UFRRJ, 2020. 467 pp.
Doutorado (Tese) – Departamento de História e Relações Internacionais,
Instituto de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Federal Rural do Rio de
Janeiro, 2020.
SEVERIANO, Jairo. Uma História da Música Popular Brasileira: Das origens à
modernidade. São Paulo: Editora 34, 2008.

Palavras-chave: Palavras-chave: Flores; Festivais da Canção; Brasil; Portugal;


Música Popular.

Circle of Bakhtin ou Bakhtin cabeça – A performance dialógica na Música


Extrema
Renan Marchesini de Quadros Souza

Este estudo busca compreender como a performance e o dialogismo estão


interligados por meio da música extrema. Para tanto, organizamos o estudo a
fim de conceituar e contextualizar a música extrema. Afinal do que se trata este
fenômeno cultural tão fragmentado? A partir disso, verificamos como se dá a
performance neste tipo de apresentação, onde a sonoridade preza pelo ruído e
por um tipo de violência confrontadora que descentraliza o emissor e empodera
o ouvinte que passa a ser parte fundamental da apresentação.
Para nos ajudar a responder tais questionamentos temos em nossos aportes
teóricos autores que nos balizam para entender este tipo de música, como:
Janotti (2003, 2004), Kahn-Harris (2007) e Cogan (2008); já para
compreendermos corpos, performances e seus comportamentos na cultura
temos bases em Lótman (1990), Žižek (2014), Baitello (2014), Menezes (2016),
Paul Zumthor (1997, 2001, 2014), além de alguns de seus comentadores; já
sobre dialogismo alguns autores que nos ajudam são Voloshinóv (2018), Bakhtin
(2016) e alguns estudiosos que se debruçaram sobre o tema e o conceito. Além
deles colocamos alguns links do youtube para que o leitor possa visualizar como
este tipo de música convoca os corpos para uma performance que, por meio da
violência, permite o ouvinte se expressar e passar de um mero receptor a um
participante ativo de uma grande catarse performática.

Referências
COGAN, Brian. The Encyclopedia of punk. New York: Sterling Publishing, 2008.
HARRIS, Keith Kahn. Extreme metal: music and culture on the edge. Oxford:
Berg, 2007.
VOLOCHÍNOV, V. Marxismo e filosofia de linguagem: problemas fundamentais
do método sociológico na filosofia da linguagem. 2ª ed. São Paulo: Editora 34,
2018.
_____________. A palavra na vida e na poesia: Ensaios, artigos, resenhas e
poemas. São Paulo: Editora 34, 2019.
ZUMTHOR, Paul. Performance, recepção, leitura. São Paulo: Cosac Naify,
2014.

Palavras-chave: Música extrema, dialogismo, performance, metal, punk.

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Entre cheias e vazantes: professores de música no interior do Amazonas
Renato Antonio Brandão Medeiros Pinto

Não é de hoje que o Brasil não conhece o próprio Brasil. O médico Djalma
Batista, já em 1976, quando publica sua obra “O complexo da Amazônia”, revela
a intimidade de um país, no caso, a Amazônia, com elementos muito
característicos e únicos quando comparados com o resto da nação. Nestes 45
anos passados, quando se faz nova leitura do trabalho do médico, percebe-se
como muito do que é dito pelo observador não mudou. Assim, diante dos 40 anos
de formação de professores de arte no Amazonas, permanecem inquietudes
sobre como a complexidade apresentada por Batista reflete na atual
configuração do ensino das artes nos diferentes vales de rios amazônicos. O
estudo propõe uma abordagem bibliográfica partindo do trabalho do Professor
Doutor Jackson Colares à cerca da fundação do curso de Licenciatura Plena em
Educação Artística em 1980, dentro da então denominada Universidade do
Amazonas, ao qual este levantamento identifica a historicidade da formação de
professores de arte até a criação da Faculdade de Artes em 2017. Por este viés,
é feita a contabilidade de alcance do esforço para cobrir as dimensões do espaço
territorial amazonense. Por isso, é justo refletir sobre como até hoje as cadeiras
de arte, sobretudo nas escolas do interior do estado, estão vazias quando estas
mesmas existem. A vida ribeirinha e suas especificidades teimam em entortar
os padrões de formação acadêmica no universo dos rios e matas. Não obstante
a isso, ainda temos as considerações feitas pela Professora Doutora Rosemara
Staub de Barros, quando coordenadora do PARFOR faz público um relatório de
ações deste programa nos municípios de São Gabriel da Cachoeira, Itacoatiara,
Barreirinha e Manicoré, praticamente nas principais calhas fluviais que o curso
de música se fez presente. Para tanto, em específico, a investigação traz
números importantes sobre alunos formados, vagas criadas nas sedes
municipais, características do processo de formação dos professores e mapa do
alcance das atividades no estado. Aos detalhes de teorização confiamos à
Professora Doutora Lia Tomás, membro da Associação Nacional de Pesquisa e
Pós-graduação em Música(ANPPOM) as questões sobre pesquisas em música
no Brasil como estado de conhecimento(2015), uma tese de verificação dos
planos de ensino no Amazonas pela pedagoga Cátia Lemos(2020) e fechando,
um suporte sobre trajetórias de criação artística no interior do estado pelo Mestre
Pedro Vanuzo Costa e sua dissertação defendida em 2020. Tais trabalhos
permitem criar uma imagem do que é o ensino da arte perante a complexidade
amazônica, tempo e espaço criativo. Dessa forma, o texto considera os anos de
desenvolvimento do curso de artes na Universidade Federal do
Amazonas(UFAM), obstáculos e avanços, visibilidade do real ao contrário do
imaginário brasileiro sobre a região e por fim, o potencial e esforço dos que
decidem trabalhar para a educação mesmo tangenciando indiferenças
governamentais. De maneira qualitativa e quantitativa, os resultados são
exclusividade de uma leitura bibliográfica e produção de conhecimento para o
crescimento do ensino no norte do país.

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Referências
BATISTA, Djalma. O complexo da Amazônia. (análise do processo de
desenvolvimento). Conquista. Manaus. 1976.
MOREIRA, Dulciane et al. INTEGRANDO APPS NAS AULAS DE
MUSICALIZAÇÃO INFANTIL DA ESCOLA DE ARTES-UFAM. AEC&D-Arte,
Educação, Comunicação & Design, v. 1, n. 1, p. 1-10, 2020. Disponível em:
https://periodicos.ufam.edu.br/index.php/dcae/article/view/7478
RAMOS, Evandro José Santos; ZAGO, Rosemara Staub; NAJAR, Núbia Silva.
Licenciatura em Artes Visuais a Distância no Amazonas/BR. Octaedro. V.1, pl
2926 2933. Manaus. 2016.
TEIXEIRA, Wagner Barros; BRANDÃO, Raimunda Julia de Freitas. Parfor no
Amazonas: fronteiras, deslocamentos, e formação de professores de Espanhol.
Polifonia, v. 27, n. 47, 2020. Disponível em:
https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/polifonia/article/view/10776

Palavras-chave: PARFOR; Amazônia; Faculdade de Artes; UFAM

Recordar é Viver: práticas de comunicação e dimensões espaço-


temporais em um acervo online de bandinhas alemãs
Giovanni de Sousa Vellozo
A prática das chamadas “bandinhas alemãs” consiste em uma manifestação
musical de origem em comunidades de imigrantes estabelecidos no Sul do Brasil
(STAMBOROSKI JR., 2011), com grupos vinculados a apresentações em
contextos de confraternização em bailes e ao ar livre. A sua trajetória
discográfica começou no início dos anos 1960 com a gravação pioneira de LPs,
como os da Banda Treml de São Bento do Sul/SC (1961, RGE) e do duo Krüger
e Vogelsanger de Joinville/SC (1962, RGE), ambos artistas cujas obras do
período são objetos de estudo para a dissertação do estudante. Nas décadas
seguintes, somaram-se outros grupos, inseridos majoritariamente no segmento
de gravadoras e selos da chamada música regional (VICENTE, 2010) assim
configurada na segunda metade do século XX. Nesse sentido, o presente
trabalho busca, segundo as propostas do eixo temático, analisar um acervo
online desta música, em um canal na plataforma YouTube. O canal “Xirú
Brasiguaio”, criado e curado pelo paraguaio residente no Brasil Daniel Kernechi,
trabalha desde 2016 com o upload de discos e faixas avulsas, majoritariamente
de lançamentos das décadas de 1960 a 1990 não disponíveis em relançamentos
oficiais e plataformas de streaming. Até o último 30/05, o canal abrigava 359
vídeos e pouco mais de 10 mil inscritos, estabelecendo contato com estes a partir
da doação de LPs para digitalização e disponibilização de downloads não-
oficiais. A escolha se deu devido à proximidade do pesquisador com o acervo
em seu objeto de pesquisa, que se relaciona diretamente com a trajetória
discográfica desta música. Essa proposta tem dois objetivos principais. O
primeiro é o de perceber as práticas de comunicação associadas a um acervo
musical na Internet, tanto entre os agentes (colecionadores e apreciadores
inscritos no canal) no ambiente online quanto em relação às institucionalizações
do mercado fonográfico e da memória musical brasileira. Tal análise será feita à
luz dos conceitos de estratégia e tática de Certeau (1998) e norteada por
discussões levantadas por Machado (2015) e Vinci de Moraes (2020). O

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segundo objetivo é o de compreender as dimensões espaço-temporais
abrangidas pelo catálogo construído no canal, por meio da demarcação dos
artistas, das cidades de origem, dos anos de lançamento dos fonogramas e das
gravadoras com mais aparições.

Referências:
CERTEAU, Michel de. A Invenção do Cotidiano. Petrópolis: Editora Vozes,
1998.
MACHADO, Cacá. Entre o passado e o futuro das coleções e acervos de
música no Brasil. In: rev. hist. (São Paulo), n. 173, p. 457-484, jul.-dez., 2015.
STAMBOROSKI JR., Amauri Antonio. Música Popular Germânica no Sul do
Brasil: um panorama histórico da “bandinha” ao “pop do sul”. Funarte. Ministério
da Cultura. São Paulo, 2011.
VICENTE, Eduardo. Chantecler: uma nova gravadora popular paulista. Revista
USP, São Paulo, n. 87, p. 74-85, set./nov. 2010. Disponível em:
<http://www.revistas.usp.br/revusp/article/view/13831>. Acesso em 30 mai.
2021. VINCI DE MORAES, José Geraldo. Criar um mundo do nada. A invenção
de uma historiografia da música popular no Brasil. São Paulo: Intermeios; USP
– Programa de Pós-Graduação em História Social, 2019.

Palavras-chave: Acervos Sonoros, Acervos Online, Memória Musical, Música


Regional, Bandinhas

A presença ruidosa de Thelmo Cristovam


Paulo Dantas
Nascido em Brasília, Pernambucano por escolha e pelo tempo vivido em Olinda,
Thelmo é improvisador, pesquisador, ruidista, radioasta e técnico de som
responsável por inúmeros trabalhos em meios diversos como o cinema, projetos
instalativos, entre outros. Considerado um dos maiores artistas envolvidos com
gravação de campo no Brasil, ele também é uma figura importante no cenário
nacional dos gêneros Noise, reconhecido principalmente por seu trabalho junto
ao grupo de música extrema Hrönir, em parceria com Túlio Falcão e outros. Um
aspecto interessante da visão de mundo de Thelmo me foi revelado por meio de
entrevistas que conduzi em 2017, focadas em seu trabalho com gravação de
campo. Essa prática era inicialmente entendida por Thelmo como uma forma de
obter material sonoro para as suas composições, mas a partir de determinado
momento passa a ser considerada como um método para “retirar o véu do
mundo”. E é com o auxílio dessa escuta mediada que Thelmo busca incorporar
informações que antes lhe eram vedadas por seus filtros sociais e culturais.
Nesse sentido, a prática da gravação de campo é utilizada por Thelmo como um
meio para expandir ao máximo a sua própria 'razão Sinal-Ruído', mas não
através da otimização de um sinal. Na verdade, Thelmo pretende ter acesso
irrestrito a todos os ruídos, para então incorporá-los. Esta é, creio, a medida de
sua presença nas gravações que realiza: elas podem ser encaradas como
documentos de um processo de auto-reprogramação. Um modelo potente para
o uso da gravação de campo como um instrumento do fazer político nos é então
oferecido: nestes tempos difíceis, a escuta mediada poderia funcionar como
'redutor de ruído', como um meio de fazer ouvir---e potencialmente começar a

16
entender e compreender---o que normalmente é deixado de fora por nossos
filtros: o outro.

Referências

CHAVES, R., Performing sound in place: field recording, walking and mobile
transmission. Tese de doutoramento. Belfast, 2013. Disponível em
https://www.academia.edu/11339600/Performing_sound_in_place_field_recordi
ng_walking_and_mobile_transmission. Acesso em 13/01/2018.
DANTAS, P., Being in the Field: Process, Narrativity and Discovery in the Field-
Recording Work of Thelmo Cristovam and Alexandre Fenerich. Making it Heard:
a History of Brazilian Sound Art. New York: Bloomsbury Academic, 2019.
LANE, C.; CARLYLE, A. In the Field. The Art of Field Recording. Devon:
Uniformbooks, 2013.
VOEGELIN, S. A new generation of field recordists is challenging the myth of
the invisible figure with a microphone in work that celebrates presence rather
than absence. Wire, edição 364, 2014. Disponível em
https://www.thewire.co.uk/in-writing/collateral-damage/collateral-damage
_salome-voegelin. Acesso em 03/01/2018.
WRIGHT, M. P. The Noisy-Nonself: Towards a Monstrous Practice of More-
than-human Listening. Evental Aesthetics, 2017a. Disponível em
http://eventalaesthetics.net/vol-6-no-1-2017
-sound-art-and-environment/. Acesso em 03/01/2018.

Palavras-chave: gravação de campo, escuta, presença, ruído.

O videoclipe saiu da TV ou a TV entrou no videoclipe? Performances de


um televisor -personagem a serviço da música
Jhonatan Mata / co-autores: Melina Simão, Clara Portella e Marcos Amato

Idolatrada e malquista, a televisão se configura como a ambígua flor dos meios,


que converte e reproduz em imagens e sons o mundo em suas metáforas idílicas
ou espinhosas. Na vida cultural e política, cumpre um papel social que mescla
alienação, espetacularização e legitimação de identidades. Nesse contexto, a
música atua como potente aliada da TV. Trilhas sonoras de telenovelas que
resistem ao tempo, canções que ajudam a compor narrativas diversas nos
telejornais, reality shows pautados em eleições de melhores bandas ou vozes
são exemplos dessa simbiose. Estandartes desta relação, os videoclipes são
priorizados neste trabalho, que trata da “aparição” do televisor nestas produções.
Tendo como marco inicial o lançamento de Bohemian Rapsody, da banda
Queen, na TV, em 1975, o formato se desamarra dos domínios televisivos na
contemporaneidade. E conquista solos férteis nas telas de computadores
e smartphones, nos campos da produção e difusão. Curiosamente, na era dos
álbuns visuais, com versões 3D e 360 graus, notamos crescente e expressiva
presença da televisão-aparelho nos videoclipes atuais. Por meio da análise da
materialidade audiovisual de Coutinho (2018), mapeamos 200 produções em
que a TV, em sua “materialidade” é personagem- por vezes principal- dos
videoclipes, com “vestimentas” que vão dos tubos retrôs às smart
TVs. Revelamos relações complexas na representação da TV na música,

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que não excluem a função decorativa da “TV souvenir”, papel de parede
eletrônico da canção, mas vão da performance de “companheira de solidões
compartilhadas” entre intérpretes e públicos à “deflagradora” de toda a linha
narrativa do videoclipe. Considerando que há uma lógica de organização dos
elementos significantes, ligada às atitudes produtivas, este trabalho integra o rol
de reflexões tecidas no Projeto “Música para olhos e ouvidos” (UFJF), cujo
principal objetivo é delimitar, num viés multiplataformas, as diferentes
concepções de televisão retratadas na/pela música.

Referências
COUTINHO, ILUSKA. Compreender a estrutura e experimentar o
audiovisual – Da dramaturgia do telejornalismo à análise da materialidade. In:
Cárlida Emerim; Iluska Coutinho; Cristiane Finger. (Org.). Epistemologias do
Telejornalismo Brasileiro. 1ed.Florianópolis: Insular, 2018, v. 7, p. 175-194.
COSTA, Stéphanie & ALVES, Wedencley. (2019). Evaluating resistances to
health promotion campaigns: Thresholds of Interpretation. Cambridge
University, 1997ParatextsGENETTE, G.
MACHADO, A. A televisão levada a sério. São Paulo: Senac, 2000.
MATA, Jhonatan. “Morte e vida em telas: análise das estratégias sensíveis
entre profissionais e público nas dez maiores lives musicais do planeta
num cenário de pandemia”.MusiMid2, no.1 (2021): 77-94
SOARES, Thiago. A Estética do Videoclipe. João Pessoa. Editora da UFPB,
2013.

Palavras-chave: audiovisual, videoclipe, música, televisão, representação.

Resistindo a discursos conservadores e ataques às artes: que a educação


musical semeie um futuro melhor
Patricia Kawaguchi
O ensino de Artes nas escolas sempre foi relegado a uma posição subalterna
dentro das sociedades capitalistas, que priorizam uma formação cada vez mais
tecnicista para atender aos interesses do mercado de trabalho. Com a ascensão
dos setores mais conservadores da sociedade ao governo, artistas e as Artes
como um todo vêm sofrendo uma escalada de perseguições, ataques e
censuras. Nesse cenário, houve o desmonte de políticas culturais, o Ministério
da Cultura foi extinto, ao mesmo tempo em que foi construída e propagada uma
ideologia de que artistas são pessoas degeneradas, contra a “moral e os bons
costumes” e por isso seria necessário incentivar uma arte “nacional heroica”,
como disse o ex-Secretário da Cultura, Roberto Alvim, em discurso
assustadoramente repleto de apologia ao propagandista nazista Joseph
Goebbels. Sua sucessora, Regina Duarte, apresentou uma postura
negacionista, falando que as pessoas deveriam ter leveza e pararem de carregar
mortos – referindo-se às vítimas da Covid e da ditadura militar. Na educação,
sofremos com a perseguição a professoras e professores com o projeto Escola
Sem Partido, a proposta de retirar a obrigatoriedade das aulas de Artes na
reforma do Ensino Médio, a controversa elaboração da BNCC (Base Nacional
Comum Curricular) com forte influência de institutos empresariais e na qual a
Música é citada de forma considerada incoerente pela ABEM (Associação

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Brasileira de Educação Musical). Em mais um infeliz exemplo recente, o
candidato a prefeito de São Paulo, Arthur do Val, disse que as escolas precisam
ensinar a ganhar dinheiro e que “chega de aula de picho e break dance”, falando
pejorativamente sobre as aulas de Arte. Este trabalho se propõe a fazer uma
análise de como esses discursos conservadores que atacam as Artes e artistas
ganharam espaço na mídia e no senso comum e por consequência influenciaram
nos ataques à arte-educação e à educação musical. Aponta em seguida a
importância das Artes e da educação enquanto resistência nestes tempos
tóxicos que vivemos e sobrevivemos, para que possamos esperançar dias
melhores.

Referências:
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática
educativa. 50 ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2015.
LINARES, Alexandre; BEZERRA, José Eudes Baima. Obscurantismo contra a
liberdade de ensinar. In: CÁSSIO, Fernando. (Org.) ? Educação contra a
barbárie?: por escolas democráticas e pela liberdade de ensinar. São Paulo:
Boitempo, 2019. p. 127-133.
SANTOS, Micael Carvalho dos. A educação musical na Base Nacional Comum
Currricular (BNCC) – Ensino Médio: Teias da política educacional pós-golpe
2016 no Brasil. Revista da Abem, v. 27, n. 42, p. 52-70, jan./jun. 2019.
SNYDERS, Georges. A escola pode ensinar as alegrias da música? 5 ed.
Tradução de Maria Felisminda de Rezende e Fuzari. São Paulo: Cortez, 2008.
SUBTIL, Maria José Dozza. Marxismo, arte e educação: as potencialidades de
humanização pela educação artística. In: SCHLESENER, Anita Helena;
MASSON, Gisele; SUBTIL, Maria José Dozza. Marxismo(s) e educação. Ponta
Grossa: Editora UEPG, 2016. p. 227-244.

Palavras-chave: educação musical; conservadorismo; políticas públicas.

Sobre arte viva e relações: gravadores e plantas em dois casos de field


recording
Gabriela Nobre
Em seu pequeno texto “Arte viva”, Flusser propõe que a matéria viva é como um
contraponto ou oposição ao suporte finito que serve a toda e qualquer arte. “Não
importa qual significado queiramos dar ao termo arte, sempre implica elaboração
de informação a ser preservada (em pedra, bronze, tela, papel…).” (FLUSSER,
1998, p.83). Essa aparente cisão entre mundo vivo e não vivo, na arte, pode ser
pensada e transformada a partir do acolhimento de relações.
Especificamente, da relação entre “indivíduos técnicos” (Simondon) - tais
como gravadores e microfones - , e plantas - seus ecossitemas e paisagens.
Tal relação amplia a ideia sobre o que é construir um coletivo e estabelecer o
comunitário, uma vez que itens técnicos e ecossistemas passam a ter seus
limites borrados, e passam a ser reconhecidos como nossas “espécies
companheiras”, tal como conceituado por Haraway: “Cada uma delas (…) une,
sob formas inesperadas, o humano e o não humano, o orgânico e o tecnológico,
natureza e cultura.” (HARAWAY, 2016, p.58. Tradução nossa).Para pensar
como se dão essas relações, proponho investigar a prática de gravações de
campo (field recording) a partir de dois trabalhos recentemente lançados:

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"Silêncios, assim como as montanhas, serão consumidos pela vida
(eventualmente)" dos artistas Paulo Dantas e Thiago Rocha Pitta (BR) para o
Festival Novas Frequências, e “Ficções”, de Verónica Cerrotta (CH), publicado
pelo selo Música Insólita em 2021. Em ambos os trabalhos, objetos técnicos que
gravam, paisagens que são gravadas e sujeitos que gravam estão em
relação. Se por um lado é possível identificar cada um desses organismos como
forma individual de vida, é perceptível, igualmente, sua mistura. Seus modos de
existência são como extensões de um corpo ao outro: da ponta dos dedos de
quem grava ao corpo do gravador; do corpo que grava, à paisagem que o recebe
e o altera e é, igualmente, por ele alterado. Para discutir o tema da natureza no
plano das artes é preciso habitá-la e pensar suas figuras. Recuperando,
assim, alguma forma de existência possível. Suspender o binarismo que se
impõe entre distopia x utopia e produzir entre lugares habitáveis é papel da arte,
assim como pensar em um plano estético o que convencionamos chamar de
“natureza”.

Referências:
CERROTTA. Verónica. Entrevista concedida a Gabriela Nobre. Maio, 2021.
Disponível em: <https://musicainsolita.com/2021/06/08/veronica-cerrotta-
ficcoes/>
CHAVES. Rui. Field recording: presença, lugar e processo no trabalho de Lilian
Nakao Nakahodo e Paulo Dantas.
COCCIA, Emanuel. A vida das plantas. Florianópolis, Cultura e Bárbarie, 2018.
DANTAS, Paulo. Entrevista concedida a Gabriela Nobre. Agosto, 2020.
Disponível em: <https://musicainsolita.com/2020/08/28/paulo-dantas-
02022020/>
FLUSSER, Vilém. “Arte Viva” in Ficções Filosóficas. São Paulo, EdUSP, 1998.
HARAWAY, Donna. Staying with the trouble. Duke University Press., 2016.
________________. When Species Meet, Minneapolis: University of Minnesota
Press, 2007.
SIMONDON, Gilbert. Du mode d’existence des objets techniques. Editions
Aubier, 1989.

Palavras-chave: formas de vida, gravações de campo, relação, mistura.

Responsividade e Responsabilidade em Si se Calla El Cantor, de Horácio


Guarany: uma leitura crítica-bakhtiniana da canção.
Paula Maria Lima Galama, Andressa Zoi Nathanailidis
A Argentina, ao longo do século XX, atravessou uma série de golpes militares
decorrentes da aliança da elite composta por proprietários de terra, grandes
exportadores, banqueiros e corporações estrangeiras com os militares, a fim de
se manterem no controle político-econômico nacional. (SANDER et al,
2006). Em 28 de junho de 1966, Juan Carlos Ongania, tenente-general do
exército e representante de um movimento autodenominado “Revolução
Argentina”, assumiu a presidência do país. Seu governo fora caracterizado por
diversas repressões: dissolveu partidos políticos, forneceu poderes de caráter
legislativo a uma junta de comandantes-chefes, perseguiu professores,
estudantes, sindicalistas e líderes estudantis; além de ter instituído a censura,
incluindo a apreensão de livros. (BEIRED, 1996, p. 66). Durante a vigência deste

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governo, consolidava-se na Argentina o “Nuevo Cancionero”, movimento
estético- literário, que defendia a arte como instrumento de comunicação capaz
de conscientizar e instigar a população à ação política, tornando-a conhecedora
acerca da realidade do país; suas potencialidades folclóricas e culturais, suas
dores, esperanças, injustiças, violências, relações de exploração, etc. (DÍAZ,
2004). Mercedes Sosa, nascida na cidade de San Miguel de Tucumán, cidade
onde foi assinada a independência da Argentina, em nove de julho de 1935,
assinou o “Manifiesto del Nuevo Cancionero”. Durante toda a sua carreira foi
defensora dos direitos civis, da luta dos trabalhadores e tornou-se um dos
símbolos do movimento estético-literário desencadeado pelo documento.
Através de suas interpretações, as obras folclóricas argentinas ganharam os
Estados Unidos e a Europa, principalmente as registradas por Violeta
Parra, Atahualpa Yupanqui, seu conterrâneo e Horácio Guarany. De autoria
deste último, interpretou (e gravou) uma de suas mais célebres canções Si se
Calla El Cantor, levada ao público pela primeira vez no álbum “El Potro” (1970),
de Guarany. Com o intuito de compreender o lugar de fala assumido pelos
artistas de então, adotamos como objeto de estudo a supracitada canção,
representativa deste movimento e por diversas vezes performada por Mercedes
Sosa. Por meio de uma leitura crítica, buscamos apresentar o potencial de
engajamento inerente às produções desse período. A fim de viabilizar a presente
leitura, nos valemos da perspectiva dialógica sustentada pelo filósofo da
linguagem Mikhail Bakhtin. Dentre as obras a que recorremos estão: Arte e
Responsabilidade (2003) e Para uma Filosofia do Ato Responsável (2010).

Referências:
BAKHTIN, Mikhail. Para uma filosofia do ato responsável. Sâo Carlos. Pedro
& João Editores, 2010.
CHRISTENSEN, Anette. Mercedes Sosa, uma lenda: um tributo à vida de uma
das maiores artistas da América Latina. Tektime, 2020.
DÍAZ, Claudio Fernando. “Una vanguardia em el folklore argentino: canciones
populares, intelectuales y política em la emergencia del “Nuevo Cancionero”.” In:
Atas do II Congresso Internacional de Literatura
Argentina/Latinoamericana/Española, Mar del Plata, 2004.
BEIRED, José Luis Bendicho. Breve História da Argentina. São Paulo: Editora
Ática, 1996.
SADER, E.; JINKINGS, I.; NOBILE, R. e MARTINS, C. E. (orgs.).
Latinoamericana: Enciclopédia Contemporânea da América Latina e do
Caribe. São Paulo: Boitempo, 2006.

Palavras-chave: Ética, estética, dialogismo, canções de protesto, Nuevo


Cancionero.

Ruído subversivo: reflexões sobre (anti)música e política


Brennan Cavalcanti Maciel Modesto

Desconforto. Barulho constante não é aprazível aos ouvidos humanos. Berros.


Não é possível entender o que se “canta”. Em meio a estas características,
pretendemos compreender como é possível transmitir uma mensagem por meio
de tal sorte de produção artística. De pronto, vamos aos aspectos estéticos: a

21
desconstrução do belo, na subversão dos padrões de beleza enraizados no
mercado musical – obrigando-nos à voltar até a acepção grega de aesthesis,
enquanto “afecção”, enquanto aquilo que te toca. Talvez o efeito de causar
aversão, quiçá ojeriza em ouvintes desprevenidos não seja de todo coincidência.
Quem produz arte tem um objetivo mais ou menos delimitado. E mesmo os que
tem crença na “arte pela arte”, objetivam a aesthesis, num maior ou menor grau.
Naquilo que convencionou-se como “antimúsica”, é patente o engajamento
político. Embora nos dias de hoje já existam artistas de vertentes correlatas que
não abordem liricamente temas correlatos à política, ainda são exceções os que
não se posicionam à esquerda – desde seus princípios, na primeira metade dos
anos 1980 - é ávido e potente o discurso político dentro dos meios perpassados
pelo grindcore. A união entre o espírito contestador inerente ao punk, à despeito
dos usos comerciais posteriormente atrelado ao movimento. As vanguardas
artísticas, não raro, se posicionam politicamente. Nas décadas de 1930 e 1940
intelectuais de todo o cone sul se organizaram em frentes antifascistas, num
movimento de reação ao avanço do autoritarismo. De maneira semelhante,
os punks do ABC e de São Paulo se organizaram junto à classe trabalhadora
durante a ditadura militar. Deste modo, ainda que permeado por uma maneira
não ortodoxa de fazer música, que torna inaudível ou, melhor dizendo,
ininteligível a temática abordada pelos compositores. O meio da música extrema,
entendido enquanto contracultura, tem se mostrado, antes de qualquer coisa, um
espaço propício ao fortalecimento de resistência; de debate e de fortalecimento
do antifascismo.

Referências:
COSTA, Fabiana Vieira da. Arte e Política na Filosofia de Herbert Marcuse.
2017. 123 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Programa de Pós-Graduação em
Filosofia, Ufop, Ouro Preto, 2017. Disponível em:
http://www.repositorio.ufop.br/bitstream/123456789/8250/1/DISSERTA%C3%8
7%C3%83O_ArtePol%C3%ADticaFilosofia.pdf. Acesso em: 24 jun. 2021.
FAVARETTO, C. A contracultura, entre a curtição e o experimental. MODOS.
Revista de História da Arte. Campinas, v. 1, n.3, p.181-203, set. 2017. Disponível
em: ?http://www.publionline.iar.unicamp.br/index.php/mod/article/view/872?
OLIVEIRA, Ângela Meirelles. Palavras como balas. Imprensa e intelectuais
antifascistas no Cone Sul (1933-1939). São Paulo: Alameda, 2015. Resenha de
BEIRED, José Luis Bendicho. Para compreender o antifascismo na América
Latina. Topoi. Revista de História, Rio de Janeiro, v. 19, n. 37, p. 226-231,
jan./abr. 2018. Disponível em: DOI: https://doi.org/10.24978/mod.v1i3.872

Palavras-chave: Política, Música, Antimúsica, Antifascismo, Subversão.

Músicas de reabertura: o cancioneiro de Milton Nascimento no final da


ditadura militar brasileira
Fernanda de Araújo Patrocinio
Quais cenas históricas um cancioneiro é capaz de montar, a partir da paisagem
sonora oriunda de discos? Ou, ainda: como canções e articulações artísticas
podem reverberar tempos e identificar estruturas sociais de um determinado
território? Embasado em tais questionamentos, o presente artigo apresenta a
produção e a circulação da obra de Milton Nascimento na primeira metade da

22
década de 1980, considerando-se também o contexto brasileiro acerca da
abertura política e, consequentemente, o fim dos Anos de Chumbo. Desse modo,
Nascimento e sua obra são os objetos analisados neste artigo, de forma a
auxiliarem na compreensão de economias simbólicas (BOURDIEU, 2015), no
que diz respeito à representação de um período histórico e às negociações
destas mimeses, a partir de expressões artísticas (com especial destaque à
música), bem como às estruturas de sentimento (WILLIAMS, 2011), que retratam
também a experiência coletiva histórica e sua expressão na cultura. Assim, a
leitura das narrativas presentes nos discos e nas parcerias de Nascimento
(DUARTE, 2009) e também a circulação do próprio artista, além de sua posição
em meio ao movimento de abertura política, culminam também na leitura de uma
geografia audível (ROBBINS, 2019). Ou seja, onde os sons do território e suas
experiências sociais reverberam também especificidade e identidade. A partir
das possíveis interpretações oriundas das narrativas dos discos de Nascimento,
lançados entre 1980 e 1985, procura-se destacar as estruturas que permitiram a
construção de tais montagens e cenas, considerando-se as experiências
sensoriais (nos discos e no contexto vivido), bem como as possíveis mediações.
A análise aqui proposta usará como metodologia a pesquisa bibliográfica, com
acesso a materiais históricos, como biografias, textos publicados em jornais e
revistas, bem como os discos lançados por Nascimento no referido período.
Assim, o artigo aborda aspectos de micro e macrouniversos para compreender
os desdobramentos e as articulações, no que diz respeito à indústria fonográfica
e sua contribuição aos debates e diálogos da época, bem como à configuração
da Indústria Cultural brasileira. O contexto, da censura à reabertura democrática,
e sua influência direta nas peças musicais produzidas durante o período da
Ditadura Militar são o ambiente essencial para entender as construções sonoras
possíveis no período. Do mesmo modo, este é o pano de fundo para
compreender potencialidades e articulações políticas também a partir do campo
das artes, sobretudo da música.

Referências
BOURDIEU, Pierre. A economia das trocas simbólicas. São Paulo:
Perspectiva, 2015.
DUARTE, Maria Dolores Pires do Rio. Travessia – a vida de Milton Nascimento.
Rio de Janeiro: Record, 2009.
ROBBINS, Dylon Lamar. Audible Geographies in Latin America. Londres:
Palgrave/Macmillan, 2019.
WILLIAMS, Raymond. O campo e a cidade. São Paulo: Companhia de Bolso,
2011.

Palavras-chave: Milton Nascimento, Sociologia da Cultura, Música Popular


Brasileira, Ditadura Militar, Democracia.

23
"Um bom tempo para não fazer nada" - a atuação e a poética de Chico
Buarque, na Itália, durante seu autoexílio, em 1969.
Rodrigo Vicente Rodrigues

A italianidade é uma constante em nosso País, como aponta Cenni (2003);


exemplos disso são muitos, como a ação de artistas italianos no contexto
acadêmico, a perenidade da ópera da Península no Brasil e, obviamente, a
herança cultural e etnográfica de milhares de imigrados. Posteriormente, outros
modos de inserção dessa cultura dizem respeito às dinâmicas das mídias de
massa, sobretudo o sucesso da canção italiana a partir da década de 1950; San
Remo também foi ponte entre Brasil e Itália (Roberto Carlos vence em 1968
com Canzone per te). Mais tarde, como contraponto à hegemonia estadunidense
na cena musical, tivemos os álbuns em italiano Per amore e Passione (Zizi
Possi), Equilibrio distante (Renato Russo) e Brasiliano (Jane Duboc), todos da
década de 1990, recuperando a memória da canção italiana. Vê-se, a partir de
obra organizada por Heloísa A. D. Valente (2018), que o período ditatorial foi
extremamente permeável a essa canção, tanto via rádio, como também através
da venda de discos. No mesmo período, porém, vemos uma dinâmica em sentido
contrário: a ida de brasileiros à Itália, como Maysa e Astrud Gilberto, além de
Roberto Carlos e outros. Especificamente, observamos que Chico Buarque,
incitado pela ditadura, se autoexila na Itália em 1969, justamente por ter se
tornado o paradigma do artista subversivo naquele contexto, conforme explicita
Napolitano (2004), algo que ratifica que a arte é sempre permeada por questões
políticas. Lá, grava e lança um álbum no mesmo ano, demonstrando que a
canção ligeira brasileira continuava a ser difundida internacionalmente, mas
agora noutro registro: poder-se-ia interpretá-lo como um eco da tropicalidade
representada pelo samba e potencializado pela bossa nova (atualizando quiçá a
atuação de Carmem Miranda). Chico não apresenta algo muito distante disso,
levando (a partir de traduções) à Itália uma imagem da cena musical brasileira
compreensível pelos europeus. Partindo do estudo de Susan Bassnett (2005)
sobre a tradução, vemos que esta é sempre uma área intersticial entre
realidades; daí observar-se-á como a música brasileira no contexto italiano se
deu através de negociações, importando sublinhar que foi a política que
propiciou o tráfego cultural entre os dois países, no contexto das mídias de
massa. Assim, propõe-se verificar a atuação de Chico na Itália a partir de seu
álbum de 1969 (Na Itália), num momento crítico da vida cultural brasileira
(lembremo-nos que o AI-5 data de dezembro de 1968), sobretudo a partir da
faixa Far niente (Bom tempo), e como o artista negociou para transitar entre duas
realidades e como se inseriu no panorama da música ligeira italiana (BORGNA,
1985).

Referências
BASSNETT, Susan. Estudos de tradução. Porto Alegre: UFRGS, 2005.
BORGNA, Gianni. Storia della canzone italiana. Roma: Laterza, 1985.
CENNI, Franco. Italianos no Brasil. São Paulo: Edusp, 2003.
VALENTE, H. A. D. A canção romântica no Brasil nos “anos de chumbo”. São
Paulo: Letra e Voz, 2018.
NAPOLITANO, Marcos. A MPB sob suspeita: a censura musical vista pela ótica
dos serviços de vigilância política (1968-1981). Revista Brasileira de História.
São Paulo, v. 24, nº 47, p.103-126 – 2004.

24
Palavras-chave: Chico Buarque, canção ligeira, canção italiana, canção
brasileira, ditadura militar brasileira

Blocos de sensação e a força afetiva dos timbres no rock independente


brasileiro
Marcelo Bergamin Conter, Ligia Maria Lasevicius Perissé, Juliana Henriques
Kolmar
No livro O que é a filosofia?, Deleuze observa a arte como "a linguagem das
sensações" (2010, p. 208), sugerindo que ela é capaz de se fazer entrar "nas
palavras, nas cores, nos sons ou nas pedras" (idem). Ela conserva blocos de
sensação na matéria, um composto de perceptos e afectos. Deleuze ainda
reflete sobre como este fenômeno ocorre na música, observando como os
acordes se comportam, pensando-os como afetos. A fim de desdobrar estas
teses de Deleuze e inspiradas pelos estudos sobre timbre de Blake (2012) e
Elferen (2021), buscamos entender o papel das timbragens na formação de
blocos de sensação que induzem músicos e audiência a estados de alteração
de percepção similares ao êxtase e ao transe, responsáveis também por
potencializar sentidos e criação de perceptos durante performances musicais.
As teorias do afeto são chave para este estudo, pois "o afeto levanta a questão
sobre se o sentimento pode ou deve ser descrito como significado" (GARLAND,
2020, p. 138), além de nos fazer voltar a atenção para a materialidade do evento
musical. Analisamos registros fonográficos e de shows ao vivo de bandas
independentes (ativas entre 2015 e 2020) publicados no YouTube, bem como
entrevistas que realizamos com seus membros. Os blocos de sensação que nos
interessam analisar são aqueles presentes em momentos em que a performance
musical converge para uma experiência de escuta sem centro de gravidade,
onde é recorrente, por exemplo: a busca pela criação de paisagens sonoras
complexas e ricas em parciais harmônicos; ampla e complexa utilização de
faixas de frequências dentro do espectro sonoro de mixagem; trechos
instrumentais longos; momentos de introspecção; estratificações sonoras
através do recurso de looping, que induzem o espectador a uma escuta mais
atenta e a uma experiência similar ao transe e ao êxtase. Barry Shank (2014)
comenta que tais experiências de escuta conformam uma espécie de força
política da beleza musical e que é preciso reconhecermos a força dos afetos que
emanam desses momentos. A partir destas constatações, descrevemos os
processos de singularização via timbragem desenvolvidos pelos músicos em
suas performances ao vivo (ou em estúdio), bem como por eles descritos em
seus depoimentos. A presente pesquisa parece apontar que os blocos de
sensação analisados, que surgem a partir da interação de elementos humanos
e não-humanos, convergem à expansão da virtualidade do timbre e à
potencialização de estéticas e políticas dentro do rock independente brasileiro.

Referências
BLAKE, David K. Timbre as differentiation in indie music. Music Theory
Online, vol. 18, n. 2, 2012.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Felix. O que é a filosofia? São Paulo: Editora
34, 2010.

25
ELFEREN, Isabella van. Timbre: Paradox, Materialism, Vibrational
Aesthetics. New York: Bloomsbury Academic, 2021.
GARLAND, Shannon. Exigimos o Amor: A Música como Articuladora de Afetos
Políticos. In: CASTANHEIRA, J.C. S. et. al. Poderes do Som: Políticas
Escutas e Identidades. Florianópolis: Editora Insular, 2020. p. 127-152.
SHANK, Barry. The political force of musical beauty. Durham and London:
Duke University Press, 2014.

Palavras-chave: Timbre, Blocos de Sensação, Afeto, Comunicação, Semiótica.

Sua Harmonia Branca Não Afeta o meu Canto


Thiago Barbosa Alves de Souza
As produções de funk brasileiro que são feitas para os bailes de rua, chamados
fluxos, têm uma construção musical e estética bem particular, diferente do funk
pop comercial difundido por grandes produtoras e que atingem setores sociais
mais endinheirados. No funk de fluxo, há uma diferença marcante que será
abordada neste artigo: o canto fora do tom, produzido propositalmente. Este
canto que conflita com uma base harmônica e melódica mostra as intenções
estéticas e sugere significados musicais, sociais e políticos de funks tocados em
bailes de favelas. Analisando diversos desses funks de baile, encontramos um
paralelo com a capoeira que, em diversos casos, traz um canto melódico que
difere das notas tocadas no berimbau, por exemplo.Estas observações nos
permitem mapear os diversos critérios musicais, estéticos e políticos que existem
em cada subgênero de funk, e nos permite ver que os funks comerciais tem uma
produção musical que opta, via de regra, por construções melódicas e
harmônicas mais tradicionais, vindas do tonalismo europeu. Enquanto que os
funks destinados aos bailes de favelas têm critérios de produção que desafiam
e pedem um outro tipo de análise musical. Qual a melhor forma de analisá-los?
É o que tentaremos expor neste artigo.

Referências
EWELL, Philip. A. Music Theory and the White Racial Frame. Music Theory
Online, novembro de 2019. Disponível em:
<https://mtosmt.org/issues/mto.20.26.2/mto.20.26.2.ewell.html>. Acesso em 28
de junho de 2021.
FACINA,Adriana; MOUTINHO, Renan Ribeiro; NOVAES, Dennis; PALOMBINI,
Carlos. O errado que deu certo: Deu onda, o debate da harmonia e a construção
da batida numa produção paulistana de funk carioca. Revista Eletrônica da
ANPPOM. Disponível em:
<https://www.anppom.com.br/revista/index.php/opus/article/view/opus2018a241
1>. Acesso em 28 de junho de 2021.
LOPES, Adriana Carvalho. Funk-se Quem Quiser: no batidão negro da cidade
carioca. Rio de Janeiro: Bom Texto, Faperj, 2011.
NOVAES, Dennis. Técnica, produção e circulação musical no funk carioca. Tese
de doutorado do programa de pós-graduação em Antropologia Social do Museu
Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2020. Disponível em:
<https://www.academia.edu/44132827/Nas_Redes_do_Batidão_técnica_produ
ção_e_circulação_musical_no_funk_carioca>. Acesso em 28 de junho de 2021.

Palavras-chave: funk brasileiro; música afrodiaspórica; baile funk;

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Esboço sobre a recepção dos aparelhos tecnológico-musicais: A
invenção das tradições, costumes e rituais
Joabe Guilherme Oliveira

A música advinda das máquinas falantes era parte importante de uma nova era,
de uma fase do desenvolvimento do capitalismo liberal, batizada a
posteriori pelos teóricos de “Segunda Revolução Industrial”. E da mesma forma
que, em algumas propagandas podiam-se ver fábricas dentro dessas máquinas,
pode-se, por assim dizer, perceber uma nova ideia de música que vem acoplada
a elas, um espírito industrial, e que pode ser percebido em outros meios de
comunicação. A era mecânica da gravação e reprodução registra não só um
acontecimento econômico, cognitivo e cultural, mas também político, ela registra
o início e fim da Primeira República. Horas antes da proclamação da República,
fazia-se, no palacete do Príncipe D. Pedro Augusto, de acordo com Franceschi
(1984, p. 19), uma demonstração do segundo fonógrafo, que para cá veio por
intermédio do comendador Carlos Monteiro de Sousa. A divulgação dos
aparelhos de forma efetiva se dará pelas mãos de Figner no desenrolar da
República. O corpo e a alma dessas máquinas estavam, em seu sentido pleno,
em simpatia com o capitalismo liberal/industrial. Para um novo produto, novas
tradições, hábitos, costumes, reivenções e rituais tinham que ser criados, seja
por meio de um passado estabelecido por outros instrumentos, ou por meio das
problemáticas técnicas que surgiram com esses aparelhos. Isso era necessário,
dentro do processo de recepção, como fator de operação para essa indústria
fonográfica. Contudo, o distanciamento de aproximadamente um século do
período compreendido aqui, faz com que o pesquisador, que estuda a primeira
metade do século XX, fique cada vez mais dependente de dois tipos de fontes,
como bem lembra Hobsbawm (1997, p. 9), sendo elas: a imprensa diária ou
periódica, e outras publicações de governos nacionais e instituições
internacionais. No nosso caso procuramos fazer uma análise dos textos e
propagandas, sobre as tecnologias musicais, veiculados pela revista Fon-Fon,
uma das revistas ilustradas mais populares de sua época.

Referências
FON-FON: Semanário Alegre, Político, Crítico e Espusiante. Biblioteca
Nacional - Hemeroteca Digital. Disponivel
em:<http://memoria.bn.br/DocReader/DocReader.aspx?bib=259063&PagFis=1
>. Acesso em: 24 março 2019.
FRANCESCHI, H. M. Registro Sonoro por meios mecânicos no Brasil. Rio de
Janeiro: Studio HMF Ltda, 1984.
FRANCESCHI, H. M. A Casa Edison e seu tempo. 1ª. ed. Rio de Janeiro:
Sarapuí, 2002.
HOBSBAWM, E. J. E.; RANGER, T. A invenção das tradições. Tradução de
Celina Cardim Cavalcante. 6ª. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2008.
MILLARD, A. America on record: a history of recorded sound. 2ª. ed. New York:
Cambridge University Press, 2005.

Palavras-chave: Fon-Fon, Tecnologias musicais, Recepção.

27
S.P. Metal: a flor-cadáver da contracultura paulista
Milton Medusa, Rodrigo Kurita, André Felipe Simões
O Heavy Metal representou desde um princípio um espaço de manifestação da
contracultura típica da década de 1970. No Brasil, o movimento rapidamente se
enraizou nos territórios "esquecidos"das cidades industrializadas, como os
antigos centros comerciais e as periferias. Esta comunicação visa descrever e
analisar a emancipação do Heavy Metal na década de 80 com o intuito de
correlacionar o nascimento de seus subgêneros assim como os principais
festivais que ocorreram à época. A proposta tratará de mostrar as referências
dessas bandas, como Iron Maiden e Judas Priest, assim como os festivais que
serviram de difusor do movimento como o Metal 4, realizado em 1986, no clube
Palmeiras, em São Paulo, e o South American Death Festival, em 1987, em
Santos. Ademais, far-se-á também um comparativo acerca dos produtores bem
como do papel da mídia na divulgação de novas bandas e/ou eventos de grande
porte. Especificamente a comunicação parte do lançamento das coletâneas S.P.
Metal I e II, entre os anos de 1984 e 1985. Essas coletâneas lançaram luz em
bandas como Avenger, Centúrias, Salário Mínimo, Vírus, Santuário,
Performances, Korzus e Abutre. Ao redor desse movimento surgiram festivais e
gravadoras independentes como a Baratos & Afins. Mediante tais justificativas,
o intuito desta pesquisa é avaliar as estratégias midiáticas de divulgação bem
como resgatar a importância do contexto histórico da cena do rock pesado
paulistano. Por fim, o estudo propõe uma comparação com a cena atual do heavy
metal brasileiro, principalmente discutindo como a era da "live" representa a
perda de uma energia vital do Heavy Metal: a interação performática. Este estudo
nasce do Grupo de Estudos Rock no Brasil, desenvolvido no Laboratório de
Musicologia da EACH-USP.

Referências
ARNETT, Jeffrey Jensen (1996). Metalheads: Heavy Metal Music and
Adolescent Alienation. Westview Press.
AZEVEDO, Cláudia Souza Nunes de (2009). É para ser escuro! - codificações
do Black Metal como gênero audiovisual. Tese de Doutorado em Música.
Programa de Pós-Graduação em Música – Universidade Federal do Estado do
Rio de Janeiro (UNIRIO)
CHRISTE, Ian (2003). Sound of the Beast: The Complete Headbanging History
of Heavy Metal. HarperCollins
DAPIEVE, Artur (1996). Brock: o rock brasileiro dos anos 80. São Paulo:
Editora 34.

Palavras-chave: S.P. Metal; Heavy Metal no Brasil; Música e Ideologia.

De ratos e carniças: análise discursiva das bandas de punk rock do ABC


Fernando Tavares, Ana Mara Alves, Diósnio Machado Neto
Este texto está vinculado ao grupo de Estudos de Rock da EACH-USP e tem
como objetivo analisar as práticas discursivas dos grupos de Punk Rock do ABC
Paulista entre o final dos anos 1970 e início dos 1980. Apresentamos o cenário
histórico do período, as relações de poder por meio da formação discursiva

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musical das bandas Inocentes, Ratos do Porão e Garotos Podres, sem perder
de vista as diversas formações de sentido bem como estratégias musicais
comparadas com grupos estrangeiros, que eram a base referencial e musical
dos músicos brasileiros. Tais temas se justificam pelo período em que o
movimento ocorreu e que coincidiram com a mobilização dos movimentos
sindicais da região. Se desdobra como espaço de resistência e identidade que,
de certo modo, construíram as condições para o florescimento do movimento
musical de maior impacto na atualidade nas regiões que formavam o antigo
cinturão operário do Grande ABC, o Rap.

Referências
ESSINGER, Silvio (1999). Punk: anarquia planetária e a cena brasileira. São
Paulo: Editora 34.
FOUCAULT, Michel (2015). Microfísica do poder. 2. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra.
MELÃO, Cesar Augusto. O punk sob o olhar da mídia: um estudo léxico-
discursivo. 2013. Dissertação (Mestrado em Filologia e Língua Portuguesa) -
Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo,
São Paulo
TEIXEIRA, Aldemir Leonardo. O movimento Punk no ABC Paulista: anjos: uma
vertente radical. 2007. 227 f. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) -
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2007.

Palavras-chave: Punk Rock, Movimento Operário do ABC, Análise Discursiva

Disputas de capital e dinâmicas de gênero musical no contexto da música


experimental
Fernando Gonzalez

Questões peculiares sobre nomenclatura e definição, assim como


questionamentos que circulam em torno destas, não são novidade no reino da
música de concerto. Grande parte destes questionamentos é justificado e
encontra respaldo entre diferentes grupos de ouvintes. O objetivo deste trabalho
é refletir sobre disputas e dinâmicas de capital envolvidas na nomenclatura e
classificação da música, no contexto da produção e consumo da música
experimental. Buscamos, também, fomentar a reflexão sobre o que se entende
por gênero musical nesse contexto, assim como propor uma análise da música
experimental, compreendida aqui como objeto estético anti-hegemônico,
enquanto gênero musical. Gêneros e classificações musicais parecem operar,
como grande parte das dinâmicas de atribuição de identidade, pela definição de
fronteiras mais ou menos explícitas delimitando aquilo que pode ou deve fazer
parte de um grupo. Considerando sua complexidade, os gêneros musicais
permitem que músicos e audiências estabeleçam balizas para as disputas de
gosto, ao mesmo tempo que permitem a construção de assinaturas específicas
que se tornam as marcas distintivas do artista (Janotti Jr; Sá, 2019, p.131). As
relações complexas em torno das noções de gênero musical sempre se deram
de forma dinâmica, resultando em implicações que vão muito além de questões

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musicológicas, como apontam Janotti Jr e Sá (2019). Reconhecendo e
enfatizando a dimensão do caráter extramusical das noções de gênero na
música, Janotti Jr (2003) oferece uma metodologia de estudo desses com base
em três eixos analíticos, baseados em “regras econômicas que envolvem
práticas de consumo e endereçamento dos produtos musicais, regras semióticas
e regras técnicas e formais” (Janotti Jr e Sá, 2019, p.130). Seria possível
empreender em uma análise da música experimental a partir deste
direcionamento? Partindo em ordem inversa, podemos encontrar algumas pistas
das possíveis regras técnicas e formais, que correspondem ao terceiro eixo da
análise, e das regras semióticas, correspondentes ao segundo eixo, nos arcos
teóricos discutidos por Gottschalk (2016) em sua análise da música
experimental. O primeiro eixo envolve o que Janotti Jr e Sá (2019) descrevem
como “regras econômicas que envolvem práticas de consumo e endereçamento
dos produtos musicais” (p.130). Podemos considerar que, apesar de sua
proposta estética muitas vezes apontar para a direção contrária, a música
experimental em grande medida depende das regras mercadológicas já
estabelecidas para sua produção e circulação. A constituição de circuitos de
consumo, mesmo que distintos do que é distribuído de forma massiva e
produzido em série, ainda assim demanda o estabelecimento de dinâmicas de
mercado que, por fazerem parte de um contexto maior (em uma sociedade
fortemente ligada à indústria cultural), não conseguem se apresentar
inteiramente livres ou isolados destes. Faz-se necessário, também, reconhecer
que, em grande parte por conta da centralidade do consumo no processo de
fruição musical, as divisões dos gêneros musicais de caráter inicialmente
comercial acabaram se convertendo em elementos geradores de práticas,
conceitos e significados, se mostrando centrais para as diversas dinâmicas e
práticas de consumo observadas pelos ouvintes.
Referências
BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. São Paulo: Zouk,
2015
GOTTSCHALK, Jennie. Experimental Music since 1970. Nova York: Bloomsbury
Publishing, 2016.
JANOTTI JR, Jeder. À procura da batida perfeita: a importância do gênero
musical para a análise da música popular massiva. Revista Eco-Pós. Rio de
Janeiro. UFRJ. v.6, n.2, p.31-46, 2003
_________________. SÁ, Simone Pereira de. Revisitando a noção de gênero
musical em tempos de cultura musical digital. Galaxia (São Paulo, online), n. 41,
p. 128-139, mai-ago., 2019
SOARES, Thiago. O videoclipe no horizonte de expectativas do gênero musical.
Ecompós. Brasília, v. 4, p. 1-18, dez. 2005.

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"É necessário quebrar os padrões/ É necessário abrir discussões": Criolo
e população LGBT entre controvérsias e alianças possíveis.
Leandro Stoffels

Essa pesquisa se interessa em analisar o videoclipe da música ‘Etérea’, do


rapper Criolo, protagonizado por corpos LGBTs e dissidentes, sob a perspectiva
das ‘visualidades cuir/queer’ (LOZANO, 2019). Por ser o vídeo da música de um
artista que não se identifica como LGBT, entendemos que essa obra é ideal para
analisar disputas, conflitos e alianças mobilizados pela aparição de sexualidades
não-hegemônicas na cena musical, em especial em suas relações com o hip-
hop e com o público tradicional desse artista, acostumado a uma performance
de masculinidade hegemônica em suas canções e vídeos. A metodologia está
assentada nos estudos de cultura visual decolonial e cuír/queer (BARRIENDOS,
2011), e nos estudos do videoclipe ‘pós-MTV’ (SÁ, 2019). A partir dos caminhos
indicados por essas metodologias, a pesquisa não se restringe à análise do
conteúdo das obras, mas, e principalmente, as articulações entre a obra e os
contextos políticos e sociais. Interessa não apenas a análise visual, mas também
os contextos de produção e de sua recepção (comentários e curtidas), levando
em conta as controvérsias anteriores do artista com a comunidade LGBT, além
de entrevistas e making ofs que ajudem a compreender o processo de criação e
produção desse videoclipe. Nos interessa inquirir quais posições essa obra
audiovisual demarca na trajetória do cantor, e quais leituras essa obra propõe
sobre esses corpos que estão à margem do hetero-patriarcado. Nesses tempos
tóxicos em que vivemos, onde os corpos dissidentes são tantas vezes
repudiados publicamente por autoridades políticas, ou por outro lado, celebrados
falsamente pelo capital, visando cooptá-los enquanto produto ou consumidores,
o que significa esse gesto artístico de Criolo? Estaria ele propondo alianças
(BUTLER, 2018), ou apenas reproduzindo uma retórica visual colonial, que extrai
lucro de corpos dissidentes ao mesmo tempo que os alienam de seu valor?
Esperamos que essa pesquisa possa representar uma contribuição à
musicologia queer no Brasil (CAVALCANTI, 2018), ao permitir entender alguns
sentidos e valores agenciados pela visibilidade que vem sendo conquistada
pelas sexualidades dissidentes na cultura midiática contemporânea.
Referências
BARRIENDOS, Joaquín. La Colonialidad Del Ver. Hacia Un Nuevo Diálogo
Visual Interepistémico. Nómadas (Col), núm. 35, outubro de 2011, pp. 13-29.
BUTLER, Judith. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria
performativa de assembleia. Editora José Olympio, 2018.
CAVALCANTI, Guilherme Marelli Cardoso. Gênero, Militância LGBT e
Musicologia queer no Brasil. Música em Foco, v. 1, p. 6-10, 2018.
LOZANO, Rían. Cuir visualities, survival imaginaries. In: IQANI, Mehita;
RESENDE, Fernando (Ed.). Media and the Global South: Narrative
Territorialities, Cross-cultural Currents. Taylor & Francis, 2019.
SÁ, Simone Pereira de. 'O dia em que Beyoncé se tornou negra': notas para
análise do videoclipe 'pós-MTV'. In: Adriana Amaral; Ivan Bomfim, Marcelo
Bergamin Conter, Gustavo Daudt Fischer, Michael N. Goddard, Fabricio Silveira.

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(Org.). Mapeando cenas da música pop: materalidade, redes e arquivos.
1ed.João Pessoa: Marca de Fantasia, 2019, v. 2, p. 17-47.

Palavras-chave: Criolo; artivismos; videoclipe; visualidades queer; corpos em


aliança;

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