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NÚCLEO PREPARATÓRIO EXAME DA ORDEM

PROFª ANA PAULA MATOSINHOS

INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE PRIVADA

1 - INTRODUÇÃO

O Estado brasileiro que adota uma política de bem estar social não admite mais a propriedade
privada com a antiga característica do período liberal de ser absoluta.

A Constituição brasileira de 1988 ao mesmo tempo que afirma , em seu artigo 5, ser a
propriedade privada um direito individual a condiciona a um uso que cumpra uma função social.
Entretanto, é muito comum que as condutas que vão ensejar ao cumprimento de acordo com essa
função social sejam traçadas pelo próprio Estado, restringindo o uso da propriedade pelo seu
proprietário.

As intervenções estatais são instituídas pela Constituição e regulamentadas por leis federais,
por isso, ocorrem de forma limitada pelo ordenamento jurídico, para que sejam respeitadas os direitos
e garantias individuais.

A doutrina nos aponta princípios para as intervenções do Estado na propriedade: a) a função


social da propriedade e b) a prevalência do interesse público em face do interesse particular.

A União é quem detém a competência para legislar sobre o direito de propriedade (art. 22,II) , já a
competência administrativa, ou seja, de regulamentar o uso da propriedade privada,de efetivamente
restringi-la, em regra geral, é de todas as entidades federativas. Portanto, todas as intervenções têm
que ser feitas com base em lei.

1) TIPOS DE INTERVENÇÃO

3.1) LIMITAÇÕES ADMINISTRATIVAS

De acordo com Hely Lopes Meirelles, “limitação administrativa é toda imposição geral, gratuita,
unilateral e de ordem pública condicionadora do exercício de direitos ou de atividades particulares às
exigências do bem-estar social. Derivam do poder de polícia e se exteriorizam em imposições
unilaterais e imperativas, sob a tríplice modalidade positiva (fazer), negativa (não fazer) ou permissiva
(permitir fazer)”.

Exemplo: lei que institui normas de higiene para hospitais em um município; decreto que impõe
como se deve organizar o recolhimento de lixo de hospitais.

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2) OCUPAÇÃO TEMPORÁRIA

A ocupação temporária é a utilização transitória de bens imóveis particulares pelo Poder Público, para
a execução de obras, serviços ou atividades públicas ou de interesse público.

De acordo com José dos Santos Carvalho Filho, são suas características principais:
a) são imposições de caráter não-real;
b) só incidem sobre a propriedade imóvel.
Assevera Maria Sylvia Zanella di Pietro que o artigo 3 da Lei 1.021/03 estabeleceu que seriam
definidas em regulamento as regras e formalidades para a ocupação temporária de imóveis,
quando for indispensável à execução de obras e para a devida indenização aos particulares.
Entretanto, não existe um único tipo de ocupação temporária. Algumas são instituídas
somente sobre propriedade imóvel, como é o caso do Decreto lei 3.365/41, outras, também
sobre bens móveis e serviços como ocorre com a ocupação na Lei 8.666/93 e da Lei 8.987/
95. Por isso, alguns autores, como é o caso do Prof. Hely Lopes Meirelles não identificam
somente os bens imóveis.
c) objeto: a necessidade de realização de obras e serviços públicos normais
c) tem caráter transitório; entretanto, somente diante do caso concreto é que será definido o
prazo de duração.
d)é uma medida auto-executória, ou seja, independe de aquiescência do particular e da
manifestação do Poder Judiciário para efetivamente ocorrer.

e)Tem natureza gratuita (quando a utilização for por um período muito curto e não causar dano ao
proprietário ou estiver vinculada à desapropriação) ou onerosa (como se fosse um arrendamento
forçado).

Pode ocorrer quando a Administração Pública precisa colocar equipamentos em um terreno


para construir uma estrada, quando precisa de escolas, clubes para fazer a vacinação de crianças ou
eleições.

2) REQUISIÇÃO ADMINISTRATIVA

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É uma medida de intervenção estatal que diante de um perigo público iminente poderá
requisitar bens móveis, imóveis e serviços particulares, gerando direito à indenização posterior
caso ocorra efetivamente dano (art. 5, XXV).

A grande diferença da ocupação temporária é que nesta a necessidade não se respalda em um


perigo público iminente; e para alguns recai somente sobre bem imóvel.

São suas características:


a) são imposições de caráter não-real;
b) incidem sobre a propriedade imóvel, móvel e serviços.
c) objeto: evitar ou sanar um perigo público que esteja prestes a acontecer ou efetivamente
ocorrendo.
c) tem caráter transitório; entretanto, somente diante do caso concreto é que será definido o
prazo de duração, que deverá extinguir juntamente com situação de perigo.
d)é uma medida auto-executória, ou seja, independe de aquiescência do particular e da
manifestação do Poder Judiciário para efetivamente ocorrer.

e)Tem natureza gratuita

a) somente haverá direito à indenização quando ocorrer dano.

Ocorre quando há um incêndio e o Corpo de Bombeiros precisa de carros, casas e pessoas para
ajudar a atender às vítimas.

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6- SERVIDÃO ADMINISTRATIVA
A servidão administrativa é a instituição de um ônus real de uso pela Administração ou por
seus delegatários sobre imóvel privado, para permitir a execução de obras ou serviços públicos de
interesse público, mediante indenização dos prejuízos efetivamente sofridos pelo proprietário do bem.
Somente uma parcela do bem pode ser objeto de servidão e ter seu uso compartilhado ou
limitado para atender ao interesse público.
O Decreto lei n. 3.365/41 em seu art. 40, regula este ato interventivo e como esse decreto
disciplina as desapropriações por necessidade ou utilidade pública, o procedimento da servidão
deverá segui-la.
Na servidão administrativa alguns atributos do direito de propriedade são partilhados com
terceiros, então, ao contrário da desapropriação, não haverá perda da propriedade.
São suas principais características:
a)trata-se de um direito real de uso, por isso ao final do procedimento administrativo ou
judicial deverá ser levada a registro.
b)somente incide sobre bem imóvel;
c)tem natureza de definitividade, ou seja, é instituída para perdurar no tempo, por isso não
se adequa a situações de urgência e nem de perigo.
a) Não é uma medida auto-executória. Somente se opera mediante acordo entre as
partes em um processo administrativo com ampla defesa ou com autorização judicial
após sentença judicial. Exceto se se tratar de servidão instituída por lei.
b) Em regra o instituto é gratuito, somente haverá indenização se houver dano.

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TOMBAMENTO

O Tombamento é uma forma de intervenção do Estado na propriedade privada que tem por
objetivo a proteção do patrimônio cultural brasileiro, conforme relata a Constituição.

A)EFEITOS

O Decreto-lei 25/37 destaca um capítulo sobre os efeitos do tombamento, abaixo apontaremos os


principais.

No caso de transferência da propriedade dos bens de que trata este artigo, deverá o
adquirente, dentro do prazo de trinta dias, sob pena de multa de dez por cento sobre o respectivo
valor, fazê-la constar do registro, ainda que se trate de transmissão judicial ou "causa mortis".

Na hipótese de deslocação de tais bens, deverá o proprietário dentro do mesmo prazo e sob
pena da mesma multa, inscrevê-los no registro do lugar para que tiverem sido deslocados.

A coisa tombada não poderá sair do país, senão por curto prazo, sem transferência de
domínio para fim de intercâmbio cultural, a juízo do Conselho Consultivo do Serviço do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional.

Os bens tombadas não poderão, em caso nenhum, ser destruídas, demolidas ou mutiladas,
nem, sem prévia autorização, e nem ser reparadas, pintadas ou restauradas;

Não se poderá, na vizinhança da coisa tombada, a não ser com autorização administrativa,
fazer construção que impeça ou reduza a visibilidade, nem nela colocar anúncios ou cartazes, sob
pena de ser mandada destruir a obra ou retirar o objeto, impondo-se neste caso a multa de cinqüenta
por cento do valor do mesmo objeto.

As coisas tombadas ficam sujeitas à vigilância permanente do Serviço do Patrimônio Histórico


e Artístico Nacional, que poderá inspecioná-los sempre que for julgado conveniente, não podendo os
respectivos proprietários ou responsáveis criar obstáculos à inspeção.

Em caso de alienação onerosa de bens tombados, pertencentes a pessoas naturais ou a


pessoas jurídicas de direito privado, a União, os Estados e os Municípios terão, nesta ordem, o
direito de preferência ( prazo de 30 dias).

É nula a alienação realizada com violação do direito de preferência, ficando qualquer dos
titulares do direito de preferência habilitado a seqüestrar a coisa e a impor a multa de vinte por cento
do seu valor ao transmitente e ao adquirente, que serão por ela solidariamente responsáveis.

O direito de preferência não inibe o proprietário de gravar livremente a coisa tombada, de


penhor, anticrese ou hipoteca.

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DESAPROPRIAÇÃO OU EXPROPRIAÇÃO
NOÇÕES GERAIS
A desapropriação é a forma mais drástica de intervenção do Estado na propriedade privada,
pois a Administração Pública ou seus delegatários, unilateral e compulsoriamente retiram a
propriedade do seu proprietário e a tomam para si.

Tem como fundamento a necessidade pública, utilidade pública ou o interesse social:


a) Necessidade Pública: o Estado, para atender a situações anormais (de emergência) que
se lhe apresentam, adquire bens de terceiros. Essa desapropriação é de interesse do Poder Público;
( Decreto-Lei n. 3.365/41, art. 5º, alíneas “a” até “d”).
b)Utilidade Pública : o Estado, para atender a situações normais, adquire bens de terceiros
(Decreto-Lei n. 3.365/41, art. 5º, alíneas “e” até final). Essa desapropriação é de interesse do Poder
Público;
a) Interesse social:é a desapropriação em que o Estado, para impor um melhor aproveitamento
da propriedade em virtude do interesse da sociedade, adquire a propriedade de alguém, e em
regra repassa a terceiro (Lei ln. 4.132/62, art. 2º). Esse também é fundamento das
denominadas desapropriações extraordinárias ( Estatuto da Cidade, Reforma Agrária e
Confisco). Essa desapropriação é de interesse da coletividade.

Em regra geral, a perda da propriedade é garantida mediante prévia e justa indenização em dinheiro
(art. 5, XXIV da CF ), salvo os casos em que o pagamento é feito com títulos da dívida pública (art.
182, parágrafo 4º, III, CF) ou da dívida agrária (art. 184 e parágrafos, CF); ou ainda, pode não haver
pagamento algum, no caso da desapropriação confiscatória ( art. 243 da CF).
As desapropriações são formas de aquisição originária de propriedade, por isso desaparece o vínculo
com o proprietário e também os possíveis ônus encontrados na propriedade.
O procedimento desapropriatório não é auto-executório, por isso ou se procederá mediante acordo
em escritura pública ou será mediante ação judicial de desapropriação.

ESPÉCIES DE DESAPROPRIAÇÃO
As espécies ou tipos de desapropriação são estabelecidos pela Constituição, não podendo ser
criados novos tipos por legislação infraconstitucional.

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Podemos dividir a desapropriação em: 1) ordinárias ou clássicas e 2) extraordinárias ou


especiais.
2.1) Desapropriações ordinárias

São as desapropriações quem têm como fundamento a necessidade e utilidades públicas ou o


interesse social (art. 5º, XXIV, primeira parte, da CF).
Se ela tiver como fundamento a necessidade ou utilidade públicas seguirá as normas gerais
do Decreto-lei 3.365/41. Se for por motivo de interesse social seguirá as normas da lei federal n.
4.132/62 e subsidiariamente o referido decreto-lei.
Regra geral, pode recair sobre qualquer bem de conteúdo econômico.
A indenização é prévia, justa e em dinheiro.
A competência para declarar compete em regra, somente às entidades federativas, através de
ato dos chefes do Poder Executivo ou de ato ou lei do órgão do Poder Legislativo.
Já a competência executória, ou seja, a de iniciar e terminar o procedimento administrativo ou
judicial tanto pode ser das entidades federativas através de seus órgãos, quanto das entidades que
compõem a Administração Indireta, quanto dos delegatários.

2.2) Desapropriações extraordinárias ou especiais


Elas são assim denominadas somente são usadas como forma de aplicação de sanção ao
proprietário que está descumprindo as normas estabelecidas legalmente para o uso da propriedade.
De alguma forma ele está descumprindo a função social da propriedade e como sanção perderá a
propriedade para o Poder Público, para que este possa dar tal função a ela.

O objetivo, procedimento e o aspecto indenizatório dessas desapropriações se diferem da


desapropriação ordinária e tem respaldo constitucional.
Tais desapropriações são:
a) desapropriação para fins urbanísticos ou do Estatuto da Cidade (art. 182, parágrafo 4º, III)
b) desapropriação rural ou para reforma agrária ( art. 184 e parágrafos)
c) desapropriação confisco ou desapropriação-expropriação ( art. 243)

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1) PROCEDIMENTO DAS DESAPROPRIAÇÕES ORDINÁRIAS

O procedimento se divide em duas fases : a ) fase declaratória e b) fase executória que será
administrativa quando houver acordo com o proprietário ou judicial.
O procedimento se inicia com a fase declaratória, que é feita pelo chefe do Poder Executivo através
decreto do Presidente da República, governador ou prefeito ou pelo Poder Legislativo, através de lei
ou resolução, cumprindo, neste caso, ao Executivo, praticar os atos necessários à sua efetivação (art.
7 e 8 do decreto-lei ).
A declaração deve conter obrigatoriamente:
a) identificação do bem;
b) fundamento
c) dispositivo legal em que se baseia o fundamento.

Na fase declaratória há somente a manifestação formal de interesse por aquele bem, mas ainda não
há a transferência da propriedade para o Poder Público. Mesmo assim, temos importantes efeitos
jurídicos:

a) direito de penetração: autorização para que a autoridade administrativa penetre nos


imóveis compreendidos na declaração para vistoria-los. As autoridades inclusive podem contar com o
auxílio de força policial.

B) início da contagem do prazo de caducidade do ato de declaração;

C) fixação do estado físico da coisa, para o que seja será calculado o seu valor e arbitrada a
indenização;

D) desobrigação do expropriante do pagamento das benfeitorias voluptuárias, que ainda


realize o proprietário;

E) desobrigação, para o expropriante, do pagamento das benfeitorias úteis, que o proprietário


ainda venha a realizar, salvo se autorizadas por ele próprio;

F)impossibilidade de deslocamento da coisa exproprianda para a circunscrição territorial


diferente daquela em que se deve efetuar a desapropriação.

A caducidade é a extinção do ato declaratório em virtude da inércia ou da desistência do


Poder Público na desapropriação. De acordo com o art. 10 do decreto-lei o prazo de caducidade
para desapropriações com fundamento na necessidade pública ou na utilidade pública é de cinco

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anos, e com fundamento no interesse social é de dois anos, iniciando-se a partir da expedição do ato
declaratório da desapropriação. No entanto a declaração poderá ser feita novamente posteriormente
a um ano da data da caducidade.

Posteriormente à fase declaratória é necessário que seja instaurado um procedimento


administrativo para que haja efetivamente a transferência da propriedade. Caso não haja acordo, ter-
se á que promover a ação judicial de desapropriação.

a) FASE EXECUTÓRIA ADMINISTRATIVA

Fala-se em fase executória administrativa ( extrajudicial, voluntária, amigável), quando as


partes chegam a um acordo quanto à indenização e o lavram através de escritura pública.

b) FASE EXECUTÓRIA JUDICIAL

Fala-se em fase executória judicial quando não houver acordo, e como a desapropriação não é auto-
executória, o Poder Público terá que promover uma ação de desapropriação nos moldes
procedimentais do Decreto-lei e subsidiariamente o Código de Processo Civil.

A manifestação judicial poderá ser de dois tipos:

a) homologatória; quando o proprietário do bem aceita, em juízo, a oferta pelo


expropriante
b) contenciosa: quando o proprietário e o expropriante não acordam em relação ao
preço, que terá que ser fixado pelo juiz.

DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA

Ocorre a desapropriação indireta quando o Poder Pública incorpora um bem de outro


proprietário sem promover o devido processo administrativo ou judicial. Trata-se de um
esbulho possessório.

O Decreto-lei aduz que os bens expropriados, uma vez incorporados ao Poder Público,
não podem ser objeto de reivindicação, ainda que fundada em nulidade do processo de
desapropriação. Qualquer ação, julgada procedente, resolver-se-á em perdas e danos (art.
35).

Caso tenha ocorrido o esbulho e houver destinação pública ao bem, somente terá direito o
proprietário ao valor da indenização. j

Maria Sylvia Zanella di Pietro ressalva que às vezes, a Administração não se apossa
diretamente do bem, mas lhe impõe limitações ou servidões que impedem totalmente o
proprietário de exercer sobre o imóvel os poderes inerentes ao domínio; neste caso,
também se caracterizará a desapropriação indireta.

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