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O Legado do Texas

Lorraine Heath

(Trilogia Texas 3.5)

Parceria LRTH + PRT

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Sinopse

Rawley Cooper amava Faith Leigh desde que se lembrava. Mas a crueldade de sua
infância o assombra e ele sabe que não merece Faith. Quando ela vai até ele na noite de seu
décimo nono aniversário, ambos cedem a tentação. Mas o beijo trocado reafirma o que ele
sempre soube: ele não poderá nunca tê-la em seus braços. Para proteger seu coração, ele
empacota suas coisas e vai para o oeste.
Faith sempre adorou o garoto que seus pais acolheram e criaram. Mas ela não tem a
certeza de que pode, alguma vez, perdoá-lo por sair da sua vida justo quando ela mais
precisava dele. Quando um telegrama urgente o força a voltar, seis anos mais tarde, Rawley
descobre que Faith é agora uma mulher a ser levada em conta.
Enquanto velhos sentimentos voltam à vida e novas paixões tomam posse, ambos
devem confrontar segredos de seu passado ou arriscar perder um legado de amor.
Dedicação
Para todos os leitores maravilhosos que esperaram pacientemente por vinte anos. . .

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Dedicatória

Para todos os leitores maravilhosos que esperaram pacientemente por vinte anos...

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Capítulo um

Agosto de 1909

O telegrama o encontrou em Cheyenne, as palavras simples e diretas ao ponto: Eu


preciso de você em casa. Com amor, mamãe.
Ele cavalgou até o rancho onde estivera trabalhando como capataz, se demitiu,
empacotou seus parcos pertences, os levou depressa ao depósito ferroviário, e subiu no
primeiro trem que o levaria ate onde ele precisava estar o mais rápido possível. Leighton,
Texas; uma cidade, uma vez descrita como estando no lado mais afastado de lugar nenhum,
mas quando ele partiu, estava plena de atividade e promessas. O caminho de ferro tinha
mudado seu destino.
Não, isso não era propriamente certo, ele meditou, enquanto se sentava ao lado de
uma janela, no pesado trem e observava a vastidão vazia passar. Dallas Leigh tinha criado a
cidade, a partir do nada, atraiu os barões dos caminhos de ferro para garantir que uma linha
ferroviária passasse por sua cidade para aumentar suas chances de prosperar, e ao fazê-lo,
tinha alterado a paisagem e as vidas de muito boa gente. Ele, junto com sua esposa, tinha
mudado a vida de Rawley Cooper, também, o haviam retirado do buraco do inferno que
havia sido sua infância e, lhe dado mais oportunidades do que ele merecia. Esta foi a razão
pela qual Rawley não hesitou em deixar tudo para trás quando recebeu o telegrama.
Embora, se fosse honesto consigo mesmo, tinha que admitir que estava mais do que
pronto para voltar. Ele sentia falta do lugar, sentia falta do povo. Sentia falta de Faith.
Ele esperara que o tempo e a distância a fizessem sumir de suas memórias, mas ela
estava tão presente como sempre, e não se passava uma noite em que ele não sonhava com
ela.
Faith Leigh era a mulher mais bonita em quem ele já tinha posto os olhos, embora
não a tivesse visto sempre sob este prisma. Quando ela nascera — enrugada, vermelha e
berrando mais do que qualquer bezerro que ele tinha ouvido até aquele momento — ele
proclamou que ela era tão feia que doía. Mas ela conseguiu rapidamente esgueirar-se para
dentro do seu coração — não que ele tenha ficado muito satisfeito com isso.
Ele era, provavelmente, entre uma década e uma dúzia de anos mais velho que ela.
Sua verdadeira idade era uma incógnita, porque o homem que se intitulara pai de Rawley,
não prestara muita atenção aos detalhes de sua vida. Não foi até que Rawley foi viver com
Dallas e Cordelia Leigh, que ele aprendeu que as pessoas contavam o tempo que passavam
nesta Terra. Desde que eles o acolheram em uma noite fria em Dezembro de 1881, esta
tornou-se a data em que eles honravam seu nascimento. Ele não podia negar que era um
bom dia para um pouco de folia, porque marcava o momento em que sua vida se
transformou de uma mera existência em uma vivência real.
Quanto a Faith, sua chegada fora em Maio de 1884, devidamente anotada e
registrada na Bíblia da família. A última vez que a tinha visto fora há seis anos, na noite em
que ela fez dezenove anos, depois de uma celebração que, sem dúvida, fizera um bom
número de homens — e, possivelmente, algumas mulheres — saudarem o novo amanhecer

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com uma cabeça dolorida. Ele também suspeitava que um punhado de cowboys havia
acordado com um pouco de dor no coração, porque havia algo em Faith que fazia um
homem desejar por coisas que nunca poderia possuir.
Ao longe, a cidade ficou à vista e, embora não estivesse exatamente como quando ele
saíra, ele a reconhecia em qualquer lugar — o Grand Hotel dominando o horizonte. Este
estivera à frente do seu tempo quando fora construído, em 1881. Ele havia visto muito mais
do país desde então, mas nada o lembrava mais de uma esplêndida e majestosa dama tanto
quanto este hotel, talvez porque ele, por muito tempo, adorara a mulher que o tinha
imaginado e construído: Cordelia Leigh.
Era estranho, todas as emoções ricocheteando através dele. Orgulho, alegria, um
pouco de remorso, um pouco de medo. Ele tinha poucas dúvidas de que sua partida abrupta
havia deixado muitas perguntas, e alguns poderiam estar querendo as respostas com o seu
retorno — mas se ele conseguisse fazer as coisas do seu modo, elas iriam para a sepultura
com ele.

*****

Faith Leigh estava de pé na plataforma da estação ferroviária, e observava a espiral de


fumaça saindo do gigante de ferro à distância, à medida que este se aproximava dela. Seu
estômago deu um nó, e ela respirou fundo para aliviar a tensão que vinha crescendo desde
que ela descobrira que Rawley Cooper estava a caminho de casa. Ela sabia que esse dia
chegaria, mais cedo ou mais tarde. Um acerto de contas. Uma chance para provar que ela
não era mais a garota tola de dezenove anos de idade que havia se jogado nele e humilhado
a si mesma no processo.
A última vez que o vira tinha sido estranho, na melhor das hipóteses. Ela não esperava
que fosse diferente desta vez, especialmente quando ele descobrisse todas as verdades
sobre ela — e ele descobriria. Ela nunca fora capaz de esconder nada dele. Uma vez ele fora
seu melhor amigo, seu confidente de maior confiança, mas depois, quando ela mais
precisava dele, ele havia cavalgado para fora da sua vida. Não que ela o culpasse, não lá no
fundo. Mas a garota que tinha sido, ainda guardava rancor.
Ela não conseguia se lembrar de uma época em que não o amara. Ela não tinha
aprendido a andar porque sua mãe e seu pai a incentivaram; ela tinha dado aqueles
primeiros passos, porque estes lhe davam a oportunidade de acompanhar Rawley. Não que
suas memórias chegassem tão longe, mas ela se conhecia o bastante para saber o que
sempre a tinha motivado, para saber que a maior parte de suas ações foram um esforço para
acompanhar o menino mais velho que seus pais haviam acolhido.
O trem parou na estação com um retumbar de vapor e um guincho de freios. As
pessoas desembarcaram em um frenesi, como se ansiosas para chegar onde estavam indo ou
para saudar as pessoas que tinham vindo ver.
Todas, exceto ele.
Como se não tivesse pressa, como se tivesse o dia todo e o mundo fosse esperar por
ele, Rawley Cooper desceu do trem, segurando a sela pendurada em suas costas com uma
mão no ombro. Ele era como um grande copo de água que mataria a sede de qualquer
mulher. Maldito fosse. Os últimos seis anos serviram para deixa-lo mais bonito, e o corpo,

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que o trabalho duro ao ar livre havia moldado até a perfeição, havia, de alguma forma,
conseguido se tornar ainda mais agradável ao olhar.
Ele caminhou em direção a ela em passo lento, despreocupado, que demonstrava
nenhuma pressa para estar em algum lugar, os saltos das suas botas fazendo barulho contra
a plataforma de madeira, e ela podia senti-la tremendo com cada passo que ele dava, assim
como ela imaginava que as mulheres tremiam sempre que ele lhes lançava aquele olhar
sensual com olhos tão escuros a ponto de serem quase pretos, tão pretos quanto seu cabelo.
Assim como ela tremia agora, que ele estava perto o suficiente para ela ver que ele não tinha
se barbeado recentemente. A curta barba por fazer acrescentava uma robustez a sua
mandíbula afiada.
Quando ele a alcançou, usou o dedo polegar da mão livre para inclinar seu preto
chapéu Stetson para acima da testa, e as poucas sombras que se atreveram a tocar em seu
rosto recuaram. Nos cantos de seus olhos, pequenas linhas se espalharam, linhas que não
eram tão profundas antes. Uma tristeza pairava em torno dele como um sobretudo já gasto,
projetado para proteger contra os duros elementos, e ela se perguntou se ele temia vê-la
tanto quanto ela temia vê-lo.
— Faith. — Nenhum riso, nenhum sorriso que uma vez iluminara seu mundo. Apenas
aquela única palavra, dita sem qualquer emoção, sem nenhum indício sobre o que ele estava
sentindo — e isso, em si mesmo, comunicava tudo.
Ela imaginara esse encontro mil vezes, não havia pregado olho a noite anterior,
praticando justamente a inflexão certa, as palavras certas para cumprimentá-lo, depois de
todo esse tempo. Elas pairavam na ponta de sua língua, mas seu punho bateu nele primeiro
— literalmente — e ela sentiu a chocante dor viajar ascendentemente por seu braço, antes
mesmo de perceber que dera um rápido soco na bochecha dele, logo abaixo do olho, que fez
a cabeça dele estalar para trás e sua cela atingir as pranchas de madeira com um baque que
as fez tremer.
Havia emoção agora, tumultos no rosto dele, em seus olhos. Fúria. Choque.
Descrença.
— Que diabos, Faith?
— Isso foi por partir sem dizer adeus.

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Capítulo dois

Faith Leigh tinha o hábito de dizer o que pensava e de apanhá-lo de surpresa. Com
base na velocidade e força do soco, ela esteve se guardando por seis longos anos, de repente
todos esses meses afastado pareceram uma eternidade e vê-la novamente foi um bálsamo
para a sua alma. Seu riso era áspero, cheio de dor e de um pouco de auto-aversão.
— Eu merecia isso.
— Eu não teria de bater em você se você não o tivesse feito. Por que você partiu,
Rawley?
— Você sabe por que, Faith.
Suas bochechas tornaram-se vermelhas.
— Eu estava bêbada.
Balançando a cabeça, levou tudo dentro dele para não deixar cair seu olhar para a
ponta de suas botas.
— Eu não estava.
Graças a Deus por isso, porque caso contrário, um inferno de muito mais atrito
existiria entre eles agora.
— Eu não esperava ninguém para me buscar, — acrescentou. Se ele soubesse que ela
viria recebê-lo, ele poderia ter se preparado um pouco mais, embora ele soubesse que,
eventualmente, eles se cruzariam. Ele esperava que fosse mais tarde, no rancho, sem
testemunhas e olhares de estranhos. Por alguma razão, ele esperava lágrimas, mas a mulher
em pé, diante dele agora, não era a garota que ele abandonou.
Ela usava um vestido azul marinho com uma saia estreita que não permitia ignorar a
largura dos quadris. Eles se tornaram um pouco mais abrangentes nos últimos anos, mas
também, agora, ela tinha um pouco mais de carne sobre ela em todos os lugares. De
repente, o constrangimento estava de volta, porque ele não deveria estar percebendo tudo
isso; não deveria ter notado como a maturidade tinha adicionado uma graça a suas
características, ou o quão grato ele estava que os botões da blusa eram fechados até à
garganta e que suas mangas bufantes estreitaram no cotovelo e eram justas até os pulsos,
então ele não poderia pousar seu olhar sobre a carne nua. Em um ângulo desenvolto, ela
usava um pequeno chapéu com flores azuis claras, e ele não queria pensar sobre removê-lo e
soltar seu cabelo de ébano para ver se ele era tão longo quanto tinha sido quando ele tinha
partido.
— A charrete está ali, — disse ela, como se ciente do desconforto ameaçando
reassentar entre eles.
— Deixe-me pegar meu cavalo. Ele está no vagão do gado.
— Achei que você não iria se dar ao trabalho de trazer o seu cavalo quando o Tio
Houston poderia facilmente arranjar-lhe um.
Houston Leigh vivia criando, treinando e vendendo cavalos. Rawley calculava que
existiam poucas pessoas, no estado, que não tivessem pelo menos um garanhão, égua, ou
castrado vindo do estoque Leigh, incluindo o que estava esperando por ele.

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— Por que deixar um bom cavalo para trás? — Especialmente quando ele e o
garanhão estavam confortáveis um com o outro e sabiam as peculiaridades de cada um. Ele
abaixou-se para pegar a sua sela.
— Rawley Cooper!
Ele mal teve tempo para fincar seus pés e se preparar antes que Maggie May Leigh se
lançasse para ele. Ele a pegou e rodopiou, saboreando o abraço apertado de seus braços
envoltos em seu pescoço, fazendo voar seu chapéu. A filha mais velha de Houston era como
sua mãe, pequena e baixinha. Se ele não soubesse quão teimosa e determinada ela poderia
ser, ele poderia ter temido que pudesse quebrá-la, elevando-se sobre ela como ele fez.
— Coloque-me no chão, seu idiota. Eu não sou mais uma garotinha.
Ela certamente não era, mas ele já sabia disso antes de partir. Ele fez o que ela lhe
ordenou, em seguida, estendeu a mão, pegou o chapéu, e colocando-o de volta em sua
cabeça, grato por saber que algumas coisas não mudaram. Com base na idade que ele
pensava que tinha, ela era cinco anos mais jovem do que ele, havia se agarrado aos seus
calcanhares até Faith aparecer e tornar-se sua pequena sombra.
— Pirralha, — ele reclamou, provocando-a com o apelido que tinha dado a ela
quando eles eram crianças, corajosamente tomando o tapa no ombro que ela lhe deu antes
de se afastar.
A bainha de sua fina saia preta envolvia seus tornozelos, e um laço preto muito bem
feito estava amarrado na gola de sua blusa branca. No alto de seus cabelos loiros assentava
um chapéu preto pequeno, sem ornamentos, o de uma mulher com uma missão. Seus olhos
verdes brilharam.
— Eu estava com medo de perdê-lo.
— Como você sabia que eu estava vindo?— A pergunta era estúpida em
retrospectiva. Os membros desta família não mantinham segredos uns dos outros, o que foi
a razão pela qual ele sempre foi tão reservado.
— Eu sou uma repórter. É o meu negócio saber o que está acontecendo por aqui. A
família está lhe dando a chance de descansar esta noite, mas estaremos todos juntos para
jantar amanhã.
— Estou ansioso por isso. — E ele quis dizer isso. O clã Leigh era um grupo imenso,
turbulento, indisciplinado, de pessoas que sabiam como fazer uma pessoa se sentir em casa.
Estendendo a mão, com a sobrancelha franzida, tristeza espelhada nos olhos dela, ela
agarrou seu braço, os dedos criando pequenos sulcos em sua jaqueta.
— Sinto muito sobre o tio Dallas.
Seu intestino apertou como se, junto com as palavras, ela lhe tenha dado um forte
golpe no estomago. Um calafrio de medo deslizou por sua espinha. Ele não tinha
experimentado este nível de receio desde que ele era um menino e tinha sido incapaz de se
defender.
— Dallas? O que aconteceu com Dallas?
Arregalando os olhos com alarme, ela olhou para Faith.
— Você não lhe disse?
— Mamãe não queria que ele se preocupasse, visto não haver mais nada a fazer, —
disse Faith, seu rosto uma máscara de culpa.

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— Que diabos está acontecendo, Faith? — Perguntou ele, observando como as
emoções lutavam em seu rosto — entre ser beligerante por causa de seu tom ou simpática
com ele — mas ele também viu a apreensão, a preocupação, e talvez até mesmo um pouco
de medo. Ela cruzou os braços sobre o peito como se necessitasse se proteger contra tudo o
que ia rolar para fora de sua língua.
— Papai tem tido algumas dores no peito. Você sabe que elas têm que ser ruins para
ele mencioná-las a alguém. Doc pensa que é seu coração. Papai pensa que é algo que ele
comeu. Mas ele desmaiou no rancho alguns dias atrás. Doc diz que ele tem que descansar.
Que deveria de ser a razão pela qual lhe tinham enviado o telegrama, — porque ele
era verdadeiramente necessário aqui. De repente, ele foi atingido pela culpa de ter partido,
em primeiro lugar.
— Eu vou pegar o meu cavalo.
Ele despediu-se de Maggie antes de se abaixar para pousar sua sela. Com passos
largos que eliminavam a distância entre ele e a parte traseira do trem, ele se aproximou do
animal que já havia sido descarregado para ele. Ele sempre gostou particularmente de pôneis
malhados, desde que os irmãos Leigh lhe deram um no primeiro Natal que passou com eles,
há mais de um quarto de século atrás. Este último, Shadow, ele tinha comprado pouco antes
de partir de Houston. Ele deu duas moedas ao atendente do posto antes de pegar o freio.
— Obrigado, Charlie.
— É bom ter você em casa, Rawley.
— É bom estar em casa. — Uma pequena mentira, pois ele desejava que as
circunstâncias fossem diferentes.
Ele encontrou-se com Faith, já sentada no banco da charrete calçando as luvas, jogou
a sela e alforjes no compartimento na parte de trás, e prendeu Shadow. O veículo balançou,
quando ele subiu no banco, ao lado da menina que andava constantemente atrás dele,
quando ele era um menino. Sem pensar, ele estendeu a mão para as rédeas, sua mão
roçando a dela enquanto ela fez o mesmo. Ambos congelaram. Ele detestou que ambos
reagissem da mesma forma, pois houve um tempo em que ela aninhava a mão
confortavelmente na sua, quando tudo o que ele queria era protegê-la.
— Eu posso guiar, — disse ela com sarcasmo.
— Eu sei que você pode. Eu só estou sendo um cavalheiro.
Ela virou a cabeça e segurou seu olhar. — Eu estou acostumada a fazer isto.
— Você sempre fez tudo o que se propunha, Faith. Você é a garota mais teimosa que
já conheci. Você não tem que provar nada para mim.
Fogo disparou para fora daqueles olhos castanhos escuros e foi rapidamente extinto.
Ela educadamente cruzou as mãos no colo. — Vá em frente.
Ele não discutiu mais, não queria perder mais tempo, então, simplesmente, pegou as
rédeas, açoitou os lombos dos dois cavalos, e sentiu a tensão diminuir um pouco à medida
que eles começaram a mover-se.
— Estou ansioso para chegar ao rancho. Quão ruim realmente está Dallas?
— Por que não o chamar de Papai?
Porque o homem que tinha conhecido como papai quando ele era um menino, tinha
sido um filho de uma cadela, mau e vingativo, que havia se aproveitado de sua mãe, levando-
a para longe da tribo Shawnee e tido uma criança dela que ele não queria. Mesmo depois de

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todos esses anos, mesmo sabendo que o homem estava morto, Rawley ainda se retraia e
sentia uma forte dor no estômago quando memórias dele e daquele tempo de sua vida,
vinham à tona. Dallas podia tê-lo criado, mas Dallas não era o seu pai. Aos olhos de Rawley
ele sempre foi muito grande, muito ousado, tão majestoso como a terra. Rawley nunca tinha
se sentido digno de reconhecer o homem como seu pai.
— Ele não é meu pai, — ele disse simplesmente.
— Mas você chama nossa mãe de Mamãe.
Por um longo tempo, ele simplesmente a conhecera como à senhora bonita. Quando
ela abriu os braços e coração para ele, ele tinha ido para ela com tudo o que ele era,
desesperado para preencher a dor que permaneceu com ele depois que sua própria mãe
uma bondosa e gentil alma que o amava, morreu.
— Isso é diferente.
— Importa-se de explicar como?
— Não por isso. Quão ruim está Dallas? — Ele perguntou novamente.
Ela deu um suspiro profundo, obviamente não satisfeita com a sua resposta ou com a
sua obstinada determinação de voltar ao tema, e ele quase sorriu porque ela sempre teve
muito menos paciência com ele, do que ele tinha tido com ela.
— Principalmente, ele está resmungão porque o Doc não quer que ele se canse. Você
conhece papai. Eu acho que ele não ficou parado em nenhum momento de sua vida.
Exceto no momento em que ele quase morreu, mas isso foi antes que Faith tivesse
surgido.
— Ele ainda está acamado?
— Na maior parte do tempo, ele está vagando pela casa, mas pelo menos ele não está
mais cavalgando. Ele estava sozinho, quando caiu do seu cavalo. Não sabemos quanto tempo
passou antes que alguém o socorresse.
Uma vez mais, seu estômago apertou. Ele não queria pensar em Dallas passando para
o grande Além. Como se sentindo a direção de seus pensamentos, Faith deu um tapinha no
seu joelho.
— Ele alegou que era apenas o calor e talvez fosse. Olhando para ele, você não
saberia que alguma coisa tinha acontecido.
Mas algo tinha acontecido, e Rawley não estava lá — por causa da mulher sentada ao
lado dele, alguém por quem pensamentos e sentimentos impróprios tinham florescido, e ele
não tinha certeza de que poderia mantê-los sob controle. Quando, uma noite, ela o desafiou,
ele percebeu que a sua contenção estava no limite e que facilmente seria perdida. E então, o
que seria deles?
Ele cresceu no seio da família dela, sabia que não era digno dela. Então, ele tinha
partido. Para protegê-la, para se proteger. No entanto, ele não podia lhe dizer tudo isso. Em
vez disso, ele mentalmente se repreendeu e auto-flagelou, por ter se tornado ainda mais
indigno, por não ter ficado e ser o homem que deveria ser, o homem que Dallas Leigh criou
para ser.
Olhando para ela, ele se deu conta do quanto ele sentira sua falta, de quão pouco
sabia sobre o que havia acontecido com ela desde que ele partiu. Parecia que, não importa
quão longe ou rápido ele viajou, ela estava sempre lá. Durante os anos que ele esteve
ausente, ele só tinha escrito cartas para Mamãe, e recebido notícias dela. Sempre que ele

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chegava à cidade seguinte, ele enviava-lhe um telegrama para deixá-la saber que ele estava
bem e um cartão postal para mostra-lhe o local. Há três anos, tornou-se mais fácil, com a
autorização do Congresso para a utilização da parte de trás do cartão para escrever algumas
linhas. Ele já não tinha que sentar e escrever uma longa carta para ela. Algumas frases, curtas
e doces, era tudo o que precisava para mantê-la a par de sua situação.
— O que você tem feito ultimamente, Faith? Seus poços de petróleo funcionaram? —
Depois de Spindletop, ela estava otimista que eles talvez encontrassem petróleo em algumas
das propriedades Leigh e, começou a trabalhar com técnicos habilitados para ajudá-la a
localizá-los.
— Eles nunca encontraram muito, — disse ela. — Eu perdi o interesse neles. Por
agora, principalmente, estou apenas cuidado do rancho.
Ele não estava surpreso que ela fosse responsável pelo rancho. Ela era a escolha
lógica, herdaria tudo isso algum dia.
— Como estão as coisas?
Ela se agarrou à oportunidade de falar sobre algo diferente de si mesma, o
crescimento das cabeças de gado, as contratações e demissões dos homens, os que tinham
falecido, os que tinham se aposentado. Ouvir com interesse, absorvendo o som de sua voz,
aqueceu-o de maneiras, que nada mais fez.
A estrada para a cidade não tinha mudado muito. Arame farpado em ambos os lados,
arame que ele colocou e reparou inúmeras vezes, arame que tinha mudado a indústria do
gado. Os longos dias a mover o gado já tinham acabado. Agora eles só tinham que levar o
gado para o trem. Ele se perguntou se chegaria o tempo em que já não haveria mais
cowboys. Às vezes ele se sentia como uma raça em extinção.
Ele virou os cavalos da estrada para um caminho estreito, que passava por baixo de
um arco, com os dois D's da marca que Dallas tinha começado a usar, quando ele se casou
com Cordelia McQueen, conhecida como Dee entre sua família e amigos. Não que Rawley
alguma vez a tenha chamado assim. A partir do momento que ela o fez dela, ela tinha sido
Mamãe.
Eventualmente a casa surgiu à vista. — Tão hedionda como eu me lembro, — disse
ele com carinho. Era uma monstruosidade, tinha a aparência de um castelo na pradaria.
Dallas tinha construído a estrutura maciça mais de trinta anos antes, em antecipação da
chegada de sua noiva por correspondência. Só que o destino tinha feito com que Amelia
Carson se apaixonasse por Houston Leigh quando ele foi enviado para ir buscá-la em Fort
Worth, em nome de Dallas.
— Quando eu era jovem, eu sempre me senti como uma princesa vivendo lá, — Faith
disse em voz baixa.
— Dallas tenho certeza, a estragou como se fosse uma.
— Você fez sua justa parte no estrago. É espantoso como eu aprendi a andar com
você me carregando para todos os lugares.
Surpreso, ele olhou para ela. — Você se lembra disso?
Ela balançou a cabeça. — Não, mas Mamãe disse-me vezes suficientes. “Que Rawley
Cooper nunca me deixava fora de vista.” E aparentemente, eu me assegurava disso,
esticando constantemente meus braços para você.

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O tom da sua voz soava a provocação, mas a forma como ele tomou conta dela, tinha
sido uma coisa séria. Ele tinha sido responsável por Cordelia Leigh perder seu primeiro bebê
— apesar de que todo o mundo lhe disse que não foi culpa dele. Ele sabia a verdade e, tinha
sido determinado em que nada ia acontecer para levar embora a sua amada filha.
Quando se aproximaram da casa, ele podia ver os edifícios, as cercas, toda a atividade
acontecendo. O trabalho no rancho Leigh parecia nunca abrandar ou terminar. Ele se
indagou se seria capaz de voltar a pegar o ritmo, como se nunca tivesse se afastado.
Então viu Dallas e Mamãe sentados na varanda da frente, na cadeira de balanço,
movendo-se lenta e preguiçosamente, um cão desconhecido descansando perto deles. Ele
mal teve tempo de perceber uma menina vestida de macacão e botas que estava sentada
entre eles antes que Mamãe a tivesse empurrado até que ela ficasse de pé. Ele parou a
charrete. As coisas pareciam acontecer a uma velocidade que tornava tudo impossível de
compreender.
A criança estava correndo escada abaixo.
— Mamãe!
Correndo atrás dela, o cão saltou da varanda.
Faith rapidamente desceu da charrete, correu em frente, pegou a menina antes que
ela chegasse muito perto dos cavalos, e rodopiou com ela, suas risadas ecoando alegremente
no ar.
Após usar o freio, Rawley desceu por sua vez, seus pés batendo no chão com um
baque, remexendo o pó, seu corpo já não parecendo ligado a seu cérebro, movendo-se
independentemente de quaisquer pensamentos que ele pudesse ter.
De repente, braços estavam em torno de suas costas, apertando com força,
segurando-o perto. Sua mamãe. Sua mamãe estava lá, acolhendo-o em casa. Porra, como ele
tinha saudades dela, o que foi, com certeza, óbvio para ela, devido ao modo um pouco forte
de mais que ele a abraçou de volta. Ele sempre amou a fragrância dela, o calor dela. Ela era
tudo o que era bom e limpo em sua vida.
Envolvendo as mãos em torno de seus braços, ela se inclinou para trás e sorriu para
ele. Seu rosto continha mais algumas rugas, o cabelo escuro mais alguns fios grisalhos, mas
ela ainda era um colírio para os olhos.
— Você parece bem, — disse ela, com tanta suavidade e ternura em sua voz que se
ele não fosse um homem adulto, ele poderia ter chorado.
Quando ela o largou e deu um passo atrás, Dallas avançou, seu cabelo escuro e
bigode polvilhados de branco, mas ele ainda parecia capaz de comandar o mundo pelo modo
como ele apertou a mão de Rawley e lhe deu um tapa no ombro.
— Bem vindo ao lar, filho.
Filho. Dallas o tinha chamado assim através dos anos, mais vezes do que ele poderia
contar e, sua garganta sempre apertava à medida de que a verdade o bombardeava: Ele não
era o filho do homem. O filho de Dallas estava sepultado em uma cova debaixo de um
moinho de vento perto, por causa da covardia de Rawley. Ainda assim, ele respondeu com
um aceno brusco, grato por Dallas parecer mais robusto do que ele esperava.
Um canto da boca de Dallas ergueu-se. — Faith lhe deu essa mancha negra que está
se formando na sua bochecha?

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Ele esperava que seu soco não tivesse deixado uma marca, mas considerando a forma
como sentia a bochecha, ele imaginou que ficaria pior amanhã.
— Parece que ela levou a peito a forma como eu parti.
— Ela o fez, de fato.
— Ela me contou sobre seu coração, mas Dallas, você não é tão velho. — Dallas riu.
— Filho, eu sou o homem mais velho que eu conheço.
Ele tinha sessenta e três, o que era bastante velho para a vida que ele tinha vivido,
mas Rawley não poderia deixar de acreditar – de ter esperança — que ele tinha mais alguns
anos pela frente.
Rawley poderia ter dito mais alguma coisa, mas ele estava distraído, sua atenção
focada em Faith e na criança, empoleirada em seu quadril que o fez lembrar-se de Faith
quando ela era desse tamanho. A criança estava falando sem parar, palavras que ele não
podia ouvir, mas Faith apenas balançava a cabeça e sorria, seus olhos, ocasionalmente
alargando, como se ela estivesse impressionada.
Faith deve ter sentido seu olhar perfurando-a, porque ela finalmente olhou para ele, e
um profundo rubor escarlate tomou conta de seu rosto, ruborizando suas bochechas. O
sorriso fulminante dela quando começou a andar, o alertou de que ele não tinha visto um
verdadeiro sorriso dela desde que ele chegou, não que ele realmente esperasse por um. Ele
deveria ter lidado melhor com as coisas, na última vez que estiveram juntos. Ele percebia isso
agora.
O cão cheirou suas pernas, desinteressou-se e se afastou. Seus pais se separaram
como se fossem o Mar Vermelho e ela fosse Moisés. Ela ergueu seu pequeno e impertinente
queixo. Seus olhos castanhos tinham um desafio e uma ameaça, como se temesse que ele
pudesse fazer alguma coisa para causar danos à criança, a que segurava, a que lhe tinha
chamado Mamãe. Quando, no inferno, ela tinha casado, e por que diabos ninguém lhe tinha
dito nada?
— Callie, este é o seu tio Rawley.
Em seguida, a menina sorriu para ele e seu peito ameaçou implodir, um aperto tão
forte tornando quase impossível respirar. Ela era sua mãe de novo, doce, inocente, pura.
Acenando para ele, ela aninhou a cabeça no ombro de Faith.
— Esta é minha filha.
— Eu percebi. — Ele não tinha a intenção de que as palavras saíssem tão concisas,
mas mil perguntas o estavam bombardeando.
— Parabéns. Eu não sabia que você tinha se casado.
— Não me casei.

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Capítulo três

Ela deveria ter dito a ele, deveria tê-lo preparado. Ela merecia a desaprovação de sua
mãe, o olhar dela através dos olhos estreitos porque Mamãe insistiu com Faith que ela
precisava dizer a Rawley sobre Callie, antes de chegar ao rancho, mas o momento certo para
fazê-lo nunca chegou — ou talvez ela não o estivesse procurando.
— Eu dei à luz uma filha fora do casamento — não era algo que facilmente surgisse
numa conversa. Ou talvez ela simplesmente temesse sua censura, seu julgamento. Houve um
momento em que sua opinião importava mais do que respirar.
De repente, ele bateu as mãos grandes juntas, fazendo-a saltar, e abriu os braços para
Callie. — Quer vir com seu tio Rawley?
Sua voz tinha tanta ternura, tanta devoção, que ele foi, uma vez mais, a pessoa que
ela sempre adorara. Toda a raiva e ressentimento que se tinham acumulado desde sua
partida diminuiram um pouco, fazendo-a perceber o quão tola tinha sido ao pensar que ele,
de todas as pessoas, iria julgá-la. Nunca foi a sua forma de agir. Quando ela estava com
ciúmes de algumas das outras meninas e tentava recrutá-lo para caçoar delas — mesmo que
fosse quando estavam sozinhos, tranquilamente sentados sob as estrelas, sem ninguém por
perto para ouvir — ele se recusava a cooperar, para não dizer nada indelicado sobre
ninguém.
— Eu não estou no lugar delas.
Callie, que nunca tinha sido simpatica com estranhos, estava meio nos braços de Faith
e meio nos de Rawley, antes que Faith pudesse reagir, suspensa entre os dois, juntando-os,
restabelecendo um vínculo que ela temia ter sido rompido com a sua partida. Com uma
gargalhada auto-consciente, ela rapidamente liberou as pernas de sua filha, confiante de que
ele tinha um firme controle sobre a preciosa criança, e não iria deixá-la cair. Ela não quis
considerar quão certo Callie parecia, equilibrada em seu quadril magro, com um de seus
braços finos pendurado em seu pescoço, seus olhos castanhos brilhando de alegria, e seu
sorriso grande o suficiente, para revelar quase todos os seus dentes, incluindo a lacuna onde
ela recentemente perdera seu primeiro.
— Quantos anos você tem? — Perguntou Rawley.
— Cinco. — Com os dedos bem abertos, ela pressionou a palma da mão no nariz dele,
para que ele pudesse facilmente contar os anos.
— Bem, você é uma menina grande, não é?
— Uh — huh. — Ela balançou a cabeça com força suficiente para que suas tranças
marrons balançassem contra os ombros.
— Quantos anos você tem?
— Não tenho bem a certeza. Cerca de trinta anos, eu acho.
Ela riu, o tilintar doce, inocente, de uma criança que nunca tinha sido magoada. —
Você é engraçado.
Com um sorriso, ele enfiou a mão no bolso e tirou um pedaço de rebuçado de
salsaparrilha. — Quer um pouco?
Callie assentiu com entusiasmo. Continuando a segurar a menina, ele conseguiu partir
em os dois e entregar-lhe um pedaço. O coração de Faith se apertou tão dolorosamente com

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as memórias de todas as vezes que ele compartilhou seus doces com ela, que ela receou que
lágrimas inundassem seus olhos.
— Rawley Cooper, você sabe bem que não deve estragar seu jantar, — Mamãe
criticou, o carinho em sua voz desmentindo qualquer bronca que ela possa ter sugerido.
— Eu ainda vou estar com fome suficiente para comer um cavalo. E você, Callie?
Ela balançou a cabeça, tomando o doce para fora da boca. — Nós não comemos
cavalos. Nós comemos vacas. Não galinhas, nem porcos, nem coelhos.
— Sério? — Ele perguntou, como se realmente estivesse interessado em seus hábitos
alimentares.
Ela assentiu com a cabeça. — Vovô uma vez comeu uma cobra. — Ela franziu o rosto.
— Que nojo. Eu não gosto de cobras.
— Eu também não.
— Bem, ninguém vai comer cobras esta noite, — disse Mamãe.
— Vamos. Tenho certeza de que o cozinheiro já tem o jantar à nossa espera de nós.
— Eu preciso cuidar da charrete e dos cavalos, — disse Rawley.
— Pete já está cuidando disso, — Papai disse a ele antes de levantar um braço e
apontar para o local no rancho onde um peão já estava tratando do cavalo e levando tudo
para o celeiro.
Rawley se virou, concedendo ao homem envelhecido um largo e genuíno sorriso, e
Faith desejou ter sido cumprimentada com o mesmo sorriso de estou-contente-de-te-ver.
— Ei, Pete.
— Ei, Rawley. Estou contente por ter você de volta.
— Também estou contente por estar de volta.
Embora Faith ouvisse a verdade em seu tom de voz, não pode evitar, de achar que ele
poderia estar se sentindo um pouco desorientado, ao descobrir que muito pouco era o
mesmo, desde que ele partiu.
Mamãe passou um braço em volta de sua cintura. — Você está mais magro.
Não está mais magro, pensou Faith. Ela podia ver a evidência de seus músculos
preenchendo a manga do paletó enquanto segurava sua filha.
— Você provavelmente vai querer lavar-se após a sua viagem, — sua mãe continuou.
— O seu antigo quarto, no andar de cima, está pronto para você.
Um lampejo de surpresa cruzou seu rosto, sem dúvida, porque ele tinha saído de
casa, anos antes de partir.
— Callie e eu estamos vivendo em sua cabana, — Faith disse rapidamente, chamando
sua atenção. Com ela, ele bloqueou suas emoções, para que ela não pudesse perceber o que
ele estava pensando, e isso a perturbou.
— Se você quiser ficar lá, podemos arrumar as malas e voltar para a casa.
— Não, está tudo bem. Fique onde está.
Perguntou-se se a sua resposta significava que ele só ia estar aqui temporariamente.
Temendo que ele poderia questioná-la sobre os detalhes de sua vida, se ela questionasse a
dele, ela não se preocupou em perguntar o que ele tinha feito desde que partiu. Ela sabia
que ele estava trabalhando com gado, mas, talvez, ele também tivesse conhecido alguém. No
entanto, se tivesse, ele não iria trazê-la com ele?

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— Vou levar Callie. Ela está toda pegajosa. Seu rosto e mãos precisam ser bem
lavados.
— Nããão! — Sua filha gritou, enterrando o rosto na curva do pescoço.
— Salve-me, tio Rawley.
Ele se sentiu como se tivesse sido chutado no coração e em algum tipo de perigo, ele
pareceu atordoado, um pouco abalado, incerto quanto à forma de lidar com a situação, a fim
de melhor protegê-la.
— Não seja pateta, — disse Faith, movendo os braços em volta de sua filha, até que
eles formaram uma barreira entre ela e Rawley, até que ela podia sentir a firmeza do seu
peito. Não estava mais magro, mesmo. Ela queria empurrar-se para ele. Em vez disso, ela
libertou Callie.
— Vou levá-la, — disse Mamãe com autoridade, o que fez Callie ir com ela sem
levantar qualquer tipo de problema.
Faith viu como sua mãe e seu pai começaram a caminhar em direção à casa, como
Rawley andou até o fim da varanda, onde Pete tinha deixado seus alforjes. Relutante, ela
seguiu-o, sabendo que tinha coisas que ela precisava dizer, se ela pudesse encontrar as
palavras certas. Mas ela tinha estado procurando por elas desde que ela descobriu que ele
estava voltando, e elas ainda lhe escapavam.
— Quem é o pai dela? — Ele perguntou sem rodeios, descendo, pegando os sacos e
atirando-os em cima de um ombro antes de se virar para encará-la.
— Só um cowboy sem planos para ficar.
— Ele deixou você? — A raiva deslizou através de sua voz. Se ele tivesse estado aqui
quando ela percebeu que estava grávida, ele provavelmente, teria perseguido o pobre rapaz.
— Nós não eramos… — Ela balançou a cabeça, colocou as mãos nos quadris, e chutou
a ponta do sapato no chão. Finalmente, ela levantou o olhar e encontrou o seu.
— É complicado.
— Não, não é, Faith. Ele estava com você, ele a engravidou, e ele simplesmente
ignorou e saiu de sua vida? Isso não é assim que funciona.
— Eu não queria casar com ele.
— Por que não?
— Porque ele não estava à altura. — Porque ele não era você.
Apesar de que sua resposta não ter explicado tudo, ela girou nos calcanhares e se
dirigiu para a casa, deixando Rawley com a certeza de que existia mais nesta história do que
Faith estava contando. Em outros tempos, ela confidenciava tudo para ele, mas sua partida
tinha criado distância entre eles – o que tinha sido sua intenção, só que ele tinha esperado
que apenas se afastassem, não que ela já não confiasse nele. Tanta coisa precisava ser dita,
tantas pazes a serem feitas, mas não agora, com o crepúsculo no horizonte e as pessoas
esperando por eles.
Percorrendo um caminho que ele já tinha cruzado centenas de vezes, ele deu um
passo para a varanda e entrou na casa, onde a fragrância conhecida flutuava em torno.
Nenhum outro lugar que ele já visitara cheirava assim, quente, acolhedor e amado. A entrada
era enorme, mas os tapetes abafaram o eco de seus passos quando ele se dirigiu para as
escadas. Ele se lembrou da primeira vez em que as tinha subido, o medo e a vergonha que o

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tinham acompanhado. Agora, ele movia-se com a confiança de um homem que se conhecia,
que sabia que seu lugar no mundo era onde ele queria que fosse.
No topo das escadas, virou-se para o corredor e foi até ao último quarto à esquerda.
A primeira noite que ele tinha ficado lá, Dallas tinha lhe dado uma chave para que ele
pudesse se trancar, bloquear outras pessoas fora. Mais tarde, deitado na cama, olhando para
o teto, ele sentiu-se seguro, uma paz estranha vindo sobre ele. Ele pensou que nunca iria
querer sair dali.
Era uma crença que ficou com ele, até à noite em que Faith tinha ido à sua cabana —
Empurrando de volta as memórias, ele abriu a porta e entrou no quarto onde ele dormiria
até sumir de novo.

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Capítulo quatro

— Eu tenho um cavalo, um bezerro e um cão — o vira-lata estava sentado, quieto e


em silêncio, prestando atenção ao que se passava na cadeira a seu lado — e uma galinha. Eu
quero um elefante. Você sabe o que é um elefante?
— Sei, — disse Rawley de seu lugar através da mesa para a garotinha, que ainda não
tinha parado de falar desde que eles tinham se sentado.
— Eu até já vi um.
— Eu também!
— Tivemos aqui um circo no verão passado, — Faith explicou antes que ele pudesse
perguntar onde ela tinha visto um. Poderia ter sido o mesmo espetáculo itinerante que ele
assistiu durante seu curto período no Colorado.
— Eu gosto de elefantes, — Callie declarou enfaticamente, olhando ansiosa para a
mãe.
— Nós não vamos ter um, — Faith disse pacientemente.
A criança, com um semblante sério, de novo, voltou sua atenção para ele.
— Você gosta de elefantes?
— Eu gosto de olhar. No entanto, eu não gostaria de ter um. Eles fazem uma grande
bagunça. Você teria que passar o dia tratando e limpando sua baia, em seguida, lavá-lo e
alimentá-lo. Você não teria mais tempo para brincar.
A sua pequena testa estava franzida como se estivesse pesando seriamente todos os
prós e contras de ter um elefante, contra suas outras opções.
— Eu sei nadar. Você sabe?
Ele calculou que, com esta pergunta, o tema dos animais já tinha passado.
— Sei.
— Eu costumo nadar no rio, mas só se alguém estiver assistindo. Quer nadar comigo?
— Talvez.
— Quando?
— Callie, você se lembra da regra sobre falar à mesa? — Perguntou Dallas.
A pequena fada torceu a boca e, pelo canto do olho, deu-lhe um olhar malicioso,
como se, não o encarando diretamente, iria impedi-lo de ver seu descontentamento com a
pergunta.
— Eu devo ser vista, não ouvida.
Dallas deu um aceno brusco. — Está certo.
Callie deu um aceno brusco idêntico, antes de, calmamente, pegar uma ervilha entre
seu pequeno dedo indicador e o polegar e oferecê-la ao cão.
Rawley olhou para Faith, que estava lutando para não sorrir, e por um momento,
ambos eram crianças na mesma mesa, determinados a obedecer às regras de Dallas — as
crianças não falam, a não ser que falem com elas. A primeira vez que Dallas pediu a Rawley
sua opinião durante uma refeição, ele ficou tão surpreendido que quase caiu de sua cadeira.
Só mais tarde ele entendeu, que Dallas estava reconhecendo que ele tinha crescido. Era uma
maravilha que ele tivesse sobrevivido ao olhar de Faith, porque ela, obviamente, não tinha
gostado nem um pouco que ele tivesse na posse de um privilégio negado a ela.

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Ele voltou sua atenção para a criança que estava rapidamente se infiltrando em seu
coração. Ela, delicadamente, pegou outra ervilha e ofereceu-a ao cão, que de bom grado
aceitou. Então ela, diretamente, encontrou o olhar de Rawley e se inclinou um pouco em
direção a ele.
— Eu não gosto de ervilhas, — disse ela no que ele só podia supor que ela achava que
era um sussurro, mas sua voz ressoava sobre a mesa.
— Mas Rufus gosta. Você gosta de ervilhas?
— Eu gosto, e você sabe por quê?
Seus olhos se arregalaram, seja porque ele a surpreendeu ao responder ao invés de
repreendê-la por quebrar a regra ou porque ela estava realmente interessada, e ela balançou
a cabeça, esticando-se mais sobre o prato como se ele estivesse prestes a transmitir-lhe
algum segredo maravilhoso.
— Elas fazem você crescer e correr mais depressa.
— Eu já posso correr depressa.
— Aposto que você não pode me vencer.
Ela estreitou os olhos, mordeu o lábio inferior em concentração, como se esforçando
para determinar se ela deveria desafiá-lo.
— Você pode correr mais rápido do que a Mamãe?
Ele ainda não estava acostumado a ver Faith como uma, sua filha se referindo a ela
como tal. Uma parte dele continuava a ver Faith como uma jovem, enquanto outra parte
teve que admitir que já não o era, especialmente quando seus olhos continham um desafio,
desafiando-o a tentar, nem que fosse por um minuto, vencê-la. Perguntou-se sobre o homem
que tinha estado com ela, tomou-a, e depois a abandonou. Ele não estava contente que ela
guardasse segredos dele.
— Absolutamente.
Faith zombou. — Eu gostaria de ver você tentar, Rawley Cooper.
As palavras foram pronunciadas facilmente, como se os anos não tivessem passado,
como se a distância não se tivesse se interposto entre eles.
— Você era rápida, Faith, mas eu era sempre mais rápido. Você sabe disso.
— Mas você não passou cinco anos correndo atrás desta pequena. — Ela inclinou a
cabeça na direção de sua filha.
Ele sentiu um peso esmagador, lamentando não ter estado aqui para ela. Se ele
soubesse, ele teria retornado imediatamente. Ele teria forçado o idiota que a engravidou, a
casar com ela. Ele se perguntou por que diabos Dallas não o tinha feito.
Esta foi a refeição mais longa de sua vida. Talvez porque seu estômago estava atado
com tanta força que ela mal conseguia comer ou, talvez porque ela não sabia o que Callie
podia deixar escapar ou, talvez, apenas talvez, porque a visão de Rawley continuava a mexer
com as suas emoções. Com sua partida, ele deixou sua posição em relação a ela muito clara.
Mas uma parte dela ainda ansiava por seus braços ao seu redor.
— Certo, pequenina, é hora de irmos. Dê um abraço em todos, — ela anunciou. Ela
observou como seus pais abraçaram sua filha, seu coração apertando como sempre
acontecia, porque eles tinham aceitado tão bem sua filha. Ela sabia que nem todos os pais o
fariam.

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Ela não achava que fosse possível que o seu peito apertasse mais até que Callie correu
com os braços abertos em direção a Rawley. Seu grito ecoou em torno deles quando ele a
balançou e passou por cima do ombro, e colocou os braços em volta do seu pescoço, antes
de deslizar pelas suas costas, suas pernas enroladas em torno de Rawley, seus pés
balançando timidamente.
— Vou acompanhá-las a casa.
Ela não gostou do modo com as suas terminações nervosas reagiram como se ele
tivesse oferecido um serviço muito mais íntimo.
— Isso não é necessário. Não é tão longe. Nós ficaremos bem.
— Está ficando escuro.
Rindo levemente, ela odiou a ligeira sugestão de pânico na sua voz. — Nós já fizemos
este caminho mil vezes.
— Ainda assim.
Duas palavras que demonstraram determinação e refletiram a obstinação de um
homem decidido. Ela quase lhe deu um soco. Ele usou esse tom inúmeras vezes quando ela
era uma menina, mas agora ela era uma mulher — Só que ele não esperou a sua resposta.
Ele simplesmente se dirigiu para a porta, sua filha saltando animadamente contra suas
costas.
— Não demoro muito, — ele disse, por cima do ombro, para seus pais.
Sua mãe arqueou uma sobrancelha para ela, desafiando-a corrigir as coisas entre ela
e Rawley. Faith deu-lhe um abraço e depois um em seu pai.
— Te vejo amanhã.
Ela correu para fora atrás de Rawley, esforçando-se por não aceitar como parecia
natural, tentado não se lembrar quantas vezes ela tinha feito isso enquanto criança, sempre
atrás dele, sempre querendo estar no meio de tudo o que ele estava fazendo. Quando ela o
alcançou, ela estava grata que as suas longas passadas combinavam com as dele. Ela sempre
quis ser igual a ele.
Juntos, selaram os cavalos em silêncio. Ela, particularmente, não gostou do jeito que
seu coração deu um pequeno salto quando ele levantou Callie e a ajeitou no seu cavalo.
Eles estavam bem além da casa, Rufus correndo em círculos em torno deles, Callie
rindo, quando Rawley disse calmamente, — Dallas parece bem, — e ela percebeu que ele
não tinha insistido em acompanhá-la a casa porque ele tinha pensado que ela não poderia
cuidar de si mesma, mas porque ele precisava falar, precisava dela.
— Eu sei. Ele não parece um homem que sofre de qualquer doença. Talvez tenha sido
algo que ele comeu, talvez fosse o calor, mas com certeza nos deu um bom susto.
— Eu percebi que você os abraçou-os muito apertado.
O sol era apenas uma linha laranja no horizonte.
— Eu percebi que eles estão ficando mais velhos, e eu poderia perder um ou ambos a
qualquer momento. Eles são tanto uma parte deste lugar, uma parte da minha vida, que eu
não posso imaginar não os ter por perto.
— Ainda vai ser um bom tempo.
Ele disse isso com tanta confiança de que ela não tinha escolha a não ser acreditar, ou
pelo menos querer acreditar.

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— Estamos em casa! — Callie gritou, como se eles não pudessem ver a pequena
cabana situada entre as árvores de algaroba.
Assim que pararam os cavalos, ele desmontou, pegou Callie, e deslizou-a até o chão.
Assim que seus pés tocaram a terra, ela se foi, perseguindo vaga-lume, Rufus saltando ao
lado dela.
— Você costumava fazer isso, — Rawley disse com carinho.
— Lembra quando você pegou alguns e os colocou em uma jarra para mim, para que
eu pudesse dormir com eles ao lado da minha cama?
Ele sempre tinha feito pequenas coisas para ela. Não admira que ela o amasse tanto,
ainda o fazia.
— Eu me lembro. Antes de ir dormir você os libertou.
Ela olhou para ele, incrédula. Não querendo ferir seus sentimentos, ela tinha sido
incrivelmente silenciosa rastejando para sua janela, abrindo o frasco, e enviando os insetos
de volta para a noite.
— Você sabia disso?
— Faith, não havia muita coisa que você fizesse que eu não soubesse. — Ele apontou
para Callie.
— Não sei nada sobre ela, no entanto. Por que você não me falou dela?
— Por que você, realmente, foi embora? — Ela disparou de volta para ele.
Sua resposta foi um meio sorriso.
— É complicado.
Suas palavras, jogadas de volta, deveriam tê-la irritado, mas só serviram para
entristecê-la.
— Nós não costumávamos manter segredos um do outro.
Seu sorriso se tornou sombrio, os olhos cheios de pesar.
— Sempre tivemos segredos. Ou pelo menos eu tinha. Vou tratar de seus cavalos.
— Eu ajudo.
Eles trabalharam em silêncio, relaxaram em velhas rotinas familiares. Quando os
cavalos estavam acomodados no curral com o seu abrigo protetor, Faith dirigiu os passos
para a varanda da frente.
— Obrigado por escoltar-nos até em casa.
Ele estava com as mãos pressionadas nos bolsos de trás da calça jeans, uma postura
familiar que apertou seu coração. Ele estudou-a como se ele tivesse algo mais a dizer e não
sabia bem como dizê-lo. Ele não estava sozinho nesse sentido. Talvez ela lhe devesse um
pedido de desculpas. Sua lembrança daquela noite era confusa, fraca, mas ela não conseguia
encontrar as palavras, não quando tanto entre eles havia mudado.
Callie subiu os degraus e abraçou uma das vigas da varanda que apoiavam os beirais
como se fosse sua melhor amiga.
— Vovô me ajudou a ensinar Rufus a se fazer de morto. Quer ver?
— Claro, — disse Rawley, e Faith teve a sensação de que ele não negaria a ela nada
do que ela pedisse.
Ela apontou seu pequeno dedo para o cão. — Rufus, morto!
O cão caiu de lado.
— Isso é muito impressionante, — disse Rawley, olhando para Faith.

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— Eu não posso acreditar que Dallas teve paciência para treinar o vira-lata para fazer
isso.
— Ele sempre teve um jeito de fazer as pessoas obedecerem. Eu acho que transferiu
esse talento para os animais também. Ele vai ficar assim... Callie, diga-lhe que o jogo
terminou.
— Rufus, acorde!
O cão levantou-se e saiu correndo, sem dúvida, avistando algo que precisava
perseguir.
— Tio Rawley, quer ver as minhas fotos? — Perguntou Callie, e Faith sabia que a
criança poderia passar a noite toda compartilhando uma coisa depois da outra.
— Tenho certeza que o tio Rawley está cansado, — Faith disse a ela.
— Precisamos deixá-lo voltar para a Vovó.
— Na verdade eu não estou, — disse ele. Estendendo a mão, ele torceu o nariz de
Callie, fazendo-a rir.
— Eu gostaria de ver suas fotos.
— É hora de ela ir para a cama, — Faith disse pacientemente.
— Quanto tempo pode demorar? — Perguntou.
— Por favor, mamãe, — Callie implorou, apertando suas pequenas mãos e segurando-
as como se em oração.
— Por favor.
Droga. Ela ainda estava para aprender a negar alguma coisa a sua filha. Mas ela não
queria que Rawley entrasse na cabana, que tinha sido a sua cabana. Ela não queria se
lembrar da última vez que tinha estado lá com ele, dentro daquelas paredes.
Será que essas memórias não significavam nada para ele? Talvez elas lhe permitissem
descobrir a verdadeira razão para sua partida.
— Eu acho que mais alguns minutos não vai fazer mal. Vamos entrar.

Ele não sabia porque tinha insistido. A última coisa que ele queria era desenterrar
memórias da última vez que tinha estado com Faith, mas era difícil deixar a parte o hábito de
querer passar tempo com ela.
Passando o limiar, ele inalou uma fragrância de flores, uma mistura de aromas,
nenhuma flor em particular, nenhuma flor à vista. Era o cheiro de Faith. Ela sempre cheirava
a algo selvagem e indomável. Contra sua vontade, seu olhar se voltou para a porta que dava
para o quarto. Ele podia ver a mesma colcha estendida sobre a cama, lutou contra a
lembrança de quão pacífica e certa Faith parecia, estendida sobre ela quando ele encostou-
se ao batente da porta e absorveu a visão dela, cada polegada de seus pés descalços até seu
cabelo bagunçado, antes dele sair da cabana pela última vez.
Ele desviou sua atenção para longe dos lugares que não deveria vaguear e seu olhar
percorreu o restante da cabana. Outra porta, que não existia antes, indicou que tinham
acrescentado um quarto. Sem dúvida, para Callie. O mobiliário na sala principal permanecia o
mesmo, mas uma cadeira de balanço tinha sido adicionada, e seu peito se apertou com a
imagem de Faith balançando sua filha. Ela tinha adicionado cortinas amarelas com babados
nas janelas e pinturas de cowboys laçando novilhos nas paredes. Isso era Faith: uma

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combinação de feminilidade e masculinidade. Ela nunca tinha se esquivado dos trabalhos
pesados.
— Tio Rawley, sente-se aqui.
Olhando para cima, ele viu quando Callie deu um tapinha na almofada ao lado dela no
sofá. Um pequeno album descansava no seu colo. Droga, se ela não tinha os maiores olhos
castanhos que ele já tinha visto. Ele olhou para Faith, sabendo que ela queria se livrar dele,
que ele estava sendo um incômodo.
Ela deu um rápido aceno de cabeça enquanto ela se acomodava na cadeira de
balanço.
— Vá em frente.
Sentando-se no sofá, ele colocou seu braço à volta dela. Mesmo sentado, ele se
elevava sobre a menina. Ela cuidadosamente abriu a capa de couro como se fosse
merecedora de sua reverência, e sua respiração parou quando ela colocou o dedo indicador
no meio de um cartão postal.
— Esse é o Grand Canyon, — ela anunciou com autoridade.
— Vou vê-lo algum dia.
Ele enviou o cartão postal a Mamãe, para aliviar suas preocupações e, para que ela
pudesse apreciar uma das maravilhas que ele estava vendo, esperava que ela fosse partilhar
os cartões postais com os outros, mas não tinha considerado que eles seriam mantidos.
Outra página virada, um outro cartão.
— Um hotel em Santa Fé, — disse ela como se ela soubesse onde Santa Fé ficava.
— Irei lá.
Outra página virada, um outro cartão.
— Uma sala de jantar no Arizona. Vou lá, também.
Uma sala de jantar em um hotel em Fred Harvey. Muitos dos cartões postais eram dos
hotéis onde permaneceu por uma noite. Ele os tinha enviado, particularmente, para que sua
Mãe pudesse ver que todos os alojamentos não eram nada em comparação com o Grand
Hotel que tinha sido construído em Leighton. Ele levantou o olhar para Faith.
— Você os manteve?
— Eu era fascinada por eles, — ela admitiu. — Eu imaginava você andando por
aquelas ruas, comendo naquelas mesas, dormindo nas camas.
— Na maioria das vezes, eu dormi sob as estrelas.
— Imaginei isso, também. Eu percebi que eles foram enviados para fazer Mamãe
acreditar que você estava vivendo melhor do que realmente estava.
— A estação de trem na California, — Callie anunciou como se sua atenção não
tivesse se desviado para longe dela. —Temos trens aqui. Eu vou andar num quando for
maior.
— Você vai? — Perguntou.
Ela balançou a cabeça, ao mesmo tempo que virava a página. — Eles são mais rápidos
do que cavalos.
— Mas eles não são muito boa companhia, — disse ele.
Ela virou-se para olhar para ele, uma pergunta naqueles olhos castanhos que eram
tão parecidos com os de sua mãe.
— Eu falo com o meu cavalo o tempo todo, — ele disse a ela.

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— Sobre o quê?
— Meus sonhos. — Ele se inclinou e sussurrou: — Eu posso contar-lhe os meus
segredos. Ele não vai dizer a ninguém.
— Eu também não conto.
— Promete?
Ela assentiu com tanto entusiasmo que suas tranças balançavam ao redor dela.
— Sua mãe estava certa. Estou cansado. Tem sido um longo dia. Mas eu vou voltar e
ver o resto outra vez. Que tal isso?
— Ok.
Com a mesma reverência com que ela abriu o livro, ela o fechou. Ele pôs-se em pé,
enquanto, simultaneamente, Faith se levantou da cadeira de balanço, e ambos ficaram ali,
sem jeito, ele com as mãos enfiadas nos bolsos na parte de trás das calças, ela com as mãos
na frente dela.
— Obrigado por lhe ter feito à vontade: — Faith disse finalmente.
— Ela é uma gracinha.
Faith sorriu, o primeiro sorriso genuíno desde que o encontrou na estação, e causou-
lhe uma dor no peito que o fez se perguntar se ele estaria sofrendo da mesma doença que
Dallas.
— Ela é sim. Se você não tiver cuidado, ela vai envolvê-lo ao redor de seu dedo
mindinho.
— Esse aviso vem um pouco tarde demais. — Ele olhou ao redor.
— Estou surpreso que você goste de viver aqui.
— Ela não estava sendo usada. Você disse que estava cansado, por isso não devemos
atrasá-lo. — Ela correu para a porta, como se um coiote estivesse beliscando seus
calcanhares, e abriu-a.
— Vamos vê-lo amanhã, na reunião, se não for em outro lugar.
A reunião, quando o restante da família iria cair sobre ele como gafanhotos, querendo
respostas. Virando-se para trás com uma piscadela, ele puxou uma das tranças de Callie.
— Bons sonhos.
Ela lhe deu um sorriso tão inocente que ele queria que ela não tivesse mais nada
senão agradáveis imagens em sua cabeça. As coisas na sua, tendiam a ser feias, criadas para
um monte de noites agitadas. Quando ele chegou à porta, ele parou ao lado de Faith. Ela já
não usava tranças, deixando-o sem nada para puxar. Lembrou-se de um tempo em que ele
poderia ter se inclinado para roçar um beijo em seu rosto. Mas esses dias estavam muito
longe.
— Boa noite, Faith.
Ela apenas balançou a cabeça, fechando a porta atrás dele assim que os saltos de suas
botas passaram a porta.
Tomando um caminho sinuoso de volta para casa, ele passou por uma vaca ou duas
ao longo do caminho, sentindo-se pequeno e insignificante com o vasto céu acima dele. A
escuridão se estabeleceu, trazendo com ela um manto de veludo preto pontilhado de
estrelas e um vislumbre da lua. Uma das razões pelas quais ele gostava de trabalhar com o
gado era porque ele nunca se sentia encurralado, porque o horizonte estava sempre à
distância, chamando, prometendo mais espaço além dele. Outrora ele sentia-se satisfeito,

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mas agora, de repente, tudo parecia vazio. E ele sentiu que um pedaço de sua vida tinha sido
vivida sem ele realmente ser uma parte dela. O que era um estranho e irritante pensamento
para ter, à medida que ele subiu os degraus e entrou na casa.
Uma lamparina tinha sido deixada acesa numa mesa na entrada, pelo que ele
suspeitava que Dallas e Mamãe já tinham se retirado. Ele ficou surpreso que Dallas não
tivesse ainda instalado eletricidade aqui, mas imaginou que viria com o tempo. Pegando a
lamparina, ele se encaminhou para a grande biblioteca, onde ele aprendera a gostar de
livros, pousando a lamparina sobre a mesa de tampo de mármore que continha uma
variedade de garrafas de cristal, serviu uma generosa quantidade de uísque em um copo, e
atravessou a porta para a varanda. Encostado a uma viga, ele tomou um gole e olhou para
fora, para o que lhe era familiar, a terra que se estendia diante dele por milhas, o moinho de
vento ainda em pé, como uma torre orgulhosa. Ele construiu uns quantos no seu tempo,
sempre gostou de trabalho braçal.
A mão suave pousou entre as omoplatas, esfregou o aperto lá, deslizou sobre os seus
ombros antes de se afastar. Virando a cabeça ligeiramente, ele olhou para a segunda mulher
que ele já tinha amado, sendo a primeira a sua mãe, ou pelo menos sua memória dela,
desbotada e desgastada como estava.
— Por que você não me disse que Faith teve uma filha?
— Ela nos pediu para não dizer. Quaisquer que foram as suas razões para partir, ela
não queria ser a razão para você voltar.
Ele teria se casado com ela sem hesitação para poupá-la da vergonha e embaraço de
ser uma mãe solteira.
— Você sabe quem é o pai?
Virando-se, ela apoiou as costas contra a trave e encontrou o seu olhar.
— Se você quer respostas, você tem que falar com Faith. É ela quem decide o que as
pessoas sabem quando se trata de Callie.
— Ela não está falando nada.
— Essa é sua prerrogativa. Eu suspeito que há coisas que você nunca compartilhou
com ela. — Deslizando ao seu lado, ela colocou os braços ao redor dele.
— Estou feliz que você está em casa.
Em um movimento suave, ele colocou o copo no corrimão e envolveu-a em seus
braços, segurando-a com firmeza.
— Você sabe que Dallas é muito teimoso para morrer.
Ela riu levemente, mas ele ouviu o sussurro de lágrimas invadirem a borda de
preocupação. — Eu sei. Ainda assim, tudo precisa ser definido entre você e Faith.
Depois que sua mãe lhe deu outro abraço e voltou para dentro, ele sentou-se no
degrau mais alto, esticou as pernas, e respirou o ar quente do Texas, viajando de volta em
suas memórias, à noite em que tudo mudou.

26
Capítulo Cinco

Maio de 1903

Com grande diversão, Rawley se manteve montado em seu cavalo, observando como
Faith mandava nos trabalhadores do campo de petróleo ao redor. Enquanto o dinheiro e
terra de Leigh estavam pesquisando a possibilidade de existirem poços negros e escuros,
Faith tinha suas próprias opiniões sobre o assunto e uma maneira de fazer as pessoas ouvi-la.
Ela saiu a seu pai a esse respeito.
Rawley não sabia se, ao lado da mandíbula se agitando, alguém disse algo a ela a
respeito de sua presença ou se ela só sentiu isso, mas de repente ela se virou, abriu um largo
sorriso, e acenou.
— Rawley!
Seus passos encurtaram o chão que os separava. Como sua mãe, ela era alta, apenas
uma polegada ou duas mais baixa do que ele. Um homem não tinha que adivinhar o
comprimento de suas pernas porque, quando ela estava no campo, ela usava calças jeans
que delineavam um pequeno e doce traseiro — Ele empurrou esse pensamento impróprio
para um canto escuro. Cada vez mais ultimamente, ele estava começando a vê-la como uma
mulher em seu próprio direito, e esses pensamentos eram totalmente errados vindos dele.
Ele não deveria estar pensando sobre a forma como sua camisa branca estava enfiada no cós
de suas calças, na cintura estreita, deixando muito pouco a respeito de sua forma à
imaginação de um homem. A longa trança de seu cabelo de ébano por cima do ombro,
batendo contra o peito com a rapidez de seus passos. Lembrava-se dela lamentando a
ausência de seios, quando ela tinha cerca de quatorze anos. Ela certamente não tinha motivo
para reclamar sobre isso agora, pois seus seios estavam muito longe de se assemelhar a uma
tábua de madeira. Ela era toda curvas.
Para evitar que ela lançasse os braços em volta dele como ela costumava fazer
quando eles se encontravam — um hábito de seus dias de crescimento quando a carregava
nos braços porque ela era muito pequena para acompanhá-lo — ele ficou na sela e esperou.
Quando ela o alcançou, ela colocou a palma da sua mão nua na coxa dele. Mesmo
sabendo que era um gesto inocente, não impediu o choque de prazer de viajar através dele,
não que ele desse qualquer indicação de que sentia outra coisa senão sentimentos sociáveis
para com ela.
— Você está pensando em vir para o nosso lado? — Ela perguntou, sorrindo para ele,
seus olhos castanhos provocando com malícia.
— De jeito nenhum. Eu não posso acreditar que Dallas está permitindo que você abra
buracos nas suas terras.
— Você vai se sentir de forma diferente quando eles descobrirem petróleo. — Ela
roçou seus dedos na coxa dele.
— Eles vão terminar a perfuração até o final do mês.
— É uma missão de tolos, Faith.
— Eles descobriram um poço em Spindletop.

27
Existiam bolsas de petróleo, há muito agrupadas, sob a superfície em algumas áreas
do Texas, mas dois anos antes, quando um poço foi descoberto, os homens do petróleo
começaram a ter um interesse real no que o estado poderia ter para oferecer abaixo do solo.
— Isso foi a milhas de distância, do outro lado do estado. Aqui é apenas terra, gado, e
moinhos de vento.
— Você nunca teve muita imaginação. — Com um suspiro, ela cruzou os braços
abaixo dos seios, e inclinou-se contra sua perna.
— Há petróleo ali. Eu sinto-o no fundo dos meus ossos.
— Então eu espero que você o encontre.
Inclinando o rosto, ela olhou para ele. — A pecuária está mudando. Você é o último
de uma raça, Rawley. Os cowboys não vão montar por muito mais tempo. Vocês já nem
necessitam conduzir o gado por longas distâncias. Vocês só necessitam levar o rebanho até à
estação de trem.
Onde simplesmente os colocam nos vagões e levam para o matadouro. Era um pouco
estéril para ele, mas também dava muito menos trabalho e exigia menos noites cavalgando
em terrenos perigosos.
— Ainda existe muito trabalho a ser feito. Como cercar estes poucos acres de terra
para que o gado não esteja incomodando seus perfuradores.
O sorriso brilhante que ela lhe deu, sempre causou tempestades escuras que
ameaçavam sua alma a se retirar por um tempo.
— E eu gosto disso.
Lutando contra o impulso de se inclinar e capturar sua boca, ele simplesmente trouxe
a aba do chapéu mais baixo, esperando que as sombras camuflassem os anseios que, por
vezes, o alcançavam quando estava com ela. Ele tinha passado boa parte de sua vida
sabendo que ela estava destinada a partir seu coração. Enfiando a mão no bolso da camisa,
ele puxou uma barra de salsaparrilha.
— Dê-me, — disse ela, segurando sua mão.
— É a minha última.
— É sempre a última.
Quebrando-a ao meio, ele entregou-lhe uma metade, tal como tinha feito durante a
maior parte de sua vida.
Mudando seu olhar, viu como o líder do equipamento de perfuração começou
andando em direção a eles. Cole Berringer. Rawley sabia que seu desagrado para com o
homem do petróleo resultava do fato de que ele estava passando seus dias na companhia de
Faith, e ela gostava dele. Berringer tinha abordado Dallas há alguns meses com a crença de
que existia petróleo para ser encontrado nas terras Leigh. Enquanto Dallas não tinha se
mostrado muito interessado, Faith tinha abraçado a perspectiva de possibilidades.
Normalmente, Rawley apoiava o entusiasmo de Faith por experimentar coisas novas e a teria
encorajado nesta empreitada, se Berringer não fosse um diabo tão bonito, com seu cabelo
cor de trigo e olhos azuis. Ele tinha metade das mulheres da cidade desfalecendo sobre ele.
— Cooper, — o homem disse, parando a poucos passos de distância. Sua calça
marrom e jaqueta mostravam pouco desgaste, sinal de um homem que preferia dar ordens a
fazer o trabalho duro.
— Berringer.

28
— Já não se vêem muitos homens andando por aí com um revólver amarrado a sua
coxa.
Rawley deu de ombros, não sentindo necessidade de se defender, mas determinado a
seguir o código de educação com que tinha sido criado.
— Eu cavalgo muito sozinho. Isto me dá paz de espirito.
— Não é como se existissem quaisquer bandidos ou renegados à espreita.
— Tivemos algumas cabeças faltando, acho que, no mês passado. Eu diria que ainda
temos ladrões.
— Mas o Estado é civilizado agora. Você deixa que a lei…
Rawley num só movimento — tinha sua arma na mão, apontou e disparou antes de
ele voltar a piscar. E teve grande satisfação em ver Berringer guinchando como um porco
cuja cauda tinha sido arrancada. Ele estava agachado, com as mãos sobre a cabeça, num
gesto de proteção.
— Que diabos, Cooper?
Tendo sido criado por Houston, que vendia cavalos para militares, treinados para não
se assustarem com o som de tiros, o garanhão de Rawley tinha feito pouco mais do que dar
um ligeiro passo para o lado. Todos os homens estavam parados. Faith apenas olhou para
ele, interrogativamente, esperando para determinar se ele estava precisando de uma bronca
por aterrorizar um homem que, obviamente, estimava. Rawley apontou o cano ligeiramente
para o lado, antes de deslizar o revólver de volta para o coldre.
— Cascavel.
Horrorizado, Berringer encarou o réptil mutilado e, em seguida, olhou para Rawley.
— Eu não a ouvi sibilar. Você podia ter me avisado.
— Elas nem sempre sibilam antes de atacar. Já me encontrei com demasiadas para
saber que podem atacar sem fazer qualquer som e sem dar qualquer dica. Além disso, já
estava se preparando para dar o bote em você no momento em que a vi.
— Isso é verdade, chefe, — disse um trabalhador com uma pá, à medida que se
aproximou.
— Eu estava tentando me aproximar sem fazer barulho para matá-la. Não quis
alarmá-lo, fazendo que ela o atacasse, mas então ele disparou nela... Acho que o assunto
está resolvido.
— Bom, Jones, — disse Berringer, impaciente. — Volte ao trabalho. — Ele tirou o
chapéu, deu um tapa contra sua perna, provocando uma nuvem de poeira.
Rawley não sentia prazer em ver tremer a mão do homem. Ou, pelo menos, ele lutou
para não sentir. Ele experimentou um pouco de satisfação ao ver Berringer inquieto. Ele iria
queimar no inferno por seus pensamentos maldosos, mas, de qualquer modo, ele já estava
lá, então por que se importar?
— Acho que te devo uma, — Berringer disse de má vontade.
— Basta ter certeza que os cowboys continuam a ser necessários.
O queixo do homem estava apertado. — Você vai estar na festa hoje à noite?
Eles estavam comemorando o aniversário de Faith. Todos os trabalhadores da
fazenda e um bom número de habitantes da cidade tinham sido convidados.
— Eu não perderia isso.
— Vejo você então. — Com isso, Berringer deu um aceno em direção a Faith.

29
— Eu tenho algumas coisas para mostrar a você aqui.
— Eu vou acompanhá-lo em um minuto. — Depois que ele saiu, ela inclinou para trás
seu Stetson, encontrou o olhar de Rawley, e colocou as mãos nos quadris.
— Eu não ficaria surpresa ao saber que você trouxe essa cascavel aqui, em um saco de
estopa e, em seguida, a liberou para que você pudesse se exibir.
— Eu não mexo com cascavéis. Nunca. — Não que a ideia não lhe tivesse passado
pela cabeça uma ou duas vezes, mas ele não ia arriscar uma mordida apenas para fazer um
ponto.
— Eu não sei por que vocês dois parecem sempre estar em desacordo.
Por sua causa. — Eu não tenho nada contra ele pessoalmente.
Ela deu-lhe um tapinha na perna, deu-lhe outro de seus sorrisos estonteantes. —
Ainda bem. Porque eu gosto muito dele.
Observando como ela se dirigiu para o grupo para compartilhar seus planos,
esperanças e sonhos, ele se perguntou se era hora de seguir em frente e encontrar seus
próprios sonhos.

Faith observou como Rawley incitou o cavalo a galope e se apressou a colocar


distância entre eles. Ela não conhecia nenhum homem que se sentasse num cavalo como ele,
nem tão habilidoso com uma arma. Ela sabia que vários homens as usavam como um
acessório, da mesma forma que uma mulher envolve o pescoço com um colar, mas Rawley
Cooper não. Ele trabalhava no rancho há demasiado tempo para tomar qualquer coisa como
certa, para não saber que um perigo pode surgir de repente.
Ela também usava uma arma, era quase tão boa atiradora quanto Rawley, mas Cole
nunca a tinha ridicularizado pela sua adição ao seu guarda-roupa. Foi apenas mais um
exemplo dos dois homens encontrando algo sobre o outro para não gostar.
— Eu acho que o seu irmão estava se exibindo com esse pequeno tiroteio, — disse
Cole.
Virando-se, ela o encarou. — Ele salvou sua pele e ele não é meu irmão.
— Eu pensei que sua família tomou conta dele.
— Eles tomaram. Só que eu não o vejo dessa maneira.
Seus olhos, de um azul que lembrava a cor do céu ao amanhecer, se estreitaram.
— Como você o vê?
— Como um amigo. — Alguém em que confiava com todo seu coração. Alguém que,
tarde demais, ela se apercebeu de formas que não o tinha feito antes. Quando ela se virou
para vê-lo montando na sela do seu cavalo, era como se todo o seu corpo tivesse acordado
de um longo sono. Suas terminações nervosas se sentiam mais vivas, os braços queriam
alcançá-lo, e suas pernas queriam envolver-se em torno de seus quadris estreitos. Mas era
mais do que a consciência física manifestando-se — todos os aspectos da relação entre eles
se aprofundaram. Deitar-se sob as estrelas e conversar até tarde da noite com ele,
aumentara a ligação, passear com ele pelo rancho, mais orgulho. Seus sorrisos a
esquentavam mais do que antes. Sua risada elevava seu coração.
— Eu gostaria de ser mais do que isso, — Cole disse baixinho, discretamente
estendendo sua mão para a dela e apertando os dedos.

30
Ele era bonito de uma forma polida; não tinha, em nada, a aparência rude de Rawley.
E, também existia força nele. E ambição. Ele vira para onde o futuro ia e não ia ficar para trás.
Ele a encheu de entusiasmo sobre as possibilidades.
— Seria preciso um homem corajoso, Cole Berringer, para dar conhecimento disso a
meu pai e enfrentar seu escrutínio.
— Coragem é algo que não me falta, Faith.
Ela havia dito a Rawley a verdade. Ela gostava de Cole. Ela não sabia, se o que ela
sentia por ele, a levaria pelo caminho do amor, mas ela nunca tinha tido medo de ver onde
as trilhas a podiam levar.
Ela usava o maldito vestido vermelho.
Encostado na parede coberta com papel de parede do espaçoso salão, que estava
servindo como salão de baile, tomando seu uísque, Rawley lutou para não notar quão
cremosos e suaves seus ombros descobertos pareciam ou, como o corte baixo do corpete
revelava as ondas superiores de seus seios. Com seu cabelo cor da meia-noite preso em cima,
pequenos caracóis soltos ao redor de seu pescoço, vermelho era o tom perfeito para ela, e
ela sabia disso muito bem. A primeira vez que usou o esvoaçante vestido, foi no Natal, e, já
tinha sido suficientemente difícil, não reconhecer como ela evoluiu de menina para mulher.
Não era de admirar os homens em volta dela, competindo por sua atenção, um após o outro,
levando-a para a pista de dança.
A banda formada por elementos amadores era liderada, principalmente, pelo violino
de Austin Leigh; ninguém o igualava quando se tratava de puxar um arco sobre as cordas do
seu violino — alternando uma melodia animada, com uma mais lenta. Era óbvio que a
maioria dos homens cronometrou sua chegada ao lado de Faith, de modo a demonstrar que
estavam disponíveis para uma valsa. De certa forma, foi divertido de assistir, mas, ao mesmo
tempo irritou o diabo fora dele. Nenhum era suficientemente bom para ela, mas ela flertou
com eles e transmitiu-lhe esperança de qualquer maneira.
Faith ocupou o lugar de sua mãe nesse aspecto. Ela encontrava tempo para todos:
rancheiros, empresários, pobres, ricos, o que era uma das razões porque a maioria de suas
danças foram reivindicadas. Ela tinha um jeito de ser que fazia um homem sentir-se feliz por
sua atenção.
Ele não sabia por que ele ainda estava aqui, atormentando-se, observando Faith
dançando com um homem após o outro; Cole Berringer avidamente colocando-se em linha
para usufruir da terceira ou quarta dança. Era uma regra não escrita entre os cowboys que
um homem se limitava a um giro sobre o chão com uma moça até que todos tivessem dado
uma volta com ela. Apesar de todos os esforços de Dallas para atrair mulheres para esta
parte oeste do Texas, os homens ainda eram em número muito superior ao do sexo
feminino. Mas Berringer não prestava atenção às regras, o que, provavelmente, no final, o
levaria longe e garantia que ele mantivesse a seu lado uma feliz senhora. Rawley tinha
certeza de que ele pretendia que essa senhora fosse Faith.
— Rawley Cooper. Exatamente o homem que eu estava procurando, — Maggie disse
acenando uma bandana vermelha na frente dele.
— Olá, pirralha, — murmurou com carinho. — Você não vai me marcar. — O termo se
refere à longa tradição dos cowboys de assumir o papel de parceiro de dança do sexo
feminino, quando as mulheres eram escassas.

31
— Mas nós temos aqui muito mais homens do que mulheres. Preciso de alguns caras
que finjam ser a moça para que mais homens tenham uma chance de dançar.
O que significava ter um lenço amarrado em torno da parte superior do braço, sinal
de que essa pessoa estava disposta a estabelecer uma parceria com outro homem para uma
dança ou duas. Os cowboys gostavam de dançar.
— Não. Procure em outro lugar.
Ela soltou um suspiro irritado, então sorriu para ele. — Você não tem graça. Eu nem
sequer o vi esgueirando-se por aí.
— Eu não me esgueiro. — Mas ele teve que admitir que também não atraiu atenções.
Ele nunca gostou muito de ser o centro do foco de ninguém, preferindo passar despercebido.
Ser notado quando ele era um menino, não lhe tinha rendido nada mais do que dor e
humilhação. Mantendo-se à parte, mesclado com as sombras transmitia-lhe um sentido de
paz.
— Você vai dançar com ela?
Ambos sabiam a quem ela estava se referindo. Maggie era sua melhor amiga, mas às
vezes ela era absolutamente irritante, especialmente, quando ela conseguia descobrir coisas
sobre ele que queria manter em segredo.
— Eu acho que ela já tem parceiros suficientes.
— Mas você é seu irmão.
Ele fez uma careta quando sentiu um laço apertar seu peito com vergonha.
— Não, eu não sou. Fui criado por seus pais, em sua casa, mas isso não faz de mim
seu irmão.
— Exatamente. Então, qual é o mal de dançar com ela?
O mal era que ele não era bom o suficiente para ela, tinha feito coisas que o deixavam
doente, se lembrasse delas com precisão. Dallas Leigh sabia os feios detalhes de sua
juventude. Rawley nunca esqueceria o esgar de repulsa no rosto de Dallas, no momento que
ele se apercebeu da verdade, sobre o que Rawley tinha feito. Tinha a expressão de um
homem à beira de vomitar cada refeição que ele já tinha comido. Se Dallas se apercebesse de
que Rawley tinha algum interesse amoroso para com sua filha, o homem que lhe tinha dado
um refúgio seguro, iria expulsa-lo — depois de o matar com um tiro. Ele tomou um gole lento
de seu uísque.
— Você é a mulher mais irritante que eu conheço.
— Mas você me ama mesmo assim.
— Eu tolero você, apesar de você ser tão irritante quanto um mosquito, mas não tão
grande.
Ela riu levemente. — Eu te amo, Rawley.
— Maggie
— Seu problema é que você não acredita ser merecedor de amor, nem do tipo que
existe entre amigos. Eu não sei o que aconteceu com você antes de se tornar parte desta
família, mas eu sei, que você é um dos melhores homens que eu conheço. — Triste, ele olhou
para ela.
— Você não sabe muito dos homens, então.
Seu pequeno punho fez contato duro com o ombro.
— Ai! — Ele deu um passo para trás, segurando o uísque.

32
— Você quase me fez derramar a coisa boa.
— Eu fui para a universidade. Eu conheço muitos homens. Eu também posso dizer,
com certeza, que nenhum é tão teimoso quanto você.
— Todos os seus elogios subiram-me à cabeça, Maggie. — Acabando o uísque, ele
colocou o copo de lado em uma mesa próxima.
— Vamos, eu vou dançar com você.
Antes que ela pudesse protestar, ele a pegou pelo braço e levou-a para a pista de
dança polida onde as pessoas cantavam, dançavam e rodopiavam. Com ela, era a maneira
mais rápida e mais fácil de mudar de assunto porque, uma vez que ela tinha uma ideia em
sua cabeça, ela a perseguia com uma determinação obstinada. Além disso, ela estava errada.
Não era que ele acreditasse ser indigno de amor. Ele sabia que era.

33
Capítulo Seis

Ela soube o momento em que ele entrou no salão de baile. Como seu pai, ele tinha
uma presença contundente sobre ele. Mesmo com suas passadas tranquilas, quando ele
entrava numa sala, as pessoas sabiam. Era como se o próprio ar que respiravam ganhasse
vida, a atmosfera carregada. Ele se movia com uma bem-vinda tempestade.
— Como você conseguiu que Rawley dançasse contigo? — Faith perguntou a Maggie
quando finalmente ela foi capaz ter um minuto com sua prima, depois de dançar com mais
cowboys do que poderia contar. Aquele com quem ela não tinha dançado, no entanto, era o
que ela queria, mais do que qualquer coisa, mas, ele se permitiu arrastar os saltos de suas
botas, na pista de dança, em uma só musica. Ela esperou toda a sua vida para crescer o
suficiente para que Rawley deixasse de tratá-la como se fosse uma criança. Ela imaginou que
aos dezenove ela estaria no limiar da feminilidade. Talvez até já o tenha transposto, a partir
do momento, em que decidiu assumir a responsabilidade de expandir as empresas Leigh ao
negócio do petróleo.
— Eu o enlouqueci, — disse Maggie, entregando a Faith uma taça de champanhe.
Faith riu, em parte com carinho, em parte com um pouco de ciúmes.
— Eu nunca entendi o relacionamento de voces. Vocês brigam mais do que quaisquer
duas pessoas que eu conheço e mesmo assim, vocês sempre permanecem amigos.
Maggie tomou um gole de champanhe, seu olhar curioso varrendo a sala onde as
pessoas dançavam e conviviam. Como repórter recentemente contratada para o Leighton
Leader, o único jornal da cidade, ela estava sempre à procura de um ângulo interessante para
criar uma história interessante.
— Estamos pisando nos calos um do outro há cerca de vinte anos, eu acho. Nunca
houve qualquer rancor entre nós. Só uma tendência para irritar o outro o máximo possível.
— Você o ama?
Essa pergunta fez Maggie virar a cabeça tão rapidamente que Faith ficou
surpreendida por ela não ter ficado tonta.
— Como um amigo, nada mais. Além disso, ele está loucamente apaixonado por outra
pessoa já faz muito tempo e, eu não posso competir com isso.
Faith não poderia ter ficado mais surpreendida se sua prima, de repente, anunciasse
uma debandada de gado dentro de casa. Qualquer mulher seria afortunada ao manter a
afeição de Rawley, mas ele nunca deu a entender que tinha um pingo de interesse em
cortejar.
— Quem?
Maggie simplesmente balançou a cabeça e voltou sua atenção para os convidados.
— Maggie, você não pode simplesmente dizer-me uma coisa dessas e não me dar os
detalhes. — Ela olhou ao redor.
— Senhorita Tate, a professora? — Ela se mudara para a cidade há três anos, era
bastante jovem e bonita como uma espécie de boneca de porcelana.
Maggie nem reagiu.
— E acerca de Lydia Helmsley? — A filha do açougueiro. Ela era baixa e cheinha,
dando a um homem o que segurar, ao contrário de Faith, que sempre tinha sido muito magra

34
desde que se lembrava. Na escola, os meninos brincavam com ela dizendo que um bom
vento a sopraria para longe. Mais de uma vez, sua mãe tinha sido forçada a repreendê-la
sobre seu comportamento grosseiro, dando socos quando alguém dizia algo que ela não
gostava.
Maggie suspirou. — Se você tivesse prestado um pouco de atenção, você,
provavelmente, teria descoberto.
Ela sempre prestou atenção a Rawley, especialmente, nos últimos tempos. Todos na
cidade pensavam nele como seu irmão, inclusive, umas quantas vezes se referiu a ele como
tal, mas ela nunca o tinha visto dessa maneira. Ele tinha apenas sido sempre Rawley, seu
amigo, seu protetor, seu desespero.
— Será que ela o ama?
— Não da forma como ele a ama.
— Então ela é uma tola. — Embora, assim que ela disse isso, ela sentiu uma pontada
no seu coração que se assemelhava a inveja. A ideia de vê-lo cortejando uma moça solteira,
de vê-lo segurando a mão dela, compartilhando conversas com ela, dando-lhe metade de sua
vara de salsaparrilha, trouxe consigo uma dor física. Se ele se cassasse, ela o veria ainda
menos. Ele até podia deixar o rancho, mudar-se para a cidade. Ela não conseguia imaginar
um cenário em que ele não estava sentado à sua frente durante as refeições. Já tinha sido
suficientemente difícil quando ele decidiu viver em uma pequena cabana, no meio de um
bosque de árvores de algaroba, a uma distância razoável da casa. Mas ele continuou a se
juntar a eles para a maioria das refeições.
— Nisso eu tenho que concordar com você, — disse Maggie.
— Só um tolo cego para não ver que ela domina o seu coração.
— Eu nem sequer percebi ele flertando com uma garota.
— Essa não é a maneira de Rawley. Ele é mais sutil do que isso.
O que não podia ser dito de Cole. Ele estava derramando atenções e elogios sobre ela
desde que chegou, e ela estava lutando para não deixar que isso lhe subisse à cabeça. Nunca
um cavalheiro tinha expressado o desejo de sair com ela, principalmente porque os homens
temiam a ira de seu pai.
Faith tomou um gole de champanhe. As pessoas foram-lhe trazendo taças de
champanhe durante toda a noite, e a cada uma, ela se sentiu mais e mais relaxada. A maioria
das pessoas da cidade tinha sido convidada. Comida estava sendo servida na sala de jantar,
enquanto as pessoas vagavam pelas várias salas de estar, convivendo e indo para a sala
maior, para dançar. Em uma das salas jogava-se às cartas, noutra, bilhar. Se Rawley não ia
dançar com ela, talvez ele, pelo menos, fosse desafiá-la para um jogo de bilhar. Eles eram
muito equilibrados no jogo.
E logo, ele estava andando em sua direção com uma expressão de indiferente
superioridade que a fez sentir a boca seca. Ou talvez tenha sido o champanhe. O certo é que
não matou sua sede. Ele vestia seu casaco de domingo sobre uma camisa branca com um
laço fino atado. Seu rosto estava barbeado, com o cabelo – da cor da meia-noite — penteado
para trás. Quando chegou perto o suficiente para lhe tocar, ele sorriu.
— Ei, menina aniversariante. — Menina. Por que não podia ter usado a palavra
mulher?

35
Ele colocou a mão na parte inferior de suas costas, inclinou-se e deu um rápido beijo
em seu rosto. Ela sentiu o cheiro da colônia de sândalo que ela lhe tinha dado no Natal
passado, mas por baixo era a amada fragrância a couro, cavalos e planícies abertas. Ele
sempre cheirava a trabalho duro e a liberdade para fazer o que quisesse. Seus pais haviam
restringido suas atividades muito menos do que tinham as dela. Em parte porque ele era
mais velho, mas também porque ele era do sexo masculino, pelo que eles não se
preocupavam tanto com ele. Essa diferença sempre a incomodara. Um dia chegaria em que
ele iria gerenciar o rancho e isso era algo que ela sabia que também poderia fazer com
sucesso, se lhe fosse dada a chance. Mas ela tinha seu petróleo e, com isso ela sabia que
poderia fazer um nome para si mesma. Ela tinha muito de sua mãe para falhar.
— Demorou bastante tempo para chegar até aqui, — ela repreendeu.
— Eu não achei que você fosse notar com todos os caras se movimentado em torno
de você.
Oh, ela tinha notado.
— Acho que vou terminar a noite, — acrescentou.
Ele poderia muito bem ter lhe arrancado a cabeça. — A festa não termina até meia-
noite. Nós ainda temos um par de horas.
— Você não precisa de atenção e, matar a cascavel hoje me arrasou.
Por atenção, ela tinha a sensação de que ele se estava referindo à devoção de Cole.
Ele dançou com ela três vezes, e estava, nesse momento, na pista de dança com sua mãe.
— Você tem que dançar comigo antes de ir.
— Eu não danço.
— Você dançou com Maggie.
Ele olhou para Maggie, que apenas levantou as mãos em sinal de rendição. — Nós
não o fizemos às escondidas. — Ela lhe deu um tapinha de brincadeira no ombro.
— Você tenha atenção às cascáveis quando for para casa. Embora eu suspeite que
elas serão muito menos perigosas do que Faith se você não dançar com ela. Eu estou indo
pegar um pouco mais de champanhe. — Ela deslizou para longe.
— Por que você não quer dançar comigo? — Perguntou Faith.
— Você tem muitos caras ansiosos para dançar com você.
— Mas nenhum deles é você. — Ela não tinha a intenção que seu tom soasse com
tanta saudade ou melancolia.
— Faith
— Por que você não gosta de mim?
O choque em seu rosto era recompensador. — Você não pode achar que eu não
gosto de você só porque eu não quero pisar em seus pés.
Ela deslizou o braço no dele. — Você não vai pisar em meus pés. Dance comigo.
Ela sentiu sua resistência dissipando à medida que a rigidez foi abandonando os
músculos de seu braço, como se tivesse preparado para este momento, mas, agora que o
momento tinha chegado, não era tão desagradável quanto ele esperava que fosse. Mas
quando ele começou a acompanhá-la até o salão, ela o segurou.
— Vamos esperar que comece a próxima. Eu quero uma dança completa. — E uma
lenta.

36
Por alguma razão, ele a esteve evitando toda a tarde, tinha arranjado uma desculpa
atrás da outra para não estar em sua companhia, então ela queria aproveitar ao máximo os
momentos que viriam. Ela sabia que seu pai tinha começado a dar-lhe mais
responsabilidades no rancho, preparando-o para assumir o cargo de capataz logo que o seu
atual capataz decidisse pendurar seu chapéu e arrumar suas esporas, mas a notória ausência
de Rawley parecia abranger mais do que isso. E ela encontrou-se sentindo falta dele.
Ele não discutiu com ela. Provavelmente porque ele não queria criar confusão e
chamar a atenção. Ele era assim, mas era difícil não o notar. Ela nunca o tinha visto ser
indelicado com ninguém, e ainda assim, ele exalava uma aura perigosa que sugeria que ele
não era um homem para tomar de ânimo leve. Talvez fosse porque seus sorrisos eram raros.
Ou a maneira como seus olhos percorriam o mundo, como se ele estivesse sempre em busca
de problemas, não chegando a confiar que o que ele estava vendo era como as coisas
realmente eram. Ela imaginava que Maggie sabia mais sobre ele porque ela tinha estado
presente quando Rawley entrou para a família. Ele já fazia parte dela no momento em que
Faith nasceu. Sempre que ela perguntava a alguém porque Rawley vivia com eles quando sua
mãe não tinha dado à luz a ele, a resposta era sempre a mesma, não importa quem lhe dava:
Ele precisava de um lar.
Um lar. Não uma casa. Conforme foi ficando mais velha, ela percebeu a diferença.
Mas o que quer que tenha acontecido com ele, antes que ele viesse para a sua família, há
muito que estava enterrado, e ela suspeitava que estava submerso profundamente o
suficiente, para nunca mais vir a tona. Ela sabia que ele não tinha mais parentes, ninguém
para visitá-lo ou perguntar por ele. Ela não podia imaginar não ter todas as suas tias, tios e
primos, por perto.
Finalmente a música acalmou e um frisson de antecipação a percorreu, algo que ela
não tinha experimentado durante toda a noite, nem mesmo com a primeira dança da noite.
Cowboys bonitos, banqueiros, advogados, donos de lojas e Cole — ela tinha varrido o chão
com uma variedade de homens. A maioria deles jovens, solteiros, e ainda assim, com
nenhum deles, ela tinha contado os segundos até que ele a tomou em seus braços.
Mas o fez com Rawley, e quando esse momento chegou, ela percebeu o que lhe tinha
feito falta todos esses anos, o conhecimento claro e absoluto de que este homem poderia ser
parte de sua família, mas ele não era da família. Ela estava ligada a ele, e, certamente, não
era como uma irmã para um irmão.
Quando ele a levou para valsar, ele segurou a mão no ar para que ela pudesse pousar
a dela na dele, enquanto a outra mão mal tocou entre as omoplatas, sobre a seda, e ela se
perguntou se ele tinha feito um esforço consciente para não tocar sua pele. Nem todos os
homens tinham. A sua outra mão descansou no seu ombro, onde sentiu a firmesa dos
musculos. Tendo-o visto sem camisa inúmeras vezes, ela sabia, sem dúvida, que ele era
composto de tendões e músculos tonificados.
A intensidade com que ele a observava era o bastante para que a sua respiração
estivesse presa. Ele, certamente, não tinha focado seu olhar sobre Maggie da mesma
maneira quando ele a levou para a pista de dança. Bem vistas as coisas, o tempo todo ele
tinha dado a impressão de que ele queria estar em outro lugar. Ela esperava o mesmo, mas
em vez disso ficou com a sensação de que ele poderia estar a memorizar o momento.

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— Você está linda esta noite, — disse ele com tal seriedade que quem o escutasse
poderia pensar que ele estava falando com ela pela última vez, como alguém pairando no
precipício da morte.
— Não estou sempre? — Brincou ela, na esperança de aliviar o seu humor.
Ele lhe deu um sorriso, lançou um bufo de risada. — Você sabe que sim.
— E você é bonito.
Seu sorriso era auto-depreciativo. — Você sabe que a bajulação não é o caminho.
— Eu quero dizer isso, Rawley. Você está com boa aparência. —Sua pele estava
bronzeada por anos passados numa sela, misturada com sua herança Shawnee. Seu cabelo
negro caindo sobre a testa, e seus dedos coçaram para escová-lo de volta, para torná-lo um
pouco menos selvagem, mas nada sobre Rawley já tinha dado a impressão de que ele era
menos que isso.
— Eu poderia dizer que um monte de meninas estava esperando que você lhes fosse
pedir para dançar.
Ele apenas balançou a cabeça, nunca se tinha sentido confortável com louvores. Seu
pai não lhes deu muitas vezes, quando o fazia realmente ele queria dizer isso e as bochechas
de Rawley ficavam de um profundo tom vermelho. Faith sempre tinha pensado que ele
ficava adorável quando corava, mas ela nunca brincou com ele sobre isso.
— Maggie disse-me que você ama alguém.
Seus olhos se estreitaram, um músculo pulsou em sua bochecha, sua mandíbula
apertada. — Essa menina tem a maior boca.
— Se você me dissesse quem ela é, talvez eu possa ajudar com o seu cortejo. — Deu-
lhe um olhar aguçado.
— O que você sabe sobre cortejar, Faith?
Que ela tinha finalmente chegado a uma idade em que seu pai deixaria que alguns
homens começassem a convidá-la para sair, desde que eles estivessem dispostos a enfrentar
o desafio de olhares duros que ele era suscetível lhes dar.
— Eu sei o que as garotas gostam. Eu poderia lhe dar algumas dicas.
— Eu não preciso de dica nenhuma. Eu posso, muito bem, lidar com minha própria
vida amorosa.
— Ela está aqui hoje à noite?
Ele comprimiu seus lábios, um sinal claro de que não ia responder. Quantas vezes ele
a tinha irritado ao longo dos anos, mantendo silêncio sobre questões que ela queria
respondidas? Será que os meninos gostam de meninas que escalavam as árvores,
controlavam os cavalos melhor do que eles, podiam laçar um bezerro, ou podiam disparar
um rifle com precisão mortal? Embora ele não tivesse se mantido em silêncio sobre todas as
questões, era como se tivesse, porque sua resposta: — Basta ser você mesma, Faith. Você vai
tê-los caindo a seus pés, — não foi uma grande ajuda quando se tratava de descobrir o que
quereria um companheiro.
Em seguida, eles não estavam mais falando, simplesmente se moviam ao ritmo da
música. Seu olhar sustentou o dela, e ela se viu caindo nas profundezas marrom escuro de
seus olhos. Nenhum indício de humor residia dentro deles. Em vez disso, ele era todo
seriedade e algo mais que ela não conseguia decifrar. Mas isso a desafiou, fez seus dedos

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apertarem onde quer que eles tocassem. Todos os outros casais desapareceram até que
fosse só ela e Rawley deslizando sobre o piso de madeira.
Desde que ela se lembrava, sempre tinha sido assim entre eles. Não era necessário
utilizar palavras para se comunicarem, sempre sabiam o que o outro necessitava, queria ou
pensava. Só que agora, o que estava se mexendo dentro dela, a assustava pela sua
intensidade, e ainda assim, ela teve a sensação de que ele estava lutando contra a mesma
consciência inquietante.
Assim que a música ficou em silêncio, ele soltou-a tão rápido que quem estivesse
assistindo teria pensado que ela tinha pegado fogo.
— Eu preciso ir. Feliz aniversário, Faith.
Ela se questionou porque, quando ele saiu da sala, era como se ele tivesse levado a
luz com ele.

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Capítulo Sete

Com a lua cheia deslizando por detrás de ondulantes nuvens negras, Rawley sentou-
se em sua varanda em uma cadeira de encosto reto, as pernas dianteiras levantadas,
escorado para trás, e tomou um gole de uísque. Dançar com Faith tinha sido um erro. Ela não
era mais uma criança. Ele ainda podia sentir a elegância de suas costas contra a palma da
mão. Suas narinas tinham queimado quando ele inalou seu perfume — almiscarado
entrelaçado com sensualidade — que era de algum modo diferente do que tinha sido uma
vez. À medida que eles se moviam ao ritmo da música, ele queria envolver aqueles pequenos
cachos ondulados, ao longo de seu pescoço, em torno de seu dedo e atraí-los suavemente
em direção a ele até que sua boca estivesse mais perto da sua — Seus lábios pareciam mais
vermelhos, mais cheios, como se, também, tivessem amadurecido, em antecipação a um
momento em que ela teria homens a beijando. E seus olhos – quentes e familiares —
enfrentaram os seus com tal intensidade que ele não queria nada mais do que tomá- la como
sua. Mas ela ainda era jovem, inocente e ingênua sobre os homens. Certamente ela tinha
visto suficientes animais reprodutores para conhecer os pormenores relativos a como o
fazer, mas ela não conhecia todas as sutilezas do mesmo, de como um homem era diferente
de um animal, como as mãos acariciavam – Ele fechou esse pensamento como se fecha o
porão de um curral para prender os cavalos.
Depois de dançar com ela, ele não poderia ficar e assistir ela valsando pela sala com
outros homens, sabendo como era mantê-la em seus braços. Vê- la com Berringer tinha sido
um tormento antes de ele dançar com ela, mas depois teria sido pura tristeza. Então, ele
voltou para sua casa e serviu- se de um uísque, determinado a esquecer, mas tudo o que ele
tinha sido capaz de fazer era reviver os momentos, mais e mais.
Ele dançou com Maggie, que era tão bonita quanto um botão de rosa, e não tinha
tido um único pensamento de colocar suas mãos em qualquer lugar diferente de onde elas
respeitosamente descansavam. Quando foi com Faith, porém, sua mente vagava para lugares
que não deveria.
E parecia que Faith também estava a vaguear.
Deixando seu uísque de lado, ele deixou as pernas da cadeira caírem, antes de se por
em pé e caminhar para a beira da varanda para obter uma melhor visão dela, montada em
seu cavalo, à medida que trotava em direção a ele.

— Rawley! — Ela gritou, estendendo o seu nome como se tivesse cinco silabas. Ela
parou o cavalo.
— A festa acabou.
— O que você está fazendo aqui, Faith? — Ele perguntou à medida que andava para
fora da varanda.
— Eu queria ver você. Ajude-me.
Ela ainda estava com o vestido, tinha montando o cavalo a direito, e a saia tinha
subido até aos joelhos, o luar brilhando sobre seus tornozelos criando-lhe água na boca. Ela
estendeu os braços para ele, começou a escorregar — Ele correu e pegou-a enquanto ela
estava caindo, impedindo que caísse de cabeça. Com os pés no chão, ela caiu contra ele.

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— Você está bêbada, — disse ele, passando um braço ao redor dela, segurando-a
contra o peito.
— Um pouco. Muito champanhe. — Ela balançou a cabeça, endireitou-se, afastando-
se para trás até que ela ficou sozinha. Um sorriso bobo se espalhou por seu rosto enquanto
ela sussurrou, — Cole me beijou.
O pensamento daquele homem baixando os lábios para Faith, colocando seus braços
ao redor dela, fê-lo sentir-se amarrado num aperto mais forte do que um fio de arame
farpado entre dois postes. Por vontade própria, com as mãos fechadas em punhos, ele
decidiu que iria fazer uso deles na próxima vez que ele estivesse a um passo do arrogante
homem do petróleo.
— Você não sabe nada sobre Berringer. Se ele tomou vantagem...
— Não, ele não o fez. Ele é um cavalheiro. E eu sei muito sobre ele. Ele vem de uma
boa família perto de Houston. Papai contratou alguns ex-Texas Ranger para verificá-lo, antes
de me dar o ok para trabalhar com ele, antes dele me pedir permissão para procurar
petróleo na nossa terra.
Até onde Rawley estava preocupado, nada disso dava a Berringer o direito de
conhecer o gosto dela.
— Você não deve dar a um homem seus favores a menos que exista um
entendimento entre vocês.
— O entendimento era que eu queria um beijo. Além disso, eu já beijei outros caras
antes.
— Quem? — A palavra saiu como um latido, dura e ecoando ao seu redor.
— Quando?
— John Byerly no meu décimo sexto aniversário. Augustus Curtis no meu décimo
sétimo. Eu sempre beijo um cara no meu aniversário.
Seu pai estava ciente disso? Ele arrancaria-lhe a pele se descobrisse que ela estava
saindo por aí, oferecendo algo tão precioso quanto os seus lábios.
— Por quê?
— Curiosidade. E no meu aniversário de dezesseis anos eu queria fazer algo
memorável. Acho que eu estive procurando por isso desde então.
Teria ela encontrado? Provavelmente não, se ela apenas tivesse beijado meninos e
jovens que nunca tinham tido a oportunidade de pegar a estrada e, passar por uma cidade
vaqueira onde as meninas do salão de dança e maculadas pombas esperavam sua chegada.
— Berringer deu- lhe algo memorável?
Ele queria morder a língua por perguntar. Ele não queria ouvir o homem elogiado por
ser um excelente beijador.
Ela estudou- o por um minuto inteiro.
Com o coração acelerado, ele esperou que ela lhe dissesse que o homem do petróleo
tinha dado a ela, exatamente, o que ela desejava.
— Não exatamente, — ela finalmente disse.
— Mas talvez seja porque ele não é o único que eu tenha decidido querer beijar esta
noite. — Ela apertou-se contra ele, envolveu os braços sobre os seus ombros, encontrou seu
olhar de frente.
— Você é.

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Talvez fosse porque uma pequena faísca de ciúme tenha surgido quando ela se
apercebeu de que outra pessoa tinha reclamado seu coração. Ou talvez fosse porque
durante os últimos dois anos, ela comparou, cada homem que tinha cruzado seu caminho,
com ele e encontrou todos eles em falta, num aspecto ou outro.
Eles não partilhavam o seu amor à terra que tinha nascido com ela. Eles não
respeitavam o legado que lhes tinha sido entregue, por aqueles que lutaram para libertar o
território, para que ele pudesse tornar-se parte dos Estados Unidos, ou eles não apreciavam
os sacrifícios que haviam sido feitos por aqueles que tinham se estabelecido e, trabalharam a
terra para torná-la maior do que poderia ter sido de outra forma. Eles gabavam-se-de fazer
as coisas de um modo tão tranquilo que isso falava por eles. Seus sorrisos não surgiam
lentamente, levantando um canto dos lábios antes de levantar o outro. Eles não lhe davam
metade de uma vara de salsaparrilha. E eles não se mantinham tão imóveis que eles
poderiam muito bem ser uma estátua.
— Quanto champanhe que você tomou?
— Você está com medo? — Ela provocou.
Ele zombou. — Dificilmente.
— Talvez seja porque você não sabe como, talvez você nunca tenha beijado uma
garota antes.
— Eu já beijei muito.
— Então por que não quer me beijar?
— Porque você merece o melhor.
— Eu não estou pedindo para você se casar comigo, cowboy. Apenas me beije. — Ela
agitou um pouco a cabeça, inclinou o queixo para cima um pouco, olhou para o céu, as
estrelas reluzindo sobre veludo preto.
— Por outro lado, pode ser que eu tenha avaliado mal o beijo de Cole, não lhe dei
suficiente credibilidade. Ele fez meus dedos curvarem.
A única luz vinha da lua e das estrelas que brilhavam, mas ainda assim ela conseguiu
detectar um aperto em sua mandíbula.
— Esses caras que você beijou antes eram apenas meninos, e Berringer é um novato.
Eu duvido que eles saibam alguma coisa sobre beijar adequadamente.
— Então me mostre.

Ele emitiu um rosnado baixo na parte de trás de sua garganta quando ele segurou seu
rosto com uma mão.
— Esta é uma má ideia, Faith. Uma maldita má ideia.
Então, ele puxou-a para si, baixou a boca para a dela, e admoestando-a separar os
lábios. Quando o fez, ele reivindicou a boca dela com a mesma intensidade que uma
tempestade varre a terra, escura e esvoaçante, não dando qualquer trégua, ameaçando
conquistar tudo em seu rastro. A palma da mão segurando o rosto se moveu até que seus
dedos estavam enfiados em seu cabelo e, seu polegar estava acariciando o canto da boca,
aumentando a sensualidade do momento, provocando um calor que fluía lentamente
através dela, levando-a para longe em uma maré de indulgência sensual. Com o braço livre

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serpenteando ao redor dela, ele pressionou seu peito contra ele, e ela suspeitou que, através
de sua camisa, ele podia sentir o arrepiar de seus mamilos, sua sensibilidade aumentando a
cada golpe de sua língua sobre a dela.
O seu não foi um beijo tímido como os dos rapazes que tinham vindo antes. Nem era
civilizado como Cole. Era selvagem e indomável, uma força a ser reconhecida. Exigia uma
resposta igual em intensidade. Ela passou os braços firmemente em torno de seu pescoço
porque ela precisava de amparo. Não só os dedos dos pés se curvaram, mas suas pernas
ficaram tão instáveis como os de um potro recém-nascido, e ela tinha medo de envergonhar
a si mesma, deslizando para baixo ao longo de seu comprimento, de seu magnífico e
endurecido corpo. Ela se sentia aquecida com um prazer que ela nunca tinha experimentado,
nem sequer sabia que existia. A cada momento que passava, ela estava ciente de uma
metamorfose acontecendo, como se estivesse a tecer um casulo ao redor dela, envolvendo-a
em êxtase, e quando o beijo chegou ao fim, ela emergiu para descobrir que tinha sido
transformada em algo mais bonito do que jamais imaginou ser possível.
Ele estava fazendo coisas em sua boca que a fizeram pensar que os seus aspectos
femininos tinham realmente florescido e, verdadeiramente, desabrochado em uma flor
gloriosa que lhe roubou o fôlego. Dentro de seus braços, pela primeira vez em sua vida, ela
sentiu o poder de sua feminilidade, sabia a extensão da força que residia dentro dela.
Ao devolver o beijo com idêntico fervor, ela se sentiu a altura da tarefa de encontrá-lo
nos termos que ele definiu e, ousada o suficiente para definir alguns de seus próprios. Ela
roçou os dedos ao longo de seu couro cabeludo através de seu cabelo preto e grosso. Ao
longe, em outro mundo, ela ouviu suspiros e gemidos circulando ao seu redor. Seu corpo
apertava com necessidades e anseios que a assustavam pela sua intensidade, mas, ao
mesmo tempo, acenavam com a promessa de mais. E ela queria tomar tudo o que lhe era
oferecido.
Com um gemido desesperado, ela pressionou seus quadris contra os dele, à procura
de algo que ela pensava que só ele poderia entregar.
De repente, ele interrompeu o beijo, segurou seus ombros, e a colocou longe dele.
— Feliz aniversário, — resmungou.
Então ele saiu como se não tivesse acabado de reorganizar seu coração e sua alma,
enquanto derrubava tudo o que ela tinha acreditado que sabia sobre Rawley Cooper. Ela não
o conhecia de todo.

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Capítulo Oito

Beijá-la tinha sido uma maldita coisa estúpida de se fazer, quase tão estúpida como
ter permitido que ela o incitasse a fazê-lo. Ele deveria ter apenas roçado os lábios nos dela e
rido sobre isso, mas não. Sua natureza competitiva tomou conta, e ele seria condenado se ia
deixar Berringer lhe dar um beijo mais memorável do que o dele.
Então, ele derramou necessidade, desejo e anseio no beijo que quase o fez saltar de
suas botas. Deus do Céu, ele sentiu como se tivesse sido atingido por um raio. E agora ele
estava andando em sua varanda, terminando seu uísque, esforçando-se para lavar o gosto
dela. Champagne tinha escurecido seu sabor, e ele pensou que tinha detectado uma pitada
de todas as varas de sarsaparilla que tinha compartilhado com ela ao longo dos anos. Ou,
talvez, ele estava se esforçando para encontrar alguma evidência de que ela ainda era uma
criança, algum aspecto dela que iria tê-lo pensando nela mais uma vez como a menina que
ele tinha sempre querido proteger. Mas ela, com toda a certeza, já não era mais uma criança.
Ela era uma mulher adulta, e quando ela se apertou contra o seu corpo, ele sentiu
cada curva suave, cada angulo, e... aqueles pequenos mamilos duros que fizeram com que
ele quisesse baixar o seu corpete e lambê-los. Mas, em algum lugar, ele conseguiu encontrar
um pouco de algo semelhante a auto-preservação, porque ele sabia que se seu pai
descobrisse, ele colocaria Rawley sete palmos abaixo da terra. No entanto, ele não podia
deixar de pensar, que ter um de seus mamilos contra sua língua, teria valido a pena.
Ele ardia com a necessidade de possuí-la, que o fez se sentir trêmulo e aterrorizado
como o inferno, caso ele não encontrasse forças para não tocá-la novamente.
E, ele ia ter de tocá-la de novo, para ajudá-la a subir para a sela porque o álcool a
tinha tornado demasiado instável, para conseguir fazê-lo sozinha. Ele não sabia como ela
tinha conseguido isso da primeira vez. Em seguida, ele teria que acompanhá-la a casa. Ele
meio que queria que ela dissesse alguma coisa. Pelo contrário, ela só ficou lá, balançando um
pouco e observando-o. Ele não podia deixá-la aqui fora, não conseguia pensar em uma
maneira de consertar esta bagunça.
— Rawley? — Ela gemeu, sua voz soando como um ronronar, como um gatinho
recém-nascido.
— O que é?
— Eu acho que estou indisposta. — Ela caiu de joelhos e vomitou.
Ele estava ao seu lado, esfregando suas costas, antes que a segunda onda de náuseas
se abatesse sobre ela. Em seguida, o absurdo da situação o atingiu, e ele não conseguiu
segurar. Ele riu, ruidosamente, com uma ponta de alívio e constrangimento. Quando ela
olhou para ele, ele riu novamente.
Quando ela se endireitou, ele tirou um lenço do bolso e limpou a exuberante, perfeita
e bonita boca.
— Meu beijo não foi tão ruim, foi, Faith?
Ela lhe deu um sorriso indiferente. — Não, mas me sinto horrível.
— Você vai se sentir muito pior pela manhã. Vamos lá, vamos levá-la para a cama.
— Eu acho que não posso andar.

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Aparentemente, ela tinha desenvolvido um dom para eufemismos. Mesmo estando
ele sentado atrás dela e a mantendo na sela, seria uma longa e torturante viagem para os
dois — ela, por causa da sua má disposição, ele porque ela estaria em seus braços.
— Você pode dormir aqui.
Ele a ajudou a se levantar. Ela tinha dado dois passos antes de começar a tropeçar. Ele
a tomou em seus braços. Com um pequeno suspiro, ela se aninhou, a cabeça na curva de seu
ombro.
— Eu sempre pensei que fosse muito alta para ser carregada, — disse ela, pensativa.
— Tem tudo a ver com a alavancagem.
— Você é apenas forte. Eu vi você fazer um boi ficar de joelhos. Vi você fazendo um
monte de coisas.
— Isso é porque você tem andado por aqui há muito tempo. Dezenove são muitos
anos.
Levou-a para a cabana, para seu quarto, e a deitou na cama. Seus olhos estavam
fechados, e ele achou que ela já tinha adormecido. Ele começou a tirar os sapatos.
— Você alguma vez quis mais do que isto? — Perguntou ela, melancolicamente.
É claro que ele queria mais. Como o chão tem sede de chuva, e as abelhas ansiava por
néctar. Ele desejava beijá-la novamente, até que ambos estivessem sem fôlego. Ansiava por
colocar seu corpo sobre o dela e dar-lhe alívio quando a tensão atingisse o seu auge, seus
gritos de libertação ecoando ao seu redor.
— Vá dormir.
— Você beija bem, — ela murmurou. — Melhor do que Cole.
Ele fez uma careta. Enquanto suas palavras arrastadas deviam tê-lo feito estufar o
peito com orgulho, ele não podia ultrapassar o fato de que o beijo nunca deveria ter
acontecido, e que, ela não estaria aqui, se não tivesse bebido demais.
— Sobre isso. Não devia ter acontecido, Faith.
— Eu sei. Por causa dessa senhora que você ama. Diga-me quem ela é, e eu vou
deixá-la saber que você beija bem.
Ele colocou os sapatos de lado. — Isso, provavelmente, não é uma estratégia muito
boa para cortejar.
— Você está cortejando?
— Não.
— Você deveria. — Ela seguiu o comentário com um pequeno ronco.
Não, ele não deveria. Ele era muito velho para ela. Demasiado quebrado. E se ele não
tivesse parado aquele beijo naquele momento, ele a teria trazido até aqui e lhe
demonstrado, exatamente, porque ele não era suficientemente bom para ela. Ele a queria
com uma necessidade que assustava o inferno fora dele.
Alcançando atrás dela, ele agarrou a colcha e a desdobrou sobre ela. Então ele ficou
lá, por mais algum tempo, apenas observando-a dormir.

Assim, ao primeiro sinal da madrugada se infiltrando através das janelas, Rawley


acordou, dolorido e magoado, pela noite passada no sofá. Depois de se esticar para afastar a
rigidez, ele se levantou e andou até o quarto. Faith ainda estava lá, enrolada de lado,

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dormindo profundamente. Ela ia se sentir péssima quando acordasse, mas ele achou que não
seria para já, ainda teria algumas horas.
Ele precisava deixar seus pais saberem onde ela estava, antes de que eles
descobrissem seu desaparecimento e enviassem um destacamento para procurá-la. Ele
conhecia suas rotinas, sabia que eles já estavam trabalhando. Sem se preocupar em perder
tempo para lavar-se, ele, simplesmente, selou seu cavalo e se dirigiu para a casa.
Assim como ele esperava, Dallas e Ma estavam sentados na varanda de trás, onde
eles sempre cumprimentavam o dia. Ele puxou seu cavalo para que parasse, desmontou, e
envolveu as rédeas ao redor do corrimão antes de marchar até ao pé deles. Ambos se
levantaram, sua mãe se aproximando e dando-lhe um beijo na bochecha, como era seu
costume.
— Bom dia, — disse ela.
— Bom dia.
— Parece que vai ser um bom dia, — disse Dallas.
Não para Faith. — Eu vim para que vocês saibam que Faith está na minha cama dor...
O soco na sua mandíbula veio rápido e inesperadamente, fazendo-o cambalear para
trás, tropeçando em seus pés até que ele caiu no chão de costas.
— Dallas! — Ma gritou, empurrando o ombro do homem que agora estava em cima
dele, a fúria escurecendo seus traços enquanto ele se manteve firme, indiferente aos
esforços de sua esposa.
— Depois de tudo que fiz por você, você aproveitou-se de nossa filha... levante-se.
Rawley sabia que outro soco estava em espera no final daqueles punhos fechados,
tão apertados, que as juntas estavam brancas. Ele balançou a cabeça.
— Não aconteceu nada. Ela veio me ver, estava bêbada, vomitou, e eu a deitei na
cama. Eu não a toquei. — Era uma pequena mentira, mas se ele confessasse que a tinha
beijado, estaria morto.
Respirando com dificuldade, Dallas olhou para ele. Uma miríade de emoções — raiva,
traição, decepção, tristeza, remorso — percorreram suas feições enquanto suas mãos,
lentamente, se abriram. Sua maldição retumbante ecoou ao redor deles enquanto ele
abaixou a cabeça. Desta vez, quando Ma o empurrou de cima dele, ele recuou três passos.
Ela se ajoelhou ao lado de Rawley. Sua mão a dispensou.
— Estou bem.
Ele não queria ser tocado, não naquele momento.
— Sinto muito, filho, — Dallas disse, sua voz embrutecida por verdadeiro
arrependimento e vergonha.
— Eu não sou seu filho, — disse Rawley, erguendo em seus pés.
— Seu filho está enterrado debaixo do moinho de vento, e todos nós sabemos que é
por minha causa.
Porque em uma noite de inverno, quando ele era um menino e um homem tinha sido
bruto com ele no beco fora do Grand Hotel, Rawley tinha gritado, e Cordelia Leigh, volumosa
com uma criança em seu ventre, o tinha ouvido e veio em seu auxílio. O homem, em pânico,
tinha jogado nela uma pilha de caixas e a ferido muito. Ela perdeu o bebê que ela estava
carregando. Se ao menos Rawley tivesse tido a coragem de não gritar, para não chamar a
atenção para o horror que ele estava enfrentando.

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— Rawley...
— Não. Eu sei porque você reagiu como o fez. Eu não o culpo. Se eu tivesse uma filha
e um homem com os meus antecedentes a tocasse, eu o mataria.
— Você não foi responsável pelo que aconteceu com você.
— E mesmo assim aconteceu. — E isso fez com que se sentisse sujo e envergonhado.
Nem todos os banhos do mundo poderiam lavar as distantes memórias, não poderiam fazê-
lo sentir-se limpo.
— Deixe que sua Ma trate de seu lábio.
Tocando com sua língua o canto da boca e saboreando o sangue, ele sacudiu a
cabeça.
— Tenho que ir embora.
As suas palavras trouxeram a calmaria. Era a única maneira que ele poderia ter
certeza de que o que Dallas temia que tinha acontecido entre ele e Faith, nunca aconteceu.
— Eu tenho que sair daqui, fazer meu próprio caminho, tornar-me eu mesmo. Eu
nunca vou ser capaz de pagar o que você fez por mim. — Mas partir era um começo.
Suspirando profundamente, Dallas elevou a cabeça para trás e olhou para a névoa
rosa púrpura da aurora.
— Eu tive medo, medo de que minha filha poderia ter se machucado e não havia nada
que eu pudesse fazer para Pará-lo.
— Eu nunca a machucaria.
— Eu sei disso.
— Podemos conversar sobre isso, — disse sua mãe com ternura.
— Não há nenhuma razão para você ir. — Mas havia.
— Eu estive pensando em partir já há algum tempo. Para descobrir o que quero e
qual é meu lugar neste mundo.
Dallas assentiu em direção ao horizonte. — Quando eu me for, metade deste rancho
será seu.
As palavras o atingiram com força, em vários níveis. O preço que ele pagaria para ter a
terra seria a perda de Dallas, e apesar de sua incompreensão presente, ele ainda amava o
homem por tudo o que era. O fato de que ele sempre o apoiou.
— Se não fosse por mim, você estaria deixando para seu filho.
Dallas o encarou de frente.
— Você é meu filho.
Assoberbado com emoções, com medo que ele ia fazer algo efeminado como chorar,
Rawley sacudiu a cabeça.
— Tudo o que tem deve ir para Faith.
— Há muito para ela.
— Eu não vou ficar com o que, por direito, é de seu sangue.
Dallas sacudiu a cabeça. — Passei vinte anos tentando garantir que você se sentisse
como família, e com uma conclusão precipitada e um soco, consegui destruir tudo. Vou
lamentar isso pelo resto da minha vida.
— Você não tem nada a lamentar. Agradeço tudo o que fez por mim, mas eu tenho
que encontrar meu próprio destino, fazer o meu próprio caminho.

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Dallas riu baixo. — Meus irmãos sentiram o mesmo. Tentei encurralá-los e mapear
suas vidas, mas, eventualmente, eles se soltaram. Eu acho que talvez você tenha razão. É
hora de ser você mesmo, não uma sombra do que eu acho que você deveria ser. Mais tarde,
vamos ao banco, pegar alguns fundos.
— Não. — Ele precisava sair agora, enquanto o queixo ainda doía, e ele podia
recordar vividamente como ele se sentia por ter Faith em seus braços.
— Eu tenho dinheiro suficiente guardado. — E ele queria fazer isso por conta própria.
— Tudo o que eu preciso é de um cavalo, minha sela e apetrechos.
A parte mais difícil foi dizer adeus à mulher que considerava ser sua mãe. Ele a
abraçou com força, não tendo a certeza onde foi que ele encontrou forças para deixá-la ir.
Piscando para conter as lágrimas, ela deu um tapinha no rosto.
— Você vai escrever para mim muitas vezes, deixar-me saber onde você está e o que
você está fazendo.
— Eu vou.
Ele estendeu a mão para Dallas, grato quando o homem lhe deu um aperto firme.
— Sempre haverá um lugar aqui para você.
— Eu fico agradecido. — Ele hesitou, depois acrescentou:
— Não há razão nenhuma para Faith saber o que aconteceu esta manhã.
— Como é que você vai explicar o corte nos lábios?
— Eu vou lidar com isso.
Ele voltou para sua cabana, grato por encontrar Faith ainda dormindo. Encostado à
ombreira da porta, ele memorizou cada aspecto dela. O emaranhado de seu cabelo negro se
espalhando por seu travesseiro, o comprimento ágil de seu corpo enrolado em sua cama.
Suas longas pernas que ele queria desesperadamente em volta dele.
Ela parecia tão inocente em seu sono, seus grossos cílios cor de fuligem descansando
em suas altas maçãs do rosto. O sol tinha bronzeado sua pele sem deixar uma única sarda
para trás. A seus olhos, ela era perfeita.
Ele lamentou perder o seu ataque de temperamento quando ela acordasse e desse
conta de sua partida. Ela era linda no auge da sua paixão. Mas ele não queria levar consigo
quaisquer palavras amargas que poderiam surgir entre eles, e se ela derramasse uma única
lágrima, ele não sabia se encontraria dentro de si, o necessário para fazer o que precisava ser
feito. Com um suspiro solitário ele deixou de sonhar.
Após embalar algumas coisas em seus alforjes, ele montou seu cavalo e se dirigiu para
o oeste.

48
Capítulo Nove

Agosto 1909

— Tio Rawley, você tem um cachorro? — Callie perguntou, em torno do pedaço de


bacon que estava mordiscando.
Faith e sua filha haviam chegado à hora do almoço, e até agora a refeição tinha sido
tão tranquila como a da noite anterior, o que significava não tranquila de todo.
— Eu tinha, — disse ele.
Sua delicada sobrancelha se franziu. — O que aconteceu com ele?
Ele tinha envelhecido e teve que sacrificá-lo, uma das coisas mais difíceis que já tinha
feito em sua vida, mas como lhe diria isso? Ela sabia sobre a morte?
— Ele foi brincar no céu, — disse Faith, poupando-lhe o tormento de, possivelmente,
partir o coração da criança.
— Você deve ter outro.
A menina era tão mandona como sua mãe. — Talvez um dia, quando eu estiver um
pouco mais estável.
— Eu gosto de cães. — Para provar seu ponto, ela deu o último pedaço de seu bacon
para o vira-lata desalinhado.
— Rufus dorme comigo.
— Eu aposto que isso o faz feliz.
Ela assentiu com a cabeça. — Você vai brincar comigo hoje?
— Eu tenho que trabalhar.
— Falando nisso, — Faith disse, — talvez nós devêssemos ter uma pequena reunião
privada antes que os homens se reúnam, para que possamos discutir como queremos lidar
com as coisas.
— Você está no comando. Apenas me diga o que fazer.
Aparentando estar perdida, ela olhou para o pai, em seguida, para sua mãe, em
seguida, virou seu olhar de volta para ele.
— Você estava no comando das coisas antes de ir embora.
Ele deu de ombros. — E agora você está.
Ela parecia surpresa, mas também satisfeita. Ele tinha poucas dúvidas de que ela
poderia lidar com todas as responsabilidades de gestão, da prospecção e todos os homens
que trabalhavam para eles. Ela passou uma boa parte de sua juventude percorrendo o
rancho com ele e Dallas, laçando bezerros para marcar, movendo novilhos de um pasto para
outro, consertando cercas, transportando feno. Ela conhecia o funcionamento do rancho,
assim como ele.
— Eu achei que era melhor fazê-lo, — disse ela.
Enquanto ela dava um abraço e algumas palavras finais a sua filha, ele saiu, para onde
os vaqueiros estavam reunidos. Ele apertou as mãos dos homens que ele conhecia,
apresentou-se aos que ele não conhecia, notou a ausência de alguns rostos familiares.
Muitas mudanças haviam ocorrido desde que ele partiu.

49
Então Faith saiu de casa. As calças jeans pareciam melhor sobre ela, do que em
qualquer homem que ele conhecia, e ele lutou para não notar como suas curvas eram um
pouco mais pronunciadas. O vestido, que usara na noite anterior, tinha ocultado maravilhas.
As roupas que ela usava agora revelavam tudo, e não havia um único aspecto que não era
agradável aos seus olhos. Caminhando para o centro do grupo, ela parou ao lado dele.
— Que trabalhos vai nos dar hoje, Rawley? — Um peão perguntou.
— Faith vai fazer isso, Beau, — ele disse, em voz alta o suficiente, para que todos
ouvissem.
— Mas você está no comando.
— Não. Estou recebendo ordens de Faith como o resto de vocês, rapazes.
— Todos nós pensamos que Faith estava apenas substituindo até você voltar, — disse
Mike.
— Você pensou errado.
— Se você tem algum problema comigo dando ordens, — Faith disse: — Eu posso
adiantar-me, fazer as suas contas e você pode seguir em frente.
Mike arrastou os pés como se ele pensasse que ela poderia começar a disparar balas
contra eles e ele precisava estar preparado para evitá-las.
— Só estou surpreso, é tudo.
— Eu não sei porquê, — disse Faith.
— Eu tenho trabalhado ao lado de vários de vocês desde que eu cresci o suficiente
para me sentar em uma sela.
Rawley bateu palmas uma vez. Um par de homens saltaram.
— Eu acho que isso está resolvido. Porque você não me diz o que quer que eu faça,
para eu começar rapidamente? Estou ansioso para descobrir o que mudou.
— Por que não monta o perímetro, verifica a cerca? Vai dar-lhe a chance de olhar as
coisas.
Ele piscou para ela. — Com certeza, chefe.
Ela lhe deu um esboço de um sorriso, que fez seu coração galopar, dando-lhe
esperança de que, eles estavam à beira de recuperar a amizade, que uma vez tinha
compartilhado. Fazendo seu caminho através dos homens reunidos, ele caminhou até seu
cavalo e montou, ouvindo o som da voz de Faith emitindo suas ordens. Uma das coisas que
ele sempre admirava nela, era sua determinação de fazer o que precisava ser feito.

No meio da tarde, Faith tinha cuidado de tudo o que precisava, estava satisfeita com
o trabalho que os homens estavam fazendo, satisfeita com quase tudo, exceto o ligeiro
constrangimento que ainda pairava entre Rawley e ela. Vários dos homens tinham cruzado
com ele durante o dia e relatado seu paradeiro aproximado para ela. Incitando seu cavalo,
em um galope suave, em direção à extremidade norte do rancho, ela estava determinada a
garantir que tudo estava bem entre eles antes desta noite.
Os membros de sua família não costumavam fofocar sobre a vida dos outros — mas
eles a fizeram perceber e preocupar-se com determinadas coisas e, ela sentiu que algo não
estava certo. Seu relacionamento com ele significava muito para ela, e ela não queria que
fosse arruinado, por causa de questões não resolvidas de uma noite há muito tempo atrás e,

50
por sentimentos em relação a ele que tinham começado a mexer com ela quando era mais
jovem.
Não que finalmente encontrá-lo tenha feito algo para acalmar a sua ansiedade,
porque só a visão dele, estava despertando a agitação do desejo, que ela não tinha sentido
em um bom tempo. Ele tinha ido consertar uma seção da cerca de arame farpado. Tendo
como base o reluzente bronzeado de suas costas, ele, há muito, tinha deixado de lado sua
camisa. Seu chapéu de abas largas era a única sombra por milhas.
Fazendo seu cavalo parar a uma curta distância, ela simplesmente assistiu com
fascínio, deslumbrada com a forma como seus músculos se retesavam e esticavam com os
seus esforços, a maneira como seu Levis se esticava contra seu traseiro, emoldurando suas
coxas. Ele era todo uma musculosa força em movimento, e ela teve a louca ideia de pensar
que, se alguém, alguma vez fizesse um retrato dele trabalhando, ela ficaria feliz em vê-lo por
horas e nunca se cansaria.
Mil vezes ela deve tê-lo visto sem camisa – ao lavar-se no bebedouro depois de um
dia na sela, antes de entrar para lavar-se corretamente, ao dar um mergulho no rio nas
proximidades, onde ele a ensinou a nadar quando tinha sete anos, e em momentos como
este, quando, simplesmente estava demasiado calor para não deixar que uma ocasional brisa
fresca soprasse, diretamente, sobre a pele da pessoa. Mas nunca antes tinha a boca tão seca,
nunca tinha pensado quão agradável poderia ser lamber aquela carne salgada. Ela sentiu
como se o champanhe daquela noite, há muito tempo, voltasse para ela, deixando-a tonta
com um desejo por coisas que ela tinha afastado de sua mente, colocando em sua cabeça,
pensamentos que não eram bem vindos.
Se ela tivesse casado com Cole Berringer — ou qualquer outro homem, verdade seja
dita — ela teria assentado, se estabelecido porque ela não tinha sido capaz de atrair este
homem, fazê-lo vê-la como outra coisa senão uma irmã mais nova. Ela, por certo, não pode
evitar, ter sido uma menina boba fantasiando demasiado, sem se aperceber das dificuldades
até que estas surgiram sem aviso.
Seu cavalo bufou. Rawley parou o que estava fazendo, olhou por cima do ombro, e se
endireitou.
— O que você está fazendo aqui? Verificando o meu trabalho? — Ele perguntou
soltando o arame, deixando cair seu martelo, e andando até o poste onde sua camisa se
agitava com o vento ligeiro. Ele agarrou a camisa e vestiu-a, com um movimento suave, que
rivalizava com a poesia, em sua beleza simples. Levou tudo dentro dela para não gritar com
ele para deixar sua roupa onde estava, para deixá-la saborear um pouco mais do festim que
nunca seria servido para seu prazer.
Pelo menos ele não se preocupou em apertar os botões antes de pegar seu cantil
pendurado no poste e tomar vários goles de água, seus músculos da garganta trabalhando, o
pomo de Adão deslizando para cima e para baixo com seus esforços, causando uma vibração
incomum em seu estômago, que viajou diretamente para baixo, para o assento da sela. Que
diabos estava acontecendo com ela? Ela tinha visto muitos homens bebendo. Era necessário
se alguém quisesse sobreviver aqui.
Frustrada com a consciência rebelde borbulhando a superfície, ela, abruptamente,
desmontou e caminhou até ele.

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— Eu queria agradecer pela maneira como você lidou com a situação com os homens
esta manhã, me apoiando, não tentando assumir.
— Você merecia, por ter assumido quando Dallas precisou largar tudo isto.
— Se você estivesse aqui, ele teria entregue tudo para você. Ou você teria apenas,
naturalmente, assumido o seu lugar. Ele sempre te viu, eventualmente, como seu substituto.
— Mas eu não estava aqui. E um dia a fazenda será sua. Os homens tem que começar
a habituar-se que você está no comando. Além disso, eu não quero ter que explicar outro
olho roxo. — Sua voz mostrava uma pitada de provocação o que facilitou liberar um bom
bocado da tensão.
— Eu não lhe dei um olho roxo. Apenas machuquei seu rosto um pouco. Isso dói?
— Só quando eu sorrio.
O que ele fez naquele momento, conferindo-lhe o tipo convidativo de sorriso que
tinha, sem dúvida, roubado milhares de corações.
— Rawley, com a reunião de família hoje à noite, eu quero ter certeza de que tudo
está bem entre nós.
Ele olhou para ela um minuto inteiro antes de chegar no bolso de sua camisa,
puxando uma vara de salsaparrilha, quebrando-a ao meio, e segurando um pedaço para ela.
Para um homem como ele, de poucas palavras, suas ações falavam alto. Com um sorriso, ela
tomou a sua oferta e colocou-o entre os lábios, consciente de seu olhar fixo em suas ações.
Encontrando algum conforto, ela apontou para o carretel de arame.
— Ladrões?
— Talvez, — disse ele em torno de sua vara de salsaparrilha.
— É difícil de dizer. Você deveria pedir aos homens que façam uma contagem das
cabeças de gado. Ou pode ser alguém que não goste de cerca. Eles cortaram cerca de
oitocentos metros.
— Por que você não pega alguns homens para ajuda-lo a repará-la? Tanto quanto eu
aprecio o que você fez esta manhã, você não precisa de minha permissão para mandar os
homens fazer qualquer coisa que você entenda que necessita ser feita. A verdade é que você
tem tanto direito de dar ordens quanto eu.
Ele lhe deu um sorriso familiar que normalmente a fazia sorrir de volta, mas, agora,
ele a fez perceber o quão masculino e confiante ele era. Sabia quem era, sabia o queria.
— Eu gosto do trabalho duro de colocar o arame.
O que era, ela supôs, o seu reconhecimento de que ele emitiria ordens se ele
precisasse.
— Você não vai conseguir terminar sozinho. Por que você não estica e eu martelo nos
postes?

Eles trabalharam bem juntos, mas, eles sempre o fizeram. Ele esticou o arame,
envolveu-o em torno de um poste, e segurou-o firmemente, observando enquanto ela o
prendia com alguns pregos estrategicamente colocados em forma de U. Embora ela quisesse
que as coisas voltassem a ser como eram entre eles, ele queria respostas e, percebeu que
fazer perguntas era suscetível de fazer com que ela se fechasse novamente, mas estava
disposto a arriscar.

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— Eu estive andando pela área que você tinha reservado para a perfuração. — Ele
estava ciente do martelo a bater o prego com um pouco mais de força, fazendo com que o
poste vibrasse.
— Parece que alguém ateou fogo a essas torres que estavam construindo.
Recuando, ela encontrou seu olhar. — Como eu disse, eu perdi o interesse.
Parecia uma medida drástica para levar para uma mera falta de entusiasmo. —
Berringer não tem nada a ver com essa decisão?
— Certo.
— Ele é o pai de Callie?
Seus lábios estavam cerrados, mas ela não desviou o olhar, como se estivesse
pesando o quanto podia confiar nele. Finalmente, ela concordou.
— Eu pensei que você gostava dele.
Ela lhe deu um sorriso triste. — Eu também pensei.
Ela andou a passos largos para o próximo poste. Atrás dela, frustrado com o homem
por machucá-la e desiludi-la, ele puxou o arame com tanta força que ele estava surpreso que
não tivesse arrancado o poste anterior fora da terra.
— O que aconteceu? — Perguntou.
Com um encolher de ombros, ela posicionou o prego e deu-lhe uma pancada.
— Nós simplesmente não demos certo.
Ele queria as razões específicas, mas sabia pelo seu tom de voz, que não as teria tão
cedo.
— Ele sabe sobre Callie?
Outro prego posicionado, outra pancada que quase o converteu em pó.
— As coisas já tinham terminado entre nós antes de eu saber que estava grávida. Ele
já tinha partido há algum tempo. Se ele não tivesse partido, de qualquer modo, eu não ia
querer me estabelecer com ele, por isso até foi bom que ele não estivesse por perto.
Ele não pode evitar, mas achava que o homem tinha o direito de saber. Inferno, ele ia
querer saber, se tivesse uma criança, mesmo que fosse depois de saber que o seu
relacionamento não tinha dado certo.
— Deve ter sido difícil, Faith, ter um bebê e, não ser casada.
Ela sorriu, uma beleza melancólica de quase quebrar seu coração.
— Quando eu comecei a aumentar, eu deixei de ir à cidade. Todos no rancho
perceberam, é claro. Tenho certeza que alguns deles não o mantiveram para si mesmos;
rumores circularam ao redor. Poucos dias depois que Callie nasceu, quando eu já estava forte
o suficiente para sair da cama, o Pai nos levou para a cidade, apresentou sua neta para cada
banqueiro, comerciante, advogado, jornalista, viúva, homem, e mulher ao redor. Tinha tanto
amor e orgulho refletidos em sua voz. Rawley, eu nunca o amei mais do que naquele dia.
Ele podia imaginá-lo — Dallas com seu longo passo, seus passos maiores do que a
vida, desafiando qualquer um a encontrar uma falha no bebê em seus braços ou sua mãe. A
cidade pode agora ter um prefeito e um conselho municipal, mas Leighton ainda pertencia a
Dallas. Sua influência não podia ser medida. Ninguém queria deixar de ser seu amigo.
— Você deveria ter me avisado, Faith.
— Ela não era sua responsabilidade. Você partiu daqui à procura de alguma coisa,
Rawley. Eu não queria que você voltasse até tê-la encontrado.

53
A coisa que ele estava procurando, estava de pé, diante dele. Ele não podia imaginar a
coragem que ela tinha que ter tido para correr o risco de censura dos habitantes da cidade.
Ela poderia ter ido para alguma outra cidade ou outro lugar onde ninguém a conhecia e dizer
que era viúva.
— Por que você ficou?
— Porque esta é a minha casa.
Ela andou até ao próximo poste e ele a seguiu, começando de novo a colocar o arame
tal como antes.
— Você conheceu alguém enquanto você estava fora? — Ela perguntou.
— Eu conheci um monte de gente.
Ela fingiu que lhe ia bater na cabeça com o martelo.
— Uma pessoa especial. Uma dama.
— Não.
Ela parecia ter um grande interesse em se assegurar que o prego seguinte estava
perfeitamente posicionado.
— Aquela moça que amava, aquela sobre a qual Maggie me contou, você sabe se ela
ainda está na cidade?
— Ela está.
Com isso, elevou seus olhos para ele.
— Você escreveu para ela enquanto você estava fora?
— Eu deveria tê-lo feito, mas não.
— Ela é casada?
— Não.
Ela lhe deu um sorriso desafiador e atrevido.
— Talvez agora você reúna coragem para convidá-la a sair.
Com isso, ela se deslocou para o poste seguinte.
Nunca tinha sido sobre coragem. Tinha sido sempre sobre acreditar que ele não a
merecia. E ele não a merecia, mas, talvez, não pelas razões que ele tinha assumido. Talvez
tivesse havido um pouco de medo nele, temor de que seu passado iria manchar tudo o que
eles poderiam ter tido juntos.
Mas quando ele considerou a coragem que ela tinha tido ao permanecer aqui,
sabendo que as pessoas iriam julgá-la, suas próprias preocupações sobre ser julgado eram
insignificantes.
A única coisa que ele sabia era que ninguém, jamais, iria amá-la tanto quanto ele
amava.

54
Capítulo Dez

— Faith deu-lhe esse olho roxo?


Rawley esperava algum comentário sobre sua bochecha machucada, mas tinha
pensado que viria de Maggie, não de seu pai. Houston deu-lhe um sorriso conhecedor, ou
pelo menos, o conjunto de sua boca se parecia muito com um sorriso. Metade de seu rosto
tinha sido marcado — em algum campo de batalha esquecido por Deus — quando era mais
jovem, e as cicatrizes de tecido grosso tendiam a manter essa parte de seu rosto imóvel,
assim, por vezes, era difícil interpretar seus sorrisos. Mas não havia nenhuma dificuldade
quando se tratava de ler o largo sorriso de Austin. O homem estava franca e irritantemente
divertido.
— Eu posso ter caído em seu punho, acidentalmente, quando desci do trem, — ele
admitiu.
Austin riu. — Eu ouvi dizer que ela estava apta a te desancar quando você partiu
daqui, sem discutir o assunto com ela primeiro.
— Eu tinha minhas razões para partir do modo que o fiz.
— O que quer que fosse, nós esperamos que elas tenham ficado para trás, — disse
Houston.
— Estamos felizes em ter você em casa. — Ele era o pacificador da família, um
homem quieto, de poucas palavras, mas quando ele falava, as pessoas tendiam a ouvir.
Tomando um gole de uísque, Rawley olhou em redor. A esposa de Houston e as
quatro filhas estavam lá, assim como a esposa de Austin, Loree e seus cinco filhos. Callie já
tinha comido e sido colocada na cama. Faith ainda estava se vestindo. Depois de trabalharem
na cerca, eles voltaram para casa para se aprontarem. Quando ele afundou na banheira de
água quente, ele tinha imaginado ela fazendo a mesma coisa no quarto ao lado do seu, o
pensamento do pano com sabão acariciando sua pele, as gotas de água escorrendo sobre
ela.
Reparar a cerca juntos, conversando, tinha ajudado a restabelecer o vínculo entre
eles, e ele não estava completamente certo de que era uma coisa boa, porque agora Faith
Leigh era uma mulher a ser reconhecida. Maturidade tinha sido adicionada ao seu fascínio, e
ele não estava certo de que possuía dentro de si o suficiente para resistir a ela neste
momento, nem tinha a certeza de que ainda o queria. Uma mulher de sua coragem era o tipo
que qualquer homem gostaria de ter a seu lado. Agora que ela era mais velha, os anos que os
separavam já não pareceriam tantos. Ele não era mais um homem, e ela uma menina. Ambos
eram adultos.
— Dee partilhou os cartões postais que você enviou para ela, — disse Houston.
— Você viajou bastante.
— Por algum tempo. Eu estava tentando descobrir onde me assentar.
— E no final, você voltou para cá. Assim como Austin. Ele viajou o mundo tocando seu
violino em diversos lugares, mas quando se deu conta, não foi capaz de encontrar qualquer
lugar que gostasse mais.
— Não é verdade, — disse Austin.

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— Não encontrei ninguém de quem gostasse mais. Há algo reconfortante em estar no
seio de sua família. — Ele olhou ao redor, fez um sinal com a mão.
— E eu queria que meus filhos crescessem com isto. Você, Dallas, e eu só tínhamos a
nós. Agora olhe para nós.
A sala estava cheia de conversas, risos, abraços e sorrisos.
— Sobre o que vocês estavam falando? — Dallas perguntou juntando-se a eles.
— Família, — disse Austin.
— E Rawley estava prestes a nos dizer sobre Cowboying em Wyoming.
— Cowboying é Cowboying, — disse Rawley.
— Correu tudo bem, hoje, no rancho? — Perguntou Dallas.
— Sim. — Ele sorriu para o homem que o havia ressuscitado.
— Embora Faith me tenha dito que, caso você perguntasse, era suposto eu responder
que não houve problemas e tudo correu bem.
— Você teve problemas? — Percebendo preocupação e interesse em sua voz, Rawley
entendeu que era difícil deixar de se preocupar com algo que levou toda sua vida a construir.
— Tudo estava bem. Foi necessário reparar um pouco da cerca, mas nada que não
pudesse ser feito.
— Me deixa louco estar aqui sentado o dia todo, sem saber exatamente o que está
acontecendo, — resmungou.
— O que te leva à loucura é não conseguir bater Callie nas damas,— Faith disse,
deslizando o braço pelo seu pai.
Ela não estava usando o vestido vermelho, graças a Deus. O tecido cor de rosa ia até à
cintura, e o corpete não era muito decotado, apenas o suficiente para não revelar muito.
Seus ombros não estavam nus, mas as mangas eram tão pequenas que ele se perguntou por
que a costureira se tinha incomodado. Vestida deste modo, ela o recordou de um algodão
doce conhecido como — o fio de fadas — que ele tinha saboreado na Feira Mundial em St.
Louis. Ele tinha derretido em sua boca, e ele se perguntou se ele poderia fazê-la derreter. Ele,
certamente, estava tentado a experimentar.
— Esta querida pequena me venceu cinco vezes, — Dallas murmurou.
Faith riu. — Ela me disse. — Ela estendeu a mão, dedos abertos. — Cinco vezes!
Então, ela tinha se atrasado porque ela foi ver a filha Ela era uma boa mãe, e ele
achava que ela iria dar o mesmo amor e atenção a todos os seus filhos. Não que ele estivesse
surpreendido. Ela se destacava em qualquer coisa que tentasse, o que tornou sua decisão de
desistir do petróleo um pouco confusa. Ele teria apostado que ela tinha se assegurado que
seria um sucesso, apesar de Berringer.
— Tio Houston, — disse ela, dando-lhe um beijo na bochecha. Em seguida, ela lançou
seu domínio sobre Dallas e andou em torno dele para dar um beijo em Austin.
— Tio Austin.
— Rawley não tem direito a um beijo? — Austin perguntou, e o olhar dela se desviou
para o de Rawley.
— Pode aliviar a dor desse hematoma que você deu a ele.
Rawley estava dividido entre rir alto, assumindo isso como uma piada, e aproximar-se
para que ela não tivesse que se mover muito e o beijasse quanto antes.

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Com seus olhos nunca abandonando Rawley, ela disse, — Acho que, uma vez que esta
noite é para celebrar seu regresso a casa, eu deveria ser um pouco mais tolerante e fazê-lo
adequadamente.
Seu coração batia tão forte que era como se ela lhe estivesse fazendo um convite
para sua cama. O que deve ter demorado segundos pareceu levar horas, enquanto ela
contornou Austin e se inclinou, um sorriso diáfano como a luz do luar em seus lábios,
olhando para o seu rosto. Breve e suave, de algum modo, parecia ser mais poderoso do que
o que partilharam do lado de fora de sua cabana. Talvez porque, desta vez ,ela não estava
bêbada e, ele não estava pensando que ela era muito jovem ou inocente para alguém como
ele.
Quando ela se inclinou para trás, ela sorriu, o tipo de sorriso que um amigo querido
dava a outro quando compartilhavam algo especial. E naquele sorriso, ele viu o potencial
para a felicidade.
Quando construiu sua casa, o pai dela tinha antecipado ter uma família grande ao
longo dos tempos, assim a mesa de jantar coberta com linho branco era do comprimento da
sala e acomodava a todos. Seu pai estava sentado em uma extremidade, sua mãe à sua
esquerda, perto de seu coração. Faith sentou- se à sua direita. Rawley ocupou a cadeira ao
lado de sua mãe.
O Tio Houston havia tomado um lugar no outro extremo, tia Amélia à sua esquerda,
cada um ladeado por duas de suas filhas. Tio Austin e Tia Loree se sentaram em um lado da
mesa com três de seus filhos, enquanto os outros dois estavam em frente a eles. Vendo
como todos os seus primos se reuniam no mesmo lugar, foi uma lembrança agridoce de que
seus pais tinham ansiado por mais filhos, mas o acidente que fez sua mãe perder seu
primeiro filho tinha tornado difícil para ela conceber e tinha impedido que sua casa crescesse
além de Faith.
Após a comida distribuída e o vinho servido, Faith ergueu o copo.
— Eu gostaria de fazer um brinde. — Ela esperou até que tinha a atenção de todos e,
em seguida, olhou para o homem que, ela tinha poucas dúvidas, estava no caminho de, mais
uma vez, se tornar seu melhor amigo.
— É bom ter você de volta, Rawley. Eu senti falta das varas de salsaparrilha.
Seu sorriso era pequeno, um pouco brincalhão, mas algo mais refletido dentro dele
insinuou segredos compartilhados.
— Eu senti falta de ter alguém para roubá-las de mim.
Risos ecoaram ao redor da mesa, os mais altos vindo de seus primos, que, em uma
altura ou outra, tinham sido os destinatários de parte das varas que Rawley constantemente
transportava em seu bolso.
Ela ergueu mais o copo, e brindou — Bem-vindo a casa, Rawley — ecoou pela sala.
Depois que todos tomaram um gole de vinho, a comida foi passada ao redor e o
zumbido das conversas encheu o ar, quando as pessoas começaram a pôr em dia os seus
assuntos, suas vidas ocupadas impedindo-os de se reunir com a frequência que gostariam.
— Rawley, eu estou pensando em fazer uma série de artigos sobre as suas viagens, —
disse Maggie.
A forma intensa com que Rawley cortou sua carne disse a Faith que ele não estava
confortável com essa ideia.

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— Por que alguém iria se importar de ler sobre minhas viagens?
— Eu acho que seria interessante. “A vida de um cowboy viajante”.
— Não foi tão glamouroso como se poderia pensar.
— Eu não quero glamour. Estou à procura de histórias de aventuras da vida real.
Faith também estava muito interessada nos detalhes da sua vida durante o tempo
que ele esteve fora. Nem seus cartões postais, nem suas cartas tinham revelado muito sobre
os detalhes de seus dias e noites.
— Parece-me que você deveria ir em suas próprias aventuras e escrever sobre elas, —
disse ele.
— Isso é o que eu venho lhe dizendo, — disse Grant, o mais velho do tio Austin.
— Eu estou indo para a Europa no próximo ano. Você poderia viajar comigo, Maggie.
Admirar a paisagem, viver as experiências em primeira mão, e escrever artigos que vão fazer
as pessoas sentir que estão lá ao seu lado.
— Não é nas paisagens que estou interessada. Um modo de vida está desaparecendo
e é necessário registrá-lo antes que ele desapareça completamente. Tem um cara tirando
fotografias do rancho e dos peões trabalhando, porque ele acredita que, um tempo virá, em
que não teremos mais cowboys.
— Enquanto as pessoas quiserem carne, — Pai disse, — nós vamos ter cowboys.
Talvez não tantos, mas o gado não vai caminhar sozinho até o comboio.
Faith encontrou o olhar de Rawley, e ela se perguntou se ele recordou como Cole
tinha questionado sua relevância, como ela esperava que ele cuidasse do rancho enquanto
ela criava um império petrolífero. Tudo podia mudar rapidamente.
As pessoas interromperam as suas conversa paralelas. Faith achou difícil não manter
sua atenção em Rawley, não ouvir e recolher informações sobre o seu tempo longe. Sua
afeição, por aqueles em torno dele, era evidente na intensidade com que ele os ouviu falar
— o mesmo olhar atento que atravessava seu rosto, quando Callie falava com ele. Ele daria
um bom pai, mas, também, ele teve um bom exemplo.
— Rawley, você chegou em casa a tempo para a inauguração do novo teatro, — disse
o tio Austin.
— O que estava errado com o antigo teatro?
— Este é para imagens em movimento, — Faith explicou.
— Nós pensamos em, simplesmente, converter o outro teatro, — sua mãe disse a ele.
— Mas, eu acredito que ainda temos necessidade de peças de teatro, ópera e cultura.
Então, eu quero manter o palco. Laurel vai gerir o novo. Ela diz que as imagens em
movimento estão se tornando muito populares. — Ela olhou ao longo do comprimento da
mesa.
— Laurel, querida, você pode contar a Rawley sobre o teatro?
A segunda filha mais velha do tio Houston animou-se. Ela adorava falar sobre as
imagens em movimento. Ela tinha visto um espetáculo, alguns anos antes, quando tinha feito
uma viagem a Pittsburgh e, quando voltou para casa, deliciou a todos com histórias sobre
ele.
— Nickelodeon — é como vamos chamá-lo, oficialmente, abre quinta-feira. Você já
viu uma imagem em movimento?
— Eu olhei uma vez através de um Kinetoscope e vi um homem espirar.

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Ela riu. — Isto é muito melhor. É uma história mais do que uma única ação. E é em
uma tela grande, então você pode vê-lo com outras pessoas, compartilhando a experiência,
sabendo que os que estão à sua volta também estão encantados. Estou tão animada que
estamos trazendo algo tão moderno para Leighton. Toda a família está planejando estar lá.
Espero que você possa se juntar a nós.
— Estou ansioso por isso, — disse Rawley.
Laurel sorriu como se ele tivesse acabado de lhe entregar a lua. Faith não a culpava.
Ele sempre foi o favorito entre os primos.
Ele olhou através da mesa para Faith. — Eu suponho que você está planejando ir.
— Eu não perderia isso.

— Tem certeza de que não quer ficar? — perguntou a mãe depois que todos tinham
ido embora.
— Callie está dormindo, e seu quarto está pronto para você.
Faith considerou, mas percebeu que ela não ia pregar o olho sabendo que Rawley
estava do outro lado do corredor. Já tinha sido suficientemente difícil tomar banho num
quarto perto dele, imaginando- o abaixando aquele corpo comprido e magro na água
fumegante.
— Eu odeio acordar Callie, por isso se você não se importa eu vou deixá-la ficar. E
Rufus, também, se estiver tudo bem. Caso ela acorde, ela gosta de tê-lo por perto. Sei que
soa terrível, mas eu gostaria de ter a cabana só para mim, experimentar um pouco de calma.
— Nós adoramos que Callie fique, assim não há problema.
— Vou levá-la a casa, — disse Rawley.
— Isso não é...
— É, está escuro, Faith.
Ela revirou os olhos. — Certo.
Quando os cavalos foram selados e tinham montado, já que Callie não estava com
eles, ela decidiu que estava com disposição para um pouco de aventura.
— E vou ganhar de você.
Antes que ele pudesse concordar, ela lançou seu cavalo a galope e, logo depois, ouviu
o barulho dos cascos do cavalo dele. Ela pressionou a montaria para ir mais rápido. A lua e as
milhares de estrelas forneciam uma luz suave o suficiente para guiá-los.
Pelo canto do olho, ela viu que ele estava ganhando terreno, seu sorriso brilhando na
noite. A rivalidade sutil sempre existiu entre eles, e ela sempre tinha apreciado que ele nunca
a tinha deixado sair vitoriosa, sempre a tinha considerado uma concorrente digna. Esta noite
ela encontrou conforto na competição, grata pelo alivio de fazer com ele algo que era tão
natural como respirar.
Ele a venceu por meio cavalo, gritando quando ele acalmou o seu cavalo até parar.
Tirando o chapéu da cabeça, ele esperou que acalmasse o seu cavalo.
— O que eu ganho? — Perguntou.
— O direito de se gabar.
Ele riu, o profundo timbre de sua alegria circulando no ar e pousando em seu coração,
tão suavemente, como uma borboleta em uma pétala.

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— Eu aceito.
Ela desmontou. Ele seguiu o exemplo e a ajudou tratar de seu cavalo. Quando
terminaram, ela caminhou até a varanda, colocou as mãos atrás dela, e inclinou-se com as
costas contra a viga que sustentava os beirais da cabana onde esta noite ela ia dormir
sozinha.
Mesmo tendo construído um quarto extra para Callie, Faith estava sempre
consciente da presença de sua filha, tentando ouvir sua respiração, notando o ranger da
cama quando ela rolava. Faith, muitas vezes acordava no meio da noite e ficava na porta,
observando como sua bênção dormia.
— Imagino que você vá agora para cidade para um pouco de folia. Ainda não é muito
tarde.
— Não estava planejando isso.
— O que você vai fazer?
— Eu estava pensando em ir dar um mergulho no rio. Quer vir?
Ela sorriu, sacudiu a cabeça. — Eu não me lembro da última vez em que eu fui nadar.
— Parece um longo tempo. Pegue um par de mantas. Vou selar de novo seu cavalo.
— Não seja bobo. Podemos caminhar.
— Andar vai contra os principios de um cowboy. Já vi homens montarem seus cavalos
apenas para atravessar de um lado da rua para o outro.
— O que eu nunca entendi. Não é muito longe. Dê-me um minuto para me trocar.
Quando ela voltou, vestindo calças, uma camisa e botas, com seu cabelo trançado, ele
estava segurando uma lanterna acesa que ele tinha, obviamente, retirado do prego fora da
porta da frente. Ela entregou-lhe uma garrafa de uísque e abraçou as mantas perto de si.
Ele ergueu o uísque. — Uma mulher que conhece o caminho para o coração de um
homem.
Isso foi uma distorção se ela já tinha ouvido uma, mas, ao invés de discutir sobre isso,
ela simplesmente partiu em um ritmo acelerado, a luz da lanterna dando-lhe a confiança que
ela não estava indo de encontro a um animal inesperado.
— Falando sobre preguiçosos para andar a pé...
— Eu não sou preguiçoso, — ele a interrompeu.
— Mas eu não vejo qual é o ponto de usar minhas pernas quando existe um outro
conjunto de pernas que pode fazer o mesmo.
— Eu gosto de caminhar. Existe tranquilidade nisso. Você já viu esses automóveis que
aquele Ford está fazendo?
— Andei em um, uma vez.
Ela olhou para ele. — Você não!
— Claro que sim.
— Como foi?—
— Chacoalhava demais. Quase arrancou meus dentes.
— Um cara veio aqui, com um, alguns meses atrás. Ele disse que um dia todos vão
estar dirigindo um.
— Eu vou ficar com meu cavalo.
— Ainda assim, eu estive pensando que precisamos de um lugar, em Leighton, para
vender gasolina as pessoas, que não têm a mente fechada como você, que vão precisar.

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Ele riu baixo.
— O que é tão engraçado?
— Você é mesmo filha de seu pai. Sempre tentando descobrir o que as pessoas
precisam, o que vai trazê-las aqui, mantê-las aqui.
— Como o gado já não está sendo conduzido para os matadouros de abate, as
cidades estão desaparecendo. Eu não quero que Leighton seja uma delas.
— Você já pensou em partir?
— Não. Se eu partir, vou fazer como você. Eventualmente, eu vou voltar.
— Você poderia ir embora por um curto período de tempo, só para ver outros
lugares.
Ela sorriu para ele. — Eu tenho os seus postais.
— Não é o mesmo, Faith. De pé na beira do Grand Canyon... ele tira o seu fôlego.
Onde quer que fosse, eu via algo e queria que você estivesse lá para ver isso comigo.
Saber que ele tinha pensado sobre ela enquanto estava fora a tocou profundamente.
Uma parte dela desejava estar com ele. Quando ela acordou na manhã depois que eles se
beijaram, apesar de sua dolorida cabeça e agitado estômago, ela acreditava que algo
significativo havia mudado entre eles, que mais do que seus corações se tinham conectado,
que suas almas se tinham fundido. Ela tinha sido preenchida com a promessa de amor e
felicidade. Até que ela descobriu que ele tinha ido embora.
Ela tinha ficado devastada com notícia de que ele decidiu seguir em frente, para longe
de Leighton, para longe dela. Seu orgulho tinha levado um golpe, seu coração um soco. Ele
tinha sido uma constante em sua vida, e ele não tinha sequer se preocupado em dizer adeus.
Ela não podia deixar de acreditar que, quando ela o beijou, tinha provocado a sua partida. Ele
não lhe tinha dito que aquilo nunca deveria ter acontecido?
Mas Cole Berringer tinha estado mais do que disposto a beijá-la, então ela, agravou o
seu o primeiro erro com um segundo, aceitando o seu namoro. Ele tinha falado com seu pai,
e Dallas tinha dado permissão a Cole para visitá-la numa base não profissional. Em seus
braços, ela pensou que ela poderia ser capaz de esquecer Rawley Cooper, mas ele sempre
esteve lá, no fundo de sua mente, na borda de seu coração.
Ela observou a luz da lanterna balançando ao longo sobre o solo com seus passos.
— Então você pensou em mim enquanto estava fora?
— Todos dias.
Ela pensou sobre ele quase a cada minuto. — Por que você não me escreveu?
— Eu não sei. — Arrependimento em sua voz.
— Para ser honesto, eu não sei nem mesmo, porque parti.
A tranquilidade caiu sobre ela por ter Rawley ao seu lado. Ela teve o cuidado de
manter uma distância suficiente, entre eles, para que suas mãos não se tocassem, mas
parecia que o comportamento dele não era tão simples quanto o dela, porque, de vez em
quando, os seus dedos deslizavam sobre os dela, e um arrepio de desejo inesperado a
percorria. Fazia muito tempo desde que ela encontrou alegria na presença de um homem,
mas parecia natural inalar o cheiro de Rawley e obter o conforto na sua presença. Ela teve o
desejo de enterrar seu nariz contra a carne macia de seu pescoço, sentir os pelos ao longo do
lado de baixo de sua mandíbula arranhando sua testa, mexer em seu cabelo.

61
O silêncio os envolvia, o que também a confortou, reconhecendo que com ele, o
silencio não necessitava ser preenchido com conversa forçada.
Com uma risada, ela acelerou o passo. Ela podia ver o contorno das árvores, ouvir o
barulho da água. O rio cortava um caminho sinuoso ao longo da propriedade Leigh. Mais
abaixo, o seu pai tinha lutado com a família de sua mãe sobre os direitos da água. Paz tinha
chegado com um casamento arranjado, e o amor logo tinha seguido. Ela nunca se cansou de
ouvir a história de seus pais. Sempre lhe tinha dado a esperança de que ela iria encontrar seu
próprio amor. Ela tinha levado um longo tempo para entender, que a história de todo mundo
era diferente, e nem todas terminavam bem.
Na beira do rio, ela deixou cair as mantas no chão.
— Quem vai primeiro?
— As senhoras devem ir sempre primeiro. Dallas me ensinou isso.
— Não espreite! — Ela gritou quando correu para os arbustos ao redor do riacho.
— Eu sou um cavalheiro, — ele gritou de volta para ela.
Era estranho, ela pensou, quando começou a despir sua camisa e as calças, que ela
estava fazendo algo que nunca tinha esperado fazer de novo, estar confortável com muito
pouca roupa na presença de um homem. Diziam que o tempo curava todas as feridas. Talvez,
após seis anos, as dela estivessem, finalmente, começando sarar.

62
Capítulo Onze

Em que raio estava ele pensando quando sugeriu isso? Ele ouviu os arbustos farfalhar
e lutou arduamente para não pensar, exatamente, no que estava causando a agitação dos
arbustos. Em vez disso, ele pensou na quantidade de trabalho que era necessário fazer e
como ele, amanhã, ia estar o dia todo fora do rancho, reparando cercas e movendo o gado
para áreas com mais grama e água, até que ele estivesse morto de cansaço, com os ossos tão
cansados para, até mesmo, acompanhar Faith a casa.
Ele não sabia como era possível que seus sentimentos por ela terem se aprofundado,
mas tinham. Observá-la dando ordens aos homens e erguendo-se sobre eles, tinha
aumentado seu respeito e admiração por ela. Ele tinha se apaixonado por uma menina que
tinha capturado seu coração por causa de sua doçura, e ela tinha crescido em uma mulher
feita de aço e coragem, mas a doçura ainda estava lá. Ele viu quando ela interagiu com sua
filha, percebeu quando ela mostrou ternura para com seus pais. Ela estava curiosa sobre o
mundo, mas enraizada a terra, a mesma terra que falava com algo profundo de dentro de
sua alma.
Ao viajar, ele tinha trabalhado em uma série de biscates, sempre se sentira sem
amarras até que ele tomou a posição de capataz em Wyoming, mas, ainda assim, algo estava
faltando. E esse algo estava aqui: Faith.
O esguicho de água tirou-o de seus devaneios. Colocando a lanterna em uma rocha
próxima, ele dispôs as mantas para que estivem esperando por eles quando saíssem da água.
Depois de soltar um par de botões, ele puxou a camisa sobre a cabeça. Ele tirou a arma do
coldre — ele sempre o usava quando saia de casa, nunca se sentia confortável sem ele e
colocou-o, cuidadosamente, no canto de uma das mantas. Suas botas logo se juntaram a ele.
Ele foi até a beira do rio, a água lambendo os dedos dos pés. Em um movimento
rápido, mas suave, ele despiu suas Levis, jogou sobre um arbusto próximo, e mergulhou no
fluxo corrente. Quando ele irrompeu à superfície, Faith estava a apenas alguns passos de
distância, pisando na água. A maioria dos cowboys não sabia nadar, mas Dallas garantiu que
Rawley aprendesse. Ao levar o gado através de um rio, um homem nunca sabia se um boi
errante ou uma correntesa poderia derrubá-lo de seu cavalo. Rumando ao norte, Rawley
tinha encontrado muitas margens de riachos.
E, é claro, tudo o que Rawley podia fazer, Faith estava determinada a igualar.
— Eu me lembro que você estava sempre querendo vir aqui para um mergulho, —
disse ela agora.
— Eu nunca me sentia suficientemente limpo.
— Você tomava banhos quase todos os dias.
Todas as noites, antes de ir para a cama, ele se afundava em uma banheira de água e
esfregava a pele, numa tentativa de raspar o sentimento de outros tocando-o, homens que
ele não queria perto dele.
— Quando você está trabalhando com gado, muita sujeira se levanta e tem que ir
para algum lugar.
— Às vezes, eu me sinto como se nunca ficasse limpa, — disse ela, tão baixinho que
quase não a ouviu.

63
— Você ainda usa aquele sabão fino. Eu posso sentir o cheiro quando você está perto
de mim.
— Lavanda. Sabão feito em Paris. Você costumava odiar.
Ele adorava a fragrância nela, mas sempre havia reclamado sobre isso, porque tinha
sido mais seguro, para não deixá-la saber todas as coisas sobre ela, que ele gostava.
— Sempre que você me abraçava, eu ficava cheirando a petúnias.
Ela riu levemente. — Lavanda e petúnias são duas flores diferentes, dois aromas
diferentes.
— Flores. Isso é tudo o que importa. Os homens não devem cheirar como flores.
— Eles, também, não deveriam usar flores nos seus chapéus, mas o Tio Houston usa.
Uma desbotada e desgastada fita de linho bordada com flores circulava a coroa de
seu Stetson, desde que Rawley conseguia se lembrar.
— Eu acho que Amelia fez isso para ele, — disse ele.
— Ela fez, só que, originalmente, ela o fez para que Papai pudesse identificá-la na
estação de comboios em Fort Worth. Às vezes eu me pergunto se as coisas seriam diferentes
se não tivesse quebrado a perna e enviado o Tio Houston para ir buscá-la.
— De uma forma ou de outra, eu acho que tudo teria terminado na mesma.
Ela inclinou a cabeça para o lado. — Você acredita no destino?
Ele deu de ombros. O rio nesta zona não era tão profundo. Se ele pousasse os pés no
fundo, a água iria chegar ao seu peito.
— Eu não sei. Mas se eu tivesse entrado na loja cinco minutos mais cedo ou mais
tarde, o meu caminho poderia nunca ter se cruzado com Ma e eu não estaria aqui agora. —
Fora a primeira vez que ele encontrara Cordelia Leigh. A maioria das pessoas, incluindo Faith,
acreditava que ela tinha falado com ele e acabado por levá-lo com ela. Poucos sabiam a
verdadeira história do que tinha acontecido na noite em que Cordelia Leigh perdeu o bebê.
— Então eu nunca iria conhecê-lo, — disse Faith.
Ela teria — se realmente o destino existisse. Talvez ele fosse um cowboy vagueando
pela fazenda e fosse contratado. Embora se, Dallas e Cordelia Leigh não tivessem tomado
conta dele, ele, provavelmente, teria morrido anos antes ou sido um homem revoltado e
amargo, ninguém teria sido capaz de ter estômago para aturá-lo.
— Outro alguém teria vindo para resgatá-la.
Como se cansada da conversa, ela foi para baixo d’água, voltou-se, afastou do rosto
alguns fios de cabelo que se soltaram da sua trança, e começou a nadar para longe dele. Ele
queria que ela admitisse que ele não a irritou, que ela gostava de tê-lo por perto. Queria
ouvi-la rir. Ele não tinha ouvido uma gargalhada sincera dela, desde que tinha voltado. Ela
era uma mãe, o que lhe trouxe responsabilidades, havia assumido o ônus de administrar a
fazenda, que trouxe consigo ainda mais deveres e obrigações, bem como a prestação de
contas. O sucesso do rancho agora repousava sobre os ombros dela. Mas ela estava
precisando de um pouco de diversão.
Com longas braçadas, ele foi no seu encalce, facilmente recuperando o atraso
perdido. Ele agarrou sua cintura, puxou-a para baixo — o grito que rasgou o ar da noite
enviou arrepios pela espinha dele acima. Seus frenéticos socos e pontapés o fiseram largá-la
imediatamente e correr para trás, para longe dela. Mas ela continuou a se debater, a gritar:
— Não! Não! Não!

64
— Faith, sou apenas eu. O Rawley. Sinto muito, querida. — Ele estendeu a mão
suplicante.
— Eu não queria assustá-la.
Ela ficou imóvel, quieta, mas ele podia vê-la tremer, uma selvageria em seus olhos
como se estivesse lutando para se orientar.
— Eu a ajudo.
Sua mão disparou. — Não. Eu sinto muito. Eu tenho que sair agora. Por favor, apenas
fique aí.
Ele ouviu o tremor em sua voz, a rápida corrida de sua respiração. — Eu estou indo
nadar de volta até onde eu deixei minhas calças. Vou buscar suas roupas também. Envolva-se
em ambas as colchas.
Ela deu um pequeno aceno e começou a dirigir-se em direção à margem, enquanto
ele se dirigiu rio acima, subiu no baranco, e puxou as calças novamente. Em seguida, ele
localizou a roupa e correu de volta para onde ele tinha estendido as mantas. Ela estava
sentada numa delas, a outra envolta em torno dela, a lanterna perto dela.
— Sinto muito, — disse ela, observando enquanto ele se aproximava.
— Não se desculpe por algo que não foi sua culpa. — Ele caiu ao lado dela, pegou o
uísque, abriu a garrafa, e segurou-a em sua direção.
— Tome um gole disto. Vai ajudá-la a se aquecer. — Mesmo que a noite fosse
abafada, ela parecia gelada.
— Vou fazer uma fogueira.
— Eu não preciso de uma fogueira.
— Mas eu vou fazer. — Poucos minutos depois, ele usufruía do conforto do crepitar
das chamas que lambiam os ramos que tinha reunido, tendo a gratificação de ver como ela
se inclinou em direção ao fogo que, ela alegou, não precisar.
— Faith...
— Eu simplesmente não estava esperando você me pegar, é tudo. Pegou-me de
surpresa.
— Foi mais do que isso, Faith. Nós já nos puxamos para baixo da água milhares de
vezes.
— Éramos crianças então. Foi há anos. Eu já tinha me esquecido, é tudo. Não é nada.
Dê-me a minha roupa.
Ele lhe entregou o monte de roupa, viu como ela simplesmente o agarrou como se
fosse o escudo de uma armadura projetado para protegê-la de todos os perigos. Só então,
ele notou que ela tinha pego sua arma, que estava descansando ao lado de seu quadril, com
fácil acesso. Ela poderia muito bem ter levantado e disparado uma bala no seu peito. Teria
doído menos do que o conhecimento de que ela sentiu necessidade de se defender dele.
— Você sabe que eu nunca vou te machucar, — ele disse calmamente.
— Eu sei.
Tanta coisa estava começando a fazer sentido. Sua perda de interesse na
possibilidade de petróleo que outrora a teria animado. O dissipar de seus sonhos. Sua recusa
em se casar com o homem que a engravidou.
— O mesmo não pode ser dito de Berringer, pode?

65
Lágrimas brotaram nos olhos dela enquanto ela segurava seu olhar e balançava a
cabeça.
— Diga-me, — disse ele suavemente.
— Eu não posso.
Ele entendeu muito bem a dificuldade de falar sobre algo tão incrivelmente horrível e
pessoal.
— Ok, mas eu tenho que aquecê-la. Tome outro gole de uísque.
Lenta e cuidadosamente ele se moveu ao redor atrás dela, ajoelhou-se e começou a
esfregar os braços através da manta, criando atrito e calor. Ela suspirou, seus músculos
afrouxando à medida que ela começou a relaxar.
— Olhe uma estrela cadente, — disse ele para distraí-la.
— Faça um desejo.
— Eu gostaria de poder esquecer.
Seu coração quase se partiu com a tristeza de seu tom.
— Eu sei. Mas você não pode.
Ela balançou a cabeça, em seguida, abanou a cabeça, como se estivesse confusa sobre
qual deveria ser sua resposta. Acomodando-se nas suas costas, ele a trouxe de volta contra
seu peito e fechou os braços em volta dela.
— Faz tanto tempo desde que eu deixei alguém me segurar, — disse ela.
— Se você não quiser, eu me afasto.
— Não, isso é bom. Eu posso sentir o seu calor mesmo através da manta. É melhor do
que o fogo.
— Você sempre foi mais hábil em fazer fogueiras do que eu.
Ela deu uma pequena risada, instalou-se o silêncio. Ele esperou, apenas esperou,
detestando-se por não estar aqui quando ela precisou dele.
— Eu gostava dele, — ela sussurrou com voz rouca.
— Muito. Ele encantou Ma e Pa. Encantou-me. Ele estava passando muito tempo lá
em casa. Todos pensavam que finalmente íamos dar o nó, que em breve ele iria pedir a Pa a
minha mão e a sua bênção. Ele tinha tido permissão para me levar para jantar na cidade. No
hotel, na sala de jantar. Você sabe como é elegante, como comer lá faz as pessoas se
sentirem especiais. Duas garrafas de vinho mais tarde, estávamos indo para casa e eu estava
tão relaxada, tão feliz. Ele nos levou para o local de perfuração. Nós andamos em torno por
um tempo, falando sobre sonhos. Então começamos a nos beijar. Nós já tínhamos nos
beijado algumas vezes antes, mas naquela noite foi diferente. Ele queria mais, mas eu não
estava pronta para isso. Mas ele não quis me ouvir. Ele, simplesmente, pegou.
Ele apertou os braços em volta dela, querendo retirar dela a memória dolorosa, para
depois soltá-los, para que ela não se sentisse ameaçada. Ele estava à procura de palavras,
mas todas as que existiam no seu vocabulário, pareciam demasiado insignificantes para
expressar o quanto ele lamentava por ela e pelo que ela deve ter sofrido.
— Ele me levou para casa como se nada tivesse acontecido, como se ele não tivesse
feito nada de errado.
— Ele foi preso?
Sua risada era dura, cheia de dor e mágoa.

66
— Eu não tinha como provar que ele me forçou. Ele teve o cuidado de não rasgar as
minhas roupas. Apenas empurrou minhas saias. Eu tinha algumas contusões onde ele me
segurou. Além disso, eles não enviam homens para a prisão por estupro.
A dura palavra, tão pequena para uma ação tão monstruosa, era um pontapé em seu
intestino.
— Eles teriam argumentado que eu tinha uma moral frouxa ou encontrado outra
desculpa, — continuou ela. — Eu costumo usar calças. Quão feminino é isso? Para ser
honesta, eu prefiro enfrentar um boi de carga do que um tribunal cheio de pessoas me
julgando, com censura escrita em seus rostos, quando eu fosse forçada a contar-lhes os
detalhes do que aconteceu. Apenas Ma e Pa sabem. A família acredita que eu fui suscetível a
seus encantos e ele se aproveitou. Todos os outros pensam que eu fui apenas insensata.
— Mas Berringer partiu.
Ela assentiu com a cabeça. — Pa o obrigou. Eu não sei exatamente como. Eu não
quero saber. Eu só queria que ele se fosse e Pa disse que ia cuidar dele.
Rawley imaginou que Dallas tivesse lhe dado uma surra até perto de matá-lo — isto
se não o tivesse mesmo matado.
— Sinto muito, Faith, sinto muito pelo que aconteceu, sinto muito por não estar aqui
por você.
— Você não podia saber o que Cole iria fazer, mais do que eu soube. Ainda assim, eu
me sinto tão tola, porque eu me apaixonei por ele.
— Você não é tola, Faith. Homens como ele são bons em disfarçar o que são.
Ela virou-se ligeiramente. — Se ele me queria tanto...
— Não se trata de querer ou desejar. É sobre controle ou domínio... ou apenas,
simples maldade. Algumas pessoas têm prazer em magoar os outros. Eu não sei o porquê,
mas eu sei que o que ele fez não foi culpa sua.
No momento em que pronunciou as palavras, ele foi atingido pela percepção, de que
aquilo, também se aplicava a ele. Ele não tinha sido culpado pelo que tinha acontecido com
ele há muitos anos atrás, não mais do que ela era a culpada pelo que lhe tinha acontecido.
Nunca antes tinha visto a verdade de suas circunstâncias, tão claramente.
Embalando sua bochecha, ele segurou seu olhar sombrio, viu o rastro de lágrimas
brilhando em suas bochechas, limpou-as com movimentos suaves de seu polegar.
— Toda vez que penso que você é a mulher mais forte que eu conheço, você vem, e
prova que ainda é mais forte do que eu pensava.
— Sabendo que ele me tocou, eu não sei como você pode.
— Porque ele não é nada e você é tudo.
Tomando seu tempo, não querendo assustá-la, ele se deslocou até que ele pudesse,
ternamente, escovar seus lábios nos dela. Ela humilhou- o com sua coragem.
Com um suspiro, ela, devagarinho, colocou seus braços em volta do pescoço dele e
separou os lábios, e ele tomou o que ela ofereceu, tão suavemente, como pode, mostrando-
lhe a cada toque vagaroso de sua língua, com cada carícia ao longo do comprimento de suas
costas, quão preciosa ela era para ele. Quando ela estremeceu contra ele, ele arrastou sua
boca ao longo da coluna cremosa de sua garganta, oferecendo consolo quando ela deixou
cair a cabeça para trás, dando-lhe um mais fácil acesso. Ele continuou preguiçosamente até a
concha de sua orelha, delineou-a com a ponta da língua, sentindo o seu arrepio através dela.

67
— Melhor do que no meu aniversário, — ela sussurrou.
Afastando-se dela, ele segurou seu olhar.
— Eu quero lhe oferecer mais, Faith, mas eu não sei se você está pronta para isso.
Ela balançou a cabeça. — Mas estou chegando lá.
Endireitando-se, ela aconchegou suas costas contra seu peito e ele fechou os braços
em volta dela. Eles ficaram em silêncio por longos minutos, ouvindo o murmúrio do rio, o
chilrear dos grilos, o coaxar das rãs.
— Você vai partir de novo, Rawley? — Ela perguntou.
— Não, se você não quiser que eu vá.
Ela apenas balançou a cabeça, e ele sabia, em seu coração, que ele estava lá para
ficar.
Ela nunca tinha planejado lhe dizer, mas ter-lhe dito, era como se um grande peso
tivesse sido tirado de seus ombros. Ela não sabia quanto tempo eles só ficaram lá sentados,
mas era reconfortante ter seus braços em volta dela, sentir seu calor em volta dela. Embora
fosse Agosto e quente, um frio tinha atingido seus ossos quando as memórias dispararam,
um frio que seu beijo tinha obliterado. Ao contrário do anterior, este tinha sido suave e
gentil. Como no anterior, ele se controlou. Ela sentiu os tremores correndo através dele,
enquanto ele segurava suas necessidades. Ele entregou as rédeas para ela, permitindo-lhe
determinar a profundidade, a direção, o ritmo que suas bocas seguiriam.
Após algum tempo, ela vestiu suas calças, camisa e calçou as botas, envolveu uma
manta ao redor de seus ombros, e eles começaram a caminhar em direção à cabana. Sem
uma palavra, ele pegou a mão dela. Ela apertou-a enquanto ela roçava seu ombro contra o
dele. A familiaridade dele foi reconfortante em sua intensidade.
Quando chegaram à cabana, ele disse, — Eu não quero ir, Faith. As suas memórias
foram agitadas esta noite e eu sei como elas podem se tornar vívidas durante o sono. Eu
quero estar aqui, para você, no caso de você ter um pesadelo, precisar de consolo. Posso
dormir na cama de Callie.
Ela nunca tinha estado sozinha durante a noite. Até que ela e Callie se mudaram para
a cabana, ela viveu na casa de seus pais. Sempre havia outra presença. Embora, no início, ela
tenha apreciado a paz, de repente, ela não queria mais ficar sozinha.
— Eu gostaria disso.
Enquanto ele tratava de seu cavalo, ela entrou, arrumou as mantas e o que restava do
uísque. Ela não estava bêbada, longe disso, mas estava um pouco mais relaxada.
Quando ele entrou, todo o lugar pareceu encolher com a sua presença. Ele encheu a
sala, mas não de uma forma intimidante. Ele era simplesmente ousado e confiante, um
homem que poderia ser duro num minuto, suave no próximo. Ela inclinou a cabeça para o
quarto de Callie. Com um aceno de cabeça, ele caminhou para ele. Ela o seguiu e encostou-se
no batente da porta.
Com um suspiro, ele inclinou a cabeça. Se ela pudesse, naquele momento, ela teria
rido. Em vez disso, ela simplesmente sorriu. A cama de sua filha não era muito maior do que
Callie era.
Sem se virar, ele olhou para Faith por cima do ombro, um sorriso irônico marcando
suas feições.
— Eu acho que vai ter que ser no sofá.

68
Ela mordeu o lábio inferior, sacudiu a cabeça.
— Na minha cama.
Ele se virou então. — Faith...
— Apenas me segure. Eu preciso disso.
Ele assentiu. — Tudo bem.
Seu sorriso cresceu. Sempre um homem de poucas palavras.
Sem se preocupar em mudar para sua camisola, ela subiu na cama, enrolado em seu
lado, e assistiu Rawley olhando ao redor do quarto.
— Você colocou cortinas, — disse desnecessariamente.
— Eu não gostava da ideia de alguém espiando. — Depois de Cole, ela olhou para o
mundo de forma diferente, tomando consciência das várias maneiras que ela poderia sentir-
se violada.
Ele aproximou-se. A cama afundou com o peso dele quando ele se sentou e começou
a tirar as botas.
— Está calor. Você pode tirar sua camisa.
— Você vai sentir-se confortável com isso?
— Eu não teria sugerido caso não estivesse.
Ele puxou-a pela cabeça e atirou-a ao pé da cama. Depois de baixar a chama na
lâmpada, deixando apenas luz suficiente para que eles não estivessem na escuridão total, ele
estendeu-se na cama, levantou um braço, e colocou uma mão sob sua cabeça. Era uma pose
tão masculina.
Deslizando, ela aconchegou-se contra ele, colocando a cabeça no oco de seu ombro.
Ele trouxe seu braço ao redor dela, segurando-a com ternura.
Quando ela adormeceu, sonhou com ele segurando-a assim todas as noites para o
resto de suas vidas.

69
Capítulo Doze

— Você matou Berringer?


Quando Rawley e Faith chegaram a casa, Dallas estava em seu escritório, olhando
alguns papéis. Faith tinha se juntado a sua mãe e Callie no café da manhã, mas Rawley tinha
que ter uma palavra com Dallas, em primeiro lugar.
O homem que o havia ressuscitado recostou-se na cadeira, plantou seu cotovelo em
seu braço e acariciou seu bigode com o dedo indicador.
— Ela te contou.
Rawley deu um aceno brusco e repetiu a pergunta.
— Você quis matá-lo?
Dallas levantou-se, caminhou até a mesa de tampo de mármore, levantou uma
garrafa e derramou uísque em dois copos. Apesar da hora matutina, Rawley aceitou o que
Dallas lhe ofereceu.
— Ele ainda estava respirando quando o deixei. Pouco. — Ele bebeu o conteúdo de
seu copo.
— Não pense que eu não estava tentado a colocar uma bala nele. Em vez disso, disse-
lhe que se voltasse a vê-lo nas proximidades eu o faria. Eu o expulsei.
— Você sabe onde eu posso encontrá-lo?
Dallas sacudiu a cabeça. — Mesmo que eu soubesse, eu não diria a você. A última
coisa que Faith e sua Ma necessitam é de vê-lo enforcado por assassinato.
— Eu poderia fazê-lo sem ser apanhado.
— Você nunca matou um homem. Eu já. Não é algo a ser feito de ânimo leve. Eu o
tenho vigiado. Eu recebo relatórios sobre ele, de vez em quando. Ele não vai cortejar a filha
de qualquer outra pessoa.

Isso não era suficiente. Se alguma vez Rawley cruzasse com Berringer, ele iria
assegurar-se de que ele dava o seu último suspiro.
Ele engoliu seu uísque, colocou o copo sobre a borda da mesa. — Eu amo Faith.
Dallas ficou parado por alguns segundos, depois assentiu. — Eu sei.
— Não como uma irmã, não como um amigo. Vou estar onde ela precisar que eu
esteja, e se isso significa que eu não vou mais dormir nesta casa — para ser honesto, Dallas,
isso não é da sua maldita conta. O que acontece entre eu e Faith, é entre eu e Faith.
Outro aceno. — Contudo, eu ficaria muito orgulhoso de lhe chamar genro.
— Eu não sei se vai chegar a esse ponto. Eu não tenho a certeza de como aFaith se
sente sobre este assunto, ou, se é algo que ela quer, mas independentemente disso,
ninguém, jamais vai magoá-la novamente.
Rawley tinha evitado cortejar ou se envolver com alguém, porque seu coração tinha
pertencido a Faith desde sempre, mas, ele sempre se sentiu muito impuro para ela. Mas,
agora que ela também estava quebrada, ele estava determinado a consertá-la. Se, no final,
ela terminasse longe dele, se isso a levasse para os braços de outra pessoa, ele iria encontrar
uma maneira de sobreviver. Tudo o que importava era que ela estivesse bem e feliz.
Então, ele perguntou a sua mãe se podia deixar Callie por mais uma noite e disse a
Faith que, quando eles terminassem as tarefas do dia, ele iria encontrá-la na cabana, que

70
tinha algo especial em mente. Ele fez todos os planos, estava bastante satisfeito consigo
mesmo.
A única coisa que ele não contava era com a chuva que começou a cair pouco antes
de ele chegar à cabana.
Ela não estava nervosa. Mas sentia, percorrendo-a, um sentimento de antecipação
enquanto estava na soleira da porta olhando a chuva cair no chão e ouvindo o ritmo
constante das gotas martelando no telhado. Fazia anos desde que ela encarara o fato de que
ia passar uma noite sozinha com um homem – ela não contou com a noite anterior porque
eles estavam juntos como amigos. Ela tinha a sensação de que esta noite ia ser um pouco
diferente. A forma como seus olhos tinha esquentado quando ele lhe disse que estava
fazendo planos para eles e que Callie iria ficar com a mãe – provocara-lhe um sorriso que
durou o resto do dia.
Apesar de ela ficar nervosa em torno de outros homens, de não querer ficar sozinha
com eles, ela nunca tinha tido essa reação quando se tratava de Rawley, exceto quando ele a
apanhou de surpresa no rio. Ela não podia negar a existência de uma ligação entre eles desde
sempre. Agradava-lhe saber que esta noite, eles teriam algum tempo juntos e sozinhos.
Tranquila, ela esperava que ele chegasse em seu cavalo e não na charrete. Quando
ele parou, ele correu para a parte de trás, pegou uma grande cesta de vime, e subiu os
degraus.
Seu sorriso era irônico, auto-depreciativo. — Lá se foram os meus planos.
Ela sorriu. — Um piquenique.
Com um aceno de cabeça, ele olhou por cima do ombro. — Eu não estava contando
com a Mãe Natureza estragando as coisas.
— Precisamos da chuva, — ela apontou, tentando não parecer muito desapontada
por si e por ele, pelo trabalho que ele teve.
— Nós podemos fazer um piquenique aqui dentro.
— Não vai ser o mesmo.
— Certamente será diferente de qualquer outro piquenique que eu já tive.
Seus olhos esquentaram. — Isso é o que eu estava esperando.
Ele carregou a cesta para dentro da casa, em seguida, tomou o seu tempo para
desengatar a dupla de cavalos e levá-los para um abrigo. Quando ele voltou para dentro, ela
jogou uma toalha para ele, observou como ele esfregou seu cabelo encharcado.
— Você deixou algumas roupas quando partiu, se você quiser vestir algo seco.
Suas sobrancelhas se levantaram surpresas. — Elas ainda estão aqui?
Ela não estava pronta para confessar que, algumas noites, ela dormia com uma
camisa que ele usara antes de partir porque ela ainda tinha o seu cheiro — fraco, mas
perceptível. Com um encolher de ombros, ela disse,
— Na gaveta da cômoda.
Enquanto ele foi para o quarto, e, para evitar pensar nele tirando suas roupas, ela se
ocupou de aprontar as coisas. Ela colocou uma manta no chão e pôs a cesta sobre ela. Apesar
de ainda ser de tarde, as nuvens espessas e as fortes chuvas haviam bloqueado o sol quando
este mergulhou em direção ao horizonte, escurecendo o céu. Preferindo a penumbra, ela
acendeu uma única luz e, em seguida, abriu a porta para acolher o exterior. Os beirais da
varanda impediam a chuva de entrar, mas o seu cheiro flutuava em uma brisa fresca.

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Ela estava olhando para fora quando Rawley veio por trás dela e, cuidadosamente,
colocou as mãos na cintura dela. Com um suspiro, ela se inclinou contra ele, voltou-se para
trás, e trouxe seus braços em volta dela, dobrando-os sobre o peito, logo abaixo dos seios.
Baixando a cabeça, ele roçou os lábios sobre a sua têmpora.
— Eu sempre amei a chuva, — disse ele calmamente.
Eu sempre amei você, pensou.
Lentamente, ele virou- a. — Eu tinha planejado alimentá-la em primeiro lugar.
— Eu não estou com fome de comida. — Ela passou-lhe as mãos pelo peito, nos
ombros, no pescoço.
— Mas eu estou com fome de... — Lágrimas queimaram seus olhos.
— Eu não sei para o que estou pronta, se eu posso fazê-lo. Eu me sinto tão suja e você
sabe quão imunda eu sou.
— Como te disse ontem à noite, não foi sua culpa, Faith. Quando eu olho para você,
eu não vejo nada disso. Eu só vejo você. Eu vejo uma mulher que suportou algo terrível e o
superou tornando-se uma mãe maravilhosa, uma mulher extraordinária.
Ela balançou a cabeça. — Você não entende, Rawley. Você não pode saber como é...
— Eu sei, Faith. Eu não sei quantos anos eu tinha. Eu me lembro de que meus dois
dentes da frente estavam faltando, a primeira vez que o homem que se chamava meu pai,
me vendeu para um bastardo depravado.

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Capítulo Treze

O seu coração balançou, seu estômago se agitou, e o aperto em torno de seu peito
tornou difícil para respirar. Toda a dor que ela estava sentindo por ela mesma estava, agora,
sentindo por ele. Com uma das mãos, ela acariciou sua mandíbula. Ela não conseguia
encontrar as palavras, tudo o que podia fazer era segurar o seu olhar, enquanto as lágrimas
rolavam pelas suas bochechas.
Com o polegar, ele capturou as lágrimas. — Não chore, querida. Foi há muito tempo.
— Mas você nunca esquece.
— Não, nunca. Mas você não tem de deixá-la ser sua dona e não tem que sofrer tanto
tempo como eu. Eu pensava que o que me aconteceu me tornou indigno, indigno de amar,
indigno de ser amado. Eu pensava que os homens tinham deixado algo mau em mim, que iria
contagiar os outros. Que iria contagiar você. — Ele circulou o polegar dela em torno de seu
rosto.
— Naquela noite, quando você veio aqui, eu queria fazer um inferno de muito mais
do que beijá-la. Eu queria levantá-la em meus braços, levá-la para a minha cama, e fazer
amor com você até o amanhecer.
— Se eu lhe dissesse o que eu estava sentindo, o motivo de eu ter pensado que o
beijo foi um erro, talvez as coisas tivessem mudado entre nós. Eu não sei. Talvez você tivesse
chutado Berringer para fora de sua vida naquela noite, talvez você nunca tivesse sido ferida.
Eu fui embora, Faith, porque eu estava com medo que se você viesse ter comigo novamente,
eu não teria forças para mantê-la afastada. E eu acreditava, com todo meu coração, que você
merecia alguém melhor do que eu.
Ele a queria? Seu beijo certamente a fez sentir desejada — Ela balançou a cabeça.
— Mas, e sobre aquela mulher que você ama? Aquela de que Maggie me contou.
Ele sorriu ternamente. — Era você, Faith. Sempre foi você.
Mais lágrimas se agruparam em suas bochechas. — Oh, Rawley.
Ele inclinou a cabeça, baixou-se ligeiramente. — Se você não quer o que eu estou
oferecendo, tudo o que você tem a fazer é dizer pare.
Só que ela queria, sempre quis isso. Quando os seus lábios tocaram os dela, ela abriu
a boca para ele, para este homem incrível e extraordinário, que sempre esteve conectado
com sua alma de um modo que mais ninguém o fez. Por que ela não tinha confiado em suas
próprias emoções, seus próprios instintos, seus próprios desejos? Por que ela duvidou da
força do que ela sentia por ele?
Conforme ele aprofundou o beijo, ela derramou tudo o que tinha na união de suas
bocas e a varredura de sua língua sobre a dele. Apesar de não ter bebido qualquer álcool, ela
estava se sentindo bêbada e tonta. Ela não se opôs quando ele colocou as mãos em seu
traseiro, quando ele apertou-a contra ele, e ela sentiu sua necessidade, dura e longa, lutando
contra suas calças, empurrando contra sua barriga.
Ela não sentia medo ou repulsa como ela temia. Ela sentiu a força desencadeada lá,
mas também a sentiu dentro de si mesma. Seu desejo por ela provocando a reação de seu
corpo. Não um desejo de ferir, prejudicar ou dominar. Mas o desejo de compartilhar, para

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que ela soubesse que ela era igual a ele. Caso contrário, ele não teria lhe dado o poder de
ditar os termos.
— Pare, — disse ela contra sua boca, e ele, imediatamente parou.
Respirando com dificuldade, ele se afastou, sustentou o olhar.
— Eu quero isto, Rawley, eu realmente quero. Mas, por dentro, eu me sinto suja.
Nem todos os banhos no mundo vão conseguir limpar o que precisa ser limpo.
— Eu sei. Houve alturas em que eu me esfregava até ficar quase em carne viva. — Ele
olhou para além dela.
— Você sabe quando eu me sinto mais limpo, Faith? Quando eu estou em uma
tempestade. — Ele puxou as botas e as meias, então se ajoelhou e tirou-lhe os sapatos.
Endireitando-se, ele estendeu a mão e entrelaçou os dedos com os dela.
— Confie em mim.
Ela assim fez. Com todo o seu coração e alma. Então, com a mão aninhada na sua, ela
o seguiu para a varanda, descendo os degraus, para a grama, onde sua filha brincava.
A chuva era pesada, mas não machucava. Ela caia sobre ela, criando riachos por seu
rosto. Ela tinha deixado os cabelos soltos. Rawley passou suas mãos por ele e, mais uma vez,
tomou sua boca, sua paixão ainda mais quente.
Pressionando-se contra ele, ela obteve prazer em seu grunhido gutural, em senti-lo
vibrando em seu peito. Com uma mão ainda emaranhada em seus cabelos, ele envolveu seu
outro braço, firmemente ao redor dela e baixou os dois para o chão, até que ele estava
deitado de costas e ela estava escancarada em seus quadris.
Olhando para baixo, para ele, ela encontrou seu olhar ardente.
— Você está no comando, Faith. Mostre-me ou me diga o que você quer. Faça comigo
o que você quiser.
Jogando a cabeça para trás, ela riu enquanto a chuva caia sobre ela, como se as
algemas que a tinham reclamado por muito tempo, caíssem. Ela não tinha nada a provar
para este homem, não tinha expectativas a cumprir. O amor dele rompeu seus limites,
deixou-a tão livre quanto as extensas planícies abertas.
Ela voltou sua atenção para ele. — Se você não gostar do que estou fazendo, tudo o
que você tem a fazer, é me dizer para parar.
Ele sorriu diabolicamente. — Querida, quando se trata de você, essa palavra nunca
vai cruzar os meus lábios. Eu não vou me opor a qualquer coisa que você queira fazer
comigo.
Suas palavras a encorajaram. Ela agarrou sua camisa com ambas as mãos, uma de
cada lado, e a rasgou em pedaços — enviando botões dançando pelo ar. Seus olhos
escureceram.
— Você tem um peito terrivelmente bom, Sr. Cooper. — Ela baixou a boca para o oco
no seu esterno e lambeu a chuva que tinha se reunindo lá, a pele logo abaixo da piscina rasa
de água da chuva. Seu rugido competiu com o trovão quando ele endureceu. Dando-lhe mais
poder, mais domínio, mais controle. Ela lambeu seu caminho até as costelas, uma por uma,
em seguida, até seu pescoço, até que ela foi capaz de levar seu lóbulo entre os dentes e dar-
lhe uma pequena mordida.
— Retribua o favor, — ela respondeu asperamente.
— Cristo, Faith.

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Endireitando-se, ela afastou suas mãos, levando-as, ambas, aos lados dos botões do
seu vestido. Ela estudou seu rosto, viu a fome, a necessidade, o desejo de não machucar.
— Faça-o, — ela ordenou.
Seus formidáveis músculos, que ela tinha visto se desenvolvendo ao longo dos anos,
tiveram pouco trabalho para rasgar a camisa e o corpete até que ela estava nua, para ele, da
cintura para cima. Reverentemente, ternamente, ele espalmou seus seios, pressionando
suavemente.
— Perfeitos.
Levantando-se, ele circulou seu mamilo com a língua, fez um X sobre ele, rodeou-o
novamente, em seguida, fechou a boca aquecida em torno dele. Ela gritou com o puro
prazer. Ele deu a mesma atenção ao outro seio antes de tomar novamente sua boca e
entregar-se a um beijo escaldante que lhe roubou a capacidade de pensar ou raciocinar.
Paixão e necessidade assumiram quando suas bocas e mãos viajaram sobre a pele
nua, saquearam o que foi exposto, roubando toques preciosos como sensações
intensificadas. Prazer acumulava-se entre suas coxas e ela ansiava por libertação.
Com dedos ágeis e gananciosos, ela desabotoou as calças e libertou-o. Ele tomou
conta de si mesmo enquanto ela erguia a saia, se levantava, e logo, afundando lentamente,
absorveu a maravilhosa glória de seu enchimento. Posicionando as mãos em cada lado de
seus quadris, ele guiou seus movimentos enquanto ela balançava contra ele, enquanto a
chuva caía, encharcando-os, lavando-os, limpando-os.
Acariciando as mãos sobre o peito dele, ela deixou cair a cabeça para trás e o montou
duro e rápido, edificando o prazer até que ele chicoteou através dela e mandou-a voando em
um grande abismo onde reinou a gratificação. Seu grito ecoou em torno deles, um eco do
grunhido dele quando este se contraiu e ela sentiu sua semente quente fluindo dentro ela.
Desmoronando em cima dele, ela acolheu os seus braços fechando-se ao redor dela.
Ela o abraçou com força enquanto a tempestade prosseguia o seu caminho e a paz flutuava
em torno dela, caiu sobre ela.

Rawley pensou que, ao seu estilo de cortejo, faltava muita finesse, mas não podia
discordar com o resultado final. Enquanto estava sentado na banheira de água morna com
seus braços em volta de uma Faith aninhada contra o seu peito, ele nunca havia se sentido
tão limpo.
— Quando você percebeu que me amava? — Ela perguntou.
— Eu sempre te amei. Mas quando eu tinha dezessete anos, quase dezoito, foi
quando eu comecei a perceber que o que eu sentia por você estava prestes a tomar um
rumo que não deveria.
— Foi ao mesmo tempo em que eu percebi que você estava me evitando,
encontrando desculpas para não ficar perto de mim. Eu devia ter imaginado. Eu acho que
ainda estava tentando me descobrir.
Ele baixou a boca para a sua nuca.
— Você se saiu muito bem.
— O que fazemos agora? — Perguntou ela.
— Secar-se, ir para a cama, fazer amor novamente.

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Ela riu. — Eu quis dizer para onde vamos além disso. Eu gostaria de explorar o que
temos aqui, mas não quero apressar qualquer tipo de compromisso.
— Eu compreendo, Faith.—
Ela virou-se até que seu quadril estava pressionado contra seu pênis, chamando sua
atenção.
— Eu não quero que Callie suspeite que algo está acontecendo entre nós. Ou meus
pais. — Revirando os olhos, ela balançou a cabeça.
— Ou ninguém. Não é que eu tenho vergonha de você, de nós, mas...
— Eu entendo. Nós vamos perder todas as nossas escolhas.
Com um aceno de cabeça, ela se acomodou contra ele, enviando um riacho de água
sobre eles.
— Pa faria você se casar comigo.
Ele não achava que ela precisava saber que ele já tinha falado com seu pai. Ele não
queria que ela sentisse que tinha que trilhar esse caminho com ele.
— Eu gosto da sua ideia, porém, de nos secarmos, ir para a cama, e fazer amor
novamente.
E isso foi exatamente o que eles fizeram.

76
Capítulo Quatorze

Quando Faith acordou naquela manhã, tudo o que ela queria fazer era ficar na cama
com Rawley, mas eles tinham responsabilidades. Além disso, ela estava ansiosa para ver
Callie. Ela nunca tinha estado tanto tempo longe dela. Então eles decidiram que eles agiriam
como se nada tivesse acontecido, e que, à noite levariam Callie à abertura da Nickelodeon.
Mas enquanto ela estava no hall de entrada do cinema, com Callie aos saltos
apertando sua mão, e Rawley, discretamente, segurando sua outra mão, Faith não pode
deixar de pensar, que ela estava radiante de felicidade e que, com toda a certeza, todo o
mundo iria notar.
— Então este é o majestoso edifício, — disse Rawley, olhando em volta para o papel
de parede dourado e vermelho, o tapete de vermelho, o corrimão talhado das sinuosas
escadas gêmeas — no momento, ainda fechadas — que levavam uma sacada.
— Você conhece a Ma. Ela gosta de dar às pessoas experiências que as façam sentir-
se especiais. Callie, você se lembra da regra sobre esta noite, não é?
Callie revirou os olhos.
— Não falar.
— Está certo. Este é um evento adulto, mas você pode vir porque você é da família.
— Rufus queria vir.
— Este não é um lugar para cães. Ele está esperando por você em casa, — Faith
lembrou. Rawley tinha vindo buscá-las na charrete, e ia levá-las de volta para casa.
Laurel escolheu esse momento para fazer sua aparição, de pé sobre o patamar, no
topo das escadas. Ela bateu palmas várias vezes para tentar obter a atenção de todos, mas,
todo o espaço estava repleto de muita emoção, tornando difícil às pessoas prestarem
atenção.
De repente, um assobio ensurdecedor propagou pelo ar, fazendo todos olhar ao
redor.
— Acalmem-se! — Rawley gritou, e a multidão ficou em silêncio.
Laurel sorriu. — Obrigado, primo Rawley. Sejam todos bem-vindos! A Tia Dee, o Tio
Dallas e eu estamos muito felizes por vocês se juntarem a nós esta noite. Acreditamos que
vocês estão prestes a vivenciar uma experiência única. Embora as imagens em movimento já
existam há alguns anos, agora elas estão ganhando popularidade. Teatros dedicados a exibí-
las estão sendo construídos em todo o país. Como vocês sabem, a minha tia e o meu tio
acham que é importante acompanhar as mudanças dos tempos. Portanto, esta noite temos
para vossa diversão, Oliver Twist. Temos também os talentos excepcionais de Austin e Grant
Leigh proporcionando a música que vai acompanhar o filme. Vocês podem sentar-se no piso
principal ou, estamos removendo as cordas, para que possam chegar à sacada. Aproveitem a
vossa viagem mágica!
As pessoas começaram a dirigir-se às portas que levavam ao teatro.
Descendo, Rawley arrebatou Callie em seus braços.
— Não podemos deixar você se perder, — ele disse a ela. Ele mudou-a para que
pudesse apoiá-la com um braço, em seguida, estendeu a mão e enfiou os dedos em Faith.

77
Sim, as pessoas eram obrigadas a notar que ela estava brilhando como um céu cheio
de estrelas, mas ela não podia evitá-lo. Ele a fez sentir-se preciosa.
A multidão continuou, sinuosa, procurando por lugares vazios. Rawley começou a
levá-la ao longo da borda, passando pelas pessoas que estavam discutindo sobre onde
sentar, até chegar a uma fila com vários assentos vazios, perto da frente. Ela passou por ele e
tomou o terceiro assento do fim. Ele começou a colocar Callie no assento do meio, mas ela se
agarrou ao seu pescoço como um macaco.
— Não! Abraça-me, — ela exigiu.
Dando a Faith um sorriso irônico, ele deslizou no assento ao lado dela e instalaram-se
com Callie em seu colo.
Faith sorriu provocativamente. — Ela tem você na palma da mão.
— Não mais do que a mãe dela.
As luzes foram apagadas. Os violinos começaram a tocar. As imagens em movimento
começaram a rolar.
Ela ouviu um estalo, sentiu o cheiro a salsaparrilha, e sem pensar, estendeu a mão.
Rawley deixou cair um pedaço menor do que o habitual em sua palma. Olhando por cima, ela
viu que Callie já estava chupando seu pedaço. Com uma piscadela, Rawley enfiou o restante
em sua boca. Olhar este homem com sua filha, apertou seu coração.
As imagens em preto e branco, piscando na tela, hipnotizavam, embora não tanto
quanto o homem sentado ao lado dela, que não parava de segurar sua mão. Ela tinha apenas
cerca de vinte minutos para observá-lo, discretamente, antes do filme chegar ao fim. Mas o
tempo todo, os cabelos em sua nuca se enriçaram. Ela olhou ao redor da sala se esforçando
para determinar quem poderia estar olhando para ela ou o que poderia estar lhe causando
desconforto, mas não viu nada fora do comum.
Quando eles se encaminharam para fora do teatro, ela olhou em redor, para as
pessoas se deslocando. Pelo canto do olho, ela viu alguém familiar — Virando a cabeça
rapidamente, ela esperava obter uma visão melhor, mas o perdeu de vista. Ainda assim, não
poderia ser quem ela achava que era, não poderia ser Cole. Ele não se atreveria a mostrar
sua cara por aqui e correr o risco de ter que lidar com seu pai, ou mesmo com ela. Antes ela
tinha estado muito chocada e envergonhada para confrontá-lo, mas, se seus caminhos se
cruzassem novamente, ele iria descobrir que ela já não era a menina que costumava ser.
Agora ela era forte.
— O que se passa? — Perguntou Rawley.
— Eu pensei ter visto — Ela balançou a cabeça. Foi apenas sua imaginação brincando
com ela, porque ela já não estava deixando o homem dominar seus pensamentos, porque ela
estava seguindo em frente, com Rawley. Talvez uma parte dela quisesse que ele visse que já
não tinha qualquer influência sobre ela.
— Não é nada. Eu não dormi muito a noite passada. Eu só estou cansada.
— Eu acho que você vai conseguir dormir esta noite.
Ela olhou para a filha, aninhada contra seu ombro, e estava tentada a mandá-la para
casa com seus pais, mas Callie era sua responsabilidade. Ela e Rawley apenas teriam que
descobrir uma maneira de estar juntos de modo a que sua pequena não os apanhasse
sozinhos.
— Eu imagino que sim.

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De volta a casa, Callie se sentou no seu colo, falando tudo o que ela não tinha falado
durante o filme. Embora ela não tivesse sido capaz de ler as legendas, ela tinha ficado
fascinada observando os atores se movimentando na tela. E ela tinha muito para contar
sobre ele como se eles não tivessem assistido.
Quando eles chegaram à cabana, Rawley caminhou com ela e Callie até aos degraus
da porta. Rufus apareceu, de tras da casa, para cumprimentá-los. Faith abriu a porta, e o cão
saiu disparado para dentro de casa, seguido de Callie, o que lhe deu um momento a sós com
Rawley.
— Obrigada por ser tão bom para ela, — disse ela.
— Ela é como a mãe. Fácil para amar.
Deus do Céu, ela desejou que este homem fosse o pai de sua filha.
— Mamãe! — Callie gritou.
— Eu tenho que ir, — Faith disse a ele.
Ele colocou o dedo indicador sob o queixo, levantou seu rosto, e deu um beijo em
seus lábios.
— Sonhe comigo.
Rindo, ela viu quando ele caminhou até à charrete, dando-lhe uma visão de seus
ombros largos. Ela iria, definitivamente, sonhar com ele.

Faith estava apenas caindo em um sono leve quando ouviu os passos do cavalo fora
da janela de seu quarto. Cada terminação nervosa estava acordada assim que ela saltou da
cama, com o coração batendo tão forte que ela não teria ficado surpresa se, quem estava lá
fora, pudesse ouvir. Quase sem respirar, sem mover um músculo, ela escutou atentamente.
O relinchar do cavalo tinha soado demasiado perto para ser do seu cavalo, fechado no
estábulo, não muito longe da cabana.
O sentimento de mau presságio que ela tinha experimentado no teatro, tinha ficado
com ela, então ela tinha deixado a chama da lâmpada na mesa de cabeceira queimando
baixinho, o que tornou fácil a tarefa de alcançar a arma que descansava ao lado dela. Seu
coração desacelerou e sua respiração acalmou quando seus dedos se fecharam em torno do
frio punho de marfim. Deslizando por entre os lençóis, ela não fez nenhum som quando seus
pés descalços aterrissaram no áspero tapete trançado. As cortinas eram grossas o suficiente
para que a pessoa que se esgueirava no exterior, não fosse capaz de pegar nem sequer um
vislumbre de sua sombra, não saber que um acerto de contas caminhava em direção a ele.
Ela não tinha deixado nenhuma lâmpada acesa na sala da frente. As cortinas não
eram tão grossas. O luar filtrava-se através do tecido, iluminando o seu caminho. Ela olhou
para dentro do quarto de Callie, grata por que ela e Rufus estavam confortáveis e dormindo
em sua cama. Calmamente, ela fechou a porta.
Quando chegou à porta da frente, ela pressionou a orelha contra a madeira e
escutou. Silêncio. Estranho. Incomodo. Pesado. Antinatural. Nem mesmo o cricrilar de um
grilo. Então o um ruído muito baixo veio até ela, do outro lado da sala, perto da janela da
cozinha. Alguém estava se movendo ao longo do lado da cabana.

79
Lentamente, ela destrancou a porta, soltou o trinco, e abriu a porta para a varanda. O
luar era suficiente para ver que não havia nada se deslocando lá. Conhecendo bem quais as
tábuas que rangiam e as que não, ela deu um passo para a varanda em silêncio absoluto.
Crepitação como folhas secas sendo perturbadas chamaram sua atenção. O cavalo
deu um bufo rápido e baixo. Uma voz de homem se seguiu. Sem dúvida, tentando silenciar a
besta. Ela achou estranho que ele tivesse mantido o animal com ele, se ele estava tentando
esquivar-se dela, mas era bem possível que o homem fosse demasiado tímido para ter uma
arma carregada.
Ela se arrastou ao longo da varanda, de costas, deslizando ao longo da parede da
casa. Quando ela chegou até a borda, ela espiou ao virar da esquina.
Definitivamente um cavalo. E um homem. Um homem se agachando, esticando sobre
uma palete. Deslizando o dedo fora do gatilho, ela desceu da varanda.
— Que diabos...
Rawley empurrou para cima e se virou tão rápido, que ela poderia ter rido, se não
tivesse também sacado sua arma do coldre em um movimento treinado, que demonstrou
seus reflexos rápidos e seu objetivo mortal porque agora foi apontada para ela.
— Maldição, Faith! Você sabe que não deve surpreender assim um homem.
— E você sabe ainda melhor que não deve estar onde não é esperado. Diabo, eu
estive muito perto de atirar em você.
Com um floreio que girou sua arma em torno duas vezes, ele voltou a colocar sua
arma de volta no coldre de couro.
— Eu só quis ver se estava tudo bem.
O suspiro que ela deu mostrou tanto amor como frustração.
— Eu agradeço, mas eu posso cuidar de mim mesma.
— Eu não tenho dúvidas disso, nem por um minuto sequer, mas eu não gosto da ideia
de você estar aqui sozinha. — Ele fez uma careta.
— Eu sei que Callie está aqui, mas ela não vai ser uma grande ajuda em caso de
problemas.
Ele estreitou os olhos, moveu a cabeça para frente um pouco como se estivesse
tentando ter uma visão melhor.
— Você está usando a minha camisa?
— Cheira como você, — disse ela.
Ele sorriu. — A coisa real cheira melhor.
— Você não vai voltar para a casa, não é?
— Não.
— Você pode muito bem entrar.
— Você sabe o que vai acontecer se eu o fizer.
Ela deu a ele seu sorriso maroto.
— Se eu tiver sorte, você vai tirar esta camisa de mim.

80
Capítulo Quinze

Com um suave suspiro e um gemido, Faith apertou-se mais firmemente contra


Rawley. Ela poderia se acostumar a acordar todas as manhãs com os braços dele ao redor
dela, seu cheiro enchendo suas narinas.
— Bom dia, — ele disse, sua voz baixa e rouca, não tão acordado como outras partes
do seu corpo.
Inclinando a cabeça para trás, ela sorriu para ele. — Manhã.
— Eu preciso fugir antes que Callie acorde.
— Ela já deve estar acordada. Eu ouvi a porta da frente.
Os latidos de Rufus encheram o ar.
Ela gemeu, enterrou o rosto na curva do pescoço dele.
— Sim. Eles estão.
— Eu acho que não temos tempo para saudar o dia adequadamente.
— Não há nada que eu gostasse mais do que fazer amor com você, mas o cara que
viveu nesta cabana antes de mim não colocou uma fechadura na porta do quarto. E Callie só
vai entrar porque, nunca antes, houve um motivo para ela bater.
— Como é que vamos explicar eu estar aqui?
Rufus latiu mais alto.
— Vamos esperar que ela não pergunte.
— Faith, ela vai perguntar. — Os latidos cresceram em volume e intensidade.
— Essa menina é curiosa...
Os latidos tornaram — se mais frenéticos.
— Algo está errado. — Faith jogou as cobertas e saiu da cama.
Rawley não a questionou. Apenas pegou as calças, mas ela não esperou por ele. Ela
vestiu a camisola por cima da cabeça, porque era a maneira mais rápida de se cobrir. Não
sabendo que tipo de criatura irritou Rufus, ela pegou sua pistola da mesa de cabeceira e
correu. Suas pernas nunca tinham se movido tão rápido.
A porta da frente estava aberta. Ela correu através dela, cambaleou até parar.
Um homem estava ajoelhado sobre um joelho, o braço travado em torno de Callie,
segurando-a firmemente entre suas pernas. Apesar de ela estar lutando, era óbvio que ela
não conseguia se libertar.
— Mamãe!
O homem parecia familiar, mas seu nariz era tão disforme — torto e curvado, —
quase plano no meio, que ele dificilmente se assemelhava ao bastardo que tinha se
aproveitado dela.
— Deixe-a ir, — ela ordenou.
Rawley tropeçou quando parou nas suas costas.
— Bem, bem, o que temos aqui? — O homem disse, e sua voz fez os curtos cabelos na
sua nuca subirem.
— Deixe-a ir, Cole.
— Eu não penso assim. — Ele acenou com a arma na outra mão, em seguida, apontou
para Callie.

81
Faith jurou que seu coração parou.
— Se qualquer um de vocês fizer qualquer coisa estúpida...
— Você é o pai dela, Cole.
Por um momento, ele pareceu atordoado, depois sacudiu a cabeça.
— Não importa.
— O que você quer, Berringer? — Rawley perguntou incisivamente.
— O que eu quero? Eu quero minha vida de volta!
Ele apontou a arma para Faith, e Rawley pôs-se, rapidamente, na frente dela antes
que ela pudesse sequer piscar. Ele não se preocupou em perder tempo vestido uma camisa
ou calçando as botas. Olhando para baixo, viu a arma que ele tinha enfiado na cintura de
suas calças. Ela tentou mover-se em torno dele, mas ele esticou seu braço, para impedi-la de
ir para frente.
— E eu quero que o maldito cão pare de latir!
— Rufus, finja-se morto, — Faith gritou. O cão ganiu.
— Finja que está morto, — ela ordenou, e ele rolou para o lado.
— Isso é impressionante, — disse Cole.
— Vovô e eu ensinamos a ele, — Callie disse inocentemente, não compreendendo
verdadeiramente o perigo terrível que ela estava ou que sua vida estava em risco.
— Não é que você é uma menina inteligente? — Disse Cole.
— Deixe-a ir, Cole, — disse Faith.
— Nós podemos resolver isso.
— Ela é a minha vantagem. Eu tinha planejado usar você, Faith. Mas ele, — ele
apontou para Rawley — esteve grudado em você desde que voltou. Mesmo cortando o
arrame não consegui separá-la de Cooper. Então eu vi você com este pequeno girino ontem à
noite...
— Você estava no teatro, — Faith afirmou com convicção.
— Como ele pertence à sua família, achei que você estaria lá, que talvez eu pudesse
encontrá-la sozinha. Mas uma vez que a vi, eu decidi que seria mais fácil de manusear. Você
tem muita garra em você, Faith. Como se sente, Cooper, sabendo que eu fui o seu primeiro?
Ela podia ver a tensão nos músculos de Rawley quando ele deu de ombros.
— Como você se sente sabendo que viu seu último nascer do sol?
Cole riu, um som hediondo. — Um cowboy até o fim, um fanfarrão. Só que eu estou
com todas as cartas.
— Mas, como disse Faith, ela é sua filha, você não vai machucá-la, não importa o
quão bastardo você é.
— Eu, por outro lado — Rawley desceu do alpendre e abriu os braços.
— Não estou armado.
—Deixe-a entrar em casa e eu vou cair de joelhos aqui mesmo. Então, se os seus
termos sejam eles quais diabo forem, não forem atendidos, matar-me não vai impedi-lo de
dormir à noite.
Ela tinha a certeza de que assim que Callie estivesse livre, Rawley estaria pegando sua
arma, mas Cole já tinha a arma na mão, então as chances de ele atingir Cole antes deste dar
um tiro em Rawley, não eram boas. Ele tinha que saber isso.
— Isso não é verdade, — disse Cole.

82
Apesar de não liberar seu domínio sobre Callie, ele parecia estar ponderando suas
opções, e Faith estava pensando também. Sua arma estava escondida nas dobras de sua
camisola. Se ele tivesse visto isso, ele teria lhe ordenado que a jogasse no chão. Com ele
segurando Callie como estava, ela não podia garantir que ela não atingiria sua filha. E mesmo
que ela pudesse acertá-lo com precisão infalível, ela não queria que Callie visse um homem
ser baleado diante de seus olhos, ter seu sangue pulverizado sobre ela? Será que ela queria
que Callie crescesse com essas imagens trancadas em sua memória?
— Se não há outra escolha — Cole finalmente concordou.
— Em seus joelhos.
— Solte-a primeiro, — Rawley insistiu.
— Depois que você estiver de joelhos. Coloque as mãos para cima.
Com pouco mais do que um olhar para Faith, refletindo o seu amor por ela, como se
soubesse que poderia ser a última vez que a olhava — Rawley fez como lhe foi ordenado.
Faith queria detê-lo, mas precisava de Callie fora de perigo. Tudo dentro dela queria gritar,
alto e forte, mas ela segurou seu silêncio enquanto ela continuava avaliando a situação.
Quando os joelhos de Rawley bateram no chão, Cole empurrou Callie e lhe deu um
pequeno empurrão.
— Vá para a sua mãe.
Callie correu até ela, abraçou-lhe as pernas. Rufus viu isso como seu sinal para não
brincar mais como morto e saltitou até elas. Sem tirar os olhos de Cole, Faith colocou a mão
sobre a cabeça de Callie.
— Vá para casa. A camisa do tio Rawley está no meu quarto. Há uma vara de
salsaparrilha no bolso. É sua. Toda. — Isso deveria mantê-la ocupada por um tempo.
— Eu quero que você fique no meu quarto com a porta fechada até que o tio Rawley
ou eu vá buscar você, não importa o que você ouvir, você não vai sair. Leve Rufus com você.
— Vamos, Rufus! — Sua menina gritou antes de sair correndo para casa.
Faith ouviu uma porta se fechar a distancia e deu um suspiro de alívio. Pelo menos,
por agora, sua filha estava segura.
— Tudo bem, Cole, agora que você tem a nossa atenção, o que é que você quer?
— Dez mil dólares.
— Eu não tenho dez mil dólares.
— Seu pai tem. Você vê o que ele fez com a minha cara? Bateu em mim até
transformá-la em polpa. Eu não consigo que uma mulher olhe para mim, muito menos que
saia comigo.
Conhecendo seu pai, ela suspeitava que ele lhe dera um golpe ou dois, quando ele lhe
disse que tinha tratado de Cole.
— Sua falta de sucesso com as mulheres pode ter mais a ver com a forma como você
as trata, — disse ela, sem se incomodar em disfarçar seu nojo por ele.
— Você estava se fazendo de difícil e sempre falando sobre ele. — Ele acenou com a
arma para Rawley.
— Seus estúpidos cartões postais, cartas, todos os lugares que ele foi, as coisas que
viu.
— Eu não merecia o que você fez.
— Nenhuma mulher nunca reclamou.

83
Seu estômago se agitou. — Eu não fui a primeira que você forçou?
— Você foi a primeira a correr para o papai. Colocar seus punhos em mim e me chutar
para fora da cidade, não foi suficiente para ele. De alguma forma, ele conseguiu que eu não
obtivesse quaisquer empréstimos ou quaisquer investidores. Nem mesmo a minha família vai
me ajudar.
— Ele é um homem poderoso, — Rawley disse, — com muita influência neste estado.
— Estou falando com você? — Então Cole virou sua atenção de volta a Faith.
— Eu não tenho sido capaz de perfurar um único poço desde que sai daqui. Estou
arruinado. Então, eu quero dinheiro. Você pode ir buscá-lo, mas se você trouxer alguém
consigo, ele estará morto.
— Ela não está indo buscar o dinheiro. Ela não vai a lugar nenhum. Mas você vai. Você
vai direto para o inferno. — Rawley se lançou de lado, pegando sua arma ao mesmo que Cole
disparou. Faith gritou quando Rawley ficou imóvel. Ela correu para ele, colocou sua cabeça
em seu colo, apertou-lhe ombro com a mão onde o sangue escorria.
— Você pegou ele? — Rawley sussurrou.
Ela olhou para Cole. Ele soltou uma gargalhada.
— Parece que eu também sou bom matando cascavéis.
Então o olhar de Cole foi para sua camisa, onde florescia vermelho. Piscando em
descrença, ele olhou para ela. Ela tinha estado tão preocupada com Rawley que ela mal
registrou ter disparado a sua Colt. Sua arma escorregou de seus dedos como se ela não
tivesse mais controle sobre eles. Lentamente, a arma caiu no chão.
Faith voltou sua atenção para Rawley.
— Sim. Eu o peguei.
Ele sorriu. — Esta é a minha garota.
— Ele poderia tê-lo matado. Eu não sei o que você estava pensando, — disse Faith
enquanto andava.
Rawley estava sentado na varanda dos fundos da casa de seus pais, com o braço em
uma tipoia. Ela tinha enfaixado seu ombro tão firmemente quanto pôde, para parar o
sangramento, ajudou-o a vestir uma camisa, e jogou uma colcha sobre Cole para Callie não o
ver. Sua filha tinha aceitado o conto de Faith de que o homem tinha decidido tirar um
cochilo.
Depois de Faith ter selado os cavalos, os três tinham cavalgado para a casa para que
sua mãe pudesse ficar com Callie. Então Faith levou Rawley para a cidade para ver o médico,
enquanto seu pai voltou para a cabana com alguns peões, colocou Cole em um vagão, e
levou-o para o xerife. Uma vez que a bala tinha atravessado o ombro, não atingido nenhum
órgão vital, e Rawley foi tratado — ambos tinham ido falar com o xerife para explicar o que
tinha acontecido como tinha sido forçada a atirar em Cole em autodefesa.
Então eles voltaram para casa, onde sua mãe a tinha convencido de que tinham que
passar a noite lá. Seus pais estavam mantendo Callie ocupada enquanto Faith estava com
Rawley. Ela não conseguia parar de tremer.
— Eu sabia que você tinha sua arma, — ele lhe disse, — mas você não ia poder
disparar, enquanto ele tivesse usando a Callie como escudo. Eu estava esperando que
houvesse uma faísca de decência nele que me permitisse trocar de lugar com ela. Eu sabia
que você ia matá-lo se ele fosse por mim, que o mataria e que você e Callie estariam a salvo.

84
— Mas você não sabia se a minha bala iria impedi-lo de matar você.
— Porque eu não era o mais importante. Quando eu lhe disse que ele era o pai de
Callie, foi quando me apercebi.
Ela parou abruptamente e olhou para ele.
— O que você percebeu?
— Que eu a amava mais do que ele jamais poderia. Que eu não me importava que foi
ele que plantou a semente. Aqui, — ele deu um soco com dois dedos no centro de seu peito
— no meu coração, ela é minha. Se for necessário, eu dou a minha vida por ela sem
hesitação ou remorso.
Ele se levantou, caminhou até ela, e envolveu o braço bom em torno dela, trazendo-a
contra ele.
— E eu faria o mesmo por você. Nada neste mundo é mais importante para mim do
que você e sua menina. Eu gostaria de fazer de você uma mulher honesta.
Ela lhe deu um sorriso travesso.
— É esta a sua ideia de uma proposta, Rawley Cooper?
Com um rolar de olhos, ele começou a abaixar-se para o chão. Ela parou-o.
— Ficar de joelhos uma vez hoje foi o suficiente. — Ela passou os braços em volta do
pescoço.
— Eu te amo com tudo o que sou. Quando eu pensei que você estivesse morto, a luz
no meu mundo esfumou-se. Eu vou casar com você na condição de que você nunca mais se
coloque na frente de uma arma de novo.
— De agora em diante, querida, vamos levar uma vida chata.
— Eu ganhei do vovô nas damas! — Callie gritou quando ela pulou para fora da casa.
— Novamente!
— Ele não consegue ser tão bom quanto você, certo? — Perguntou Faith.
— Uh — uh. — Ela agarrou o corrimão da varanda e balançou para trás e para frente.
— Mamãe, você disse ao homem que ele era meu pai.
Com uma respiração profunda, ela procurou auxilio em Rawley. Ela tinha planejado
ter esta discussão dentro de muitos anos.
— Eu sei. A verdade, Callie...
— É que ele não é, — ela disse num tom que indicava que não havia sentido em
discutir o assunto.
— O Tio Rawley é que é.
— Por que você disse isso?
— Porque eu o amo muito.
Rawley estava sentado num degrau. — Eu gostaria de ser seu pai. Estaria tudo bem se
eu me casasse com sua mãe? Em seguida, todos nós poderíamos viver juntos.
Callie assentiu. — Com Rufus, também?
Rawley sorriu. — Com Rufus, também.
Faith se juntou a ele no degrau. Tendo cuidado com sua ferida, ela circulou os braços
ao redor dele.
— Você acha que poderia dar a Ma e Pa mais alguns netos?
— Eu certamente estou disposto a dar o meu melhor.

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Colocando as mãos atrás da cabeça, ela o trouxe para baixo para um beijo. Ela amava
tanto este homem. Ela o tinha perdido uma vez, não tinha a intenção de perdê-lo
novamente.

86
Capítulo dezesseis

Um mês depois

— Maggie, como você sabia que Rawley me amava? — Faith perguntou a sua dama
de honra quando elas estavam no grande salão bebendo champanhe, esperando que seu tio
Austin e os outros músicos afinassem seus instrumentos.
— Ele confiou em você?
— Claro que não, ele não me disse. Eu sou observadora, descobri por conta própria. A
maneira como ele olhava para você, se um homem me olhasse com tanta adoração, eu me
casaria com ele em um piscar de olhos. — Ela balançou a cabeça, sorriu melancolicamente.
— Mas, meu Deus, Faith, quando você entrou na sala antes, a maneira como ele
olhava para você no passado, era pouco em comparação com o que eu vi em seus olhos
hoje... ele não estava se segurando. Todo mundo pode ver o quanto ele te ama. Eu não era a
única a usar um lenço para enxugar as lágrimas.

Faith estava usando o mesmo vestido branco que sua mãe tinha usado no dia em que
ela se casou. Faith e Rawley tinham trocado seus votos na mesma sala onde seus pais haviam
prometido ser fieis e, se manter unidos até que a morte os separasse, com o mesmo vigário
que os tinha casado. Assim, muitos dos peões e moradores vieram testemunhar a cerimônia,
a qual só tinha cadeiras para os membros da família, criando, assim, espaço suficiente para
acomodar todo mundo.
— Ele tem uma maneira de olhar para mim muito expressiva.
— Até que enfim você notou, — Maggie brincou.
Não era difícil quando ela podia sentir seu olhar quente do outro lado da sala, quando
ele transmitiu tudo o que estava sentindo, prometeu uma vida de felicidade. Ele estava de pé
entre suas tias, ocasionalmente balançando a cabeça, mas então seu olhar iria pousar sobre
ela e ela ia sentir o calor dele como se ele estivesse aninhado contra ela.
— Eu me pergunto o que eles estarão dizendo.
Sorrindo, Maggie olhou por cima do ombro. — Conhecendo minha mãe,
provavelmente elas estão lhe transmitindo palavras de sabedoria sobre as pequenas coisas
que ele pode fazer para que você saiba que ele a aprecia.
— Ele não precisa de nenhum conselho nessa área.
A orquestra começou a tocar — My Loree, — uma música que Tio Austin tinha
composto para sua esposa que refletia tantas emoções, tanto amor que os olhos de Faith se
encheram de lágrimas quando ela a ouviu. Capturando a atenção dela, Rawley inclinou a
cabeça para o lado.
Faith entregou a taça de champanhe a sua prima.
— Obrigada, Maggie, obrigada por ser amiga dele e minha.
Então ela caminhou até o centro da pista de dança onde seu marido a esperava.
Assim que ela chegou até ele, com um sorriso acolhedor e um floreio, ele deslizou com ela
sobre a madeira polida em uma valsa. As pessoas bateram palmas, um par de homens

87
assobiaram, mas o homem que nunca quis estar no centro das coisas, não parecia importar-
se em ter a atenção de todos sobre ele.
— Se eu soubesse que, tudo o que eu tinha que fazer era me casar com você, para
que você dançasse comigo de boa vontade, eu já teria feito isso há muito tempo, — brincou
ela.
Sua risada soou profunda e verdadeira.
— Você vai ser uma mulher fácil de agradar.
— Você estava temendo este momento? — Perguntou ela, porque sabia que iam
começar a primeira dança sozinhos.
— Como eu poderia, quando isso significava que eu, finalmente, teria você de volta
em meus braços?
Querido Deus, como ela o amava.
As pessoas começaram a avançar para pista de dança. Era impossível resistir à
tentação do violino do tio Austin.
— O que é que as tias lhe disseram? — Perguntou ela.
— Elas disseram que eu deveria levá-la para o Grand Hotel, para que você tenha uma
noite especial.
— A noite será especial porque eu estarei com você. Você explicou-lhes que nós
queremos passar a noite de núpcias na cabana onde nos libertamos dos fantasmas do
passado?
— Não acho que isso seja da conta delas. Eu educadamente acenei com a cabeça e
disse que, provavelmente, elas estavam certas.
Ela riu levemente. — Eu duvido que elas tenham ficado surpreendidas com sua breve
resposta. Você tem uma reputação de não falar muito, Rawley Cooper. Embora possam ser
surpreendidos por quanto você fala comigo.
— Isso é porque você é o meu coração, Faith Cooper. E a minha alma. Quando
chegarmos à cabana, eu vou dar-lhe o meu corpo, também.
Com base no calor aquecendo suas bochechas, ela estava certa de que ela estava
corando. Eles não tinham sido íntimos desde seu encontro com Cole porque tinham ficado
com seus pais. Ela precisava de algum tempo, para deixar as lembranças do que havia
acontecido dentro das sombras da cabana, desaparecerem. Mas era onde ela queria que eles
começassem a sua vida, juntos, esta noite.
Quando a música acabou, eles se separaram, mas esperaram que seus pais se
juntassem a eles. Em seguida, ela dançou com o pai enquanto Rawley circulou a área com
sua mãe.
— Você parece feliz, — disse o pai.
— Eu estou. Tão feliz.
— Ele é um bom homem.
— Eu acho que ele teve um bom exemplo.
Ele balançou sua cabeça. — Eu sou um homem mais duro do que ele. A guerra fez isso
comigo. Rawley teve um começo de vida duro, mas conseguiu manter a sua decência. Com
ele olhando por você, eu nunca vou ter que me preocupar com você ou Callie. Ou sua mãe.
Ele vai cuidar dela, também.

88
Lágrimas ardiam em seus olhos. — Eu te amo, Pa. Por favor, não vá a qualquer
momento em breve.
— Eu não estou planejando isso, querida.
— Boa. Porque temos a intenção de lhe dar mais alguns netos para tomar conta.
Sua gargalhadas encheu a sala. — Eu estou ansioso por isso.
Ela teve necessidade de encontrar o olhar de seu marido, e quando o fez, seu coração
derreteu. Ele já não estava dançando com sua mãe, mas com sua filha. Callie estava de pé
sobre suas botas polidas, olhando para ele, rindo enquanto ele deslizava ao redor da sala.
Faith suspirou.
— Eu o amo muito, Pa.
— Eu duvido que ele possa querer mais nada, Faith.
Mas ela pretendia dar-lhe mais, estava destinada a dar-lhe tudo o que ela era.

A celebração iria continuar ainda por mais algumas horas, mas Rawley estava ansioso
para ficar a sós com Faith e todos, graciosamente, aceitaram esse fato. Ela estava se
trocando para algo mais adequado para viajar, mesmo que eles estivessem indo apenas para
a cabana.
— Passamos metade da nossa vida esperando pelas mulheres, — disse Austin.
— Mas a espera sempre vale a pena, — Houston assegurou.
— Certamente que não me senti assim quando estava esperando que você trouxesse
Amelia da estação de trem em Fort Worth, — Dallas resmungou.
— Mas foi o melhor, — Houston declarou com firmeza.
— Verdade, — disse Dallas.
E era verdade, pensou Rawley. Se não fosse o atraso na chegada de Amelia, ele
poderia não estar, agora, assistindo a mulher mais linda que ele conhecia, andando pelo
salão vestindo aquele maldito vestido vermelho que ele não podia esperar para tirar.
— Eu os vejo por aí, — disse ele distraidamente para os três homens que lhe tinham
demonstrado que ainda existia bondade no mundo. Enquanto se dirigia para Faith, ele estava
vagamente consciente deles rindo atrás dele.
Quando ele a alcançou, ele não se importou que uma horda de pessoas
permanecesse no salão. Ele serpenteou seu braço ao redor dela, trouxe-a para perto, e a
beijou.
— Está pronta, senhora Cooper?
Seu sorriso era brilhante o suficiente para guiar uma manada de gado em uma noite
de tempestade.
— Estou, senhor Cooper.
Ele se baixou para ficar ao nível dos olhos da menina segurando a mão de Faith.
— Você se lembra dos planos?
Callie assentiu com entusiasmo. — Eu vou passar a noite com Vovô e Vovó. Amanhã,
nós vamos partir para o Grand Canyon!
Ele apertou-lhe a ponta do nariz. Ele e Faith decidiram que todos eles mereciam uma
pequena viagem juntos.

89
— Está certo. Então, você seja uma boa menina, e nós vamos te pegar bem cedo pela
manhã.
Soltando seu domínio sobre sua mãe, ela jogou os braços ao redor do pescoço dele.
— Eu te amo, papai.
Ela havia começado a chamá-lo assim à medida que o casamento se aproximava e
isso, nunca deixava de lhe apertar o coração. Ele envolveu-a em seus braços.
— Eu também te amo, pequena.
Ele entregou-a para seu avô, que o tinha seguido e, abraçou sua mãe. Em seguida, ele
passou o braço em torno da cintura de Faith e levou-a para fora, os convidados indo atrás
deles, desejando votos de felicidade.
Depois que ele ajudou Faith subindo até a charrete que os esperava, ela jogou seu
buquê de flores silvestres para a multidão, rindo quando Maggie o pegou. Ele riu ao ver a
expressão chocada da pirralha e não pode deixar de desejar que um dia, em breve, ela iria
encontrar um homem digno dela.
Assim que Faith se acomodou a seu lado, ele bateu as rédeas.
— Giddyap.
Os cavalos cavalgaram em frente.
Faith passou os braços em torno de um dos dele e aconchegou- se contra ele. O
crepúsculo surgindo.
— Esse vestido me deixa louco, — ele murmurou com bom humor.
— Levei um tempo para descobrir isso. A primeira vez que eu o usei, você parecia
louco o suficiente para cuspir pregos. — Ela apertou-se mais contra ele, mordendo de leve o
lóbulo de sua orelha.
— Agora eu percebo que foi porque ele fez você me querer demais. Acho que vou
usá-lo muitas vezes no futuro.
Ele riu baixo. — Um aviso. Sempre que você fizer, não vai ficar com você por muito
tempo.
Eles se acomodaram em silêncio, deixando-se envolver pela escuridão purificadora.
Quando eles se aproximaram da cabana, ela cavou seus dedos em seu braço. Ela não tinha
voltado à cabana desde a manhã fatídica. Ele tinha levado os pertences e as roupas dela e de
Callie para a casa. Ele tinha sido o único a arrumar.
— Não é tarde demais para ir para a cidade e obter um quarto no hotel, — disse ele
calmamente.
Afrouxando seu aperto, ela balançou a cabeça.
— O que eu fiz nunca vai me deixar, Rawley. Eu não me sinto orgulhosa sobre isso.
Mas ele não me deu escolha. Eu acredito nisso, com todo o meu coração.
— Porque é a verdade.
Ela olhou para ele. — Nós protegemos o que é nosso.
— Com tudo em nós.
Ela aninhou a cabeça em seu ombro.
— Eu tenho boas lembranças suficientes da cabana para afastar o mal.
Ele estava destinado a dar-lhe mais.

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Quando chegaram à cabana, ele viu Pete sentado nos degraus. Com um largo sorriso
dividindo seu rosto, o cowboy idoso ficou de pé e se aproximou assim que Rawley parou a
charrete.
— Eu imaginei que um homem recém-casado não gostaria de perder tempo tratando
de seus cavalos.
Rawley saltou da charrete e apertou a mão do homem.
— Obrigado, Pete. — Em seguida, ele estendeu a mão, colocou as mãos em cada lado
da cintura de Faith, e trouxe-a para o chão.

Inclinando-se para Pete, ela deu um beijo rápido sobre seu rosto, o rosto ficando
vermelho, o suficiente para fazer desvanecer a maioria de suas sardas.
— Nós apreciamos isso, Pete.
— O prazer é meu, madame.
Deslizando seu braço em volta da cintura, Rawley levou para a cabana.
— Foi doce da parte dele, — disse ela.
— Foi, de fato.
Quando se aproximaram da cabana, ele a tomou em seus braços, tendo o prazer do
eco de sua risada.
Ao chegarem à porta, ela a abriu e ele a carregou através do umbral, chutando a
porta atrás deles. Ele foi para o quarto e não parou até que chegaram à cama, onde ele,
lentamente, a baixou em seus pés e segurou seu rosto entre as mãos.
— Eu não sou um homem de palavras extravagantes. Eu não sei como lhe dizer o
quanto isto significa para mim, que você é minha esposa. Tudo o que posso fazer é passar o
resto da minha vida tentando lhe demonstrar, começando hoje à noite.
Com um sorriso que aqueceu o seu olhar, ela passou os dedos em seus cabelos.
— Eu te amo, Rawley, com tudo o que tenho.
Seu rosnado baixo reverberou em torno deles pouco antes de ele reivindicar sua
boca, derramando tudo no beijo, tudo o que ele sentia. Com ela, ele se sentiu renascer,
levantando-se incólume das cinzas de um passado obscuro que já não importava. Quando ela
o liberou de sua jaqueta, colete, gravata e camisa, como se fossem camadas caindo, ele
sentiu a glória da lavagem de seu amor sobre ele. Ele era digno dela acariciando sua pele. Ele
era digno dela.
— Eu te amo. — Sua declaração era trêmula e crua quando ele se inclinou para trás e
segurou seu olhar. Seu amor o teria humilhado, o teria trazido de joelhos, se ele não tivesse
necessidade de permanecer em pé, a fim de remover o maldito vestido vermelho que
mantinha tanto dela escondido dele.
Ele tomou o cuidado de não rasgar ou romper, mas ainda assim, suas mãos
trabalharam rapidamente até que ela se revelou em todo seu esplendor. Eles caíram em
cima da cama.
— Suas calças, — ela ordenou.
Uma das razões que a amava era porque ela sabia o que queria e não tinha medo de
dizer a ele. Ele tirou as botas, puxou as calças, e se estendeu a seu lado, sua perna aninhada
entre as dela, sua coxa pressionada contra o local celestial, que lhe havia sido negado, por
um mês.

91
Baixando a cabeça para a curva de seu pescoço, ele mordiscou a pele macia, notando
a alegria em seu suspiro, em seus dedos cavando em suas costas. Deixando um rastro de
beijos em seu caminho, ele viajou para baixo, para o peito, até ter o mamilo na boca,
acariciando a língua sobre o pequeno botão que chamou a atenção dele.
Ela soltou um pequeno miado, levantando seus quadris e pressionando seu núcleo
íntimo contra sua coxa.
— Eu quero você, — ela suspirou.
— Eu quero você agora.
— Quando eu terminar de adorar você.

Ela não precisava ser adorada, não precisava se sentir uma deusa, ela queria apenas
sentir-se como uma mulher, uma mulher desejada, uma mulher amada.
Não, ela pensou. Ela queria ser uma mulher que desejava, uma mulher que amava. E
ela amou e desejou este homem.
Ele ficou entre suas coxas, então deslizou para baixo e circulou sua língua ao redor de
seu umbigo. Dobrando as pernas, ela apertou a sola dos pés na parte de trás de suas coxas
firmes.
Ele empurrou-se mais para baixo.
— Aonde você vai? — Ela perguntou.
Ele levantou seu olhar, ela viu o calor abrasador em seus olhos.
— Hoje à noite eu vou provar você toda.
Continuando a descida, abrindo suas pernas, espalhando suas dobras. Quando ele
baixou a boca para o broto sensível, ela quase saiu da cama. Meio sentada, com as costas
arqueadas, ela descansou sobre os cotovelos e observou enquanto ele se banqueteava.
— Oh, Deus, — ela gemeu, segurando a respiração enquanto seu corpo inteiro se
esforçava para chegar mais perto dele.
Sensações agudas, fortes em sua intensidade, em espiral, através dela. Com um
gemido, ela caiu de costas na cama e deixou-o assumir, enquanto trabalhava no centro de
seu núcleo, como se estivesse destinado a domá-lo. Mas ele não estava tentando encurralá-
la. Ele estava buscando liberdade — Ela gritou seu nome quanto seu corpo se contraiu, as
costas arqueadas, e onda após onda de prazer, rolou através dela.
Em seguida, ele estava lá, enterrado profundamente dentro dela, a boca cobrindo a
dela, enquanto ele bombeava dentro dela, duro e rápido, até que ambos estavam chorando
quando o êxtase os engoliu.
Quando ele foi rolar para fora, ela o abraçou.
— Ainda não.
Ele deixou-se cair sobre ela, alavancando-se em seus braços para manter a maior
parte de seu peso fora dela, e ainda assim ela absorveu o seu calor, seus tremores. Ela
saboreou a pressão de seus lábios contra a curva de seu ombro.
— Eu amo você, Faith, — disse ele quebrando o silêncio.
Ela sorriu. — Que sortuda que eu sou, porque eu também te amo.
E ela assim o fez, em todos os dias e todas as noites que se seguiram.

92
Epílogo

Um ano depois

Faith sentou-se no balanço da varanda ao lado do pai, olhando ternamente como ele
embalava seu neto com um mês de idade, Jackson Cooper. Não era a primeira vez que ele
fazia isso, mas sempre a enchia de uma grande felicidade, ver a alegria e o orgulho refletido
em seu rosto. Ele transferiu a gestão da fazenda totalmente para ela e Rawley, que estava
com o traseiro pressionado contra a grade da varanda, os braços cruzados sobre o peito, um
pé cruzado na frente do outro. Embora ela soubesse que ele não estava tão relaxado quanto
parecia.
Ela também sabia que os dois faziam uma grande equipe lidando com o gado,
enquanto ela tinha renovado seu interesse pelo petróleo. Ela acreditava, de todo o coração,
que em algum momento, eles encontrariam um poço ou dois. Mas mesmo se não o fizessem,
ela sabia que tinha confortado seu pai saber que eles tinham capacidade para assegurar seu
legado, aliviando-o de um fardo que ele estava cansado de carregar. E com alguma sorte, ele
estaria com eles por muitos e bons anos.
Sua mãe sentou-se numa cadeira de balanço próxima, mantendo um olhar atento
sobre Callie enquanto ela perseguia Rufus, que de repente virava e começava a persegui-la.
Sua risada e gritos de alegria ecoaram em torno deles.
— Eu não posso acreditar o quão grande esse cara já está, — seu pai disse passando
rapidamente um dedo áspero, sobre o que ela sabia, ser um rosto incrivelmente macio,
gordinho.
— Ele está sempre com fome, — Faith disse a ele.
— Ele vai estar comendo carne dentro de pouco tempo.
— Tenho poucas dúvidas, — assegurou ela.
Ele levantou o olhar para ela. — Eu o teria amado tanto mesmo se acabasse por ser
uma menina.
Ela sorriu com ternura. — Eu sei, Pa. Você nunca me fez sentir como se você
desejasse que eu tivesse sido um menino.
— Não existem muitas mulheres que pudesse lidar com a gestão de um negócio tão
bem quanto você.
— Eu acho que você ficaria surpreso. — Ela olhou para sua mãe.
— Somos muito resistentes quando se trata de ir direito ao assunto.
— Somos, sim, — Ma concordou.
— Sua mãe e eu temos falado, — disse Pa.
— Nós já não precisamos desta grande monstruosidade de casa.
— Eu nunca vi isso como uma monstruosidade, — sua mãe disse rapidamente.
— Representa um homem ousado com grandes sonhos.
— Bem, este homem ousado está ficando cansado, e vocês, jovens, vão necessitar de
espaço mais do que nós, por isso vamos construir um lugar menor não muito longe daqui,
mas longe o suficiente para vocês terem a vossa privacidade. Ou vocês podem construir
outra coisa, mas aquela pequena cabana já não dá.

93
Ela olhou para Rawley e, com nada mais do que um pequeno trejeito de sua boca,
deu-lhe a sua resposta.
— Nós gostaríamos de mudar para cá, — disse ela.
— Está repleta de memórias maravilhosas, e nós vamos passá-las para as crianças.
— Bom, era isso que estávamos esperando, — disse o pai.
— Com isto resolvido, vocês estão prontos para jantar? — Perguntou sua mãe,
começando a se levantar da cadeira de balanço.
— Uh, antes de fazermos isso, — Rawley começou, interrompendo seu progresso,
olhando para Faith. Ela deu a seu marido um aceno encorajador.
— Uh, eu tenho algo a dizer.
Sua mãe baixou-se de volta para o assento almofadado e esperou pacientemente.
Rawley endireitou-se e enfiou as mãos nos bolsos de trás da calça. Ele trocou seus
pés, limpou a garganta.
— O que se passa, rapaz? — Perguntou o pai, com preocupação em sua voz, e ela se
perguntou se os pais alguma vez iriam ver, como adultos, as crianças de que cuidaram.
Colocando a mão em seu braço, ela apertou suavemente.
— Basta dar-lhe um tempo. — Então, ela deu sua atenção para seu marido e deixou
que todo o amor que sentia por ele, de toda uma vida e mais além, se refletisse em seus
olhos. Ele lhe deu um pequeno aceno de cabeça, com um canto da boca inclinado para cima,
antes de voltar seu olhar sobre seu pai.
— Dallas, quando eu era um garoto e você me acolheu, você se ofereceu para me dar
o seu nome.
— E você sempre se opôs.
— Eu não achava que o merecia.
— Isso é um perfeito disparate.
Ela apertou o braço de seu pai para silenciá-lo, porque sabia o quão difícil esse
momento era para Rawley, sabia o quanto significava para ele.
— Vá em frente, — disse o pai bruscamente.
Rawley deu outro aceno.
— Eu estive pensando sobre isso. E a coisa é, eu o quero em meu filho, — ele olhou
para onde Callie agora estava rolando na grama com Rufus — “meus filhos”, ele olhou para
Faith — eu quero que nossos filhos tenham o nome do meu pai. Eu estava esperando que a
oferta que você fez ainda estivesse em aberto e se você me daria a honra de assumir o seu
nome.
— Já não era sem tempo, filho, — disse o pai, com a voz um pouco trêmula de
emoção.
— Já não era sem tempo.
Então ele entregou Jackson a ela, empurrou-se em seus pés, e cercou Rawley em um
abraço. Sobre o ombro de seu pai, através das lágrimas, ela viu os olhos bem fechados de seu
marido, viu uma única gota de água fugindo ao longo de sua bochecha.
Ele disse a ela nas horas tardias da noite o que ele queria fazer, tinha pedido a sua
permissão, porque também afetava o nome dela. Ele queria adotar Callie, assim, ser tanto
um pai para ela como ele seria para seu filho. E ela sabia que ele, finalmente, deixara seu
passado para trás, tinha finalmente entendido que a família não era definida pelo sangue.

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— Se não fosse domingo, iríamos para a cidade agora mesmo e resolver este assunto,
— disse o pai.
— Vamos fazê-lo amanhã, logo de manhã.
Quando seu pai deu um passo atrás, sua mãe substituiu-o, abraçando Rawley
firmemente.
— Você nos fez tão felizes.
— Levei um tempo para ver as coisas direito, para entender, — disse ele.
— A Callie é tanto minha quanto Jackson.
Assim que ouviu seu nome, Callie, de repente, prestou atenção se lançando pelas
escadas.
— Papá! Também quero um abraço!
Algum dia, Faith percebeu, ela teria que explicar tudo sobre o homem que
desempenhou um papel na sua existência. Mas seu pai era, e sempre seria, Rawley.

Com as crianças dormindo, e seus pais sentados na varanda apreciando as estrelas,


Rawley passou o braço em torno de Faith e levou-a para longe da casa, em direção à pradaria
aberta. Até onde ele podia ver era a terra que um dia lhes iria pertencer, que iriam passar
para seus filhos.
— As coisas mudam e eles ainda parecem os mesmos, — disse Faith em voz baixa.
— Você vai ser Faith Leigh novamente.
— Eu não ligo para qual é o meu nome desde que você seja o meu marido.
Ele riu baixo.
— Rawley Leigh não rola exatamente para fora da língua.
— Eu gosto dele. — Balançando ao redor, ela parou de andar, de pé em frente a ele,
com os braços ao redor de sua cintura, as mãos apertadas em suas costas.
— Eu te amo, Rawley. E eu vou te amar até já não existir ar para respirar e céu para
olhar.
Com uma mão, ele embalou sua bochecha.
— Eu te amei por tanto tempo, Faith, que eu não consigo me lembrar de uma época
em que eu não o fiz.
Reclamando sua boca, enquanto os vaga-lumes dançavam ao seu redor, ele percebeu
que o legado que lhe tinha sido dado não tinha nada a ver com terras ou, gado ou a
possibilidade de petróleo, mas tinha tudo a ver com o amor, com o amor dessa mulher.

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Sobre a autora

Lorraine Heath sempre sonhou em ser escritora. Depois de se formar pela


Universidade do Texas, ela escreveu manuais de treinamento, press releases, artigos e
códigos de computador, mas algo estava sempre ausente. Quando ela leu um romance, ela
não só se tornou viciada no gênero, como, rapidamente percebeu que em sua escrita faltava:
rebeldes, canalhas e bandidos. Ela está escrevendo sobre eles desde então. Seu trabalho foi
reconhecido com vários prêmios da indústria, incluindo RWA’s o prestigiado RITA®. Suas
novelas têm aparecido nas listas dos mais vendidos no EUA Today e New York Times.

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