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Eu teria dois contos para contar, um que preparei para os meus netos, a partir de um
conto russo, e outro, para os adultos.
Virou um só.
O coelhinho da Páscoa me disse que estava com saudades dessas crianças que estão
escondidas dentro de vocês. Vocês estão ouvindo as risadas dessas crianças
brincando?
Os bichos das nossas matas pediram para participar. Então, eles foram chegando,
batendo na porta da história, e eu deixei entrar. E o reino distante ficou bem distante,
aqui mesmo, com cheiro de mato, com murmúrio do riacho, com o reflexo prateado da
lagoa, com todas as cores nas flores.
Sabem, no domingo antes desse domingo, recebi a visita da Vovó Coelha, bem
velhinha, que usava óculos e um xale meio desgastado em volta dos ombros.
Veio arrastando os pés em chinelos grandes, fofos, vermelhos, e trazia um cesto cheio
de folhas de palmeira.
A Vovó Coelha me contou que antes de chegar à minha casa, viu um jumentinho
entrando na cidade, e montado nele o Filho do Homem muito forte e belo. Parecia um
rei. Ia em silêncio. E as pessoas, entusiasmadas, o saudavam abanando folhas de
palmeira, e cantando hosana.
Ela me prometeu vir todos os dias, bem cedinho, antes de eu acordar, e me contar
mais um pedaço da história.
Era uma vez, lá no reino muito distante, onde não chega nem o avião nem a televisão,
no meio do mato, uma casa escavada na terra, coberta de grama, escondida.
Dentro da casa, o Coelho Pai e a Coelha Mãe chamaram os sete coelhinhos filhos e
perguntaram quem queria ser o coelho da Páscoa esse ano. Pois não é fácil ser coelho
da Páscoa! É preciso ser de verdade.
E o que é ser coelho da Páscoa, perguntaram os sete em coro, pois como sempre
acontece nas famílias de coelhos, a cada ano há novos coelhinhos, e estes nunca
haviam vivenciado a Páscoa.
O Pai Coelho e a Mãe Coelha se entreolharam, deram uma piscadinha um para o outro.
Disseram que durante a semana os coelhinhos iriam entender, pois tinham várias
tarefas para executar. Quem as executasse direito, seria o coelho da Páscoa.
Na segunda-feira, a Vovó Coelha apareceu com a cesta cheia de folhas de figueira, bem
secas. Estava com ar de sonhadora. Veio devagar, arrastando os pés nos grandes
chinelos vermelhos.
A Vovó Coelha contou que antes de chegar à minha casa, passou por uma figueira que
estava secando. Ela estranhou, pois antes sempre havia um monte de gente debaixo
dessa figueira, rezando, rezando, rezando, flutuando um pouco acima da terra. Agora
não havia ninguém, e as pessoas passavam por ela, uma olhando para a outra, uma
ajudando a outra.
Também ouviu uma barulheira, uma gritaria, e foi ver. No templo, alguém muito
energicamente expulsava os vendilhões de lá. Pareceu ser o mesmo do jumentinho.
Depois que todos os vendilhões foram embora, o templo ficou iluminado e limpo.
Então...
Na terça-feira, a Vovó Coelha chegou com a cesta cheia de lã de ovelha. Veio animada,
com passinhos rápidos, arrastando os chinelos.
Contou que antes de chegar à minha casa, passou pelo templo e discussões chamaram
sua atenção. Escondeu-se por trás de uma coluna, e ficou ouvindo, curiosa. Aquele do
jumentinho contava histórias com um nome esquisito: parábolas. E saíam pedras
preciosas de sua boca, brilhantes, belas. E saíam espadas de sua boca, que faziam os
sacerdotes e escribas murchar um pouquinho. Era tão interessante ficar ouvindo, que
a Vovó Coelha de repente se deu conta de que precisava correr para chegar a tempo à
minha casa. E lá estava ela de novo para continuar a história.
O Pai Coelho e a Mãe Coelha reuniram os seis coelhinhos e pediram para que o
segundo escolhesse um ovo de Páscoa e levasse ao jardim das crianças.
O coelhinho escolheu o ovo vermelho e saiu saltitando pela estrada afora. Encontrou a
Onça, que se interpôs em seu caminho. O coelhinho depositou o ovo na beira da
estrada, ao lado de uma pedra, e muito bravo, foi brigar com a Onça. Enquanto isso, a
Arara viu o ovo e o levou para o seu ninho. A Onça, muito esperta, deixou o coelhinho
pular, brigar, só dava um empurrãozinho aqui, outro ali, até o coelhinho cansar.
Quando ele estava bem exausto, ela também ficou com sono, e os dois dormiram. Pode
ser que ainda estão dormindo.
Na quarta-feira, a Vovó Coelha trouxe sua cesta cheia de ervas com cheirinho gostoso.
Veio dançando, com passinhos leves, como se tivesse asas nos seus chinelos
vermelhos.
Contou que no caminho encontrou uma bela mulher de longos cabelos, carregando
um frasco com óleo precioso. Onde será que ela ia? Para quem estava levando esse
frasco? O olhar dela era tão cheio de amor...
Antes de chegar à minha casa, ela havia encontrado um homem carregando uma bacia
com água e toalha, e outro, carregando pão e vinho. Disseram que iam preparar uma
ceia muito especial. Onde será que era?
O próximo coelho pegou o ovo laranja e saiu saltitando pela estrada. Encontrou o
Tamanduá. Vocês sabem que o Tamanduá não enxerga nem ouve, só sente o cheiro
das coisas. E ele sentiu o cheiro do chocolate. Ficou com tanta vontade de comer o ovo,
que deu uma lambida no ovo e convidou o coelho a experimentar. Lambida vai,
lambida vem, o ovo foi diminuindo e acabou. Quando o coelhinho percebeu isso,
sentou-se e começou a chorar. E agora?
O pedaço da história que ela me contou foi assim: o coelhinho escolheu o ovo verde e
foi saltitando pela estrada. No caminho encontrou o Macaco na beira do riacho que
não parava de se olhar no espelho da água, encantado. O coelhinho também olhou no
espelho da água, para entender o que estava acontecendo. Mas quando viu refletido
ali um lindo coelhinho, também ficou encantado. Acho que está lá até hoje.
E no sábado, o que foi que aconteceu? A Vovó Coelha chegou com a cesta de nuvens
pretas. Assustada, olhava para os lados, ajustando os óculos no nariz.
Ela disse que no caminho estava tudo escuro e silencioso. Nada se movia. Só ao longe
parece que vinha vindo uma luz, formando um anel. Que estranho, pensou ela.
E a história, como continua? O penúltimo coelhinho pegou o ovo azul e saiu saltitando
pela estrada. No caminho, encontrou o Jacaré. Levou um enorme susto, pois o Jacaré
estava com muita fome e exigiu dar uma mordida no ovo. Mais do que depressa, o
coelhinho lhe entregou o ovo, de medo que o Jacaré quisesse comer coelho também. E
fugiu. Acho que está fugindo até hoje, porque ainda não voltou.
A noite foi avançando. À meia-noite, em vez de escuridão, começou a surgir uma luz
que ninguém jamais vira antes. Era mais forte que o sol, parecia um sol novinho em
folha. Mas no meio da noite?
E chegou à minha casa com sua bela cesta cheia de ouro puro e reluzente.
E o último coelhinho o que fez? Escolheu o ovo branco e saiu saltitando pela estrada.
Ele estava tão feliz, tão alegre, e contente, e sabendo que devia levar o ovo para as
crianças. Quando encontrou o Jabuti, não lhe deu bola, quando a Onça barrou-lhe o
caminho, ele deu a volta e continuou pela estrada. O Sapo não conseguiu deixá-lo
zonzo porque ele estava concentrado na sua tarefa. Nem deixou o Tamanduá cheirar o
ovo, bem embrulhado que estava, e continuou, cuidadoso. Deixou o Macaco sozinho
olhando para o espelho d´água, o coelhinho que viu na água era lindo, mas não ficou
lá, pois tinha algo muito importante a fazer. E o Jacaré? Ficou com medo do Jacaré e
correu, correu e é claro que o Jacaré não conseguiu correr tanto quanto ele.
O coelhinho chegou ao jardim das crianças, deu um pulo nem muito comprido nem
muito curto, deixou o ovo escondido no meio da grama e, todo contente, voltou para
casa.
Quando chegou em casa, percebeu que o pelo dele brilhava todo em milhares de
luzinhas coloridas, cheias de vida nova. O Pai Coelho e a Mãe Coelha o receberam num
abraço gostoso. Era ele o verdadeiro Coelho da Páscoa.
ADENDO - RESUMO DAS CORRELAÇÕES – UM PRIMEIRO ESTUDO
A SEMANA SANTA:
Domingo de Ramos
1. Segunda-feira: A figueira é amaldiçoada e seca, Cristo expulsa os vendilhões do
templo.
2. Terça-feira: Discussões com os doutores da lei, sacerdotes e escribas
3. Quarta-feira: Jesus vai à casa do cobrador de impostos, Maria Madalena unge seus
pés e os enxuga com seus cabelos.
4. Quinta-feira: A Santa Ceia
5. Sexta-feira: Jardim das Oliveiras, suor de sangue, crucifixão e morte
6. Sábado: decida aos infernos
7. Domingo: Ressurreição